Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:325/21.BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:01/20/2022
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR;
SERVIÇOS PRISIONAIS;
RESOLUÇÃO FUNDAMENTADA;
CONTAGEM DA ANTIGUIDADE;
Sumário:1 – O tribunal ao analisar o preenchimento dos pressupostos tendentes a julgar procedente, ou não, uma Providência Cautelar, não pode confundir essa análise, com a verificação dos pressupostos de Resolução Fundamentada, entretanto emitida, uma vez que esta tem objeto e objetivo diverso, mormente quando nem sequer foi utilizada a prerrogativa resultante do nº 4 do Artº 128º do CPTA, tendente a “atacar” os Atos de Execução.

2 - Mantendo-se controvertido o modo de contagem do tempo de serviço dos Guardas prisionais num determinado Estabelecimento Prisional, não é possível, em sede cautelar, optar conclusiva e definitivamente por um entendimento que aponte para a ilegalidade do modo como os Serviços Prisionais procederam à referida contagem, com implicações na reafectação de Guardas Prisionais num Estabelecimento Prisional.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
O Ministério da Justiça/Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, no âmbito da Providência Cautelar apresentada por L...tendente à suspensão da eficácia do despacho do Subdiretor Geral da Reinserção e Serviços Prisionais, que determinou, nomeadamente, a transferência deste, a partir de Abril de 2021, para o EP de Sintra, inconformado com a Sentença proferida no TAF de Sintra em 28 de junho de 2021, através da qual foi deferida a referida Providência Cautelar, veio, em 13 de julho de 2021 Recorrer Jurisdicionalmente para este Tribunal, tendo concluído:
1. O Recorrente através da “resolução fundamentada” indicou as razões que militam no sentido da existência de situação de urgência grave no prosseguimento da execução do ato administrativo suspendendo, decisão essa que é passível de ser sindicada contenciosamente pelos tribunais no âmbito do incidente de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida com fundamento quer no facto dos atos de execução não estarem baseados na “resolução fundamentada” (total ausência desta ou estarem fora da sua abrangência ou cobertura), quer no facto dos motivos aduzidos naquela “resolução” não constituírem fundamentos legais ou legítimos abarcados pelo conceito legal enunciado no n.º 1 do art. 128.º do CPTA do diferimento da execução ser “gravemente prejudicial para o interesse público”, o que o ora Recorrido não fez;
2. Deriva do teor da resolução fundamentada produzida nos autos motivação idónea e adequada que corporiza as razões apresentadas para a emissão daquela resolução, razões essas que permitem claramente sustentar o prosseguimento da execução e integram-se na previsão do n.º 1 do artigo 128.º do CPTA;
3. O Tribunal a quo andou mal quanto à apreciação da existência do interesse público, apresentado na Resolução Fundamentada. Ora, a resolução fundamentada apresentada pela entidade requerida ao abrigo do artigo 128º do CPA, tem uma finalidade própria que não se confunde com a oposição à providencia cautelar, algo que parece não ter sido o caminho seguido pelo Tribunal a quo e que merece a devida censura;
4. O Tribunal a quo andou mal ao decidir pela verificação do fumus bonis iuris, porquanto, em sede de ação principal, não é correto concluir, pela existência de vício pela existência de vício do erro sobre os pressupostos de facto na Decisão da Entidade Pública demandada, no que tange ao critério da antiguidade adotado, e, portanto, não existirá fundamento, para a procedência da ação principal e a consequente anulação do ato aqui em crise;
5. A antiguidade na unidade orgânica foi determinada única e exclusivamente atendendo à data em que foi praticado o ato administrativo ou, eventualmente, à data que o próprio determina a transferência ou afetação à unidade orgânica, à luz do que determina o RTPCGP e nos termos do artigo 155º do CPA não relevando para o cálculo dessa antiguidade a data efetiva de apresentação de cada elemento, elemento subjetivo e arbitrário, que mais não é do que a execução material do ato.
6. Atento o quadro legal supra exposto e ao contrário do alegado pelo Recorrido não existe qualquer irregularidade ou desvio do quadro legal aplicável, concluindo-se, pois, que o despacho impugnado cumpriu todos requisitos mínimos de fundamentação, sem preterição de qualquer tipo de formalidades.
7. E porque assim é, forçoso é de concluir que sentença de que ora se recorre está ferida de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito que inquina a sua validade;
8. Porque os critérios constantes do artigo 120.º do CPTA são de verificação cumulativa, basta, pois, que não se verifique um dos pressupostos descritos para que a providência não possa ser decretada. Por isso, faltando um dos requisitos, não se mostram verificados todos os pressupostos para o decretamento da providência;
9. Não existe, portanto, no caso concreto, o “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal” e que venha a tornar inútil ou vã a eventual concessão, no âmbito da ação administrativa, da tutela judicial efetiva nessa sede requerida;
10. A Administração observou todas as vinculações procedimentais a que estava obrigada a respeitar;
11. Impendia sobre o Requerente da providência, ora Recorrido, o ónus de especificar e concretizar o fundado receio, ou seja, evidenciar o preenchimento do requisito do “periculum in mora”, bem como os demais requisitos exigidos por lei, ou seja, o da constituição de uma situação de facto consumado e / ou a produção de prejuízos de difícil reparação. O que não aconteceu;
12. Mesmo que assim não fosse, como efetivamente é, o prejuízo que poderia advir pela improcedência da providência cautelar seria sempre possível o regresso do Recorrido ao estabelecimento prisional de origem (Caxias).
13. No que à ponderação de interesses concerne também a decisão do Tribunal a quo merece censura, ao olvidar-se de todo o alegado na Oposição e na Resolução Fundamentada.
14. Os factos apresentados na Oposição e na Resolução Fundamentada impunham a prevalência do interesse público, sendo patentes os danos para o interesse público, pelo que só um aparente desconhecimento do meio prisional, das suas complexidades e especificidades é que justifica uma decisão contrária.
15. Por não estar preenchido o requisito exigido pelo n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, ou seja, o “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção e prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal” (o periculum in mora) e a probabilidade de que “a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente” (o fumus boni iuris ou a aparência de bom direito), o alegado interesse do Recorrido não carece da tutela cautelar pretendida, logo não deve ser concedida a providência requerida nestes autos, como erroneamente decidiu o Tribunal a quo.
16. A sentença proferida pelo Tribunal a quo está ferida de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito, que incumbe retificar.
Termos em que deve o presente recurso proceder e a sentença do Tribunal a quo ser revogada, com as legais consequências. Assim se fazendo a acostumada Justiça!”

O aqui Recorrido/L... veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 31 de julho de 2021, no qual concluiu:
“A) O aresto recorrido decidiu com base na factualidade provada, dela não se desviando e fazendo-lhe adequada aplicação do Direito;
B) A sentença sob recurso, dando por verificados os requisitos legais do artigo 120º do CPTA para adoção da providência requerida, fundamentou o seu entendimento cabalmente – sem necessidade de delongadas considerações do signatário - no que diz respeito ao fumus boni iuris, nomeadamente a págs. 18 e 19, e quando ao requisito periculum in mora, consubstanciado no risco de constituição de facto consumado, com enfoque para o vazado nas suas págs. 15 e 22;
C) O ato suspendendo viola a Lei por determinar que a antiguidade na unidade orgânica se conta a partir da data em que o despacho que determinou a colocação do Apelado naquela, em data em que nela ainda não se encontrava a trabalhar;
D) Esse entendimento, anacrónico, permitiria que o um trabalhador visse a sua antiguidade contabilizada na unidade orgânica de destino - eventualmente – semanas ou meses antes de nele ingressar, em momento em que ainda se encontra a trabalhar na unidade orgânica do destino.
E) De resto, o Apelado demonstrou que no concurso de motoristas naquela mesma unidade orgânica foi adotado o critério da data do início efetivo de funções para se determinar o momento em que se inicia a contagem da antiguidade, pelo que a adoção do critério “data do despacho de afetação”, não só é ilegal como corresponde a um capricho -a uma arbitrariedade – da Apelante;
F) A fundamentação detalhada do aresto recorrido contrasta, no sentido inverso, a Apelante limitou-se a tecer considerações genéricas, opinativas, desprovidas de base factual, não cumpriu minimamente o ónus de demonstrar que prejuízo poderia advir para o interesse público por força da adoção da providência requerida.
Nestes termos, deve o recurso interposto improceder, confirmando-se a da sentença recorrida e a adoção da providência nela decretada, assim se fazendo Justiça!”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 3 de agosto de 2021
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 6 de agosto de 2021, nada veio dizer, Requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, que o “Tribunal a quo andou mal ao decidir pela verificação do fumus bonis iuris, porquanto, em sede de ação principal, não é correto concluir, pela existência de vício pela existência de vício do erro sobre os pressupostos de facto na Decisão da Entidade Pública demandada, no que tange ao critério da antiguidade adotado.”
III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade provada:
1. O Requerente é trabalhador da Administração Pública, com a categoria profissional de Guarda do corpo da Guarda Prisional, em regime de nomeação – doc. nº 1, fls. 19.
2. Iniciou serviço no EP de Caxias em 24/04/2018 – doc. nº 7, fls. 36
3. Por Despacho de 3 de março 2021 do Subdiretor Geral da DGRSP foi o Requerente notificado da intenção da Administração de proceder à sua transferência do EP de Caxias para o EP de Sintra, pelos fundamentos constantes da Informação nº DSS/57/2021 de 26/02/2021, no que ora interessa.
(Dá-se por reproduzido o Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Artº 663º nº 6 CPC)
(…)
- Doc. junto em 14/06/2021, fls. 95 e ss.
4. O requerente pronunciou-se em sede de Audiência prévia, alegando a existência de discrepâncias na Informação supra identificada e ainda que, nos termos do disposto no Regulamento de Transferências, uma vez que a transferência ocorria por motivo de supressão de postos de trabalho, deveriam as mesmas obedecer ao critério da menor antiguidade, conforme o disposto no artº 10º nº 5 do Regulamento, sendo que, a antiguidade conta-se a partir do exercício efetivo na unidade orgânica, e não a partir da data do despacho de reafectação, como pretende o requerido – doc. . junto em 14/06/2021, fls. 100 e ss.
5. Por Despacho de 8/04/2021 exarado na Informação nº DSS/90/2021 de 7/04/2021, foi mantida a Informação anterior, seguindo o mesmo critério de antiguidade, tendo sido determinada a transferência do requerente para o EP de Sintra, a partir de 15/04/2021 – Doc. nº 5 junto com a p.i., fls. 23 e ss. que se dá como reproduzido.
6. Em 21/04/2021 deu entrada em Juízo a presente providência cautelar – resulta dos autos.
7. Em 10/05/2021, o requerido apresentou Resolução Fundamentada, nos termos seguintes:
“(…)
1. De acordo com o disposto no n°1 do artigo 128° do CPTA, a autoridade administrativa uma vez recebido o duplicado do requerimento não pode iniciar ou prosseguir a execução dos atos cuja suspensão é requerida, salvo se, mediante resolução fundamentada, reconhecer, no prazo de 15 dias, que o diferimento da prossecução do ato suspendo seria gravemente prejudicial para o interessem público.
2. Sem prejuízo das considerações que o Ministério da Justiça/Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais irá deduzir em sede de oposição em torno dos efeitos cautelares pretendidos, entende o mesmo, desde já, que é absolutamente crucial para o Estabelecimento Prisional de Sintra a não suspensão do ato do Senhor Subdiretor Geral da DGRSP, Dr. P..., de 08.04.2021, exarado na informação DSS/90/2021 de transferência do Requerente do Estabelecimento Prisional de Caxias para o estabelecimento Prisional de Sintra.
3. Assim, o Ministério da Justiça citado como entidade requerida na providência cautelar de suspensão de eficácia de ato administrativo - interposta L...a correr os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra UO 3, sob o processo n.º 325/21.1BESNT, vem pela presente, e nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 128° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, manifestar a intenção de continuar a executar o ato impugnado, pelos motivos que infra se expõem:
i) A peticionada suspensão de eficácia do ato praticado pelo do Senhor Subdiretor Geral da DGRSP, Dr. P..., de 08.04.2021, teria repercussões muito negativas a nível da imagem pública da Administração Prisional e do regular funcionamento interno dos seus serviços
ii) A suspensão do, sob pena de criar uma incerteza grave na organização e gestão das escalas dos tempos de trabalho dos elementos do CGP e das suas famílias e igualmente na Direção do Estabelecimento Prisional, designadamente na organização e funcionamento dos serviços a seu cargo.
iii)
iv) Nestes termos, a suspensão da eficácia do ato poderia produzir efeitos muito diversos ao nível do interesse público relevante, designadamente a ordem e segurança do Estabelecimento Prisional de Sintra.
v) Com efeito, o exercício de funções do Corpo da Guarda Prisional comporta especificidades que o diferencia do regime jurídico dos restantes trabalhadores da Administração Pública. Com efeito, as especificidades que decorrem do Estatuto Profissional do Corpo da Guarda Prisional (ECGP) e da caraterização do respetivo funcionamento dos estabelecimentos prisionais assim o determinam. E é por isso que o serviço do CGP é de carácter permanente e obrigatório e que os estabelecimentos prisionais funcionam em laboração contínua, tal como previsto no artigo 61°, n°1 e 2 do ECGP, que não é compatível com incerteza que a suspensão deste procedimento iria objetivamente causar.
vi) A Direção de Serviços de Segurança, adiante designada por DSS, é a unidade orgânica responsável na DGRSP por promover a afetação e a transferência do pessoal do corpo da guarda prisional, vide artigo 6o, n°2 alínea q) da Portaria n° 300/2019, de 11 de setembro.
vii) Com a supressão de postos de trabalho para os elementos do CGP ocorrida no Estabelecimento Prisional de Caxias por fecho do reduto Sul, foi possível colocar elementos do CGP nas Unidades do distrito de Lisboa, onde a unidade orgânica responsável pela movimentação de recursos humanos do CGP (DSS) identificou necessidades prementes, ou seja, estabelecimentos prisionais do Linhó, Sintra, Carregueira, Lisboa, Tires (femininas) e Monsanto.
viii) A identificação das unidades orgânicas teve em conta os seguintes pressupostos:
a) O Estabelecimento Prisional Linhó à data do procedimento tinha alojados na secção de segurança um conjunto de cidadãos estrangeiros provenientes do SEF. O Estabelecimento Prisional de Sintra tinha registado as seguintes aposentações de elementos do CGP: 2019, 4 elementos, 2020, 1 elemento, 2021 1 elemento, 2 elementos a cumprir medida privativa de liberdade e um elemento falecido. Convém ainda referir que funciona naquele estabelecimento a unidade de quarentena Covid-19 para os estabelecimentos prisionais da zona de Lisboa
b) O Estabelecimento Prisional da Carregueira registou as seguintes aposentações 2020, 2 elementos, 2021, 1 um elemento e tem alojados cerca de 760 reclusos.
c) O Estabelecimento Prisional Lisboa registou as seguintes aposentações 2020, 2 elementos, tem alojados cerca de 850 reclusos.
d) O Estabelecimento Prisional Tires não tem registo de transferência de nenhum pedido de elementos femininos para esta Unidade e registou as seguintes aposentações 2019, 2 elementos, 2020, 4 elementos 2021,2 elementos.
e) Por fim, o Estabelecimento Prisional Monsanto recebeu os reclusos da secção de segurança do Estabelecimento Prisional Paços de Ferreira, passando de uma lotação de cerca de 60 reclusos para cerca de 90 reclusos.
ix) Ou seja, só por efeito desta reafectação dos elementos do CGP, oriundos do Estabelecimento Prisional Caxias (por supressão dos postos de trabalho resultante do encerramento do reduto Sul) é que foi possível colmatar necessidades urgentes de elementos do CGP nas unidades orgânicas da Grande Lisboa e destas para as seguintes Unidades Orgânicas do Continente: Estabelecimentos Prisionais do Porto, Paços de Ferreira, Leria Jovens, Coimbra, Covilhã e Izeda.
x) A suspensão de eficácia demandada lesa gravemente o interesse público, pois a suspensão desta alteração no processo de reafectação de elementos do CGP causaria anormal perturbação no funcionamento da instituição, criando alarme no pessoal do CGP e nas suas famílias, por não permitir com segurança gerir a sua vida familiar e profissional.
xi) Atente-se que a eventual suspensão de transferência do Requerente para o Estabelecimento Prisional de Caxias esta unidade orgânica fica com um elemento do CGP para o qual não se encontra identificado posto de trabalho e o seu estabelecimento prisional de destino (Sintra) de um défice de recursos humanos já considerável de 7 para 8 elementos.
xii) . As repercussões de tal suspensão seriam, por isso, não apenas uma grave causa de perturbação no funcionamento da instituição, pondo em causa a imagem e prestígio da administração penitenciária, mas também, um facto de desestabilização do próprio Corpo da Guarda Prisional em exercício de funções naquele estabelecimento prisional.
xiii) Com efeito, a distribuição de elementos do CGP, terá de ser criteriosa e atender a necessidade de todo o sistema com um todo, pois é crónica a situação deficitária de recursos humanos de elementos do CGP.
xiv) Incumbe ainda referir que esta reafectação de elementos do CGP do Estabelecimento Prisional de Caxias para os Estabelecimentos Prisionais com carência prementes destes elementos permite aos elementos do CGP daquelas unidades orgânicas agora reforçadas assegurarem o cumprimento das competências que lhe estão legalmente atribuídas de forma mais eficaz, ao garantir que permanecem em exercício efetivo de funções menos horas nos estabelecimentos prisionais, em contrapartida do aumento dos períodos de descanso, o que origina uma melhor e maior articulação entre as horas de trabalho e descanso deste grupo profissional, com naturais benefícios na que concerne à ordem e manutenção da segurança nos estabelecimentos prisionais, pois que menores períodos de trabalho e maiores períodos de descanso permitem uma maior concentração nas tarefas a desempenhar.
xv) Acresce que a implementação deste modelo de reafectação em termos duma correta política gestionária, permite uma maior eficiência e uma correta racionalização dos elementos do CGP, com a diminuição sempre apontada pelo Requerente do deficit crónico daqueles trabalhadores no interior dos estabelecimentos prisionais, bem como garante um reforço robusto do número de elementos do CGP no período diurno, com ganhos substanciais na manutenção da ordem e segurança daquelas unidades orgânicas, período em que mais se faze sentir a necessidade de elementos do CGP nos estabelecimentos prisionais.
xvi) Nesta medida a suspensão do exercício de funções pelo Requerente no Estabelecimento Prisional de Sintra, por tempo indeterminado, pela incerteza que acarreta, será uma forte fonte de conflitualidade social interna do corpo da guarda prisional, com consequências na imagem e coesão de toda a estrutura penitenciária e um enorme fator desestabilizador na organização e vida interna do referido estabelecimento prisional podendo perigar o regular funcionamento dos serviços, ao comprometer o escalonamento original de elementos do CGP.
xvii) O Requerente deve saber que a sua ausência pode perturbar o funcionamento do serviço, mais que não seja obrigando à necessidade de reorganizar a escala com os elementos que ficam disponíveis, que podem não ser suficientes para preencher todos os postos de trabalho, o que levará ao desguarnecimento de outras tarefas ou funções.
xviii) Tem de se acautelar o direito da população reclusa às necessidades básicas, sob pena do cumprimento da pena da execução privativa da liberdade ou medida de segurança tornar- se numa pena acessória, sem a necessária sentença condenatória e colocar assim em causa o Estado de Direito, e isso implica a presença de todo o contingente do CGP em exercício de funções no horário determinado.
Assim, de acordo com os fundamentos acima enunciados e nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 128° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, reconheço o grave prejuízo para o interesse público que o diferimento da execução do ato impugnado acarretaria “
- Resolução Fundamentada nos autos, fls.46 a 48.

IV – Do Direito
Foi requerido no presente Processo a suspensão de eficácia do despacho do Subdiretor Geral da Reinserção e Serviços Prisionais, que determinou, nomeadamente, a transferência do Requerente, a partir de abril de 2021, para o EP de Sintra.

Correspondentemente, decidiu o Tribunal a quo julgar “(…) procedente a presente ação e, em consequência, determina-se a suspensão de eficácia do ato de transferência do requerente para o EP de Sintra, devendo o mesmo manter-se no EP de Caxias.”

No que ao “direito” diz respeito, e no que aqui releva, discorreu-se na Sentença Recorrida:
“(…)
Do art 120º, nº 1 do CPTA.
De regresso ao nosso caso concreto, desde logo se dirá que o pedido cautelar – de suspensão de eficácia de ato, que determinou a transferência do Requerente para o EP de Sintra – pretende impedir que o requerente seja transferido do EP de Caxias, até ao trânsito em julgado da decisão a proferir na ação principal.
(…)
O que configura, sem dúvida, a adoção de providência conservatória, pois o que o requerente pretende, com a presente providência, é manter ou conservar o seu status quo, ou seja, continuar a exercer as suas funções de guarda prisional no EP de Caxias.
Nos termos do artº 112°, n° 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, pode ser pedida a adoção da providência ou providências cautelares, antecipatórias e/ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal.
Considerando-se a requerida, enquanto medida cautelar de natureza conservatória, como adequada a tutelar a situação apurada nos autos.
Analisemos, pois, cada um dos requisitos que a tutela cautelar exige estejam verificados para ser adotada a medida adequada.
Nestes autos cautelares, o requerente alicerça o requisito do fumus boni iuris em:
- ter mais antiguidade do que alguns dos colegas que ficaram no EP de Caxias;
- violação do disposto no artº 10º nº 5 do regulamento de transferências;
Por sua vez, a entidade requerida alega, sobretudo:
- lesão do interesse público, por a alteração no processo de reafectação de elementos do CGP causar anormal perturbação no funcionamento da instituição, com alarme no pessoal do CGP e famílias (concl x) da Resolução Fundamentada);
- não identificação de um posto de trabalho para o requerente (concl xi) da Resolução Fundamentada)
- repercussões negativas ao nível do funcionamento da instituição e da imagem pública da Administração Penitenciária e desestabilização do CGP - (concl xii) da Resolução Fundamentada);
- conflitualidade social interna no CGP (concl xvi) da Resolução Fundamentada);
Vejamos:
Dos factos provados ressalta à evidência o vício do erro sobre os pressupostos de facto na Decisão da Entidade Pública demandada, uma vez que o critério da antiguidade teve em atenção o Despacho de nomeação e não a efetividade de serviço no EP de Caxias (cf. nº 3, 4 e 5 do probatório)
Atente-se que a Resolução Fundamentada nada nos diz quanto a esta questão.
Limita-se a invocar o interesse público, a imagem da administração penitenciária e o funcionamento dos serviços, de forma geral e abstrata, sem concretizar por que razão foi o Requerente transferido e não outros – qual era a antiguidade dos outros, atendendo ao início de funções no EP Caxias em relação à antiguidade do Requerente.
É que o Tribunal terá de apreciar a Resolução Fundamentada, tomando em linha de conta, sobretudo, os seus fundamentos.
(…)
É que, quanto à matéria da resolução fundamentada importa referir que a mesma terá de ser apreciada tendo em atenção os factos que consubstanciem a lesão do interesse público – neste caso concreto, por que razão foi o Requerente transferido e não outros – sendo que, o critério de apreciação da antiguidade do requerente revela-se anulável, por se basear a sua contagem, não desde a data da efetividade de serviço, mas do despacho de nomeação – ou seja, mostra-se viciado por erro nos pressupostos de facto.
Com efeito, analisando a Resolução Fundamentada apresentada pelo Demandado Ministério da Justiça pergunta-se: quais os factos alegados que consubstanciem o grave prejuízo para o interesse público?!
Nenhuns, analisada criticamente a Resolução apresentada.
Pelo contrário, a mesma apresenta-se opinativa, conclusiva e sem qualquer suporte fáctico que a sustente.
Por que razão foi o requerente transferido e não outros, quando o mesmo goza a seu favor do Regulamento de Transferências (Despacho nº 2244/2018, publicado no DR, II, nº 46, de 6/03/2018), o qual dispõe:
“Artigo 10.º Modalidades de transferência
1 - Além da transferência decorrente do movimento de pessoal, o pessoal do CGP pode ser transferido, por despacho do Diretor-Geral, nas seguintes situações:
(…)
g) Por supressão de postos de trabalho.
(…)
5 - As transferências a que se refere a alínea g) do n.º 1, são efetuadas por ordem de menor antiguidade na unidade orgânica, mediante a indicação de preferência quanto aos postos de trabalho a preencher, em unidade orgânica desconcentrada, no mesmo distrito ou em distrito contíguo, posicionando-se automaticamente na folha de matrizes da primitiva unidade orgânica, em primeiro lugar.
6 - Nas transferências a que se referem as alíneas e), f) e g) do n.º 1 aplicam-se os critérios de desempate constantes do n.º 4 do artigo 6.º”
In casu, a Entidade Demandada teria de alegar e provar na Resolução Fundamentada que os elementos que ficaram no EP de Caxias eram possuidores de maior antiguidade do que o requerente, em vez de alegações genéricas e conclusivas.
Ora, parafraseando o Ac. do TCA Sul supra enunciado, “Na explicitação motivadora da resolução fundamentada não devem ser aceites como válidas referências de tal modo genéricas e conclusivas que não habilitem os interessados e, em última análise, o próprio Tribunal, a entenderem e a aperceberem-se das razões que terão motivado a sua emissão”.
A sindicância, pelo Tribunal, dos fundamentos constantes da Resolução Fundamentada, deve ser particularmente exigente, conforme tem vindo a ser defendido pela melhor jurisprudência, citando-se a este propósito, o seguinte Ac. do TCA NORTE
Acórdãos TCAN Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte Processo: 948/17.3BEBRG-A
(…)
I – A proibição de execução de ato por força da instauração de suspensão cautelar da respetiva eficácia cautelar visa salvaguardar o efeito útil da decisão do processo principal, só podendo ser levantada em casos excecionais, de urgência grave para o interesse público com a imediata suspensão da execução do ato – artigo 128° do CPTA.
II – Em eventual incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida o tribunal deve controlar, de forma particularmente exigente, os fundamentos em que se sustenta a Resolução Fundamentada, aferindo se tal Resolução se baseou em razões formal e materialmente procedentes para demonstrar que o deferimento da execução lesaria gravemente o interesse público, ou improcedentes por as não conter ou por tais serem inidóneas ou inviáveis ou insuficientes para justificar o prosseguimento urgente da execução do ato suspendendo. III – (…)”
In casu, não decorre da Resolução Fundamentada quaisquer fundamentos que permitam ao Tribunal apreender por que razão o diferimento da transferência do Requerente para o EP de Sintra causaria grave prejuízo para o interesse público, qual prejuízo, e qual a sua gravidade, nada disto é percetível na Resolução apresentada ao Tribunal – porquê o Requerente e não outro.
As referências genéricas ao “perturbar o funcionamento do serviço”, à “ imagem e coesão de toda a estrutura penitenciária”, em geral, são matérias completamente alheias ao enquadramento legal da Resolução Fundamentada, nos termos em que o legislador a concebeu, no artº 128º CPTA – porque tais conclusões não se apresentam suportadas por FACTOS verdadeiramente danosos – sendo que, a contagem da antiguidade do requerente há-de ser feita, comparativamente com outros, desde a data em que o requerente começou a prestar serviço no EP de Caxias, sendo transferidos outros com menor antiguidade, conforme o citado regulamento de transferências
A Resolução em presença, nos seus argumentos, reconduz-se simplesmente a juízos genéricos e conclusivos, e carecem, na linha do acabado de expor, de razoabilidade e adequação. Não basta dizer que é gravemente prejudicial para o interesse público, para que o seja.
Impõe o legislador que, para que funcione a exceção da execução da decisão Administrativa sem esperar pela decisão final jurisdicional, que a Administração logre demonstrar, nessa Resolução “fundamentada”, os motivos concretos pelos quais o diferimento da execução prejudica “gravemente” o interesse público.
É que o legislador não se bastou com a existência do mero prejuízo para o interesse público, antes exigiu, para que não se espere pela decisão jurisdicional dos Tribunais, que o prejuízo para o interesse público seja grave – e essa gravidade não resulta do teor da Resolução Fundamentada dos autos.
Razão por que improcede a Resolução Fundamentada, procedendo, em consequência, o “ fumus boni iuris” a favor do requerente.
O mesmo se diga do “periculum in mora”.
A transferência do requerente para o EP de Sintra pode vir a constituir uma situação de facto consumado para o interesse do requerente e que o mesmo visa assegurar no processo principal.
E a tal não se opõem os interesses em presença, numa ponderação, em sede de juízo de prognose, tal como prescreve o artº 120º CPTA, nº 2.
É que o requerido não logrou demonstrar qual o prejuízo para o interesse público na suspensão de eficácia da transferência do Requerente – por que razão foi o mesmo transferido e não outro – quais os cálculos da sua antiguidade, em comparação com outros, desde a data da tomada de Posse do lugar no EP de Caxias, ou desde o dia da sua efetividade de funções.”

Diga-se desde, já que se não acompanha o entendimento adotado em 1ª Instância.

Há desde logo um equivoco na decisão recorrida, pois que o objeto da Providência Cautelar é o ato cuja suspensão é requerida, sendo que a Resolução Fundamentada é um ato ulterior que não foi sequer atacado, pelo que mal se compreende a razão pela qual o Tribunal de 1ª Instância centra o essencial da sua análise, exatamente no teor da referida RF.

Efetivamente, é incontornável que o Requerente da providência cautelar não lançou mão da declaração de ineficácia dos atos de execução indevida, designadamente para inviabilizar uma resolução que não considerasse devidamente fundamentada ou, ainda, que fizesse uma errada apreciação dos pressupostos de facto ou de direito.

Na realidade, a Resolução Fundamentada apresentada pela entidade requerida ao abrigo do artigo 128º do CPA, tem uma finalidade própria que não se confunde com a oposição à providencia cautelar e que não pode condicionar a decisão cautelar, exatamente por terem natureza, objeto e objetivos diversos.
Em sede cautelar, a pretensão do Requerente apenas visa assegurar a utilidade da sentença que venha a ser proferida no processo principal, mediante a adoção, sendo caso disso, de medidas urgentes baseadas necessariamente numa apreciação sumária do caso.

Os critérios gerais de decisão das providências cautelares encontram-se estabelecidos no artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), que prevê requisitos diferenciados consoante estejamos na presença de providências em que seja provável a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, em que esteja em causa a adoção de uma providência conservatória ou ainda a adoção de uma providência antecipatória.

Como refere Mário Aroso de Almeida, in “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 2ª Edição, Revista e Atualizada, Almedina, Outubro de 2003, pág. 292, referindo-se às providências cautelares: «Estão aqui em causa providências destinadas a manter o status quo, não permitindo que ele se altere, como paradigmaticamente sucede com a tradicional suspensão de eficácia de atos administrativos, cuja concessão não dependia, anteriormente, da formulação de qualquer juízo sobre a aparência de bom direito» e como «… situações em que o interessado pretenda manter ou conservar um direito em perigo, evitando que ele seja prejudicado por medidas que a Administração venha a adotar. (…) Isto pode acontecer quando o interessado pretenda que a Administração se abstenha de realizar operações materiais que não surjam em direta execução de atos administrativos ou quando a providência cautelar se destine a complementar a suspensão da eficácia de um ato administrativo…», págs. 280-281.
Tomando em consideração a distinção entre providências cautelares conservatórias e antecipatórias, não oferece dúvida que na situação em apreço estamos perante uma providência cautelar de natureza conservatória.

Decorre do n.º 1 do art.º 120.º do CPTA, que o tribunal decretará a providência cautelar requerida, nomeadamente, quando, mediante um juízo perfunctório possa concluir que é provável a procedência da Ação principal.

Na situação em análise, e no que concerne ao nº 1 do Artº 120º do CPTA, o tribunal a quo concluiu que “(…) Dos factos provados ressalta à evidência o vício do erro sobre os pressupostos de facto na Decisão da Entidade Pública demandada, uma vez que o critério da antiguidade teve em atenção o Despacho de nomeação e não a efetividade de serviço no EP de Caxias”, entendimento que se mostra precipitado uma vez que a referida questão não é evidente e provável, mantendo-se controvertida.

Em qualquer caso, e desde logo, o afirmado é conclusivo e longe de ser pacifico e provável, na medida em que, em termos perfunctórios e sumários, não se evidencia minimamente uma situação de manifesta ilegalidade, nos termos exigidos pelo n.º 1 do artigo 120.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”

Mantendo-se controvertido o modo de contagem do tempo de serviço dos Guardas prisionais num determinado Estabelecimento Prisional, não é possível optar conclusiva e definitivamente por um entendimento que aponte para a ilegalidade do modo como a Entidade aqui Recorrente procedeu à referida contagem, com implicações na reafectação de Guardas Prisionais ao Estabelecimento Prisional de Sintra.

Assim, está-se longe de poder afirmar que o ato cuja suspensão foi requerida, à luz do estabelecido no nº 1 do Artº 120º do CPTA, denote probabilidade de ser declarado ilegal, e antes pelo contrário.
Com efeito, resulta singelamente da decisão recorrida que “Dos factos provados ressalta à evidência o vício do erro sobre os pressupostos de facto na Decisão da Entidade Pública demandada, uma vez que o critério da antiguidade teve em atenção o Despacho de nomeação e não a efetividade de serviço no EP de Caxias”

Mais se afirma: “Atente-se que a Resolução Fundamentada nada nos diz quanto a esta questão. Limita-se a invocar o interesse público, a imagem da administração penitenciária e o funcionamento dos serviços, de forma geral e abstrata, sem concretizar por que razão foi o Requerente transferido e não outros – qual era a antiguidade dos outros, atendendo ao início de funções no EP Caxias em relação à antiguidade do Requerente. É que o Tribunal terá de apreciar a Resolução Fundamentada, tomando em linha de conta, sobretudo, os seus fundamentos. In casu, a Entidade Demandada teria de alegar e provar na Resolução Fundamentada que os elementos que ficaram no EP de Caxias eram possuidores de maior antiguidade do que o requerente, em vez de alegações genéricas e conclusivas”

O tribunal a quo insiste em confundir o ato cuja suspensão vem requerida e o teor da Resolução fundamentada ao afirmar que “É que o legislador não se bastou com a existência do mero prejuízo para o interesse público, antes exigiu, para que não se espere pela decisão jurisdicional dos Tribunais, que o prejuízo para o interesse público seja grave – e essa gravidade não resulta do teor da Resolução Fundamentada dos autos. Razão por que improcede a Resolução Fundamentada, procedendo, em consequência, o “fumus boni iuris” a favor do requerente

Reafirma-se que o Requerente, aqui Recorrido, não utilizou sequer a prerrogativa resultante do nº 4 do Artº 128º do CPTA que lhe permitiria, sendo caso disso, “(…) requerer ao tribunal onde penda o processo de suspensão da eficácia, até ao trânsito em julgado da sua decisão, a declaração de ineficácia dos atos de execução indevida.”

Há que centrar a análise da Providência Cautelar nos normativos aplicáveis à mesma.

Com efeito, resulta do Artº 120º do CPTA que o decretamento da providência cautelar depende da verificação cumulativa de dois requisitos positivos, previstos no n.º 1, e de um requisito negativo, previsto no n.º 2, a saber:
(i) A existência de um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente pretende acautelar no processo principal – periculum in mora;
(ii) Que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente – fumus boni iuris;
(iii) Que, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão não se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.

Como se afirmou já, quanto ao fumus bonus iuris, a verificação de tal pressuposto pressuporia que a pretensão formulada ou a formular no processo principal viesse provavelmente a ser julgada procedente, o que está longe de perfunctoriamente ser possível afirmar e confirmar.

Efetivamente, no caso em análise, a antiguidade na unidade orgânica dos Guardas Prisionais foi determinada reportadamente à data em que foi praticado o ato que determinou a afetação dos mesmos ao Estabelecimento Prisional de Sintra, o que perfunctoriamente se mostra adequado, pois que, assim não sendo, se por condicionalismos diversos, os guardas se viessem a apresentar em dias distintos no estabelecimento de destino, passariam a ter antiguidade diferente, o que seria anacrónico, atenta a afetação simultânea e por via do mesmo ato.

Assim, entende-se que o ato cuja suspensão foi requerida, atento o quadro legal aplicável, se mostra perfunctoriamente adequado, não se vislumbrando qualquer irregularidade,

Já no que respeita ao preenchimento do pressuposto de “periculum in mora” é o tribunal a quo ainda mais parco argumentativamente, ao afirmar apenas que “O mesmo se diga do “periculum in mora”. A transferência do requerente para o EP de Sintra pode vir a constituir uma situação de facto consumado para o interesse do requerente e que o mesmo visa assegurar no processo principal”, não se alcançando em que medida se verificará o invocado “facto consumado”, uma vez que a situação, sendo caso disso, sempre poderia ser revertida, tanto mais que os Estabelecimentos Prisionais aqui em causa se situam ambos na zona norte da Área Metropolitana de Lisboa.

A apreciação deste requisito pressupõe um juízo de prognose sobre a existência de fundado receio de que uma futura e hipotética decisão judicial que dê provimento à pretensão da Requerente venha a perder utilidade, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela ou por, entretanto, se terem produzido prejuízos de difícil reparação, obstando a que a Requerente obtenha uma efetiva reintegração no plano dos factos.

Acresce que o ónus de alegação e da prova dos factos constitutivos do referido requisito legal recai sobre o Requerente, nos termos gerais das regras probatórias, vertidas no artigo 342.º n.º 1 do Código Civil, não tendo o mesmo logrado fazer prova suficiente e adequada relativa à suposta verificação de situação de facto consumado ou de prejuízo de difícil reparação (Artº 120º nº 1 CPTA).

O Tribunal a quo, ao dar conclusivamente como verificado o periculum in mora, cingiu-se a afirmar que “A transferência do requerente para o EP de Sintra pode vir a constituir uma situação de facto consumado para o interesse do requerente e que o mesmo visa assegurar no processo principal”.

O requisito do periculum in mora encontrar-se-á preenchido sempre que exista o fundado receio de que, quando o processo principal termine, a decisão que vier a ser proferida já não venha a tempo de dar resposta às situações jurídicas carecidas de tutela, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão inútil, seja porque tal evolução gerou ou conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis, o que não é aqui manifestamente o caso, uma vez que, como se afirmou já, sendo caso disso, sempre a situação seria reversível.

Aqui chegados, e entendendo-se não se verificar o preenchimento de qualquer dos pressupostos analisados, fica, por natureza, prejudicada a análise da ponderação de interesses.

IV - Decisão
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao Recurso, revogando-se a decisão recorrida, mais se julgando improcedente a Providência Cautelar.

Custas pelo Recorrido, sem prejuízo da isenção de que goza.

Lisboa, 20 de janeiro de 2022
Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Lina Costa