| Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 366/10.4BELRS | 
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| Secção: | CT | 
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| Data do Acordão: | 04/30/2025 | 
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| Relator: | FILIPE CARVALHO DAS NEVES | 
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| Descritores: | FALTA DE CITAÇÃO VALIDADE DA CITAÇÃO PRESCRIÇÃO | 
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| Sumário: | I - A nulidade por excesso de pronúncia ocorre quando o tribunal se pronuncia sobre questões que não foram suscitadas pelas partes e que não sejam de conhecimento oficioso. II - Embora não constitua fundamento de oposição à execução fiscal (cf. art.º 204.º, n.º1 do CPPT), nada obsta a que se possa conhecer da falta da citação nesta sede, a título incidental, se tal ponderação for necessária para apreciar qualquer questão que deva ser conhecida pelo tribunal, como sucede no caso da invocação da prescrição (cf. art.º 204.º, n.º1, alínea d) do CPPT), em que o art.º 49.º, n.º1 da LGT atribui à citação efeito interruptivo da sua contagem. III - Para que ocorra a falta de citação basta a mera possibilidade de prejuízo para a defesa da executada, e não a demonstração da existência de efetivo prejuízo, pelo que a incompletude da citação deve ser valorada e avaliada na perspetiva da salvaguarda do direito de defesa do visado. IV - A falta de indicação na citação do nome da executada pode prejudicar o seu direito a um due process of law, na dimensão do exercício do seu direito de defesa, sendo que essa possibilidade é suficiente para se extrair a conclusão que não se pode considerar citada para a execução fiscal. | 
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| Votação: | Unanimidade | 
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| Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais | 
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| Aditamento: |  | 
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| Decisão Texto Integral: | I – RELATÓRIO A Fazenda Pública veio apresentar recurso da sentença proferida a 02/04/2019 pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a oposição judicial deduzida por M…, M… e M…, na qualidade de herdeiras de A…, melhor identificadas nos autos, no processo de execução fiscal («PEF») n.º 3255200601016105, instaurado para cobrança de dívida de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares («IRS»), do ano de 2000, no valor de 89.351,02 Euros. A Recorrente apresentou alegações, rematadas com as seguintes conclusões: «1. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a oposição judicial, intentada por M… (e outros), já devidamente identificado nos autos e que, em consequência, conheceu da prescrição da obrigação tributária, determinando quanto às mesmas, a extinção da execução fiscal (PEF 3255200601016105). Entende a Fazenda Pública que mal esteve o Tribunal a quo na douta sentença proferida porquanto, pronunciou-se quanto a uma questão que não devia conhecer, o que acarreta a nulidade da sentença, promovendo ainda uma errónea aplicação do direito aos factos dados como provados, ocorrências estas que impõem, salvo melhor opinião, a anulação da sentença recorrida. 2. A Fazenda Pública não se conforma com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa porquanto a mesma vem considerar prescrita a dívida exequenda, considerando que “a “citação” das Oponentes ocorreu apenas no dia 27 de Julho de 2009, ou seja, já no decurso do oitavo ano posterior à ocorrência do facto tributário!”. Nesta senda, o Tribunal a quo acrescenta que “não se reveste do formalismo essencial de “citação”, o conhecimento da existência do processo de execução fiscal por outra via que não a de carta registada com aviso de recepção dirigida ao próprio”, o que faz numa clara alusão à citação ocorrida em 9 de Março de 2006 na pessoa da Oponente M… e que é referenciada no ponto 3 da matéria de facto dada como provada na sentença. 3. A validade da citação para o PEF não pode ser conhecida através da Oposição Judicial, mas somente através de requerimento dirigido ao próprio Órgão de Execução Fiscal em que se argui a validade deste ato processual, nos termos do art.º 165º do CPPT com possibilidade de recurso do despacho que indefira a referida arguição para o tribunal tributário competente, nos termos do disposto no art.º 276º do CPPT. 4. A este propósito convém ter presente o disposto no n.º 1 do art.º 125º do CPPT, ora aplicável por remissão do art.º 211º do mesmo diploma legal, o qual comina com a nulidade da sentença a pronúncia sobre questões que o Juiz não deva conhecer. Nestes termos, entende a Fazenda Pública que ao Tribunal a quo estava vedado conhecer da validade daquela citação, ainda que indiretamente, como forma de justificar a prescrição da dívida exequenda, esta sim fundamento para oposição judicial. 5. Nesta parte, com o devido e muito respeito, o Tribunal a quo, ao decidir como efetivamente o fez, menosprezou o entendimento consolidado e reiterado da jurisprudência emanada pelos Tribunais Superiores, conhecendo de um vício que lhe estava vedado conhecer em violação do disposto nos art.ºs 165º e 276º do CPPT, o que acarretou a nulidade da sentença nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 125º do CPPT, ora aplicável por remissão do art.º 211º do mesmo diploma legal. 6. Entende ainda a Fazenda Pública que mal esteve o douto Tribunal a quo ao julgar verificada a prescrição da dívida exequenda por considerar que a primeira citação ocorrida no âmbito do PEF subjacente aos autos se deu em no dia 27 de Julho de 2009, ou seja, já no decurso do oitavo ano posterior à ocorrência do facto tributário. 7. Estando em causa dívida de IRS, decorre do disposto no n.º 1 do art.º 21º da Lei Geral Tributária (LGT) que “quando os pressupostos do facto tributário se verifiquem em relação a mais de uma pessoa, todas são solidariamente responsáveis pelo cumprimento da dívida tributária”. E havendo solidariedade tributária, dispõe o n.º2 do art.º 48º da LGT que “ As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários”. Por conseguinte, e não obstante o falecimento de um devedor solidário, tendo havido citação de outro devedor solidário, o efeito desta citação extender-se-á aos sucessores daquele primeiro, na medida em que a morte do executado implica a transmissão das suas obrigações tributárias nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 29º da LGT. 8. Resulta da lei processual civil que citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação, chamando-o ao processo para se defender. Consta dos autos que a Oponente M… era executada no PEF, verificando-se que a mesma tomou conhecimento da instauração da referida execução fiscal, o que implicou, em relação a esta, e nos termos do n.º 1 do art.º 49º da LGT, a interrupção da prescrição em 9 de Março de 2006. Efeito interruptivo este que se alastrou aos demais oponentes (e recorridos) na qualidade de sucessores de um devedor solidário, por via do disposto nos n.º 1 do art.º 21º e n.º2 do art.º 48º, ambos da LGT. 9. Ao menosprezar este ato de citação concretizado em 1 de Março de 2006, e ocorrido ainda durante o decurso do prazo de prescrição de 8 anos e que começara a correr em 1 de Janeiro de 2001, dado estar em causa dívida de IRS do ano de 2000 (cfr. art.º 48º, n.º 1 da LGT), veio o Tribunal a quo considerar erroneamente que a dívida já estava prescrita no ano de 2009, quando na verdade e nessa data estava ainda em curso um novo prazo de prescrição que começara a correr aquando do facto interruptivo acabado de assinalar – a citação de 09/03/2006 (cfr. art.º 49º, n.º1 da LGT). Face ao referido, deve-se assim concluir que o prazo de prescrição foi interrompido com a citação da Recorrida Oponente M… em 019/03/2006, o que demonstra ter o Juiz a quo procedido a uma errada apreciação jurídica dos factos dados como provados na sentença. 10.Em suma, e ressalvando o devido respeito que merece, o Tribunal a quo, ao decidir como efetivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de facto e de direito relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto em diversos preceitos normativos da LGT, designadamente o n.º 1 do art.º 21º, o n.º 2 do art.º 29º, o n.º2 do art.º 48º; e o n.º 1 do art.º 49º da referida Lei. Termos em que, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser declarada nula a sentença emitida no âmbito dos presentes autos, ou, caso assim não se entenda, ser revogada a sentença ora recorrida, com as demais e devidas consequências legais, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!». * * *Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão. * II – DO OBJECTO DO RECURSO O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cf. art.º 635.º, n.º 4 e art.º 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil - «CPC» - ex vi art.º 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - «CPPT»), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente. Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações das Recorrentes, importa decidir se: (i) a sentença recorrida é nula, por ter conhecido da legalidade do ato de citação realizado no âmbito do PEF n.º 3255200601016105; e, (ii) deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo com fundamento em erro de julgamento, atendendo a que não se verifica a prescrição da dívida de IRS exequenda. * III.A - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «1. Em 26 de Fevereiro de 2006 foi pela Administração Tributária instaurado contra A… e M… o processo de execução fiscal n.º 3255200601016105, que tramita pelo SF de Lisboa 10 para cobrança de dívidas de IRS e juros compensatórios, referentes ao ano de 2000, no montante de € 89.351,02; 2. Em 1 de Março de 2006, no âmbito do PEF indicado em 1. foi emitida “Citação”, através de “Carta Registada Com Aviso de Recepção”, tendo como destinatário “A…”; 3. A “Carta Registada Com Aviso de Recepção” foi recebida no dia 9 de Março de 2006 por M…, tendo sido aposto no comprovativo de entrega a referência de que a carta foi recebida “Por pessoa a quem for entregue a CITAÇÃO e que se comprometeu a entregá-la prontamente ao Destinatário”; 4. Na carta a que antes se fez referência, expedida pela SF de Lisboa 10, vinham indicados os NIF de A… e de M…; 5. A… faleceu no dia 17 de Setembro de 2003; 6. Em 14 de Julho de 2009, no âmbito do PEF indicado em 1. foram emitida ofícios para “Citação”, através de “Carta Registada Com Aviso de Recepção”, tendo como destinatários “M…”, “M…” e “M…”, na qualidade de “herdeiras de A…”; 7. As “Carta Registadas Com Aviso de Recepção” referidas em 7. foram recebidas no dia 27 de Julho de 2009; 8. Com referência à dívida exequenda, até ao recebimento das cartas referidas em 7., não foram pelas ora Oponentes apresentadas, reclamação, recurso hierárquico, impugnação, pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo, nem pedido de pagamento de prestações.». * «Com interesse para a decisão da causa, nada mais se provou.». *Mais resulta consignado em termos de motivação da matéria de facto o seguinte: «A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados.». *III.B De Direito A Recorrente veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal a quo nos presentes autos, invocando, em síntese, que: (i) a sentença recorrida é nula, por ter conhecido da legalidade do ato de citação realizado no âmbito do PEF n.º 3255200601016105; e, (ii) deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo com fundamento em erro de julgamento, atendendo a que não se verifica a prescrição da dívida de IRS exequenda. Vejamos, então, se assiste razão à Recorrente. (i) Quanto à nulidade da sentença recorrida nos termos do art.º 125.º, n.º 1 do CPPT Comecemos, então, por apreciar se, tal como vem alegado, a sentença recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia, com base no que preceituam os art.ºs 125.º, n.º1 do CPPT e 615.º, n.º1, al. d) do CPC. Preceitua o art.º 125.º, n.º1 do CPPT, sob a epígrafe «Nulidades da sentença» o seguinte: «1 - Constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.». Também a alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, invocada pela Recorrente, dispõe que é nula a sentença quando: «d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.». Assim, a nulidade por excesso de pronúncia ocorre quando o tribunal se pronuncia sobre questões que não foram suscitadas pelas partes e que não sejam de conhecimento oficioso. Por questões submetidas à apreciação do Tribunal deve entender-se as que se referem aos pedidos formulados, atinentes à causa de pedir ou às exceções alegadas, não se confundindo, pois, com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem verdadeiras questões para os efeitos preceituados na norma citada. Nas palavras de Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, I Vol. pág. 284, 285 e V Vol. pág. 139), são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer questões de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal qualquer questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão. Aqui chegados, regressemos, então, ao caso concreto da presente lide recursiva. A questão da prescrição da dívida exequenda foi suscitada pelas Oponentes – ora Recorridas – na petição inicial, pelo que o Tribunal a quo apreciou, conforme deveria, esta questão (cf. art.º 204.º, n.º1, alínea d) do CPPT). Por outro lado, note-se, o art.º 175.º do CPPT estabelece, de forma clara e inequívoca, que a prescrição é de conhecimento oficioso, o que significa que, mesmo que não viesse alegada pelas Recorridas, deveria o Tribunal a quo ponderar devidamente esta matéria, tal como fez. Neste conspecto, o tema da falta de citação para a execução fiscal que foi apreciada na sentença recorrida não configura, de forma alguma, um excesso de pronúncia do Tribunal a quo. É que a falta de citação para a execução fiscal foi apreciada a título incidental, no âmbito da análise da verificação da prescrição da dívida exequenda, de acordo com o que prescreve, designadamente, o art.º 49.º, n.º1 da Lei Geral Tributária («LGT»), que atribui, além do mais, à citação efeito interruptivo da contagem daquele prazo. E, por essa razão, a conclusão quanto à ocorrência in casu da falta de citação é extraída no contexto da apreciação da verificação da prescrição da dívida exequenda, e não como fundamento autónomo e individualizado de oposição à execução fiscal. No sentido de que a falta de citação pode, neste concreto contexto, ser apreciada em sede de oposição à execução fiscal, veja-se o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 29/01/2015, processo n.º 00307/13.7BECBR, disponível em www.dgsi.pt, no qual foi sumariado que: «I. Embora não constitua fundamento de oposição (artigo 204º do CPPT), nada obsta a que se possa conhecer da falta ou da nulidade da citação no processo de oposição à execução fiscal se tal conhecimento for necessário para apreciar qualquer questão que deva ser apreciada na oposição.». Pelo que, sem necessidade de mais nos alongarmos, podemos concluir que improcedem estas conclusões recursivas. (ii) Quanto ao erro de julgamento do Tribunal a quo quanto à prescrição da dívida exequenda Insurge-se também a Recorrente contra a sentença recorrida por, alegadamente, padecer de erro de julgamento, concretamente em relação à verificação da prescrição da dívida exequenda. Vem, assim, a Recorrente peticionar a revogação da sentença que recaiu sobre a oposição à execução fiscal apresentada no PEF n.º 3255200601016105, defendendo, em suma, que in casu não se pode concluir que se verifica a prescrição da dívida exequenda, já que M… «tomou conhecimento da instauração da referida execução fiscal, o que implicou, em relação a esta, e nos termos do n.º 1 do art.º 49º da LGT, a interrupção da prescrição em 9 de Março de 2006. Efeito interruptivo este que se alastrou aos demais oponentes (e recorridos) na qualidade de sucessores de um devedor solidário, por via do disposto nos n.º 1 do art.º 21º e n.º2 do art.º 48º, ambos da LGT.». Sustenta, por seu turno, o EMMP junto deste Tribunal que as conclusões recursivas devem ser julgadas improcedentes, devendo, por isso, ser mantida na ordem jurídica a sentença recorrida. Apreciemos. Adiantando, desde já, a nossa posição, entendemos que também aqui não tem razão a Recorrente. Vejamos, então, as razões para julgarmos neste sentido. Preceitua o art.º 49.º n.º 1 da LGT que a citação interrompe a prescrição. Por falta de regulamentação dos efeitos da citação na LGT, há que aplicar as normas contidas no Código Civil («CC»), designadamente o n.º1 do art.º 326.º, que estabelece que «[a] interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte», bem como o n.º 1 do art.º 327.º do mesmo diploma, que dispõe que «Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo». Donde resulta que quando o prazo de prescrição foi interrompido pela citação, a cessação da eficácia do facto interruptivo é diferida para a data da decisão que ponha termo ao processo. Por conseguinte, a interrupção decorrente da citação inutiliza todo o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo e obsta ao início da contagem do novo prazo enquanto o processo executivo não findar. Neste mesmo sentido, veja-se o que se deixou dito no acórdão do STA de 13/03/2019, proc. n.º 01437/18.4BELRS, disponível em www.dgsi.pt: «Relativamente às dívidas de natureza tributária, temos por inquestionável que a prescrição só é aceite enquanto expressamente prevista nas normas de direito tributário que admitam a sua existência, definam o seu prazo e tipifiquem os actos interruptivos e suspensivos – como acontece com as normas contidas na LGT. Todavia, e como acima referimos, tal não significa que os efeitos dos actos interruptivos não possam ser colhidos no Código Civil, atenta a circunstância de, atualmente, inexistir na LGT qualquer norma sobre a matéria. Com efeito, embora este diploma legal fixe, de forma taxativa, os actos interruptivos da prescrição, ela não define os efeitos desses actos, isto é, não define se eles têm efeito instantâneo ou duradouro. É certo que durante muitos anos a legislação tributária continha essa definição – cfr. o art.º 27º do CPCI, o art.º 34º do CPT e o art.º 48º da LGT até à alteração introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 – sempre no sentido de que o efeito da interrupção só cessava se o processo que constituía a causa interruptiva ficasse parado mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte. O que equivalia a conferir efeito duradouro a todos os actos interruptivos, já que a prescrição não corria após esses actos e só voltava a correr caso cessasse esse efeito duradouro por mor da paragem do processo nos termos referidos (acrescentando-se, então, ao prazo que a partir daí se iniciava, todo o prazo que decorrera até à instauração do processo, o que, na prática, equivalia a converter ou “desgraduar”, nesse específico caso, a interrupção em suspensão da prescrição). Contudo, após a alteração introduzida no art.º 49º da LGT pela Lei nº 53-A/2006, de 29/12, esse regime desapareceu e deixou de haver norma a definir os efeitos dos actos interruptivos da prescrição relativamente a obrigações tributárias. Razão por que não há como deixar de aplicar as normas contidas no C.Civil, onde, como se viu, o artigo 326º estabelece que «a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte» e o artigo seguinte dispõe que «1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo». Assim, a jurisprudência consolidada do STA é no sentido de que a interrupção decorrente da citação do executado inutiliza todo o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo e obsta ao início da contagem do novo prazo enquanto o processo executivo não findar.». Regressemos, agora, ao caso concreto dos presentes autos. Para sustentar que a dívida exequenda se encontrava prescrita foi entendido na sentença recorrida que «Do exposto resulta que não se reveste do formalismo essencial de “citação”, o conhecimento da existência do processo de execução fiscal por outra via que não a de carta registada com aviso de recepção dirigida ao próprio. Ora a “citação” das Oponentes ocorreu apenas no dia 27 de Julho de 2009, ou seja, já no decurso do oitavo ano posterior à ocorrência do facto tributário!». E o assim decidido mostra-se acertado, pese embora a exígua fundamentação que foi gizada pelo Tribunal a quo para sustentar a decisão tomada. Senão vejamos. Ressalta do probatório que em 01/03/2006, no âmbito do PEF em causa, foi remetida «Citação» através de «Carta Registada Com Aviso de Recepção», tendo como destinatário «A…» (cf. ponto 2. dos factos provados). Foi também dado como provado que «A “Carta Registada Com Aviso de Recepção” foi recebida no dia 9 de Março de 2006 por M…, tendo sido aposto no comprovativo de entrega a referência de que a carta foi recebida “Por pessoa a quem for entregue a CITAÇÃO e que se comprometeu a entregá-la prontamente ao Destinatário” (cf. ponto 3. dos factos provados). Contudo, M… já não poderia entregar a carta ao destinatário – A… –, porquanto este faleceu em 17/09/2003 (cf. ponto 5. dos factos assentes). Por esta razão – o decesso A…– não se pode, naturalmente, ser considerado citado para o PEF n.º 3255200601016105. E quanto à questão de saber se M… se deve considerar citada para o PEF em causa em 09/03/2006 por ter recebido a «Citação» (ainda que nesta conste unicamente o nome de A… como destinatário – cf. ponto 2. da factualidade assente), por o seu número de identificação fiscal («NIF») constar daquele documento (cf. ponto 4. do probatório) e por se tratar de uma dívida de IRS (cf. ponto 1. dos factos provados), a resposta não pode deixar de ser negativa. O IRS é um imposto que opera através da tributação conjunta do agregado familiar, e de que são sujeitos passivos aqueles a quem incumbe a sua direção (cf. n.º 2 do art.º 13.º do Código do IRS, na redação aplicável), no caso concreto, ambos os cônjuges, atendendo a que o imposto em causa diz respeito ao ano de 2000. Com efeito, e no que aqui releva, dispunha-se o seguinte no art.º 13.º do Código do IRS, na redação aplicável: «1 - Ficam sujeitas a IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que, nele não residindo, aqui obtenham rendimentos. 2 - Existindo agregado familiar, o imposto é devido pelo conjunto dos rendimentos das pessoas que o constituem, considerando-se como sujeitos passivos aquelas a quem incumbe a sua direção. 3 - O agregado familiar é constituído por: a) Os cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens e os seus dependentes; b) Cada um dos cônjuges ou ex-cônjuges, respetivamente, nos casos de separação judicial de pessoas e bens ou de declaração de nulidade, anulação ou dissolução do casamento, e os dependentes a seu cargo; c) O pai ou a mãe solteiros e os dependentes a seu cargo; d) O adotante solteiro e os dependentes a seu cargo. (…) 7 - A situação pessoal e familiar dos sujeitos passivos relevante para efeitos de tributação é aquela que se verificar no último dia do ano a que o imposto respeite. (…)». Pelo que, e como resulta do disposto no n.º 7 do supracitado art.º 13.º do Código do IRS, a situação pessoal e familiar dos sujeitos passivos relevante para efeitos de tributação era aquela que se verificasse no último dia do ano a que o imposto respeitava. Donde se conclui que a aqui Recorrida M… e o seu cônjuge – o decesso A… – eram sujeitos passivos do IRS no ano de 2000. Existia, pois, quanto ao IRS uma «titularidade plural das obrigações fiscais», sem prejuízo de, e atento o disposto no n.º 5 do art.º 16.º da LGT – «qualquer dos cônjuges pode praticar todos os atos relativos à situação tributária do agregado familiar e ainda os relativos aos bens ou interesses de outro cônjuge, desde que este os conheça e não se lhes tenha expressamente oposto» –, tal não implicar necessariamente a intervenção simultânea de ambos os cônjuges no cumprimento das respetivas obrigações (cf. neste sentido, Rui Duarte Morais - Sobre o IRS. Reimpressão da 3.ª edição de 2014 Coimbra: Almedina, 2016, p. 29). Ora, atento o disposto no n.º 1 do art.º 21.º da LGT, do qual resulta que «salvo disposição da lei em contrário, quando os pressupostos do facto tributário se verifiquem em relação a mais de uma pessoa, todas são solidariamente responsáveis pelo cumprimento da dívida tributária», a Recorrida M… é responsável solidária pelo cumprimento da dívida tributária emergente do IRS de 2000, aqui em causa (cf. ponto 1. dos factos provados). Contudo, para acionar esta responsabilidade solidária para cumprimento coercivo da dívida de IRS exequenda é necessário que o credor tributário proceda à citação do devedor de acordo com o regime ínsito, além do mais, no art.º 190.º do CPPT. De acordo com o n.º 1 desta norma, a citação deve conter, designadamente, o nome e o número de contribuinte do ou dos devedores. No caso concreto, pese embora a citação contenha os NIF de A… e de M…, (cf. ponto 4. do probatório) a verdade é que contém unicamente referência ao nome daquele (cf. ponto 2. da factualidade assente), omitindo, pois, o nome daquela. E, na nossa perspetiva, esta circunstância é decisiva para se concluir pela não citação de M… para a execução fiscal. A citação, sendo um ato praticado pela Administração que visa «dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada» (cf. n.º 2 do art.º 35.º do CPPT), tem como escopo fundamental assegurar o direito ao contraditório e à defesa do executado. É por isso que, além de outros elementos, a citação deve conter o nome do executado, de modo que seja adequadamente informado que sobre si impende uma execução fiscal e assim, caso pretenda, possa reagir contenciosamente contra a mesma. Pelo que a falta de indicação na citação do nome da executada pode prejudicar o seu direito a um due process of law, na perspetiva do exercício do seu direito de defesa, sendo que essa possibilidade é suficiente para se extrair a conclusão que não se pode considerar M… como citada para a execução fiscal. Para que ocorra a falta de citação, e apoiando-nos na lição de Jorge Lopes de Sousa (in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Volume III, 6.ª edição, págs. 138/139), basta in casu a mera possibilidade de prejuízo para a defesa do executado e não a demonstração da existência de efetivo prejuízo, tal como também se sumariou no acórdão do STA de 02/04/2014, processo n.º 0217/14, disponível em www.dgsi.pt: «III - Para que ocorra a nulidade por falta de citação basta a mera possibilidade de prejuízo para a defesa do executado e não a demonstração da existência de efectivo prejuízo». E no caso dos autos, a verdade é que M… nada fez perante a citação rececionada em 01/03/2006, a qual, como já visto, não continha referência ao seu nome, mas apenas a A…, verificando-se, assim, a possibilidade de prejuízo para a sua defesa em sede dessa execução fiscal. Por último, diga-se que a alegação pela Recorrente de que M… «tomou conhecimento da instauração da referida execução fiscal» e que, por essa razão, se deve entender que foi interrompida a contagem do prazo de prescrição, não pode proceder, dado que o n.º1 do art.º 49.º da LGT faz referência expressa à «citação», ou seja, à receção por parte do visado de um ato praticado pela Administração que almeja «dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada» (cf. n.º 2 do art.º 35.º do CPPT). E no caso que agora nos ocupa já vimos que não se pode concluir que tenha ocorrido a «citação» de M…, pelo que «tomar conhecimento» da existência da execução fiscal não pode, como é evidente, corresponder, para efeitos de aplicação do regime ínsito no n.º1 do art.º 49.º da LGT, à concretização de um ato de citação para efeitos de acionamento da sua responsabilidade tributária solidária quanto à dívida de IRS exequenda. E por ser assim, como cremos que é, impõe-se concluir, tal como ficou consignado na sentença recorrida, que M… apenas foi citada para a execução em 27/07/2009 (cf. pontos 6. e 7. do probatório), já após o decurso do prazo de prescrição de 8 anos que é ao caso aplicável (cf. art.º 48.º, n.º1 da LGT). Em face do exposto, tudo visto e ponderado, o recurso não merece provimento, devendo a sentença recorrida ser mantida, pois que, com acerto, julgou procedente a oposição à execução fiscal. * Termos em que acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 30 de abril de 2025 (Filipe Carvalho das Neves) (Susana Barreto) (Luísa Soares) |