Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 1093/09.0BELRS |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 09/30/2025 |
| Relator: | ÂNGELA CERDEIRA |
| Descritores: | IVA DIREITO À DEDUÇÃO FATURAS FALSAS ÓNUS DA PROVA REQUISITOS FORMAIS |
| Sumário: | I - Nos termos da alínea a) do n° 2 e no n° 3 do artigo 19.º CIVA, só confere direito à dedução o imposto mencionado em faturas passadas na forma legal e não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura. II - Quando a AT desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT), competindo-lhe fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. III - Tal ónus da prova não se mostra cumprido em face da natureza conclusiva da afirmação de que a empresa emitente das facturas não possuía estrutura produtiva e humana para realizar os trabalhos facturados, sem qualquer concretização dos factos apurados, nomeadamente junto da Segurança Social e considerando, por outro lado, a possibilidade de aquela empresa subcontratar terceiros para a realização dos trabalhos em causa, situação frequente no sector da construção civil. IV - A falta de apresentação pelo sujeito passivo dos elementos solicitados pelos serviços de inspecção – contratos, autos de medição, etc. – não pode ser valorada em sede de demonstração de indícios de facturação falsa, sob pena de, na prática, fazer recair de imediato o ónus da prova da veracidade das operações sobre o sujeito passivo, quando tal deve ocorrer apenas nas situações em que esteja devidamente sustentada a suspeição de falsidade das operações tituladas pelas faturas. V - É jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se os requisitos materiais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham omitido certos requisitos formais, sendo que a posse de uma factura com as menções previstas no artigo 226º da Directiva IVA constitui um requisito formal e não um requisito material do direito à dedução do IVA. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | I – RELATÓRIO
J........, LDA, doravante Recorrente, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 12/09/2012, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial por si apresentada contra as liquidações adicionais, nos autos devidamente identificadas, relativas a IVA referente ao ano de 2004 e juros compensatórios associados, no montante global de € 18.101,74, determinando a sua manutenção na ordem jurídica. Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES: a. A SENTENÇA A QUO NÃO JULGOU PROVADOS - MAS ASSIM OS DEVIA TER JULGADO - OS FACTOS ALEGADOS SOB OS ARTIGOS 10, 11, 17, 18, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 42, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 58 E 67 DA P.I.; b. A ALTERAÇÃO DO SENTIDO DO JULGAMENTO DAQUELA MATÉRIA DE FACTO É IMPOSTA — SEM PREJUÍZO DO PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA, MAS ATÉ POR RESPEITO PELO SEU CONTEÚDO E PELAS REGRAS DA EXPERIÊNCIA HUMANA, SOCIAL E HISTORICAMENTE COMUNGADAS -, PELA CORRECTA PONDERAÇÃO DOS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS R........, D........, A........, J........, C........ E M........ E DAS DEMAIS PROVAS DOCUMENTAIS CONSTITUÍDAS NOS AUTOS, MAXIME, O PROCESSO ADMINISTRATIVO EM QUE SE FORMARAM AS LIQUIDAÇÕES IMPUGNADAS E ADREDE TRANSCRITAS E ESPECIFICADAS NAS PRESENTES ALEGAÇÕES, NOS TERMOS QUE, POR NECESSÁRIA SÍNTESE CONCLUSIVA, AQUI SE DÃO POR INTEGRALMENTE REPRODUZIDOS; c. O FACTO 8 DA SENTENÇA A QUO DEVERIA INCLUIR AINDA — ERRANDO O JULGAMENTO, POR O NÃO FAZER — QUE AS FACTURAS EMITIDAS PELA SOCIEDADE C........, L.DA, QUE ESPECIFICA, SE ENCONTRAVAM COMPLETADAS POR ANEXOS CONTENDO A DISCRIMINAÇÃO DOS DEMAIS REQUISITOS LEGAIS E REGULAMENTARES, DESIGNADAMENTE AS QUANTIDADES DOS TRABALHOS E SERVIÇOS PRESTADOS E SEUS VALORES UNITÁRIOS, QUANDO APLICÁVEL, COMO RESULTA DOS DOCUMENTOS CONTIDOS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO EM QUE SE FORMARAM AS LIQUIDAÇÕES IMPUGNADAS, A FLS..., EM ESPECIAL OS DOCUMENTOS OFERECIDOS PELA ORA IMPUGNANTE NO EXERCÍCIO DO DIREITO DE AUDIÇÃO PRÉVIA; d. A VALORAÇÃO CORRECTA DE TODOS ESSES FACTOS IMPORTA A CONCLUSÃO DE QUE A IMPUGNANTE AGIU DE BOA FÉ, EM TERMOS SEMELHANTES ÀQUELES EM QUE AGIRIA UM NORMAL E DILIGENTE SUJEITO, COLOCADO NA MESMA POSIÇÃO, NÃO LHE SENDO EXIGÍVEL QUE CONHECESSE, OU DEVESSE CONHECER, SEQUER, QUE A SOCIEDADE C........., L.DA, APESAR DE FIGURAR NO SÍTIO DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA COMO SUJEITO PASSIVO DE IVA, NÃO DAVA CUMPRIMENTO A OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS E PARA COM A SEGURANÇA SOCIAL; e. A EMISSÃO DE FACTURAS POR SUJEITO PASSIVO DE IVA QUE NÃO CUMPRA AQUELAS OBRIGAÇÕES NÃO PERMITE QUALIFICÁ-LAS COMO FALSAS, ENQUANTO FACTO JURÍDICO RELEVANTE, NEM CONSENTE CONCLUIR QUE ESSE SUJEITO NÃO PODIA TER EFECTUADO OS TRABALHOS FACTURADOS, A PRETEXTO FALACIOSO E SOFÍSTICO DE QUE NÃO TENDO REGULARIZADA AS SUAS OBRIGAÇÕES DECLARATIVAS TRIBUTÁRIAS E DE SEGURANÇA SOCIAL, É COMO SE NÃO TIVESSE TRABALHADORES E, NÃO OS TENDO, ASSIM, CONSIDERAR QUE AS OBRAS QUE CONCRETAMENTE EDIFICARAM E PROFUSAMENTE DOCUMENTADAS NOS AUTOS POR DEPOIMENTOS E FOTOGRAFIAS, NÃO CORRESPONDEM A REAIS OPERAÇÕES; f. A CIRCUNSTÂNCIA DE O TAL B........, PERANTE A RECORRENTE E TERCEIROS, INVOCADO, AGIDO E ASSINADO, EVENTUALMENTE CONTRA O DIREITO, NA QUALIDADE DE GERENTE DA DITA SOCIEDADE, POR UM LADO, NÃO É NECESSARIAMENTE FALSA, SE ATENTARMOS A QUE A INSCRIÇÃO DESSA QUALIDADE NO REGISTO COMERCIAL NÃO É CONSTITUTIVA DA INVESTIDURA NO CARGO, MAS APENAS SERVE FINS DE PUBLICIDADE A TERCEIROS E, POR OUTRO, O DIREITO NÃO IMPEDIA QUE AGISSE COMO SEU REPRESENTANTE, SEJA COMO GESTOR DE NEGÓCIOS, SEJA COMO MANDATÁRIO SEM REPRESENTAÇÃO, SEJA COMO COMISSÁRIO, SEJA, AINDA, COMO UM SEU SUB-EMPREITEIRO (E A QUE A IMPUGNANTE SERIA TERCEIRO ALHEIO); E, POR ISSO, A LEI TRIBUTÁRIA PREVÊ A SUA RESPONSABILIZAÇÃO, INCLUSIVE PENAL, POR TAL, DE PAR COM A RESPONSABILIZAÇÃO DA PRÓPRIA SOCIEDADE; g. A SENTENÇA A QUO VIOLOU O DIREITO QUE ELA PRÓPRIA INVOCOU E, DEPOIS, NÃO APLICOU, DEVENDO TÊ-LO FEITO, OUTRO DIREITO QUE AO CASO CABIA E CABE APLICAR, COMO É O CASO DO DIREITO DOS ART. 19/4 E 35 DO CIVA, DO ART. 4/6 E /7 DO D.L. 147/2003 DE 11 DE JULHO, PORQUANTO AS FACTURAS FORAM EMITIDAS EM CONFORMIDADE COM AS DISPOSIÇÕES LEGAIS E REGULAMENTARES APLICÁVEIS, NA MEDIDA EM QUE DESTAS FAZEM PARTE INTEGRANTE OS RESPECTIVOS ANEXOS; h. VIOLOU, AINDA, O DIREITO DO ART. 260/2, 3 E 4, DO ART. 80, AMBOS DO CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS, PELO DIREITO DOS ART. 464 E S.S. (SOBRE A GESTÃO DE NEGÓCIOS) E DOS ART. 500, ESTES DO C. CIVIL, DIREITO ESTE QUE PROTEGE, TAMBÉM, A BOA FÉ DE TERCEIROS E, CONSEQUENTEMENTE, APLICADO AOS FACTOS QUE SE DEVEM TER POR APURADOS, IMPÕEM QUE À RECORRENTE NÃO POSSA SER IMPUTÁVEL NEM O CONHECIMENTO, NEM O DEVER DE CONHECER OS FACTOS RELATIVOS À SOCIEDADE C........., L.DA EM QUE SE FUNDOU A SENTENÇA A QUO E AS LIQUIDAÇÕES IMPUGNADAS, PARA REJEITAR A LEGALIDADE DA DEDUÇÃO DO IVA CONSTANTE DAS ALUDIDAS FACTURAS; i. VIOLOU, FINALMENTE, O DIREITO DO ART. 103 DO RGIT, POSTO QUE NEM AS FACTURAS SÃO FALSAS, NEM AS OPERAÇÕES FORAM SIMULADAS OU NÃO CORRESPONDERAM A TRANSACÇÕES REAIS; O QUE SINGELAMENTE SE PASSOU É QUE OUTRÉM (A C........., L.DA E, POR CONTA E EM NOME DESTA, O B........) NÃO CUMPRIU AS OBRIGAÇÕES DECLARATIVAS E PRESTACIONAIS IMPOSTAS POR DIVERSAS NORMAS TRIBUTÁRIAS, DESIGNADAMENTE DO CIVA E DO CIRC, ABUSANDO DA BOA FÉ DA IMPUGNANTE; j. TERMOS QUE IMPÕEM A REVOGAÇÃO DA SENTENÇA A QUO E A SUA SUBSTITUIÇÃO POR DECISÃO QUE JULGUE A IMPUGNAÇÃO JUDICIAL SUB IUDICE, TOTALMENTE PROCEDENTE E, CONSEQUENTEMENTE, ANULE AS LIQUIDAÇÕES DE IVA IMPUGNADAS E ORDENE A RESTITUIÇÃO DOS SEUS RESPECTIVOS MONTANTES, ENTRETANTO PAGOS PELA RECORRENTE, ACRESCIDOS DE JUROS COMPENSATÓRIOS ÀS TAXAS LEGAIS APLICÁVEIS.
NESTES TERMOS e nos melhores do direito aplicável, deve o presente recurso ser julgado procedente, como se deixou argumentado e concluído e com as demais consequências legais, assim se fazendo JUSTIÇA!
A RECORRIDA não apresentou contra-alegações. *** A DIGNA MAGISTRADA DO MINISTÉRIO PÚBLICO (DMMP) neste TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. *** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR As questões a apreciar e decidir consistem em saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na seleção, apreciação e valoração da matéria de facto e na aplicação do direito, o que implica responder às questões submetidas à apreciação do Tribunal sobre se a Autoridade Tributária e Aduaneira reuniu indícios suficientes de se estar perante uma situação de as faturas em causa não corresponderem ao fornecimento de bens e prestação de serviços efetivamente adquiridos e depois, em caso de resposta afirmativa, se a Impugnante e ora Recorrente, por sua vez, conseguiu comprovar a materialidade das operações em causa e, por último, se as facturas em causa reuniam ou não os requisitos legais para conferir o direito à dedução em sede de IVA.
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: 1. A impugnante até 4.11.2008 tinha como actividade o exercício de “administração de condomínios, CAE 68322.” com enquadramento normal em IVA e periocidade trimestral (cf. relatório de inspecção fls. do Processo administrativo tributário, de ora em diante designado de PAT). 2. Na sequência da Ordem de Serviço n.° 01200701728 de 2007.02.28 foi realizada acção inspectiva em sede IRC e IVA ao sujeito passivo C........, LDA. na qual a administração fiscal concluiu pela “(...) existência de fortes indícios de emissão de facturação falsa no sector da construção civil, quer por parte do sujeito passivo quer por terceiros alheios à sociedade (...), foi possível identificar entre os utilizadores das suas facturas, a J........, Lda.”” (cfr cópia do relatório de inspecção constante a fls. 113 e ss. dos PAT). 3. Foram realizadas obras numa herdade propriedade da J........, Lda. por trabalhadores trazidos por B........, (cfr. declarações das testemunhas D........, A........, J.C........, M........, R........). 4. Nas obras referidas no ponto anterior, B........ intitulava-se gerente da sociedade C........, LDA. (cfr. declarações das testemunhas D........, A........, J.C........, M........, R........). 5. A impugnante emitiu vários cheques à ordem de B........ (cfr declarações das testemunhas D........, cópia de cheque a fis. 129 dos autos). 6. Através da Ordem de Serviços n.° s 01200803943 emitida com data de 6-8-2008 e, com despacho datado de 11-08-2008, foi ordenada acção inspectiva interna referente ao exercício de 2004, ao sujeito passivo J........LDA, com o NIF 50……, com o fundamento de utilização de facturas, indiciadas como falsas e emitidas pelo sujeito passivo C........ LDA, com o NIF 50……. (cf. cópia do relatório de inspecção a fls. 42 a fls. 52 do PAT). 7. Em 11.11.2008 foi emitido o relatório final da inspecção cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, do qual consta o seguinte (cf. cópia do relatório de inspecção a fls. 42 a fls. 52 do PAT): “(…) II -OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA 2.1 - Introdução Em cumprimento do disposto na(s) Orde(ns) de Serviços n°s 01200803943 emitida(s) com data de 6-8-2008 e, com despacho datado de 11-08-2008, nos termos do disposto nos arts n.°s 1 e 2 al. a) e 12° n.° 1, ambos do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT), foi ordenada acção inspectiva interna referente ao exercício de 2004, ao sujeito passivo J........LDA, com o NIF 50……, tendo por objectivo, proceder às correcções que se mostrarem devidas pela utilização de facturas, indiciadas como falsas e emitidas pelo sujeito passivo C........ LDA, com o NIF 50……. 2.2 - MOTIVO DA ACÇÃO INSPECTIVA A referida acção inspectiva teve origem na sequência da acção de inspecção externa realizada pelos Serviços de Inspecção, relativamente aos sujeitos passivos C........ LDA, que concluiu pela existência de indícios fortes da emissão de facturas falsas por parte deste sujeito passivo, quer por terceiros alheios à sociedade, na qual, o sujeito passivo em análise, é indicado como utilizador das referidas facturas, razão pela qual foi proposta abertura de Ordem de Serviço para o apuramento dos factos que, ao longo do presente relatório, se dão como reproduzidos. 2.2 OBJECTO SOCIAL E ENQUADRAMENTO FISCAL DA ACTIVIDADE EXERCIDA Em sede de IRS/IRC O sujeito passivo com início de actividade declarada em 2004/02/09, exerce a actividade de ADMINISTRAÇÃO DE CONDOMÍNIOS — CAE:6........- e, encontra-se, no exercício em análise, enquadrado no regime de tributação simplificado. Em sede de IVA Em sede deste imposto, o sujeito passivo, com enquadramento à data de 2004/02/09, está sujeito a imposto, encontrando-se abrangido pelo regime Normal periocidade Trimestral; 2.3 - REPRESENTANTES FISCAIS DO SUJEITO PASSIVO 2.3.1- Sócios/Administradores do sujeito passivo O sujeito passivo é uma Sociedade pontes são Quotas, de acordo com a informação recolhida quando da consulta à “Visão do Contribuinte”. Os sócios gerentes são: I........ com o NIF 15…... A........ com o NIF 15….. H........com o NIF 19…… 2.3.2- Técnico de Contas responsável pela contabilidade Da consulta ao sistema informático, constatamos que o Técnico de contas da sociedade é o Sr. D........, com o NIF: 18……. e domicílio declarado na R das horas de Paz n 21 Alto do Banzão - 2705-145 Colares. III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL 3.1 - ANÁLISE NO ÂMBITO DO IR/IVA 3.1.1 — Cumprimento formal das obrigações fiscais Quando da consulta ao sistema informático da DGCI, confirmamos que o sujeito passivo objecto da análise, face à actividade exercida: ADMINISTRAÇÃO DE CONDOMÍNIOS, e ao disposto legalmente, cumpriu, com as suas obrigações declarativas: (…) Em sede de IVA, relativamente ao exercício de 2004 (…) 3.1.3 Correcções aritméticas em sede de IVA: 3.1.3.1 - IVA indevidamente deduzido, por se apresentar suportado por facturas de favor Face à informação recolhida pelos Serviços de Inspecção e a consequente emissão de ficha de fiscalização, os suportes formais (facturas ou documentos equivalentes) ao IVA deduzido contabilizados pelo sujeito passivo J........ LDA, referentes aos serviços prestados pelo subempreiteiro C........, LDA, do sujeito passivo em análise, não correspondem a serviços efectivamente prestados pelo mesmo, pelos motivos que resumidamente indicamos: - O sócio e gerente da, C........ LDA, nunca compareceu às nossas solicitações, e salienta-se, que a firma é desconhecida na morada da sede. - Impossibilidade da realização dos trabalhos facturados em 2004, por insuficiência de estrutura produtiva/humana, da empresa C........ LDA, conforme informação da Segurança Social. Por outro lado o sujeito passivo objecto do presente procedimento, apresentou fotografias das obras, facturas e cheques. Porém, os meios de pagamento utilizados pela sociedade, cheques indicam um único beneficiário Sr. B........, que se constatou, pela pesquisa efectuada, não ter nenhum relacionamento profissional ou outro, com a empresa C........., Lda. Também, não apresentou outros elementos solicitados, (que visavam a comprovação inequívoca das prestações de serviços facturadas, alegadamente realizadas pela C........ LDA), nomeadamente, os contratos, autos de medição, nome e n.° de trabalhadores, etc. Em conclusão, o sujeito passivo respondeu à(s) notificação(ões) porém, os elementos apresentados não comprovam as prestações de serviços facturadas pela alegada firma. (Anexo II) Na sequência do relatado e fundamentado, procede-se à correcção do IVA, indevidamente deduzido pelo sujeito passivo, por infracção ao disposto no artigo 20.°, n.° 1 do CIVA, em conjugação com o artigo 19.° n.° 3 do mesmo diploma. Acresce que as facturas recolhidas, na sua designação, indicam “Trabalhos de construção civil efectuados na(s) vossa(s) obra(s)" o que é manifestamente insuficiente, e viola a legislação tributária existente, isto é, não cumprem as exigências do art.º 35.° do CIVA conjugado com o ofício 181044 da DSIVA datado de 06/12/91, o que constitui infracção ao art.° 19.° n.° 2 do CIVA. As correcções são no exercício e nos montantes a seguir referidos: Exercício de 2004: EUR 15.599,84 E cuja distribuição por períodos é a seguinte: 0403T-2.394,00 0409T 680,99 0409T 8.012,88 0412T 4.511,97 (…) VII - INFRACÇÕES VERIFICADAS/PUNIÇÃO As infrações supra relatadas, nomeadamente: Em sede de IVA: A dedução indevida de IVA, por infracção ao disposto nos arts 19.°, n.° 2 e 3 e 20.°, ambos do CIVA, por as operações em causa terem subjacente um negócio jurídico simulado; São punidas nos termos do art. 104.°, n.° 2 do RGIT VIII - DIREITO DE AUDIÇAO No cumprimento do disposto nos arts 60 ° da Ler Geral Tributária (LGT) e do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT), foi efectuado Projecto de Conclusão de Relatório, que acompanhou a notificação enviada ao contribuinte, através do Ofício n.° 80186 de 22 de Outubro de 2008, registo - RC 0736 3230 9 PT, concedendo- lhe o prazo de dez dias para o Direito de Audição. O contribuinte exerceu o Direito de Audição, alegando que discorda com as correcções apresentadas no projecto de correcções do relatório de inspecção, conforme Direito de Audição entrada 96348 de 03/11/2008, que se considera transcrito e constitui anexo III fls. 1 a 22. Resumidamente,
O projecto de relatório sob apreciação é a plena, mas infeliz, demonstração de falta de rigor e de preparação (ou, mais grave, de seriedade intelectual) de par com a mais flagrante violação da lei; importa demonstrar a afirmação; A medir pelo relatório, terá havido uma inspecção à sociedade C........, LDA, a qual terá apurado que este contribuinte não registava, quer para efeitos de IRC quer para efeitos de IVA, a totalidade das facturas que emitia a terceiros (cfr. Pag. 4 do relatório no qual se refere ser conhecida a emissão por esta de 23 facturas mas apenas ter sido contabilizada uma); Sucede que a inspecção tomou conhecimento do número de facturas que tinham sido emitidas e entregues por aquela, precisamente graças à colaboração da ora respondente que facultou todas as que a si tinham sido emitidas e entregues, bem como cópias dos respectivos meios de pagamento e recibos; E facultou, ainda a identificação da pessoa - B........- que sempre se lhe apresentou como gerente e encarregado da dita firma, “trouxe” as facturas e os recibos e dirigiu e realizou as obras em nome dessa empresa; Além do mais, a respondente ofereceu ao inspector a possibilidade de recolher centenas de fotografias comprovativas da realização das obras e do seu decurso, designadamente no ano de 2004; Mas o referido inspector, apenas levou consigo algumas poucas (percebe-se agora porquê); por isso, a respondente oferece a junção de um CD contendo um conjunto de fotografias documentando a realização dessas obras e, em algumas das quais é possível identificar a presença do tal B........, bem como de outras pessoas que, por este foram trazidas para o efeito - DOC. 1; (…) (…) E, se quem fez as obras e emitiu as respectivas as não contabilizou, nem em relação a elas cumpriu as obrigações tributárias, nem por isso deixa de ser verdadeiro que as obras foram feitas e feitas por esse contribuinte; é este quem está em falta e não o dono da obra que tudo pagou e registou devidamente; Mas, como inspecção confessa que não conseguiu localizar, nem ouvir os responsáveis do contribuinte faltoso, vira-se para o cumpridor e vem agora exigir-lhe o pagamento do que não deve (mas deve o outro que não consegue localizar) e, mais grave, imputar-lhe a utilização de facturas falsas; trata-se de uma imputação gravíssima, contra os próprios factos e o direito e que não pode passar incólume para quem a faz, tal a sua irresponsabilidade e má fé; A respondente tinha todos os motivos para não duvidar, sequer da regularidade das facturas que lhe foram entregues pelo Senhor B........, nem da sua capacidade de representação da sociedade C........, LDA: Esta sociedade foi validamente constituída e registada na CRC competente; O seu NIPC está confirmado como tendo-lhe sido atribuído e para efeitos de IVA no site da DGCI e como tal validado; Aquele sempre se apresentou como responsável dessa sociedade; Foi com ele, representando a dita sociedade que o respondente acordo acordou o regime de realização de obras por ajuste directo e os respectivos valores; O mesmo foi portador de facturas e recibos e, além do mais, assinou, com invocação da qualidade de gerente, diversos documentos emitidos por essa sociedade, tais como folhas de mão de obra utilizada, comunicações, facturas recibos, etc...(DOC 2 a 9); Foi ele quem esteve sempre presente, em 2004, no local da obra, trouxe os trabalhadores, dirigiu-os e trabalhou ele próprio, pernoitando na própria herdade, quase sempre no decurso das obras; Era ele quem ia comprar materiais a fornecedores locais, no Redondo e cercanias (doc. 10) e que lhos venderam, acreditando eles próprios, tal como a respondente, que representava a empresa em nome da qual pedia as respectivas facturas; Era o mesmo quem recebia do gerente da respondente e arquitecto de profissão, desenhos destinados e necessários à execução das obras (Doc.11); Vários cheques para liquidação de facturas foram emitidos à ordem de B........, é exacto; todavia, os valores constantes desses cheques correspondem exactamente aos montantes das respectivas facturas a cuja liquidação se destinaram; E foram entregues em nome dele porque ele assim o solicitava, invocando: A sua qualidade de representante da C..........., LDA. Que necessitava de levantar os fundos correspondentes a cada cheque, formalmente, a fim de fazer face à aquisição de materiais para a obra na zona de Redondo e para pagar aos trabalhadores que tinha na mesma obra; Em qualquer caso, é irrelevante o nome a favor do qual os cheques eram emitidos porquanto: Todos os cheques eram nominativos, o que implicava que o mesmo B........ tivesse de se identificar para os cobrar ao balcão ( o que se prova pelas cópias de frente e verso dos cheques que a correspondente entregou ao inspector); Por todos e cada um os valores representados nos cheques e, em contrapartida da sua entrega, o mesmo B........, entregou à respondente os correspondentes recibos emitidos e assinados pelas C..........., LDA., Gomo se constata de documentos ora juntos e de outros já constantes dos autos; O que sempre permitia e permite reconstituir o circuito dos respectivos valores; A respondente é uma sociedade cujos sócios são pais e filhos, cujo activo principal é constituído por uma herdade agrícola com o respectivo monte e cuja actividade não é, nem nunca foi a administração de condomínios como e erradamente lhes foi atribuída; a respondente nem sequer tem no seu objecto a administração de condomínios; tem sim, a administração de bens e a exploração agrícola, florestal, cinegética e turismo; Pela sua reduzida dimensão, e porque o custeio das obras necessárias (de recuperação) ao exercício de actividade, tinha de ser feito por recurso a financiamentos bancários e suprimentos do sócio e porque o seu gerente é arquitecto, a modalidade da administração directa era a que se adequava e adequa ao caso, devendo o empreiteiro ser, necessariamente, uma empresa pequena; Acresce que o gerente da respondente, desde que foi adquirida a herdade e iniciada a obra, esteve e está presente na mesma herdade, quase diariamente e nunca menos de 3 a 4 dias por semana, dirigindo as mesmas obras, dando indicações, desenhando etc...; por tudo isto, não havia necessidade nem legal nem outra de adoptar contrato escrito de empreitada, pois que o próprio gerente da respondente dirigia e fiscalizava, no local, as ditas obras; diga-se ainda de passagem que não se vê onde o Senhor inspector foi buscar a ideia de que num contrato de empreitada deste género deve haver autos de medição, nome e n.° de trabalhadores etc... que lei o imponha; Mas a mais extraordinária e chocante falácia do relatório é a afirmação (que a respondente não sabe, nem tem obrigação de saber e nem tem mesmo direito a saber, pois não tem o direito de aceder a tais dados) de que a empresa emitente não apresenta estrutura produtiva e pessoal para a realização das prestações de serviços facturadas. Acrescenta-se que na Segurança Social, em 2004, encontram-se registos de 3/ três trabalhadores, incluindo o gerente e sócio e uma empregada de limpeza, sem remunerações... para concluir que por isto a dita sociedade não tinha estrutura produtiva e, portanto, não podia prestar aqueles serviços; É que se tais factos são verdadeiros (não teria trabalhadores inscritos na Segurança Social) sendo verdade, como o é, que os tinha e os teve a realizar a obra em causa (de outro modo ela não estaria hoje erigida como está) então a conclusão lógica só pode ser a de que ta! empresa também estava em falta no cumprimento das suas obrigações com a Segurança Social; Mas, mais uma vez, a eventual necessidade de atingir objectivos leva a construir um pseudo raciocínio cujo único fim é o de extorquir, porque sem lei e contra lei, ao contribuinte cumpridor (a respondente) aquilo que por ineficiência não consegue cobrar do incumpridor (pois que até diz que um responsável estará no Luxemburgo, bem como afirma que enviou notificações postais ao Sr.° B........, mas este nunca compareceu, não obstante o verso de alguns cheques identificar o número de autorização de residência em Portugal; O próprio relatório reconhece e afirma que existem indícios de utilização indevida de facturação por outrem (Sr.° B........), mas imputa a utilização de facturas falsas à ora respondente, o que constitui uma insanável e contradição com a conclusão proposta; O que os autos indiciam é a existência de fraudes tributárias e à Segurança Social por parte da C..........., LDA., e ou do Sr.° B........ e de que foram vítimas, tanto a Administração Tributária, como a da Segurança Social e como a ora respondente; O que os autos indiciam é uma total, leal e pronta colaboração por parte do respondente, entregando todos os documentos pedidos, solicitando aos bancos cópias de todos os cheques, em frente e verso e entregando-os ao Sr.° Inspector, a clara demonstração da boa fé da ora respondente que assim não teria procedido se não estivesse convicta da regularidade das facturas; O que se passa é o clássico tipo de incumprimento de obrigações tributárias: os trabalhos foram feitos, facturados regularmente, pagos, conferido recibo, mas o beneficiário desses pagamentos, pura e simplesmente não deu cumprimento às suas obrigações tributárias; A respondente agiu como agiria qualquer sujeito norma! perante as mesmas circunstâncias, aceitando a invocação da qualidade e a assinatura do S.° B….. como representando aquela sociedade (cfr. art. 260.° CSC) e aceitando facturas devidamente numeradas, com menção da tipografia, com todos os demais dizeres, de sociedade validamente constituída, com o N1PC validado em seu nome no site da DGSI, em 2004, como ainda hoje; mas a administração tributária não; esta agiu com má fé: o próprio inspector reconheceu perante o gerente e o contabilista da respondente que as obras tinham sido feitas e nem quis fotografias, nem quis ir verificar ou mandar verificar a obra localmente; Em suma: o projecto de relatório respondendo viola todas as normas que ele próprio invoca, distorce a realidade, falta à verdade, fere as mais elementares regras da lógica e da boa-fé intelectual e mais: desobedece frontalmente à conduta imposta pela INFORMAÇÃO VINCULATIVA emitida pela FICHA DOUTRINÁRIA no processo 5247/05 e cuja cópia se anexa {DOC.12) pois que manifestamente se afigura desconhecida ao autor do relatório; nesta informação se fixa claramente o entendimento de que o contribuinte não pode ser afectado nos seus direitos e interesses legítimos pelo não cumprimento de obrigações fiscais impostas por lei a outro contribuinte que com ele se relacionou, sob pena de ser ferido o principio da proporcionalidade; com efeito e para todos os efeitos legais, o projectado relatório indicia uma manifesta falta de compreensão dos deveres legais por parte dos seus próprios autores. Termos em que não deve ser tornado definitivo, devendo ser substituído por outro que ordene o arquivamento dos autos quanto à respondente por nenhuma infracção a esta ser imputável. (…) Resposta ao Direito de Audição Relativamente aos argumentos apresentados pelo sujeito passivo no Direito de Audição atrás transcrito, verificamos que os pontos abordados são: reflexões ou entendimentos de carácter geral. Acrescenta-se que todos os factos referidos no direito no Direito de Audição constam do projecto de correcções do relatório de inspecção, sem que tenha acrescentado algo de relevante para a matéria de facto. (…) Em resumo, o sujeito passivo, não carreou para o processo novos elementos que levassem à alteração do mesmo, pelo que os factos tributários descritos no projecto de Relatório, são considerados procedentes, pelo que o projecto de correcções se torna definitivo. IX- OUTRAS SITUAÇÕES Na sequência das correcções efectuadas no âmbito de IVA, foi preenchido o DCU relativamente ao exercício de 2004. Não foi levantado Auto de Notícia em virtude do Sujeito Passivo ter sido indiciado no Auto de Notícia levantado ao emitente das facturas. Direcção de Finanças de Lisboa, 11 de Novembro de 2008. (…)
8. Do anexo 3 ao relatório de inspecção, constam cópias das seguintes facturas emitidas pela C........, LDA, contribuinte fiscal n.° 50........à Impugnante, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido (cfr. cópias das facturas a fls. 53 a 60 do PAT):
9. Em 13.11.2008 foi proferido pela Chefe de Divisão dos serviços de inspecção tributária da direcção de finanças de Lisboa, por subdelegação de competências, despacho de concordância com o relatório melhor descrito no ponto anterior, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (cf. cópia do despacho a fls. 38 do PAT). 10. Em 24.11.2008 foi elaborado pela inspecção tributária o documento de correcção do imposto em sede de IVA, relativo ao sujeito passivo J........LDA, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido (cf. print da declaração a fls. 87 a 96 dos autos). 11. Em 28.2.2009 foram emitidas as seguintes liquidações adicionais no valor total de EUR 18.099,74, todas com data limite para pagamento voluntário fixada para 28.2.2009: n.° 08…… de IVA relativa ao período 0403T de EUR 2.394,00; n °083….. de juros compensatórios de EUR 430,00; liquidação adicional n.°08…… de IVA do período de 0406T no valor de EUR 680,99; n.° 08…… dos inerentes juros compensatórios no valor de EUR 115,53; adicional n.° 08……. relativa ao período de 0409T, no valor de EUR 8.012,88; n.° 08………..os juros compensatórios no valor de EUR 1.279,43; adicional n.° 08…… de IVA do período de 0412T no valor de EUR 4.511,97; n.° 08….. de juros compensatórios no valor de EUR 674,94, (cf. cópia das liquidações a fls. 25 a fls. 32 dos Autos). 12. Em 26.2.2009 a impugnante procedeu ao pagamento do valor constante das liquidações descritas no ponto 11, no valor total de EUR 18099,74, (cf. pmfafls. 108 do PAT e vinheta aposta nas liquidações constantes a fls. 25 a fls. 32 dos Autos). 13. Em 29.5.2009 a presente impugnação deu entrada no Tribunal Tributário de Lisboa, através do sistema SITAF (cfr. fls.2 dos autos).»
Consignou-se, ainda, na sentença recorrida: «Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir.»
Em sede de motivação da matéria de facto consta, na referida sentença, o seguinte: «A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, na prova testemunhal produzida, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada.» * IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO A Impugnante insurge-se, no presente recurso, contra a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que manteve as liquidações oficiosas de IVA referentes ao ano de 2004 e juros compensatórios associados, face à falta de prova da materialidade das operações em causa, bem como à inobservância dos requisitos das facturas legalmente exigidos no âmbito do direito à dedução do IVA. Como resulta das alegações de recurso, este tem por objecto não só a matéria de facto apurada pela decisão recorrida, como as “erradas valoração dos factos apurados e a aplicação do direito que ao caso foi feita”. Da impugnação da matéria de facto O artigo 640° Código de Processo Civil (CPC) aplicável ex vi artigo 281° CPPT dispõe o seguinte: Artigo 640.° (Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto) 1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n. os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.° 2 do artigo 636.°. Desde já cumpre referir que estes ónus foram suficientemente cumpridos pela ora Recorrente. Vejamos, então. Insurge-se a Recorrente, desde logo, por ter sido omitido da matéria de facto provada, quando se impunha reconhecê-lo como assente, o seguinte segmento da petição inicial: “10. Sucede que a inspecção tomou conhecimento do número de facturas que tinham sido emitidas e entregues por aquela, precisamente graças à colaboração do ora impugnante que facultou todas as que tinham sido emitidas e entregues, bem como cópias dos respectivos meios de pagamento e recibos.” Ora, não estando em discussão nos autos o (in)cumprimento do dever de colaboração por parte do contribuinte, a factualidade ali referida não se mostra relevante para a decisão das questões suscitadas, razão pela qual se indefere o respectivo aditamento. Prossegue a Recorrente, indicando um “conjunto de factos alegados e cuja unidade temática justifica a sua apreciação conjunta, nesta sede”, a que aludem os artigos 11, 17 e 18, 31 a 35, 37 a 40, 42 e 44 a 52, 58 e 67: “11. E facultou, ainda, a identificação da pessoa —B........- que sempre se lhe apresentou como gerente e encarregado da dita firma, trouxe as facturas e os recibos, dirigiu e realizou a obras e recolheu os meios de pagamento entregues pela ora impugnante, em nome dessa empresa. 17. ... as obras descritas nas facturas e seus anexos, emitidas pela sociedade C........., L.da foram executadas, nesse tempo, pelo dito B........, como representante desta, com os trabalhadores por ele trazidos, com materiais adquiridos por ele, uns em nome da impugnante e outros em nome da dita firma e aplicados nessas obras. 18. Em circunstâncias absolutamente semelhantes às usuais no tipo de comércio. 31. Aquele indicado B........ sempre se apresentou quer à impugnante quer aos trabalhadores que consigo trouxe quer a fornecedores locais na zona da obra, como responsável dessa sociedade. 32. Foi com ele, representando a dita sociedade, que a impugnante acordou o regime de realização de obras por ajuste directo e os respectivos valores. 33. O mesmo foi o portador de facturas e recibos e, além do mais, assinou, com invocação da qualidade de gerente, diversos documentos emitidos por essa sociedade, tais como folhas de mão de obra utilizada, comunicações, facturas, recibos, etc... (cfr. doc. 2 a 12 da resposta em audição prévia). 34. Foi ele quem esteve sempre presente, durante anos, no local da obra, trouxe os trabalhadores, dirigiu-os e trabalhou ele próprio no tempo de decurso das obras. 35. Era o mesmo quem recebia do gerente da impugnante e arquitecto de profissão, instruções e desenhos destinados e necessários à execução das obras. 37. Todavia, os valores constantes desses cheques correspondem exactamente aos montantes da respectivas facturas a cuja liquidação se destinaram. 38. E foram entregues em nome dele porque ele assim o solicitava, invocando a sua qualidade de representante da C......... L.da. 39. E invocando, ainda, que necessitava de levantar os fundos correspondentes a cada cheque, localmente, a fim de fazer face à aquisição de materiais para a obra na zona e para pagar aos trabalhadores que Anha na mesma obra. 40. Em qualquer caso, é irrelevante o nome a favor do qual os cheques eram emitidos porquanto todos os cheques eram nominativos. 42. Por todos e cada um os valores representados nos cheques e, em contrapartida da sua entrega, o mesmo B........, entregou à impugnante os competentes recibos emitidos e assinados pela C......... L.da, como se constata de documentos juntos com a resposta ao direito de audição e de outros já constantes dos autos do processo administrativo. 44. A impugnante é uma sociedade cujos sócios são pais e filhos, cujo activo principal é constituído por uma herdade agro-florestal com cerca de 500 há, que explora, também, a actividade cinegética do tipo turístico e, pela sua reduzida dimensão, e porque o custeio das obras necessárias (de recuperação) ao exercício da actividade, tinha de ser feito por recurso a financiamentos bancários e suprimentos do sócio e porque o seu gerente é arquitecto, a modalidade da administração directa era a que se adequava e adequa ao caso, devendo o empreiteiro ser, necessariamente, uma pequena empresa. 45. Com efeito, trataram-se de obras de recuperação de construção centenária existente no local e que serve, ainda, de apoio turístico à actividade cinegética. 46. O dito B........ foi sempre o portador de facturas e recibos e, além do mais, assinou, com invocação da qualidade de gerente, diversos documentos emitidos por essa sociedade, tais como folhas de mão de obra utilizada, comunicações, facturas, recibos, etc... (cfr. docs 2 a 9 da resposta à audiência prévia no processo administrativo). 47. Foi ele quem esteve sempre presente, em 2004, no local da obra, trouxe os trabalhadores, dirigidos e trabalhou ele próprio, pernoitando na própria herdade quase sempre, no tempo de decurso das obras. 48. Era ele quem ia comprar materiais a fornecedores locais, no Redondo e cercanias (cfr. doc. 10 da mesma resposta) e que lhos venderam, acreditando eles próprios, tal como a respondente, que representava a empresa em nome da qual pedia as respectivas facturas. 49. Era o mesmo quem recebia do gerente da respondente e arquitecto de profissão, desenhos destinados e necessários à execução das obras (cfr. doc. 11 da mesma resposta). 50. Acresce que o gerente da impugnante esteve e está presente no local várias vezes por semana, além de que trabalham no local para a impugnante diversos empregados encarregues, também, de vigiar as obras. 51. Por tudo isto, não havia necessidade, nem legal nem outra, de adoptar contrato escrito de empreitada, pois que o próprio gerente da impugnante, directamente e através dos seus empregados presentes no local, dirigia e fiscalizava as ditas obras. 52. Nem a adopção da forma escrita é uso do comércio em circunstâncias semelhantes de contratação de serviços de obras em regime de administração directa. 58. ... factos e dados, legalmente, não acessíveis à impugnante, designadamente os relativos ao seu quadro de pessoal e nome e ao número de trabalhadores inscritos na segurança social. 67. A impugnante agiu como agiria qualquer sujeito normal perante as mesmas circunstâncias, aceitando a invocação da qualidade e a assinatura do Sr. B........ como representando aquela sociedade (cfr. art. 260 do CSC) e aceitando facturas devidamente numeradas, com menção da Apografia, com todos os demais dizeres, de sociedade validamente constituída, com NIPC validado em seu nome no site da DGCI, em 2004, como ainda hoje.” Desde já se adianta que os artigos 11, 17, 31, 34 e 38 contemplam factualidade que já consta do probatório, nos seguintes termos: “ 3. Foram realizadas obras numa herdade propriedade da J........, Lda. por trabalhadores trazidos por B......... 4. Nas obras referidas no ponto anterior, B........ intitulava-se gerente da sociedade C........, LDA. 5. A impugnante emitiu vários cheques à ordem de B.........” Todavia, da análise da prova documental e testemunhal produzida nos autos, cumpre ainda dar como provados os seguintes factos: 14. Foi com B........, representando a dita sociedade, que a impugnante acordou o regime de realização de obras por ajuste directo e os respectivos valores – cfr. depoimentos de A........, secretária da Impugnante ao tempo dos factos, e de J........, arquitecto que acompanhou as obras realizadas na Herdade da D........, os quais demonstram conhecimento directo da factualidade em causa, merecendo, assim, inteira credibilidade. 15. Era o dito B........ quem ia comprar os materiais aplicados na obra a fornecedores locais, no Redondo e cercanias e que lhos venderam, acreditando eles próprios, que representava a sociedade C........, LDA - cfr. doc. 10 junto com o requerimento de audição prévia, conjugado com os depoimentos das testemunhas D........l, contabilista da Impugnante ao tempo dos factos e M........, empresário de construção civil que forneceu materiais para a obra na Herdade da D........, cujos relatos se mostraram coincidentes e inteiramente credíveis. Relativamente aos demais artigos da petição inicial, da mesma “unidade temática”, cujo conteúdo pretende ver aditado ao probatório, com a redação proposta, ou são conclusivos ou são meros argumentos e raciocínios tendentes a infirmar as conclusões a que se chegou no relatório dos Serviços de Inspeção Tributária, pelo que não poderiam ser levados à matéria de facto como pretende a Recorrente. Relativamente aos factos alegados nos artigos 29º e 30º da petição inicial, não se justifica o seu aditamento à matéria de facto provada, uma vez que não foram postos em causa pela Autoridade Tributária e Aduaneira no relatório de inspeção. Por fim, ainda em sede de impugnação de decisão de facto, a Recorrente sustenta que “o facto 8 da sentença a quo deveria incluir ainda – errando o julgamento, por não o fazer – que as facturas emitidas pela sociedade C........., L.da se encontravam completadas por anexos, contendo a discriminação dos demais requisitos legais e regulamentares, designadamente as quantidades dos trabalhos e serviços prestados e seus valores unitários, quando aplicável, como resulta dos documentos contidos no processo administrativo em que se formaram as liquidações impugnadas, a fls…., em especial os documentos oferecidos pela ora impugnante no exercício do direito de audição prévia”. Analisados os documentos juntos com o requerimento de audição prévia, verifica-se que os doc. 2 a 5 e 7 a 9 consistem em listagens com indicação do número de dias de trabalho e remunerações auferidas pelos trabalhadores e, nalguns casos, “despesas do gerador” e “deslocações”, não sendo, contudo, possível estabelecer uma correlação entre tais documentos e cada uma das facturas em causa nos autos. Termos em que se indefere o requerido aditamento, improcedendo, nesta parte, o presente recurso. Da errada valoração dos factos apurados e errónea aplicação do Direito Conforme decorre do probatório, a A.T. fundamentou as correcções ao montante de IVA deduzido pela impugnante, na existência de fortes indícios de que as facturas emitidas pela sociedade C........, LDA não correspondem a reais e efectivas transmissões de bens ou serviços e ainda porque as facturas apresentadas pela impugnante não cumpriam os requisitos do artigo 35.° do CIVA. Relativamente ao primeiro fundamento das correcções, a Impugnante invocou, em síntese, na petição inicial que os factos em causa são imputáveis exclusivamente à sociedade emitente das facturas em causa e dela desconhecidos, salientando, relativamente ao número de trabalhadores da referida sociedade, que esta tanto podia prestar os trabalhos com recurso ao seu pessoal, como o podia fazer mediante a contratação directa de sub-empreiteiros e ao que a Impugnante sempre seria alheia. E que ao imputar a utilização de facturas falsas à Impugnante, a AT “fá-lo sem invocar, sequer, um único facto, falso ou verdadeiro, que estabelecesse um nexo de imputação mínimo”. Pronunciando-se sobre a questão em causa, a sentença recorrida considerou o seguinte: “No campo do direito à dedução de custos em sede de IVA, a administração fiscal não actua baseada na existência de qualquer facto tributário por si invocado que como tal deve provar, antes põe em causa um facto tributário invocado pelo contribuinte para a dedução, porque face aos indícios recolhidos considera que não se realizaram as operações comerciais que tais facturas, supostamente, titulam. Assim, é o impugnante quem se arroga de um direito que pretende exercer - o direito à dedução do IVA, que não é reconhecido pela Administração Fiscal. Destarte, não é a Administração que afirma um facto positivo com consequências tributárias - é o contribuinte que invoca o seu direito à dedução do IVA pago a montante. Por isso, é ele quem deve provar a verificação dos pressupostos em que assenta tal direito. (Neste sentido vide Ac. do STA n.° 01026/02 de 07.05.2008, disponível para consulta em www.dgsi.pt).” Ora, neste domínio, como tem sido amplamente firmado pela jurisprudência mais recente dos tribunais superiores, quando a AT desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT), competindo à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. E só no caso de ser feita essa demonstração, é que passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção (cfr., entre outros, os acórdãos do TCAS de 30.04.2025, processo 2324/09.2BELRS, e de 22.05.2025, processo n.º 249/09.0BESNT, disponíveis em www.dgsi.pt). O que significa que o tribunal de 1ª instância errou ao fazer recair o ónus da prova sobre a Impugnante, sem antes aferir se os elementos reunidos pela AT configuravam indícios sérios de faturação falsa. Cumpre, assim, antes de mais, analisar tais elementos, convocando para o efeito o segmento do relatório de inspecção que a eles se reporta: “3.1.3.1- IVA indevidamente deduzido, por se apresentar suportado por facturas de favor Face à informação recolhida pelos Serviços de Inspecção e a consequente emissão de ficha de fiscalização, os suportes formais (facturas ou documentos equivalentes) ao IVA deduzido contabilizados pelo sujeito passivo J........ LDA, referentes aos serviços prestados pelo subempreiteiro C........, LDA, do sujeito passivo em análise, não correspondem a serviços efectivamente prestados pelo mesmo, pelos motivos que resumidamente indicamos: - O sócio e gerente da, C........ LDA, nunca compareceu às nossas solicitações, e salienta-se, que a firma é desconhecida na morada da sede. - Impossibilidade da realização dos trabalhos facturados em 2004, por insuficiência de estrutura produtiva/humana, da empresa C........ LDA, conforme informação da Segurança Social. Por outro lado o sujeito passivo objecto do presente procedimento, apresentou fotografias das obras, facturas e cheques. Porém, os meios de pagamento utilizados pela sociedade, cheques indicam um único beneficiário Sr. B........, que se constatou, pela pesquisa efectuada, não ter nenhum relacionamento profissional ou outro, com a empresa C........., Lda. Também, não apresentou outros elementos solicitados, (que visavam a comprovação inequívoca das prestações de serviços facturadas, alegadamente realizadas pela C........ LDA), nomeadamente, os contratos, autos de medição, nome e n.° de trabalhadores, etc. Em conclusão, o sujeito passivo respondeu à(s) notificação(ões) porém, os elementos apresentados não comprovam as prestações de serviços facturadas pela alegada firma. (Anexo II)» Ora, tais indícios não se revelam suficientes para sustentar um juízo seguro acerca da falsidade das facturas em causa, salientando-se, nomeadamente, a natureza conclusiva da afirmação de que a empresa emitente das facturas não possuía estrutura produtiva e humana para realizar os trabalhos facturados, sem qualquer concretização dos factos apurados, nomeadamente junto da Segurança Social e considerando, por outro lado, a possibilidade de aquela empresa subcontratar terceiros para a realização dos trabalhos em causa, situação que ocorre com alguma frequência no sector da construção civil. Acresce que a falta de apresentação pelo sujeito passivo dos elementos solicitados pelos serviços de inspecção – contratos, autos de medição, etc. – não pode ser valorada em sede de demonstração de indícios de facturação falsa, sob pena de, na prática, fazer recair de imediato o ónus da prova da veracidade das operações sobre o sujeito passivo, quando tal deve ocorrer apenas nas situações em que esteja devidamente sustentada a suspeição de falsidade das operações tituladas pelas faturas. Em consonância com o exposto, é de concluir que o tribunal a quo errou na interpretação que fez do nº 3 do artigo 19º do CIVA, em matéria de ónus da prova, mostrando-se ilegais as correcções efectuadas pela AT com base naquele fundamento legal. Todavia, verifica-se que não foi apenas com base nesse fundamento que as faturas foram desconsideradas para efeitos de dedução do IVA, mas também pela insuficiência dos descritivos das faturas, no sentido de não permitirem averiguar qual a extensão e a natureza dos serviços prestados. Vejamos. Prescrevia o n° 5 do artigo 35º CIVA, que tinha por epígrafe “Prazo de emissão e formalidades das faturas e documentos equivalentes”, com a redação introduzida pelo Decreto-Lei n° 256/2003, que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2004: “5 - As faturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos: a) Os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto; b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efetivamente transacionadas deverão ser objeto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução; c) O preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável; d) As taxas aplicáveis e o montante de imposto devido; e) O motivo justificativo da não aplicação do imposto, se for caso disso. f) A data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, em que os serviços foram realizados ou em que foram efetuados pagamentos anteriores à realização das operações, se essa data não coincidir com a da emissão da fatura g) No caso de a operação ou operações às quais se reporta a factura compreenderem bens ou serviços sujeitos a taxas diferentes de imposto, os elementos mencionados nas alíneas b), c) e d) devem ser indicados separadamente, segundo a taxa aplicável.» O tribunal de 1ª instância validou o fundamento em análise, com base na seguinte argumentação: “Da análise das facturas que atestam a aquisição de serviços e produtos pela impugnante e que foram consideradas pela administração como aquisições não dedutíveis, verifica-se a presença dos elementos exigidos pela alínea a) da disposição supracitada, mas sem qualquer discriminação dos serviços concretamente prestados (cf. do ponto 8 dos factos provados). A factura ou documento equivalente deve ser emitida pelo sujeito passivo “por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vem definido nos artigos 3.° e 4.° do CIVA, bem como pelos pagamentos que lhe sejam efectuados antes da data de transmissão de bens ou prestação de serviços” - artigo 28.°, n.° 1, alínea b), do CIVA Na verdade, é reconhecido o carácter formalista do IVA, em ordem nomeadamente, a evitar, o mais possível, a evasão fiscal, pelo que as respectivas formalidades o são ad substanciam, que não meramente ad probationem”. Nos autos está em causa a alegação de uma prestação de serviços pela empresa C........, LDA, nos termos das facturas por esta emitidas, no entanto, das facturas não consta qualquer discriminação dos trabalhos realizados na obra, dos valores que correspondem a materiais transaccionados e a mão de obra, as mesmas não respeitam o disposto no art ° 35°, n° 5, al. b) do CIVA. Com efeito, o que o legislador pretendeu foi evitar a fuga e a fraude fiscal, exigindo várias formalidades aos documentos que atestam a existência de factos tributários, designadamente nas transmissões de bens e prestações de serviços, pelo que as facturas ou documentos de suporte devem obedecer a todos os requisitos do art.º 35° do CIVA. (…)”. Com efeito, a sentença recorrida não relevou, de forma nenhuma, a factualidade apurada nos autos sob os pontos 3., 4. e 5. do probatório, à qual acrescem os factos aditados por este Tribunal, e que permitem apreender a situação relacionada com a materialidade das operações apontadas os autos, a qual, aliás, nunca foi verdadeiramente posta em causa pela administração fiscal, limitando-se a afirmar que tais operações não poderiam ter sido realizadas pela empresa emitente das facturas, ou seja, uma pretensa simulação relativa. Ora, decorre de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se os requisitos materiais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham omitido certos requisitos formais. Por conseguinte, quando a Administração Tributária dispõe dos dados necessários para saber que os requisitos materiais foram cumpridos, não pode impor requisitos suplementares ao direito do sujeito passivo de dedução do imposto que possam ter por efeito eliminar esse direito (Acórdão de 29 de setembro de 2022, Raiffeisen Leasing, C-235/21, EU:C:2022:739, n.° 38 e jurisprudência referida). No presente caso, não há dúvida de que as prestações de serviços tituladas pelas facturas ocorreram, tendo o respectivo imposto sido suportado pela Recorrente, tal como resulta da factualidade dada como provada, o que significa que ficou demonstrado o cumprimento dos requisitos substantivos do direito à dedução, pois que, tendo em conta, nomeadamente, a realidade material, que o Tribunal apreendeu, os elementos carreados para o processo e as facturas propriamente ditas permitiram ao Tribunal conhecer as operações em causa e, nesta medida, a natureza dos serviços prestados. Deste modo, face aos concretos contornos de facto da situação em apreço, a verificação dos elementos constantes das facturas que impede a dedução do IVA traduziu-se numa apreciação demasiado restritiva da matéria em apreço, colocando em crise os princípios da neutralidade e da proporcionalidade, uma vez que a ora Recorrente logrou demonstrar a existência de dados suficientes para provar que preenche os requisitos materiais para beneficiar, in casu, da dedução do IVA, o que implica a procedência do presente recurso. * Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, formulam-se as CONCLUSÕES: I. Nos termos da alínea a) do n° 2 e no n° 3 do artigo 19.º CIVA, só confere direito à dedução o imposto mencionado em faturas passadas na forma legal e não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura. II. Quando a AT desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT), competindo-lhe fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. III. Tal ónus da prova não se mostra cumprido em face da natureza conclusiva da afirmação de que a empresa emitente das facturas não possuía estrutura produtiva e humana para realizar os trabalhos facturados, sem qualquer concretização dos factos apurados, nomeadamente junto da Segurança Social e considerando, por outro lado, a possibilidade de aquela empresa subcontratar terceiros para a realização dos trabalhos em causa, situação frequente no sector da construção civil. IV - A falta de apresentação pelo sujeito passivo dos elementos solicitados pelos serviços de inspecção – contratos, autos de medição, etc. – não pode ser valorada em sede de demonstração de indícios de facturação falsa, sob pena de, na prática, fazer recair de imediato o ónus da prova da veracidade das operações sobre o sujeito passivo, quando tal deve ocorrer apenas nas situações em que esteja devidamente sustentada a suspeição de falsidade das operações tituladas pelas faturas. V. É jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se os requisitos materiais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham omitido certos requisitos formais, sendo que a posse de uma factura com as menções previstas no artigo 226º da Directiva IVA constitui um requisito formal e não um requisito material do direito à dedução do IVA.
Decisão Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, revogar A SENTENÇA recorridA e julgar a impugnação judicial procedente, anulando em consequência a liquidaçÃO impugnada. Custas pela Recorrida, sem taxa de justiça por não ter apresentado contra-alegações (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil; artigo 7.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais).
Registe e notifique.
Lisboa, 30 de setembro de 2025 (Ângela Cerdeira)
(Teresa Costa Alemão)
(Cristina Coelho da Silva) |