Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:886/08.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/23/2025
Relator:ANA CRISTINA CARVALHO
Descritores:IRC
MÉTODOS INDIRECTOS
CRITÉRIOS DE CORRECÇÃO
ERRO NA QUANTIFICAÇÃO
Sumário:I – Considera-se ocorrer erro na quantificação da matéria tributável apurada por métodos indirectos, se não são explicitadas as circunstâncias que justificam a não utilização dos valores resultantes do valejo realizado recentemente pelo IVV, em que os bens em excesso e em falta se equivalem;
II – Nas circunstâncias descritas em I, os valores resultantes do valejo realizado recentemente pelo IVV devem merecer a mesma credibilidade para a quantificação quer de bens em falta, quer em excesso e não apenas para quantificar os bens em falta, não bastando à ATA alegar que os critérios de quantificação foram objectivos e adequados, ou que se encontram dentro da normalidade e razoabilidade.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

A Fazenda Pública, inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial intentada pela C… -V… S.A., contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e respectivos juros compensatórios, referentes ao exercício de 2004, no valor global de €203 374,42, dela veio interpor recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«A. Não pode a Fazenda Pública concordar com a decisão do douto Tribunal, pois ao contrário do entendimento vertido na sentença aqui em análise, os critérios utilizados pelos SIT encontram-se corretos, não tendo sido apurada matéria tributável excessiva.

B. Atente-se que a metodologia de tributação por métodos indiretos, não comporta a mesma precisão de apuramento de imposto da resultante do método declarativo, sendo alcançada mediante índices que só por coincidência concordarão com a realidade, subsistindo sempre um concreto grau de dúvida sobre a quantificação, a qual só constituirá dúvida fundada quando o contribuinte, positivamente, prove que a quantificação em causa é errada.

C. Ao contrário do entendimento vertido na douta sentença, a AT cumpriu o ónus de provar os pressupostos de determinação da matéria coletável por métodos indiciários, enunciando o critério utilizado na respetiva quantificação, expondo os elementos convincentes em que fez assentar o volume da matéria coletável presumida, de forma objetiva, racional e fundamentada.

D. Tal demonstra que os STI atuaram em conformidade com o disposto no artigo 90.º da LGT, tendo adotado os critérios de normalidade e razoabilidade, fundamentando as correções em dados objetivos e racionais, o que se comprova pela circunstância de se ter desprezado o valor apurado respeitante a vendas de bebidas espirituosas omitidas em 2004 e o correspondente IVA a liquidar, bem como por se ter utilizado o rácio da rentabilidade fiscal das vendas após as correções propostas, por forma a que os valores apurados pudessem ajustar-se o mais possível à realidade em causa.

E. Ora, no caso em apreço e contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal, a sociedade recorrida não logrou provar, como lhe incumbia, que existiu erro ou manifesto excesso na quantificação, o que demonstra a legalidade das correções efetuadas pelos SIT.

F. Importa ainda atentar, salvo o devido respeito, que no caso sub júdice, a douta sentença pronuncia-se excessivamente em relação ao objeto da impugnação, infringindo a delimitação imposta pelo princípio do dispositivo (artigo 608.º, n.º 2 do CPC) à atividade jurisdicional, que na sua decisão teria de circunscrever-se ao objeto da ação.

G. A douta sentença que ora se recorre, defende a inexistência de qualquer justificação do relatório de inspeção, argumento que não foi utilizado pelo impugnante, ora recorrido.

H. Como decorre do princípio do dispositivo das partes, o objeto de uma impugnação no que concerne aos seus fundamentos, é definido e delimitado pelo Impugnante na respetiva petição inicial, verificando-se no caso em apreço, que o Impugnante, ora recorrido, não coloca em causa a fundamentação do relatório de inspeção.

I. Assim, tendo o douto Tribunal decidido como efetivamente o fez, foi muito além do conhecimento das questões que lhe foram suscitadas pelas partes, o que acarreta um vício de nulidade da Sentença por excesso de pronúncia, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT, o qual se invoca para todos os efeitos legais;

J. Neste contexto, entende a Fazenda Pública que o Tribunal a quo errou no seu julgamento de facto e direito, enfermando a sentença de uma errónea apreciação dos factos relevantes para a decisão e de uma errada interpretação da lei aplicável ao caso em apreço, devendo a sentença ser revogada e substituída por outra que julgue a impugnação judicial totalmente improcedente.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação judicial totalmente improcedente.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!»


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A Recorrida, apresentou as suas contra-alegações, rematando-as com as seguintes conclusões:

«1ª. Não indicando a recorrente a concreta prova que não teria sido conseguida pela impugnante, fica-se sem saber onde está a falha probatória quer da impugnante quer da sentença.

2ª. Verificando-se que a recorrente não cumpre nenhum dos ónus impostos pelo art. 640° do CPC, aplicável por remissão do art. 281° do CPPT.

3ª. Ainda assim, e apesar de ignorados pelo recurso, o RIT enferma de pelo menos dois erros graves de quantificação que foram plenamente demonstrados pela impugnante e corroborados pela douta sentença recorrida Erros sintetizados no ponto 6 destas contra-alegações.

4ª. O excesso de pronúncia assacado à sentença por supostamente se ter pronunciado sobre questões não invocadas pela impugnante é incompreensível e mais incompreensível se toma quando está em causa a questão do varejo do IVV, que parece ser aquela onde, para a recorrente, terá ocorrido a falta de fundamentação e portanto logo o excesso de pronúncia.

5ª. Atendendo no alegado dos arts. 28° a 49° da petição de impugnação logo se vê que não faz sentido a alegada falta de fundamentação e portanto o invocado excesso de pronúncia da sentença.

Termos em que se requer a V. Exas., que recusem a procedência total do recurso, confirmando a douta sentença recorrida.»


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No despacho que admitiu recurso, o Tribunal pronunciou-se sobre nulidade da sentença por excesso de pronúncia arguida pela Fazenda Pública, considerando não se verificar tal nulidade, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

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A Digna Magistrada do Ministério Público, junto deste Tribunal Central, emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pela recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Importa assim, decidir se a sentença recorrida:

i) É nula por excesso de pronúncia ao declarar que inexiste qualquer justificação do relatório de inspecção sobre o critério de quantificação, quando não foi invocada pela Recorrida a falta de fundamentação do relatório de inspecção, em violação do princípio do dispositivo previsto no artigo 608.º, n.º 2 do CPC;

ii) Padece erro de julgamento de facto e de direito quanto ao excesso de quantificação da matéria tributável.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

III – 1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«A) A Impugnante é uma sociedade anónima (anteriormente designada “B…, SA”), cujo objecto é a produção, distribuição e comercialização de vinhos e seus derivados e licores, promoção e organização de eventos e enoturismo (cfr. RIT a fls. 45 e seguintes do PA apenso – Vol. I):

B) A Impugnante encontra-se enquadrada no regime geral de tributação em sede de IRC, e integra o perímetro fiscal do Grupo P…tributado ao abrigo do Regime Geral de Tributação de Grupo de Sociedades - REGTS (cfr. RIT, fls. 64 do PA apenso – Vol. I);

C) Em cumprimento da ordem de serviço nº OI200600873 de 29.03.2006, da Direcção de Finanças de Aveiro, a Impugnante foi objecto de acção de inspecção externa, de âmbito geral, aos exercícios de 2003 e 2004, com o objectivo de controlo das operações relevantes do sujeito passivo, relativamente ao cumprimento de obrigações fiscais (cfr. RIT a fls. 56 e seguintes do PA apenso – Vol. I);

D) Em 02.08.2007, foi elaborado o Relatório final de Inspecção Tributária (RIT), cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, no qual se determinou a correcção técnica de valores declarados (ponto IV.2.1. do RIT) e ainda o recurso a métodos indirectos para determinação da matéria colectável (ponto IV.2.2. do RIT) (cfr. RIT, fls. 52 e seguintes do PA apenso – Vol.I);

E) No que se refere a correcções técnicas, a respeito do exercício de 2004, extrai-se do RIT, designadamente, o seguinte:

2. Falta de contabilização de facturas emitidas à empresa M… em Março de 2004

Na sequência da conciliação dos valores mensais constantes do ficheiro da estatística de vendas fornecido pela empresa em formato digital com os valores contabilizados [procedimento necessário dado o total anual da estatística de vendas, após ajustamentos, ser superior ao valor contabilizado], apurou-se que no exercício de 2004 foram emitidas pelo M…–S…, Lda., … as facturas que indicamos no quadro seguinte, não tendo estas sido relevadas contabilisticamente na respectiva conta de proveitos da empresa:


«Imagem em texto no original»


Analisados os D.A.A’s referenciados nas facturas, verificamos que em todos eles consta como expedidor o s.p. e como destinatário as C…, tendo-se apurado que esta empresa prestou à empresa M… serviços de enchimento do vinho, tendo emitido a esta factura relacionada com essa prestação de serviços, significando isto que as facturas emitidas pelo s.p. titulam de facto vendas realizadas e não registadas na contabilidade. Face ao exposto, vai o montante de 30.935,19 € acrescer-se para efeitos de tributação do ano de 2004, nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 20.° do CIRC.

Juntam-se em Anexo 34 fotocópias das facturas e respectivos D.A.A/s bem como Mapa de Vendas Artigo/Cliente do mês de Março de 2004. (…)” (cfr. RIT, fls. 104 e 105 do PA apenso – Vol.I);

F) No capitulo IV do RIT, foram indicados os motivos e expostos os factos que implicaram o recurso a métodos indirectos, aí se referindo que se mostra preenchido o requisito a que alude a alínea b) do artigo 87º da LGT, com base nos seguintes fundamentos:

1 - Contabilidade não reflecte todos os movimentos - existência de D.A.A/s relativos a aquisições de bens para os quais não existe factura de compra ou documento equivalente;

2 - Inexistência de sistema de inventário permanente;

3 - Deficiências detectadas na elaboração dos inventários fiscais ao nível da quantificação e valorimetria das existências e pelo facto de existir um apuramento de dívida de IEC em varejo realizado pela DGAEC - Alfândega de Aveiro e sua contabilização;

4 - Inventários fiscais reportados a 31.12.2002, 31.12.2003 e 31.12.2004 reflectem quantidades diferentes das constantes dos livros de registo de produtos vitivinícolas;

5 - Inventários fiscais facultados na acção inspectiva, diferentes dos facultados à DGAIEC - Alfândega de Aveiro (acção de inspecção n° 050052 aos exercícios de 2002,2003 e 2004), diferenças essas verificadas quanto ao tipo de produtos inventariados, quantidades dos produtos inventariados e preços unitários de diversos produtos;

6 - Lançamentos contabilísticos sem documento de suporte adequado;

7 - Não relevação contabilística de quebras

(Cfr. RIT, fls. 87 a 102 do PA apenso – Vol.I);

G) Relativamente à determinação da matéria colectável com recurso a métodos indirectos, e no que concerne aos produtos vitivinícolas, refere o RIT o seguinte:

A) Critérios utlizados na quantificação por métodos indirectos - fundamentação

(…) A.2. PRODUTOS VTTIVINICOLAS - EXERCÍCIOS DE 2003 E 2004

A.2.1. Do controlo de existências efectuado pelo I.V.V. (Instituto da Vinha e do Vinho) nas instalações da empresa em 11 de Março de 2004, resultou o apuramento de:

i) falta em armazém de um volume de 313.516 litros, supostamente vendidos sem documento de suporte, conforme se resume no quadro seguinte: (...) Total: 313.516

ii) volumes em excesso em armazém para os quais não foram apresentados documentos de suporte e que foram apreendidos, conforme se resume no quadro seguinte:

(...) Total: 282.066

(…)

A.2.2 … tendo ainda em conta…:

- inexactidões nos registos vitivinícolas por falta de indicação dos documentos de entrada, de saídas, falta de indicação do grau, registos fora de ordem cronológica;

- inexistência de saldos de existências que comportem quantidades facturadas;

- omissão de compras de vinhos;

- existência de vendas sem emissão de factura ou documento equivalente; foi a empresa questionada por escrito (…)

Em resposta à notificação informou o mesmo que: “3 – Esta situação deve-se a transferências de vinhos de umas contas correntes para outras. Pois o que está a mais no Anexo II está a menos no Anexo I esta situação deve-se a desclassificações de vinhos que por vezes não foram actualizadas nas contas correntes (…)

A.2.3. Relativamente à justificação apresentada para o apuramento de vinhos em falta e em excesso (transferências de vinhos de umas contas para outras, a desclassificação de vinhos não actualizados nas contas correntes e a erro na Declaração de Existências à data de 31-07-2002), entendemos importante referir os seguintes aspectos:

- Os vinhos portugueses estão classificados em quatro níveis: Vinho de Mesa (...) Vinho Regional (...) Vinho de Denominação Controlada (DOC) (...) Vinho de Qualidade Produzido em Região Demarcada (VQPRD) (…).

A justificação apresentada de desclassificação dos vinhos, não tem qualquer aderência à realidade, pois esta situação raramente ocorre e só quando o produtor verifica que é inexequível a venda do produto atribuindo-lhe aquela categoria.

(…) a desclassificação … quando ocorre, pode diminuir as taxas a pagar de certificação e de promoção.

- atendendo à classificação dos vinhos apontada, os volumes em falta e em excesso apurados pelo IVV dividem-se da seguinte forma por classe de vinho:




A “desclassificação” de vinhos VQPRD, DOC e Regionais para vinhos de mesa obedece a requisitos (…)

- O s.p. refere que as diferenças encontradas pelo IVV se devem a transferências por desclassificação de uns vinhos para outros que não foram registados nos livros, porém não identificou nem comprovou devidamente nenhum desses movimentos. (...)

As desclassificações solicitadas pelo contribuinte e cedidas pelo IVV foram tidas em conta nas condições referidas. (…)

- Atendendo ao conteúdo do ofício do IVV mediante o qual foi comunicado ao s.p. o montante da taxa de promoção a entregar pelo volumes em falta no armazém, apenas não foi considerada a desclassificação de 12.000 litros de vinho Tinto Dão para vinho de mesa tinto, pelas razões já referidas; assim será a mesma tida em conta nos cálculos a efectuar, donde os volumes em falta e em excesso em armazém passam a ser os seguintes:



- … o contribuinte procedeu ao pagamento das taxas de promoção relativas aos volumes de vinho apurados em falta, o que, do nosso ponto de vista é mais um facto que confirma a existência de vendas sem facturas, pois naturalmente ninguém paga o que é indevido.

A.2.4. Perdas nos produtos vitivinícolas

(...)

Então, para o cálculo das vendas em falta de produtos vitivinícolas concedeu-se uma perda na ordem dos 6,5%, assim decomposta:

i) 5%, valor atribuído nas várias operações, desde resíduos que ficam depositados nos recipientes que contenham mostos ou uvas, passando pela fermentação, tratamento autorizado e armazenagem; e

ii) 1,5%, para manipulação e trasfegas (percentagem indicada na alínea a) do n° 1 do art. 39º do CIEC para as perdas na armazenagem de bebidas alcoólicas).

No entanto, não podemos deixar de sublinhar que as aquisições do contribuinte são, na sua esmagadora maioria, de vinho, produto este que já não está sujeito às operações iniciais. (…)

As perdas referidas têm a ver com as faltas encontradas pelo IVV, uma vez que relativamente aos produtos vendidos o contribuinte foi registando nos livros as quebras conforme nos referimos no ponto IV.1.7.

(...)

B) Cálculos

(…) B.2 PRODUTOS VTTIVINÍCOLAS - EXERCÍCIO DE 2003 E 2004

B.2.1. Determinação das vendas omitidas de produtos vitivinícolas

A determinação do valor das vendas de vinho em falta nos exercidos de 2003 e 2004 obedecerá ao critério referido na al. h) do n° 1 do artigo 90° da LGT, ou seja, o valor de mercado dos bens tributados. Relativamente aos volumes em falta de VEQPRD não se aplicará o preço de venda médio do vinho espumante mas sim o preço de venda do vinho Regional (classe inferior), uma vez que entre o varejo de 05-11-2003 e 11-03-2004, decorreram apenas cerca de 4 meses, período inferior ao tempo mínimo de estágio do espumante normal que é de 9 meses.

Assim, aos volumes apurados em falta no armazém por classe de vinho, corrigidos da desclassificação Dão e de perdas totais na ordem dos 6,5%, aplicar-se-á o preço de venda médio praticado em 2003, na medida em que o controlo realizado pelo IVV ocorreu em inícios de Março de 2004.

Atendendo a que no controlo realizado pelo IVV em 5-11-2003 não foram encontradas diferenças entre as existências constantes dos livros de registo e as existências físicas em armazém e que em 11-03-2004 é que foram detectadas as diferenças para menos apontadas, considera-se razoável imputar os acréscimos resultantes da estimativa de vendas de produtos vitivinícolas na proporção dos dias de cada ano decorridos entre os varejos, ou seja 44% ao ano de 2003 e 56% ao ano de 2004, conforme se apura no quadro seguinte:




Os preços de venda médios apurados por classe de vinhos, com base no ficheiro de facturação do ano de 2003 são os seguintes:



56.662,85|78.559,70|1,39

Aplicando os preços de venda médios aos vinhos apurados em falta de armazém, após consideração da perda de 6,5% obtêm-se as vendas de vinhos omitidas:




As vendas de vinho omitidas imputam-se aos anos de 2003 e 2004 na proporção de 44% e 56% respectivamente, atendendo a ser estas as percentagens resultantes do tempo que mediou entre o varejo de 2003 e 2004 realizados pelo IVV:



B.2.2. Determinação das compras omitidas de produtos vitivinícolas

Considerando que:

- existem entradas de vinho (conforme D.A.A.'s enumerados no ponto iv.i.i.) em 2003, para as quais não existe factura de compra;

- no varejo realizado pelo IVV, em Março de 2004, foram apuradas em armazém quantidades de produto em excesso para os quais não foram apresentados os respectivos documentos de suporte, situação que configura a existência de compras de vinho sem factura;

- o s.p. … comprou e vendeu vinho a diversas empresas como M…, D…, A…, cuja gestão era assegurada por pessoas comuns. Algumas delas reduziram significativamente a sua actividade, vendendo (e em alguns casos transferindo apenas) os produtos, matérias-primas, marcas e inclusivamente algum equipamento para o s.p.. A este respeito, foi-nos referido em tom de desabafo, pelo administrador Dr. A…, que a empresa passou por momentos de grande confusão, chegando-se ao ponto de ninguém saber o que era de quem. Daí, provavelmente, ter havido emissão de alguns DAA’s pela M… ao s.p. que nunca chegaram a ser facturados.

(…)

- foi verificada a existência de diferenças entre os inventários fiscais de 2003 e 2004 exibidos no decurso da presente acção inspectiva e os facultados à Alfândega, nomeadamente quanto aos tipos de produtos, quantidades e preços unitários de diversos produtos vitivinícolas; situação anómala e que pode encapotar compras e vendas omitidas.

Vamos proceder à determinação do custo das matérias-primas consumidas, aplicando às vendas de produtos corrigidas (com as vendas estimadas de bebidas espirituosas e de produtos vitivinícolas e as correcções técnicas apuradas) e variação da produção (nula), o rácio da margem bruta sobre as vendas de produtos resultante das declarações apresentadas pelo s.p. (53,29% em 2003 e 53,23% em 2004), dado ser consistente de um ano para o outro e semelhante aos rácios do sector disponíveis para aqueles exercícios.

Aplicando às vendas dos produtos corrigidas a margem de 53,29% em 2003 e 53,23% em 2004, apura-se um acréscimo ao custo das matérias-primas consumidas no valor de 100.387,88€ em 2003 e de 108.774,95€ em 2004 (...)” (cfr. RIT a fls. 52 e seguintes do PA apenso – Vol. I);

H) Como resultado da acção de inspecção, foram efectuadas correcções à matéria colectável de IRC, referente ao exercício de 2004, no montante total de € 65.882,03, assim distribuídas:

· Omissão de proveitos - vendas omitidas de produtos vitivinícolas - € 199.348,47

· Omissão de proveitos - vendas à M… não contabilizadas - € 30.935,19

· Omissão de proveitos - vendas da Loja não contabilizadas - € 2.124,91

· Correcção do valor da variação da produção – (€ 61.993,54);

· Omissão de custos (compras omitidas de produtos vitivinícolas) - (€ 108.774,95);

· Custos não aceites - seguro de vida - € 4.241,95;

(Cfr. RIT, fls. 54 e 56 do PA apenso – Vol. I);

I) Em 09.08.2007 foi elaborado parecer pelo Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Aveiro, concordante com as propostas constantes do relatório de inspecção, onde conclui propondo, em face da alteração da sede da empresa, a remessa de um exemplar daquele relatório e anexos à Direcção de Finanças de Lisboa, bem como os documentos para fixação em IVA e IRC (cfr. RIT, fls. 53 do PA apenso – Vol. I);

J) Face à alteração da sede da Impugnante para a área do Serviço de Finanças de Loures 1, a Direcção de Finanças de Lisboa emitiu as Ordens de Serviço n°s 0I200707322 e 0I200707323 de 27.09.2007, tendo por base o relatório da acção de inspecção recebido da Direcção de Finanças de Aveiro (cfr. RIT da DF Lisboa, fls. 47 do PA apenso – Vol. I e fls. 181 do Vol. II);

K) Em 04.10.2007, foi elaborado pelos serviços de inspecção da Direcção de Finanças de Lisboa um relatório sucinto, acolhendo o relatório de inspecção da DF de Aveiro (cfr. RIT da DF Lisboa, fls. 44 a 51 do PA apenso - Vol. I);

L) Em 08.10.2007, foi proferido despacho pelo Director de Finanças Adjunto da DF de Lisboa, a determinar a fixação da matéria colectável referente aos exercícios de 2003 e 2004 nos montantes propostos (cfr. RIT da DF Lisboa, fls. 44 do PA apenso- Vol. I);

M) Na mesma data, em cumprimento de mandado emitido para o efeito, foi a Impugnante notificada, na pessoa de F…, na qualidade de seu administrador, do Relatório de Inspecção Tributária aos exercícios de 2003 e 2004 (cfr. fls. 201 a 206 do PA apenso - Vol. I);

N) Em 06.11.2007, a Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria colectável fixada por recurso a métodos indirectos, em sede de IRC, para os exercícios de 2003 e 2004, a que se refere o artigo 91º da LGT, com os fundamentos que se dão aqui por integralmente reproduzidos (cfr. fls. 288 e seguintes do PA apenso – Vol. II);

O) A reunião da Comissão de Revisão foi realizada em 03.12.2007, da qual foi lavrada e assinada a Acta n° 78/07 – Processo nº 1302 a 1305/2007, da mesma resultando não ter havido acordo, conforme laudos elaborados pelos peritos nomeados, dos quais consta, designadamente:

Laudo do perito do contribuinte

“Manifesto a minha discordância relativamente aos pressupostos utilizados pela Fiscalização. Não existiu acordo, pois não foi feita prova que permita alterar a posição assumida no pedido de revisão”

Laudo do perito da Fazenda Pública

“(…) III – No debate contraditório

No decorrer do debate, o perito do contribuinte, que não divergiu do alegado no pedido de revisão, confirmou o teor do mesmo (…).

(…) Pelo exposto, ao longo da petição em análise, o sujeito passivo vem alegar incoerência e pressupostos contraditórios na metodologia adoptada pela IT, para quantificação da matéria tributável e imposto (IVA), proprondo (teoricamente) metodologias alternativas. Porém não comprova, quer através de cálculos, quer através de documentos, os valores resultantes das metodologias que defende.

Apenas relativamente a uma das situações descritas a fls. 50 do relatório, nomeadamente a “Falta de contabilização de facturas emitidas à empresa M… em Março de 2004” – referiu o perito do sujeito passivo a existência de DAA’s, que se disponibilizou a fazer chegar, que podiam comprovar que não houve venda do produto à empresa. (…)” (cfr. fls 334 e seguintes do PA apenso – Vol. II);

P) O Director de Finanças de Lisboa procedeu à fixação da matéria colectável dos exercícios de 2003, no montante de € 362.142,53, e de 2004, no montante de € 661.599,91, através de despacho fundamentado proferido em 03.12.2007, que se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 351 a 363 do PA apenso – Vol. II);

Q) Em 18.12.2007, em cumprimento de mandado emitido para o efeito, foi a Impugnante notificada, na pessoa de F…, seu administrador, da decisão antecedente (cfr. fls 375 a 403 do PA apenso – Vol. II);

R) Em 16.01.2008, foi emitida em nome da Impugnante, a liquidação de IRC n° 2008.8310000177, respeitante ao exercício de 2004, no montante de € 203.374,42, incluindo juros compensatórios no montante de € 17.441,99 (cfr. fls 416 a 419 do PA apenso – Vol. II).

Mais se provou que:

S) O Instituto da Vinha e do Vinho, IP (“IVV”), no varejo realizado à Impugnante, por referência ao período de 01.08.2002 a 10.03.2004, apurou diferenças para menos (faltas) no total de 313.516 litros e para mais (sobras) no total de 316.064 litros, conforme quadros seguintes:


«Imagem em texto no original»

«Imagem em texto no original»


(Cfr. Doc. 4 junto com a p.i.);

T) A Impugnante emitiu à M…, Lda. as facturas nº 36292, 36293, 236294 e 36295, no montante de € 30.935,19, as quais se encontravam integradas no “mapa de vendas do mês”, mas não foram registadas contabilisticamente (cfr. artigo 18º da p.i., e RIT);

U) A Impugnante (ex-B…) enviou às C…, SA, vinho a granel, conforme as seguintes DAA’s – Documentos Administrativo de Acompanhamento:




(Cfr. Doc. 1 junto com a p.i.);

V) A M…, Lda. enviou à Impugnante vinho de mesa “Sesmarias” (marca pertencente à M…) acondicionado em 89.124 pacotes de 1Litro, conforme as seguintes DAA’s:




(Cfr. Docs. 2 junto com a p.i.);

W) A C…devolveu à Impugnante 3.000 litros de vinho a granel, conforme DAA’s nº CDT 1000196, de 19.04.2004 (cfr. Doc. 3 junto à p.i.);

X) A C…, SA emitiu à M…, SA, em 15.04.2004, pelo serviço de enologia e engarrafamento de 89.292litros a factura nº 4103441, no montante de € 6.502,87 (cfr. fls. 352 dos autos);

Y) No período inspeccionado (2003/2004), a secção de enologia da Impugnante não mantinha actualizados os registos relativos, designadamente, a transferências de tipo/qualidade de vinhos, o que motivou uma reorganização do departamento ao nível dos recursos humanos e procedimentos, tendo a Impugnante passado a dispor de inventário permanente (prova testemunhal);

Z) Os principais tipos de garrafas de vinho existentes no mercado e respectivas capacidades são:




(Facto notório).»
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A título de factualidade não provada exarou-se na decisão recorrida que:
«Não se comprovou que as facturas identificadas na alínea T) supra tenham sido anuladas ou inutilizadas.»

Em sede de fundamentação da matéria de facto consignou-se que:
«Quanto aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica da prova documental constante dos autos e do processo administrativo instrutor apenso, conforme especificado em cada uma das alíneas supra.
Para fixação do facto constante da alínea Y) contribuíram ainda os depoimentos de A… à data dos factos, responsável pela área financeira e contabilidade da Impugnante, e de B…, que desde 2004 trabalha para a Impugnante. Ambos afirmaram que na secção de enologia havia registos em atraso, lapsos, e que na sequência da presente inspecção houve lugar a reorganização desse departamento, a nível de recursos humanos e de procedimentos, tendo, aliás, sido introduzido o inventário permanente.
Quanto ao demais, e entre outras coisas, explicitaram de forma geral as razões de perda de qualidade dos vinhos e a sua desclassificação e as quebras existentes.

O depoimento de A… demonstrou-se confuso na parte respeitante à facturação emitida à M…, Lda., não tendo esclarecido cabalmente a razão daquela facturação nem o fluxo do vinho e a sua correspondência com as DAA’s.
Relativamente ao depoimento da Inspectora da AT, A…, não se mostrou determinante para a fixação de factos, tendo, no essencial, reiterado o já constante do relatório final de inspecção tributária.
No que concerne aos factos não provados, embora o Impugnante tenha protestado juntar prova da anulação/inutilização das facturas emitidas à M…, e, bem assim, tenha avançado uma justificação para o atraso na entrega dos documentos (cfr. fls. 351 dos autos), facto é que a prova inexiste.»
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III – 2. De Direito

A recorrente alega que a sentença é nula por excesso de pronúncia, uma vez que na petição inicial não foi invocada a falta de fundamentação do relatório de inspeção, violando assim o princípio do dispositivo (artigo 608.º, n.º 2 do CPC).

Vejamos.

Nos artigos 35 e 36 da petição inicial, a Recorrida alega o seguinte, reflectindo sobre os resultados do varejo do IVV (Instituto do Vinho e da Vinha) que constituiu a base de trabalho da fiscalização: constatamos que as quantidades que aí foram consideradas em falta (313 516 litros) foram as adoptadas para a fiscalização após a introdução de correcções que considerou necessárias. Já o mesmo não sucedeu, no que respeita às sobras ou excessos. Enquanto a AT quantifica as sobras em 282 066 litros (270 066 l) após desclassificações dos vinhos) o IVV computou as diferenças dessa natureza em 316 064 litros, conforme resulta do documento 4. Ou seja, as quantidades em excesso e em falta apuradas no varejo realizado pelo IVV neutralizam-se.

Mais alega no n.º 40 que essa pressuposição - «de assimilar excessos e faltas a compras e vendas por fora»; não pode deixar de causar a maior perplexidade, sobretudo se atentarmos na significância das quantidades envolvidas e no facto de a movimentação de tais quantidades ter conseguido escapar à vigilância de várias entidades de controlo.

O Tribunal recorrido, ao apreciar as compras e vendas omitidas relativamente a produtos vitivinícolas analisou o teor do relatório sobre a questão, concluindo que se verifica a invocada discrepância de critérios utilizados.

Concluiu o Tribunal recorrido o seguinte: «[a] AT não justifica em parte alguma do RIT qual o motivo da utilização dos valores constantes do auto de apreensão (cerca de 282.000 litros), em detrimento dos valores constantes do varejo, relativamente aos excessos, de modo a que o Tribunal pudesse fazer um juízo sobre a razoabilidade ou assertividade da escolha efectuada.

Não se compreendendo o porquê da actuação da AT, que aplica dois critérios distintos para as faltas e para as sobras, não pode deixar de se considerar comprometida a coerência no método utilizado.

Perante inexistência de qualquer justificação, certo é que se os valores resultantes do varejo tinham credibilidade para as faltas, a mesma credibilidade deveria ter sido atribuída aos excessos.

É que, segundo se depreende dos documentos a que se refere a alínea S) do probatório, e o auto de apreensão de fls. 3 a 7 do anexo 22 ao relatório (fls. 173-verso a 175 dos autos), o valor de volume em falta em armazém foi calculado a partir dos movimentos de produtos vínicos, pelo que o volume em excesso também o deveria ser, para que obedecesse ao mesmo critério de tratamento, já que os volumes apreendidos efectivamente podem não ter, ou não têm, correspondência com os resultantes desses movimentos.

Consequentemente, atendendo a que para efeitos de sobras (excessos) foram utilizados os valores constantes do auto de apreensão (e não os do varejo), tal conduziu a um acréscimo à matéria colectável resultante do acréscimo de € 199.348,47 efectuado às vendas deduzido do valor de € 108.774,95 referente a compras, correspondente ao acréscimo ao CMVMC (cfr. fls. 70 do RIT).

Termos em que se demonstra, não só, o erro no método escolhido pela AT – que enviesou os pressupostos de quantificação (já que parte de critérios distintos para apuramento de faltas e para apuramento de excessos) –, como também o consequente excesso da quantificação da matéria colectável.»

Conforme se depreende claramente do segmento da decisão recorrida analisada e transcrita, o tribunal não julgou que existia falta de fundamentação do relatório de inspeção, o que estava em causa era a coerência dos métodos usados pela inspecção.

O que o tribunal declarou é que, por falta de indicação do motivo pelo qual foram considerados adequados e utilizados os dados recolhidos pelo IVV no varejo que este levou a cabo, para os efeitos da determinação da quantidade de vinho em falta e já não os considerou adequados para a determinação da quantidade em excesso. Dito de outro modo, não se percebe por que motivo os valores utilizados são credíveis para um efeito e não o são para o outro.

Assim, concluiu o Tribunal recorrido que, tal como tinha invocado a Recorrida, não obedecendo a avaliação efectuada pela AT ao mesmo critério, estava comprometida a coerência do método, já que a credibilidade do varejo realizado pelo IVV deveria valer para ambas as quantificações.

Questionando a Recorrida a razoabilidade do método de quantificação, mal ou bem, tal não importa para a questão aqui em causa, sem que se perceba a razão pela qual foram utilizados como base de quantificação do vinho em falta os resultados do varejo do IVV e para a quantificação do vinho em sobra ou excesso o constante do auto de apreensão, que conduzem a resultados diferentes, impunha-se ao Tribunal recorrido apreciar a questão, não se verificando excesso de pronúncia.

Conforme decorre do disposto no artigo 608.º, n.º 2 do CPC, aplicável por força do artigo 2.º, alínea e) do CPC «[o] juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)».

Deste modo se conclui que não se verificando o excesso de pronúncia, não ocorre a arguida nulidade, improcedendo as conclusões F a I.


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Na conclusão C, alega a recorrente que ao contrário do decidido, a AT cumpriu o ónus de provar os pressupostos de determinação da matéria colectável por métodos indiciários, enunciando o critério utilizado na respectiva quantificação, expondo os elementos convincentes em que fez assentar o volume da matéria colectável presumida, de forma objectiva, racional e fundamentada.

Antes de mais, importa ter presente que na petição inicial a impugnante, ora recorrida, não colocou em causa os pressupostos para a avaliação indirecta da matéria tributável. O que impugna é a quantificação de matéria tributável imputando-lhe erros quanto ao método aplicado, bem como quanto à quantificação propriamente dita, no que se refere aos cálculos efectuados.

Assim sendo, foi por referência à concreta causa de pedir, que consiste no erro de quantificação da matéria tributável, que a sentença julgou a causa e o recurso deve ser balizado.

Dito isto, retomemos a apreciação da questão do critério utilizado na quantificação invocada no recurso que nos vem dirigido.

Alega a Recorrente que não foi apurada matéria tributável excessiva e que a metodologia de tributação por métodos indirectos não comporta a mesma precisão de apuramento do imposto relativamente ao método directo, decorrendo o primeiro de índices que comporta sempre um certo grau de dúvida sobre a quantificação e, por fim, que apenas haverá dúvida fundada quando se prove que a quantificação em causa está errada.

Mais alega que os serviços de inspeção actuaram «em conformidade com o disposto no artigo 90.º da LGT, tendo adotado os critérios de normalidade e razoabilidade, fundamentando as correções em dados objetivos e racionais, o que se comprova pela circunstância de se ter desprezado o valor apurado respeitante a vendas de bebidas espirituosas omitidas em 2004 e o correspondente IVA a liquidar, bem como por se ter utilizado o rácio da rentabilidade fiscal das vendas após as correções propostas, por forma a que os valores apurados pudessem ajustar-se o mais possível à realidade em causa (…) contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal, a sociedade recorrida não logrou provar, como lhe incumbia, que existiu erro ou manifesto excesso na quantificação, o que demonstra a legalidade das correções efetuadas pelos SIT.»

Ora, está em causa, como já o dissemos, o facto de terem sido utilizados como base de quantificação do vinho em falta os resultados do varejo do IVV e para a quantificação do vinho em sobra ou excesso o constante do auto de apreensão, que conduzem a resultados diferentes.

Sobre a questão decidiu-se na sentença o seguinte: «atendendo a que para efeitos de sobras (excessos) foram utilizados os valores constantes do auto de apreensão (e não os do varejo), tal conduziu a um acréscimo à matéria colectável resultante do acréscimo de € 199.348,47 efectuado às vendas deduzido do valor de € 108.774,95 referente a compras, correspondente ao acréscimo ao CMVMC (cfr. fls. 70 do RIT).

Termos em que se demonstra, não só, o erro no método escolhido pela AT – que enviesou os pressupostos de quantificação (já que parte de critérios distintos para apuramento de faltas e para apuramento de excessos) –, como também o consequente excesso da quantificação da matéria colectável.»

Efectivamente, sem que sejam explicitadas as razões pelas quais a credibilidade dos resultados do valejo realizado pelo IVV não serve para ambas as quantificações (faltas e excessos de vinho), ou as circunstâncias que justificam que tais valores não são utilizáveis, ou se encontrem desactualizados, não se pode concluir que os critérios de quantificação foram objectivos e adquados, ou sequer que se encontram dentro da normalidade e razoabilidade.

Com efeito, no caso concreto, a aplicação de critérios diferentes de quantificação conduz a resultados diferentes. Aplicando os valores resultantes do varejo realizado pelo IVV as quantidades de vinho em falta e em excesso equivalem-se e consequentemente neutralizam-se.

Ao invés, os critérios utilizados pela AT, conduziram um acréscimo da matéria tributável de € 90 563,52 valor resultante da diferença entre os proveitos considerados omitido (vendas de produtos vitivinícolas omitidos) no valor de € 199.348,47 e os custos considerados omitidos (compras de produtos vitivinícolas omitidas) no valor de € 108 774,95, conforme resulta do ponto H) da matéria de facto provada.

Perante tal diferença, impõe-se concluir que a sentença não incorreu em erro de julgamento quando concluiu que se verificava erro na quantificação da matéria tributável, mostrando-se improcedentes as conclusões de recurso.


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IV – CONCLUSÕES

I – Considera-se ocorrer erro na quantificação da matéria tributável apurada por métodos indirectos, se não são explicitadas as circunstâncias que justificam a não utilização dos valores resultantes do valejo realizado recentemente pelo IVV, em que os bens em excesso e em falta se equivalem;

II – Nas circunstâncias descritas em I, os valores resultantes do valejo realizado recentemente pelo IVV devem merecer a mesma credibilidade para a quantificação quer de bens em falta, quer em excesso e não apenas para quantificar os bens em falta, não bastando à ATA alegar que os critérios de quantificação foram objectivos e adequados, ou que se encontram dentro da normalidade e razoabilidade.

V – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 23 de Janeiro de 2025.


Ana Cristina Carvalho - Relatora

Ângela Cerdeira – 1.ª Adjunta

Patrícia Manuel Pires – 2.ª Adjunta