Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:210/14.3BECTB
Secção:CA
Data do Acordão:05/09/2024
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:PROCESSO DISCIPLINAR
PENA DE DEMISSÃO
Sumário:I- A ilicitude da conduta disciplinar consubstanciada nas ausências injustificadas não pode ser contornada com a apresentação de requerimento de licença sem vencimento, cuja mera apresentação não confere ao seu requerente automaticamente o direito correspondente.
II- Tendo pela Entidade Pública sido revogada a pena originariamente aplicada, o prosseguimento da instrução procedimental, corrigindo-se a circunstância que havia determinado a revogação determinada, não constitui a renovação do procedimento mas a sua mera retoma
III- Tendo sido retomada a instrução procedimental para momento anterior à elaboração do relatório final, por forma a atender já à defesa apresentada pelo arguido, mostra-se sanada a irregularidade verificada, não havendo, assim, que facultar novo contraditório ao arguido, pois que apenas esteve em causa a legitima e tempestiva revogação de um ato inválido, pois que a nota de culpa não foi alterada em face do que a resposta à mesma se mantém válida.
IV– Tendo o arguido dado 16 faltas injustificadas seguidas, o que nos termos da alínea g) do Artº 18º do ED aplicável, determinará a sua demissão, é certo que tal comportamento inviabilizou a manutenção da relação funcional, tanto mais que as referidas ausências não foram sequer justificadas do ponto de vista disciplinar (Artº 40º nº 4 ED).
V- O facto do arguido faltar injustificadamente a pretexto de discordar do horário que lhe foi atribuído, não pode ser considerado como desculpabilizante das suas ausências, antes constituindo um comportamento desviante e ilegítimo, que evidencia a declarada inviabilização da manutenção da relação funcional.
VI– A apresentação de um qualquer requerimento não pressupõe a sua aprovação pelo seu destinatário, tanto mais que não estamos perante um qualquer direito, mas tão-só face a uma faculdade da Administração.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I Relatório
O Ministério da Educação e Ciência, no âmbito da Ação Administrativa Especial contra si intentada por V…………. tendente à anulação do despacho proferido pelo Secretário de Estado do Ensino e Administração Escolar que lhe aplicou uma pena de demissão, inconformado com a Sentença proferida em 25 de agosto de 2023, no TAF de Castelo Branco que julgou a Ação parcialmente procedente, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão para esta Instância em 2 de outubro de 2023, formulando as seguintes conclusões:
“A. Sobre o segmento da douta Sentença referido, supra, em III, A.
1. A apreciação judicial a quo funda-se na invocada existência de renovação do procedimento disciplinar e, assim, na impossibilidade legal da mesma acontecer por força do regime assente no art. 63.°, do ED.
2. Norma muito complexa a exigir especial cuidado na sua aplicação, sob pena de levar a resultados desconformes.
3. O que veio a acontecer no caso em apreço.
4. É inconcebível, todavia, como entendeu o Tribunal a quo, que a impugnação jurisdicional fundamentada em preterição de formalidade essencial conduza por vinculação legal, no caso, do art. 63.°, ED, à renovação do ato instaurador ali prevista.
5. O que só poderia acontecer se no procedimento que aqui cuidamos tal desprezo pudesse ser assacado ao titular do poder disciplinar.
6. O que não aconteceu, logo na fase de defesa do então arguido.
7. Cuja resposta à acusação, subscrita e dirigida em 18.01.2013, apenas não foi levada em conta pelo simples facto de não ter sido conhecida em tempo.
8. Por facto imputável à distribuição postal, que apenas a entregou em 27.02.2013, a um tempo em que os autos já tinham sido dirigidos de Penamacor para o decisor, para Lisboa, factos que a decisão a quo não fixou com a clareza.
9. Não estando reunidos os pressupostos fundamentadores do mecanismo da renovação, ao tempo não tendo sido preterida, em bom rigor, qualquer participação do arguido por atuação, sequer negligente, do instrutor, em Novembro de 2013, a intervenção revogatória da decisão, foi tempestiva e competentemente levada a cabo, respeitando o art. 6.°, n.° 6, ED, e fazendo baixar os autos ao instrutor para ponderação da defesa.
10. O Tribunal não teve em conta o facto de se estar perante uma eventual causa de nulidade insuprível, não concebível, pois, como passível de “suprimento a impor” pelo Tribunal.
11. Ainda concebesse uma intervenção saneadora uma invalidade com o regime do art. 37.°, n.° 1 ED, tal não se compaginaria no caso da preterição não ser atribuível ao destinatário do disposto no art. 63.°, n.° 1, ED, mas terceiro.
12. Ao titular do poder disciplinar não penderia a faculdade de “renovar o ato instaurador”, que assentara, o que é pacífico, na mais completa legalidade, como não penderia a obrigação de “renovar o procedimento” por força do mesmo ser estranho e não ter contribuído para qualquer preterição essencial.
13. A esfera dispositiva da norma em causa não alcança nem contempla o que aqui nos traz.
14. Afirmar o contrário é conceber que um facto imputável a terceiro determine a renovação da decisão instauradora e do procedimento.
15. O que a Sentença tem como irremediavelmente impossível, o que não comportaria graves consequências se concebesse outro meio de atuação, o que a mesma não concebe, por força do prazo do art. 6.°, n.° 1, ED.
16. Todavia o que sucedeu, e bem, foi atuação revogatória de 13 Novembro de 2013 (em contrário, vide, idem, pg. 10, 1.°, 3.° e 4.° parágrafos).
17. No caso em apreço, a apreciação da valia renovatória, logo porque exigiria uma apreciação jurisdicional potenciadora da perceção faltosa de formalidade essencial ao procedimento, realidade que se constitui, aliás, como o primeiro dos requisitos ali enunciados, antes de poder operar já se encontrava impossibilitada de atuar corretivamente.
18. O que explica a severidade da solução legal, preocupada com a segurança jurídica, se estiver em causa uma pressuposta atuação culposa do titular do poder disciplinar ordenada ao desprezo por formalidade essencial. Não fora disso.
19. A norma em causa, o art. 63.°, ED, ou os seus apertadíssimos crivos apenas podem compreender-se no âmbito do que dissemos, isto é, considerando que se destinam a um detentor do poder disciplinar relapso. O que não nunca foi o caso.
20. O entendimento da Sentença a quo, desconsiderando as circunstâncias da preterição, comportou um ilegal encargo para o decisor de boa-fé, como que impondo-lhe uma renovação motivada por apreciação judicial, a exercer no prazo de 30 dias, antes mesmo de ocorrer o prazo de um ano a que se refere o art. 6.°, n.° 1, ED!
21. Ao empregador não é imputável a causa ou a autoria da preterição, não se concebe que o instituto da renovação excluísse de aplicação o regime previsto nos arts. 135.°, 138.°, 139.°, aqui a contrario, e 141.° a 146.°, do Código do Procedimento Administrativo de 1991, na redação em vigor, aplicável ex vi do art. 2.°, n.° 5, do mesmo CPA .
22. Em tal mesmo âmbito não se concebe que no prazo previsto no art. 6.°, n.° 6, ED, não se conformasse, designadamente, como foi o caso, por força da decisão revogatória e dos efeitos nela compreendidos, o saneamento de omissão não atribuível a quem deveria decidir legalmente.
23. Assim, e para os efeitos do previsto no art. 639.°, n.° 2, do CPC [art. 685 °-A, CPC/61], a decisão desconsiderou em erro a possibilidade revogatória oferecida pelo regime previsto nos arts. 135.°, 138.°, 139.°, a contrario, e 141.° a 146.°, do CPA de 1991, na redação em vigor, aplicável ex vi do art. 2.°, n.° 5, do mesmo CPA.
23.1 O regime legalmente aplicado na apreciação da anterior decisão, sendo que esta, por facto não imputável ao detentor do poder disciplinar, ao instrutor e ao decisor, não contara com a ponderação da defesa, pelo que em sentido estrito até aí nunca fora verdadeiramente preterida a formalidade essencial. Todavia, a perceção de que tal ocorrera, na verdade, implicou a imediata intervenção corretiva por mão do empregador público, corrigindo uma situação que se dera sem sua vontade contributo.
23.2 A correção daí decorrente não beliscou qualquer direito ou garantia do então arguido, como a própria Sentença reconhece, e dentro do prazo previsto no art. 6.°, n.° 6, ED. A decisão a quo, em erro, entendeu a situação como prevista no quadro do art. 63.°, ED, esquecendo que a possibilidade renovatória ali em causa, atenta a continuada e sucessiva boa-fé do detentor do poder disciplinar, e a conformação temporal do caso, imporia antes a solução revogatória.
24. Assim, agora para os efeitos do previsto no art. 640.°, n.° 1, do CPC [art. 685 °-B, CPC/61], sempre se dirá a respeito da al. D da fundamentação de facto da douta Sentença (vide, Sentença, IV, pg. 5), que a referência com que o aresto se contentou para ter como efetiva a “resposta à nota de culpa”, não contou, mas deveria ter contado como assente, rectius, era imperioso que tal tivesse acontecido, o facto da resposta escrita do antão arguido ter sido recebida apenas em 27.02.2013 e que de imediato, quer o instrutor, quer a direção da escola, tudo fizeram para que a decisão integrasse o seu conhecimento e valoração. Ao não retirar a valia de tal facto, a Sentença desconsiderou um elemento fático de extrema importância.
24.1 Na mesma senda, o que aqui também se invoca, a Sentença laborou em erro, ao assentar que, agora na al. F (idem), que a ação aí identificada “corre” ainda no TAF de Castelo Branco, o que não corresponde à realidade, tendo obtido Sentença em 02.07.2014. Tudo de pleno conhecimento do Tribunal, do processo que aqui nos traz e da prova feita. Nesse sentido, com as devidas consequências, a decisão deveria contemplar a receção da defesa em 27.02.2013, por facto não imputável ao empregador, a imediata remessa da mesma para o decisor e a consideração da mesma, primeiro, por amplo efeito da decisão revogatória, segundo, pela integração da sua ponderação na decisão final, aqui em causa.
24.2 A decisão factual deve ter conta, ainda, o facto do pleito identificado estar decidido por inutilidade superveniente da lide, facto com completo significado no que respeita à esclarecedora intervenção do titular do poder disciplinar, à ausência de qualquer posição do aqui R.° e à legal força revogatória que a montante esteve na base de tal atempada e legal intervenção.
B. Sobre o segmento da douta Sentença referido, supra, em III, B.
25. No que respeita ao exame respeitante à invocada necessidade de emissão de nova pronúncia do então arguido, com exceção ao postulado afirmativo de existência de renovação do ato instaurador, que não se verificou, e do procedimento (vide, Sentença, V, pg. 10, 4.° parágrafo), que também se não se verificou, o mesmo encontra-se bem concluído
26. O que já não se pode afirmar de parte do sustento aduzido e, portanto, sem que se acompanhe qualquer alusão ao resultado “inquinado” ali dito (vide, idem).
27. Pelo que, e bem, o argumento do aqui R.° improcedeu.
28. Resta concluir que a improcedência da arguição vem demonstrar que toda a atuação foi legal, assentando na tempestiva e legal revogação de um ato inválido, sem mácula, e não numa putativa renovação de que estava desvinculado o empregador.
29. Aqui improcedendo o pedido do então A., nada há a dizer sobre tal efeito e conclusão, todavia, com a mesma força que antes se deu conta nas conclusões 23 a 24.2, sempre se dirá, in casu, que a plena consideração como que repristinatória da Acusação não precisaria de nova audiência - é a douta Sentença quem no-lo, e muito bem, diz - implica o reconhecimento do decisor ao instituto da revogação da decisão e a não aplicação do mecanismo da renovação que, ao contrário do afirmado, não encontraria aqui possibilidade legal de aplicação.
29.1 Em tal âmbito, não há como deixar de invocar, aqui também, o que se disse antes para ilustrar o requerido no art. 639.°, n.°s 1 e 2, als. a) a c), CPC.
C. Sobre o segmento da douta Sentença referido, supra, em III, C.
30. Não há também aqui qualquer razão que assista à decisão a quo, no que divergiu da perspetiva sancionatória assente na acusação (Sentença, V, pg. 10, 9.° e último parágrafo, pg. 11, e pg. 12, 1° a 4.° parágrafos).
31. Todavia, clara e realizada em estrita obediência à lei, demonstrando a grave culpa envolvida no também grave ilícito a que correspondeu, e bem, a previsão acusatória mais gravosa, atenta, como se disse, a culpa e o facto, amplissimamente demonstrado na acusação, de com tal e por tal ter ficado irremediavelmente posta em causa a possibilidade de sobrevivência da relação funcional.
32. Patente em todo o articulado acusatório, o que a Sentença não compreendeu.
33. Depois de na instrução ter ficado seriamente indiciada a conduta infratora, a violação do dever de assiduidade, a mesma, por recolha da necessária prova, não deixou de atender, de modo particularmente zeloso, à plena compreensão das circunstâncias em que tal se verificou.
34. Ao contrário da crítica assinalada na Sentença. Tudo feito, sem qualquer margem para reparo, em estrita obediência, para além da norma basilar que é o art. 3.°, n.° 1, do ED, mas especialmente ao que prescrevem as als. e) e i), do n.° 2 da dita norma, o art. 48.°, n.°s 2 e 3, ED, as normas corporativas com assento no Estatuto de 2004, a que o seu desempenho profissional imediatamente respeitava e, ainda, referindo normas substantivas de aplicação genérica.
35. Aludindo e integrando probatoriamente a objetividade culposamente violadora do dever de assiduidade e a pormenorizada fundamentação que permitiu afirmar-se estar “inviabilizada a manutenção da relação funcional”, por especial menção, não apenas à al. g) do art. 18.°, do ED, como sem acerto refere a Sentença.
36. Mas salientado diferenciadamente a precisa referência à cláusula geral do dita norma, preocupação que emana, precisamente, de não estar circunscrita a apreciação dos factos à norma referente à “automática ” violação do dever de assiduidade.
37. A decisão ignorou os artigos 11.° e 12.° da acusação, que sustentavam o juízo em causa, o que se fez também sobre a explicação aturada da circunstanciação da realidade vivida pelo antão assistente operacional V…………. em face das exigências da sua prestação laboral, explicitando a motivação gravemente desviante ao dever de assiduidade em causa e ao estertor da relação laboral.
38. Ignorou sem qualquer razão, o que desde 01.03.2012 motivava o comportamento ausente do então trabalhador, a encontrar na não aceitação de mudança dos períodos de trabalho.
40. Tornando difícil a tarefa de acompanhar a linha de pensamento que fundamenta a apreciação a quo.
41. A decisão disciplinar não assentou na valia unilateral do ilícito, na existência de faltas injustificadas, não se bastou com a violação objetiva do dever de assiduidade, suportou-se, antes, na aturada prova sobre a culpa do agente, expressando a gravidade da conduta e as circunstâncias em que esta se deu, explicando o que censuradamente levou à afirmação de estar inviabilizada a relação funcional o que deveria culminar com a aplicação da pena de demissão (vide, Sentença, V, pg. 11, 2.° parágrafo).
42. Com sustento único no último parágrafo da parte expositiva da informação que imediatamente fundamentou a decisão punitiva de 15.01.2014, a informação n.° …………, de 10.12, a Sentença afirmou, em erro, o ato impugnado considerou as faltas injustificadas “bem como a circunstância de não aceitar o horário que lhe foi distribuído” (vide, Sentença, V, pg. 11, 3.° e 4.° parágrafos).
43. Em erro, entende que a decisão “aplicou automaticamente a pena de demissão” considerando “a suficiência das faltas injustificadas”, entendendo “não ter sido realizada a ponderação do comportamento do trabalhador”.
44. Não se percebe no que é que a douta decisão judicial se funda para (vide, Sentença, V, pg. 11, 3.° parágrafo), bastando-se com a referida síntese constante da fundamentação da decisão. Ignora mesmo, a referência de violação ao dever geral de zelo ali presente.
45. Ignorando, ainda, a fundamentação per relationem que dirige ao acusatório na informação n.° …………., de 10.12, com o destaque dado às relevantíssimas declarações do então arguido assumindo a determinação de não aceitar o horário de trabalho em função de condições objetivas, as que se ligavam à sua própria vida e as que resultavam da reiterada posição pública em não conceber a prestação laboral em horário noturno.
46. Foi mais longe a Sentença, aceitando, o que é um argumento contra legem, estar o aqui R.° legitimamente convencido poder não comparecer na escola (!) e, mais, que fora a diretora da escola quem lho informara!
47. Para o R.te é incompreensível colocar a decisão em causa sem fazer reparos à acusação, firmando-se, até, o título de culpa ali sufragado e o ilícito e apenas questionado, em erro de direito, a suficiência integradora, repetimos da cláusula geral da norma em causa, por um lado, e, por outro lado, da invocação da al. g).
48. A decisão não se refere criticamente à precisa culpa expressa na acusação, aceitando, pois, e bem, o título ali empregue como suficiente, nem se refere à expressa e destacada motivação ali bastamente utilizada para suportar o juízo que afirma e comprova a inviabilização da relação de emprego público.
49. Não existem razões para truncar o que estava em causa na acusação, ficcionado uma base fáctica sem correspondência na realidade e uma aplicação do direito que assim surgiu em totalidade com as exigências do caso.
50. A decisão a quo, para além de ter desconsiderado que a fundamentação do decisor era bastante mais ampla do que aquela que tem como a que fora considerada, incorre em erro ao ter a apreciação da conduta em causa como subtraída à definição legal do que é uma infração disciplinar, fazendo crer que o que se aponta na síntese informativa não “serviria” (sic).
51. Não é verdade que o entendimento decisório não estivesse suportado cabalmente de facto e de direito e, portanto, justificando nessa mesma medida o gravame da decisão, fundada, como se demonstrou, na inviabilização da relação funcional em causa
52. É desconforme a já concluída parte da fundamentação da decisão que entende que o facto de o ali Autor “ao submeter um pedido de licença sem vencimento poder ter sido induzido em erro fazendo-o pensar que estaria autorizado a exercer de imediato” (!!).
53. Refere-se ou sugere-se, sem sustento, que o aqui R.te “aceita” tal (sic; vide, Sentença, V, pg. 12, 2.° parágrafo) o que aqui está em causa. O que não é verdade.
54. Assim, e para os efeitos do previsto no art. 639.°, n.°s 1 e 2, do CPC [art. 685 °-A, CPC/61], a decisão a quo violou o disposto no art. 3.°, n.° 1, n.° 2, al. e), n.° 7 - a Sentença pura e simplesmente ignorou a respetiva existência, a al. i) e o n.° 11, o art. 18.°, n.° 1, e a al. g), todos do ED, errando na sua conformação às exigências do art. 48.°, n.° 2 e sobretudo 3, sem sequer colocar estas últimas normas em questão. Desvalorizou em erro o amplo e fundado teor acusatório e, portanto, a completa fundamentação da acusação, ligando-a a uma questão unilateral cuja verdadeira dimensão e significado sequer captou, vendo-a como causa única da afirmação inviabilizadora da relação funcional, que nela não apenas se fundamentou, e desprezando a força das próprias afirmações do A. Foi a Sentença para além do que um eventual erro grosseiro na determinação da sanção possibilitaria, imiscuindo-se em poderes de decisão que cabem à administração fazer e que, aqui, não há margem para ver como sindicáveis, ofendendo a ponderação legalmente efetuada.
54.1 Violando, as regras gerais que constantes nos arts. 124.° e 125.°, do CPA em vigor, não deixaram de ser respeitadas na decisão disciplinar, a fundamentação per relationem contida nesta, vendo “automatismo” onde, ao contrário se provou a plena atenção à grave culpa envolvida e ao ilícito praticado.
54.2 Nesta senda, numa ávida procura de invalidade anulatória chega-se a construir uma nova perspetiva sobre a legitimidade do então A. poder estar coberto por uma situação não definida, mas apenas requerida (!), em oposição ao que na lei geral se encontrava plasmado nos arts. 74.°, n.° 1, e 106.°, CPA, seguindo cegamente a posição infundada do A., não chegando, é certo, ao ponto de atribuir tal desvio a terceiro. Em sublinhado erro, a decisão vai ao ponto de entender a decisão de modo dual ou divisível, a traduzir-se em invocação claramente errada e obscura, reveladora de técnica subsuntiva não conseguida, aqui não podendo deixar-se de retirar a legal consequência prevista no art. 615.°, n.° 1, al, c), 2a parte, CPC [art. 668.°, CPC/61].
54.3 Para os efeitos do previsto no art. 640.°, n.° 1, do CPC [art. 685 °-B, CPC/61], não corresponde à afirmada base factual que o aqui R.te aceite que o A. submeteu um pedido de licença sem vencimento o que pode ter induzido a pensar, ou, pior, “fazendo-o pensar” (vide, Sentença, pg. 12; circunstância que não deixa de supor afirmação de intervenção de terceiro) que estaria de imediato habilitado a gozá-la (idem).
54.4 Se foi isso o que entendeu a decisão a quo, impugna-se tal fonte, que não tem tal alcance, não constando do probatório qualquer prova que o afirme e se era assim, o que não se concebe, deveria a base factual afirmá-lo. Nesse sentido, a decisão deveria afirmar a interposição do requerimento, as circunstâncias da sua decisão e o facto indesmentível de inexistência de terceiro a legitimar gozo antecipado de algo que, veio a ver-se, nem era possível.
D. Sobre o segmento da douta Sentença referido, supra, em III, D.
56. Inexiste qualquer despedimento ilícito, pelos que os efeitos decorrentes da decisão disciplinar deverão ser, apenas, os previstos no art. 11.°, n.° 4, do ED, estando os putativos efeitos indemnizatórios e compensatórios mal precisados na douta Sentença.
56.1 Assim, também para os efeitos do previsto no art. 639.°, n.°s 1 e 2, al. c), do CPC [art. 685 °-A, CPC/61], sendo certo que a decisão a quo determinou em erro as normas aplicáveis, sempre se dirá, in casu, que os efeitos desta pena expulsiva, porque lícita, não podem deixar de ser os que se encontram no art. 11°, n.° 4, ED, portanto, nenhum mais, muito menos indemnizatório ou compensatório. Neste sentido não há como que invocar, aqui também, o que se disse antes para ilustrar o requerido no art. 639.°, n.°s 1 e 2, als. a) a c), CPC.
56.2 Existe erro na determinação das normas invocadas, que não sendo os arts. 276.° e 278.°, do Regime aprovado em anexo à Lei n.° 59/2008, 11.08, para os ditos efeitos, também o não são para, “à data dos factos”, ter as pretensões em causa como previstas no art. 278.°, do dito Regime nem que “por isso aos mesmos [factos, novamente parêntesis nossos] [seja] aplicável nos termos da última parte do n.° 1 do art. 9.°da Lei n.° 35/2014, de 20 de Junho”.
56.3 “[À] data dos factos” (infratores e, ainda, da prepositura da ação) as pretensões em causa encontravam-se previstas, antes, no art. 65.° do ED, e se “por isso” é aplicável, nos termos do art. 9.°, n.° 1, parte final, da Lei n.° 35/2014, 20.06, o regime então aplicável, não parece que tal se encontre no sustento enquadrado pela Sentença, nos termos do art. 42.°, n.° 1, als. d) e e), da Lei n.° 35/2014, 20.06. Sobre a compensação, tendo presente a completa legalidade da pena expulsiva aplicada, vale o que se disse sobre o regime jurídico que está em causa, que não é o invocado na douta Sentença, mas antes o art. 64.°, n.°s 1, al. b), 2 a 5, do ED, e, portanto, a valia de melhor exame ao correspondente segmento em causa da douta Sentença (vide, Sentença, V, pgs. 13 e 14).
Conclusão final: Nestes termos, nos melhores de direito e sempre com o mui douto suprimento de v. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional, anulando a decisão sub judice e, substituindo-a por outra que julgue improcedente em toda a linha a ação administrativa.”


O Autor, aqui Recorrido veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 13 de novembro de 2023, a concluindo:
“1. A análise efetuada na douta sentença mostra-se correta, bem estruturada e fundamentada, não padecendo das fragilidades que o recorrente lhe pretende assacar.
2. Salvo o devido respeito que é muito em desespero de causa, não pretende mais o Recorrente do que obter em segunda instância um duplo julgamento da matéria de facto, invocando em desespero de causa factualidade à margem dos autos, de nula relevância para a apreciação do presente recurso.
3. Pois, como melhor resulta da douta sentença é inequívoco que entre a data em que ocorreu a infração imputada ao Recorrido setembro e outubro de 2012 e a data em que ocorreu a renovação do procedimento disciplinar que foi precedido do ato de revogação da decisão da sanção de demissão que lhe foi aplicada em anterior processo disciplinar já havia decorrido prazo superior a um ano.
4. Dado que o Recorrente teria até 8 de outubro de 2013 para renovar o procedimento disciplinar renovado, à data em que assim procedeu 13/11/2013, há muito tempo que se encontrava precludido o prazo que permitiria ao ora Recorrente proceder à renovação do processo disciplinar que conduziu á demissão do aqui Recorrido.
5. Daí que bem andou a douta sentença ao considerar que tendo a o Recorrente renovado o procedimento disciplinar sem obediência ao disposto na alínea a) do n°2 do art° 63° do ED incorre o despacho em causa, que aplicou a pena de demissão ao Recorrido em vicio de violação da lei, e concomitantemente na justificada declaração da sua anulabilidade.
6. Tem assim o recorrido para si como certo que a decisão proferida pelo tribunal "a quo" não merece qualquer reparo, pois que interpretou os factos e o direito de forma imaculada.
Assim, julgando totalmente improcedente e mantendo "in tottum" a douta sentença proferida nos autos, farão V. Exas Ilustres Desembargadores a Costumada Justiça.”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 12 de dezembro de 2023.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 8 de janeiro de 2024, nada veio dizer requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente/Ministério, nomeadamente verificando se ocorreu, ou não, no procedimento a invocada existência de renovação do procedimento disciplinar, e se terá ocorrido caducidade do procedimento disciplinar, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.


III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade provada e não provada:
“A) O Autor iniciou o desempenho de funções públicas em 22 de Novembro de 1988. (Cfr. nota de culpa junta como documento n.º 5 com a Petição Inicial, não impugnado)
B) Em 11 de Setembro de 2012 o Autor apresentou junto do Agrupamento de Escolas Ribeiro Sanches de Penamacor pedido de licença sem remuneração por um período e 90 dias.
(Cfr. documento n.° 11 junto com a Petição Inicial)
C) Em 19 de Dezembro de 2012 o Agrupamento de Escolas Ribeiro Sanches de Penamacor entregou ao Autor nota de culpa, da qual resulta que entre 14 de Setembro de 2012 e 8 de Outubro de 2012 o mesmo se ausentou injustificadamente do seu local de trabalho, considerando tal conduta punível com pena de demissão.
(Cfr. documento n.0 5 junto com a Petição Inicial)
D) Em 18 de Janeiro de 2013 o Autor respondeu à nota de culpa supra, defendendo a aplicação de pena mais leve.
(Cfr. documento n.° 6junto com a Petição Inicial)
E) Por ofício datado de 2 de Maio de 2013 o Ministério da Educação e Ciência remeteu ao Diretor do Agrupamento de Escolas Ribeiro Sanches despacho do Secretário de Estado de Ensino e da Administração Escolar, com despacho de aplicação de pena de demissão ao arguido.
(Cfr. documento n.° 11 junto com a Petição Inicial)
F) O Autor impugnou o despacho referido na alínea anterior através de ação administrativa que corre termos neste tribunal sob n.° …/13.5BECTB.
(Cfr. documento n.° 12junto com a Petição Inicial)
G) Em 13 de Novembro de 2013 o Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar proferiu despacho com o seguinte teor:
(Dá-se por reproduzido Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Art.º 663º nº 6 CPC)
H) Em 14 de Novembro de 2013 o Ministério da Educação e Ciência remeteu à Diretora do Agrupamento de Escolas Ribeiro Sanches de Penamacor, comunicação da qual consta, nomeadamente, o seguinte teor:
(Dá-se por reproduzido Documento fac-similado constante da decisão de 1ª Instância – Art.º 663º nº 6 CPC)
(Cfr. documento n.° 14junto com a Petição Inicial)
I) Por ofício datado de 16 de Janeiro de 2014 o Ministério da Educação e Ciência remeteu à Diretora do Agrupamento de Escolas Ribeiro Sanches de Penamacor comunicação com o seguinte teor:
1. Comunico a V. Exa. que por despacho de 15.01.2014 do senhor Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, no uso da competência que lhe é atribuída pela alínea b) do n.° 3 do Despacho n.° …………./2013, de 26.03.2013, do Senhor Ministro da Educação e Ciência, publicado no Diário da República n.° …, de 03.04.2013, foi aplicada ao assistente operacional V…………. a pena prevista na alínea d) do n.° 1 do artigo 9.° do Estatuto Disciplinar - Demissão,
2. Em anexo remeto a V. Exa. fotocópias de parte do relatório final do processo disciplinar, bem como da informação NID: ……, as quais contêm os fundamentos desta decisão.
3. Solicito a V. Exa. que notifique o assistente operacional V…………., nos termos da Circular n.° ………..
4. Deverá ainda remeter a esta Inspeção-Geral o original da certidão de notificação, bem como mandar anotar no registo biográfico do arguido a pena aplicada, a qual, de acordo com o artigo 58.° do mesmo Estatuto, começa a produzir os seus efeitos legais no dia seguinte ao da notificação.
(Cfr. documento n.º 8 junto com a contestação)
J) Em 21 de Janeiro de 2014 o Autor foi notificado do despacho constante na alínea anterior.
(Cfr. documento a fls. 47 da contestação junta aos autos)
K) O Autor tem um vencimento base, reportado ao mês de Dezembro de 2013 no valor de €566,41. (Cfr. recibo de vencimento junto como documento n.º 2 com a petição inicial).”


IV – Do Direito
Importa agora, atenta a matéria dada como provada, analisar o Recurso apresentado pelo Demandado/Ministério.


No que aqui relva, discorreu-se em 1ª instância:
“(...) Como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11 de Setembro de 2008, no âmbito do processo 0368/08, o facto de as faltas “deverem ser consideradas injustificadas, (...) não implica, só por si, que se mostrem preenchidos os pressupostos de aplicação da pena de demissão. ”
Assim, não basta a mera violação do dever de assiduidade, tornando-se necessário a prova da culpa do agente, que a conduta faltosa do arguido pela sua gravidade e pelas circunstâncias em que ocorreu mereça uma censura ética que conduza à impossibilidade de manter a relação funcional com o serviço.
Regressando aos autos, resulta do ato ora impugnado que “o arguido faltou consecutivamente e de forma injustificada 16 dias úteis, tendo violado o dever geral de assiduidade e assumido um comportamento, admitido de forma expressa pelo arguido, de não aceitar o horário que lhe tinha sido distribuído, que é claramente inviabilizador da manutenção da relação funcional e punível com a pena de demissão (...)”.
Ou seja, para a pena de demissão foram consideradas as faltas injustificadas do ora Autor, bem como a circunstância de não aceitar o horário que lhe foi distribuído.
A Demandada invocou a alínea g) o n.° 1 do artigo 18.° do ED para sustentar a sua decisão de aplicação de pena de demissão.
A referida disposição legal refere o seguinte:
“1 - As penas de demissão e de despedimento por facto imputável ao trabalhador são aplicáveis em caso de infração que inviabilize a manutenção da relação funcional, nomeadamente aos trabalhadores que:
(...)
g) Dentro do mesmo ano civil deem 5 faltas seguidas ou 10 interpoladas sem justificação;”
Assim, a disposição legal utilizada pela Demandada não serve para suportar a decisão, na parte em que aplica a pena de demissão, em virtude de o ora Autor não ter aceite o novo horário que lhe foi atribuído.
Por outro lado, conforme decorre do supra exposto enquadramento, a faltas injustificadas, por si só, não são suficientes para aplicação de forma automática da pena mais gravosa disciplinar, ou seja, a demissão.
Com efeito, cabe realizar uma ponderação do comportamento do trabalhador, o que no presente caso não foi realizado.
Na verdade, a Demandada sustentou a sua decisão apenas na circunstância de o Autor ter faltado injustificadamente, bem como de ter recusado o novo horário, não cuidando de suportar o seu entendimento, nem justificar o motivo pelo qual optou pela medida mais gravosa disponível, ao invés de outra.
Para além disso, é aceite pela Demandada que o Autor de facto submeteu um pedido de licença sem vencimento, que veio a ser indeferido, é certo, mas que pode ter induzido em erro no Autor fazendo-o pensar que estaria autorizado a exercer a licença de imediato.
Assim, da factualidade em causa não é possível extrair um comportamento gravemente culposo por parte do Autor capaz de sustentar a aplicação da pena de demissão.
Por esse motivo, tem que proceder a alegação do Autor, pelo que também com este fundamento caberia anular o ato impugnado.
Considerando o supra exposto caberia condenar a Demandada a readmitir o Autor e a reconstituir a sua situação jurídico-funcional.
Porém, o Autor manifestou desde logo que optaria pela indemnização em substituição da reintegração, conforme lhe permite o artigo 278.° da Lei 59/2008 de 11 de Setembro, diploma este vigente à data dos factos e por isso aos mesmos aplicável, nos termos da última parte do n.° 1 do artigo 9.° da Lei n.° 35/2014 de 20 de Junho que, em anexo, publicou a LGTFP.
Dispõe o referido preceito legal sob a epígrafe “Indemnização em substituição da reintegração”, o seguinte:
“1 - Em substituição da reintegração pode o trabalhador optar por uma indemnização, cabendo ao tribunal fixar o montante, entre 15 e 45 dias de remuneração base por cada ano completo ou fração de antiguidade no exercido de funções públicas, atendendo ao valor da remuneração e ao grau de licitude decorrente do disposto no artigo 271.º
2 - Para efeitos do número anterior, o tribunal deve atender a todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão jurisdicional.
3 - A indemnização prevista no n.° 1 não pode ser inferior a três meses de remuneração base.”
Assim, daqui resulta que no caso de despedimento ilícito, como é a situação dos autos, o trabalhador pode optar entre a reintegração e a indemnização e que, caso opte pela indemnização, o mesmo tem direito a receber uma indemnização a fixar pelo Tribunal entre 15 e 45 dias de remuneração base por cada ano completo ou fração de antiguidade no exercício de funções públicas, sendo que, em caso algum, essa indemnização pode ser inferior a três meses de retribuição.
No caso em apreço, decorre da alínea A) do probatório que o Autor iniciou o desempenho de funções públicas em 22 de Novembro de 1988, auferindo a retribuição base de € 566,41, conforme decorre da alínea K) da matéria de facto provada.
Assim, julga-se adequado fixar o valor de 30 dias de remuneração base, por cada ano de antiguidade, contabilizando-se o mesmo desde a data de início de funções do Autor até ao trânsito em julgado da presente decisão.
O Autor peticionou ainda o pagamento de compensação correspondente às prestações remuneratórias que deixou de auferir.
Apreciando.
Dispõe o artigo 276.° da Lei 59/2008 de 11 de Setembro, o seguinte:
“1 - Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as remunerações que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal.
2 - Ao montante apurado nos termos da segunda parte do número anterior deduzem-se as importâncias que o trabalhador tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento.
3 - O montante do subsídio de desemprego auferido pelo trabalhador é deduzido na compensação, devendo a entidade empregadora pública entregar essa quantia à segurança social, no caso de ter sido esta a entidade pagadora da prestação.
4 - Da importância calculada nos termos da segunda parte do n.° 1 é deduzido o montante das remunerações respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da data da propositura da ação, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento.”
Assim, ao Autor é devido o pagamento das remunerações que tenha deixado de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão.
Reportando-se a data da notificação do despedimento ao dia 21 de Janeiro de 2014, conforme alínea J) do probatório, é devido o pagamento das remunerações desde tal data até ao trânsito em julgado desta decisão, deduzindo-se a tal montante as remunerações respeitantes ao período decorrido entre a data do despedimento - 21 de Janeiro de 2014 - até 30 dias antes da data da propositura da ação - 1 de Abril de 2014 - nos termos do n.° 4 do supra citado artigo, uma vez que a ação não foi proposta dentro dos 30 dias subsequentes ao despedimento.”


Correspondentemente, decidiu-se em 1ª Instância:
“(…) julgo parcialmente procedente a presente ação e, em consequência;
a. anulo o ato impugnado e ;
b. condeno a Entidade Demandada ao pagamento ao Autor da compensação correspondente às prestações remuneratórias que deixou de auferir,
c. bem como indemnização em substituição da reintegração.”


Vejamos:
Importa referir que se entende que Sentença Recorrida incorreu num conjunto de equívocos, desde logo no que concerne a ter entendido não ser aplicável a pena de demissão ao Autor, aqui Recorrido.


Por outro lado, é incontornável que a ilicitude da conduta disciplinar consubstanciada nas faltas injustificadas assinaladas, não pode ser contornada com a apresentação de requerimento de licença sem vencimento, cuja mera apresentação não confere ao seu requerente automaticamente o direito correspondente.


Mas vejamos em pormenor o recursivamente suscitado:
Em 01.10.2012, foi instaurado procedimento disciplinar contra o então assistente operacional V…………, no âmbito do qual foi proferida a correspondente acusação, tendo originariamente sido entendido que o arguido não se havia pronunciado, tendo ulteriormente sido elaborado Relatório final que apontava para a aplicação de pena expulsiva, a qual foi confirmada por Despacho do Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar de 26.03.2013.


O aqui Recorrido intentou ação (Proc.º n.° ……./13.5BECTB), arguindo a nulidade do procedimento disciplinar, uma vez que terá apresentado resposta à acusação o que não foi considerado no procedimento que determinou a aplicação da originária pena de demissão.


Correspondentemente, por despacho de 13.11.2013, do Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, foi revogada a precedente pena expulsiva, mais tendo sido determinada a baixa do processo ao instrutor para apreciação da defesa do arguido, tendo na Ação judicial sido declarada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.


No seguimento da retoma do procedimento, por Despacho de 15.01.2014, do então Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, veio a ser aplicada ao então arguido, V………., a pena de demissão.


Em qualquer caso, por decisão aqui recorrida do TAF de Castelo Branco, foi declarada a existência de renovação do procedimento disciplinar e, assim, a impossibilidade legal da mesma ocorrer nos termos do art. 63.°, do ED.


Não se acompanha o referido entendimento, pois que, em bom rigor, não ocorreu a renovação do procedimento disciplinar, mas singelamente a sua retoma, perante a verificação de uma nulidade procedimental, sanável e entretanto sanada.


Na realidade, não houve no procedimento disciplinar qualquer “preterição de formalidade essencial”, antes não tendo o instrutor tido conhecimento tempestivo da apresentação de resposta à nota de culpa, por razões instrumentais, que lhe não foram imputáveis, o que ulteriormente foi corrigido e sanado, o que levou, como se disse já, a que o procedimento tenha sido retomado.


Não houve pois a “preterição de formalidade essencial”, uma vez que ao arguido foi facultado o contraditório face á nota de culpa, direito que exerceu, só que a correspondente defesa não chegou em tempo ao instrutor do procedimento, situação que veio a ser corrigida com a retoma do procedimento no momento imediatamente anterior ao lapso detetado.

* * *
A Sentença, aborda ainda questão conexa com a invocada necessidade de emissão de nova pronúncia do então arguido, após a prolação do ato revogatório da originária pena aplicada.


Reafirma-se que, em bom rigor, não se verificou qualquer omissão relativamente ao contraditório do arguido quanto à nota de culpa, antes não tendo a referida pronuncia chegado ao instrutor a tempo de a ter em conta no relatório final, o que é substancialmente diferente.


Assim, tendo sido retomada a instrução procedimental para momento anterior à elaboração do relatório final, por forma a atender já à defesa apresentada pelo arguido, mostra-se sanada a irregularidade verificada, não havendo, assim, que facultar novo contraditório ao arguido, pois que apenas esteve em causa a legitima e tempestiva revogação de um ato inválido, pois que a nota de culpa não foi alterada em face do que a resposta à mesma se mantém válida.

* * *
Entendeu-se ainda Recursivamente que a Sentença desconsiderou a possibilidade da aplicação ao arguido de pena expulsiva.


Efetivamente, independentemente das razões invocadas pelo arguido para faltar injustificadamente, o que é factualmente incontornável é que o mesmo deu um número de faltas injustificadas suscetíveis de determinar a sua demissão.


Na realidade, o arguido deu 16 faltas injustificadas seguidas, o que nos termos da alínea g) do Artº 18º do ED aplicável, determinará a sua demissão, pois que tal comportamento inviabilizou a manutenção da relação funcional, tanto mais que as referidas ausências não foram sequer justificadas do ponto de vista disciplinar (Artº 40º nº 4 ED).


O facto do arguido faltar injustificadamente a pretexto de discordar do horário que lhe foi atribuído, não pode ser considerado como desculpabilizante das suas ausências, antes constituindo um comportamento desviante e ilegítimo, que evidencia a declarada inviabilização da manutenção da relação funcional.


Embora se conceda que a mera ausência injustificada por mais de 5 dias seguidos ou 10 interpolados, não determina necessária e automaticamente, a demissão do trabalhador, o que é facto é que, não tendo as ausências sido sequer justificadas do ponto de vista disciplinar, ao que acresce a circunstância do arguido ter manifestado reiteradamente oposição ao horário que lhe foi distribuído, é patente que a administração estava “condenada” a demitir o arguido, pela inexistências de quaisquer factos ou circunstâncias que permitissem mitigar ou desculpabilizar as suas ausências injustificadas.


Mal se compreende a afirmação feita na Sentença Recorrida, quando refere que a al. g) do n.° 1 do art. 18.°, ED, “não serve para suportar a decisão, na parte em que aplica a pena de demissão, em virtude do ora Autor não ter aceite o novo horário”, quando, em bom rigor, o que está em causa são efetivamente as faltas injustificadas, independentemente das mesmas poderem resultar do descontentamento do trabalhador face ao seu horário, o que não permite excluir a sua responsabilidade disciplinar, mas antes agravar a ilicitude da sua conduta, pois que a eventual interligação de ambas as condutas, sempre constituiria acrescidamente um ato de insubordinação.


Do mesmo modo, mal se alcança o entendimento adotado em 1ª Instância quando afirma que o facto do arguido “ao submeter um pedido de licença sem vencimento pode ter sido induzido em erro fazendo-o pensar que estaria autorizado a exercer de imediato”.


Se o trabalhador foi induzido em erro, foi algo para o qual a Administração não contribuiu, pois que a apresentação de um qualquer requerimento não pressupõe a sua aprovação pelo seu destinatário, tanto mais que não estamos perante um qualquer direito, mas tão-só face a uma faculdade da Administração.

* * *
Seguindo o mesmo raciocínio a Sentença Recorrida aborda depois a questão indemnizatória resultante da alegada demissão ilícita.


Em qualquer caso, entendendo-se nesta instância inverificar-se qualquer irregularidade na aplicação da controvertida pena expulsiva, naturalmente que não haveria lugar à fixação de qualquer indemnização resultante daquela circunstância, em face do que se mostra prejudicada a correspondente discussão.
Assim, nos termos e para os efeitos do previsto no art. 639.°, n.°s 1 e 2, al. c), do CPC [art. 685 °-A, CPC/61], sendo que a decisão recorrida não se mostra isenta de censura ao ter declarado a ilicitude da aplicação da pena expulsiva aplicada ao arguido, não pode deixar de ser aplicado singelamente o art. 11°, n.° 4, ED (Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro), não havendo assim, lugar à atribuição de qualquer montante indemnizatório.


Em face de tudo quanto supra vem expendido, entende-se que a decisão recorrida não poderá ser mantida.

* * *
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo, do presente Tribunal Central Administrativo Sul, conceder provimento ao Recurso, revogar a Sentença Recorrida, mais se julgando improcedente a Ação.


Custas pelo Recorrido


Lisboa, 5 de maio de 2024

Frederico de Frias Macedo Branco

Luis Borges Freitas

Maria Helena Filipe