Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1420/09.0BELSB-A
Secção:CA
Data do Acordão:04/10/2025
Relator:LUÍS BORGES FREITAS
Descritores:EXECUÇÃO
CADUCIDADE DO DIREITO DE AÇÃO / INTEMPESTIVIDADE
CAUSA LEGÍTIMA DE INEXECUÇÃO
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
Sumário:I - Tendo a Recorrida passado à situação de disponibilidade, ao perfazer 60 anos de idade, ficou, a partir dessa data, legalmente impedida de ser promovida.
II - Existe uma impossibilidade jurídica de fazer incidir uma avaliação, em repetição do concurso, sobre quem já não reúne os requisitos de participação no concurso em que essa avaliação se integra.
III - Essa absoluta impossibilidade jurídica de retomar o procedimento consubstancia causa legítima de inexecução da sentença exequenda.
IV - A aplicação de sanção pecuniária compulsória depende da existência de motivo justificativo.
V - Esse motivo não existe no caso em que ministério executado deu a conhecer as razões – aceitáveis e a dirimir na sede própria – pelas quais não havia executado a sentença em causa.
VI - Ao ser pedida a execução da sentença fica desde logo impossibilitada a formulação, a título principal, de um pedido indemnizatório, em cumulação com aquele.
VII - No processo executivo o que se pode arbitrar é, apenas, a indemnização devida pelo facto da inexecução e não os danos provocados pelo ato que tenha sido objeto de anulação (sem prejuízo da indemnização a título de responsabilidade civil pela inexecução ilícita da sentença a que se refere o artigo 179.º/6 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Social
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul:


I
M........ intentou, em 5.12.2014, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, ação executiva contra o Ministério dos Negócios Estrangeiros, por alegada inexecução da sentença de 13.6.2012 através da qual aquele tribunal anulou «o acto de homologação do Ministro dos Negócios Estrangeiros, datado de 11 de Outubro de 2007, relativamente à lista apresentada pelo Conselho Diplomático com a proposta de promoção dos conselheiros de embaixada a ministro plenipotenciário e, [declarou] nulos os actos de nomeação dos 13 conselheiros de embaixada a ministros plenipotenciários, tornados públicos através do aviso nº23942/2007 publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º236, de 7 de Dezembro de 2007 a páginas 35141 e 35142».

Considera que para a sua correta execução o Executado deve ser condenado a praticar os seguintes atos:

«a) Dar sem efeito o acto homologatório do MNE da Lista proposta pelo Conselho Diplomático para promoção dos Conselheiros de Embaixada a Ministros Plenipotenciários;
b) Considerar nulas as nomeações como Ministros Plenipotenciários dos 13 Conselheiros de Embaixada, com as legais consequências;
c) Reformular a “grelha final” relativa aos “Critérios de Avaliação do Mérito dos Conselheiros de Embaixada” em condições de promoção a ministro plenipotenciário por forma a expurgá-la da aplicação ao resultado total numérico dos pontos 1 a 5, para ponderação do mérito baseada na avaliação da forma como as funções foram exercidas, de um factor multiplicativo, expresso em décimas de pontos até 3 pontos, atenta a ilegalidade da utilização deste factor multiplicativo pelo acto anulado, que viola o disposto no artigo 3o, n.°s 1 e 5 e n.° 2 da Portaria n.° 595/2007, de 18 de Maio; isto é, deve a grelha final ser reformulada de acordo com a referida Portaria e feita uma ponderação de mérito e dada uma classificação relativamente a cada um dos critérios de avaliação, por forma a que a classificação atribuída resulte de uma ponderação efectiva e concreta da realidade curricular de cada candidato, relevando para o efeito o seu concreto mérito, de acordo com o estabelecido legalmente;
d) Assim, nestes termos, deve ser reformulada e elaborada nova lista a apresentar pelo Conselho Diplomático com a proposta de promoção dos Conselheiros de Embaixada a Ministro Plenipotenciário, de acordo com os critérios legais;
e) Deve, igualmente, a nova lista a apresentar pelo Conselho Diplomático com a proposta de promoção dos Conselheiros de Embaixada a Ministro Plenipotenciário ser objecto de fundamentação nos termos do n.° 4 do artigo 19° do Decreto-Lei n.° 40-A/98, de 27 de Fevereiro; do n.° 4 do artigo 5º da Portaria n.° 595/2007, de 18 de Maio, e, ainda, proceder a tal fundamentação no respeito pelos princípios da prossecução do interesse público, da igualdade, da proporcionalidade , da imparcialidade e da boa fé, nos termos dos artigos 266°, n.° 2 da Constituição da República Portuguesa e 4º, 5º, 6º e 6°-A do Código de Procedimento Administrativo, por forma a garantir a racionalidade da decisão (cfr. artigos 268°, n.° 3 da CRP e 124° e 125° do CPA) por forma a que sejam perceptíveis as concretas razões para a classificação e graduação final dos candidatos, em obediência aos dispositivos legais aplicáveis;
f) Deve, ainda, após a ordenação da lista dos candidatos de acordo com a classificação que vier a ser atribuída pelo Conselho Diplomático e antes da homologação da lista por parte do Ministro dos Negócios Estrangeiros, ser realizada a audiência prévia, nos termos dos artigos 100° e seguintes do CPA, aplicável “in casu”;
g) A ilegalidade do acto “sub judice” impediu e frustrou a Exequente de progredir na carreira diplomática para a categoria de Ministro Plenipotenciário (pois não pode a exequente deixar de notar, atendendo aos elementos objectivos do seu currículo e ao modo como o mesmo tem vindo a ser avaliado ao longo dos anos, nomeadamente, através da atribuição sucessiva de cargos de chefia e através da colocação como substituta legal do Embaixador num posto como Moscovo e em Maputo como Cônsul Geral, que não se vislumbra - mesmo em comparação com os currículos de outros colegas - quaisquer razões para não ter sido a exequente colocada num dos lugares que deram acesso à promoção), com as respectivas consequências a nível remuneratório, a título de “perda de chance”, pelo que deve o Executado arbitrar-lhe:


- as diferenças salariais de vencimento de categoria, em Lisboa, entre conselheiro e ministro plenipotenciário desde a prática do acto ilegal;
- as diferenças salariais entre as remunerações dos cargos de chefia em Lisboa (antes da promoção a Ministro pode desempenhar-se cargos até diretor de serviços - lugares repetidamente ocupados pela Exequente - depois da promoção pode desempenhar-se cargos a partir de sub-diretor geral), desde a prática do ato ilegal;
- as diferenças de abonos, em posto, relativos a despesas de instalação, de representação e de residência, entre um funcionário diplomático colocado com credenciais de Embaixador e o que sai sem credenciais de Embaixador, desde a data da prática do acto ilegal até a exequente perfazer 60 anos;
- uma vez que da situação resultou ficar a Exequente impossibilitada de ser colocada no estrangeiro ao perfazer 60 anos e até à idade da reforma (65 anos), valor cumulativo dos abonos de instalação, representação e residência, durante esse período de 5 anos, equivalentes aos abonos percebidos pelos funcionários colocados no exterior com credenciais de embaixador;
- avaliação do impacto no cálculo do valor da reforma do número de anos na carreira auferindo como conselheiro de embaixada versus mesmos anos com vencimento de Ministro Plenipotenciário ou Embaixador;
- diferencial do valor da reforma percebida, quando se atinge a idade da reforma com a categoria de conselheiro ou com a de Ministro ou Embaixador (se a progressão tivesse sido reposta, a Exequente poderia ter sido promovida, depois de Ministro, a Embaixador) multiplicada pelo número de anos desde a idade da reforma até à idade representando a esperança média de vida (tentativamente daqui a 20 anos)».

Por outro lado, entende que o Executado deve ainda ser condenado a praticar os seguintes atos:

«- Ressarcir a Exequente dos danos não patrimoniais alegados no montante € 70.000,00;
- Ressarcir a Exequente pela “perda de chance” no montante de € 70.000,00;
- Ser condenado no pagamento dos respectivos juros de mora à taxa legal».
*


Por sentença de 9.6.2021 o tribunal a quo julgou a ação «totalmente procedente» e, em consequência, determinou o seguinte:

«a. Que o procedimento de onde emergiu o acto anulado, processo de promoções à categoria de ministro plenipotenciário aberto em 28 de Junho de 2017, retroaja ao momento procedimental de avaliação dos candidatos.
b. Que à avaliação dos candidatos seja aplicada a cada um dos critérios de avaliação e funções desempenhadas uma ponderação de mérito específica nos termos dos artigos 3º, n.º 1 e 5º, n.º 2 da Portaria n.º 595/2007, de 18 de Maio.
c. Que a avaliação de cada um dos candidatos seja objecto de fundamentação contemporânea, completa, coerente e suficiente, nos termos legalmente exigidos.
d. Que seja elaborada lista de classificação final e ordenação dos candidatos com observância do referido em a. a c..
e. Que a lista de classificação final e de ordenação elaborada nos termos de d. seja notificada aos candidatos e concedido aos mesmos o prazo legal para, querendo, exercerem o direito de audiência prévia relativamente ao mesmo.
f. Uma vez observado o referido nos pontos anteriores o procedimento siga os seus ulteriores legais termos.
g. As operações referidas em a. a e. serão da responsabilidade do Conselho Diplomático – n.ºs 3 e 4 do artigo 19º do Decreto-Lei n.º 40-A/98, de 27/02.
h. As promoções a ministro plenipotenciário a empreender no final do procedimento referido em 1 serão da responsabilidade do Ministro dos Negócios Estrangeiros – n.º 5 do artigo 19º do Decreto-Lei n.º 40-A/98, de 27/02.
i. O Conselho Diplomático disporá do prazo de 100 dias para dar cumprimento aos actos e operações da sua responsabilidade supra descritos.
j. O Ministro disporá do prazo de 20 dias para dar cumprimento aos actos e operações da sua responsabilidade supra descritos.
k. Caso não seja cumpridos os prazos referidos em i. e j. será aplicada sanção pecuniária compulsória aos titulares do Conselho Diplomático e ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, respectivamente, dependendo de cujo prazo seja ultrapassado. – artigo 179º, n.º 3 do CPTA.
l. A sanção pecuniária compulsória a ser aplicada fixa-se no valor diário de 5% do salário mínimo nacional».
*

Inconformado, o Executado (Ministério dos Negócios Estrangeiros) interpôs recurso daquela decisão, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

A. Defende a Recorrente que a decisão exequenda transitou em julgado e/ou tornou- se exequível, quando da prolação do despacho de rejeição, no TCA Sul, do recurso para ele interposto.
B. Sendo de evidenciar que as decisões que recaíram sobre os recursos interpostos pela Recorrente nunca conheceram do objeto do referido recurso da sentença exequenda, em virtude de questões de natureza processual - meios de reação e sua admissibilidade.
C. Assim sucedeu pese embora a prolação do despacho, do TAC de Lisboa, que admitiu o recurso da decisão exequenda para o TCA Sul, mas que ficou sem efeito por força do acórdão, em conferência, daquele TCA, proferido nos termos do artigo 685.° - C, n.° 5 do CPC de 1961.
D. Sendo que, em bom rigor, a Recorrida poderia, desde logo, ter requerido a execução da sentença dos autos principais, o que se tornou mais evidente desde o momento em que o TCA Sul se pronunciou no sentido da sua irrecorribilidade - por considerar que o meio de reação processual adequado seria a prévia reclamação para a conferência.
E. Efetivamente, a Recorrida, nessa fase processual, já sabia que o eventual recurso que a Recorrente interpusesse para o STA, não poderia ter como objeto o conteúdo da sentença exequenda - e de facto não teve.
F. Podendo a Recorrente, apenas e tão só, cingir-se ao conteúdo da decisão do TCA Sul.
G. Incidindo sobre matéria que foi considerada como estando já respondida na jurisprudência do STA.
H. Como bem se considerou provado na sentença ora recorrida, sob o ponto 9 dos Factos provados, da decisão de não admissão do recurso (...), a Entidade Executada apresentou recurso para o STA.
I. Assim, o trânsito em julgado da decisão exequenda, tendo a sua notificação sido expedida em 15/06/2012, ocorreu em 28/06/2012.
J. Caso assim não se entendesse, sempre a decisão exequenda teria transitado em 13/09/2013, já decorrido o prazo de 10 dias (suspenso em férias judiciais) contado da expedição da notificação da decisão do TCA Sul, em 12/07/2013, quanto mais não fosse perante a inexistente identidade de objeto dos recursos para o TCA Sul e para o STA.
K. Assim, tendo presente a analogia das situações supramencionadas (pela Recorrente) com a situação em apreço nestes autos, é patente que, no caso, que se aventa hipoteticamente, de a decisão exequenda não ter transitado em julgado logo que decorrido o prazo de reclamação da sentença do TAC de Lisboa, então terá a mesma transitado logo que decorreu idêntico prazo relativamente ao acórdão do TCA Sul.
L. Caducou, por tudo o atrás exposto, o direito de execução de julgado.
M. Devendo a decisão recorrida ser revogada, julgando-se procedente a exceção de caducidade arguida pela Recorrente.
N. A Recorrida passou à situação de disponibilidade na data em que perfez 60 anos de idade - em 10/05/2012 - cfr. Diário da República, n.° 116/2012, II Série, de 18/06/2012.
O. Tendo o legislador estabelecido, através do Decreto-Lei n.° 40-A/98, de 27 de fevereiro, que define o Estatuto da Carreira Diplomática (ECD), no respetivo artigo 22.°, que “os funcionários diplomáticos na situação de disponibilidade não podem ser promovidos".
P. O instituto da disponibilidade encontra plena justificação no particularismo específico da atividade diplomática e nas especificidades das funções desempenhadas pelos seus funcionários, tendo um fim legal que é o melhor cumprimento das tarefas que incumbem ao serviço diplomático e aos respetivos funcionários, ou seja, a melhor representação e interesses do Estado Português no estrangeiro.
Q. O regime da disponibilidade não impede nem o exercício de funções, nem a progressão, impede, sim, a promoção e a colocação ordinária no estrangeiro de pessoas suscetíveis de revelarem menor capacidade para se adaptar a situações novas ou assumir responsabilidades mais exigentes.
R. Assim, a característica fundamental do regime da disponibilidade consiste apenas no afastamento do diplomata do exercício permanente de funções nos Serviços Externos, abrindo vaga na categoria, mas não no afastamento da carreira, em relação à qual se mantém vinculado.
S. Essa é a situação em que se encontra a Recorrida, resultante, aliás, do despacho, não impugnado, publicado no Diário da República atrás citado.
T. Implicando que, anulado o ato impugnado e ainda que fosse repetido (mesmo que parcialmente) o procedimento de promoção, a Recorrida nunca poderia ser promovida à categoria de ministra plenipotenciária.
U. Tal constitui um facto legal que absolutamente impossibilita o cumprimento da sentença exequenda.
V. Não sendo materialmente possível praticar um ato administrativo que vise produzir efeitos num período de tempo em que já se produziram outros efeitos de outro ato administrativo posterior - a sobredita decisão de passagem à referida situação de disponibilidade.
W. Trata-se de efeitos vinculados que são incompatíveis com os efeitos do ato que se pretende executar, que se sobrepõem a esses efeitos.
X. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu diferentemente, resultando da sentença recorrida a imposição, para a Recorrente e os órgãos incumbidos da execução, da obrigação de se socorrerem de uma ficção, nomeadamente, da ficção de que os atos a repetir, por hipótese no ano 2021, se passaram no ano 2007.
Y. Porém, a eficácia retroativa dos atos de execução, imposta pela sentença recorrida, não é viável, dado que implica uma completa distorção da realidade atual.
Z. E assim cremos, porquanto os efeitos retroativos estabelecidos na sentença recorrida acarretam também, e necessariamente, efeitos no momento presente.
AA. Desde logo, a ficção que o Tribunal a quo impõe que se opere, desconsidera a realidade atual (idade da Recorrida) e a sua conformação normativa (impedimento legal da promoção), levando à prática, na atualidade (mesmo ficcionando que estejamos em 2007), de um ato que constitui uma exceção, casuística, à aplicação do citado artigo 22.°, do Decreto-Lei n.° 40- A/98, de 27 de fevereiro.
AB. Contrariamente, defendemos que, à data da prática dos atos elencados na parte V da sentença recorrida, a Recorrida deveria reunir as condições pessoais e legais para poder participar em procedimento de promoção a Ministro Plenipotenciário, o que manifestamente não sucede.
AC. A fim de melhor ilustrarmos a referida posição, poderíamos, até, atentar, por exemplo absurdo, na seguinte hipótese: fazendo uso do mesmo tipo de ficção, uma entidade pública ser condenada, no ano 2021, a admitir um septuagenário a provas teóricas e práticas com vista à obtenção de licença para pilotar aviões comerciais - porque, para além do mais, à data da impugnação do ato anulado - recusa de admissão às provas -, aquele ainda não tinha excedido o limite de idade para esse efeito.
AD. Ora, a fazer aplicação do entendimento plasmado na sentença recorrida, a entidade pública competente, no caso ilustrado, seria obrigada, in extremis, a conceder a referida licença caso o impugnante passasse nas ditas provas - ultrapassando, desse modo, o normativo legal que proibia tal ato.
AE. A hipótese atrás ilustrada seria igualmente válida relativamente a médicos, polícias, militares, e outras carreiras especialmente reguladas, designadamente quanto a limitações em função da idade - como, também, é o caso da Carreira Diplomática -, não se vislumbrando a razão pela qual, na Carreira Diplomática, não haveria, de igual modo, de se considerar as condições pessoais e legais de ingresso ou promoção, nomeadamente em razão da idade, ou de situação legal dela decorrente.
AF. Deste modo, à data da execução, a situação de disponibilidade da Recorrida e o impedimento legal resultante de tal situação, conforme estabelece o artigo 22.° do Decreto-Lei n.° 40-A/98, de 27 de fevereiro, concorrem, pois, para a verificação da invocada causa legítima de inexecução.
AG. Versando sobre o domínio da causa legítima de inexecução, em sede semelhante, foi, designadamente, produzida a seguinte jurisprudência dos tribunais superiores: Acórdão do TCA Norte proferido em 15/03/2019 no processo n.° 76/11.5BECBR: “(…) 11-2 - os actos do procedimento não podem repetir-se apenas para se verificar se o Exequente seria provido no lugar de (...), de forma a poder eventualmente reconstituir o que poderia ter sido a sua carreira até ao momento da aposentação; 11.3 - para ser proferido um acto substitutivo do que foi anulado, necessário seria que o Exequente reunisse, à data da repetição, as condições pessoais para o efeito, quais sejam as de lhe ser possível ser candidato ao dito concurso (..); II.4 - só fazia sentido para a Entidade Executada renovar o acto anulado, isto é, prosseguir o concurso para preenchimento da vaga aberta, se o candidato, único concorrente, estivesse em condições pessoais de a vir a preencher, e ser provido na respectiva vaga, o que não se verifica; II.5 - não há interesse do Exequente, digno de tutela judicial, que justifique a ficção de um acto sem qualquer utilidade; II.6 - não há princípio ou regra de direito que imponha à Administração a ficção de um acto inócuo; II. 7 - repetir e/ou prosseguir com o concurso para o qual o único candidato concorrente já se encontra em situação de aposentação, não podendo preencher a respectiva vaga, por se encontrar na situação de aposentado, representaria desenvolver esforços e despender recursos humanos e materiais sem qualquer utilidade, o que poria em causa o interesse público, tal como foi invocado pela Executada como fundamento da existência da causa legítima de inexecução.” E, também, o Acórdão do TCA Sul proferido em 26/11/2020 no processo n.° 163/05.9BELLE-A: “i) A simples admissão a um concurso não garante que nele se logre êxito. ii) Por forma a ser proferido um novo ato, necessário seria que o Exequente reunisse, à data da repetição, as condições pessoais para o efeito, quais sejam a de lhe ser possível ser candidato ao dito concurso, para aí ser avaliada a sua candidatura.(...)”
AH. Adotando o mesmo entendimento, foi proferida sentença, em 29 de abril de 2014, pela 2.a U.O. do TAC de Lisboa, no processo n.° 92/11.7BELSB, em que se decidiu em termos semelhantes, no sentido de a passagem à disponibilidade constituir causa legítima de inexecução;
AI. Sendo de evidenciar a sentença proferida em outro processo proposto pela ora Recorrida contra a ora Recorrente, ainda na fase declarativa, e que, pese embora tenha sido objeto de recurso, interposto pela ora Recorrente (na parte referente à anulação dos atos impugnados), considerou, igualmente, a referida passagem à disponibilidade como constitutiva de causa legítima de inexecução - sentença proferida, em 31 de maio de 2021, pela 6.a U.O. do TAC de Lisboa, no processo n.° 808/10.9BELSB.
AJ. Por idênticas razões de facto e de direito, e seguindo a posição consagrada na jurisprudência supra, cuja lógica é perfeitamente aplicável ao caso sub judice, deverá julgar-se verificada a causa legítima de inexecução invocada pela Recorrente.
AK. Causa legítima, que, olhando à substância dos factos invocados, e à sua conexão com os efeitos destrutivos em cadeia que, seguramente, se verificariam em toda a Carreira Diplomática - e, consequentemente, na representação dos interesses de Portugal e dos Portugueses no Estrangeiro -, se reconduz, igualmente, a um grave e excecional prejuízo para o interesse público.
AL. O referido grave e excecional prejuízo para o interesse público, neste caso em concreto, é também um efeito necessário do não reconhecimento da causa legítima de inexecução invocada pela Recorrente, assente, sublinha-se, num facto legal e absolutamente impossibilitante do cumprimento da sentença - a passagem da Recorrrida à situação de disponibilidade.
AM.) Realçando-se que este facto absolutamente impossibilitante tem natureza legal, porquanto resulta da aplicação, à situação individual da Recorrida, da própria lei vigente - a saber, da norma constante do artigo 22.° do Decreto-Lei n.° 40-A/98, de 27 de fevereiro,
AN. Lei que, por força da sentença recorrida, acaba, incompreensivelmente, desaplicada, operando-se uma exceção à mesma para resolução do presente caso - em evidente violação do princípio de que as leis são gerais e abstratas.
AO. Mais do que a desaplicação casuística da invocada norma, é a desconsideração da respetiva ratio legis que gerará, mais relevantemente, o grave e excecional prejuízo para o interesse público,
AP. Nomeadamente a desconsideração das razões, relacionadas com os requisitos do desempenho de funções diplomáticas no estrangeiro - e que foram atrás afloradas -, que levaram o legislador a entender serem de tal ordem importantes para a disciplina da Carreira Diplomática e para os interesses do País, que estiveram na génese da norma desaplicada.
AQ. Mas, e mais impressivamente ainda, o interesse público resulta seriamente prejudicado pelo facto de a execução do julgado, estribada na supramencionada ficção (de regresso ao ano 2007), provocar, como acima defendido, efeitos destrutivos em cadeia em toda a Carreira Diplomática,
AR. Sendo de evidenciar que o interesse público ficará seriamente prejudicado, se não se atender à causa legítima de inexecução invocada pela Recorrente, na medida em que a execução do julgado vai pôr em causa outros procedimentos de promoção, a Ministro Plenipotenciário e a Embaixador, que tiveram lugar na sequência do concurso do ano 2007 - sendo certo que há muitos Diplomatas intervenientes neste procedimento que entretanto participaram, e foram promovidos, em posteriores concursos de promoção, e tais procedimentos teriam de ser repetidos, com a nuance de que, dependendo as condições de participação nos concursos posteriores dos resultados do concurso impugnado, e bem assim das condições pessoais de cada Diplomata, muitos já não estariam em condições de ser promovidos, e de confirmar as posteriores promoções,
AS. Tal execução irá provocar, também, indefinição quanto à validade dos atos e da representação levados a efeito por muitos dos Diplomatas portugueses, segundo a competência própria da sua categoria, que ficaria posta em crise,
AT. E, na prática, congestionará a atividade diplomática portuguesa, ou seja, no fundo, congelará a execução da política externa do Estado, a defesa dos seus interesses no plano internacional e a proteção, no estrangeiro, dos direitos dos cidadãos portugueses.
AU. Dúvidas não pode haver, pois, quanto à existência da causa legítima de inexecução invocada pela Recorrente, e do subjacente efeito, adveniente da sua desconsideração, consubstanciado no grave e excecional prejuízo para o interesse público.
AV. A decisão do Tribunal a quo, ao concluir que no presente caso inexiste a causa legítima afirmada pela Recorrente, enferma de erro de aplicação do direito, em violação do disposto, designadamente, no artigo 22.° do Decreto-Lei n.° 40-A/98, de 27 de fevereiro e do artigo 163.° do CPTA.
AW. E ainda que não se qualificassem os factos atrás descritos como causa legítima de inexecução - o que só se concebe por dever de cautela de patrocínio -, sempre dos mesmos decorreria a falta de interesse da Recorrida no prosseguimento dos autos.
AX. Isto é, ainda que, nos termos da sentença recorrida, o procedimento de onde surgiu o ato anulado retroagisse ao momento procedimental de avaliação dos candidatos, a Recorrida nunca poderia ser promovida, ex vi do citado artigo 22.° do Decreto-Lei n.° 40-A/98, de 27 de fevereiro.
AY. Sustentando tal entendimento, foi proferida a seguinte decisão, em 09/06/2015, pelo STA, no processo n.° 12/11-A (execução do acórdão do Pleno de 22/10/2013), processo em que, de igual modo, se suscitava a questão da passagem à situação de disponibilidade dos Diplomatas, supervenientemente à prolação da sentença dos autos declarativos, e efeitos dessa situação nessa execução: “2.3. (...) Ora, nos termos do 22.° do Estatuto da Carreira Diplomática «Os funcionários diplomáticos na situação de disponibilidade não podem ser promovidos». Isto significa que desde a passagem à situação de disponibilidade o exequente deixou de ter interesse nos actos de execução que removendo a promoção dos dois contra interessados reabririam as vagas de embaixador, pois nenhum benefício deles tiraria, por já não poder ser promovido." (...) “2.5. (...) Na verdade, aqui (...), do que se trata é de a Administração retirar as consequências da anulação das promoções dos dois contra interessados: eles não poderão manter-se na categoria de embaixadores, se essa categoria advém do título que foi arredado da ordem jurídica. Trata-se, assim, de administrativamente repor a situação que existiria não fossem os actos anulados, ou seja, a recondução dos contra interessados à categoria de ministros plenipotenciários, o que acarretará que se reabram as vagas de embaixador por eles preenchidas. Mas não fica(ria) aberto nenhum direito do autor, exequente, a qualquer concreta promoção, nomeadamente, qualquer direito a que na reconstituição da situação hipotética se considerasse que ele teria sido promovido à data de qualquer dos actos anulados. Apenas, como se disse, reentraria na possibilidade de ser promovido, e apenas para futuro, nunca em relação à data dos actos anulados (sublinhado nosso). (...) “2.7. (...) Do que se trata não é de impossibilidade da execução mas, sim, e apenas, da falta total de interesse do exequente no prosseguimento dos autos. O exequente pretende que há uma causa legítima de inexecução, por isso que intenta a passagem à fase de determinação de indemnização em razão da inexecução por causa legítima. Mas não há lugar a tal. Não há lugar porque a passagem do exequente à situação de disponibilidade não é causa de inexecução. O que há é que da execução o exequente não poderá retirar quaisquer consequências vantajosas. Pois que se encontra na situação de disponibilidade, a janela que lhe ficaria aberta, bem como aos demais ministros plenipotenciários, de reentrar na possibilidade de ser promovido, se e quando a Administração entendesse promover, e era só isto, já não lhe aproveita. Na disponibilidade não pode vir a ser promovido. Outros colegas, se a Administração vier a executar, poderão aproveitar, não o exequente." “2.8. O que restará, sim, é a questão da indemnização. Só que aqui, há que ter em atenção o seguinte. Uma coisa é a indemnização a que se reporta o exequente no requerimento (...), em que veio indicar como entendia que a execução se devia realizar, outra é a indemnização que sugere no seu último requerimento (...): Relembre-se, o primeiro: «Deverá o MNE ser condenado a ressarcir os danos morais e patrimoniais causados por si ao Exequente pela prática destes actos ilegais, danos do montante que vierem a liquidar em execução de sentença, de forma a reconstituir a situação hipotética actual do Exequente, no caso de tal acto ilegal não ter sido praticado». E o segundo: «deverá ser ordenada à Administração que no prazo de 20 dias, acorde com o Exequente no montante indemnizatório devido pelo facto da inexecução, nos termos do disposto no Art. 166° n. 1, n.2 e n.3 do CPTA». Esta última supõe, portanto, o reconhecimento de causa legítima de inexecução, e é a que se encontra prevista no artigo 178.°, 1 do CPTA. Não se reconhecendo essa causa, não há lugar a ela. Já a primeira é uma indemnização pela prática dos actos ilegais. Ora, essa, sim, que poderá subsistir, não é do âmbito do processo executivo. Como tem sido repetidamente afirmado neste Supremo Tribunal - por exemplo, acórdão de 7.5.2015, processo 47307/A, acórdão de 25.9.2014, processo 01710/2014, acórdão de 2.12.2010, processo 47579/A -, não é de atender, no processo de execução de sentença anulatória de actos administrativos, aos «danos emergentes e lucros cessantes em razão da prática do acto anulado», visto neste processo nada mais se poder reclamar «que o arbitramento duma indemnização pelo facto da inexecução» (em ponto XXXVIII do dito acórdão de 7.5.2015). E, assim, poderemos concluir que há, na realidade, inutilidade superveniente da lide, pois o exequente só poderia retirar alguma utilidade dela se a indemnização a que terá direito pudesse ser efectivada neste processo. Mas não podendo, está-se, exactamente, na situação de que o prosseguimento destes autos «não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor», acarretando aquela inutilidade - artigo 277.° do CPC, por força do artigo 1.° do CPTA. (...) 3. Pelo exposto, julga- se extinta a instância por inutilidade superveniente (...)”
AZ. Assim, na hipótese de se considerar que a passagem à situação de disponibilidade, ou os efeitos destrutivos em cadeia referidos, prejudicando seriamente o interesse público, não constituem causa legítima de inexecução, sempre estaríamos perante uma inutilidade superveniente da lide, fundada na ausência de qualquer vantagem que a Exequente pudesse retirar da execução.
BA. Adicionalmente, a Recorrida não demonstra, nem pode demonstrar, que seria promovida a Ministra Plenipotenciária, mediante a repetição (parcial, como resulta da sentença recorrida) do processo de promoção.
BB. É que, encontrando-se, a Recorrida em condições de promoção desde o ano 2000, pelo menos, a mesma participou, por várias vezes, nos procedimentos de promoção, porém nunca logrando ser colocada na lista final em posição suscetível, ou sequer próxima, de assegurar a promoção, conforme se sistematiza no quadro infra:
BC. Estatisticamente, pois, fica demonstrada a maior probabilidade de não ocorrer a promoção da Recorrida.
BD. Deste modo, a Recorrida também não logra, nem lograria nunca, demonstrar que alcançaria quaisquer vantagens com a execução do julgado.
BE. Em face do que, no caso de não se considerar existir causa legítima de inexecução, deverá a execução ser extinta por inutilidade da lide.
BF. Por outro lado, no concernente à sanção pecuniária compulsória, a páginas 16 da sentença recorrida, considerou o Tribunal a quo: “Consequentemente, inexistindo causa legítima de inexecução, outra solução não restava à Executada que não a de dar execução à sentença exequenda (...) Execução essa que, como consta de 12 dos factos provados, a Executada confessa expressamente não ter empreendido".
BG. A este propósito se diga que a confissão que o Tribunal a quo mencionou resultou efetivamente de declaração da Recorrente, mas, evidenciamos, alcançada em consequência do cumprimento do despacho, de 20/05/2021, que ordenou a notificação da Recorrente para informar se procedeu à execução da decisão exequenda, tendo a Recorrente informado os autos de que “não procedeu à execução da decisão exequenda, por considerar que se mantêm os motivos invocados na contestação - designadamente, a arguida exceção perentória de causa legítima de inexecução".
BH. Assim se questiona em que medida o Tribunal a quo pôde concluir, como se a Recorrente nunca houvesse arguido os factos que defendeu constituírem causa legítima de inexecução, que “a Entidade Executada decidiu não executar a sentença sem qualquer motivo justificativo".
BI. Com o devido respeito, que é muito, tal conclusão do Tribunal a quo afigura-se de molde a transparecer uma imagem, que não é real, de desinteresse, por parte da Recorrente, pelo cumprimento da decisão exequenda, como se a mesma nunca tivesse intervindo na presente execução, nomeadamente em sede de contestação, para o efeito de aduzir, como fez, as razões de facto e de direito que considerou serem impeditivas da execução de julgado requerida pela Recorrida.
BJ. Mas, em boa verdade, a Recorrente não decidiu não executar a sentença sem qualquer motivo justificativo, sendo que, diversamente, a Recorrente justificou, perante o Tribunal a quo, as razões, supervenientes à sentença exequenda (tendo a passagem da Recorrida à disponibilidade sido publicitada no Diário da República, n.° 116/2012, II Série, de 18/06/2012), pelas quais entendia haver causa legítima de inexecução.
BK. Simplesmente, o Tribunal a quo não atendeu a tais razões, para o efeito de considerar preenchido o conceito de causa legítima de inexecução.
BL. O que poderia afigurar-se totalmente irrelevante, ou não fosse o facto de o Tribunal a quo determinar a aplicação, aos titulares do Conselho Diplomático e ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, de uma sanção pecuniária compulsória, fixada no valor diário de 5% (cinco por cento) do salário mínimo nacional,
BM. E não fosse também o facto de o Tribunal a quo igualmente determinar, para os efeitos previstos no artigo 159.° do CPTA, a emissão e remessa de certidões, da decisão recorrida, ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas e à Inspeção Geral Diplomática e Consular,
BN. Significando com isso que o Tribunal a quo já considerou, frise-se que antecipadamente, e designadamente quanto às determinações estribadas no n.° 2 do supracitado artigo, que os titulares dos órgãos responsáveis pelo cumprimento: i) manifestaram a inequívoca intenção de não dar execução à sentença, sem invocar a existência de causa legítima de inexecução - o que, como é patente nos autos, não sucedeu, ou, ii) não procederam à execução nos termos que a sentença tenha estabelecido ou que o tribunal venha a definir no âmbito do processo de execução - o que também não sucedeu, dado que a definição dos referidos termos é objeto da presente execução de julgado, nomeadamente da sentença de que se recorre.
BO. De outro modo, para que efeito seriam o MP, o T. Contas e a IGDC, desde já, oficiados, a fim de tomarem conhecimento da sentença recorrida? Antes mesmo de serem identificados no processo, os titulares dos órgãos encarregados da execução? E de decorrer o prazo fixado para o cumprimento da sentença?
BP. A este respeito, damos por reproduzido o que, nas alegações que antecedem estas conclusões, citámos dos ensinamentos de Mário Aroso de Almeida e de Carlos Alberto Fernandes Cadilha, doutrina que é aplicável, por maioria de razão, à sentença proferida na etapa declarativa do processo executivo - realçando-se que, quanto a tal sentença, se esgotou o poder jurisdicional do Juiz.
BQ. Impugnando-se a fixação, pelo Tribunal a quo, da sanção pecuniária compulsória que, nessa mesma sentença, veio a ser aplicada aos titulares dos órgãos encarregados da execução, sem que os mesmos se encontrassem individualmente identificados no processo, por um lado,
BR. E, por outro lado, sem que tenha sido feita, na sentença recorrida, qualquer alusão aos motivos, em concreto, que levaram o Tribunal a quo a considerar justificada a aplicação da sanção pecuniária compulsória - o que constituirá, ainda, uma nulidade da decisão, por falta de fundamentação.
BS. A acrescer à nulidade supracitada acrescerá, também, o facto, também gerador de nulidade, de não ter sido cumprido o contraditório previamente à aplicação da sanção pecuniária compulsória.
BT. Neste âmbito foi, designadamente, produzida a seguinte jurisprudência dos tribunais superiores: Acórdão do TCA Sul proferido em 20/04/2017 no processo n.° 107/06.0BELLE-B: “(...) II - Atenta a sua natureza e função, a sanção pecuniária compulsória só é aplicável quando tal se justifique, pressupondo este critério de justificação um juízo de valor sobre o eventual incumprimento da decisão, assente na ponderação dos factos concretos que permitam concluir se o eventual incumprimento é ou não desculpável visando compelir ao cumprimento da injunção e é imposta intuitu personae na medida em que tem por destinatários os titulares do órgão ou órgãos administrativos que exercem a competência administrativa adstrita ao cumprimento do dever jurisdicionalmente imposto à Administração. III - A sanção pecuniária compulsória prevista no artigo 169° do CPTA não pode ser aplicada, sob pena de violação do princípio do contraditório, sem que, previamente, seja dada oportunidade ao titular do órgão incumbido da execução da sentença para se pronunciar sobre a imposição da referida sanção." E, também, o Acórdão do STA proferido em 28/01/2010 no processo n.° 0941A/05 (execução de julgado do STA tirado em 1 ,a instância): “O que significa que o recurso à aplicação desta medida só pode ser feito “quando tal se justifique”, isto é, quando a mesma se revele necessária ao cumprimento do dever imposto sendo, por outro lado, que a mesma recai sobre a pessoa do titular do órgão encarregado da execução. Deste modo, e apesar dos Executados não terem cumprido espontaneamente o julgado, nada faz supor que, postos perante a presente decisão, continuem indiferentes ao seu cumprimento ou a ele se recusem e, consequentemente, que para esse cumprimento seja indispensável aplicar a medida solicitada. O que impede que, neste momento, se aplique a requerida sanção."
BU. Termos em que a sentença recorrida deverá, também nesta parte, ser revogada, por violação do disposto no artigo 179.°, n.° 3 do CPTA, bem como do princípio do contraditório.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, REQUER-SE QUE SEJA DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO JURISDICIONAL, REVOGANDO A SENTENÇA RECORRIDA E, EM CONSEQUÊNCIA:
a) Seja julgada procedente a exceção de caducidade do direito de ação executiva;
b) Seja declarada extinta a ação por inutilidade superveniente da lide;
c) Se assim não se entender, seja julgada procedente a invocação da existência de causa legítima de inexecução, por facto absolutamente impossibilitante da execução e por grave e excecional prejuízo para o interesse público;
d) E, em qualquer caso, seja revogada a decisão de aplicação da sanção pecuniária compulsória que foi fixada.
Assim se fazendo a costumada Justiça.
*

A Exequente/Recorrida apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões, que igualmente se transcrevem:

1ª. O Recorrente continua a pugnar pela caducidade do direito de acção, mas sem razão, já que a sua tese contraria o princípio da segurança jurídica que é tão caro ao direito e ao Estado de Direito.
2ª. O próprio TAC de Lisboa admitiu o recurso jurisdicional do Recorrente, que, após rejeição pelo TCA Sul, o Recorrente apresentou recurso para o STA, e como ensina Ana Prata “em direito não há verdades absolutas, há posições defensáveis”, pelo que não se sabia como este ia decidir, não podendo a Recorrida ser prejudicada pela actuação dilatória da Recorrente.
3ª. O trânsito em julgado da decisão exequenda só se deu com o trânsito da decisão do STA que indeferiu o recurso apresentado pela Recorrente, e tendo a decisão do STA sido notificada à Exequente em 21/02/2014, conclui-se que a presente acção foi tempestivamente apresentada.
4ª. A sentença exequenda foi proferida em 13/06/2012, tendo sido interposto recurso desta decisão para o TCA Sul, o qual foi admitido com efeito suspensivo, e considerado extemporâneo, pois estava em causa reclamação para a conferência, e o recurso foi apresentado em data em que a reclamação seria de considerar já extemporânea.
5ª. Desta decisão, o Recorrente apresentou novo recurso para o STA, o qual não foi admitido, o que foi notificado às partes em 18/02/2014.
6ª. Em face do efeito suspensivo atribuído à sentença exequenda, só após o trânsito a Recorrida incorreria no dever de executar a sentença, o que efectivamente fez, em tempo.
7ª. O TCA Sul decidiu não admitir o recurso apresentado pelo Recorrente, considerando-o extemporâneo; o que veio a acontecer também com posterior recurso para o STA, pelo que só com o trânsito em julgado desta decisão se iniciou o prazo para a Recorrida executar a sentença anulatória (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 02/05/2016, processo n.º 659/12.6TTMTS.P1, in www.dgsi.pt “… I - Independentemente dos motivos, valores de segurança jurídica implicam que só possa considerar-se transitada em julgado a decisão depois de decorrido o prazo legalmente previsto para a interposição de recurso ou, não sendo este admissível, para a arguição de nulidades ou dedução de incidente de reforma, pelo que quando a decisão é susceptível de recurso ordinário o trânsito em julgado depende, em primeiro lugar, do facto de se encontrarem esgotadas as possibilidades de interposição desse recurso em cujas alegações deve ser integrada a arguição de nulidades da sentença ou a reforma quanto a custas e multa (arts. 615º, nº 4, e 616º, nº 3). II - Quando seja insusceptível de recurso ordinário, o trânsito em julgado ocorre com o esgotamento do prazo para a arguição de nulidades da sentença ou dedução do incidente de reforma, nos termos dos arts. 615º, nº 4, e 616 (e dos arts. 666º e 685º quando estejam em causa acórdãos da Relação ou do Supremo, respectivamente). III - Todavia devemos considerar que podem ocorrer vicissitudes susceptíveis de determinar tanto a antecipação como o diferimento da data do trânsito em julgado. Assim quanto a esta última, há efeitos que forçosamente se produzem mesmo quando o recurso é rejeitado, tendo em conta a necessidade de aguardar a definitividade do despacho de não admissão, sujeito a reclamação para o tribunal superior, nos termos do artigo 643º. O mesmo ocorre nos casos em que a parte opte pela arguição de nulidades ou apresentação de requerimento, ainda que infundado, no sentido de obter a reforma da decisão. IV – Portanto, a insusceptibilidade do recurso ordinário só se verifica depois de ser confirmado pelo tribunal ad quem o despacho de não admissão do recurso…”.
8ª. Assim, a sentença exequenda apenas transitou em julgado com o trânsito da decisão do STA que não admitiu o recurso da Recorrente da decisão do TCA Sul que não admitiu o recurso apresentado pela Recorrente da sentença proferida em primeira instância, nos autos principais.
9ª. A decisão do STA considerou-se notificada às partes em 21/02/2014, pelo que o trânsito em julgado da decisão do STA só operou com o decurso dos 10 dias de que as partes dispunham para a apresentação de reclamação desse Acórdão, ou seja, no dia 06/03/2014, e só dia 07/03/2014 é que se iniciou o prazo procedimental constante do n.º 1 do artigo 175º do CPTA de 3 meses de que a Recorrente dispunha para dar execução à sentença ora exequenda, o qual terminou em 17/07/2014.
10ª. Assim, o prazo de 6 meses de que a Recorrida dispunha para intentar a presente acção executiva iniciou-se no dia 18/07/2014, e, tendo a presente acção sido intentada em 03/12/2014, foi a mesma apresentada em tempo.
11ª. Deste modo, dúvidas não subsistem de que inexiste a alegada excepção de caducidade do direito de acção.
12ª. A Recorrente ao voltar, em sede do presente recurso, a invocar que a sentença exequenda transitou em julgado em 28/06/2012, continua a litigar com manifesta mé fé, pois deduz oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar e omite factos relevantes para a boa decisão da causa, nos termos do artigo 542º do CPC.
13ª. Tal constitui abuso de direito na modalidade “venire contra factum proprio”, pois sabe muito bem que interpôs os recursos que impediram o trânsito em julgado da decisão do TACL, mas, simultaneamente, pretende que o trânsito em julgado ocorreu muito antes da decisão final que recaiu sobre os recursos que interpôs.
14ª. Deste modo, deve ser condenada em multa e indemnização, a fixar segundo o prudente arbítrio de V. Exas., nos termos do artigo 543º do CPC.
15ª. Pretende a Recorrente que existe “Causa Legítima de Inexecução”, afirmando que a Recorrida nunca seria promovida à categoria de ministra plenipotenciária, por se encontrar na situação de disponibilidade, o que determina o afastamento do diplomata do exercício permanente de funções nos serviços externos, abrindo vaga na categoria, mas não no afastamento da carreira, em relação à qual se mantém vinculado, mas sem razão.
16ª. A presente execução pretende que o Tribunal condene a Recorrente a praticar todos os actos necessários à reconstituição da situação que existiria caso o acto anulado nos autos principais não tivesse sido praticado, pelo que, uma vez transitada tal decisão, devia a Recorrente ter dado execução ao julgado anulatório.
17ª. A Recorrente refugia-se na passagem da Recorrida à disponibilidade quando atingiu os 60 anos, nos termos do artigo 22º do Decreto-Lei n.º 40-A/98, de 27/02, para afirmar que os funcionários diplomáticos na situação de disponibilidade não podem ser promovidos, pelo que, em virtude da referida disposição legal, a Recorrida não podia ser promovida de conselheira de embaixada (categoria com que passou à disponibilidade) a ministro plenipotenciário, o que consubstanciaria causa legítima de inexecução, mas, mais uma vez, sem razão.
18ª. Prevê o artigo 163º, n.º 1, do CPTA, que constitui causa legítima de inexecução, a impossibilidade absoluta de execução da sentença exequenda ou a verificação de grave prejuízo para o interesse público, sendo que o Recorrente, apenas em sede de recurso vem alegar a existência de grave prejuízo para o interesse público, não o tendo feito em sede de contestação, pelo que a douta sentença recorrida não se pronunciou sobre tal questão, não podendo a Recorrente extravasar colocar questões “ex novo”, que não foram abrangidas pela sentença recorrida
19ª. Porém, não se descortina que se verifique grave prejuízo para o interesse público, cujo conceito como causa legítima de inexecução de sentença pressupõe a existência de situações excepcionais ou situações limite, não bastando a simples dificuldade ou onerosidade no cumprimento do julgado, sendo que recai sobre a entidade recorrente o ónus de alegar e provar a gravidade do prejuízo para o interesse público, não chegando os alegados efeitos destrutivos na carreira diplomática invocados pela Recorrente.
20ª. A ocorrer algum efeito grave da execução do julgado, é imputável ao Recorrente, que cometeu todas as ilegalidades de que padece o acto anulado, com vista a colocar a Recorrida no fim da lista e impossibilitá-la de ascender à categoria de ministro plenipotenciário.
21ª. Sendo o acto anulado de 2007, a sentença anulatória, de 2012, teve o Recorrente muito tempo para suprir as ilegalidades, e impedir que outras se viessem a cometer, mas não o fez, limitando-se a invocar factos e argumentos que sabe não corresponder à verdade, o que reforça o pedido de condenação como litigante de má fé, em multa e indemnização, como atrás alegado.
22ª. A sentença exequenda determina a anulação do acto de homologação da lista de ordenação final dos diplomatas em condições de serem nomeados ministros plenipotenciários e declarou nulos os actos de nomeação subsequentes, pelo que é possível a reconstituição natural do presente julgado anulatório, nos termos do artigo 173º, n.º 1, do CPTA, em obediência ao princípio geral do efeito retroactivo das invalidades dos actos administrativos.
23ª. O acto de homologação anulado pela sentença exequenda foi praticado em data em que a Recorrida ainda estava longe de completar 60 anos de idade, pelo que, tendo em consideração o efeito retroactivo das invalidades dos actos administrativos, assim como a eficácia retroactiva dos actos de execução de sentença, à data em que o acto a praticar em sede de execução de sentença produzirá efeitos – 11/10/2007 – a Recorrida não se encontrava na situação de disponibilidade, sendo que estava apta a poder ser promovida a ministro plenipotenciário e nessa conformidade continuar a desenvolver a sua carreira diplomática.
24ª. Ora, a verdade é que a Recorrida, tal como consta dos documentos do MNE, que, agora, por forma superveniente logrou obter, e que se juntam como docs. 1, 2 e 3, relativos aos anos de 2010, 2011 e 2012, encontrava-se, nos três anos, na posição 4 dos Conselheiros de Embaixada que em 31 de Dezembro de 2010 reuniam condições de acesso à categoria de Ministro Plenipotenciário.
25ª. No quadro de fls. 41 e 42 da alegação da Recorrente, relativo ao ano de 2011, ao contrário do invocado por esta, a recorrida encontra-se em 4º lugar na lista dos promovíveis num concurso que abriu para 9 vagas, pelo que o mais do que normal seria ser promovida, ao contrário do que afirma a Recorrente.
26ª. No aludido quadro da Recorrente, a Recorrida no ano de 2010 encontra-se na posição 20 para ser promovida a Ministro Plenipotenciário, havendo 10 vagas para tanto, quando, nos documentos do próprio Recorrente – Docs. 1 a 3, refere que a Recorrida se encontra na 4ª posição.
27ª. Quanto aos anos de 2011 e 2012, o quadro da alegação da Recorrente refere que a Recorrida se encontra, respectivamente, na posição 16 e 17, havendo 9 vagas para cada ano na categoria de Ministro Plenipotenciário, quando os referidos documentos demonstram que a Recorrida se encontra na 4ª posição.
28ª. O mesmo acontece com o ano de 2007, em que a Recorrida se encontra na posição 74, sendo que tal afirmação advém das ilegalidades cometidas no acto anulado, que, injusta e ilegalmente, a relegou para aquela posição que não correspondia à realidade dos factos.
29ª. Se assim fosse, não seria possível nos anos de 2010, 2011 e 2012, encontrar-se na posição em que se encontrava no sentido de reunir condições para ser promovida na categoria de Ministro Plenipotenciário. Ou seja, a Recorrida estava em 4º lugar na lista de candidatos e havia 9, 9 e 10 vagas nas categorias, respetivamente em 2012, 2011 e 2010, sendo que esta era a situação de partida, pelo que a promoção estaria perfeitamente ao alcance da recorrida, não fossem as ilegalidades do Recorrente, objeto do processo “sub judice”.
30ª. A situação de chegada no final de cada concurso resulta das ilegalidades cometidas pelo Recorrente no próprio concurso, para não incluir a Recorrida nos promovidos, atirando-a para o fundo da lista e com isso impedindo a sua promoção, pois não faz qualquer sentido que estivesse em 74º lugar em 2007 e em 4º lugar em 2010, 2011 e 2012, sendo certo que, de acordo com os referidos documentos, houve candidatos posicionados abaixo da Recorrida que lograram ser promovidos à categoria de Ministro Plenipotenciário, quando a Recorrida sempre foi considerada uma funcionária excepcional, com um excelente currículo – docs. 4 e 5.
31ª. Assim, tal como alegado pela, ora Recorrida e nos termos em que decidiu a douta sentença recorrida, deve o recorrente dar cumprimento ao n.º 1 do artigo 179º do CPTA, devendo executar a decisão constante da douta sentença recorrida.
32ª. Ao contrário do pugnado pela Recorrente, a Recorrida mantém todo o interesse no prosseguimento do presente processo, inexistindo qualquer razão para ser decretada a inutilidade superveniente da lide, sendo certo que a passagem da Recorrida à disponibilidade apenas ocorreu em Fevereiro de 2012 e o acto anulado data de 11/10/2007, pelo que entre as duas situações medeou um período de quase 5 anos, inexistindo o alegado facto impossibilitante adveniente do aplicação da norma contida no artigo 22º do Decreto-Lei n.º 48-A/98, de 27 de Fevereiro..
33ª. E muito bem andou a douta sentença recorrida no que concerne à questão da aplicação de uma sanção pecuniária compulsória às entidades nela referidas, pois está demonstrado, à saciedade, que passaram sete anos sobre o trânsito em julgado da sentença anulatória e o Recorrente não se dignou executá-la.
34ª. Tampouco apresentou causa justificativa bastante e fundamentada que pudesse obstar a tal execução, sempre pugnando, aliás, pela total ausência de direitos por parte da Recorrida, como, aliás, se retira das suas alegações de recurso, onde olvida, em absoluto, a situação da Recorrida, o que adensa a má-fé com que litiga.
35ª. Aliás, ao contrário do que pretende o Recorrente, a fixação da sanção pecuniária compulsória, se peca, é por defeito, atentas todas as circunstâncias e demoras do caso.
Nestes termos e nos mais de direito, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve:
- Ser o Recorrente condenado em multa e indemnização por litigância de má-fé, nos termos supra alegados;
- Ser o presente recurso considerado totalmente improcedente, por não provado, mantendo-se a douta decisão recorrida na Ordem Jurídica, assim se fazendo a costumada e inteira
……JUSTIÇA!
*

A Exequente apresentou recurso subordinado, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

1.ª A douta sentença recorrida considerou que se verificava a forma errada do processo, absolvendo da instância, a entidade executada, relativamente aos pedidos indemnizatórios referentes a danos não patrimoniais e a “perda de chance” formulados nos presentes autos, com fundamento em que não integram o dever de a Administração reconstituir a situação que existiria caso o acto anulado não tivesse sido praticado - cfr. artigo 173°, n.° 1 do CPTA.
2.ª Ora, salvo o devido respeito, não se conforma a Recorrente com tal decisão.
3.ª O processo administrativo executivo, para além da fase estritamente executiva, tem e/ou pode ter uma fase declarativa, sendo que o que releva é a reconstituição, na íntegra, da situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado.
4.ª Os pedidos indemnizatórios suprareferidos estão intimamente ligados à reconstituição da situação que existiria se o acto não tivesse sido praticado, pois os mesmos só se foram radicando na esfera jurídica da recorrente, em virtude da prática do acto ilegal.
5.ª Ora, é da ilegalidade do acto anulado que emergem danos não patrimoniais e de “perda de chance” para a Recorrente, em virtude da sua passagem à disponibilidade quando perfez 60 anos de idade, que merecem a tutela do direito, e que foram discriminados na p. i. de execução, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
6.ª O pedido por indemnização por danos não patrimoniais acresce à reconstituição natural, ou, se esta não for possível, ou se vier a ser decretada causa legítima de inexecução, devem acrescer, ao valor indemnizatório que for determinado em relação ao que foi alegado do artigo 1° ao 9° da p.i. de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.
7.ª “In casu”, causa de pedir é a douta sentença que anulou o acto ilegal praticado, sendo que o processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos caracteriza-se por uma estrutura dicotómica que parte de uma necessária fase declarativa, para chegar, se for caso disso, a uma eventual fase executiva....” - V. Manual de Processo Administrativo Mário Aroso de Almeida, pags. 524/526, Ed. 2010.
8.ª Trata-se de uma fase declarativa da execução e, de acordo com o artigo 4°, n.° 1, al. A), e n.° 2, f), do CPTA, é possível cumular o pedido de restabelecimento da situação que existiria se o acto não tivesse sido praticado, com o pedido de condenação da Administração à reparação de danos causados.
9.ª Estes danos podem emergir de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Colectivas, desde que verificados os seus pressupostos: facto ilícito, culpa, nexo de causalidade dano, o que se verifica no caso “sub judice”.
10.ª O pedido de indemnização por danos não patrimoniais, que decorre do artigo 11° e segs., da petição de execução, justifica-se, não só por ainda estarmos numa fase declarativa, mas também por razões de celeridade e economia processuais e de acordo com o dever de gestão processual (cfr. Artigo 6° do CPC, aplicável “ex vi” do artigo 1° do CPTA).
11.ª Neste sentido determina o Acordão do STA, de 30/04/2015, o seguinte: «I- A “forma processual» a usar depende do objectivo que o autor visa alcançar e dos fundamentos que para isso invoca, ou seja, depende do seu pedido e da causa de pedir;
II - Se o autor pediu a tribunal a total execução do julgado anulatório da decisão que lhe aplicou a pena disciplinar de demissão, nomeadamente a progressão na carreira durante os anos em que esteve inactivo e o pagamento dos respectivos vencimentos, tanto o pedido como a causa de pedir cabem na forma processual executiva;
III - O enquadramento de um dos pedidos executórios no âmbito da «teoria da indemnização» não poderá justificar o entendimento de desadequação do meio processual, pois o mesmo tem a ver com a abordagem do mérito desse pedido.
12.ª Assim, a transição do processo inicial, dirigido à adopção das providências necessárias à execução, para um processo de fixação de indemnização, destinada a compensar o exequente, tem lugar, como prevê o n.° 1, do artigo 166° do CPTA, quando o tribunal julgue procedente oposição à execução, fundada na existência de causa legítima de inexecução.
13.ª Assim, caso seja declarada causa legítima de inexecução, é o presente processo o adequado a formular e obter as indemnizações e compensações emergentes do acto anulado (v. Comentário ao CPTA - Prof. Dr. Mário Aroso de Almeida e do Juiz Conselheiro do STJ, Carlos Alberto Fernandes Cadilha).
Nestes termos e nos mais de direito, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso considerado totalmente procedente, por provado, substituindo-se a douta decisão recorrida por outra que acolha a tese da Recorrente, , assim se fazendo a costumada e inteira
JUSTIÇA!

*

O Executado (Ministério dos Negócios Estrangeiros) apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem:

A. Alegou a Recorrente que, no processo administrativo executivo, na sua fase declarativa, pode ser requerida a reconstituição da situação que existiria se o ato não tivesse sido praticado, e que os pedidos indemnizatórios estão intimamente ligados a essa reconstituição.
B. Invocou, ainda, a Recorrente, em abono da sua posição, o preceituado nos n.ºs 1, alínea a) e 2, alínea f), do artigo 4.° do CPTA.
C. Porém, com o devido respeito, a Recorrente não terá razão. Senão vejamos,
D. Como resulta do citado artigo 4.°, n.° 1 do CPTA, em que se lê “É permitida a cumulação de pedidos (...)”, o legislador quis, com essa disposição, regular em que condições o tribunal pode, numa mesma lide, conhecer de mais do que um pedido.
E. Contudo, salvo melhor opinião, os pedidos a que alude o referido preceito reconduzem-se a pretensões deduzidas em processos não executivos,
F. Não colhendo a tese da Recorrente de que, na execução pendente, exista uma causa de pedir, como seja a sentença exequenda - que é, outrossim, um título executivo, mas não uma causa de pedir.
G. Logo, o requisito que a Recorrente invoca como habilitante da pretendida cumulação de pedidos, nomeadamente a mesma e única causa de pedir, não pode ser considerado como preenchido, pois a sentença que foi dada à execução é, tão somente, o título executivo destes autos.
H. Se assim não se entendesse, e caso se considerasse que uma sentença podia configurar a causa de pedir na fase declarativa da correspondente execução, ter-se-ia de concluir que, tal como sucede com qualquer causa de pedir, essa mesma sentença - e os factos e efeitos jurídicos nela fixados - estariam sujeitos a uma segunda apreciação jurisdicional, no caso, pelo Juiz da instância executiva.
I. Pelo que fica demonstrado que o entendimento perfilhado pela Recorrente, não deverá ser atendido.
J. Acresce que nas normas atinentes à execução de sentenças de anulação de atos administrativos, constantes do CPTA entre os seus artigos 173.° a 179.°, inexiste previsão legal da pretendida cumulação, nomeadamente de pedidos de execução com pedidos de natureza declarativa, típicos da ação administrativa.
K. O artigo 45.°, n.° 4 do CPTA confirma, aliás, o nosso entendimento, de que apenas em sede de ação administrativa poderiam ter sido deduzidos os pedidos indemnizatórios formulados pela Recorrente.
L. Referindo-se aquele preceito aos casos em que, na ação declarativa em que já tenha sido cumulado o pedido de reparação, e antecipando o tribunal um juízo de causa legítima de inexecução da sentença a proferir, o autor pode ampliar o pedido indemnizatório já deduzido, de modo a incluir nele o montante da indemnização adicional, devido pela não satisfação da pretensão.
M. Diferentemente, estabeleceu o legislador, como indemnização passível de ser arbitrada na execução administrativa, a indemnização dos danos “pelo facto da inexecução", não contemplando, portanto, pedidos indemnizatórios por danos alegadamente advenientes do ato administrativo anulado.
N. Em face do que, quando a Recorrente, no término das suas alegações recursivas, invoca o artigo 166.°, n.° 1 do CPTA [aplicável ex vi do artigo 178.°, n.° 2 do CPTA], e afirma que na hipótese de ser considerada verificada a causa legítima de inexecução, é no presente processo que se pede a reconstituição da situação que existiria se o ato não tivesse sido praticado, está, na prática, a defender que, nos presentes autos de execução, apenas e tão só, poderia obter o arbitramento de uma indemnização pelo facto da inexecução,
O. E assim é, independentemente da dedução dos pedidos indemnizatórios em cumulação com o pedido de execução, os quais como defendemos, devem improceder por erro na forma de processo.
P. Tal indemnização, referente a danos pelo facto da inexecução - essa sim suscetível de ser arbitrada na presente ação executiva -, não se confunde, sequer parcialmente, com os pedidos indemnizatórios de que a Recorrida foi absolvida.
Q. Sendo que o conhecimento de tais pedidos indemnizatórios implicaria o julgamento dos pressupostos da responsabilidade civil do Estado, como elencados pela Recorrente nas suas alegações recursivas, a saber, o facto ilícito, a culpa, o nexo de causalidade, o dano, o que, a nosso ver, não é compatível com o processo administrativo executivo.
R. Razão pela qual os danos alegados pela Recorrente não podem ser objeto dos presentes autos, apenas podendo sê-lo os eventuais danos resultantes da expropriação do direito à execução.
S. Plasmando este entendimento, cita-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 07/05/2015, tirado no processo 047307A, em que se pode ler, no ponto I do respetivo sumário:
“I - Numa ação executiva de julgado anulatório em que ocorra situação de causa legítima de inexecução apenas pode ser peticionada e arbitrada indemnização dos danos «pelo facto da inexecução» e não dos danos advenientes do ato administrativo ilegal, sendo que a reparação destes deverá ser realizada na ação administrativa comum enquanto forma processual idónea e adequada para tal efeito".
T. Por fim, e com relevância, é de referir o disposto no artigo 179.°, n.° 6 do CPTA, nomeadamente prevendo a fixação de indemnização a título de responsabilidade civil, pela inexecução ilícita da sentença proferida nos autos executivos,
U. Referência que fazemos, apenas, com o intuito de demonstrar que o legislador processual foi claro na tipificação das situações em que, na ação administrativa executiva, pode haver lugar à condenação da entidade executada ao pagamento de indemnizações.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE
V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ O RECURSO SUBORDINADO SER JULGADO IMPROCEDENTE.
Assim se fazendo a costumada Justiça.
*

Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o Ministério Público não emitiu parecer.
*

Com dispensa de vistos, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores adjuntos, vem o processo à conferência para julgamento.


II
Sabendo-se que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do apelante, as questões que se encontram submetidas à apreciação deste tribunal consistem em determinar se a sentença recorrida errou:

Quanto ao recurso independente:
a) Ao julgar improcedente a exceção de caducidade do direito de ação;
b) Ao julgar não verificada a existência de causa legítima de inexecução;
c) Ao julgar não verificada a inutilidade superveniente da lide;
d) Na aplicação de sanção pecuniária compulsória.

Quanto ao recurso subordinado:
Ao julgar procedente a exceção de erro na forma de processo, quanto aos pedidos indemnizatórios.


III
A matéria de facto constante da decisão recorrida – e que não foi impugnada - é a seguinte:


1. Em 28/03/2008 a Exequente apresentou acção administrativa especial através da qual pediu que fosse anulado o acto de homologação do Ministro dos Negócios Estrangeiros, datado de 11 de Outubro de 2007, relativamente à lista final do processo de promoção à categoria de ministro plenipotenciário e que, consequentemente, se declarassem nulos ou anulados os actos de nomeação de ministros plenipotenciários tornados públicos pelo Aviso n.º 23942/2007, publicado em Diário da República.
2. Na acção referida em 1, da qual os presentes autos são apenso, foi proferida sentença que conheceu do mérito da pretensão formulada pela Exequente.
3. A decisão referida em 2 anulou a lista final do processo de promoção referido em 1 com fundamento em vício de violação de lei, por violação do disposto nos artigos 3º, n.º 1 e 5º, n.º 2 da Portaria n.º 595/2007, de 18 de Maio, por vício de falta de fundamentação, designadamente no que se refere à atribuição da avaliação no ponto “ponderação do mérito”, e por violação do direito de audiência prévia dos candidatos em momento posterior à ordenação da lista dos candidatos segundo a classificação atribuída pelo Conselho Diplomático e antes da homologação da lista pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros.
4. A decisão referida em 2 qualificou os actos de nomeação dos 13 conselheiros de embaixada a ministros plenipotenciários, tornados públicos através do Aviso n.º 23942/2007 como actos consequentes do acto de homologação referido em 1.
5. A sentença referida em 2 apresenta o seguinte dispositivo decisório: “Face ao exposto, julga-se a presente acção procedente, por provada e, em consequência, anula-se o acto de homologação do Ministro dos Negócios Estrangeiros, datado de 11 de Outubro de 2007, relativamente à lista apresentada pelo Conselho Diplomático com a proposta de promoção dos conselheiros de embaixada a ministro plenipotenciário e, declaram-se nulos os actos de nomeação dos 13 conselheiros de embaixada a ministros plenipotenciários, tornados públicos através do aviso n.º 23942/2007 publicado no Diário da República, 2ª Série, n.º 236, de 7 de Dezembro de 2007 a páginas 35141 e 35142.”.
6. Da decisão referida em 2 foi interposto recurso pela entidade exequente para o TCA Sul.
7. O recurso foi admitido.
8. O recurso da sentença referida em 2 foi objecto de decisão de não admissão pelo TCA Sul.
9. Da decisão de não admissão recurso supra referida, a Entidade Executada apresentou recurso para o STA.
10. O recurso referido em 9 não foi admitido pelo STA.
11. As notificações da decisão referida em 10 foram remetidas às partes em 18/02/2014.
12. A Entidade Executada não executou a decisão referida em 2.
13. A presente acção foi intentada em 03/12/2014.



IV
Da alegada caducidade do direito de ação

1. O Recorrente mantém a defesa de que se verifica a exceção da caducidade do direito de ação, na medida em que não teria sido observado o prazo imposto pelo artigo 176.º/2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. A questão foi resolvida pela sentença recorrida no sentido da improcedência, com os seguintes fundamentos:

«O recurso da sentença proferida nos autos principais foi objecto de decisão de não admissão pelo TCA Sul, com fundamento na extemporaneidade da apresentação do mesmo, fundamentada na circunstância de a sentença em causa não poder ser objecto de recurso, mas de reclamação para a conferência, sendo insusceptível de se operar a convolação do recurso para reclamação porquanto o recurso foi apresentado em data em que a reclamação seria de considerar já extemporânea – cfr. Fls. 704 a 706 dos autos principais.
Da decisão de não admissão recurso supra referida, a Entidade Executada apresentou recurso para o STA – cfr. Fls. 719 a 726 dos autos principais. Este recurso não foi admitido pelo STA – cfr. Fls. 756 a 763 dos autos principais.
As notificações da decisão referida no parágrafo supra foram remetidas às partes em 18/02/2014 – cfr. Fls. 766 a 768 dos autos principais.
Alega a Entidade Executada que tendo em consideração que a sentença ora exequenda não era passível de recurso, mas de reclamação para a conferência, a mesma transitou em julgado uma vez transcorridos os 10 dias após a sua notificação às partes, pelo que é a data em que ocorreu o transcorrer desses 10 dias que marca o termo inicial do prazo de execução espontânea dessa sentença, e consequentemente quer o termo final desse prazo de execução espontânea, quer o início do prazo de que a Exequente dispunha para a intentar a presente acção executiva.
A Exequente, por seu lado, sustenta que o trânsito em julgado da sentença exequenda só se deu com o trânsito em julgado com a decisão do STA que não admitiu o recurso de revista da decisão do TCA Sul que não admitiu o recurso apresentado pela Entidade Executada.
E é de dar merecimento à posição assumida pela Exequente.
E assim é porquanto o despacho de admissão do recurso da sentença proferido nos autos principais, como vimos, atribuiu efeito suspensivo à sentença aí proferida. Pelo que a Entidade Executada só incorreria no dever de executar essa sentença uma vez que a mesma transitasse em julgado (ou desde que fosse atribuído efeito meramente devolutivo ao recurso, o que in casu não sucedeu). Sucede que o TCA Sul decidiu não admitir o recurso apresentado pela Entidade Exequente, considerando-o extemporâneo; decisão esta da qual a Entidade Exequente recorreu para o STA, o qual também não admitiu o recurso.
Ora, tal como se afirma no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 02/05/2016, tirado no processo n.º 659/12.6TTMTS.P1, a cuja doutrina aderimos na íntegra e sem reserva e na qual nos louvamos: “… I - Independentemente dos motivos, valores de segurança jurídica implicam que só possa considerar-se transitada em julgado a decisão depois de decorrido o prazo legalmente previsto para a interposição de recurso ou, não sendo este admissível, para a arguição de nulidades ou dedução de incidente de reforma, pelo que quando a decisão é susceptível de recurso ordinário o trânsito em julgado depende, em primeiro lugar, do facto de se encontrarem esgotadas as possibilidades de interposição desse recurso em cujas alegações deve ser integrada a arguição de nulidades da sentença ou a reforma quanto a custas e multa (arts. 615º, nº 4, e 616º, nº 3).
II - Quando seja insusceptível de recurso ordinário, o trânsito em julgado ocorre com o esgotamento do prazo para a arguição de nulidades da sentença ou dedução do incidente de reforma, nos termos dos arts. 615º, nº 4, e 616 (e dos arts. 666º e 685º quando estejam em causa acórdãos da Relação ou do Supremo, respectivamente).
III - Todavia devemos considerar que podem ocorrer vicissitudes susceptíveis de determinar tanto a antecipação como o diferimento da data do trânsito em julgado. Assim quanto a esta última, há efeitos que forçosamente se produzem mesmo quando o recurso é rejeitado, tendo em conta a necessidade de aguardar a definitividade do despacho de não admissão, sujeito a reclamação para o tribunal superior, nos termos do artigo 643º. O mesmo ocorre nos casos em que a parte opte pela arguição de nulidades ou apresentação de requerimento, ainda que infundado, no sentido de obter a reforma da decisão.
IV – Portanto, a insusceptibilidade do recurso ordinário só se verifica depois de ser confirmado pelo tribunal ad quem o despacho de não admissão do recurso…” – acórdão disponível para consulta em www.dgsi.pt.
Assim, mobilizando o entendimento propugnado no aresto cujo excerto supra transcrevemos, o qual é, atenta a afinidade de situações, totalmente transponível para o caso que conforma a presente pronúncia, é de se concluir que a sentença proferida nos autos principais somente transitou em julgado com o trânsito da decisão do STA que não admitiu o recurso da Entidade Executada da decisão do TCA Sul que admitiu o recurso apresentado da sentença proferida nos autos principais.
E tendo a decisão do STA aqui em causa notificada às partes em 18/02/2014, temos que as partes se consideram notificadas no dia 21/02/2014. Pelo que o trânsito em julgado da decisão do STA só se deu com o decurso dos 10 dias de que as partes dispunham para a apresentação de reclamação desse Acórdão, isto é, no dia 06/03/2014 (já acrescido da possibilidade de prática do acto processual nos 3 dias úteis seguintes contra o pagamento de multa – artigo 139º, n.º 5 do CPC)
Assim só dia 07/03/2014 é que se iniciou o prazo procedimental constante do n.º 1 do artigo 175º do CPTA de 3 meses de que a Entidade Executada dispunha para dar execução à sentença ora exequenda.
Prazo esse de 3 meses que terminou em 17/07/2014. Donde decorre que o prazo de 6 meses contados do términus do prazo de 3 meses supra referido de que a Autora dispunha para intentar a presente acção executiva iniciou o seu curso no dia 18/07/2014. Ora, tendo a presente sido intentada em 03/12/2014 é de se concluir que de forma clara a mesma foi apresentada em momento em que ainda não se havia transcorrido o prazo de 6 meses de que a Exequente dispunha para apresentar a presente acção.
Pelo que outra solução não resta que não a de improceder a excepção de caducidade do direito de acção suscitada pela Entidade Executada, o que infra se determinará».

2. É contra o assim decidido que se manifesta o Recorrente, nas vestes de venire contra factum proprium. Ou seja, foi o aqui Recorrente quem recorreu da sentença exequenda. Por despacho de 10.9.2012 o juiz a quo admitiu esse recurso. Sucede que, por acórdão de 11.7.2013, o Tribunal Central Administrativo Sul decidiu não o admitir considerando que «da sentença caberia reclamação para a conferência, à semelhança do que acontece nos tribunais superiores e não directamente recurso jurisdicional», à luz do entendimento jurisprudencial que entretanto se formou (note-se que o acórdão n.º 3/2012 do Supremo Tribunal Administrativo - que fixou jurisprudência no sentido de que «[d]as decisões do juiz relator sobre o mérito da causa, proferidas sob a invocação dos poderes conferidos no artigo 27.º, n.º 1, alínea i), do CPTA, cabe reclamação para a conferência, nos termos do n.º 2, não recurso» – foi publicado no Diário da República de 19.9.2012, posteriormente, portanto, à própria admissão do recurso pelo juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa). Não se conformando com o ali decidido, o Ministério dos Negócios Estrangeiros recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo. Este, por acórdão de 13.2.2014, não admitiu a revista.

3. Portanto, e neste circunstancialismo, de modo algum se poderá considerar – como faz o Recorrente – que «o trânsito em julgado de tal decisão se verificou uma vez decorrido o prazo de 10 dias para reclamação, dessa mesma decisão do TAC de Lisboa, ou decorrido idêntico prazo para arguir nulidades ou requerer a reforma dessa sentença».

4. É inaceitável, aliás, que o Recorrente venha defender que «a Recorrida, nessa fase processual [quando o TCA Sul se pronunciou pela irrecorribilidade], já sabia que o eventual recurso que a Recorrente interpusesse para o STA, não poderia ter como objeto o conteúdo da sentença exequenda – e de facto não teve. Podendo a Recorrente, apenas e tão só, cingir-se ao conteúdo da decisão do TCA Sul». Evidentemente que não. Mas a discussão relativa a um despacho de não admissão – e que impede o trânsito em julgado da sentença cujo recurso não foi admitido – tem em vista, precisamente, a reapreciação da sentença. Por isso o artigo 643.º do Código de Processo Civil estabelece que «[s]e a reclamação for deferida, o relator requisita o processo principal ao tribunal recorrido».

5. E nem se invoque, como faz o Recorrente, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que dá conta da necessidade de impedir a abertura de novas vias «para prolongar, ou seja, alterar, os prazos legalmente estabelecidos». No caso dos autos a Recorrida nada fez nesse sentido. Ao invés, foi o Recorrente, como já se explicou, quem impediu o trânsito em julgado da sentença exequenda, nos termos já referidos, ainda que de modo – importa deixar claro – totalmente legítimo.


Da alegada causa legítima de inexecução

6. De acordo com o disposto no artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 40-A/98, de 27 de fevereiro, «os funcionários diplomáticos na situação de disponibilidade não podem ser promovidos». A Recorrida passou à situação de disponibilidade em 10.5.2012, ao perfazer 60 anos de idade, pelo que a partir dessa data ficou legalmente impedida de ser promovida. É esse o facto, de acordo com o Recorrente, que impossibilita em absoluto o cumprimento da sentença exequenda.

7. Insurge-se, portanto, contra o decidido pela sentença recorrida, na qual se entendeu que «não se verifica qualquer impossibilidade absoluta de execução da sentença consubstanciadora de causa legítima de inexecução nos termos do n.º 1 do artigo 163º, n.º 1 do CPTA». Ali se disse, igualmente, o seguinte:

«Atentando-se quer no pedido formulado pela Exequente na acção principal, quer no conteúdo decisório da decisão aí proferida ressalta manifesto que na sentença exequenda o que é determinado é a anulação do acto de homologação impugnado e se declaram nulas as nomeações efectuadas tendo esse acto de homologação anulado como pressuposto. Pelo que em momento algum a sentença ora exequenda determinou que a Exequente teria direito a ser classificada em algum lugar específico da lista objecto de homologação, como em momento algum, reconhecendo esse direito à Exequente, condenou a Executada a nomear a Exequente ministro plenipotenciário.
O que a sentença exequenda determinou foi a anulação do acto de homologação da lista de ordenação final dos diplomatas em condições de serem nomeados ministros plenipotenciários e declarou nulo os actos consequentes daquele (em concreto os actos de nomeação), e tendo tal anulação sido fundamentada na errada aplicação do conteúdo normativo dos artigos 3º, n.º 1 e 5º, n.º 2 da Portaria n.º 595/2007, de 18 de Maio ao procedimento de classificação dos opositores ao mesmo, concretamente por relativamente a cada um dos critérios de avaliação e funções desempenhadas não ter sido feita uma ponderação de mérito específica; na verificação do vício de falta de fundamentação relativamente à classificação final dos candidatos, nomeadamente quanto à atribuição da avaliação no ponto ponderação do mérito; e por preterição da garantia do exercício do direito de audiência prévia por parte dos opositores ao procedimento entre o período após a elaboração da lista de classificação e ordenação dos candidatos pelo Conselho Diplomático e a homologação do mesmo por parte do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Tendo bem presente o conteúdo decisório da sentença exequenda, tendo esta transitado em julgado, ficou a Administração (neste caso a Executada) constituída “no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado” – cfr. n.º 1 do artigo 173º do CPTA.
Como bem se retira do enunciado do mesmo, o artigo que transcrevemos no parágrafo supra dá cumprimento e transpõe para as relações jurídicas administrativas o princípio geral do efeito retroactivo das invalidades – aqui, especialmente, dos actos administrativos. Ao mesmo tempo que determina a reconstituição in natura da situação actual hipotética que existiria caso o acto anulado não tivesse sido praticado como princípio. A qual se dará através do efeito retroactivo a atribuir aos actos que tenham ou venham a ser praticados na decorrência ou por efeito da sentença anulatória transitada em julgado – n.º 2 do artigo 173º do CPTA –, actos esses cujo conteúdo estará balizado pela autoridade do caso julgado firmado pelo conteúdo da sentença transitada em julgado – n.ºs 1 e 2 do artigo 173º do CPTA.
Ora, todo este arrimo legislativo impõe para o presente caso que, não tendo sido conhecido ou adquirido pelos presentes autos que a Executada não anulou ou extinguiu o procedimento de onde emergiu o acto anulado pela sentença exequenda, a Executada tivesse que retroagir o procedimento até à fase de avaliação dos candidatos e empreender uma nova avaliação dos candidatos aplicando a cada um dos critérios de avaliação e funções desempenhadas uma ponderação de mérito específica nos termos dos artigos 3º, n.º 1 e 5º, n.º 2 da Portaria n.º 595/2007, de 18 de Maio; fundamentar nos termos legais exigidos as avaliações atribuídas e, uma vez realizada a lista de classificação e ordenação dos candidatos, garantir a possibilidade de exercício do direito de audiência prévia pelos candidatos antes da homologação da mesma.
O Acto de homologação anulado pela sentença exequenda foi praticado em 11/10/2007, isto é, em data em que a Exequente ainda não havia perfeito 60 anos. Donde é de se concluir que, tendo em consideração o efeito retroactivo das invalidades dos actos administrativos, assim como a eficácia retroactiva dos actos de execução de sentença, à data em que o acto a praticar em sede de execução de sentença produzirá efeitos – 11/10/2017 – a Exequente não se encontra na situação de disponibilidade. Consequentemente, nos termos expostos, a circunstância de após a prolação do acto anulado na sentença exequenda a Exequente ter perfeito 60 anos e nessa decorrência ter passado à situação de disponibilidade, o que impediria a sua promoção, não releva para efeitos de possibilidade de execução da sentença exequenda, porquanto à data a que se terão de reportar os efeitos do acto que dê execução à decisão exequenda, a Exequente estava apta a poder ser promovida a ministro plenipotenciário».

8. Julga-se que o assim decidido não se poderá manter. É verdade – como diz a sentença recorrida – que «em momento algum a sentença ora exequenda determinou que a Exequente teria direito a ser classificada em algum lugar específico da lista objecto de homologação, como em momento algum, reconhecendo esse direito à Exequente, condenou a Executada a nomear a Exequente ministro plenipotenciário». No entanto, e como também ali se assume, o Ministério dos Negócios Estrangeiros teria de retomar «o procedimento até à fase de avaliação dos candidatos e empreender uma nova avaliação dos candidatos aplicando a cada um dos critérios de avaliação e funções desempenhadas uma ponderação de mérito específica nos termos dos artigos 3º, n.º 1 e 5º, n.º 2 da Portaria n.º 595/2007, de 18 de Maio; fundamentar nos termos legais exigidos as avaliações atribuídas e, uma vez realizada a lista de classificação e ordenação dos candidatos, garantir a possibilidade de exercício do direito de audiência prévia pelos candidatos antes da homologação da mesma».

9. Ora, existe uma impossibilidade jurídica de fazer incidir uma avaliação sobre quem já não reúne os requisitos de participação no concurso em que essa avaliação se integra. Como se dizia no acórdão de 15.3.2019 do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 76/11.5BECBR, invocado, aliás, pelo Recorrente, e que corresponde a jurisprudência consolidada, «os actos do procedimento não podem repetir-se apenas para se verificar se o Exequente seria provido (…), de forma a poder eventualmente reconstituir o que poderia ter sido a sua carreira até ao momento da aposentação». De facto, «para ser proferido um acto substitutivo do que foi anulado, necessário seria que o Exequente reunisse, à data da repetição, as condições pessoais para o efeito, quais sejam as de lhe ser possível ser candidato ao dito concurso, para aí ser avaliada a sua candidatura, o que não ocorre».

10. E essa absoluta impossibilidade jurídica de retomar o procedimento consubstancia causa legítima de inexecução da sentença exequenda (vd. artigos 163.º/1 e 175.º/ 1 e 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), tal como defendeu o Recorrente, facto aquele que prejudica a apreciação da também alegada «inutilidade superveniente da lide, fundada na ausência de qualquer vantagem que a Exequente pudesse retirar da execução», caso se entendesse – e não é o caso – que a passagem à situação de disponibilidade não constituiria causa legítima de inexecução.


Da sanção pecuniária compulsória

11. O artigo 179.º/3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos estabelece que «[q]uando tal se justifique, o tribunal condena ainda os titulares dos órgãos incumbidos de executar a sentença ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, segundo o disposto no artigo 169.º». Nesse âmbito o tribunal a quo decidiu do seguinte modo:

«i. O Conselho Diplomático disporá do prazo de 100 dias para dar cumprimento aos actos e operações da sua responsabilidade supra descritos.
j. O Ministro disporá do prazo de 20 dias para dar cumprimento aos actos e operações da sua responsabilidade supra descritos.
k. Caso não seja cumpridos os prazos referidos em i. e j. será aplicada sanção pecuniária compulsória aos titulares do Conselho Diplomático e ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, respectivamente, dependendo de cujo prazo seja ultrapassado. – artigo 179º, n.º 3 do CPTA
l. A sanção pecuniária compulsória a ser aplicada fixa-se no valor diário de 5% do salário mínimo nacional».

12. Ainda que se possa discutir a natureza da decisão tomada, face ao tempo verbal utilizado, é de afastar o trecho decisório em causa. Como se disse – di-lo o artigo 179.º/3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos –, a aplicação de sanção pecuniária compulsória depende da existência de motivo justificativo.

13. Ora, no caso dos autos, esse motivo não se verifica. Pelo contrário. O Ministério dos Negócios Estrangeiros deu a conhecer as razões – aceitáveis e a dirimir na sede própria, como se vê – pelas quais não havia executado a sentença em causa.


Do erro na forma de processo (recurso subordinado)

14. Na petição de execução a Exequente/Recorrente subordinada pediu que o Ministério dos Negócios Estrangeiros fosse «condenado a:

- Praticar os actos necessários à reconstituição da situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado, indicados no artigo 8º do presente requerimento (alíneas a) a g), incluindo os diferenciais salariais neles referidos);
- Ressarcir a Exequente dos danos não patrimoniais alegados no montante € 70.000,00;
- Ressarcir a Exequente pela “perda de chance” no montante de € 70.000,00».

15. Retrocedendo na referida peça processual, para melhor compreender o efetivo conteúdo desses pedidos, vemos que a mesma alegou, nomeadamente, o seguinte:

«g) A ilegalidade do acto “sub judice” impediu e frustrou a Exequente de progredir na carreira diplomática para a categoria de Ministro Plenipotenciário (pois não pode a exequente deixar de notar, atendendo aos elementos objectivos do seu currículo e ao modo como o mesmo tem vindo a ser avaliado ao longo dos anos, nomeadamente, através da atribuição sucessiva de cargos de chefia e através da colocação como substituta legal do Embaixador num posto como Moscovo e em Maputo como Cônsul Geral, que não se vislumbra - mesmo em comparação com os currículos de outros colegas - quaisquer razões para não ter sido a exequente colocada num dos lugares que deram acesso à promoção), com as respectivas consequências a nível remuneratório, a título de “perda de chance”, pelo que deve o Executado arbitrar-lhe:

- as diferenças salariais de vencimento de categoria, em Lisboa, entre conselheiro e ministro plenipotenciário desde a prática do acto ilegal;
- as diferenças salariais entre as remunerações dos cargos de chefia em Lisboa (antes da promoção a Ministro pode desempenhar-se cargos até diretor de serviços - lugares repetidamente ocupados pela Exequente - depois da promoção pode desempenhar-se cargos a partir de sub-diretor geral), desde a prática do ato ilegal;
- as diferenças de abonos, em posto, relativos a despesas de instalação, de representação e de residência, entre um funcionário diplomático colocado com credenciais de Embaixador e o que sai sem credenciais de Embaixador, desde a data da prática do acto ilegal até a exequente perfazer 60 anos;
- uma vez que da situação resultou ficar a Exequente impossibilitada de ser colocada no estrangeiro ao perfazer 60 anos e até à idade da reforma (65 anos), valor cumulativo dos abonos de instalação, representação e residência, durante esse período de 5 anos, equivalentes aos abonos percebidos pelos funcionários colocados no exterior com credenciais de embaixador;
- avaliação do impacto no cálculo do valor da reforma do número de anos na carreira auferindo como conselheiro de embaixada versus mesmos anos com vencimento de Ministro Plenipotenciário ou Embaixador;
- diferencial do valor da reforma percebida, quando se atinge a idade da reforma com a categoria de conselheiro ou com a de Ministro ou Embaixador (se a progressão tivesse sido reposta, a Exequente poderia ter sido promovida, depois de Ministro, a Embaixador) multiplicada pelo número de anos desde a idade da reforma até à idade representando a esperança média de vida (tentativamente daqui a 20 anos).
Os diferenciais acima referidos na alínea g) devem ter em consideração que:
a) a partir do momento em que um funcionário diplomático passa à categoria de Ministro Plenipotenciário, passa a poder ser colocado no estrangeiro com credenciais de Embaixador (mesmo antes de ser embaixador de categoria);
b) quando colocado no estrangeiro, o funcionário recebe, para além do vencimento auferido em lisboa, abonos suplementares a título de despesas de instalação, de representação do país e de residência (uma vez que é deslocado da sua residência no país) - o montante destes abonos variam consoante a categoria do funcionário e a cidade onde é colocado (devido á diferença do custo de vida);
c) a partir do momento em que um funcionário sai com credenciais de embaixador, em geral não alterna serviço em Lisboa e no estrangeiro, passando a ser colocado sucessivamente no estrangeiro».

16. Vejamos, então, a natureza da indemnização passível de ser considerada no âmbito do processo executivo. De acordo com o disposto no artigo 173.º/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, «[s]em prejuízo do eventual poder de praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um ato administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento naquele ato, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado». Por outro lado, resulta do artigo 176.º do mesmo código que «[q]uando a Administração não dê execução espontânea à sentença no prazo estabelecido no n.º 1 do artigo anterior, o interessado e o Ministério Público, quando tenha sido autor no processo ou estejam em causa os valores referidos no n.º 2 do artigo 9.º, podem exigir o cumprimento do dever de execução perante o tribunal que tenha proferido a sentença em primeiro grau de jurisdição» (n.º 1), devendo o exequente, na petição, «especificar os atos e operações em que considera que a execução deve consistir, podendo, para o efeito, pedir a condenação da Administração ao pagamento de quantias pecuniárias, à entrega de coisas, à prestação de factos ou à prática de atos administrativos» (n.º 3).

17. Portanto, uma ação de execução de uma sentença de anulação de ato administrativo tem por objeto único essa mesma execução e não o ressarcimento de quaisquer prejuízos, mormente os decorrentes do ato anulado. Os exatos termos dessa execução dependerão dos próprios limites do caso julgado anulatório, mas em caso algum dele decorrerá um ato de natureza indemnizatória. Ou seja, um pedido indemnizatório nunca terá o seu fundamento na sentença anulatória exequenda, mas sim no instituto da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito (neste sentido, e entre outros, vd. o acórdão de 16.6.2016 do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 13044/16).

18. O que significa que, ao ser pedida a execução da sentença, fica desde logo impossibilitada a formulação, a título principal, de um pedido indemnizatório, em cumulação com aquele.

19. Em sede indemnizatória releva, apenas, o regime previsto no artigo 178.º/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, nos termos do qual «[q]uando julgue procedente a invocação da existência de causa legítima de inexecução, o tribunal ordena a notificação da Administração e do requerente para (…) acordarem no montante da indemnização devida pelo facto da inexecução». Ou seja, no processo executivo o que se pode arbitrar é, apenas, a indemnização devida pelo facto da inexecução, e no âmbito do qual – note-se - «“apenas poderão ser contemplados os danos que decorram de a sentença não poder ser executada”, ou seja, os danos pelo “facto da inexecução” e não os danos provocados pelo acto que tenha sido objecto de anulação (v. acórdãos deste STA de 20.11.2012, proc. 0949/12, de 07.05.2015, proc. 047307A e de 12.07.2017 proc. 0817/14)» (acórdão de 7.9.2023 do Supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 01327/06.3BCLSB) (sem prejuízo da indemnização a título de responsabilidade civil pela inexecução ilícita da sentença a que se refere o artigo 179.º/6 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).

20. E na medida em que naquele âmbito apenas se indemniza o que vem sendo qualificado de expropriação da execução, ficam de fora todos os alegados danos decorrentes do ato anulado, como é o caso dos danos não patrimoniais.

21. O que significa, desde logo, que é indemnizada a perda, provocada na esfera jurídica da Recorrente, da possibilidade de ver retomado o procedimento com a elaboração de nova lista de classificação final sem os vícios identificados na sentença exequenda. Na medida em que o concurso não poderá ser retomado, não se saberá – tendo em conta a natureza dos vícios que determinaram a procedência da ação declarativa – se a Recorrente subordinada alcançaria a nomeação como ministro plenipotenciário, bem como, evidentemente, os benefícios por ela condicionados. Esses benefícios foram identificados pela Recorrente subordinada na petição de execução e são os referidos no § 6 do presente acórdão e que a mesma integrou no que qualificou como indemnização por perda de chance. Como anteriormente se disse, também a perda da possibilidade de alcançar essas vantagens, ainda que de natureza incerta, integram a indemnização pelo facto da inexecução, cujo quantum sempre dependerá do grau de probabilidade de obtenção de tais vantagens incertas. Mas essa é realidade que não poderia ser levada à petição de execução, nos termos em que o foi, pois que a indemnização que for devida é apenas resultado da posteriormente reconhecida causa legítima de inexecução da sentença.

22. Em suma, concluindo-se, como é caso, pela verificação de causa legítima de inexecução, o processo terá de prosseguir no tribunal a quo.
*

Da litigância de má-fé

Vem pedido pela Exequente que o Ministério dos Negócios Estrangeiros seja condenado como litigante de má-fé.

De acordo com o disposto no artigo 542.º/2 do Código de Processo Civil, «[d]iz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:

a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão».

Ora, o Ministério dos Negócios Estrangeiros poderá não ter razão – e não tem - na questão relativa à alegada caducidade do direito de ação. E precisamente porque não se acolheu o entendimento que defendeu na determinação da data do trânsito em julgado da sentença exequenda. Daí não decorre, no entanto, o preenchimento de alguma das condições previstas no artigo invocado.

Improcede, pois, o pedido de condenação do Ministério dos Negócios Estrangeiros decorrente da alegada condição de litigante de má-fé.


V
Em face do exposto, acordam os Juízes da Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul em:

a) Conceder parcial provimento ao recurso independente do Ministério dos Negócios Estrangeiros, decidindo, em consequência:

i) Confirmar a sentença recorrida no julgamento da exceção da caducidade do direito de ação;
ii) Julgar verificada a existência de causa legítima de inexecução;
iii) Revogar a sentença recorrida na parte da aplicação de sanção pecuniária compulsória:

b) Negar provimento ao recurso subordinado da Exequente;
c) Determinar que os autos voltem ao tribunal a quo, a fim de aí prosseguirem os seus termos.

Custas do recurso independente pelo Recorrente e pela Recorrida, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa, respetivamente, em 1/3 e 2/3 (artigo 527.º/1 e 2 do Código de Processo Civil).

Custas do recurso subordinado pela Recorrente (artigo 527.º/1 e 2 do Código de Processo Civil).


Lisboa, 10 de abril de 2025.

Luís Borges Freitas (relator)
Teresa Caiado
Rui Fernando Belfo Pereira