Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 308/18.9BEALM |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 04/03/2025 |
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Relator: | TERESA COSTA ALEMÃO |
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Descritores: | ART. 45.º N.º 5 DA LGT CADUCIDADE ALARGAMENTO DO PRAZO |
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Sumário: | I - Nos termos do art. 45.º n.º 5 da LGT, o prazo de caducidade previsto no n.º 1 do mesmo artigo «é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano», nos casos em que «a liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal»;
II - Este alargamento do prazo de caducidade exige apenas que ocorra identidade dos factos com base nos quais foi instaurado o processo-crime e aberto o procedimento de liquidação. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A sociedade I.........., Lda., com os demais sinais nos autos, veio interpor recurso da sentença proferida, em 25 de Junho de 2024, pelo TAF de Almada, que julgou a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC, respeitante ao exercício do ano de 2011, improcedente. A Recorrente termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes: «1. O Tribunal a quo julgou improcedente a impugnação Judicial apresentada pela Recorrente contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) correspondente ao ano 2011 por entender que ainda não ter decorrido o prazo da caducidade previsto nos n.°s 1 e 4 do art.° 45° da LGT. 2. Fundamentou a sua decisão no facto de existir o inquérito criminal n.° 195/11.8TAALM, instaurado contra os sócios da Recorrente, J.......... e E.........., na 1.ª Secção de Processos dos Serviços do Ministério Público de Almada, que suspendeu o prazo de caducidade da liquidação do IRC. 3. Pensa-se que fundamentou a decisão em factos e pressupostos errados, na medida em que, certamente por lapso, refere “...que a denúncia que deu origem ao inquérito mencionava expressamente irregularidades fiscais ao nível do IRC da Impugnante...”, o que não corresponde à verdade. 4. As denúncias que deram origem ao inquérito criminal não mencionavam expressamente irregularidades fiscais ao nível do IRC, nem isso consta sequer dos factos provados na douta Sentença, nem no inquérito criminal existe qualquer referência factual ao IRC. 5. A investigação feita no âmbito do inquérito destinou-se a apurar se as irregularidades denunciadas consubstanciavam a prática de crime, designadamente, de burla e de fraude fiscal. 6. O Ministério Público proferiu um despacho, em 25-03-2015, a determinar a constituição de uma “Equipa Mista entre a Polícia Judiciária e a Autoridade Tributária” para a investigação de factos suscetíveis de integrar o crime de fraude fiscal, branqueamento de capitais, entre outros. 7. Posteriormente, em 21-11-2017, foi realizado um procedimento externo de inspeção tributária à Impugnante, relativamente aos exercícios de 2010 a 2013. 8. A seguir, em 11-12-2017, na sequência daquela inspeção, funcionários da Direção de Finanças de Setúbal afixaram “Nota de marcação de hora certa” na porta do estabelecimento da Recorrente, com marcação de nova deslocação no dia 12-12-2017, o que cumpriram, afixando “certidão de verificação de hora certa” com a finalidade de notificar o representante legal da Requerente, do projeto relatório da inspeção. 9. No dia 27-12-2017, foi elaborado o “RELATÓRIO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA”, que efetuou correções à matéria tributável, em sede de IRC, para o ano de 2011. 10. Em 29-12-2017, foi emitida a liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2011, da qual resulta um montante de imposto a pagar no valor de € 17.113,10, tendo sido remetida para a caixa de correio eletrónico da Impugnante, em 04-01-2018. 11. O inquérito criminal n.° 195/11.8TAALM veio a ser arquivado em 13-09-2019, “(...) por não ter sido possível ao Ministério Público obter indícios suficientes da prática do referido ilícito penal, e no que diz respeito ao crime de fraude fiscal (...) - uma vez que se recolher prova bastante de se não ter praticado o mencionado crime.” 12. Resumindo: a) A inspeção tributária teve início em 21-11-2017, depois de decorrido mais de quatro anos desde o final do ano fiscal em que se verificou o facto tributário; b) E embora o n.° 5 o art.° 45° da LGT preveja que o prazo de caducidade do direito à liquidação se suspende “Sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal”; c) A jurisprudência dos tribunais superiores, tem entendido, de forma unânime, que esta norma apenas exige uma identidade objetiva, entre os factos tributários e os factos objeto de inquérito criminal, o que não sucedeu nos presentes autos; d) Pois o escopo do processo-crime foi averiguar se as irregularidades detetadas no preenchimento de fichas clínicas dos beneficiários do SAD - PSP, bem como elevados números de consultas de clínica geral e estomatologia de alguns beneficiários e seus familiares, eram passíveis de preencher o tipo dos crimes de burla qualificada ou de fraude fiscal; e) E foi com base essa factualidade que o Ministério Público pediu o apoio da Autoridade Tributária e Aduaneira, para aferir da eventual prática de ilícito criminal; f) Ora, tendo sido no âmbito da investigação criminal que foi iniciado o procedimento de inspeção tributária que deu origem à liquidação impugnada, se compararmos os factos subjacentes e investigados no âmbito do procedimento criminal e os factos subjacentes ao ato de liquidação, conclui-se que não existe uma coincidência objetiva entre os mesmos; g) Só nas situações em que a liquidação resulta de factos apurados em processo- crime se justifica o alargamento do prazo de caducidade previsto no artigo 45.°, n.° 5 da LGT; 13. Portanto, o prazo de caducidade referente ao IRC de 2011 iniciou a sua contagem em 31 de dezembro de 2011, pelo que, não se verificando causas de suspensão, o prazo de caducidade terminou em 31 de dezembro de 2015. 14. Acontece que a liquidação adicional de IRC impugnada foi emitida em 29-12-2017, após o prazo de caducidade do direito. 15. Pelo que devia o Tribunal a quo ter julgado procedente o vício de caducidade do direito à liquidação de IRC do ano 2011. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, com as legais consequências, fazendo-se assim Justiça!» **** A Recorrida, Fazenda Pública, notificada para o efeito, não contra-alegou. **** O Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.**** Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, as questões fundamentais a decidir são as de saber se a sentença recorrida errou no seu julgamento, de facto e de direito, por não ter julgado procedente o vício da caducidade do direito à liquidação, por se aplicar o alargamento do prazo, previsto no art. 45.º n.º 5 da LGT. **** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta. **** II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. De facto A sentença recorrida julgou provados os seguintes factos: «A) A Impugnante «I.........., Lda.» é uma sociedade que exerce a atividade de "Actividades Prática Médica Clínica Geral, Ambulatório'', com o CAE 86210. [cfr. "RIT" de fls. 11/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; B) A Impugnante «I.........., Lda.» tem sede social na "Rua do Feijó, n.° …….— cave — esq., 2810-…… — Almada". [cfr. Certidão permanente - Anexo 1A do RIT de fls. 113/1147 do PA a fls. 65-356 dos auto e facto que se extrai da petição inicial e depoimento da testemunha]; C) O capital social da impugnante é detido, em quotas iguais, por E.........., gerente da sociedade, e J........... [cfr. Certidão permanente - Anexo 1A do RIT de fls. 113/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; D) J.......... é sócio e diretor clínico da sociedade Impugnante desde 2003. [cfr. prova testemunhal]; E) Em sede de IRC, a sociedade impugnante encontra-se enquadrada no regime geral de determinação do lucro tributável, desde 27 de Outubro de 2003. [cfr. "RIT" de fls. 11/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; F) Em sede de IRC, a sociedade impugnante encontra-se enquadrada no regime geral de determinação do lucro tributável, desde 27 de Outubro de 2003. [cfr. "RIT" de fls. 11/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; G) Durante o ano de 2011 foi instaurado processo de inquérito crime, contra a «Implantemédica», «J..........» e «E..........«, que correu termos com o n.° 195/11.8TAALM no DIAP - 3.ª Seção de Almada, por alegado crime de Burla qualificada, praticado em 2010. [cfr. de fls. 1485 dos autos]; H) Em 10 de Maio de 2012 o DIAP de Almada solicitou, no âmbito do processo n.° n.° 195/11.8TAALM, aos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira dados fiscais, por referência, entre outros, à Impugnante. [cfr. de fls. 1485 dos autos]; I) Em data que o Tribunal não conseguiu apurar, mas seguramente durante o ano de 2013 foi instaurado processo de inquérito crime, n.° 1345/13.5TAALM no DIAP - 3.ª Seção de Almada, o qual foi incorporado no processo n.° 195/11.8TAALM, mencionado em G). [cfr. de fls. 1519 dos autos]; J) Em 25 de Março de 2015 foi remetido pelo Ministério Público à AT despacho a determinar a constituição de uma equipa mista para investigação, entre outros, da Impugnante no quadro de possível crime de fraude fiscal no âmbito do inquérito n.° 195/11.8TAALM. [cfr. de fls. 1485 dos autos]; K) Através do ofício da AT n.° 019652 de 21 de Novembro de 2017, foi enviado à Impugnante a "CARTA AVISO" com respeito às Ordens de Serviço OI201701081, OI201701082, OI201701083 e OI201701084. [cfr. doc. 4 da pi]; L) Ao abrigo das Ordens de Serviço n.° OI201701081, OI201701082, OI201701083 e OI201701084, de 21 de Novembro de 2017, foi efetuada pela Divisão de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal uma ação inspetiva, à Impugnante, de âmbito geral com referência aos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013. [cfr. "RIT" de fls. 10/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; M) Em 28 de Novembro de 2017, foi assinado, por E.........., na qualidade de sócia gerente da sociedade «I.........., Lda.», o documento "Notificação", no qual se lê, em extrato: "(...) facultar os seguintes elementos: - Comprovativos dos valores contabilizados como gastos na conta 631 - PPR (...)" [cfr. Anexo 11 do RIT de fls. 1125 de 1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; N) Através do ofício da AT de 7 de Dezembro de 2017 com o n.° 20444 foi enviado à Impugnante o projeto do Relatório de Inspeção Tributária (RIT) elaborado na sequência da inspeção tributária efetuada para, querendo, exercer o direito de audição (nos termos do art.° 60.° do RCPITA). [cfr. Anexo 12 do "RIT" de fls.1134/1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; O) Em 11 de Dezembro de 2017 foi elaborado o documento «NOTA DE MARCAÇÃO DE HORA CERTA - AFIXAÇÃO», assinado por 1 funcionária da AT e 1 testemunha (funcionária) da AT: "Certifico que hoje, 11 de dezembro de 2017, pelas 15h30 horas, me desloquei à Rua do Feijó n.° …..RC esq a fim de notificar o representante legal da sociedade I.........., Lda. (...) do ofício n.° 204447 de 07/12/2017 (...) não pude levar a efeito essa diligência. Não se encontrando igualmente qualquer pessoa capaz de transmitir os termos da notificação, procedo à afixação, na porta da sede do sujeito passivo, da presente Nota de Marcação de Hora Certa. (...)" [cfr. Anexo 12 do RIT de fls. 1128 de 1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; P) Em 12 de Dezembro de 2017 foi elaborado o documento «CERTIDÃO DE VERIFICAÇÃO DE HORA CERTA - AFIXAÇÃO», assinado por 1 funcionária da AT e 2 (funcionárias) testemunhas: "Certifico que hoje, 12 de dezembro de 2017, pelas 15h30 horas ... voltei à Rua do Feijó n.° …… RC esq a fim de notificar o representante legal da sociedade I.........., Lda. (...). A notificação da presente Certidão foi efetuada na porta da sede do sujeito passivo, por não se encontrar qualquer pessoa capaz de transmitir a notificação ao gerente. O objeto da notificação e documentos ficam à disposição do notificando nos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal (...)." [cfr. Anexo 12 do RIT de fls. 1127 de 1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; Q) Foi enviado, por carta registada, o ofício de 13 de Dezembro de 2017 com o n.° 20668, para o representante legal da «I.........., Lda.» - Rua do Feijó n.° ….. Esq - 2810-…. Almada", com o assunto: "Carta a que se refere o art.° 233.° do Código de Processo Civil" no qual se lê, em extrato: "(...) informa-se que ficou notificado naquela morada, seu domicilio fiscal, do ofício n.° 020444, de 07-12-2017, que constitui notificação do projeto de relatório da ação inspetiva pelas ordens de serviço OI201701081/2/3/4.(...) Juntam-se em anexo: - Cópia da "nota de Marcação com Hora Certa"; - Cópia da Certidão de Verificação de Hora Certa"; - Cópia do ofício n.° 020444 de 07-12-2017." [cfr. Anexo 12 do RIT de fls. 1126 de 1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; R) Foi enviado, por carta registada, o ofício de 13 de Dezembro de 2017 com o n.° 20669, para o representante legal da «I.........., Lda.» - Rua do Cacheu n.° ……. Almada", com o assunto: "Carta a que se refere o art.° 233.° do Código de Processo Civil". [cfr. Anexo 12 do RIT de fls. 1131 de 1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; S) Foi enviado, por carta registada, o ofício de 13 de Dezembro de 2017 com o n.° 20667, para o "representante legal da «I.........., Lda.» - Rua do Feijó n.°…. CV Esq - 2810-…. Almada", com o assunto: "Carta a que se refere o art.° 233.° do Código de Processo Civil'' no qual se lê, em extrato: "(...) informa-se que ficou notificado naquela morada, seu domicilio fiscal, para assinatura das notas de diligência n.° NDO2017448, NDO2017449, NDO2017450 e NDO2017451. (...)" [cfr. Anexo 13 do RIT de fls. 1136 de 1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; T) Foi enviado, por carta registada, o ofício de 13 de Dezembro de 2017 com o n.° 20667, para o "representante legal da «I.........., Lda.» - Rua do Cacheu n.° ….. Almada", com o assunto: "Carta a que se refere o art.° 233.° do Código de Processo Civil". [cfr. Anexo 13 do RIT de fls. 1140 de 1147 do PA a fls. 1128 dos autos]; U) Em 27 de Dezembro de 2017, foi elaborado o Relatório de Inspeção Tributária (RIT) no âmbito do qual foram efetuadas correções de natureza meramente aritmética em sede de IRC nos montantes de €36.377,27 (2010), €38.662,55 (2011), €47.340,48 (2012), €27.217,70 (2013). [cfr. "RIT" de fls. 10/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; V) Com referência à correção de natureza meramente aritmética, em sede de IRC (2011) refere o Relatório de Inspeção Tributária (RIT) o seguinte: "III.2 CORREÇÕES À MATÉRIA TRIBUTÁVEL - IRC III.2.1 - ENCARGOS NÃO DEDUTÍVEIS PARA EFEITOS FISCAIS, NOS TERMOS DO ARTIGO 23.° DO CIRC: "Apenas são fiscalmente dedutíveis os gastos suportados pela empresa e indispensáveis à realização dos proveitos e ganhos ou à manutenção da fonte produtora, conforme resulta do artigo 23.° do CIRC. Da análise efetuada verificou-se que o sujeito passivo não respeitou o princípio da tributação efetiva do rendimento real, e não só considerou como gasto efetivo o gasto corretamente contabilizado, mas também considerou despesas pessoais e despesas de terceiros. Foram assim apuradas correções que conduzem à alteração da situação tributária do sujeito passivo, praticadas nos períodos de 2010 a 2013, por afetarem de forma indevida os resultados fiscais, sendo de corrigir, conforme se descreve: Foram analisados os documentos e os requisitos necessários à dedutibilidade dos gastos considerados indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Os gastos fiscais não se restringem apenas ao disposto no artigo 23.° do CIRC, mas integram também outras categorias de gastos e encargos previstos nos artigos 34.° e 45.° do CIRC, os quais são suscetíveis de serem dedutíveis fiscalmente e assim concorrem para a formação do lucro tributável. III.2.1.2 - FORNECIMENTO SERVIÇOS EXTERNOS (FSE) Ainda em relação aos gastos, é exigido que tenham um único destinatário ou uma única categoria de destinatários-, isto é, que tenham sido suportados pela própria empresa e não por sujeitos alheios à empresa. Na análise efetuada aos documentos de suporte aos gastos relacionados no quando seguinte, conclui-se que houve gastos suportados pela empresa, mas referentes a despesas realizadas por terceiros estranhos a sociedade, e que concorreram para a determinação da matéria coletável de IRC. Não concorrem para a formação do lucro tributável os valores abaixo indicados, por estarem relacionados com despesas da esfera pessoal dos sócios.
III.2.1.3 - Planos de Poupança e Reforma (PPR) De salientar também que nos termos do art. 43° do CIRC (realizações de utilidade social) são dedutíveis os gastos, do período de tributação, feitos em benefício do pessoal da empresa desde que tenham carácter geral. Na análise efetuada verificou-se que estes benefícios não foram estabelecidos para a generalidade dos trabalhadores permanentes da empresa ou no âmbito de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho para as classes profissionais onde os trabalhadores se inserem, nos termos do n.° 4 do artigo 43.° do CIRC (realizações de utilidade social). Da contabilidade do sujeito passivo apenas foi possível verificar a contabilização desses benefícios aos sócios da empresa, não existindo documentos de suporte a esses gastos. Em 28-11-2017 procedeu-se á notificação do sujeito passivo (Anexo 11), para apresentar em 04-12-2017 os comprovativos do pagamento dos PPR. Na data prevista, o sujeito passivo apresentou os elementos solicitados (arquivados em papeis trabalho), tendo-se verificado que esses valores foram efetivamente pagos apenas aos sócios da empresa. A admissibilidade fiscal dos encargos não só deve obedecer aos requisitos gerais do artigo 23.° do CIRC, como aos do artigo 45.° do CIRC, que proíbe a dedutibilidade fiscal de certos encargos mesmo quando contabilizados como gastos ou perdas. Apesar de efetiva e comprovadamente suportados pela empresa, certos encargos podem não ser fiscalmente dedutíveis e, além disso, serem objeto de tributação autónoma. É o caso das despesas não documentadas que são sujeitas a tributação autónoma à taxa de 50% [artigo 45,°, n.° 1, al. g) e 88.n.° 1 do CIRC], por serem despesas cuja natureza, origem e finalidade não são especificadas, e que, não sendo conhecidas e efetivamente concretizáveis, não têm uma base documental na contabilidade. Não existindo qualquer prova ou suporte documental do gasto efetivamente suportado pelo sujeito passivo, proíbe-se a sua dedutibilidade a fim de evitar a contabilização de despesas que não estão diretamente relacionadas com a atividade da empresa. III.2.2.1 - FORNECIMENTO SERVIÇOS EXTERNOS (FSE) As correções efetuadas e mencionadas no quadro seguinte respeitam a despesas que não se encontram documentadas, apenas constando nas pastas folhas brancas com anotações e outras notas de lançamento internas, que se desconhece se o gasto foi efetivamente concretizado e está relacionado com atividade da empresa. Na contabilidade constam ainda documentos de pagamento (através do banco) sem o correspondente documento de suporte (fatura) do gasto associado, que permita aferir da sua dedutibilidade fiscal. Por esses motivos, vão ser acrescidos ao lucro tributável do respetivo período, bem como sujeitos a tributação autónoma, nos termos do artigo 88.°, n.° 1 do CIRC, tal como já referido, os montantes indicados no quadro seguinte. AA) A carta com o aviso de receção n.º RF22154303 9 PT foi devolvido com a informação “objeto não reclamado” em 31 de Janeiro de 2018. [cfr. de fls. 24/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; BB) Em 2 de Fevereiro de 2018, constava do documento “Visão Integrada do Contribuinte”, com respeito ao domicílio fiscal do Impugnante a seguinte morada: “(texto integral no original; imagem)” [cfr. de fls. 31/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; CC) A presente Impugnação, deu entrada no Serviço de Finanças de Almada 2 em 29 de Março de 2018 e depois foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada. [cfr. a fls. 3 dos autos]; Mais, ficou provado, DD) O documento "NOTIFICAÇÃO - TOMADA DE MEDIDAS, DA ACT", em nome da impugnante «I.........., Lda.», no qual se lê: "local de trabalho "Rua do Calheu, n.°…., Amora" - n.° de trabalhadores 3 e sede: "Rua do Feijó n.° ..CV Esq - 2810-…. Almada"", com data de 12 de Dezembro de 2017 e hora 17:10, foi assinado por "P.........." - Auxiliar de Consultório. [cfr. doc. 5 da pi]; EE) Através de carta registada com aviso de receção de 29 de Dezembro de 2017, assinado em 2 de Janeiro de 2018 foi enviado pela Impugnante, requerimento dirigido à Direção de Finanças de Setúbal com referência ao Ofício da AT n.° 020669 de 13-122017. [cfr. doc. 3 da pi]; FF) Em 22 de Fevereiro de 2018 a mandatária da Impugnante remeteu mensagem de correio eletrónico para os serviços da AT a referir que naquele dia se teria deslocado aos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal e, perante o insucesso em obter o relatório de inspeção, a agendar nova deslocação para o mesmo efeito a realizar no "...dia 26/02/2017...". [cfr. doc. 4 da pi]; GG) Em 13 de Setembro de 2019, foi concluso à Magistrada do Ministério Público o processo de inquérito n.° 195/11.8TAALM, tendo sido proferido despacho de arquivamento. [cfr. de fls. 1485 dos autos]; HH) No decurso do ano de 2011 a Impugnante registou na sua contabilidade um conjunto de gastos com a aquisição de bens e serviços em que a fatura ou foi emitida para consumidor final, ou foi emitida em nome dos sócios da sociedade, ou foi emitida em nome de terceiros que não a sociedade ou foi emitida para titular a aquisição de bens ou serviços de utilização pessoal. [cfr. facto que se extrai de extrato contabilístico e faturas - Anexo 2 do RIT a fls. 139/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; II) No decurso do ano de 2011 a Impugnante registou gastos com planos poupança reforma por referência aos seus sócios nas contas #6313 e #6314. [cfr. facto que se extrai de Balancete - Anexo 1 do RIT a fls. 32/1147 do PA a fls. 65-356 dos autos]; JJ) No decurso do ano de 2011 a Impugnante teria um total de três funcionários, uma rececionista e dois auxiliares clínicos, a que se somavam a gerente e o diretor clínico. [cfr. doc. 5 da pi]; KK) Durante os dias 11 e 12 de Dezembro de 2017 foram emitidas pela Impugnante «I.........., Lda.» faturas com referência aos serviços prestados pela mesma naqueles dias, todas com igual informação na parte que se reproduz “(texto integral no original; imagem)” (…)
[cfr. facto que se extrai da consulta dos documentos de fls. 1454 e ss. dos autos e prova testemunhal]; **** «1. De 11 de Dezembro de 2017 a 12 de Dezembro de 2007 a sócia gerente da Impugnante encontrava-se no estrangeiro. 2. De 11 de Dezembro de 2017 a 12 de Dezembro de 2007 a funcionária Vanessa Geadas encontrava-se presente na sede da Impugnante. [atenta a ausência de prova documental e testemunhal não foi possível ao Tribunal dar como provado os factos supra alegados na petição inicial. Da prova testemunhal, foi ainda explicado ao Tribunal que a sede social da Impugnante (morada fiscal) não coincide com a morada da clínica da Impugnante. Do depoimento da testemunha foi ainda referido que os médicos e funcionários encontravam-se na clínica da impugnante, ou seja, "rua do Cacheu".];» **** «A decisão da matéria de facto efetuou-se com base na posição assumida pelas partes nos articulados, no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos - que não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do Tribunal em conjugação com a livre apreciação da prova. Foi ainda ponderado o depoimento da testemunha inquirida J.........., como referido a propósito de cada ponto do recorte probatório. No que respeita à prova testemunhal, o depoimento da testemunha J.........., referiu ter conhecimento direto dos factos por ser sócio da aqui impugnante, não obstante o conhecimento dos factos, o depoimento da testemunha não se mostrou isento e afastado da relação que mantém como sócio da Impugnante. Questionado pelo Il. Mandatário referiu que a clínica estava em funções nos dias 11 e 12 de Dezembro de 2017, requerendo a junção aos autos das faturas emitidas nessas datas, comprovativas das consultas efetuadas naquele dia. Referiu, ainda, a testemunha que a sede social da Impugnante é na "Rua do Feijó" e a morada da clínica é na "Rua de Cacheu". Questionada a testemunha, a instâncias respondeu que só teve conhecimento da ação de inspeção aquando da receção do ofício da AT para levantar o Relatório de Inspeção Tributária. Confrontada a testemunha com o documento 2 junto com a petição inicial referiu ao Tribunal nunca ter visto o documento, identificando, contudo, a assinatura ali patente como sendo da gerente da Impugnante. Questionada a testemunha quanto à data do documento e ao facto de ser anterior à data das notificações "hora certa" [O) e P) dos factos] respondeu de forma titubeante. A demais matéria alegada não foi aqui considerada por ser conclusiva, de direito, constituir considerações pessoais ou não relevar para a decisão da causa. Quanto à motivação dos factos não provados, atendendo ao princípio previsto no art.° 342.° do Código Civil, segundo o qual quem invoque um determinado facto tem de o provar, assim, como ali referido, dada a ausência de prova documental e testemunhal comprovativa dos mesmos, não foi possível ao Tribunal dar como provados os factos 1. a 2.» **** Antes de mais, tendo em conta os fundamentos da impugnação e a matéria julgada provada no tribunal recorrido, e levando em consideração que a decisão sobre essa matéria de facto se baseou, além do mais, em prova documental constante dos presentes autos, este Tribunal considera importante para apreciação dos fundamentos da impugnação aditar dois factos, nos termos do art. 662.º, n.º 1, do C.P.Civil, no seguintes termos: LL) O Relatório de Inspecção a que se referem os pontos U) e V) supra, no seu ponto II.2 tem o seguinte teor: “(texto integral no original; imagem)” (cfr. PA, a fls. 11 do doc. n.º 005463620 do SITAF); MM) Em 06-08-2018 a 3.ª Secção de Almada do DIAP emitiu certidão relativa ao proc. de inquérito n.º 195/11.8TAALM, que aqui se dá por integralmente reproduzida, certificando que “a data da participação (pº 1345/13.5TAALM) é de 17.04.2013, a data de instauração é 03.05.2015, sendo a data de constituição como arguida da Sociedade I.........., Lda. é de 21.03.2016.” (cfr. doc. 005463630 do SITAF); Atendendo ao facto acima aditado com as letras MM), e uma vez que, de acordo com a norma do art. 45.º n.º 5 da LGT, é relevante a data de instauração do processo de inquérito criminal, há que corrigir o facto I) da sentença recorrida, o qual tem o seguinte teor: “I) Em data que o Tribunal não conseguiu apurar, mas seguramente durante o ano de 2013 foi instaurado processo de inquérito crime, n.° 1345/13.5TAALM no DIAP - 3.ª Seção de Almada, o qual foi incorporado no processo n.° 195/11.8TAALM, mencionado em G). [cfr. de fls. 1519 dos autos];” Passando o mesmo a ter o seguinte teor: “I) Em 03-05-2015 foi instaurado processo de inquérito-crime, n.º 1345/13.5TAALM no DIAP – 3.ª Secção de Almada, o qual foi incorporado no processo n.º 195/11.8TAALM, mencionado em G) [cfr. flss. 1519 dos autos , doc. 005463637 do SITAF e ponto MM) supra]” Por fim, dada a relevância do seu conteúdo, completa-se o facto GG), relativo ao despacho de arquivamento do inquérito criminal, com parte do seu teor, nos seguintes termos: “GG) Em 13 de Setembro de 2019, foi concluso à Magistrada do Ministério Público o processo de inquérito n.° 195/11.8TAALM, tendo sido proferido despacho de arquivamento, o qual tem, designadamente, o seguinte conteúdo: “(…) DO CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA: Tendo em conta a factualidade supra referida, em que, igualmente, se indiciava a eventual prática de ilícito criminal de natureza fiscal (fraude fiscal qualificada - art. 104.º, n.º 1 al. a) e al. d), do R.G.T.I.T.) foi efectuado um levantamento de dados patrimoniais dos arguidos (bancários e fiscais), obtidos através de informações solicitadas a entidades bancárias, bem como pela análise de documentação contabilística e bancária, entretanto, apreendida no âmbito de buscas domiciliárias e às instalações da sociedade arguida. Assim, e de acordo com o extenso parecer final emitido pela A.T. que consta defls. 1309 a 1373 e relatório conclusivo defls. 1374 a 1375, para os quais remeto dando por integralmente reproduzido o teor dos mesmos, após análise efectuada pela referida entidade aos documentos de suporte à contabilidade; extratos bancários e extratos de conta corrente dos subsistemas de saúde ADM; ADSE; SAD-PSP; ARS Lisboa e Vale do Tejo e PT ACS, não foram detectados factos susceptíveis de correção ao nível das receitas, apesar de ao nível das despesas terem sido verificadas diversas irregularidades das quais resultam correções ao lucro tributário declarado. Outrossim, verifcou-se o registo contabilístico de despesas respeitantes a aquisição de bens e serviços que não se coadunam com a actividade desenvolvida pela sociedade. Das irregularidades detectadas resulta uma vantagem patrimonial consubstanciada no imposto que a sociedade arguida não entregou aos cofres do Estado, constituindo essas irregularidades infracções contra-ordenacionais puníveis pelos artigos 119.º (Omissões e inexatidões nas declarações ou em outros documentos fiscalmente relevantes) e artigo 114.º (Falta de entrega da prestação tributária) ambos do R.G.I.T. Em suma, não foram identificados factos que consubstanciam ilícitos criminais, mas sim contra- ordenacionais. (…)” [cfr. de fls. 1485 dos autos e doc. 005463681 do SITAF]; Assente que está o probatório, o qual, de resto não foi impugnado, avancemos na apreciação do recurso. II.3. De Direito Como se viu, a Recorrente invoca o erro de julgamento da decisão recorrida ao concluir pela não caducidade do direito à liquidação, já que: i) Não existiu identidade objectiva entre os factos tributários e os factos objecto de inquérito criminal, pois o escopo do processo-crime foi averiguar irregularidades detectadas no preenchimento de fichas clínicas dos beneficiários do SAD – PSP, bem como de elevados números de consultas de clínica geral e estomatologia de alguns beneficiários e seus familiares, passíveis de preencher o tipo de crimes de burla qualificada ou de fraude fiscal; ii) Só nas situações em que a liquidação resulta de factos apurados em processo-crime se justifica o alargamento do prazo de caducidade previsto no artigo 45.º n.º 5 da LGT; iii) Portanto, o prazo de caducidade referente a IRC de 2011 iniciou a sua contagem em 31-12-2011 e, não havendo causas de suspensão, terminou em 31-12-2015; iv) Tendo a liquidação sido emitida em 29-12-2017, foi-o após caducidade do respectivo direito, pelo que o Tribunal a quo devia ter julgado a impugnação procedente, por vício da caducidade do direito à liquidação. Ou seja, não pondo em causa a factualidade assente, a discordância da Recorrente com a decisão recorrida cinge-se apenas à questão da não identidade dos factos entre o processo-crime e o procedimento tributário.
Custas pela Recorrente.
Lisboa, 3 de Abril de 2025
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