Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1062/17.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:07/08/2021
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:NULIDADE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
APENSAÇÃO PROCESSUAL
PROCESSO APENSANTE
PROCESSO APENSÁVEL
Sumário:I-A falta de concreta individualização das ocorrências processuais, não tem o aporte de, in casu, acarretar a sua nulidade, porquanto o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo limitou-se a validar as asserções fáticas alegadas pela parte e não controvertidas. À semelhança do que sucede nas situações relacionadas com o indeferimento liminar, inexiste necessidade de uma concreta individualização dos factos provados, uma vez que a decisão teve por suporte apenas as realidades fáticas convocadas pela parte, ora Recorrente.
II-Conforme resulta do artigo 28.º do CPTA, a apensação pode ser ordenada com fundamento, alternativamente, no facto de os respetivos pedidos: terem a mesma e única causa de pedir; tendo causas de pedir diferentes, devam ser apreciados em função dos mesmos factos ou da aplicação dos mesmos princípios ou normas jurídicas; ou estarem, entre si, numa relação de prejudicialidade ou dependência jurídica.
III-A apensação terá, necessariamente, de ser feita sob requerimento ao juiz do processo apensante, o qual, conforme dimana do nº 2, do artigo 28.º, do CPTA, deve ser entendido enquanto tal, o de numeração inferior, ressalvada a situação de dependência.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I-RELATÓRIO

J....., interpôs recurso dirigido a este Tribunal tendo por objeto o despacho que indeferiu a apensação dos presentes autos ao processo nº 1144/16.2BESNT, por “[o] pedido de apensação ter de ser apreciado pelo juiz titular do processo a que outro tenha de ser apensado.”


***

O Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

1.ª O presente recurso deve subir imediatamente nos próprios autos em resultado da conjugação do disposto no artigo 285.º, n.º 1, 2 e 3 do CPPT, dado que o decorrer do tempo e a evolução dos processos leva a mudanças de fase processual que tornariam os requerimentos para apensação de processos absolutamente inúteis;

2.ª No presente recurso está em causa a douta decisão do Tribunal Tributário de Lisboa proferida em 25.01.2018 que indeferiu - tácita ou implicitamente - a apensação de processo que tinha sido requerida pelo recorrente;

3.ª O recorrente requereu a apensação do presente processo ao processo n.º 1144/16.2BESNT, cujos autos correm termos no Tribunal Tributário de Lisboa - Unidade Orgânica 2 e que respeita a impugnação de matéria sobre o exercício da Audição Prévia com o mesmo objeto dos presentes (mesmo imposto, veículo e sujeitos processuais), em virtude de este dever ser considerado o processo principal por ter sido distribuído em primeiro lugar;

4.ª Em nenhum lugar do douto Despacho recorrido se estabelece qual dos dois processos foi instaurado em primeiro lugar no termos que decorrem do disposto no artigo 267.º, n.º 2 do CPC e assim também entendido no douto Despacho recorrido.

5.ª Por notificação de 15.01.2018 relativa ao processo n.º 338/17.8BESNT o recorrente foi notificado do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, 2.º Juízo, 2.ª Secção (Contencioso Tributário), proferido em 11.01.2018 e disponível em linha no endereço eletrónico www.dgsi.pt;

6.ª Através de decisão judicial plasmada no Acórdão que se referiu o recorrente ficou a saber que “…, nesta sede, atenta a factualidade provada (cfr.nºs. 3 e 5 do probatório), deve concluir-se que a p.i. de oposição se considera proposta na data em que foi formulado o pedido de patrocínio judiciário pelo recorrente (17/02/2014). Isto significa que, pedida a nomeação de patrono no quadro da protecção jurídica antes de ocorrer o termo final do prazo de caducidade do direito de acção em causa, se queda irrelevante o prazo que decorra entre aquele momento e o de propositura da acção pelo patrono que venha a ser nomeado (cfr. artº. 33, n.º 4, da Lei 34/2004, de 29/07; Salvador da Costa, O Apoio Judiciário, 9ª. Edição, Almedina, 2013, pág. 197 e seg.).” (sublinhado nosso);

7.ª Nos casos em que a parte litiga com o benefício de apoio judiciário, na determinação da data de instauração importa considerar o disposto no artigo 33.º, n.º 4 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, segundo o qual “A acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono.”;

8.ª Importa considerar o facto atinente à data em que o recorrente formulou pedido de Apoio Judiciário e não outra data posterior porque irrelevante;

9.ª No caso destes autos, consta no “Envelope n.º 0293566” que se juntou à PI como Doc. 5, que o pedido de Apoio Judiciário com nomeação de patrono e que lhe veio a ser deferido, foi formulado em 17.03.2014;

10.ª No processo n.º 1144/16.2BESNT, decorre do “Envelope n.º 0297117” que ali foi junto à PI como Doc. 5, que foi no dia 07.04.2014 que peticionou o Apoio Judiciário com nomeação de patrono;

11.ª Nos termos do disposto no artigo 105.º do CPPT a consideração da data em que o recorrente peticionou apoio judiciário para o presente caso é essencial para que se possa decidir sobre a apensação de processos em causa;

12.ª Face ao que se alega na epígrafe III e aqui dá por reproduzido, a douta decisão recorrida enferma de erro de julgamento na apreciação e decisão sobre a matéria de facto, por se ter omitido facto atinente à data de propositura da ação, atento o disposto no 33.º, n.º 4 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho;

13.ª Nestes termos requer-se a Vossas Excelências que revoguem a decisão nesta parte (omissão), e determinem o aditamento dos seguintes factos:

a) “Nestes autos o impugnante pediu apoio judiciário com nomeação de patrono em 17.03.2014.”;

b) Nos autos relativos ao processo n.º 1144/16.2BESNT, o impugnante pediu apoio judiciário com nomeação de patrono em 07.04.2014

14.ª Constata-se que na douta decisão recorrida não se encontram referidos quaisquer factos quanto às concretas datas em que deve considerar-se proposta a ação em cada um dos dois processos cotejados;

15.ª Por isso, estamos perante uma situação de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, que a torna nula nos termos do disposto no artigo 125.º, n.º 1 do CPPT, requerendo-se a Vossas Excelências que o declarem;

16.ª Na douta decisão recorrida decidiu-se que: “…, estando o processo mais antigo distribuído a outro juiz, deverá ali ser requerida a respectiva apensação.”

17.ª Porém, tal exercício é impossível sem que se adquira nestes autos e dê por assente qual a concreta data em que deve considerar-se instaurada a ação no processo n.º 1144/16.2BESNT, nos termos que vêm propugnados no Acórdão o Tribunal Central Administrativo Sul a que se aludiu;

18.ª No douto Despacho recorrido decidiu-se sem que houvesse conhecimento nestes autos do facto atinente àquela data em concreto;

19.ª Por isso, ocorre uma situação de vício de insuficiência da matéria de facto dada como provada para a decisão;

20.ª Adicionalmente, tendo por referência a data em que foi formulado pedido de Apoio Judiciário com nomeação de patrono – e não a data de apresentação da peça processual inicial -, e à luz do entendimento vertido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul que se referiu, ficou demonstrado que ao contrário do que se entendeu, é o presente processo que deve ser considerado o mais antigo no cotejo com o processo n.º 1144/16.2BESNT;

21.ª Do que aqui fica dito, a douta decisão recorrida incorre em erro de julgamento quanto à questão da apensação de processos, tendo-se violado os artigos 104.º e 105.º do CPPT, artigos 28.º e 61.º do CPTA e artigo 267.º, n.º 2 e 3 do CPC, pelo que se requer a Vossas Excelências que revoguem a decisão recorrida nesta parte.

Nestes termos, nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências deverá ser admitido e proceder o presente recurso, só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”


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Não foram produzidas contra-alegações.

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Os autos foram com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP), ao abrigo do artigo 146.º, nº1, do CPTA.

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Sem vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos atenta a simplicidade da questão, cumpre, agora, decidir.

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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Visando a decisão do presente recurso, este Tribunal dá como provada a seguinte matéria de facto:

1. Em 26 de setembro de 2016, deu entrada via plataforma SITAF, no Tribunal Tributário de Lisboa, ação de impugnação de atos administrativos em matéria tributária contra o Ministério das Finanças, a qual corre termos sob o nº de processo 1144/16.2BESNT, tendo por objeto e conforme evidenciado no preâmbulo da petição inicial o seguinte:
“a) Ato de notificação por carta de 17.03.2014, sob correio registado com o n.º ..... e relativa ao procedimento de “Liquidação Oficiosa de IUC – 2.ª Notificação para Audiência Prévia”, cuja cópia se junta como Doc. 3, dando-se aqui por reproduzido o seu conteúdo; e
b) O ato administrativo consubstanciado na decisão do Chefe do Serviço de Finanças Sintra-4. Queluz, de 19.02.2015 que rejeitou o exercício do direito de audição prévia, relativamente à notificação a que se alude no antecedente, com fundamento em extemporaneidade, cuja cópia se junta como Doc. 4, dando-se aqui por reproduzido o seu conteúdo.” .” (cfr. fls.1 e 2 dos autos de impugnação nº 1144/16.2BESNT mediante consulta na plataforma SITAF; facto que se extrai do requerimento de apensação processual a fls. 60 e 61 dos autos);

2. Em 23 de maio de 2017, deu entrada via plataforma SITAF, no Tribunal Tributário de Lisboa, a presente ação de impugnação de atos em matéria tributária, contra Ministério das Finanças, tendo por objeto e conforme evidenciado no preâmbulo da petição inicial o seguinte:
 “a) “Resposta/decisão” que aparentemente, reporta à “Pronúncia na Audição Prévia”, consubstanciada na mensagem de correio eletrónico, cuja cópia se junta como Doc. 11, remetida pelo Órgão Fiscal em 21.09.2016 18:35 a partir do endereço eletrónico .....@at.gov.pt; e
b) O ato administrativo consubstanciado na decisão do Chefe do Serviço de Finanças Sintra-4. Queluz, de 13.02.2017 que tacitamente indeferiu in toto a reclamação graciosa e determinou o seu arquivamento, com os fundamentos que decorrem da informação e do parecer que a antecedem, cuja cópia se junta como Doc. 3, dando-se aqui por reproduzido o seu conteúdo.” (cfr. fls.1 e 2 dos autos);

3. A 12 de julho de 2017, foi ordenada a autuação da ação identificada no número antecedente, que corre termos sob o nº 1062/17.7 BELRS, como ação administrativa (cfr. fls. 52 dos autos);

4. O Recorrente, em 29 de setembro de 2017, apresentou requerimento junto dos presentes autos com o seguinte teor:
“ J....., impugnante nos autos à margem referenciados e neles melhor identificado, com o benefício de Apoio Judiciário nas modalidades de (1) dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de (2) nomeação e pagamento da compensação de patrono1, requerer a Vossa Excelência o seguinte:
1.º No Tribunal Tributário de Lisboa - Unidade Orgânica 2, sob o processo n.º 1144/16.2BESNT, correm termos os autos relativos a impugnação de matéria sobre o exercício da Audição Prévia com o mesmo objeto dos presentes (mesmo imposto, veículo e sujeitos processuais).
2.º Face ao que precede, requer-se a V. Exa. que determine no sentido de o presente processo ser apenso ao referido, em virtude de este dever ser considerado o processo principal por ter sido distribuído em primeiro lugar.” (cfr. fls. 60 e 61 dos autos);

5. Na sequência do requerimento evidenciado no ponto antecedente, foi prolatado despacho com o seguinte teor:
“Fls. 56 a 59: Visto.
Dê conhecimento à entidade requerida da sua junção aos autos.
*
Fls. 60 a 69:
Nos termos do disposto nos artigos 104.º e 105.º do CPPT, 28.º, n.º 3 do CPTA e 267.º, n.ºs 2 e 3 do CPC, a apensação de um processo a outro deve ser apreciado pelo juiz titular do processo a que o outro tenha de ser apensado, ou seja, o instaurado em primeiro lugar, pois é esse o juiz a quem cabe decidir se deve ou não fazer-se a apensação.
Face ao exposto, estando o processo mais antigo distribuído a outro juiz, deverá ali ser requerida a respectiva apensação.
Notifique.
*
Cumpra agora o disposto no artigo 81.º, n.º 1 do CPTA.”
(cfr. fls. 91 dos autos);

6. Na sequência da prolação do despacho constante no ponto antecedente, o Recorrente apresentou o presente recurso jurisdicional (cfr. fls. 92 e seguintes dos autos);


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A convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto estruturada supra, fundou-se no teor dos documentos, alicerçada na consulta da plataforma SITAF e na posição das partes, conforme referido em cada um dos números do probatório.

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III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, o despacho recorrido corresponde ao evidenciado no ponto 5 supra, ou seja, aquele que indeferiu a apensação dos presentes autos ao processo nº 1144/16.2BESNT, por “[o] pedido de apensação ter de ser apreciado pelo juiz titular do processo a que outro tenha de ser apensado”, o qual carece de ser analisado imediatamente, porquanto, a subida diferida ou a final do recurso em exame traduziria, necessariamente, uma inutilidade para os interesses que o mesmo defende no processo-de resto, é questão não controvertida, não tendo sido sindicada por nenhuma das partes em juízo-(cfr. artigo 644.º, nº2, alínea h) do CPC ex vi artigo 142.º, nº5 do CPTA).

Cumpre, assim, aferir se o aludido despacho deve manter-se na ordem jurídica com a consequente manutenção do indeferimento de apensação processual, competindo, nessa medida, aquilatar se o mesmo enferma das nulidades e erros de julgamento que lhe são assacados pelo Recorrente.

Vejamos, então.

O Recorrente começa por evidenciar que pese embora tenha requerido a apensação do presente processo ao processo n.º 1144/16.2BESNT, em virtude de este dever ser considerado o processo principal por ter sido distribuído em primeiro lugar, a verdade é que no Despacho recorrido não se estabelece qual dos dois processos foi instaurado em primeiro lugar nos termos que decorrem do disposto no artigo 267.º, n.º 2 do CPC.

Mais defendendo que decorre do Acórdão prolatado no âmbito do processo nº 338/17.8BESNT, datado de 11 de janeiro de 2018, que deve concluir-se que a p.i. de oposição se considera proposta na data em que foi formulado o pedido de patrocínio judiciário pelo Recorrente, donde ter-se-á de considerar o facto atinente à data em que o Recorrente formulou pedido de Apoio Judiciário e não outra data posterior, porquanto irrelevante.

E por assim ser, propugna que face ao consignado no artigo 105.º do CPPT a consideração da data em que o Recorrente peticionou apoio judiciário para o presente caso é essencial para que se possa decidir sobre a apensação de processos em causa. Logo, sublinha que não tendo a mesma sido computada encontramo-nos perante erro de julgamento na apreciação e decisão sobre a matéria de facto, por se ter omitido facto atinente à data de propositura da ação, atento o disposto no 33.º, n.º 4 da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho e, outrossim, perante nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito.

E por assim ser, é errada a asserção de que “[e]stando o processo mais antigo distribuído a outro juiz, deverá ali ser requerida a respectiva apensação”, razão pela qual a mesma incorre em erro de julgamento quanto à questão da apensação de processos, tendo-se violado os artigos 104.º e 105.º do CPPT, artigos 28.º e 61.º do CPTA e artigo 267.º, n.º 2 e 3 do CPC.

Apreciando.

Comecemos pela nulidade da decisão recorrida, por alegada falta de fundamentação de facto e de direito.

Preceitua o artigo 125.º do CPPT, que constitui causa de nulidade da sentença a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão.

O que corresponde ao regulamentado no normativo 615.º, nº1, alínea b), do CPC, segundo o qual “é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e direito que justifiquem a decisão”, sendo aplicável, com as necessárias adaptações, aos despachos, conforme consignado no artigo 613.º, nº3, do CPC.

De convocar, ainda neste particular, o comando constitucional contemplado no artigo 205.º da CRP o qual prevê que: “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.

Como doutrina Alberto dos Reis[1], “[u]ma decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas; é uma peça sem base.”

Dimana, efetivamente, dos aludidos preceitos legais que uma decisão tem de contemplar a respetiva fundamentação, de facto e de direito, sendo certo que, como esclarece António Santos Abrantes Geraldes[2] “no campo dos despachos interlocutórios, a exigência de fundamentação pode não ser tão intensa, autorizando-se o juiz a fundamentar por remissão para os fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, desde que verificados os seguintes requisitos: faltar oposição ao pedido pela contraparte e tratar-se de caso de manifesta simplicidade”.

De facto, atentando no teor do despacho visado verifica-se que inexiste uma concreta individualização da factualidade, no entanto perceciona-se que o Tribunal a quo não a particularizou, mormente, a data de entrada da petição inicial, à luz, desde logo, do requerido pela parte.

Com efeito, conforme dimana perentório do requerimento extratado em 4) da factualidade assente, o Recorrente assume de forma inequívoca que o processo nº 1144/16.2BESNT foi distribuído em primeiro lugar, reconhecendo-o, expressamente, como processo principal (apensante), peticionando, por conseguinte, a apensação destes autos ao aludido processo.

E por assim ser, pese embora o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, não tenha individualizado e autonomizado qualquer probatório, a verdade é que adotou tal procedimento porquanto validou tais asserções fáticas, não controvertidas. De resto, à semelhança do que sucede nas situações relacionadas com o indeferimento liminar[3], in casu, não haveria necessidade de uma concreta individualização dos factos provados, uma vez que a decisão teve por suporte apenas as realidades fáticas convocada pela parte, ora Recorrente.

Destarte, a falta de concreta individualização das ocorrências processuais, não tem o aporte de, in casu, acarretar a sua nulidade.

Ademais, e sem embargo de todo o exposto, importa ter presente que o Tribunal ad quem, por forma a clarificar a fundamentação de facto, e no âmbito dos seus poderes de cognição, já procedeu à fixação da factualidade que reputava relevante para dirimir a questão.

De relevar, in fine, que o Tribunal a quo nada aquiesceu quanto à data da formulação do pedido de apoio judiciário, pela simples razão que tal não era uma questão em contenda. É certo que essa análise pode estar incorreta, no entanto, tal em nada configurará uma nulidade, quando muito erro de julgamento, que será apreciada em sede própria.

Improcede, assim, a arguida nulidade.

Atentemos, ora, no erro de julgamento de facto.

O Recorrente requer que sejam aditados os factos que infra se enumeram, por os mesmos se reputarem fundamentais para dirimir o litígio, mormente, para aquilatar qual o processo apensante.
a) “Nestes autos o impugnante pediu apoio judiciário com nomeação de patrono em 17.03.2014.”;
b) Nos autos relativos ao processo n.º 1144/16.2BESNT, o impugnante pediu apoio judiciário com nomeação de patrono em 07.04.2014.”

No entanto, atento o âmbito e abrangência da questão em litígio, designadamente, do artigo 28.º do CPTA, ajuíza-se que a aludida factualidade é irrelevante para a apreciação da questão em contenda.

Mas explicitemos porque assim o entendemos.

In casu, encontramo-nos perante uma ação administrativa porquanto face ao consignado no artigo 97.º, nº1, alínea p), e nº2, do CPPT, a mesma é regulada pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos, donde, pelo regime constante no CPTA.

No domínio da apensação processual rege o artigo 28.º do CPTA-normativo esse, e bem, convocado pelo Tribunal a quo- o qual dispõe que:
“1 - Quando sejam separadamente propostas ações que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade previstos para a coligação e a cumulação de pedidos, possam ser reunidas num único processo, deve ser ordenada a apensação delas, ainda que se encontrem pendentes em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão torne especialmente inconveniente a apensação.
2 - Os processos são apensados ao que tiver sido intentado em primeiro lugar, considerando-se como tal o de numeração inferior, salvo se os pedidos forem dependentes uns dos outros, caso em que a apensação é feita na ordem da dependência.
3 - A apensação pode ser requerida ao tribunal perante o qual se encontre pendente o processo a que os outros tenham de ser apensados e, quando se trate de processos que estejam pendentes perante o mesmo juiz, deve ser por este oficiosamente determinada, ouvidas as partes.
4 - Importa baixa na distribuição a apensação de processo distribuído a juiz diferente.”

Resulta, assim, que a apensação pode ser ordenada com fundamento, alternativamente, no facto de os respetivos pedidos: terem a mesma e única causa de pedir; tendo causas de pedir diferentes, devam ser apreciados em função dos mesmos factos ou da aplicação dos mesmos princípios ou normas jurídicas; ou estarem, entre si, numa relação de prejudicialidade ou dependência jurídica[4].

Sendo que a apensação terá, necessariamente, de ser feita sob requerimento ao juiz do processo apensante, o qual, conforme dimana do nº 2 deve ser entendido enquanto tal, o de numeração inferior, ressalvada a situação de dependência.

Como doutrinado por Mário Esteves de Oliveira, e Rodrigo Esteves de Oliveira[5], convocando os ensinamentos de Alberto dos Reis, “[a] apensação é feita sob requerimento de uma das partes do processo apensável ao juiz do processo apensante (…) o juiz do processo apensável não intervém, de maneira alguma, no incidente da apensação”. (destaque e sublinhado).

Aliás, tal regulamentação está em consonância, designadamente, com o consignado nos artigos 104.º e 105.º do CPPT a propósito da apensação de impugnações judiciais, e 267.º do CPC, relevando quanto, a este último, António Santos Abrantes Geraldes[6] que “[o] requerimento deve ser apresentado no processo que deva suportar a apensação”.

Neste particular, vide, designadamente, o Aresto do STA, prolatado no âmbito do processo nº 01290/14, datado de 21 de janeiro de 2015, o qual doutrina claramente que: “A apensação (de impugnações judiciais) deve ser requerida no processo principal e é em relação a este que deve ser aferido o requisito de «não haver prejuízo para o andamento da causa”.

Explicitando, depois, na fundamentação jurídica na parte que para os autos releva que:

“Ora, como relativamente ao citado art. 105º do CPPT pondera o Cons. Jorge Lopes de Sousa, a norma deixa «ao critério do juiz ordenar a apensação, conforme o juízo que faça sobre a existência ou não de prejuízo para o andamento do processo a que deve ser feita a apensação, que é o primeiro que tiver sido instaurado. Será a existência desta possibilidade de o juiz casuisticamente apreciar a conveniência da apreciação conjunta das impugnações que justificará que a apensação seja admitida com maior amplitude do que a cumulação, pois aquela possibilidade de apreciação permite assegurar que esta maior amplitude não acarreta inconvenientes processuais.» (Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. II, 6.ª edição, Áreas Editora, 2011, anotação 2 ao art. 105.º, p. 189.) Pressupondo-se, «nestes casos de apensação previstos no CPPT, que os processos sejam da competência do mesmo juiz.»

E, similarmente, também o n.º 1 do art. 28º do CPTA e o nº 1 do art. 267º do NCPC permitem a apensação, caso se verifiquem os requisitos de admissibilidade e «a não ser que o estado do processo ou outra razão torne especialmente inconveniente a apensação», ou seja, consagrando, igualmente, a possibilidade de a apensação ser recusada se o estado do processo ou outra razão a tornar especialmente inconveniente.” (sublinhado nosso).

Ora, face ao supra aludido e ao recorte fático traçado anteriormente, não há dúvidas que o processo principal, entenda-se o processo apensante é o processo nº 1144/16.2BESNT, e o processo apensável é o processo 1062/17.7 BELRS, por o primeiro ter, inequivocamente, a numeração inferior, logo a apensação teria de ser requerida no processo nº 1144/16.2BESNT, tal como decidido pelo Tribunal a quo.

De evidenciar, neste particular, que em nada releva, neste e para este efeito, a data em que foi peticionado o apoio judiciário, em nada sendo transponível para efeitos da visada apensação processual o dirimido no processo n.º 338/17.8BESNT, que apenas analisa a questão da tempestividade da oposição no âmbito do processo de execução fiscal. Note-se que o, ora, convocado artigo 33.º da Lei nº 34/2004, de 29 de julho, coaduna-se, tão-só, com o prazo de propositura da ação nas situações de nomeação de patrono, em nada relevando, natural e necessariamente, para esta sede.

Ademais, não podemos perder de vista a ratio subjacente à apensação processual a qual se coaduna e justifica com razões de celeridade e obtenção de economia na atividade processual, e bem assim uniformidade de decisões.

Sublinhe-se e reitere-se, in fine, que foi o próprio Recorrente -contrariamente ao que realiza nesta instância, traduzindo a locução do exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente donde, censurável e passível de qualificação como venire contra factum proprium-que configurou o processo nº 1144/16.2BESNT como sendo o processo apensante. 

Ora, face a todo o expendido, nenhum erro de julgamento pode ser apontado ao Tribunal a quo, quando decidiu que o pedido de apensação processual teria de ser apresentado junto do processo intentado em primeiro lugar concretamente, processo nº 1144/16.2BESNT, o qual, nessa medida, se mantém.


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III. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR provimento ao recurso, mantendo-se o despacho recorrido.

Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário.

Registe. Notifique.


Lisboa, 08 de julho de 2021


[A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Susana Barreto e Vital Lopes]

Patrícia Manuel Pires

_____________________
[1] Código de Processo Civil, Vol. V, p. 139.
[2] Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa, CPC anotado, Almedina, 2019, Reimpressão, Vol. I, 188.
[3] Vide, designadamente, Acórdãos do STA, prolatados nos processos nºs 0921/15, de 15.06.2016 e 0786/07, de 04.03.2009.
[4] Vide, Mário Esteves de Oliveira, Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ETAF anotados, Volume I, Almedina, janeiro de 2006, p.227.
[5] In Ob. Cit, pp. 230 e 231.
[6] Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, CPC anotado, Almedina, 2019-Reimpressão, Vol. I, p.309.