Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 205/24.9BCLSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 11/14/2024 |
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Relator: | MARIA TERESA CAIADO FERNANDES CORREIA |
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Descritores: | DIREITO DISCIPLINAR DESPORTIVO PROCESSO SUMÁRIO FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO |
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Sumário: | I- Fundamentar é enunciar (explicita ainda que sucintamente) as razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado ato, a exteriorização dos motivos do ato de modo a permitir a um destinatário normal perceber porque se decidiu em determinado sentido e não noutro. II- A decisão impugnada estará devidamente fundamentada se das informações dos serviços e/ou dos relatórios constarem diretamente, ou por remissão, as razões por que se decidiu em certo sentido, permitindo assim a defesa posterior dos direitos e interesses legítimos dos destinatários: cfr. art. 152º a art. 154º do CPA; neste sentido vide CPA anotado por MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO AMORIM, 2º edição, Almedina; Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo - STA de 1998-01-28, processo n.º 021331; Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte – TCAN, de 2014, processo n.º 1726/07.BEPRT, disponíveis em www.DGSI.pt. III- Equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato: cfr. art. 152º a art. 154º do CPA; vide CPA anotado por MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES E J. PACHECO AMORIM, 2º edição, Almedina, Ac. do STA de 1998-01-28, proferido no Processo n.º 021331, disponível em www.DGSI.pt. IV- É manifesta a insuficiência da fundamentação da decisão de 2024-06-28, tomada pela entidade recorrente que, tal como na decisão de 2024-05-31, não logrou identificar os factos em que se alicerçou, nem esclareceu concretamente a motivação do ato, tornando assim impossível alcançar o iter-cognoscitivo adotado e quais as razões por que decidiu como decidiu: cfr. art. 246º, art. 247º e art. 229º n.º 4 todos do RDFPF; art. 152º e art. 153º do CPA ex vi art. 11º do RDFPF. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção SOCIAL |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | EM NOME DO POVO acordam os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul – Subsecção Social: *** AA.., com os demais sinais dos autos, intentou no Tribunal Arbitral do Desporto – TAD, contra a FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL - FPF, ação arbitral impugnando o acórdão do Conselho de Disciplina da entidade demandada, datado de 2024-06-28, o qual condenou o Demandante, no âmbito do Proc. Disciplinar n.º ....23/2024, em 17 (dezassete) dias de suspensão e multa no valor de €612,00 (seiscentos e doze euros).I. RELATÓRIO: * * Inconformada a entidade demandada, ora entidade recorrente, interpôs recurso de apelação para este Tribunal Central Administrativo do Sul - TCA Sul, no qual peticionou o provimento do recurso e a revogação da decisão arbitral recorrida, para tanto, apresentando as suas alegações com as conclusões recursivas que se transcrevem: “……”: cfr. fls. 36 a 47. * …”: cfr. fls. 49 a 69. * O presente recurso foi admitido e ordenada a sua subida em 2024-10-17: cfr. fls. 71.* Para tanto notificada, a Digna Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal Central ao abrigo do disposto no art. 146º e art. 147º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos - CPTA, emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, de que ressalta: “… entende o Ministério Público que a decisão do TAD procedeu a uma correta apreciação dos factos trazidos ao conhecimento do Tribunal e à sua subsunção ao Direito, evidenciando clara e suficiente fundamentação, pelo que, salvo melhor opinião, não merece qualquer censura. (…) Termos em que se pugna pela improcedência do presente recurso. …”: cfr. fls. 76 a 78.E, de tal parecer, notificadas, as partes nada disseram: cfr. fls. 79 a 80. * Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente (cfr. art. 36º nº 2 do CPTA), mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o presente processo à conferência para julgamento.*** Delimitadas as questões a conhecer pelo teor das alegações de recurso apresentadas pela entidade recorrente e respetivas conclusões (cfr. art. 635°, n° 4 e art. 639°, n°1, nº. 2 e nº 3 todos do Código de Processo Civil – CPC ex vi artº 140° do CPTA), não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas - salvo as de conhecimento oficioso -, importa apreciar e decidir agora se a decisão arbitral recorrida padece do invocado erro de julgamento.II. OBJETO DO RECURSO: Vejamos: *** A – DE FACTO:III. FUNDAMENTAÇÃO: Remete-se para os termos da decisão da 1.ª instância que decidiu a matéria de facto: cfr. art. 663º n.º 6 do CPC ex vi art. 1.º, art. 7º-A e art. 140.º n.º 3 todos do CPTA. E por se mostrar relevante para a boa decisão em sede recursiva, adita-se ainda a seguinte factualidade: cfr. art. 7º -A do CPTA: ● Do recurso da decisão sumária apresentado pelo recorrido, em 2024-06-11, e já referido na matéria assente, ressalta: “… 6. Pois que sempre se haveria de exigir que a formação restrita da Secção Não Profissional do Conselho de Disciplina da FPF, nem que fosse de modo sintético, cuidasse de expressamente (i) enunciar os factos que deram origem ao presente processo, (ii) fundamentar, de facto e de direito, a sua decisão, e, bem assim, (iii) explicar os motivos que o levaram a decidir nesse concreto sentido. 7. Nessa medida, uma vez que a decisão recorrida veio determinar a aplicação de sanções disciplinares ao recorrente sem qualquer fundamentação, dúvidas inexistem que a mesma padece e ilegalidade por violação do art. 268º n.º 3 da CRP, dos art. 152º e 153 do CPA e do art. 229º n.º 4 do RDFPF…”: cfr. Processo Disciplinar n.º ....23/2024; ● Em 2024-06-28 o Conselho de Disciplina da entidade recorrente decidiu nos seguintes termos: “… §1. Da alegada falta de fundamentação...” (...)18. É, pois, neste maior grau de certeza ou presunção de veracidade que se sustenta o sancionamento em processo sumário, em prol da continuidade e do equilíbrio das competições. De resto, o arguido, mesmo quando prescinda de apresentar defesa escrita nos termos do art. 247º, n.º 5 do RDFPF, tem sempre hipótese de apresentar a sua versão dos factos, designadamente em sede de recurso para o Pleno, nos termos do disposto no art. 257º do RDFPF, momento em que pode lançar mão de todo e qualquer meio de prova, inclusivamente testemunhal, expediente do qual, contudo o não se socorreu o recorrente, pois não questionou os atos materiais que integram a factualidade que esteve subjacente ao seu sancionamento em processo sumário antes se limitou, genericamente, a alegar a falta de fundamentação da decisão recorrida. 19. Por outro lado, especificamente quanto à fundamentação das decisões, no domínio da lei ordinária, dispões o art. 153º n.º do CPA (…) 20. Não obstante a forma impressiva como se impõe aquele preceito legal, cabe não perder de vista que o fim único do dever de fundamentação é tornar inteligível, percetível, alcançável para o destinatário, as razões de facto e de Direito que sustentam a decisão. 21. E in casu, (…) o recorrente entendeu, perfeita e plenamente, as razões da sua condenação, tanto que em momento algum questionou a factualidade que lhe esteve subjacente. Em concreto, foi o mesmo sancionado pela prática da infração disciplinar prevista e sancionada pelo art. 130º n.º 2 al. b) do RDFPF (...) em virtude de na sua qualidade de dirigente de clube, se ter dirigido a terceiro ou ao visado (que no caso era outro agente desportivo no exercício das suas funções ou por virtude delas ou espetador), através de qualquer meio de expressão, e formular juízo, praticar facto ou, ainda que sob a forma de suspeita, imputar-lhe facto ofensivo da honra, consideração ou dignidade. Ademais, nem sequer o recorrente questiona a dosimetria das sanções concretas que lhe foram aplicadas, (…). 22. Por outro lado, importa ainda ter presente que a questão da fundamentação das sanções aplicadas pelo Conselho de Disciplina da FPF em sede de processo sumário (…) que os elementos constantes do Comunicado Oficial da FPF vulgarmente denominado “mapa de processos sumários” têm, necessariamente, de ser conjugados com os factos relatados pelo arbitro na Ficha de Jogo e/ou pelos Delegados da FPF, no Relatório de Ocorrências, que são do conhecimento prévio dos agentes desportivos e dos clubes (…) 24. Posto isto, resulta à evidencia que a decisão recorrida não padece do alegado vicio de falta de fundamentação e, bem assim, o recorrente não viu cerceados, ou sequer limitados, os seus direitos de defesa, pelo que, em face do exposto, deve improceder a pretensão deduzida pelo recorrente. IV – DECISAO: (…) manter integralmente a condenação do recorrente, pela prática da infração disciplinar prevista e sancionadas pelo art. 130º, n.º 2 al. b) do RDFPF, na sanção de 17 (dezassete) dias de suspensão e na sanção de multa de 6 UC, correspondentes a 612,11€ (seiscentos e doze euros), que lhe foram aplicadas em processo sumário…”: cfr. Processo Disciplinar n.º ....23/2024. * B – DE DIREITO:DO ERRO DE JULGAMENTO (v.g. art. 246º, art. 247º e art. 229º n.º 4 todos do Regulamento de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol – RDFPF; art. 152º e art. 153º ambos do Código de Procedimento Administrativo - CPA ex vi art. 11º do RDFPF): Ressalta do discurso fundamentador da decisão arbitral recorrida que: “… (…) (…) (…) Correspondentemente, e como resulta do sobredito, o tribunal arbitral a quo decidiu a ação arbitral procedente e, em consequência, anulou a decisão disciplinar impugnada. O assim decidido pelo tribunal arbitral a quo escora-se em tese que se acompanha. Na exata medida em que fundamentar é enunciar (explicita ainda que sucintamente) as razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado ato, a exteriorização dos motivos do ato de modo a permitir a um destinatário normal perceber porque se decidiu em determinado sentido e não noutro. A decisão impugnada estará devidamente fundamentada se das informações dos serviços e/ou dos relatórios constarem diretamente, ou por remissão, as razões por que se decidiu em certo sentido, permitindo assim a defesa posterior dos direitos e interesses legítimos dos destinatários: cfr. art. 152º a art. 154º do CPA; neste sentido vide CPA anotado por MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO AMORIM, 2º edição, Almedina; Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo - STA de 1998-01-28, processo n.º 021331; Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte – TCAN, de 2014, processo n.º 1726/07.BEPRT, disponíveis em www.DGSI.pt. Equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato: cfr. art. 152º a art. 154º do CPA; vide CPA anotado por MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES E J. PACHECO AMORIM, 2º edição, Almedina, Ac. do STA de 1998-01-28, proferido no Processo n.º 021331, disponível em www.DGSI.pt. É o que sucede no caso concreto. Porquanto, pese embora a decisão sancionatória impugnada se encontre fundamentada de direito e admitindo até que se pretenda mostrar-se fundamentada de facto (por remissão para os relatórios), o facto é que – aliás, como bem se sublinha na decisão arbitral recorrida – tal remissão é omissa, posto que, não identifica o conteúdo do descritivo do relatório em que se alicerça, não fazendo ademais qualquer menção ao relatório e/ou relatórios em que se baseia. Circunstância tanto mais bizarra quanto o facto de que, exatamente no mesmo Comunicado Oficial da FPF n.º ...., de 2024-05-31, vulgo, mapa de processos sumários, onde foi publicada a decisão sancionatória em crise, foram publicadas outras decisões sancionatórias em que, tal como decorre dos autos e o probatório elege, se identificam não só o direito em que se apoiam, mas fazem também, corretamente, a correspondência com os factos, de que é exemplo, não só a decisão disciplinar sancionatória que imediatamente antecede a do recorrido [cfr: “…BB.. (…) multa (…) (4º cartão amarelo) (art. 164.4 (…) art. 36º n.º 1 e n.º 2 do RDLPFP)…”], como ainda aquela que imediatamente a sucede [cfr: “…CC.. (…) multa (…) 154º.5 (Prática de jogo violento e outros comportamentos graves – “motivo: impedir a equipa adversária de marcar um golo, ou anular uma clara oportunidade de golo (…) Carregar um adversário destruindo uma clara oportunidade de golo. Conforme relatório do Árbitro) (…) art. 36n.º 1 e n.º 2 do RDLPFP) …”]. Já em sede de procedimento gracioso de segundo grau, a entidade recorrente afirma corretamente o direito no que à fundamentação dos atos respeita, mas continua a não o aplicar corretamente ao caso concreto. Uma vez que não reconhece que no Comunicado Oficial da FPF n.º ...., de 2024-05-31, relativamente ao recorrido (e, repete-se, diversamente do que sucedeu relativamente a outras decisões disciplinares publicadas no mesmo mapa de processo sumários) não foi feita qualquer identificação factual que permitisse identificar o relatório (e neste o ponto) de onde consta o comportamento que justificou a aplicação da sanção disciplinar. Mais, acresce que, a entidade recorrente também não identificou o iter-cognoscitivo adotado para decidir aplicar a sanção disciplinar e, bem assim a sua graduação, limitando-se, em sede de recurso gracioso, a afirmar que o recorrido nem sequer questionou: “… a dosimetria das sanções concretas que lhe foram aplicadas…”. Assim identificando a omissão do procedimento de primeiro grau (diga-se: de forma hábil, mas incorreta) evitando, todavia - como se lhe impunha à luz do quadro legal vigente (que, aliás bem identificou no ato em crise) - explicar o caminho traçado na decisão, ou seja, a motivação da decisão e ainda os critérios e normas em que se fundou para decidir no sentido e no modo, em que o fez: cfr. art. 246º, art. 247º e art. 229º n.º 4 todos do RDFPF; art. 152º e art. 153º do CPA ex vi art. 11º do RDFPF. No que importa considerar para a economia dos autos do probatório resulta, pois, manifesta a insuficiência da fundamentação da decisão de 2024-06-28, tomada pela entidade recorrente que, tal como na decisão de 2024-05-31, não logrou identificar os factos em que se alicerçou, nem esclareceu concretamente a motivação do ato, tornando assim impossível alcançar o iter-cognoscitivo adotado e quais as razões por que decidiu como decidiu: cfr. art. 246º, art. 247º e art. 229º n.º 4 todos do RDFPF; art. 152º e art. 153º do CPA ex vi art. 11º do RDFPF. Vale isto por dizer, como sobredito, que bem andou o acórdão arbitral recorrido ao verificar a falta de fundamentação do ato, assim corretamente decidindo pela procedência da ação arbitral, anulando, em consequência, a decisão disciplinar impugnada. Termos em que a decisão arbitral recorrida não padece do invocado erro de julgamento. *** Pelo exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Administrativo – Subsecção Social deste TCAS em julgar improcedente o recurso interposto e, em consequência, manter a decisão arbitral recorrida.IV. DECISÃO: Custas pela entidade recorrente. 14 de novembro de 2024 (Teresa Caiado – relatora) (Frederico Branco - 1º adjunto) (Luis Freitas – 2º adjunto) |