Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1720/20.9BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 02/20/2025 |
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Relator: | FILIPE CARVALHO DAS NEVES |
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Descritores: | RECURSO DE CONTRAORDENAÇÃO TAXA DE JUSTIÇA MULTA |
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Sumário: | I – A omissão do pagamento da taxa de justiça devida pelo recurso da decisão da autoridade administrativa, não conduz imediatamente à sua rejeição, sem que antes o recorrente seja notificado para efetuar o pagamento omitido, acrescido da multa devida, nos termos das disposições conjugadas do art.º 41.º do Regime Geral das Contraordenações («RGCO»), do art.º 4.º do Código de Processo Penal («CPP») e do art.º 642.º do Código de Processo Civil («CPC»). II – Sendo cumprido o rito processual acima indicado e mantendo-se a situação de incumprimento, deve ser ordenado o desentranhamento do recurso da decisão da autoridade administrativa, com a consequente extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos dos art.ºs 277.º, alínea e), e 642.º, n.º 2, in fine, do CPC, 41.º, n.º 1 do RCGO e 4.º do CPP. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO A… – Sociedade de Manutenção …, Lda. veio, nos termos art.ºs 83.º, n.ºs 1 e 3 e 84.º, a contrario, do Regime Geral das Infrações Tributárias («RGIT»), 401.º, n.º 1, alínea b), 406.º, n.º 1 e 407.º, n.º 2, alínea a), todos do Código de Processo Penal («CPP»), apresentar recurso da decisão proferida a 11/04/2024 pelo Tribunal Tributário («TT») de Lisboa, que determinou o desentranhamento da petição inicial, com a consequente extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos dos art.ºs 277.º, alínea e), e 642.º, n.º 2, in fine, do CPC, 41.º, n.º 1 do RCGO («Regime Geral das Contraordenações») e 4.º do CPP. A Recorrente apresentou alegações, rematadas com as seguintes conclusões: «I. Em 30/04/2021 (ref.: 007107790, fls. 208) foi a ora requerente, notificada para juntar comprovativo de pagamento de taxa de justiça no prazo de 10 dias. II. A taxa foi devidamente liquidada e o comprovativo de pagamento junto aos autos por requerimento datado de 19/05/2021 (ref. 007124807, fls. 215). III. Foi aberta cota a fls. 216 referindo: Estado – Paga na totalidade. IV. Em 14/11/2022, foram os autos redistribuídos conforme conclusão com a ref. 007534035; fls. 218. V. Nessa mesma data foi também proferido despacho com a ref. 007534854, fls. 219, referindo o seguinte: “Atenta a informação prestada a fls. 216 do SITAF, notifique a Recorrente para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça no âmbito dos presentes autos, sob pena de não conhecimento do presente recurso”. VI. Estando a taxa devidamente liquidada, houve uma clara distorção da realidade factual (error facti) aquando da decisão emitida, pois esta está claramente em desconformidade com a documentação junto aos autos. VII. A sentença é, em nosso modesto entender, nula nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. c) do CPC. Face ao exposto, deve V.Exa. declarar a nulidade da sentença e em consequência substituir por outra que admita o recurso do processo de contra-ordenação seguindo os seus termos normais. Não se opondo desde já que o Tribunal Tributário de Lisboa profira despacho, sem necessidade de julgamento.» * «A recorrente voltou não pagou a taxa de justiça e multa devidas. Conforme citou a douta sentença, como se escreveu no Ac. do TCA-Norte de 14-10-2021, proferido no processo 00275/21.1BEAVR: “I - No recurso de Contraordenação, o Recorrente deve ser notificado para pagar a taxa de justiça, nos termos do n.º 8 do artigo 8.º do RCP. II - Em caso de omissão do pagamento da taxa de justiça, o Recorrente deve ser notificado para efetuar o pagamento omitido, acrescido da multa a que alude o n.º 1 do artigo 642.º do CPC.”. Ora a consequência do não pagamento não mais é do que a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos dos artigos 277.º, alínea e), e 642.º, n.º 2, in fine, do CPC, 41.º, n.º 1 do RCGO e 4º do CPP, motivo pelo qual entendemos não ser merecedora de qualquer censura a sentença recorrida, devendo a mesma permanecer na ordem jurídica. Porém, V. Exas. farão como sempre O Exmo. Magistrado do Ministério Público («EMMP») junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.JUSTIÇA! * * Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão.* O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cf. art.º 635.º, n.º 4 e art.º 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil - «CPC» - ex vi art.º 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - «CPPT»), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente. Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se deve ser revogada a decisão de 14/04/2024 proferida pelo Tribunal a quo, uma vez que a taxa de justiça devida pelo impulso processual concretizado (apresentação de petição inicial) se encontra liquidada na íntegra, tendo oportunamente sido junto aos autos o correspondente comprovativo de pagamento. * III – FUNDAMENTAÇÃO III.A - De facto Com interesse para apreciação da questão em causa há que ter em conta a dinâmica processual supra referida em sede de relatório e ainda a seguinte factualidade que resulta dos elementos constantes dos autos: A. Em 01/09/2020, deu entrada junto da Autoridade Tributária e Aduaneira («AT») recurso judicial com referência à decisão de aplicação de coima proferida no âmbito do processo de contraordenação n.º 14732020060000002323, não tendo sido junto documento comprovativo da liquidação de taxa de justiça – cf. fls. 1 a 188 (numeração do SITAF A indicação das fls. do processo será sempre realizada com referência à numeração indicado no SITAF.); B. Em 28/04/2021, foi proferido despacho pelo Tribunal a quo, no qual, além do mais, consta o seguinte: «Atentos os fundamentos invocados no recurso e o teor dos elementos documentais juntos aos autos, julga-se dispensável a realização de audiência de discussão e julgamento no âmbito dos presentes autos. Notifique a Recorrente e o Ministério Público para, no prazo de 10 dias, declararem, querendo, a sua oposição, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 64.º, n.º 2, do RGCO, ex vi do artigo 3.º,alínea b), do RGIT.» - cf. fls. 206; C. Em 30/04/2021, foi emitida pelo TT de Lisboa a «Guia Cível / Penal» n.º 703180081360584, na qual, além do mais, consta o seguinte: «Imagem em texto no original» - cf. fls. 207; D. Em 30/04/2021, no âmbito dos presentes autos foi emitida pelo TT de Lisboa «notificação» dirigida à ora Recorrente, na qual, além do mais, consta o seguinte: «Mais, fica notificado para, no prazo de 10 dias, autoliquidar a taxa de justiça no montante de uma unidade de conta – 102,00€ - nos termos dos n.º 7 e n.º 8 do artigo 8.º do Regulamento de Custas Processuais, juntando-se para o efeito a respetiva guia DUC, - Documento Único de Cobrança, (art.º 21.º da portaria 419-A/2009).» - cf. fls. 208; E. A «guia DUC» referida nos pontos C. e D. que antecedem não foi paga pela Recorrente – cf. histórico do SITAF, concretamente a informação que se extrai de fls. 211 e 215 a 216; F. Em 19/05/2021 a Recorrente apresentou requerimento nos presentes autos, no qual, além do mais, é referido que «(…) vem requerer a junção aos autos de comprovativo de pagamento de taxa de justiça (…)» - cf. fls. 212 a 215; G. Em 14/11/2022, foi proferido despacho pelo Tribunal a quo com o seguinte teor: «Atenta a informação prestada a fls. 216 do SITAF, notifique a Recorrente para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça no âmbito dos presentes autos, sob pena de não conhecimento do presente recurso.» - cf. fls. 219; H. Através de ofício de 15/11/2022, com a referência 007536573, foi o despacho referido no ponto anterior remetido por via eletrónica para a mandatária da ora Recorrente – cf. fls. 220; I. Em 20/03/2023, foi emitida pelo TT de Lisboa no âmbito dos presentes autos «notificação» dirigida à ora Recorrente, na qual, além do mais, consta o seguinte: «Assunto: Pagamento de taxa de justiça e multa – art.º 642.º nº 1 CPC Com referência ao processo acima identificado, fica notificado, para, no prazo de 10 dias, efetuar o pagamento da taxa de justiça devida acrescida de uma multa de igual montante. (…) Pagamento da taxa de justiça O pagamento da taxa de justiça em falta deverá ser efetuado por autoliquidação, dentro do prazo concedido. Para efeitos da autoliquidação, junto se remete a guia DUC no montante da taxa devida. Pagamento da multa O prazo de pagamento, bem como o montante, locais e o modo de pagamento da multa constam da guia anexa Cominação A falta de pagamento da taxa de justiça e das multas no prazo assinalado implica o desentranhamento, dos autos, da alegação, do requerimento ou da resposta eventualmente apresentada pela parte em falta. Nota: Caso opte pelo pagamento através de autoliquidação deverá juntar o respetivo comprovativo de pagamento dentro do prazo estabelecido (10 dias - art.º 642.º, n.º 2 do CPC)» - cf. fls. 222 dos autos; J. A «guia DUC» referida no ponto I. que antecede não foi paga pela Recorrente – cf. histórico do SITAF, concretamente a informação que se extrai de fls. 223; K. Em 11/04/2024 foi proferida «Sentença» pelo Tribunal a quo, na qual foi, além do mais, determinado o «desentranhamento do instrumento de impugnação e de alegação, com a consequente extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos dos artigos 277.º, alínea e), e 642.º, n.º 2, in fine, do CPC, 41.º, n.º 1 do RCGO e 4º do CPP.» - cf. fls. 229 e 230. * O Tribunal fundou a sua convicção na análise dos documentos constantes dos autos, para os quais se remete no final de cada facto, que não foram impugnados.* III.B De Direito Vem o presente recurso interposto de decisão proferida pelo TT de Lisboa, em 11/04/2024, de não admissão do recurso de decisão administrativa de aplicação de coima por falta de pagamento da taxa de justiça devida. Neste conspecto, sustenta a Recorrente, fundamentalmente, que procedeu ao pagamento da taxa de justiça devida pela apresentação do recurso judicial da decisão de aplicação da coima proferida no processo de contraordenação n.º 14732020060000002323, tendo junto aos autos o correspondente comprovativo de pagamento. Por seu turno, sustenta o Recorrido que as alegações recursórias devem improceder, uma vez que resulta dos autos que a taxa de justiça devida não se encontra paga, apesar de a Recorrente ter sido, conforme deveria, convidada a proceder ao respetivo pagamento. Apreciando e decidindo: Adiantamos, desde já, que não tem razão a Recorrente. Vejamos, então, porquê. A situação aqui em discussão tem sido apreciada por diversas vezes pela jurisprudência dos Tribunais Superiores. Tenhamos presente, entre outros, o acórdão do TCA Norte, de 14/10/21, proferido no processo n.º 275/21.1BEAVR, disponível em www.dgsi.pt, no qual se pode ler, além do mais, o seguinte: «Estabelece o n.º 7 do artigo 8.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP) que é devida taxa de justiça pela impugnação das decisões de autoridades administrativas, no âmbito de processos de contraordenação, no montante de 1 UC, podendo ser corrigida a final pelo juiz. Por sua vez, o n.º 8 do mesmo artigo 8.º do RCP, determina que a taxa de justiça é autoliquidada, assim que o arguido seja notificado da data de marcação da audiência de julgamento ou do despacho que a considere dispensada. O que não estabelece o RCP é a consequência para o não pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso da decisão da autoridade administrativa. No entanto, a jurisprudência tem se pronunciado sobre o assunto, no sentido de que a omissão do pagamento da taxa de justiça devida pelo recurso da decisão da autoridade administrativa, não conduz imediatamente à sua rejeição, sem que antes o recorrente seja notificado para efetuar o pagamento omitido acrescido da multa devida, nos termos das disposições conjugadas do artigo 41.º do Regime Geral das Contraordenações (RGCO), do artigo 4.º do Código de Processo Penal (CPP) e do artigo 642.º do Código de Processo Civil (CPC). Assim, o n.º 1 do artigo 41.º do RGCO refere que os preceitos reguladores do processo criminal, são aplicáveis subsidiariamente ao processo de contraordenação. Por sua vez, o artigo 4.º do CPP, determina que nos casos omissos, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal. Estando em apreço um recurso, significa que a regime atinente ao pagamento da taxa de justiça deve observar o estatuído no CPC sobre os recursos, na medida em que sobre a falta de pagamento de taxa de justiça, o RCP é omisso. Ora, o CPC, prevê no n.º 1 do artigo 642.º, que omitido o pagamento da taxa de justiça devida pelo recurso, o interessado deve ser notificado para efetuar o pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC, nem superior a 5 UC. Significa isto, que no caso em apreço, o Recorrente deveria ter sido notificado para pagar a taxa de justiça omitida, acrescida de multa de igual montante. Neste sentido veja-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26/06/2019, proferido no processo n.º 0532/18.4BEBRG (que pode ser lido na íntegra em www.dgsi.pt), cujo teor do sumário é o seguinte: «I – Ao impugnar a matéria de facto e ao arrolar testemunhas nas suas alegações – a inquirir obviamente em audiência de julgamento –, a arguida manifestou a sua oposição implícita à possibilidade de a decisão do recurso de contra-ordenação ser tomada por despacho, pois que a decisão tomada por esta via redundaria na preterição da pretendida inquirição. II – Sucede, porém, que sendo devidamente notificada de que o Tribunal a quo não considerava necessária a realização de audiência de julgamento e sendo convocada para expressamente confirmar a sua oposição à decisão da causa por despacho, a arguida optou por nada dizer, o que se revela apto a neutralizar a oposição implicitamente manifestada em momento anterior, uma vez que a arguida foi expressamente advertida pelo Tribunal de que o seu silêncio valeria como não oposição. III - Nos termos do artigo 642.º do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 4.º do Código de Processo Penal e artigo 41.º do Regulamento Geral das Contra-Ordenações), o recurso de contra-ordenação não deveria ter sido julgado deserto sem que a Secretaria do Tribunal a quo notificasse o impugnante a fim de, em dez dias, proceder ao pagamento omitido acrescido da multa legalmente devida.». Assim, ao abrigo do n.º 1 do artigo 642.º do CPC, face à omissão de pagamento da taxa de justiça devida pelo recurso, o interessado deve ser notificado para efetuar o pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC, nem superior a 5 UC. Significa isto, que no caso em apreço, a Recorrente deveria ter sido notificado para pagar a taxa de justiça omitida, acrescida de multa de igual montante. Situação que, ocorreu, conforme resulta da materialidade relevante supra elencada – cf. pontos C., D., G., H. e I. do probatório. Temos, pois, que a Recorrente – então Arguida – foi instada pelo Tribunal a pagar a taxa de justiça, num primeiro momento, tendo-lhe, aí, sido concedido o prazo para proceder ao referido pagamento, no montante de 1 UC, tudo conforme se preceitua no artigo 8.º, n.ºs 7 e 8, do RCP; depois, como o pagamento não ocorreu, foi notificado para realizar o pagamento omitido, desta vez acrescido de multa de igual montante, sob pena da cominação prevista no n.º 2 do art.º 642.º do CPC. Em tal normativo estabelece-se que «Quando, no termo do prazo de 10 dias referido no número anterior, não tiver sido comprovado o pagamento da taxa de justiça devida e da multa ou da concessão do benefício do apoio judiciário, o tribunal determina o desentranhamento da alegação, do requerimento ou da resposta apresentado pela parte em falta». E, na verdade, o que deflui da factualidade assente nos presentes autos é que a taxa de justiça devida pela Recorrente em razão da apresentação do recurso judicial da decisão de aplicação da coima proferida no processo de contraordenação n.º 14732020060000002323 não se encontra paga – cf. pontos E. e J. da factualidade assente. Diga-se, ainda, que a cota a que a Recorrente alude, que consta a fls. 216, tendo efetivamente a indicação «Estado Paga na totalidade», contém também a indicação que se refere ao «Processo 1726/20.8BELRS», e não aos presentes autos (processo n.º 1720/20.9BELRS). Nesta conformidade, face aos factos e ao direito aplicável, a solução a que chegou o Tribunal a quo mostra-se acertada. Em face do exposto, o recurso não merece provimento, devendo o despacho recorrido ser mantido, o que de seguida se decidirá. * IV - DECISÃO Termos em que acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 20 de fevereiro de 2025 (Filipe Carvalho das Neves) (Luísa Soares) (Susana Barreto) |