Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1136/07.2BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:06/19/2024
Relator:ÂNGELA CERDEIRA
Descritores:DIVIDENDOS
RETENÇÃO NA FONTE
SUJEITOS PASSIVOS NÃO RESIDENTES
DIREITO COMUNITÁRIO
LIVRE CIRCULAÇÃO DE CAPITAIS
Sumário:I - O artigo 5.º, n.º 4 da Directiva 90/435/CEE, de 23/07/1990, do Conselho, deve ser interpretado, conforme a expressa jurisprudência do TJCE, no sentido de que o limite nela estabelecido quanto ao montante da retenção na fonte do imposto respectivo, não visa unicamente o IRC mas qualquer imposição, seja qual for a sua natureza ou denominação, sob aquela forma de retenção, relativamente aos dividendos aí em causa (incluindo o designado “imposto sobre as sucessões e doações por avença”).
II - As normas constantes dos artigos 1º a 5º da Diretiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990 têm efeito direto vertical em Portugal, impondo-se e prevalecendo sobre o direito interno.
III - A exceção à solução comunitária de eliminação da retenção na fonte permitida a Portugal, traduzida na manutenção (provisória) de retenção, não pode ser alargada por via da aceitação de taxas superiores às previstas na Diretiva 90/435/CEE, mesmo que constantes de uma Convenção de Dupla Tributação celebrada por Portugal.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, doravante Recorrente, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 25.05.2021, que julgou procedente a Impugnação Judicial e, em consequência, determinou a anulação da liquidação de “imposto sobre as sucessões e doações por avença” sobre lucros distribuídos em 1997 à sociedade italiana “C....... S.P.A.”.

Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes

CONCLUSÕES:

«A) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial à margem identificada, deduzida pelo BANCO DE I......., S.A., NIPC …………47, na sequência do despacho de indeferimento do recurso hierárquico, interposto da decisão que negou provimento à reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de Imposto Sobre as Sucessões e Doações (ISSD) por avença, sobre lucros distribuídos, em 1997, à sociedade italiana “C....... S.P.A.”.

B) Na apreciação do mérito da impugnação judicial, o Tribunal a quo pronunciou-se no sentido da ilegalidade da liquidação de ISSD por avença, impugnada nos autos, por violação do disposto no art.º 5º, nº 4 da Diretiva nº 90/435/CEE, do Conselho, de 23/07/1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados Membros diferentes.

C) Naquele pressuposto, concluiu o Tribunal a quo que “… assiste razão à Impugnante quanto à ilegalidade da retenção na fonte do ISSD por avença, o que é determinante para a procedência parcial da impugnação, na medida em que como resulta dos autos, o ISSD retido à sociedade italiana cifra-se em 472.751,17€, e não em 472.987,55€, conforme peticionado pela Impugnante. (…)”

D) Dissente a Fazenda Pública do assim decidido, por ser seu entendimento, que o ato tributário impugnado não padece do vício de violação de lei que lhe vem apontado pela douta sentença recorrida.

E) Com efeito, ao tempo e conforme as disposições legais aplicáveis, dos art.ºs. 182.º e 184.º do CIMSISSD, estavam sujeitas a imposto sucessório, pago por avença, mediante retenção na fonte, a uma taxa de 5%, as distribuições de dividendos e outros rendimentos efetuados por sociedades anónimas com sede ou direção efetiva em Portugal.

F) Aquela dedução de 5% que incide sobre os rendimentos das ações, não é um imposto sobre o rendimento, nem tão pouco um imposto sobre o capital. Configura-se como um imposto sobre as transmissões a título gratuito, sendo que, o facto de ser calculado com base no rendimento não altera a sua natureza de um verdadeiro imposto sobre as sucessões e doações.

G) Ora, a Directiva n.º 90/435/CEE, do Conselho, de 23/07/90, visou isentar de tributação, tanto à entrada como à saída, os dividendos auferidos e distribuídos por sociedades afiliadas residentes na União Europeia, verificados os demais requisitos - participação de, pelo menos, 25% do respetivo capital social, tributação de ambas as sociedades em imposto sobre o rendimento, forma societária prevista na Directiva.

H) Aquela Directiva foi transposta para a ordem jurídica interna por via legislativa, pelo Decreto-Lei n.º 123/92, de 02/07/92, que deu nova redação ao art.º 69° do CIRC.

I) Com a transposição da Directiva permaneceram, porém, inalterados os factos tributários consignados no disposto nos art.ºs. 182° e 184° do CIMSISSD, que determinam o pagamento por avença, mediante a dedução a título de imposto, à taxa de 5%, nos rendimentos das ações de sociedades com sede em território português.

J) Ao permanecerem inalterados os artigos citados do CIMSISSD, o legislador entendeu, a nosso ver, que o imposto sobre as sucessões e doações não se enquadrava no âmbito da Directiva.

K) Não decorrendo da lei qualquer derrogação ao art.º 182° do CIMSISSD, que prevê o pagamento por avença, mediante a dedução de 5% no rendimento dos títulos, em sede de Imposto Sucessório, devido pelas transmissões a título gratuito, a douta sentença recorrida ao decidir da forma que o fez, fez uma errada interpretação das sobreditas normas legais, impondo-se a sua revogação.

L) Por outro lado, a Directiva 90/435/CEE, do Conselho, refere no seu artigo 5º que, sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes, celebradas entre Portugal e um Estado-membro, a taxa de retenção na fonte não pode exceder 10%, disposição esta transposta para a ordem jurídica portuguesa pelo Decreto-lei nº 123/92, de 2 de julho e que dá corpo à alínea c) do nº 2 do art.º 69º do CIRC.

M) Convém referir que a Convenção estabelecida entre Portugal e a Itália para evitar a Dupla Tributação (Decreto-lei nº 10/82, de 01/06/82), refere no seu art.º 10º que os dividendos atribuídos por uma sociedade residente em Portugal a um residente da Itália poderão ser tributados em Portugal, mas que o imposto daí decorrente não poderá exceder 15% do montante bruto desses dividendos.

N) Ora, no caso em apreço esse montante não foi ultrapassado.

O) Acresce que, estabelece a Convenção no seu Capítulo I – Âmbito da aplicação da Convenção – mais especificamente no art.º 2, que os impostos abrangidos por esta são os impostos sobre o rendimento, definindo no nº 2 o que se entende como tal, sendo que, no nº 3 são descritos os impostos aos quais se aplica a convenção, não estando aí mencionado o imposto sobre sucessões e doações.

P) Por outro lado, o art.º 182º alínea c) do Código do IMSISD estabelece que será pago por avença, mediante dedução no rendimento dos títulos, o imposto pela transmissão, a título gratuito, das ações de sociedades com sede em território português.

Q) Ora, este imposto, embora pago mediante dedução no rendimento dos títulos, não é um imposto sobre o rendimento nem tão pouco sobre o capital. O imposto em causa, bem como o da SISA, pela natureza comum de impostos sobre as transmissões, incide sobre o património e não sobre os rendimentos, sendo por conseguinte, a sua matéria coletável, um património transmitido.

R) Assim sendo, resultando do disposto nos n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 2.º da CDT que, a limitação das retenções, à taxa máxima de 15%, prevista no respetivo artigo 10.º, se aplica a todos os tributos que tenham natureza de impostos sobre o rendimento, e não assumindo o imposto sobre as sucessões e doações por avença a natureza de imposto sobre o rendimento, impõe-se concluir que, a tributação no caso dos autos não foi excedida, e por conseguinte, a sentença recorrida ao decidir em sentido contrário merece censura. Sem conceder,

S) Em termos de compatibilização do artigo 5º, nº 4 da Directiva (que fixa a taxa máxima em 10%), com a taxa de 15% prevista no nº 2 do artigo 10º da CDT, celebrada entre Portugal e a Itália, entende a AT que a expressão “Sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes” significa que sendo prevista na CDT uma taxa superior à da Directiva, será aquela a prevalecer, porquanto existe uma abertura na própria Directiva de delimitar os seus efeitos às convenções bilaterais celebradas pelos Estados-Membros.

T) O facto daquele parágrafo enunciar uma exceção para as convenções reconhece a sua existência e a possibilidade de estabelecerem uma taxa superior, à taxa máxima vinculada pela própria Diretiva, é este o sentido da expressão “sem prejuízo”. Caso assim não se entendesse não faria sentido aquela exceção no segundo parágrafo do nº 4 do art.º 5º daquele Diploma.

U) Assim, a derrogação ao art.º 1º, plasmada no nº 4 do art.º 5º da Diretiva, não pretende uniformizar as taxas clausuladas nas convenções com as taxas da Diretiva, significa, antes que, sendo prevista na CDT uma taxa superior à da Directiva, será aquela a prevalecer, porquanto existe uma abertura na própria Directiva de delimitar os seus efeitos às convenções bilaterais celebradas pelos Estados-Membros.

V) Existindo esta abertura na própria Diretiva de delimitar os seus efeitos às convenções bilaterais encetadas pelos Estados, a taxa a aplicar aos dividendos distribuídos no ano de 1997, em crise nos autos, será de 15%, ou seja, a taxa clausulada na Convenção entre Portugal e Itália.

W) Assim sendo, tendo sido essa taxa de 15% a efetivamente aplicada no caso dos autos, nenhuma ilegalidade, máxime do disposto no nº 4 do artigo 5º da Directiva nº 90/435/CEE, do Conselho, se vislumbra na retenção na fonte de IRC à taxa de 10% sobre os dividendos distribuídos pela Impugnante à sociedade italiana, bem como na retenção na fonte de 5% a título de ISSD por avença, em crise nos autos.

X) Nestes termos deve a douta sentença recorrida ser revogada, e substituída por Acórdão que mantenha incólume no ordenamento jurídico tributário, por legal, o ato tributário impugnado e, consequentemente, julgue improcedente a impugnação com as legais consequências.

Y) A procedência do presente recurso, com a consequente, improcedência total da impugnação judicial, implicará, também, a reforma da sentença recorrida em matéria de custas processuais.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., e em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, e substituída por outra que determine a improcedência total da presente impugnação judicial.

Requer-se, ainda, a V.Exas., a dispensa da Fazenda Pública do pagamento da taxa de justiça correspondente ao valor que extravasa o montante de € 275.000,00, no caso de este Tribunal vir a entender que, no caso em apreço, se verificam os pressupostos suscetíveis de fundamentar a aplicação da faculdade prevista na norma do art.º 7º, nº 6 do RCP.

O Recorrido apresentou contra-alegações, concluindo pela manutenção do julgado.


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O DIGNO MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO (DMMP) neste TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Atendendo às conclusões das alegações da Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – a questão a apreciar e decidir é a de saber se a decisão recorrida consubstancia errada interpretação e aplicação do artigo 5º, nº 4 da Diretiva nº 90/435/CEE, de 23.07.1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados-Membros diferentes.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

«A) A Impugnante é uma instituição de crédito constituída sob a forma de sociedade anónima em cujo capital participava, em 1997, a sociedade de direito italiano C....... S.p.A. (cfr. factos dados como provados nas decisões de reclamação graciosa e de recurso hierárquico, conforme fls. 139 do PAT e fls. 84 dos autos).

B) A percentagem de participação daquela sociedade no capital do Impugnante ascendia então a 50,025% do capital e era detida consecutivamente há mais de dois anos (cfr. factos dados como provados nas decisões de reclamação graciosa e de recurso hierárquico, conforme fls. 139 do PAT e fls. 84 dos autos).

C) Em 31.10.1997 foi assinada a Ata nº 11 da Assembleia Geral da Impugnante, na qual foi deliberada a distribuição aos acionistas de reservas livres no montante de 3.789.186.000$00 e de resultados transitados no montante de 1.938.000$00 (cfr. fls. 38 a 40 dos autos).

D) Sobre um montante de lucros de 1.895.562.000$00 distribuídos à sociedade C....... S.p.A. foi retido e entregue ao Estado, a título de IRC, o montante de 189.556.200$00 (cfr. fls. 267 a 271 do processo de reclamação graciosa apenso ao PAT).

E) A Impugnante procedeu igualmente à retenção de Imposto sobre as Sucessões e Doações por avença, relativamente aos lucros distribuídos à sociedade C....... S.p.A., tendo sido retido e entregue ao Estado, a título deste imposto, o montante de 94.778.100$00 (472.751,17€) (cfr. fls. 42 dos autos);

F) A Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação de ISSD referida na alínea antecedente, em 11.02.1998, a qual foi instaurada no SF de Lisboa 3 com o nº 3085-98/400066.8 (cfr. fls. 1 e 3 do processo de reclamação graciosa apenso ao PAT).

G) Por despacho do Diretor de Finanças de Lisboa, proferido em 08.05.2000, foi a reclamação graciosa indeferida, com fundamento em que o ISSD por avença se trata de um imposto sobre o património e não sobre os rendimentos, sendo ainda na referida decisão dado como provados, de entre outros, os seguintes factos:

“(…)

3 – Quanto aos Factos:

a) – A reclamante procedeu à retenção na fonte à taxa de 10% (alínea c) do nº 2 do artigo 69º do CIRC) dos dividendos colocados à disposição da acionista C....... S.p.A., empresa esta com sede na Itália de acordo com o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 75º do CIRC.

b) – A taxa de 10% aplica-se pelo facto da acionista se encontrar nas condições exigidas no artº 2º da Directiva nº 90/435/CEE, de 23 de Julho de 1990 e na alínea c) do artigo 69º do CIRC.

c) (…)

d) – Desse mesmo dividendo reteve também na fonte, nos termos da alínea c) do artº 182º do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, o valor de 94 778 100$00, pela aplicação sobre os mesmos da taxa de 5% conforme dispõe o artº 184º do referido código. Este valor foi entregue ao Estado através de guia processada para o efeito, em 05/02/98.

e) – No conjunto das duas retenções efectuadas verifica-se que a quantia entregue perfaz 15% dos dividendos colocados à disposição da acionista. (…)” (cfr. fls. 135 a 146 do processo de reclamação graciosa apenso ao PAT).

H) Notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, a Impugnante interpôs recurso hierárquico em 09.06.2000, instaurado pela Direção de Finanças de Lisboa sob o nº 48/00-GO (cfr. fls. 1 e ss. do processo de recurso hierárquico apenso aos autos).

I) Em 20.10.2003 foi proferido despacho de concordância e para informação à DSIRC, pelo Diretor de Serviços da Direção de Serviços de Prevenção e Inspeção Tributária, com a informação elaborada por esta Direção, da qual consta de entre o mais, o seguinte:

“(…)

2 – APRECIAÇÃO DO RECURSO

O presente recurso hierárquico é legal, artº 54º da LGT e tempestivo, artº 66 do CPPT e artº 80º da LGT.

2.1) Os Factos

a) (…)

b) O B.I.I mantém como seu acionista a C....... S.p.A., instituição financeira de direito italiano, com sede em território italiano, com a participação social que ascende a 50%, o qual se encontra, igualmente sujeito ao imposto sobre o rendimento em Itália; (…)

4. – CONCLUSÃO

(…)

No entanto, atendendo às disposições já assumidas para esta matéria, pelos T.C.A. e TJUE (ponto V – 2 – 2.2 -7, do recurso em apreciação), parece ser de conceder provimento ao recurso e, por consequência em anular a liquidação de imposto sobre sucessões e doações” (cfr. fls. 222 a 236 do processo de reclamação graciosa apenso ao PAT, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

J) Em 16.05.2006 foi elaborada a informação por técnica da DSIMT, sobre o recurso hierárquico apresentado pela Impugnante, a qual tinha o seguinte teor:

“RESENHA:

- Em 1997 a reclamante colocou à disposição da C......., S.p.A. (sua accionista que detém uma participação de 50% do capital social, com sede em território Italiano) dividendos no montante de €9 455 023,39 relativos ao exercício de 1996.

Sobre estes dividendos foi pago por avença, imposto sobre as Sucessões e Doações da importância de €472 751,17, nos termos do art° 182°, al. c) e art° 184° ambos do CIMSISD.

A requerente deduziu reclamação graciosa contra a liquidação do imposto sobre as sucessões e doações por avença, alegando para o efeito que: (...)

PARECER:

O pedido é legal e tempestivo a recorrente tem legitimidade para o acto.

- POSIÇÃO DOS SERVICOS DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA Relativamente ao presente recurso o mesmo foi analisado por vários serviços pelo que apenas se retratará as conclusões mais pertinentes, remetendo-se, no entanto, para a leitura dos vários pareceres inclusos nos autos:

I – 1ª Direcção de Finanças de Lisboa (Divisão de Planeamento e Coordenação) por despacho do Director de Finanças de 06/06/2001 foi no sentido da manutenção do acto recorrido negando-se provimento ao mesmo, com base na informação e dos pareceres destacando-se o: Parecer emitido pela inspectora tributária principal:

(...) Segundo a recorrente o limite fixado no art.° 5.°da Directiva 90/435/CEE, abrange a totalidade dos impostos cobrados por aplicação directa independentemente de ser transposta para a legislação nacional (efeito directo vertical). No entanto o art.º 2º. Da citada Directiva define expressamente como seu âmbito de aplicação os impostos sobre o rendimento, tendo-se traduzido na transposição para a ordem jurídica interna, através do DL 123/92, de 02/07, em alteração ao código do IRC, art° 69° n° 2, alínea c), nada tendo sido regulamentado quanto ao imposto sucessório por avença que a recorrente defende ser um imposto sobre os lucros apesar de tal não decorrer designadamente do art0 . 182°. do CIMSISD e do ponto 9 do preâmbulo do referido código.

— Parecer do Supervisor Tributário:

(...), determina o §2° do n° 4 do artº 5º da Directiva que “Sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes celebradas entre Portugal e um Estado Membro, a taxa dessa retenção não pode exceder (nosso sublinhado)... ”

Constata-se assim que, ao invés de definir uma taxa, a Directiva determinou uma taxa máxima a aplicar às situações que lhe coubessem, podendo, Portugal, no período em que vigorar a derrogação ao princípio da isenção aplicar qualquer taxa entre 0 - 10%. Assim sendo, não faz sentido considerar, como pretende o contribuinte, que a ressalva às convenções bilaterais tenha por objectivo permitir a Portugal aplicar uma taxa inferior a 10%, pois tal hipótese advêm da própria norma. Somos assim de opinião, que a ressalva às convenções bilaterais tem por objectivo permitir a Portugal, durante este período pré-determinado, manter as taxas previstas nos Acordos firmados com outros países comunitários, logo aplicar taxas superiores a 10%.

II - Pela Direcção de Serviços Prevenção e Inspecção Tributária, foi emitido parecer no sentido de se deferir o pedido com base na informação prestada pela Inspectora Tributária:

(...)

“CONCLUSÃO:

Este imposto, embora pago mediante dedução no rendimento dos títulos, não é um imposto sobre o rendimento, mas sim um imposto sobre o património, uma vez que o seu objecto é a tributação das transmissões, (...), conforme art 182° do respectivo código, o facto de ser deduzido ao rendimento nada altera a espécie do tributo em causa.

Muito embora, a finalidade do Imposto sobre as Sucessões e Doações cobrado por avença, pelo sistema de retenção na fonte, seja efectivamente substituir o imposto do regime geral, o facto é que sob o ponto de vista da técnica fiscal se assemelha muito a um imposto sobre o rendimento, até porque só há imposto se houver rendimento. Dai quem o identifique como tal, mesmo a nível internacional.

No entanto, atendendo às disposições já assumidas para esta matéria, pelos T.C.A. e TJCE (ponto V -2 - 2.2 - 7, do recurso em apreciação), parece ser de conceder provimento ao recurso e, por consequência em anular a liquidação de imposto sobre sucessões e doações.”

Foram emitidos os pareceres pelo Coordenador de Equipa como pela Coordenadora-Chefe foram no sentido do deferimento do pedido. Por despacho do Director de Serviços daquela Direcção de Serviços foi proferido em 20/10/2003 despacho concordante com a informação e pareceres.

Análise do RECURSO HIERÁRQUICO:

Pretende a recorrente que a taxa máxima de retenção a aplicar aos dividendos distribuídos em 1997 seja de 10% de acordo com o n° 4 do art° 5º da Directiva 90/435/CEE, em detrimento da taxa aplicada de 15% (que engloba 10% de IRC e 5% de Imposto sobre as sucessões e doações por Avença) e consequentemente a devolução do imposto pago em excesso.

Equaciona-se a seguinte matéria já amplamente enunciada nos autos;

I - A derrogação prevista no nº 4 do artº 5o da Directiva 90/435/CEE - "Em derrogação do disposto no nº 1, a República Portuguesa pode cobrar ama menção na fonte sobre os lucros distribuídos pelas suas sociedades afiliadas a sociedades-mães de outros Estadosmembros até uma data que não poderá ser posterior ao fim do oitavo ano seguinte à data de entrada em aplicação da presente directiva.

Sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes, celebradas entre Portugal e um Estado-membro, a taxa dessa retenção não pode exceder 15% durante os cinco primeiros anos do período referido no parágrafo anterior e 10% durante os três últimos anos." –

engloba no seu conjunto o IRC e o ISD por Avença, ou seja a retenção dos dois impostos não pode ser superior a 10%. É esta a solução apontada pelos acórdãos do Tribunal judicial das Comunidades Europeias e o Tribunal Central Administrativo.

Leia-se o Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, de 8 de Junho de 2000, que declarou:

“O art° 5º , n° 4 da Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados-Membr os diferentes, ao limitar a 15% e a 10% o montante da retenção na fonte do imposto sobre os lucros distribuído pelas filiais estabelecidas em Portugal às suas sociedades-mãe de outros Estados-Membros, deve ser interpretado no sentido de que essa derrogação não visa só o IRC, mas se aplica a qualquer imposição, qualquer que seja a sua natureza ou denominação sob a forma de retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos por essas filiais.

Foi acolhida esta mesma solução no Acórdão do Tribunal Central Administrativo de 20 de Março de 2001.

II -Sublinha-se, no entanto, que a questão fundamental prende-se com o facto de existir uma convenção entre Portugal e Itália que fixa em 15% a taxa de retenção de imposto.

O que importa solucionar é saber qual das taxas vigora quando defrontados, por um lado, com a taxa da Directiva de 10% e por outro com a taxa da convenção de 15%.

Existindo por um lado uma Directiva que impõe um limite máximo de 10% de retenção para os impostos incidentes nos lucros distribuídos e por outro lado um a Convenção celebrada entre Portugal e Itália que estabelece uma taxa a aplicar de 15% para esses mesmos lucros, qual destas taxas prevalecerá no contexto descrito.

No seguimento da derrogação prevista no segundo parágrafo do nº 4 do artº 5o da Directiva que estabelece “Sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes, celebradas entre Portugal e um Estado-membro, a taxa dessa retenção não pode exceder 15% durante os cinco primeiros anos do período referido no parágrafo anterior e 10% durante os três últimos anos.

Ora, a retenção a que alude este parágrafo não se refere à taxa acordada nas convenções, mas à retenção expressa no primeiro parágrafo que refere “(...) a República Portuguesa pode cobrar uma retenção na fonte sobre os seus lucros distribuídos (…).

O facto do segundo parágrafo enunciar uma excepção para as convenções, reconhece a sua existência e a possibilidade de estabelecerem uma taxa superior, à taxa máxima vinculada pela própria Directiva, é este o sentido da expressão “sem prejuízo”.

Se assim não se entendesse não faria sentido aquela excepção no segundo parágrafo do n° 4 do artº 5º daquele Diploma.

Assim, a derrogação ao artº 1º plasmada no nº 4 do artº 5º da Directiva não pretende uniformizar as taxas clausuladas nas convenções com as taxas da Directiva.

Em suma: Existindo esta abertura na própria Directiva de delimitar os seus efeitos às convenções bilaterais encetadas pelos Estados, a taxa a aplicar aos dividendos distribuídos no ano 1997 será de 15% ou seja a taxa clausulada na Convenção entre Portugal e Itália,

Nestes termos, proponho a improcedência do presente recurso com a consequente manutenção do acto recorrido.” (cfr. fls. 83 a 95 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

K) A Impugnante foi notificada da decisão mencionada na alínea antecedente em 31.01.2007 (cfr. fls. finais do recurso hierárquico constante do PAT).

I) A presente impugnação judicial foi apresentada em 26.04.2007 (cfr. fls. 3 dos autos).


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Factos Não Provados

1 – Não foi provado que a Impugnante tenha sido notificada para o exercício do direito de audição prévia antes da decisão do recurso hierárquico.


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Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.

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Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos e no processo administrativo, bem como na posição expressa pelas partes nos seus articulados.

O facto não provado resulta de nenhuma prova existir nos autos e no PA relativamente ao mesmo.»

IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO

A sentença recorrida julgou procedente a impugnação por considerar que tendo sido efetuada pela ATA retenção na fonte de IRC à taxa de 10% sobre os dividendos distribuídos pela Impugnante/Recorrida à sociedade italiana “C....... S.P.A.”, bem como a retenção na fonte de 5% a título de “imposto sobre as sucessões e doações por avença”, foi violado o disposto no nº 4 do artigo 5º da Directiva nº 90/435/CEE, do Conselho, uma vez que a retenção máxima que podia ser efetuada em 1997 seria de 10%.

A Fazenda Pública discorda do entendimento do tribunal a quo, pelas seguintes razões de direito:

- Com a transposição da Directiva permaneceram inalterados os factos tributários consignados no disposto nos art.ºs. 182° e 184° do CIMSISSD, que determinam o pagamento por avença, mediante a dedução a título de imposto, à taxa de 5%, nos rendimentos das ações de sociedades com sede em território português, o que significa que o legislador entendeu que o imposto sobre as sucessões e doações não se enquadrava no âmbito da Directiva;

Sem conceder,

- Sendo prevista na Convenção estabelecida entre Portugal e a Itália para evitar a Dupla Tributação (Decreto-lei nº 10/82, de 01/06/82) uma taxa superior à da Directiva, será aquela a prevalecer, porquanto existe uma abertura na própria Directiva de delimitar os seus efeitos às convenções bilaterais celebradas pelos Estados-Membros.

Vejamos se alguma das razões invocadas no presente recurso merece acolhimento.

Previa a Directiva nº 90/435/CEE, do Conselho, de 23.07.1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados- membros diferentes(1):


Artigo 1º

1. Os Estados-membros aplicarão a presente directiva:

- à distribuição dos lucros obtidos por sociedades desse Estado e provenientes das suas afiliadas de outros Estados-membros,

- à distribuição dos lucros efectuada por sociedades desse Estado a sociedades de outros Estados-membros, de que aquelas sejam afiliadas.

2. A presente directiva não impede a aplicação das disposições nacionais ou convencionais necessárias para evitar fraudes e abusos.


Artigo 2º

Para efeitos de aplicação da presente directiva, a expressão «sociedade de um Estado-membro» designa qualquer sociedade:

a) Que revista uma das formas enumeradas no anexo;

b) Que, de acordo com a legislação fiscal de um Estado-membro, seja considerada como tendo nele o seu domicílio fiscal e que, nos termos de uma convenção em matéria de dupla tributação celebrada com um Estado terceiro, não seja considerada como tendo domicílio fora da Comunidade;

c) Que, além disso, esteja sujeita, sem possibilidade de opção e sem deles se encontrar isenta, a um dos seguintes impostos:

- impôt des sociétés/vennootschapsbelasting, na Bélgica,

- selskabsskat, na Dinamarca,

- Koerperschaftsteuer, na Alemanha,

- foros eisodimatos nomikon prosopon kerdoskopikoy charaktira na Grécia,

- impuesto sobre sociedades, em Espanha,

- impôt sur les sociétés, em França,

- corporation tax, na Irlanda,

- imposta sul reddito delle persone giuridiche, em Itália,

- impôt sur le revenu des collectivités, no Luxemburgo,

- vennootschapsbelasting, nos Países Baixos,

- imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, em Portugal,

- corporation tax, no Reino Unido,

ou a qualquer outro imposto que possa vir a substituir um destes impostos.


Artigo 3º

1. Para efeitos de aplicação da presente directiva:

a) É reconhecida a qualidade de sociedade-mãe, pelo menos, a qualquer sociedade de um Estado-membro que satisfaça as condições enunciadas no artigo 2° e que detenha no capital de uma sociedade de outro Estado-membro, que preencha as mesmas condições, uma participação mínima de 25%;

b) Deve entender-se por «sociedade afiliada» a sociedade em cujo capital é detida a participação referida na alínea a).

2. Em derrogação do disposto no nº 1, os Estados-membros têm a faculdade:

- de, por via de acordo bilateral, substituir o critério de participação no capital pelo de detenção de direitos de voto,

- de não aplicar a presente directiva às suas sociedades que não conservem, por um período ininterrupto de pelo menos dois anos, uma participação que dê direito à qualidade de sociedade-mãe, ou às sociedades em que uma sociedade de outro Estado-membro não conserve essa participação durante um período ininterrupto de pelo menos dois anos.


Artigo 4º

(…)

Artigo 5º


1. Os lucros distribuídos por uma sociedade afiliada à sua sociedade-mãe são, pelo menos quando esta detém uma participação mínima de 25 % no capital da afiliada, isentos de retenção na fonte.

2. (…).

3. (…)

4. Em derrogação do disposto no nº. 1, a República Portuguesa pode cobrar uma retenção na fonte sobre os lucros distribuídos pelas suas sociedades afiliadas a sociedades-mães de outros Estados-membros até uma data que não poderá ser posterior ao fim do oitavo ano seguinte à data de entrada em aplicação da presente directiva.

Sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes, celebradas entre Portugal e um Estado-membro, a taxa dessa retenção não pode exceder 15 % durante os cinco primeiros anos do período referido no parágrafo anterior e 10 % durante os três últimos anos.

Antes do fim do oitavo ano, o Conselho decidirá por unanimidade, sob proposta da Comissão, sobre a eventual prorrogação das disposições do presente número.

(…).


Artigo 8º

1. Os Estados-membros porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para se conformarem à presente directiva o mais tardar até

1 de Janeiro de 1992. Desse facto informarão imediatamente a Comissão.


(…)”.

Relativamente à questão de saber se a Directiva abrange o imposto em causa nos autos – “imposto sobre as sucessões e doações por avença” – o TJUE já se pronunciou no sentido afirmativo no processo «Epson Europe BV», através de reenvio prejudicial - art. 234.º do Tratado CE - Ac. de 08/06/2000 - cfr., ainda, o Ac. do mesmo tribunal de 23/09/1998.

Entendeu aquele Tribunal que o «artigo 5.º, n.º 4 da Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mãe e afiliadas de Estados-membros diferentes, ao limitar a 15% e a 10% o montante de retenção na fonte do imposto sobre os lucros distribuídos pelas filiais estabelecidas em Portugal às suas sociedades-mãe de outros Estados-membros, deve ser interpretado no sentido de que essa derrogação não visa só o IRC mas se aplica a qualquer imposição, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sob a forma de retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos por essas filiais» [sublinhado nosso].

Pese embora a directiva em causa apenas tivesse levado à alteração dos artigos 45.º e 69.º do CIRC - DL n.º 123/92, de 02 de Julho - mantendo-se intocados os referidos normativos do CIMSISSD – tais disposições não podem conduzir a um resultado que seja contrário ao regime da directiva, dado o efeito directo da mesma – cfr., neste sentido, o acórdão do STA de 15.02.2006, proferido no processo nº 0916/05, disponível em www.dgsi.pt.

Com efeito, segundo a Jurisprudência do Tribunal de Justiça o efeito direto vertical de uma Diretiva, ou seja, o que é feito valer pelos particulares perante os poderes públicos (o tribunal e o Estado português) existirá posto que se encontrem cumpridos cumulativamente determinados pressupostos, a saber: que não tenha sido efetuada a sua transposição para a legislação nacional ou que a mesma tenha sido objeto de transposição incorreta; que as disposições da Diretiva sejam incondicionais e suficientemente claras e precisas; que as disposições da Diretiva confiram direitos a particulares; que esteja esgotado o prazo de transposição – cfr. Acórdãos de 4 de dezembro de 1974, Van Duyn (41/74, EU:C:1974:133), e de 5 de abril de 1979, Ratti (148/78, EU:C:1979:110).

Encontrando-se verificados, in casu, todos os requisitos dos quais depende a atribuição de efeito direto vertical às Diretivas e considerando o primado do Direito da União constitucionalmente reconhecido pelo artigo 8º, nº 4 da CRP, é de concluir que as normas constantes dos artigos 1º a 5º da Diretiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990 têm efeito direto vertical em Portugal, impondo-se e prevalecendo sobre o direito interno.

Nestas condições, o primeiro fundamento do presente recurso deve ser julgado improcedente.

Sustenta, ainda, a Recorrente que estando prevista na Convenção estabelecida entre Portugal e a Itália para evitar a Dupla Tributação (Decreto-lei nº 10/82, de 01/06/82) uma taxa superior à da Directiva, será aquela a prevalecer, porquanto existe uma abertura na própria Directiva de delimitar os seus efeitos às convenções bilaterais celebradas pelos Estados-Membros.

Vejamos.

O artigo 10º da referida Convenção, aprovada para ratificação pela Lei n.º 10/82, de 1 de junho, dispunha o seguinte:


“ARTIGO 10º

Dividendos


1 - Os dividendos pagos por uma sociedade residente de um Estado contratante a um residente do outro Estado contratante podem ser tributados nesse outro Estado.

2 - Esses dividendos podem, no entanto, ser igualmente tributados no Estado contratante de que é residente a sociedade que paga os dividendos e de acordo com a legislação desse Estado, mas, se a pessoa que recebe os dividendos for o seu beneficiário efectivo, o imposto assim estabelecido não excederá 15% do montante bruto desses dividendos.

As autoridades competentes dos Estados contratantes estabelecerão, de comum acordo, a forma de aplicar este limite.”

Relativamente aos impostos abrangidos pela convenção, previa o artigo 2º o seguinte:


“ARTIGO 2.º

Impostos visados


1 - Esta Convenção aplica-se aos impostos sobre o rendimento, exigidos por cada um dos Estados contratantes, suas subdivisões políticas ou administrativas e suas autarquias locais, seja qual for o sistema usado para a sua percepção.

2 - São considerados impostos sobre o rendimento os impostos incidentes sobre o rendimento total ou sobre parcelas do rendimento, incluídos os impostos sobre os ganhos derivados da alienação de bens mobiliários ou imobiliários, bem como os impostos sobre as maisvalias.

3 - Os impostos actuais a que a Convenção se aplica são, nomeadamente:

a) Relativamente a Portugal:

1) A contribuição predial;

2) O imposto sobre a indústria agrícola;

3) A contribuição industrial;

4) O imposto de capitais;

5) O imposto profissional;

6) O imposto complementar;

7) O imposto de mais-valias;

8) O imposto sobre o rendimento do petróleo;

9) Os adicionais dos impostos indicados nos n.os 1) a 8);

10) Outros impostos estabelecidos para as autarquias locais cujo quantitativo seja determinado em função dos impostos indicados nos n.os 1) a 8) e os adicionais correspondentes;

(…)”.

Admitindo-se que o “imposto sobre as sucessões e doações por avença” seja abrangido pela Convenção – cfr., neste sentido, Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2014, p. 140 a 142 – coloca-se a questão de saber qual o sentido e alcance da expressão constante no número 4 do artigo 5.º da Diretiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de julho, “Sem prejuízo das disposições das convenções bilaterais existentes, celebradas entre Portugal e um Estado-membro”.

Ora, entende este Tribunal, em consonância com a posição do Recorrido, que a referida expressão teve em vista assegurar (aos sujeitos passivos) que a taxa máxima prevista naquele preceito legal seria sempre aplicável na distribuição de dividendos exceto se uma Convenção bilateral previsse, como taxa máxima aplicável aos dividendos, uma taxa inferior à prevista na Diretiva 90/435/CEE.

Assim, considerando que no caso em análise a taxa prevista na Convenção para Evitar a Dupla Tributação entre Portugal e Itália (15%) é superior à prevista na Diretiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de julho para o ano de 1997 (10%), teria sempre de prevalecer esta última.

É que, como bem nota o Recorrido, o objetivo imediato da Diretiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de julho é a eliminação da retenção na fonte sobre lucros distribuídos a sociedades de outros Estados-membros - o que foi conseguido na generalidade das situações por ela abrangidas -, sendo que a derrogação (provisória, isto é, até ao final de 1999) concedida ao Estado português apenas foi instituída pelas dificuldades orçamentais alegadas pelo mesmo (cfr. último considerando da Directiva).

Tal significa que a exceção à solução comunitária de eliminação da retenção na fonte permitida a Portugal, traduzida na manutenção (provisória) de retenção - mas a taxas reduzidas por comparação com as taxas resultantes da legislação interna -, não pode ser alargada por via da aceitação de taxas superiores às previstas na Diretiva 90/435/CEE, mesmo que constantes de uma Convenção de Dupla Tributação celebrada por Portugal.

E é também este o sentido preconizado por CARLOS LOUREIRO e MANUELA DURO TEIXEIRA, “Harmonização a nível comunitário”, Fisco, n.º 36 (novembro de 1991), página 12: “Assim, poderá ser mantida a tributação dos lucros distribuídos por sociedade afiliada portuguesa a uma sociedade-mãe de outro Estado-membro até 1 de Janeiro de 2000. No entanto, e independentemente das taxas reduzidas que poderão ser aplicáveis por força dos acordos de dupla tributação já celebrados entre Portugal e alguns Estados-membros, as taxas de retenção não poderão ser superiores a 15% de 1 de Janeiro de 1992 até 1 de Janeiro de 1997 e 10% desde esta data até 1 de Janeiro de 2000.” – sublinhado próprio.

E, assim, formulamos as seguintes conclusões/Sumário:

1. O artigo 5.º, n.º 4 da Directiva 90/435/CEE, de 23/07/1990, do Conselho, deve ser interpretado, conforme a expressa jurisprudência do TJCE, no sentido de que o limite nela estabelecido quanto ao montante da retenção na fonte do imposto respectivo, não visa unicamente o IRC mas qualquer imposição, seja qual for a sua natureza ou denominação, sob aquela forma de retenção, relativamente aos dividendos aí em causa (incluindo o designado “imposto sobre as sucessões e doações por avença”).

2. As normas constantes dos artigos 1º a 5º da Diretiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990 têm efeito direto vertical em Portugal, impondo-se e prevalecendo sobre o direito interno.

3. A exceção à solução comunitária de eliminação da retenção na fonte permitida a Portugal, traduzida na manutenção (provisória) de retenção, não pode ser alargada por via da aceitação de taxas superiores às previstas na Diretiva 90/435/CEE, mesmo que constantes de uma Convenção de Dupla Tributação celebrada por Portugal.


*

Do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça:

Cumpre aferir, à luz do disposto no artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), se se encontram preenchidos os pressupostos para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, em face da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processo e comportamento das partes), em articulação com o princípio da proporcionalidade.

No que diz respeito à conduta da Recorrente e do Recorrido, não se verificou nos presentes autos a prática de qualquer conduta processual censurável, tendo as partes pautado o seu comportamento pela lisura e objetividade jurídica, e ocorreu uma tramitação regular.

Por outro lado, ainda que as questões suscitadas no presente processo não fossem de menor complexidade do ponto de vista jurídico, o Tribunal entende, considerando que não foram apresentadas alegações prolixas, que a complexidade do processo não justifica a imposição de qualquer encargo adicional.

Acresce que, atento o trabalho realizado nos presentes autos, o pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos previstos na Tabela I do RCP, violaria o princípio da proporcionalidade.

Em face do exposto, defere-se o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a €275.000,00.

V.Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção do Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, MANTENDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA.

Custas pela Recorrente, com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a €275.000,00.

Registe e notifique.

Lisboa, 19 de junho de 2024


(Ângela Cerdeira)

(Rui Ferreira)

(Vital Lopes)

Assinaturas eletrónicas na 1ª folha


(1)Revogada pela Directiva 2011/96/UE do Conselho, de 30 de Novembro de 2011.