Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2357/13.4BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:11/06/2025
Relator:LUÍS BORGES FREITAS
Descritores:SISTEMA REMUNERATÓRIO DOS MILITARES DA GNR
DL 298/2009
TRANSIÇÃO PARA A NOVA TABELA REMUNERATÓRIA
MILITARES NA SITUAÇÃO DE RESERVA, FORA DA EFETIVIDADE DE SERVIÇO
Sumário:I - Os Autores/Recorridos, à data da produção de efeitos da transição para a nova tabela remuneratória (1.1.2010), já se encontravam na situação de reserva, fora da efetividade de serviço.
II - De acordo com o disposto no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, o direito à mudança de posicionamento remuneratório é conferido apenas aos militares no ativo e na reserva em efetividade de serviço.
III - Feita a transição para a nova tabela remuneratória, com efeitos a 1.1.2010, não haveria que considerar qualquer progressão remuneratória até 1.1.2013, data em que a transição foi plenamente concretizada pelo Despacho n.º 2727/2013, de 12 de fevereiro, dos Ministros de Estado e das Finanças e da Administração Interna
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Administrativa Social
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul:


I

M…, O…, D… e J… intentaram, em 16.9.2013, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, ação administrativa especial contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA pedindo a condenação deste «a reintegrar os Autores nas novas tabelas remuneratórias, nos índices e posições a que cada um tenha direito nos mesmos termos que os militares no ativo na categoria de Sargento-chefe ou Sargento-Ajudante com retroação a 01 de Janeiro de 2010».
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Por sentença de 31.1.2020 o tribunal a quo julgou a ação procedente e condenou a Entidade Demandada «a integrar os AA. nos índices e posições a que cada um tenha direito nos mesmos [termos] dos militares da Guarda Nacional Republicana no ativo providos em postos correspondentes aos seus».
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Inconformada, a Entidade Demandada interpôs recurso daquela decisão, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

1.ª - O Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de Outubro, aprovou o regime remuneratório dos militares da Guarda Nacional Republicana, tendo entrado em vigor no dia 1 de Janeiro de 2010, e, no seu anexo I, foram identificados os níveis remuneratórios e respectivos montantes pecuniários, bem como as correspondentes posições remuneratórias das categorias dos militares, tendo sido revogado o Decreto-Lei n.º 504/99, de 20 de Novembro, bem como o sistema de escalões nele previsto.
2.ª - O artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 298/2009 estabeleceu as regras de transição para a nova tabela remuneratória, dispondo no n.º 1 que, nessa transição, o militar cuja remuneração base fosse inferior à primeira posição remuneratória, prevista no referido anexo I, para o respectivo posto, seria posicionado num nível remuneratório automaticamente criado, de montante pecuniário igual à remuneração base a que o militar tinha direito até 1 de Janeiro de 2010, salvo no caso dos postos de cabo-mor, guarda principal e guarda.
3.ª - O referido regime de transição era também aplicável aos militares na situação de reserva, nos termos do n.º 5 desse artigo 14.º, situação em que se encontravam todos os Recorridos, pois tinham transitado para a reserva durante o ano de 2009, tendo deixado de prestar serviço efectivo.
4.ª - A plena concretização dos reposicionamentos remuneratórios decorrentes da transição para a nova tabela remuneratória apenas se mostrou possível com a prolação do Despacho n.º 2727/2013, de 12 de Fevereiro, dos Ministros de Estado e das Finanças e da Administração Interna, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 36, de 20 de Fevereiro de 2013, face ao disposto no n.º 8 do referido artigo 14.º, pelo que os serviços da GNR puderam então proceder à transição efectiva de todos os militares para as posições e níveis remuneratórios a que tinham direito, nos termos das regras de transição.
5.ª - E, assim, também os Recorridos transitaram então para o novo regime remuneratório, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 14.º, e, consequentemente, os mesmos foram colocados num nível remuneratório automaticamente criado, de montante pecuniário igual à remuneração base a que tinham direito à data de entrada em vigor daquele preceito legal.
6.ª - Sucede que a douta Sentença recorrida não tomou em consideração que a transição dos Recorridos já ocorrera efectivamente, e nos termos referidos e legalmente previstos, tendo condenado a entidade demandada a integrar os Recorridos nos índices e posições a que cada um tenha direito.
7.ª - E confundiu o direito dos Recorrentes à transição para a nova tabela remuneratória – que foi peticionada na presente acção, mas que já tinha sido realizada –, com o direito dos mesmos à actualização do valor da remuneração de reserva, sempre que ocorram actualizações da remuneração base de militares do activo do mesmo posto, previsto no artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 298/2009.
8.ª - Ora, esta actualização do valor da remuneração de reserva não se confunde nem se insere no âmbito da transição para a nova tabela remuneratória, pois visa assegurar que, sempre que ocorram actualizações no valor das remunerações dos militares na situação de activo, as mesmas serão também extensivas aos militares que se encontrem na situação de reserva.
9.ª - Acresce que, por força do disposto nas sucessivas leis que aprovaram o Orçamento do Estado, e como medida de contenção orçamental, desde o ano de 2010 que ocorreu o «congelamento» das tabelas salariais no âmbito de toda a Administração Pública, não se tendo verificado quaisquer actualizações salariais, e, consequentemente, não tinham os Recorridos direito a qualquer actualização prevista no artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 298/2009.
10.ª - Também os Recorridos não poderiam beneficiar do eventual posicionamento remuneratório dos militares na situação de activo que, entretanto, foram promovidos, o denominado «arrastamento», nos termos do n.º 3 do artigo 14.º do mesmo diploma legal, pois encontravam-se na reserva fora da efectividade de serviço e, consequentemente, não se verifica o pressuposto da antiguidade ali exigido, uma vez que não existe qualquer relação de antiguidade entre militares no activo e militares na reserva fora da efectividade de serviço.
11.ª - Acresce que, estando na situação de reserva fora da efectividade de serviço, os Recorridos também não poderiam ser promovidos nem contavam tempo de serviço para efeitos de progressão remuneratória, pelo que não poderia ocorrer qualquer alteração da sua posição remuneratória.
12.ª - Mostra-se, pois, estar correcto o posicionamento remuneratório dos Recorridos, decorrente da sua transição para a nova tabela remuneratória, ao ser-lhes atribuído um nível remuneratório automaticamente criado, de valor igual à remuneração de reserva que vinham auferindo antes da transição (por inexistir correspondência entre esse valor e o valor das posições da tabela), não podendo essa transição ter implicado qualquer acréscimo remuneratório para os mesmos, designadamente por comparação com militares do activo com idêntico posto.
13.ª - Consequentemente, a douta Sentença recorrida padece de erro de julgamento e não fez adequada interpretação e aplicação do disposto no artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, ao condenar a entidade demandada a proceder à transição dos Recorridos para a nova tabela remuneratória e a integrá-los nos índices e posições a que cada um tenha direito em linha com os índices e posições em que se encontram os militares do mesmo posto no activo.
NESTES TERMOS, e nos demais de Direito aplicáveis que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e anulada a douta Sentença recorrida,
Como é de JUSTIÇA !
*

Os Recorridos apresentaram contra-alegações, formulando as seguintes conclusões, que igualmente se transcrevem:

1. Tal como se determina nas Bases Gerais da Condição Militar, os militares da GNR e também das Forças Armadas que se encontram na reserva têm direito a uma remuneração igual à dos militares que se encontram no ativo.
2. A atualização da situação remuneratória dos militares da Guarda Nacional Republicana na reserva é um dever para a Administração logo que se encontrem presentes as respetivas condições de alteração dos militares no ativo que tenham o mesmo posto e posição.
3. A Administração ora recorrente não demonstrou que tenha dado “plena concretização” à transição de nível e de posição remuneratória de que os ora Recorridos são titulares.
4. A Administração, ora Recorrente devia ter praticado um ato que atualizasse as remunerações dos Recorridos em paralelo com os índices e posições onde se encontravam - ao tempo – colocados os militares do mesmo posto e categoria, por força do n.º 5 do artigo 14.º e do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de Outubro, conjugados com o artigo 20.º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana.
5. Não existindo nenhuma lacuna ao invés do que pretende e afirmou a Recorrente na sua contestação.
6. A douta decisão recorrida não padece de nenhum erro de julgamento.
7. Pois o Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, é de uma clareza cristalina ao afirmar no n.º 5 do seu artigo 14.º que a transição para os níveis remuneratórios se aplica também aos militares na situação de reserva.
8. Bem decidiu a sentença recorrida ao condenar a entidade demandada ora Recorrente a integrar os Recorridos nos índices e posições a que cada um tenha direito nos mesmos termos dos militares da Guarda Nacional Republicana no ativo providos em postos correspondentes aos seus.
Nestes termos e nos demais de direito e com o Vosso Douto suprimento deverá ser negado provimento ao presente recurso e mantida a sentença recorrida
Assim se fazendo
Justiça
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Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, o Ministério Público não emitiu parecer.
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Com dispensa de vistos, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores adjuntos, vem o processo à conferência para julgamento.


II
Sabendo-se que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do apelante, a questão que se encontra submetida à apreciação deste tribunal consiste em determinar se existe erro de julgamento por se ter considerado que os Autores devem ser integrados nos índices e posições a que cada um tenha direito nos mesmos termos dos militares da Guarda Nacional Republicana no ativo providos em postos correspondentes aos seus.


III
A matéria de facto constante da sentença recorrida – e não impugnada - é a seguinte:


1. O A. M… foi incorporado nas Forças Armadas em 5.9.1978, sendo titular do posto de Sargento Chefe da Guarda Nacional Republicana (GNR), tendo passado à situação de reserva no dia 21.12.2009;
2. O A. O… foi incorporado nas Forças Armadas em 20.1.1979, sendo titular do posto de Sargento Chefe da Guarda Nacional Republicana (GNR), tendo passado à situação de reserva no dia 20.10.2009;
3. O A. D… foi incorporado nas Forças Armadas em 2.9.1974, sendo titular do posto de Sargento Chefe da Guarda Nacional Republicana (GNR), tendo passado à situação de reserva no dia 9.4.2009;
4. O A. J… foi incorporado nas Forças Armadas em 3.6.1977, sendo titular do posto de Sargento Adjunto da Guarda Nacional Republicana (GNR), tendo passado à situação de reserva no dia 31.12.2009;
5. Em 22.2.2013, o A. M… requereu junto do Sr. Tenente-General Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, nos termos que se dão por reproduzidos, e dos quais se extrai o seguinte:




6. Em 25.2.2013, o A. O… requereu junto do Sr. Tenente-General Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, nos termos que se dão por reproduzidos, e dos quais se extrai o seguinte:



7. Em 25.2.2013, o A. D… requereu junto do Sr. Tenente- General Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, nos termos que se dão por reproduzidos, e dos quais se extrai o seguinte:



8. Em 8.3.2013, o A. J… requereu junto do Sr. Tenente- General Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, nos termos que se dão por reproduzidos, e dos quais se extrai o seguinte:




9. Sobre os requerimentos indicados nos pontos 5 a 8 do probatório, não foi proferida decisão expressa;
10. A petição inicial da presente ação deu entrada via SITAF no dia 16.9.2013;


IV
1. Para boa compreensão do presente recurso importa retroceder à petição inicial. Neste articulado os Autores/Recorridos pediram a condenação da Entidade Demandada/Recorrente «a reintegrar os Autores nas novas tabelas remuneratórias, nos índices e posições a que cada um tenha direito nos mesmos termos que os militares no ativo na categoria de Sargento-chefe ou Sargento-Ajudante com retroação a 01 de Janeiro de 2010». Ou seja, tão-pouco concretizaram o direito que consideraram assistir-lhes. A sentença recorrida julgou a ação procedente e condenou «a Entidade demandada a integrar os AA. nos índices e posições a que cada um tenha direito nos mesmos [termos] dos militares da Guarda Nacional Republicana no ativo providos em postos correspondentes aos seus». Portanto, o tribunal de apelação desconhece os concretos «índices e posições» a que os Autores/Recorridos teriam direito e que nesta instância se discutiriam.

2. Dir-se-ia, então, que o que estava em causa seria apenas dar cumprimento a uma transição para a nova tabela remuneratória, perante uma omissão verificada. Mas também não. A transição foi efetuada, embora apenas – e como se disse na sentença recorrida – através do «despacho n.º 2727/2013, de 12 de fevereiro, [dos] Ministérios das Finanças e da Administração Interna, com efeitos a 1.1.2013, que autorizou a concretização plena dos reposicionamentos remuneratórios decorrentes da transição para as novas tabelas remuneratórias previstas no Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro».

3. Vejamos, então, a causa de pedir da ação, a qual, e em rigor, é apenas a seguinte:

a) Por força do disposto no artigo 14.º/5 do Decreto-Lei n.º 298/2008, de 14 de outubro, o regime de transição para a nova tabela remuneratória aplica-se também aos militares que se encontram na situação de reserva;
b) De acordo com o disposto no artigo 29.º do mesmo decreto-lei, «[a]s remunerações dos militares na situação de reserva são actualizadas, com dispensa de quaisquer formalidades, sempre que se verifiquem alterações das remunerações dos militares do mesmo posto e posição remuneratória do activo, com efeitos reportados à data da entrada em vigor das referidas actualizações»;
c) Não obstante, os Autores/Recorridos continuaram a receber a remuneração anterior às novas tabelas – a correspondente aos anteriores escalões -, o que «cria um prejuízo individual de cerca de € 150,00».

4. O tribunal a quo acolheu tais fundamentos, motivo pelo qual, e como já anteriormente se disse, julgou a ação procedente. Com especial relevo pode ler-se o seguinte na sentença recorrida:

«Dispõe o n.º 1 do art. 14.º do DL n.º 298/2009 que, na transição para a nova tabela remuneratória, o militar da Guarda cuja remuneração base seja inferior à primeira posição remuneratória prevista no anexo I do referido decreto-lei, para o respetivo posto é transitoriamente posicionado no nível remuneratório, automaticamente criado, de montante pecuniário igual à remuneração base a que tem direito à data de entrada em vigor desse diploma, salvo no caso dos postos de cabo-mor, guarda principal e guarda.
Por outro lado, resulta do n.º 5 deste preceito que o regime de transição previsto nos números anteriores aplica-se também aos militares na situação de reserva.
Prosseguindo para o n.º 8, temos que a execução orçamental do disposto no art. 14.º é assegurada por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da administração interna.
Na sequência desta disposição, foi aprovado o despacho n.º 746/2012, de 29 de dezembro pelo Ministérios das Finanças e da Administração Interna, que autorizou a alteração da posição remuneratória ou a transição para as tabelas remuneratórias consagradas pelo Decreto-Lei n.º 298/2009, dos militares da GNR que auferem remuneração base inferior a outros militares que, em virtude de ingresso ou promoção legalmente realizada, atingiram o mesmo posto ou categoria mas detêm menor antiguidade, conferindo-se àqueles o nível remuneratório correspondente à primeira posição remuneratória no posto ou categoria em causa.
Assim, esta norma, cuja eficácia retroagiu a 1.12.2011 (cfr. o n.º 3 do Despacho mencionado), não assegurava a transição de todos os militares da GNR, nem uma transição integral para o novo sistema remuneratório.
Esta situação durou até ao despacho n.º 2727/2013, de 12 de fevereiro, pelo Ministérios das Finanças e da Administração Interna, com efeitos a 1.1.2013, que autorizou a concretização plena dos reposicionamentos remuneratórios decorrentes da transição para as novas tabelas remuneratórias previstas no Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro.
Ficaram, pois, a partir da entrada em vigor desta norma, asseguradas as condições para que todos os militares da GNR, no ativo ou na reserva, pudessem passar a ser remunerados em função das tabelas remuneratórias trazidas por aquele Decreto-Lei.
(…)
No plano substantivo, mostra-se isento de dúvidas que os AA., militares da GNR na situação de reserva à data da aprovação e entrada em vigor de ambos os despachos identificados supra, tinham direito à transição para o novo regime e ao reposicionamento remuneratório.
Essa transição implica, como vimos, para os militares cuja remuneração base seja inferior à primeira posição remuneratória consignada no Anexo I ao citado diploma legal, o posicionamento transitório no nível remuneratório, automaticamente criado, de montante pecuniário igual à remuneração base a que tinham direito no dia 1.1.2010 (cfr. o n.º 1 do art. 14.º do Decreto-Lei n.º 298/2009).
Não obstante, as remunerações dos militares na situação de reserva são atualizadas, com dispensa de quaisquer formalidades, sempre que se verifiquem alterações das remunerações dos militares do mesmo posto e posição remuneratória do ativo, com efeitos reportados à data da entrada em vigor das referidas atualizações (cfr. art. 29.º do Decreto-Lei n.º 298/2009).
A atualização da situação remuneratória dos militares da GNR na situação de reserva constitui para a Administração um dever, sempre que se verifiquem as respetivas condições – alterações das remunerações dos militares do mesmo posto e posição no ativo -, sem lhe ser deixada, nesta matéria, qualquer tipo de discricionariedade.
Nesta perspetiva, ainda que se considerasse ter-se verificado a colocação transitória, num nível criado automaticamente, alegada pela Entidade demanda, a situação remuneratória dos AA. jamais se poderia manter indefinidamente assim estabilizada, antes devendo acompanhar a evolução dos vencimentos auferidos pelos militares no ativo providos no mesmo posto e posição remuneratória.
Donde, não resultou demonstrado que tenha sido dada plena concretização ao direito à transição de nível e posição remuneratória de que os AA. são titulares, devendo ser praticado ato que atualize as remunerações dos AA. em linha com os índices e posições em que se encontram os militares do mesmo posto e categoria no ativo, por força do art. 14.º, n.º 5 e do art. 29.º do DL n.º 298/2009, conjugados com o art. 20.º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana.
(…)
Por todo o exposto, considerando que não foi dado cumprimento pela Entidade demandada ao disposto no art. 14.º, n.º 5 e no art. 29.º do DL n.º 298/2009, conjugados com o art. 20.º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, procede o peticionado».

5. Como resulta da sentença recorrida, a mesma dá-nos conta do quadro legal em causa, mas nada nos diz quanto aos termos em que é feita a sua aplicação aos casos concretos.

6. Ou seja, por um lado, o artigo 14.º/5 do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, estabelece que «[o] regime de transição previsto nos números anteriores aplica-se também aos militares na situação de reserva». E segundo a sentença recorrida não foi dado cumprimento ao aí estabelecido. Mas porquê? Qual era o nível remuneratório a que os Autores teriam direito, em 1.1.2010, e que, alegadamente, não lhes teria sido reconhecido? Nada se sabe. Embora se possa pressupor que nem os Autores/Recorridos nem o tribunal a quo identificam qualquer problema na transição – quanto à situação a considerar em 1.1.2010 -, a qual se faria para a posição remuneratória, automaticamente criada, de montante pecuniário igual ao montante pecuniário correspondente à remuneração base a que tinham direito naquela data (1.1.2010, repete-se).

7. O problema estaria, também para a sentença recorrida, no alegado incumprimento do disposto no artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, nos termos do qual «[a]s remunerações dos militares na situação de reserva são actualizadas, com dispensa de quaisquer formalidades, sempre que se verifiquem alterações das remunerações dos militares do mesmo posto e posição remuneratória do activo, com efeitos reportados à data da entrada em vigor das referidas actualizações». E ainda segundo a sentença recorrida, «ainda que se considerasse ter-se verificado a colocação transitória, num nível criado automaticamente, alegada pela Entidade demanda, a situação remuneratória dos AA. jamais se poderia manter indefinidamente assim estabilizada, antes devendo acompanhar a evolução dos vencimentos auferidos pelos militares no ativo providos no mesmo posto e posição remuneratória».

8. Mas nova questão se coloca: qual foi a atualização que a Entidade Demandada/Recorrente não efetuou? Nada se disse. Porque, para lá da posição de princípio segundo a qual «a situação remuneratória dos AA. jamais se poderia manter indefinidamente assim estabilizada», teria de ser identificada a atualização legal que a Entidade Demandada/Recorrida não teria cumprido. E essa identificação não foi feita pela sentença recorrida. Como já não havia sido feita na petição inicial.

9. De resto, importa recordar que os Autores/Recorridos, à data da produção de efeitos da transição para a nova tabela remuneratória (1.1.2010), já se encontravam na situação de reserva, fora da efetividade de serviço. Ora, o direito à mudança de posicionamento remuneratório é conferido apenas aos militares no ativo e na reserva em efetividade de serviço (artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro).

10. Portanto, feita a transição para a nova tabela remuneratória, com efeitos a 1.1.2010, não haveria que considerar qualquer progressão remuneratória até 1.1.2013, data em que a transição foi concretizada pelo Despacho n.º 2727/2013, de 12 de fevereiro, dos Ministros de Estado e das Finanças e da Administração Interna (nos termos do disposto no artigo 14.º/8 do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, a execução orçamental do regime de transição para a nova tabela remuneratória teria de ser assegurada por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da administração interna). Ao contrário do que poderia suceder com os militares no ativo. A sentença recorrida não poderá, pois, manter-se.


V
Em face do exposto, acordam os Juízes da Subsecção Social do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a ação improcedente, absolvendo a Entidade Demandada/Recorrente do pedido.

Custas pelos Autores/Recorridos, em ambas as instâncias (artigo 527.º/1 e 2 do Código de Processo Civil).


Lisboa, 6 de novembro de 2025.

Luís Borges Freitas (relator)
Maria Helena Filipe
Maria Julieta França