| Decisão Texto Integral: | S..... – Compra e Venda de Imóveis S.A., devidamente identificada como requerente [doravante apenas Recorrente] nos autos de outros processos cautelares instaurados contra o Ministério do Ambiente e da Energia [recorrido MAEn] e a Á....., S.A., na qualidade de contra-interessada [recorrida CI], inconformada veio interpor recurso jurisdicional da sentença, proferida em 30.11.2024, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que julgou totalmente improcedente a presente providência cautelar, e, em consequência, absolveu a Entidade Requerida e a Contra-interessada do pedido [de suspensão de eficácia de acto administrativo consubstanciado na declaração de utilidade pública (DUP) da expropriação de prédios da Requerente, determinada por via do despacho da Ministra do Ambiente e da Energia nº 8177/2024, de 2.7.2024, publicado no Diário da República nº 141/2024, Série II, de 23.7.2024] e extinto o incidente de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida, por inutilidade superveniente.
Nas respectivas alegações, a Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
«6.1. Da Nulidade da DUP por falta de parecer da ERRAA nos termos do artigo 38.º do RJRAN
6.1.1. Da manifesta nulidade da DUP
A. Qualquer utilização não agrícola de áreas incluídas na RAN para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia depende de parecer prévio vinculativo da respetiva entidade regional da RAN, nos termos dos n.os 1 e 7 do artigo 23.º do RJRAN.
B. Nos termos dos n.os 1 e 7 do artigo 23.º do RJRAN, qualquer ato administrativo que conceda, aprove, licencie, autorize ou de qualquer modo viabilize um uso não agrícola de áreas RAN deve ser precedido de parecer vinculativo da respetiva entidade regional da RAN, sob pena de nulidade, nos termos do artigo 38.º do RJRAN.
C. Ora, no caso concreto, os Prédios localizam-se em áreas integradas na RAN.
D. Sem prejuízo, a DUP que viabilizou a instalação e a operação da Estação de Dessalinização do Algarve – o que, naturalmente, não constitui um uso agrícola –, não foi precedida de qualquer parecer prévio por parte da ERRAA, nos termos do n.º 1 ou do n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN.
E. Consequentemente, e como determina a jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal Administrativo, a DUP deve ser considerada nula, nos termos do artigo 38.º do RJRAN (vide desde logo o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo de 21 de janeiro de 2021 - processo n.º 094/09.3BEPRT) (AUJ).
F. O Tribunal a quo rejeitou esse entendimento, com base, essencialmente, em três pressupostos:
i. Ao abrigo do n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN, a entidade regional da RAN não precisaria de emitir qualquer parecer sobre o uso não agrícola que seria dado à área RAN dos Prédios, bastando para o efeito o parecer da CA em sede de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução no âmbito do procedimento de AIA;
ii. A jurisprudência fixada no AUJ não é aplicável ao caso sub judice e, em qualquer caso, a DUP não integraria a lista de atos administrativos previstos no n.º 1 do artigo 23.º do RJRAN;
iii. O parecer da entidade regional da RAN – ou o parecer da CA que o substituísse – poderia ser emitido depois da DUP.
G. Sucede que os pressupostos que serviram de base ao entendimento do Tribunal a quo não encontram respaldo nas disposições legais aplicáveis, quando interpretadas corretamente.
6.1.2. Da dispensa de parecer da ERRAA ao abrigo do n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN
H. O entendimento do Tribunal a quo de que, nos termos do n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN não seria necessário que a ERRAA emitisse um parecer, bastando que o CA emitisse parecer técnico final favorável, nos termos do n.º 1 do artigo 9.º do RJAIA, não tem qualquer cabimento legal.
I. Com efeito, não há qualquer elemento ou indicação no n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN que possa levar o intérprete a concluir que esse tal “parecer favorável, expresso ou tácito” se refere ao tal parecer a ser emitido pela CA no âmbito do procedimento de AIA, bem antes pelo contrário.
J. Em primeiro lugar, veja-se que o n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN refere expressamente que o parecer a emitir no âmbito do procedimento de AIA e que permite dispensar o parecer a emitir nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do RJRAN é um “parecer favorável, expresso ou tácito”.
K. Sem prejuízo, a lei não prevê que os pareceres técnicos da CA, a atribuir nos termos das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 9.º do RJAIA, possam ser emitidos tacitamente.
L. Contrariamente, no âmbito de um procedimento de AIA, esse será o caso do parecer setorial a emitir pela ERRAA, nos termos do n.º 5 do artigo 9.º do RJAIA, se esta estiver representada no CA, ou do parecer externo a emitir pela ERRAA, nos termos do n.º 12 do artigo 14.º do RJAIA, se esta não estiver representada no CA.
M. Com efeito, esses pareceres serão tacitamente concedidos e de forma favorável se a ERRAA não os emitir de forma expressa no prazo legalmente previsto (20 ou 30 dias) (vide n.º 7 do artigo 9.º do RJAIA e n.º 5 do artigo 23.º do RJRAN).
N. Em segundo lugar, o “parecer favorável, expresso ou tácito” mencionado na previsão do n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN não pode ser o parecer a emitir pela CA, pois a viabilização de um uso não agrícola de uma área RAN é competência exclusiva das entidades regionais da RAN, nos termos da alínea b) do artigo 34.º do RJRAN que dispõe que “[c]ompete às entidades regionais da RAN (...) deliberar sobre os pedidos de parecer prévio vinculativo a elaborar nos termos do artigo 23.º”.
O. Em terceiro e último lugar, veja-se que a Portaria 162/2011 prevê expressamente, no n.º 2 do seu artigo único, que a mesma não se aplica a projetos sujeitos a AIA “em que tenha sido emitido parecer favorável pelas entidades regionais da Reserva Agrícola Nacional”, pressupondo esta disposição que no âmbito dos procedimentos de AIA as entidades regionais de RAN são chamadas a emitir parecer.
P. Neste sentido e pelo exposto, é evidente que quando o n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN se refere a um “parecer favorável, expresso ou tácito” se está a referir a um parecer a emitir pela entidade regional da RAN no âmbito do procedimento de AIA e nunca ao parecer técnico a emitir pela CA nos termos do n.º 1 do artigo 9.º do RJAIA, pelo que é manifesto que a Sentença padece de erro de julgamento.
6.1.3. Da plena aplicabilidade da jurisprudência uniforme do STA ao caso sub judice
Q. Não obstante a clareza da jurisprudência que advém do AUJ e da sua manifesta aplicação à situação sub judice, o Tribunal a quo:
i. Veio considerar que o AUJ não seria aplicável ao caso sub judice porque o regime legal teria mudado, prevendo-se agora que é a efetiva utilização não agrícola de áreas RAN que deve ser precedida de parecer da entidade regional da RAN e não o ato administrativo permissivo; e
ii. Veio discordar, sem qualquer fundamento, da jurisprudência uniformizada do STA, entendendo que a DUP não se integraria na lista de atos administrativos previstos no n.º 1 do artigo 23.º do RJRAN.
R. Sucede que ambos os entendimentos do Tribunal a quo padecem de erro de julgamento, já que, como se demonstrou, não só a jurisprudência do AUJ se mantém plenamente válida com a entrada em vigor do RJRAN, como a DUP integra claramente a lista de atos administrativos permissivos constante do n.º 1 do artigo 23.º do RJRAN tal como o STA veio decidir na jurisprudência supra citada.
S. Com efeito, por um lado, seguindo a posição do Tribunal a quo, isso quereria dizer que um projeto previsto em área RAN poderia ser plenamente licenciado, emitindo-se, designadamente, a respetiva DIA, DCAPE e licença de construção, só sendo necessário que o parecer da entidade regional de RAN fosse emitido no exato momento em que se fosse iniciar a utilização não agrícola da área RAN.
T. Tal entendimento não só não tem qualquer suporte na lei, como, se acolhido, levaria a resultados incompreensíveis e absurdos.
U. Assim, apesar de a letra de ambas as disposições (n.º 1 do artigo 23.º do RJRAN e n.º 1 do artigo 9.º do DL 196/89) ser distinta, olhando à lógica do sistema jurídico e à função dos pareceres no âmbito dos procedimentos, é manifesto que o regime legal permaneceu inalterado.
V. Por outro lado, tal como se entende claramente ao abrigo do AUJ, da jurisprudência supra fixada e do n.º 1 do artigo 9.º do DL 196/89, deve considerar-se que o parecer da entidade regional da RAN deve ser emitido previamente à emissão de todo e qualquer ato administrativo que “conduza”, “legitime” ou “abra caminho” a uma utilização não agrícola de uma área RAN.
W. Ora, tal como o STA concluiu no AUJ e na demais jurisprudência citada, a DUP efetivamente permite, viabiliza ou legitima a utilização dos Prédios para um uso não agrícola, pelo que tinha de ter sido precedida de parecer da ERRAA, sob pena de nulidade.
X. Por este motivo, é evidente que a Sentença a quo padece de erro de julgamento, devendo considerar-se que a DUP integra a lista de atos administrativos prevista no n.º 1 do artigo 23.º do RJRAN e que a mesma é nula por ter sido concedida sem prévia emissão de “parecer favorável, expresso ou tácito” por parte da ERRAA.
6.1.4. Da impossibilidade de emissão do parecer da ERRAA após atribuição da DUP
Y. A emissão da DUP previamente à emissão de um parecer favorável pela ERRAA, viabilizando a pretensão de que os Prédios sejam utilizados para fins não agrícolas, determina a inelutável nulidade daquele ato administrativo:
i. Por preterição de uma formalidade essencial, como dispõe o artigo 38.º do RJRAN; e
ii. Por incompetência absoluta, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 161.º do CPA.
Z. Esta nulidade não é passível de sanação, tal como se decidiu no AUJ, sob pena de se frustrar a função garantística que o legislador pretendeu atribuir quando instituiu a obrigatoriedade de aquele parecer ser emitido em momento prévio à emissão da DUP.
AA. Do mesmo modo, nos termos do n.º 2 do artigo 164.º do CPA, pura e simplesmente não é possível sanar um ato nulo através de ratificação.
BB. Em qualquer caso, não tendo sido obtido qualquer dos pareceres previstos no n.º 1 ou no n.º 7 do artigo 23.º do RJRAN, o fim constante da DUP viola o n.º 1 do artigo 20.º do RJRAN pois que é um fim proibido naquele local (áreas non aedificandi), pelo que a mesma sempre seria anulável nos termos do n.º 1 do artigo 163.º do CPA.
CC. Finalmente, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 10.º do CE, é evidente que o requerimento a apresentar pela ADA ao MAE, para emissão da DUP deveria ser acompanhado do parecer da ERRAA, tal como afirmam muito claramente FRANCISCO CALVÃO e FERNANDO JORGE SILVA em anotação àquela disposição.
DD. Termos em que a Sentença deve ser revogada, por incorrer em erro de julgamento, e substituída por uma decisão que dê o requisito do fumus boni iuris como preenchido, por ser provável que, em sede de decisão da causa principal, a nulidade da DUP venha a ser declarada, nos termos do artigo 38.º do RJRAN e da alínea b) do n.º 2 do artigo 161.º do CPA, ou, pelo menos, que a DUP será anulada por prever um fim proibido pelo RJRAN.
6.2. Da nulidade da DUP nos termos do artigo 22.º do RJAIA
EE. Nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 22.º do RJAIA os atos de autorização de projetos abrangidos pelo RJAIA só podem ser emitido após notificação DCAPE, sob pena de nulidade.
FF. Ora, quando a DUP foi emitida no dia 23 de julho de 2024, viabilizando a implementação da Estação de Dessalinização do Algarve, ainda não tinha sido emitido a DCAPE.
GG. Apesar disso, o Tribunal a quo não entendeu que a DUP era nula por considerar que:
i. A DUP não consubstancia um ato de autorização nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 22.º do RJAIA; e
ii. A DCAPE não tem de ter lugar em momento anterior à emissão da DUP e, no caso concreto, uma interpretação contrária conduziria à impossibilidade de obtenção de DCAPE em razão de a DUP ser necessária à preparação do projeto de execução.
HH. Sucede que a decisão do Tribunal a quo resulta de uma incorreta interpretação das normas legais aplicáveis, pelo que a Sentença padece de erro de julgamento, devendo ser revogada e substituída por outra que reconheça, efetivamente, que a DUP é nula nos termos do n.º 3 do artigo 22.º do RJAIA.
II. Com efeito, por um lado, a DUP insere-se inquestionavelmente no conjunto de atos de autorização que conferem à ADA o direito a implementar a Estação de Dessalinização do Algarve, ao permitir a transferência da posse dos Prédios e a afetação daqueles à finalidade do projeto.
JJ. Ao contrário do que concluiu o Tribunal, o facto de a DUP não ser o único ato administrativo necessário para que o proponente possa implementar o projeto da Estação de Dessalinização do Algarve não prejudica a sua natureza de ato administrativo permissivo.
KK. Por outro lado, ao abrigo do poder conferido ao abrigo do n.º 2 do artigo 6.º do DL 15/2021 a ADA não precisava de tomar posse administrativa dos Prédios, ou de obter qualquer autorização por parte da Recorrente, para aceder aos Prédios e aí proceder à realização dos estudos técnicos exigidos para a conceção do projeto de execução.
LL. Pelo que é evidente que a DUP não era necessária para que a ADA obtivesse a DCAPE.
MM. Assim, e por tudo quanto foi dito, deve o Tribunal ad quem concluir pelo preenchimento do requisito do fumus boni iuris para o decretamento da providência cautelar, sendo provável que, em sede de decisão da causa principal, a nulidade da DUP venha a ser declarada nos termos do n.º 3 do artigo 22.º do RJAIA.
6.3. Da errónea aplicação do princípio da proporcionalidade
NN. No seu Requerimento Cautelar, a Recorrente alegou e demonstrou que a DUP violava o princípio da proporcionalidade nas suas três vertentes, em particular que:
i. Nesta fase é absolutamente incerto se a medida adotada pelo MAE, através da emissão da DUP, é adequada à prossecução do fim que este ato visa atingir, pois que nesta fase não se sabe se o projeto vai poder se implementado nos Prédios da Recorrente, já que ainda que tal pudesse suceder posteriormente à emissão da DUP – quod non –, não é possível antecipar qual será a decisão (aliás discricionária) da ERRAA, nos termos do artigo 23.º do RJRAN (parecer), e da APA, nos termos do artigo 21.º do RJAIA (DCAPE);
ii. Se ainda não é seguro que o projeto vai poder ser implementado nos Prédios, então a emissão da DUP ainda não era (como ainda não é) necessária, pelo que o MAE podia (e devia) ter aguardado que o projeto se encontrasse numa fase mais avançada, designadamente podia ter aguardado pela emissão do parecer por parte da ERRAA e da DCAPE pela APA, para então avançar para a expropriação;
iii. Por fim, a expropriação é também desproporcional (em sentido estrito) já que:
a. Não há qualquer motivo válido que justifique que se ataque irremediavelmente um Direito Fundamental, se nem sequer se sabe se estão ou não reunidas as condições para que esse interesse público seja realizado com recurso aos meios concretamente expropriados; e
b. Ainda que, em abstrato, se equacionasse que o projeto irá receber parecer favorável da ERRAA e uma DCAPE favorável da APA – quod non –, é manifestamente desproporcional obliterar a propriedade privada da Recorrente num momento em que não se sabe quanto tempo poderá ainda demorar até ao início de implementação do projeto.
OO. Na sua Sentença o Tribunal entendeu que a DUP não violava o princípio da proporcionalidade.
PP. Para o efeito o Tribunal considerou que, por um lado, visto que a Recorrente recusou que a ADA acedesse aos Prédios “esta teve que recorrer à resolução de expropriação e requerimento da DUP com carácter de urgência, nos termos do Decreto-Lei n.º 15/2021, de 23 de fevereiro, para que lhe fosse conferida a posse administrativa dos prédios a expropriar e fosse, assim, viável executar os ditos trabalhos de sondagens e demais estudos” (cfr. Sentença a quo).
QQ. Por outro lado, o Tribunal a quo entendeu também que caso não se mostre viável prosseguir com a implementação do sistema de dessalinização da região do Algarve, a expropriação pode ser revertida e a Recorrente indemnizada dos danos que lhe tiverem sido causados.
RR. Sucede que o entendimento do Tribunal a quo também aqui padece de erro de julgamento.
SS. É que, a um tempo, como já se demonstrou, ao abrigo do n.º 2 do artigo 6.º do DL 15/2021, sempre seria possível à ADA aceder aos terrenos em causa para realizar os estudos e sondagens necessários à elaboração do projeto de execução, mesmo (i) sem a autorização da Recorrente, e (ii) sem a tomada de posse administrativa sobre os Prédios.
TT. Ora, porque o n.º 2 do artigo 6.º do DL 15/2021 permitia à ADA aceder aos Prédios caí por terra o fundamento que o Tribunal erigiu para afastar a violação do princípio da proporcionalidade.
UU. A outro tempo, a ser procedente o raciocínio do Tribunal de que a DUP não viola o princípio da proporcionalidade por entender que os prejuízos invocados pela ora Recorrente são indemnizáveis, então todas as expropriações seriam admissíveis, desde que acompanhadas da correspondente indemnização.
VV. Afastados estes erróneos entendimentos do Tribunal a quo, deve, pois, concluir-se que a DUP viola o princípio da proporcionalidade nas suas três vertentes, pelo que a Sentença a quo deve ser revogada, por erro de julgamento, e substituída por uma decisão que considere verificado o requisito do fumus bonis iuris.
6.4. Da procedência das presentes alegações de recurso
WW. Tendo o Tribunal a quo concluído pela não verificação do requisito fumus boni iuris, absteve-se de conhecer dos demais requisitos para decretamento da providência cautelar, a saber (i) o periculum in mora e (ii) a ponderação de interesses.
XX. Ora, impondo-se a conclusão de que o requisito fumus boni iuris se encontra verificado, terá o Tribunal ad quem de se pronunciar sobre as questões que o Tribunal a quo tenha considerado prejudicadas, conforme consta do n.º 2 do artigo 149.º do CPTA.
YY. Além disso, cumpre salientar que, em virtude da decisão do Tribunal a quo se ter restringido à apreciação do fumus bonis iuris, não foram apreciados todos os factos elencados no Requerimento Cautelar que eram fundamentais para a apreciação daqueles outros requisitos (em particular os vertidos nos artigos 28.º, 30.º a 33.º, 35.º a 41.º, 43.º, 44.º, 295.º a 313.º, 315.º a 329.º, 337.º, 339.º a 341.º, 349.º, 352.º, 353.º, 359.º a 361.º do Requerimento Cautelar).
ZZ. Adicionalmente, o revogando-se a Sentença, o Tribunal a quo deverá ainda revogar a decisão que declarou extintos os dois incidentes de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida da DUP, iniciados pela Recorrente em 21 de outubro de 2024 e 26 de novembro de 2024, por inutilidade superveniente,...
AAA. ...declarando que os fundamentos da Resolução Fundamentada são improcedentes e a ineficácia de todos os atos de execução da DUP, em particular a elaboração e notificação dos Relatórios de peritagem à Recorrente, a elaboração e notificação do Relatório Complementar, a tomada de posse administrativa dos Prédios por parte da AdA, a elaboração e notificação dos autos de tomada de posse administrativa dos Prédios e o depósito da quantia de € 634.022,50 à ordem da Recorrente.
BBB. Finalmente, a Recorrente considera que estão preenchidos todos os requisitos legais para que seja antecipada a decisão sobre a causa principal, em sede de recurso, sendo a urgência e a simplicidade do caso evidentes, bem como a necessidade de evitar prejuízos irreparáveis.
CCC. Assim, requer-se que V. Exas. se dignem revogar a Sentença a quo e, ao invés de prosseguir na apreciação dos requisitos de que depende o decretamento da providência cautelar, procedam à antecipação da decisão de mérito, conforme disposto no artigo 121.º do CPTA, com o intuito de assegurar a celeridade processual e a proteção dos direitos da Recorrente.»
requerendo,
«Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente Recurso de Apelação ser admitido e declarado procedente e consequentemente, revogar-se a Sentença a quo e:
i. Antecipar-se o juízo sobre a causa principal, declarando-se a nulidade da DUP ou, subsidiariamente, procedendo-se à sua anulação; ou, caso assim não se entenda;
ii. Decretar-se a providência cautelar requerida, suspendendo-se a eficácia da DUP até à emissão de sentença no processo principal; e
iii. Julgar procedentes os incidentes de declaração de ineficácia dos atos de execução indevida da DUP, em particular:
a. Reconhecendo como improcedentes as razões em que se funda a Resolução Fundamentada; e
b. Declarando a ineficácia dos atos de execução da DUP, em particular a elaboração e notificação dos Relatórios de peritagem à Recorrente, a elaboração e notificação do Relatório Complementar, a tomada de posse administrativa dos Prédios por parte da AdA, a elaboração e notificação dos autos de tomada de posse administrativa dos Prédios e o depósito da quantia de €634.022,50 à ordem da Recorrente.».
O recorrido MAEn apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:
«A. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) previu, no âmbito da Componente C09 – Gestão Hídrica, tendo em vista a implementação de medidas incluídas no Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve (PREHA), um investimento numa solução de dessalinização da água do mar na região do Algarve.
B. A Estrutura de Missão “RECUPERAR PORTUGAL” e a aqui contrainteressada, celebraram um contrato de financiamento para a realização do investimento relativo ao PREHA (código RE-C09-i01.04), no quadro de execução da Componente C09 – Gestão Hídrica do PRR, contemplando as seguintes submedidas: “SM4 - Promover a utilização de Água Residual Tratada”; “SM5 - Aumentar a capacidade disponível e resiliência das albufeiras/sistemas de adução em alta existentes e reforçar com novas origens de água”; “SM6 - Promover a dessalinização de água do mar” .
C. A localização da Estação de Dessalinização de Água do Mar (EDAM) obedece a critérios técnicos relacionados, nomeadamente, com a existência na zona envolvente de infraestruturas da contrainteressada, como é o caso do Adutor Oriental-Final.
D. A implementação da EDAM está dependente da obtenção de decisão de favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, sendo que para a elaboração deste e, bem assim, do relatório de conformidade ambiental do projeto de execução, é necessária a execução de estudos e sondagens no terreno, que implicam o acesso ao solo dos prédios da Recorrente.
E. Previamente à DUP, a contrainteressada solicitou à ora Recorrente o acesso aos seus prédios para fins de realização dos ditos estudos e sondagens necessários à elaboração do projeto de execução, tendo esta manifestado a sua oposição
F. A contrainteressada procurou adquirir os prédios da Recorrente via direito privado.
G. Pelo que foi emitida a devida DUP.
H. A referida DUP, que a Recorrente coloca em crise, foi emitida ao abrigo do Decreto-Lei n.º 15/2021, de 23 de fevereiro, alterado pela Lei n.º 5/2023, que criou um regime especial de expropriação e constituição de servidões administrativas.
I. Inexiste qualquer referência ao RJRAN ou RJAIA.
J. Verificam-se diferenças quanto à obrigatoriedade de parecer prévio da autoridade regional da RAN entre o RJRAN e o anterior regime revogado, o Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de junho.
K. O Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, que conferiu ao artigo 23.º do RJRAN a sua atual redação, visou uma simplificação de procedimentos em matéria ambiental.
L. O parecer da CA emitido em fase de estudo prévio será sempre condicionado e sujeito a posterior verificação da conformidade do projeto de execução com as condicionantes daquelas resultantes.
M. A declaração de utilidade pública da expropriação visa desencadear um processo tendente à transferência da propriedade privada para o setor público e não direta e imediatamente permitir um determinado uso do solo ou a realização de determinada operação urbanística, tal como acontece com a concessão, a aprovação, a licença e a autorização administrativa.
N. Não é pela DUP que se permite a utilização não agrícola do solo integrante da RAN.
O. É a utilização não agrícola do solo que depende do parecer prévio vinculativo da autoridade regional da RAN.
P. Não é uma competência da Ministra do Ambiente e Energia.
Q. Também para efeitos do artigo 22.º do RJAIA, a DUP não pode ser equiparada a um ato de licenciamento ou autorização, pois não é ela que permite/autoriza direta e imediatamente a realização de uma determinada operação ou projeto.
R. A entidade competente para a emissão da DUP, a Ministra do Ambiente e Energia, também não detém quaisquer competências previstas no artigo 7.º do RJAIA, pelo que não pode ser considerada entidade licenciadora ou competente para a autorização, para efeitos do RJAIA.
S. Ademais, no caso, tendo decorrido procedimento de AIA em fase de estudo prévio, será de aguardar pela fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução.
T. A DUP, por via do efeito que lhe está associado de conferir a posse administrativa dos bens a expropriar, é essencial à realização dos estudos e sondagens necessários à elaboração do projeto de execução e do relatório de conformidade ambiental do projeto de execução, pelo que não poderia ter sido emitida posteriormente à decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução.
U. Fica ainda mais claro, pelas alegações da Recorrente, de que a entidade requerida e a contrainteressada, compreendem o ónus que representa a intervenção na propriedade de terceiros e a necessidade de salvaguarda de direitos fundamentais do nosso ordenamento jurídico.
V. Ora, a atuação em especial da contrainteressada foi sempre de colaboração e de procurar esgotar as vias menos impositivas; procurou negociar a aquisição dos prédios da Autora por via do direito privado e solicitou a autorização da Requerente para realizar estudos complementares nos Prévios com vista à instalação da EDAM.
W. Não se afigura que seja especialmente longo o período de tempo necessário para ser conhecida a decisão relativa à viabilidade do projeto.
X. Considere-se ainda que a não emissão da declaração de utilidade pública com caráter de urgência, poderia determinar um enorme sacrifício para os interesses públicos: a) ficando em causa as garantias de abastecimento de água; b) imposição à população de graves limitações no uso da água, para além dos esforços resultantes das medidas já em vigor, com consequências para o seu bem-estar; c) incumprimento contratual com a EMPRR e consequente grave perda de financiamento no âmbito do PRR; d) cancelamento de projetos financiados pelo PRR.
Y. Como ficou bem demonstrado na Sentença, a DUP mostra-se necessária, adequada e não excessiva para levar a cabo o fim pretendido.
Z. A DUP não padece de qualquer vício, pelo que é manifesta a improcedência da eventual ação principal. O ato resulta de um regime especial de expropriação, os RJRAN e RJAIA não se aplicam e a proporcionalidade é evidente.
AA. Ora, resulta do artigo 120º do CPTA, que os requisitos para a procedência de uma providência cautelar são três e a verificação destes requisitos tem de ser cumulativa.
BB. Não estão verificados os requisitos de periculum in mora e do fumus boni júris, e numa ponderação de interesses, os prejuízos/danos que a aqui requerente eventualmente possa sofrer nunca poderão ter-se como superiores àqueles que o ato ora em crise pretende evitar.
CC. Por todo o exposto, e acompanhando a Sentença em crise, que em nosso entender não merece qualquer reparo, deve o recurso improceder em toda a sua extensão, como de improceder se apresentam, assim, todas e cada uma das conclusões formuladas a final do mesmo pela Recorrente.».
A recorrida CI apresentou contra-alegações, sem formular conclusões, pugnando para que seja negado provimento ao recurso.
O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. o nº 2 do artigo 36º do CPTA), mas com apresentação prévia aos mesmos do projecto de acórdão, vem o mesmo à sessão para julgamento.
As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, no essencial, em saber se a sentença recorrida incorreu em erros de julgamento ao considerar não verificado o requisito do fumus boni iuris e, consequentemente, ao julgar improcedente a adopção da providência requerida, e ao declarar extintos os incidentes de declaração ineficácia dos actos de execução indevida da DUP. E se, for decidido revogar a sentença recorrida, deve ser antecipado o juízo sobre a causa principal, declarando a nulidade ou anulando a DUP.
O tribunal a quo considerou, por relevantes para a decisão da causa, indiciariamente provados os seguintes factos:
«A) A Requerente é proprietária dos seguintes prédios:
- Prédio misto com a área de 122.600,00 m2, sito na União de Freguesias de Albufeira e Olhos de Água, concelho de Albufeira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.º 1…………., da União de Freguesias de Albufeira e Olhos de Água e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo n.º 1 da Secção BO e na matriz predial urbana sob o artigo 1…..;
- Prédio rústico com a área de 2.400,00 m2, sito na União de Freguesias de Albufeira e Olhos de Água, concelho de Albufeira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.º 1………., da União de Freguesias de Albufeira e Olhos de Água e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo n.º …. da Secção BO – cfr. documentos 1 a 5 juntos com o requerimento inicial;
2. Os prédios identificados no ponto antecedente localizam-se em zonas integrantes da RAN e o prédio misto localiza-se igualmente em zona integrante da Reserva Ecológica Nacional (REN) – cfr. documentos 6 e 7 juntos com o requerimento inicial;
3. Os prédios identificados no ponto 1. dispõem de rede de abastecimento de água, energia elétrica em baixa tensão, saneamento, rede de drenagem de águas pluviais e rede telefónica – cfr. documentos n.ºs 6 e 8 juntos com o requerimento inicial;
4. No prédio misto identificado no ponto 1., existem: 76 Alfarrobeiras de grande porte; 52 Laranjeiras de grande porte; 21 Figueiras de porte grande; 30 Oliveiras de porte médio; Casa com 50 m2; 2 Anexos, um com 4 m2 e outro com 18 m2; 2 Tanques; 3 Poços com 5 m diâmetro e 8 m de profundidade; 3 Furos com 200 m de profundidade; 2 Charcas; 1 piscina com 120 m3; Muro em alvenaria com 2 m de altura; Vedação em rede elástica encimada por arame farpado e eletrificada com a extensão de 1830 m; Vedação em rede malha ovelheira com a extensão de 190 m; Muro em pedra solta com a extensão de 225 m; Vedação elétrica com a extensão de 275 m; Portão em rede metálica com 2 m de altura; diversas benfeitorias que servem de apoio/ abrigo aos animais existentes na propriedade e alguns bens móveis, nomeadamente contentores – cfr. documentos n.ºs 6 e 8 juntos com o requerimento inicial;
5. Em 24-07-2019, o Estado Português e a Contrainteressada celebraram um contrato de concessão, por via do qual foi atribuída a esta última a concessão da exploração e da gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Algarve, pelo período de 30 anos – cfr. documento n.º 2 junto com a oposição da Contrainteressada;
6. Da cláusula 2.ª do contrato de concessão referido no ponto antecedente extrai-se, além do mais, o seguinte:
“1 - A atividade da concessão compreende, em regime de exclusivo, a captação, o tratamento e o abastecimento de água para consumo público, bem como a recolha, o tratamento e a rejeição de efluentes domésticos, de efluentes que resultem da mistura de efluentes domésticos com efluentes industriais ou pluviais, designados por efluentes urbanos, bem como a receção de efluentes provenientes de limpeza de fossas séticas e o respetivo tratamento e rejeição, que cumpram o disposto no regulamento de exploração e serviço relativo à atividade de saneamento de águas residuais em vigor no sistema, a qual deve ser realizada de forma regular, contínua e eficiente.
2 - O objeto da concessão compreende ainda o seguinte:
a) A conceção, a construção, a instalação, a aquisição ou outro meio previsto para a afetação e a extensão, nos termos do projeto global constante do anexo I, das infraestruturas e instalações necessárias à captação ao tratamento e ao abastecimento de água para consumo público dos utilizadores e à recolha, ao tratamento e à rejeição dos efluentes domésticos e urbanos canalizados pelos utilizadores e à receção dos efluentes provenientes da limpeza das fossas, sépticas e os respetivos tratamento e rejeição incluindo condutas e coletores, estações elevatórias, estações de tratamento de água para consumo público e estações de tratamento de águas residuais, incluindo condutas e coletores, estações elevatórias estações de tratamento de água para consumo público e estações de tratamento de águas residuais;
b) A aquisição ou outro meio previsto para a afetação, a instalação e a extensão de todos os equipamentos necessários à captação, ao tratamento e ao abastecimento de água para consumo público dos utilizadores e à recolha, ao tratamento e à rejeição de efluentes domésticos e urbanos canalizados pelos utilizadores e à receção dos efluentes provenientes de limpeza de fossas séticas, e os respetivos tratamentos e rejeição;
c) A conservação, a reparação, a renovação, a manutenção, a adaptação e a melhoria das infraestruturas, instalações e equipamentos previstos nas alíneas anteriores, que se revelem necessárias ao bom desempenho do serviço Público e de acordo com as exigências técnicas e com os parâmetros sanitários exigíveis;
d) O controlo dos parâmetros de qualidade da água fornecida e dos parâmetros sanitários dos efluentes tratados, bem como da qualidade da água dos meios recetores em que os mesmos sejam descarregados.” – cfr. documento n.º 2 junto com a oposição da Contrainteressada;
7. Em 13-12-2019, através do Despacho n.º 443/2020 proferido pelo Ministro do Ambiente e da Ação Climática, a Ministra da Agricultura e a Secretária de Estado do Turismo, foi determinada a elaboração das bases do Plano Regional da Eficiência Hídrica do Algarve (PREHA), extraindo-se do teor do referido despacho, além do mais, o seguinte:
“A seca hidrológica na região do Algarve assume hoje um caráter estrutural com tendência de agravamento devido ao efeito expectável das alterações climáticas. A mudança de paradigma na utilização do recurso água impõe-se face à evidência da insuficiente eficácia das medidas até agora adotadas, sendo, por isso, necessário repensar e encontrar novos caminhos em estreita articulação entre a administração, os utilizadores e a comunidade científica.
(…)
Importa, neste enquadramento, promover a elaboração do Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve, cuja 1.ª fase se inicia com o estabelecimento das suas bases, envolvendo os principais stakeholders, através da identificação dos fatores críticos e de soluções, numa análise de matriz geográfica, atenta à diferenciação de problemas no barlavento e no sotavento algarvio, administrativa e multissetorial dos utilizadores com maior expressão.
(…)” – cfr. mencionado despacho, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 9, de 14-01-2020;
8. Em julho de 2020 foi publicado o PREHA, no qual se previu, entre o mais, um conjunto de medidas com vista a evitar situações de escassez de recursos hídricos e promover a resiliência do abastecimento público de água na região do Algarve – cfr. documento n.º 5 junto com a oposição da Contrainteressada;
9. O PREHA previu no âmbito da medida “Inf_01_ALG - Estudo prévio para avaliação da viabilidade ambiental e de sustentabilidade hídrica de aumento da capacidade de armazenamento de água”, “a construção de uma central de dessalinização” como solução a estudar para aumentar a reserva hídrica – cfr. documento n.º 5 junto com a oposição da Contrainteressada (pp. 263 e 264);
10. O PRR previu, no âmbito da Componente C09 – Gestão Hídrica, tendo em vista a implementação de medidas incluídas no PREHA, um investimento numa solução de dessalinização da água do mar na região do Algarve – cfr. documento n.º 8 junto com a oposição da Contrainteressada (pp. 136, 137, 311, 316, 321);
11. Em 12-11-2021, a Estrutura de Missão “RECUPERAR PORTUGAL”, na qualidade de “Primeiro Outorgante” e a Contrainteressada, na qualidade de “Segundo Outorgante” e beneficiário direto, celebraram um contrato de financiamento para a realização do investimento relativo ao PREHA (código RE-C09-i01.04), no quadro de execução da Componente C09 – Gestão Hídrica do PRR, contemplando as seguintes submedidas: “SM4 - Promover a utilização de Água Residual Tratada”; “SM5 - Aumentar a capacidade disponível e resiliência das albufeiras/sistemas de adução em alta existentes e reforçar com novas origens de água”; “SM6 - Promover a dessalinização de água do mar” – cfr. documentos n.ºs 8 e 9 juntos com a oposição da Contrainteressada;
12. Do clausulado do contrato de financiamento referido no ponto antecedente extrai-se, além do mais, o seguinte:
“(…) CLÁUSULA 3.ª
(CUSTO TOTAL DO INVESTIMENTO E O SEU FINANCIAMENTO) 1. Pela execução do contrato, o Segundo Outorgante receberá um montante global de 169.498.742,00 € (cento e sessenta e nove milhões, quatrocentos e noventa e oito mil e setecentos e quarenta e dois euros), correspondente à totalidade do custo do Investimento RE-C09-I01.04, de acordo com o previsto no Anexo I.
2. Os pagamentos serão efetuados ao Segundo Outorgante, nos termos do protocolo previsto no nº 1 da cláusula 6.ª, em função do:
a) Cumprimento dos marcos e metas globais do Grupo A, previstos na calendarização definida no Anexo I;
b) Montante de custos efetivamente suportados e comprovados pelo Segundo Outorgante, por contrapartida da realização das operações.
3. O valor referido no n.º 1 não inclui o Imposto sobre o Valor Acrescentado, podendo, no caso do mesmo imposto não ser deduzido ou restituído a favor do Segundo Outorgante, o Primeiro Outorgante assegurar o seu financiamento, nos termos da legislação aplicável.
CLÁUSULA 4.ª
(PRAZO E CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO) O Investimento teve início em 01/01/2021 e tem conclusão em 30/06/2026, obrigando-se o Segundo Outorgante ao seu integral cumprimento, nos termos do cronograma incluído no Anexo I do presente contrato. CLÁUSULA 5.ª
(MARCOS E METAS DE EXECUÇÃO) Constitui obrigação do Segundo Outorgante tomar as medidas que se revelem necessárias para assegurar o cumprimento dos marcos e metas definidos no Anexo I ao presente contrato, assumindo a responsabilidade de:
a) Cumprir integral e plenamente os respetivos marcos e metas incluídos no Grupo A, considerados pela Comissão Europeia para efeitos da avaliação dos desembolsos do apoio do PRR;
b) Apresentar para efeitos de monitorização e acompanhamento da execução do Investimento a informação relativa aos indicadores incluídos nos Grupos B e C.
CLÁUSULA 6.ª
(PAGAMENTOS AO SEGUNDO OUTORGANTE) 1. Os pagamentos ao Segundo Outorgante são efetuados pelo Primeiro Outorgante, nos termos dos procedimentos de tesouraria estabelecido no protocolo entre a Estrutura de Missão Recuperar Portugal, a Agência para o Desenvolvimento e Coesão (AD&C) e o Beneficiário Direto, nas seguintes modalidades:
a) A título de adiantamento, após assinatura do presente contrato, numa percentagem máxima de 13% sobre o valor total do financiamento;
b) A título de reembolso, na sequência da confirmação pelo Primeiro Outorgante dos pedidos de pagamento apresentados pelo Segundo Outorgante, com a demonstração da realização dos marcos e metas globais do Grupo A contratualizados e da informação relativa à execução física e financeira do Investimento.
2. (…)
3. (…)
4. (…)
(…) CLÁUSULA 11.ª
(RECUPERAÇÃO DO APOIO FINANCEIRO) 1. Os apoios financeiros atribuídos pelo Primeiro Outorgante podem ser recuperados, total ou parcialmente, nos seguintes casos:
a) Se o Investimento não for executado ou concluído tal como consta no cronograma constante do Anexo I;
b) Não cumprimento, por facto imputável ao Segundo Outorgante, de obrigações estabelecidas no presente contrato e na legislação aplicável, no âmbito da realização do Investimento;
c) Não cumprimento das obrigações legais e fiscais do Segundo Outorgante ou dos destinatários finais;
d) Prestação de informações falsas ou viciação de dados fornecidos na apresentação e realização do Investimento;
e) Ocorrência de situações de conflitos de interesses, de fraude, de corrupção ou duplo financiamento;
f) Quaisquer outras situações não previstas anteriormente, em que se conclua que o Segundo Outorgante recebeu indevidamente ou não justificou adequadamente, o financiamento recebido.
2. A recuperação dos apoios financeiros prevista no número anterior é realizada nos termos previstos no artigo 10.º-A do Decreto-Lei n.º 29-B/2021, de 4 de maio, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 61/2023, de 24 de julho.
(…)” – cfr. documento n.º 9 junto com a oposição da Contrainteressada;
13. Do “Anexo I – Ficha do Investimento” do contrato de financiamento referido no ponto 11., extrai-se, além do mais, o seguinte: “(…)
Imagens no original
(…) – cfr. documento n.º 9 junto com a oposição da Contrainteressada;
14. Por carta registada com aviso de receção datada de 10-02-2023 e rececionada em 16-022023, a Contrainteressada comunicou à Requerente, entre o mais, a sua intenção de adquirir os prédios identificados no ponto 1., tendo em vista a implementação nos mesmos de um “Sistema de Dessalinização na Região do Algarve”, solicitou a autorização da Requerente para realizar trabalhos de sondagens, inseridos no âmbito de estudos complementares ao referido projeto e solicitou o agendamento de uma reunião, tendo em vista discutir a aquisição dos mencionados prédios por via de direito privado – cfr. documentos n.ºs 14 e 15 juntos com a oposição da Contrainteressada;
15. Em 06-03-2023, a Requerente remeteu à Contrainteressada carta registada, através da qual comunicou não autorizar a realização de estudos complementares, sondagens e outros trabalhos nos seus prédios, com vista à implementação do “Sistema de Dessalinização na Região do Algarve” e não ter interesse no agendamento da solicitada reunião, por não pretender vender os seus prédios – cfr. documento n.º 16 junto com a oposição da Contrainteressada;
16. Em 08-03-2023, a Contrainteressada, emitiu, através do seu Conselho de Administração, uma resolução de requerer a expropriação dos prédios identificados no ponto 1., tendo em vista a implementação do “Sistema de Dessanalização na Região do Algarve” – cfr. documentos n.ºs 21 e 22 do requerimento inicial;
17. Por cartas datadas de 13-03-2023, enviadas pela AR….. – Aero – Topográfica, Lda., a Requerente foi notificada da resolução referida no ponto antecedente e, bem assim, da proposta de pagamento de uma indemnização pela expropriação dos seus prédios, no montante global de 634.022,50 €, não tendo respondido às mesmas – cfr. documentos n.ºs 21 e 22 do requerimento inicial; admissão pela Requerente quanto à falta de resposta às cartas (cfr. artigos 86.º a 93.º do requerimento inicial);
18. Em 17-03-2023, a Contrainteressada remeteu à entidade regional da RAN, através de correio eletrónico, ofício datado de 16-03-2023, de cujo teor se extrai, além do mais, o seguinte:
“ASSUNTO: Estudo de implementação da dessalinização na região do Algarve – Pedido de licenciamento (RAN)
A região do Algarve sofre, ao longo dos últimos anos, ciclos de seca prolongada associada a uma situação de escassez hídrica já considerada estrutural, resultando numa diminuição dos volumes de água armazenada nas várias origens disponíveis, estando esta situação a ser monitorizada pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e pelas Á..... (AdA).
Por forma a minimizar esta situação, diversos estudos apontam para o recurso à dessalinização de água do mar como uma das medidas estruturais possíveis para o reforço da capacidade de produção de água, tendo sido integrado nos investimentos do Plano de Recuperação e Resiliência 2021-2026 (PRR), na componente da gestão hídrica do Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve (PREHA), uma verba para projetos de melhoria da eficiência hídrica e processos de adaptação às alterações climáticas no Algarve, nomeadamente uma Estação Dessalinizadora de Água do Mar (EDAM).
O presente pedido diz respeito à componente da zona de implantação da EDAM e infraestruturas associadas.
Neste contexto, serve a presente para remeter o pedido de licenciamento no que se refere às interferências com a zona classificada como RAN.
(…)” – cfr. documentos n.ºs 25 e 26 juntos com a oposição da Contrainteressada;
19. Em 21-03-2023, entidade regional da RAN remeteu à Contrainteressada mensagem de correio eletrónico de cujo teor se extrai, além do mais, o seguinte:
“(…)
Em resposta ao seu email que nos mereceu a melhor atenção, somos a esclarecer o seguinte:
A Entidade Regional da Reserva Agrícola do Algarve (ER-RAN) é uma entidade de natureza colegial que só em sede de reunião, analisa e decide sobre os processos devidamente instruídos de acordo com a Portaria n.º 162/2011, de 18 de abril, e que anteriormente à reunião é feita uma visita ao local para recolha da informação tida como necessária para a referida análise do processo. Todavia, relativamente ao solicitado e no âmbito do que cabe informar por parte destes Serviços de Apoio Técnico da ER-RAN, cumpre esclarecer, relativamente à pretensão exposta, que a mesma poderá ter enquadramento legal e regulamentar no âmbito do disposto alínea L) do n.º 1 do artigo 22.º do Regime Jurídico da RAN (DL 199/2015, de 16 de setembro).
Tendo verificado que se encontram em falta vários elementos instrutórios, a fim de habilitar a ERRAN a decidir sobre o assunto, solicita-se que instrua o processo completo observando o disposto no artigo 1.º do Anexo I da Portaria n.º 162/2011, de 18 de abril, sendo os pedidos formalizados através de requerimento dirigido ao Presidente da ER-RAN, acompanhados dos documentos identificados no Anexo II, conforme modelo previsto no Anexo III (poderá consultar no site da DRAPAlgarve > Proteção da RAN ER-RAN > Minutas > Requerimento: https://drapalagarve.gov.pt/pt/servicose-produtos/servicos/protecao-da-ran-er-ran), mediante o pagamento prévio da respetiva taxa, conforme o consignado no Artigo 45.° do referido diploma:
- No valor de 89,22€ para uma área de ocupação até 500,00 m2.
- Para áreas de ocupação superiores a 500,00 m2, deverá contabilizar, por acréscimo aos 82.57€, mais 4,00€ por cada 100,00 m2 adicionais, arredondados à centena superior.
Salienta-se que se o pagamento se efetuar por meio de cheque, deve ser emitido a favor de I.G.C.P. - Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público.
Se proceder ao mesmo por transferência bancária, deverá fazê-lo para o IBAN: PT50…………….., devendo descriminar, no descritivo da transferência, o nome do requerente e a operação urbanística.
Mais se informa que em sede de reunião, a ER-RAN poderá solicitar qualquer documentação, porventura em falta, de acordo com o Anexo I da Portaria n.º 162/2011, de 18 de abril, assim como qualquer outra que considere importante para a análise do processo, conforme ponto 10 do Anexo II dessa mesma Portaria.”
– cfr. documento n.º 26 junto com a oposição da Contrainteressada;
20. Em 24-03-2023, a Contrainteressada remeteu à entidade regional da RAN, através de correio eletrónico, diversa documentação acompanhando ofício datado de 24-03-2023, de cujo teor se extrai, além do mais, o seguinte:
“ASSUNTO: Estudo de implementação da dessalinização na região do Algarve – Pedido de parecer prévio (RAN)
Na sequência da vossa comunicação eletrónica de 21 de março de 2023 11:37 e com vista à obtenção do pedido de parecer prévio, segue em anexo o requerimento e documentação legalmente exigida. (…)”
– cfr. documentos n.ºs 27 e 28 juntos com a oposição da Contrainteressada;
21. Por ofício datado de 29-06-2023, com carimbo de data de saída nele aposto de 06-072023, a entidade regional da RAN notificou a Contrainteressada para efeitos de audiência prévia, da deliberação tomada em reunião realizada em 30-06-2023, extraindo-se da respetiva ata – ata n.º 663/2023 –, além do mais, o seguinte:
“(…)
Requerente: Á....., SA - NIF: 5………
Artigo matricial n.°: R 1 BO;
Freguesia: Olhos de Água;
Concelho: Albufeira;
Descrição: Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.° ();
Área total: cento e vinte dois mil e seiscentos metros quadrados;
Pretensão: Construção de uma estação de tratamento de Água do Mar (EDAM) que ocupará a área de cento e vinte cinco metros quadrados.
A Entidade Regional da Reserva Agrícola Nacional (ora adiante, ER-RAN) é uma entidade colegial à qual cabe, entre outras competências, a emissão de parecer prévio vinculativo sobre as utilizações não agrícolas em áreas integradas na RAN, nos termos do art.º 33° e 34° do RJRAN, o qual deve ser requerido e emitido com respeito pelo estipulado no art.0 23° do RJRAN e no art.º 1º do Anexo I da Portaria n.° 162/2011, de 18 de abril.
Em face do pedido formulado pela Á....., SA, a Entidade procedeu a um estudo sintético sobre os procedimentos associados à construção da Estação de Dessalinização de Água do Mar do Algarve (EDAM), porquanto, logo prima facie, tem a ER-RAN o dever de se articular, entre outros pináculos ambientais e estratégicos, com “...o quadro estratégico e normativo estabelecido no Programa do Desenvolvimento Rural, no Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, na Estratégia Nacional para as Florestas, nos programas setoriais com incidência territorial e nos programas regionais...”, sendo “...uma das componentes da Rede Fundamental de Conservação da Natureza, favorecendo a conectividade entre as áreas nucleares de conservação da natureza e da biodiversidade integradas no Sistema Nacional de Áreas Classificadas.” (art. 5º RJRAN).
Neste contexto, por uma questão de coerência sistemática e teleologia, tentou apurar se estava em curso algum procedimento de natureza ambiental, para com ele se poder conformar, sem prejuízo do pleno e rigoroso exercício das suas competências.
Em especial, essa análise visou determinar se estava ou viria a estar em curso uma Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), porquanto a nova redação imposta ao RJRAN pelo Decreto-Lei 11/2023, insere nesse procedimento a emissão do parecer previsto no artigo 23° deste regime jurídico.
Destarte, sabendo que a EDAM se destina exclusivamente ao consumo humano, foram consultados os textos legais disciplinadores da AIA, neste âmbito da dessalinização de águas marítimas, em especial o Decreto-Lei 306/2007 e o Decreto-Lei 151 -B/2013, tendo apurado que (ao contrário de outras situações, como, por exemplo, a captação de águas subterrâneas ou a transferência de recursos hídricos entre bacias hidrográficas) a construção de uma estação de dessalinização de águas marítimas não se encontra expressamente prevista no leque das que implicam uma AIA obrigatória.
No entanto, todo o contexto em que se desenvolve tal infraestrutura, pelo seu impacto no meio onde incidirá, tornam mais que provável a prolação dessa AIA (veja-se que o próprio DL 151-B/2013 ressalva, logo no seu artigo 1º as zonas marítimas, sujeitando à Avaliação e prestando especial atenção, em matéria de critérios de seleção, à capacidade de absorção do ambiente natural, com especial atenção para as zonas costeiras e meios marinhos - Anexo III).
Foi, assim, sem grande surpresa que constatou, há poucas semanas, ter o Senhor Ministro do Ambiente e Ação Climática considerado justificada a construção da EDAM, citando os “...estudos realizados pela Águas de Portugal e que serão entregues para a avaliação de impacte ambiental...’’.
Também verificámos que existe já uma consulta/informação, ainda que preliminar em curso na CCDR do Algarve, com vista à elaboração do Estudo de Impacte Ambiental do projeto de EDAM.
Assim, neste contexto, atendendo ao estabelecido nos nºs 7 e 11 do citado artigo 23° do RJRAN, encontrar-se a ER-RAN inibida de proferir qualquer parecer a este propósito, devendo o mesmo ser emitido em sede da AIA, o que também se justifica em termos de coerência sistemática e teleológica
Nestes termos, deliberou a Entidade, por unanimidade, tencionar arquivar o procedimento e desta deliberação vai ser a Á....., SA notificada, para que, querendo, exerça o seu direito de audiência, ao abrigo do previsto nos artigos 121° e seguintes do CPA.
Importa, apenas, ao abrigo do estabelecido no artigo 11° do CPA, alertar para o facto de este requerimento haver sido formulado ao abrigo da alínea o) do n° 1 do artigo 22° do RJRAN, sendo as peças processuais construídas na perspetiva da aí invocada alínea l) do mesmo artigo, sendo mais curial, se prevalecer a presente proposta de decisão, que a promotora especifique, em sede própria, qual a base legal a que pretende subsumir o pedido.
(…)” – cfr. documento n.º 30 junto com a oposição da Contrainteressada;
22. Em 19-07-2023, a Contrainteressada apresentou junto da Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. (APA, I.P.) formulário e documentos, incluindo estudo de impacto ambiental (EIA) e projeto, em fase de estudo prévio, tendo em vista iniciar procedimento de AIA relativamente ao projeto da “Estação de Dessalinização de Água do Mar do Algarve” em fase de estudo prévio – cfr. documento n.º 12 junto com a oposição da Contrainteressada;
23. Por ofício datado de 09-08-2023, com carimbo de data de saída nele aposto de 10-082023, a entidade regional da RAN notificou a Contrainteressada da deliberação tomada em reunião realizada em 04-08-2023, no sentido do arquivamento do processo, com os fundamentos constantes da ata n.º 663/2023 – cfr. documento n.º 31 junto com a oposição da Contrainteressada;
24. A APA, I.P., enquanto autoridade de AIA, nomeou uma Comissão de Avaliação (CA) constituída pelas seguintes entidades: APA, I.P.; Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve (CCDR – Algarve); Património Cultural, I.P.; Administração Regional de Saúde do Algarve, I.P.; Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P.; Laboratório Nacional de Energia e Geologia, I.P.; Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos; Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto e Centro de Ecologia Aplicada Prof. Baeta Neves do Instituto Superior de Agronomia – cfr. documento n.º 13 junto com a oposição da Contrainteressada (p. 1);
25. Em 27-10-2023 foi emitida declaração de conformidade do EIA – cfr. documento n.º 13 junto com a oposição da Contrainteressada (p. 2);
26. Entre 06-11-2023 e 19-12-2023, decorreu o período de consulta pública, no decurso do qual a Requerente apresentou pronúncia, pugnando pela emissão de uma declaração de impacte ambiental negativa – cfr. documento n.º 13 junto com a oposição da Contrainteressada (p. 2) e documentos n.ºs 15 e 16 juntos com o requerimento inicial;
27. No decurso do procedimento de AIA foram solicitados pareceres a entidades externas à CA, em particular à Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, à Administração dos Portos de Sines e do Algarve, S.A., às Câmaras Municipais de Loulé e de Albufeira, bem como à Autoridade Marítima Nacional / Capitania do Porto de Portimão – cfr. documento n.º 13 junto com a oposição da Contrainteressada (p. 67);
28. Em 21-12-2023, a Contrainteressada, emitiu, através do seu Conselho de Administração, uma resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação, com carácter urgente, dos prédios identificados no ponto 1., revogando a resolução emitida em 08-03-2023, a que se refere o ponto 16., nos seguintes termos:
“A Comissão Executiva da sociedade Á....., S.A., empresa concessionária do Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água e de Saneamento do Algarve, criado pelo Decreto-lei n.° 93/2019, de 15.07, na reunião de 21 de dezembro de 2023, deliberou requerer, ao abrigo do disposto no n.° 1 do artigo 10.° do Código das Expropriações (aprovado pela Lei n.° 168/99, de 18.09., na sua redação atual), e do Decreto-Lei n.° 15/2021, de 23.02., na redação que lhe foi conferida pela Lei n.° 5/2023, de 20.01, conjugados com o disposto na Base XVIII das Bases da Concessão (aprovadas em anexo ao regime jurídico da construção, exploração e gestão dos sistemas multimunicipais de captação e tratamento de água para consumo público, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 319/94, de 24.12, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.° 195/2009, de 20.08), bem como com o disposto na Cláusula 29.ª do Contrato de Concessão do Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água e de Saneamento do Algarve, assinado a 24.07.2019, a expropriação total dos seguintes prédios:
a) Parcela 1 - Prédio rústico, com área de 122 600m2, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo n.° 1 da secção BO, sito na União das Freguesias de Albufeira e Olhos de Água, omisso na Conservatória do Registo Predial de Albufeira, que confronta a norte com EN 526 e Ribeira de Quarteira, a Sul com H…………e outro, a Nascente com P…………e H…………..e a Poente com J…………..e H…………, de acordo com a planta parcelar e com a planta cadastral com os limites do prédio, que constam em anexo à presente deliberação;
b) Parcela 2 - Prédio rústico, com área de 2 400m2, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo n.° 2 da secção BO, sito na União das Freguesias de Albufeira e Olhos de Água, descrito Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o número 1....., que confronta a norte com Senhoras Moreiras, a Sul com H……e outro, a Nascente e Poente com Senhoras Moreiras, de acordo com a planta parcelar e com a planta cadastral com os limites do prédio, que constam em anexo à presente deliberação. (de ora em diante, conjuntamente designados por "Prédios")
Os Prédios são as parcelas necessárias à construção das infraestruturas e equipamentos que compõem o Sistema de Dessalinização para a Região do Algarve e que consistem, designadamente, numa central de dessalinização de água do mar, nas respetivas infraestruturas de captação e rejeição e numa central fotovoltaica associada, e cuja execução se revela necessária e urgente, tendo em vista a necessidade premente de suprir as dificuldades atualmente sentidas quanto à quantidade de água disponível para abastecimento e, bem assim, melhorar a qualidade deste.
A concretização do Sistema de Dessalinização é preconizada como uma das principais medidas previstas no Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve (PREHA), cuja elaboração foi determinada pelo Despacho n.° 443/2020, do Ministro do Ambiente e da Ação Climática, da Ministra da Agricultura e da Secretária de Estado do Turismo, publicado no Diário da República n.° 9/2020, 2.ª Série, de 14 de janeiro, sob a coordenação da Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. (APA) e da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR), reputando-se essencial para dotar a região do Algarve da resiliência hídrica necessária para fazer face às perspetivas futuras de alterações climáticas e à atualmente sentida escassez de água, a qual se prevê que se venha agravar nos próximos anos.
De facto, a região do Algarve tem vindo a registar episódios de seca hidrológica cada vez mais frequentes, sendo expectável, como resulta dos estudos que serviram de base à elaboração do PREHA, que a situação venha a ser agravada pelas alterações climáticas, com impacto significativo na distribuição temporal e espacial dos recursos hídricos, na qualidade da água e no aumento da frequência e da intensidade dos períodos de seca, com os inerentes constrangimentos em matéria de abastecimento de água e repercussões nos domínios de todas as atividades económicas desenvolvidas, em especial da agricultura e do turismo.
O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), aprovado pela Decisão de Execução do Conselho da União Europeia, de 13 de julho de 2021, prevê, entre outras medidas de natureza estratégica para a salvaguarda dos recursos hídricos em território nacional, a construção de uma estação de dessalinização de água do mar que complemente as outras medidas de reforço da oferta e que permita modularidade e a possibilidade de incrementos adicionais de disponibilidade de água, para mitigação de riscos futuros.
Em 12 de novembro de 2021, foi celebrado um contrato de financiamento entre a Estrutura de Missão Recuperar Portugal e a empresa Á....., S.A., enquanto beneficiária direta, para a realização do investimento relativo ao "Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve" (código RE009-i0I.04), no quadro de execução do PRR, contemplando a submedida «SM6 - Promover a dessalinização de água do mar».
Dado que os investimentos relativos à concretização da mencionada submedida 6 da componente 9 do PRR, bem como à implementação do Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve, visam o reforço do abastecimento de água à região do Algarve, criando, reforçando e melhorando as fontes e condições do serviço de abastecimento de água para consumo público, enquadrando-se plenamente no objeto da concessão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Algarve e nos objetivos de serviço público estabelecidos na Cláusula 8.ª, n.° 1 , do contrato de concessão, através do Despacho n.° 87/SEAMB/2023, do Secretário de Estado do Ambiente, de 6 de novembro de 2023, foi reconhecida a necessidade urgente de realização do investimento relativo à concretização do Sistema de Dessalinização e determinado à concessionária Á....., S.A., que obtivesse as autorizações e aprovações exigíveis e promovesse a tramitação dos procedimentos de contratação pública que se mostrem necessários para a consecução dos investimentos em causa, visando o cumprimento dos marcos e das metas previstas no contrato de financiamento celebrado com a Estrutura de Missão Recuperar Portugal.
Cumprimento dos marcos e das metas previstas no contrato de financiamento celebrado em 12 de novembro de 2021 com a Estrutura de Missão Recuperar Portugal;
Assim, o sistema de Dessalinização da Região do Algarve, a que a presente resolução de expropriar se refere, consiste num projeto (e num investimento) integrado no PRR, comparticipado a 100% através do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, cuja concretização se afigura premente, tendo em conta as necessidades urgentes em suprir as dificuldades atuais ao nível da quantidade de água disponível e em melhorar a qualidade deste.
Nesta medida, e por força por força do disposto nos artigos 1.° e 2.° do Decreto-Lei n.° 15/2021, de 23.02., na redação que lhe foi conferida pela Lei n.° 5/2023, de 20.01., ao procedimento de expropriação dos Prédios será aplicado o regime especial de expropriação e constituição de servidões administrativas previsto no citado diploma legal, aplicando-se o Código das Expropriações em tudo o que não se encontrar nele previsto.
Como tal, e pelo facto de se revelar fundamental para permitir a construção de equipamentos e infraestruturas no âmbito de um investimento a realizar no quadro do PRR, a expropriação aqui em causa é considerada, de acordo com o n.° 1 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 15/2021, de 23.02., de utilidade pública e apresenta caráter de urgência reconhecido pelo diploma
Não obstante o caráter urgente da presente expropriação – facto que habilitaria, nos termos da lei, a entidade expropriante a dispensar a fase de tentativa de aquisição por via do direito privado -, o Conselho de Administração da sociedade Á....., S.A., depois de ponderar os interesses relevantes em presença, considera dever ser observada, por se revelar adequada e proporcional, a fase de tentativa de aquisição por via do direito privado, nos termos dos artigos 10.°, n.° 5 e 11.º, n.° 2, do Código das Expropriações. De facto, o período necessário para a concretização da referida fase, só por si, não compromete a realização do projeto nem o financiamento comparticipado através do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, podendo, aliás, consubstanciar um meio mais célere — na medida em que seria objeto de um acordo — para a aquisição dos Prédios.
O titular do direito de propriedade de ambos os Prédios é a sociedade S..... - COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS, S.A., sociedade anónima com capital social de 50 000,00€, com o NIPC 5…, com sede na Urbanização Pi………, Zona A I Pinhal do Concelho, 8200847 Albufeira. Desconhecem-se outros interessados para efeitos da alínea b) do n.° 1 e do n.° 5 do artigo 10.° do Código das Expropriações.
O montante total dos encargos a suportar com a expropriação é de 634 022.50€ (seiscentos e trinta e quatro mil e vinte e dois euros e cinquenta cêntimos), o qual foi calculado, nos termos da legislação aplicável, através de avaliação dos Prédios realizada por perito da lista oficial, conforme resulta do relatório anexo, que faz parte integrante da presente resolução, tendo sido apurados os seguintes valores por cada uma das parcelas:
- Parcela I: 624 905.50€ (seiscentos e vinte e quatro mil novecentos e cinco euros e cinquenta cêntimos);
- Parcela 2: 9 117.00€ (nove mil cento e dezassete euros)
Os Prédios situam-se na área do concelho de Albufeira, estando abrangidos pelo Plano Diretor Municipal (PDM) de Albufeira, nos termos do qual os solos de ambas as parcelas classificam-se como rústicos e são qualificados como "Espaços de Recursos Naturais e de Equilíbrio Ambiental" (cf. com artigos 19.° e seguintes do Regulamento do PDM de Albufeira), estando integrados em "Zona de Uso Agrícola" e "Zona Agrícola Condicionada" — conforme, respetivamente, artigos 21.° e 23.° do Regulamento do PDM de Albufeira.
Nos termos do artigo 21.° do Regulamento do PDM de Albufeira, a "Zona de Uso Agrícola" é constituída pelos solos com capacidade, existente ou potencial, de uso agrícola, tendo especialmente em vista a produção de bens alimentares, sendo proibido o desenvolvimento de atividades e a realização de obras ou ações que diminuam ou destruam as suas potencialidades. Por sua vez, de acordo com o artigo 23.° do referido Regulamento, a Zona Agrícola Condicionada integra solos com capacidade, existente ou potencial, de uso agrícola, tendo especialmente em vista a produção de bens alimentares, e que evidencia também grande valor ecológico, importante para a estabilidade e perenidade dos sistemas naturais e da qualidade do ambiente em geral. A ambos são aplicáveis as regras constantes no anexo IV do Regulamento do PDM, desde que respeitadas as disposições derivadas das servidões e restrições de utilidade pública em vigor.
Deve, ainda, ser assinalado que a Parcela 1 é, ainda, abrangida pelas condicionantes "Reserva Agrícola Nacional" (RAN) e "Reserva Ecológica Nacional" (REN). A Parcela 2 integra apenas solos pertencentes à Reserva Agrícola Nacional (RAN).
O Conselho de Administração aprovou, ainda, as plantas parcelares e o mapa de expropriação que constituem anexos à resolução de expropriar, com a identificação dos proprietários, dos bens a expropriar, do seu enquadramento à luz do PDM de Albufeira e, bem assim, do valor das indemnizações devidas.
Nos termos do artigo 165.°, n.° 1, do Código do Procedimento Administrativo, a presente resolução determina a revogação da resolução de expropriar aprovada em 8 de março de 2023 pelo Conselho de Administração da Á....., S.A.”
– cfr. documento n.º 6 junto com o requerimento inicial e documento n.º 17 junto com a oposição da Contrainteressada;
29. Em data não concretamente apurada, mas situada entre 21-12-2023 e 27-12-2023, a Contrainteressada remeteu à Requerente, através de carta registada com aviso de receção rececionada em 27-12-2023, ofício datado de 21-12-2023 com vista à notificação da resolução referida no ponto antecedente e apresentação de uma proposta de aquisição dos prédios identificados no ponto 1. pelo montante global de 634.022,50 € – cfr. documento n.º 6 junto com o requerimento inicial e documentos n.ºs 20 e 21 juntos com a oposição da Contrainteressada;
30. Por carta datada de 24-01-2024, a Requerente notificou a Contrainteressada da rejeição da proposta de aquisição dos seus prédios, manifestando igualmente discordar do montante oferecido por esta última para aquisição daqueles – cfr. documento n.º 23 junto com o requerimento inicial e documento n.º 22 junto com a oposição da Contrainteressada;
31. Em 16-02-2024, através do anúncio do procedimento n.º 2530/2024, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 34, a Contrainteressada lançou um concurso público com publicidade internacional, para a celebração de contrato designado por “Conceção, Construção e Exploração do Sistema de Dessalinização da Região do Algarve” com o seguinte objeto, descrito no referido anúncio:
“O contrato misto tem por objeto a empreitada de "Conceção, Construção e Exploração do Sistema de Dessalinização na Região do Algarve", incluindo as atividades relacionadas com a elaboração de todas as peças escritas e desenhadas do Projeto de Execução da "Obra" a executar, incluindo os desenhos de detalhe (montagem e construção) e os projetos de todas as especialidades envolvidas (construção civil, obra marítima, equipamentos mecânicos, eletromecânicos, elétricos e instrumentação, instalações elétricas, automação e supervisão, arquitetura, o Plano de Segurança e Saúde (PSS), o Plano de Gestão Ambiental (PGA), o Plano de Prevenção e Gestão de Resíduos da Construção e Demolição (PPGRCD), entre outros. Inclui igualmente a elaboração dos elementos a entregar em fase de RECAPE, conforme descrito na DIA do Sistema de Dessalinização na Região do Algarve e a implementação e observância das mediadas constantes da DIA, quer durante a fase de construção, quer durante a fase de "Arranque" da instalação e até à sua Receção Provisória, de acordo com o Caderno de Encargos, nomeadamente as mencionadas para o licenciamento ou autorização do projeto, assim como as apresentadas em fase de RECAPE. O contrato misto inclui igualmente a fase de exploração do Sistema de Dessalinização na Região do Algarve.”
– cfr. documento n.º 32 junto com a oposição da Contrainteressada;
32. A subcláusula 5.2.1 do caderno de encargos relativo ao procedimento concursal referido no ponto antecedente, inserida na cláusula 5.2, intitulada de “COMPONENTES DO OBJETO DA EMPREITADA”, tem o seguinte teor:
“A empreitada de conceção-construção inclui: (…) Sondagens prévias à realização do Projeto de Execução, para identificação / confirmação em planta e em perfil, da totalidade dos Serviços Afetados pela “Obra” (incluindo a localização exata do Adutor Oriental-Final da Á....., S.A. (AdA), onde será efetuada a ligação / introdução da conduta que irá transportar a água tratada proveniente da EDAM), bem como todas as sondagens e prospeções complementares que se revelem necessárias para o desenvolvimento do projeto”
– cfr. documento n.º 33 junto com a oposição da Contrainteressada;
33. Do teor da cláusula 7 do caderno de encargos relativo ao procedimento concursal referido no ponto 31., intitulada de “PRAZOS DE EXECUÇÃO” extrai-se, além do mais, o seguinte:
“7.1 PRAZO DE EXECUÇÃO DA EMPREITADA
7.1.1 O prazo de execução da empreitada de conceção-construção é de 2210 (dois mil duzentos e dez) dias, compreendendo os seguintes prazos:
a) 90 (noventa) dias para a elaboração e aprovação do Projeto de Execução, contados a partir da data de assinatura do Contrato.
b) 1025 (mil e vinte e cinco) dias para a execução da “Obra”, contados a partir da data da Consignação ou da data de aprovação do PSS, caso esta ocorra em data posterior, até à Receção Provisória.
c) 1095 (mil e noventa e cinco) dias, para a “Exploração”, a contar da data da Receção Provisória, em conformidade com o estabelecido na cláusula 41.3.2
7.2 PRAZOS PARCIAIS
7.2.1 Para além do prazo de execução da empreitada, fixado anteriormente, consideram-se como vinculativos os seguintes prazos parciais:
a) 630 (seiscentos e trinta) dias, para a execução integral de todos os trabalhos de construção definidos nas cláusulas 5.2.3 a 5.2.6 e 5.2.9.1, relativos à “Obra”, incluindo a realização dos trabalhos relativos ao “Comissionamento”, até à data de “Pronta para Pré-arranque”, contados a partir da data da “Consignação” ou da data de aprovação do PSS, caso este ocorra em data posterior;
b) 30 (trinta) dias, para a realização do “Pré-arranque”, a contar do termo do prazo parcial previsto na alínea anterior (“Pronta para Pré-arranque”), em conformidade com o estabelecido na cláusula 41.2.1;
c) 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias, para a realização do “Arranque”, a contar do termo do prazo parcial previsto na alínea anterior (“Pronta para Arranque”), em conformidade com o estabelecido na cláusula 41.3.2.
7.2.2 O prazo referido na alínea c) da cláusula 7.2.1, para a realização do “Arranque”, pode ser reduzido, mediante comunicação do Dono de Obra enviada ao Empreiteiro, com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias em relação à data de produção de efeitos do termo do período de “Arranque”.
7.2.3 O Dono de Obra pode efetuar a comunicação referida no número anterior a partir do 183.º dia do período estabelecido para a realização do “Arranque”, desde que verificadas todas as garantias constantes da Declaração de Garantias de Processo de Tratamento, apresentada na proposta adjudicada (…)”
– cfr. documento n.º 33 junto com a oposição da Contrainteressada;
34. Por ofício datado de 27-02-2024, a Contrainteressada remeteu ao Secretário de Estado do Ambiente requerimento de declaração de utilidade pública da expropriação dos prédios identificados no ponto 1., com carácter de urgência, acompanhado de diversa documentação, incluindo um mapa de trabalhos – cfr. fls. 12 a 14, 17v e 23 do PA;
35. Em 14-03-2024 foi emitido parecer pela CA, de cujo teor se extrai, além do mais, o seguinte:
“(…)
O projeto em causa encontra-se sujeito a procedimento de AIA, de acordo com o definido nas seguintes disposições do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, na sua redação atual:
“…nos termos do ponto i), da alínea b), do n.º 3 do artigo 1.º, pelo facto de o projeto se encontrar tipificado na alínea f) do n.º 10 do Anexo II, por envolver a Construção de aquedutos e adutoras com mais de 10 Km de extensão”
(…)
5.6. ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E CONDICIONANTES AO USO DO SOLO
(…)
Servidões administrativas e restrições de utilidade pública
Quanto às principais servidões administrativas e restrições de utilidade pública (SRUP) com incidência na área de estudo e que, de alguma forma, podem atuar como fatores preponderantes à sua execução:
• Domínio Público Hídrico;
• Reserva Agrícola Nacional;
• Reserva Ecológica Nacional;
• Perigosidade de Incêndio Florestal;
• Rede Elétrica;
• Rede Rodoviária;
• Rede de Saneamento.
(…)
Reserva Agrícola Nacional (RAN)
A área de estudo do projeto interseta várias manchas de RAN, que no total representam cerca de 135 ha.
No quadro abaixo apresenta-se a interseção das componentes do projeto com a RAN, para as alternativas 1 e 2:
Imagem no original
Em termos de enquadramento legal, importa salvaguardar que o Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, veio alterar o n.º 7 do artigo 23.º do regime jurídico da Reserva Agrícola Nacional, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 73/2009, de 31 de março, dispondo que “…Quando a utilização esteja sujeita a procedimento de avaliação de impacte ambiental ou de avaliação de incidências ambientais em fase de projeto de execução, o parecer favorável, expresso ou tácito, no âmbito desse procedimento, incluindo na fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, dispensa qualquer parecer.”. Importa salientar o seguinte:
• É reconhecido o interesse público do projeto, que se encontra identificado no Plano Regional de Eficiência Hídrica da Região do Algarve, como uma medida estrutural para reforçar a capacidade de produção de água, que complemente outras medidas de reforço de oferta na região.
• Analisados os elementos que constam no EIA percebe-se que a localização da Estação de Dessalinização de Água do Mar (EDAM) obedece a critérios técnicos relacionados com a existência na zona envolvente de infraestruturas da Á..... S. A, nomeadamente o Adutor Oriental-Final onde será feita a introdução da água tratada.
• As alternativas propostas para o traçado das condutas, encontram-se devidamente fundamentadas, concluindo-se que a alternativa 2 é a que apresenta menores impactes em áreas RAN, quer em termos de capacidade de uso dos solos quer de área total abrangida.
Impactes Cumulativos
Foram avaliados os eventuais impactes cumulativos análogos aos gerados por outros projetos existentes ou aprovados para a região, nomeadamente sobre o projeto da ‘Nova Área de Atracação no Anteporto de Vilamoura’, sendo referidos os efeitos cumulativos com as operações de dragagem necessárias à instalação dos circuitos (quer de captação de água bruta, quer de rejeição de salmoura), tendo sido considerado um impacte pouco relevante, que deverá merecer maior atenção em fase de projeto de execução. Foram igualmente referidos os projetos de centrais fotovoltaicas existentes (Ferreiras, Alvalades e Apra) mais próximas da área de estudo, bem como o consumo energético e a produção de resíduos.
5.6.1. CONCLUSÃO
Face ao exposto, considera-se que pode ser emitido parecer favorável condicionado às disposições contidas no final deste parecer. (…)”
– cfr. documento n.º 13 junto com a oposição da Contrainteressada (pp. 1, 34, 36 e 37);
36. Em 03-04-2024 foi emitida declaração de impacte ambiental (DIA) condicionada, de cujo teor se extrai, além do mais, o seguinte:
“(…) Descrição sumária do projeto (…)
O sistema de dessalinização a implementar em primeira fase deve permitir a produção de 500 L/s = 1.800 m3/h = 43.200 m3/dia de água potável. O sistema ficará preparado para ser ampliado, através da instalação futura dos equipamentos necessários para a produção de 750 L/s = 2.700 m3/h = 64.800 m3/dia de água potável. Toda a construção civil ficará já preparada para o caudal futuro.
(…) Condicionantes 1. Desenvolver o projeto de execução da Estação de Dessalinização de Água do Mar do Algarve de acordo com a Alternativa 2 do estudo prévio. Elementos a apresentar Relatório de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução (RECAPE)
O RECAPE deve integrar todos os elementos indicados no ponto II do documento orientador intitulado "Normas técnicas para a elaboração de Estudos de Impacte Ambiental e Relatórios de Conformidade Ambiental com o Projeto de Execução", aprovado pelo Grupo de Pontos Focais das Autoridade de AIA e disponível no sítio da APA na internet.
Além de todos os dados e informações necessários à verificação do cumprimento das exigências da presente decisão aplicáveis ao projeto da linha elétrica, o Relatório de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução (RECAPE) deve ainda conter ou ser acompanhado dos seguintes elementos:
(…)
5. 5. Ratificação de que a solução construtiva apresentada para a captação e rejeição não sofrerá interferência no seu funcionamento e estabilidade estrutural, por se encontrarem às profundidades de 10m (ZH) e -7,5 m (ZH) respetivamente, onde a movimentação de sedimentos no fundo eventualmente ainda se pode fazer sentir. Por princípio de precaução, pode haver a necessidade de ponderar sobre opções em que a profundidade de implantação das estruturas de captação e rejeição sejam superiores às apresentadas. As questões relacionadas com a profundidade de fecho e a influência que esta pode ter no funcionamento do sistema devem ser desenvolvidas em RECAPE. em capítulo próprio. (…)
12. Estudo geotécnico, justificativo de que as perfurações propostas para a instalação dos circuitos não colocam em causa as funções da REN identificadas e que demonstre que a perfuração necessária para a instalação das condutas garantirá a manutenção da estabilidade da arriba. (…)”
– cfr. documento n.º 11 junto com a oposição da Contrainteressada (pp. 1, 2, 28 e 29);
37. Em 02-07-2024, a Ministra do Ambiente e Energia proferiu o seguinte Despacho (n.º 8177/2024), publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 141, de 23-07-2024, com o sumário “Declaração de utilidade pública da expropriação de 125 000 m2, com caráter de urgência, necessária à construção da Estação de Dessalinização de Água do Mar e do Parque de Energias Renováveis (central fotovoltaica) que integram o «Sistema de Dessalinização na Região do Algarve»”:
“Com vista à construção das infraestruturas e equipamentos que compõem o «Sistema de Dessalinização na Região do Algarve», em particular a Estação de Dessalinização de Água do Mar e o Parque de Energias Renováveis (central fotovoltaica), veio a sociedade Á....., S. A., na qualidade de concessionária da exploração e gestão do Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água e de Saneamento do Algarve, criado pelo Decreto-Lei n.° 93/2019, de 15 de julho, requerer a declaração de utilidade pública para a expropriação, com caráter de urgência, das parcelas identificadas no mapa de expropriações e plantas parcelares anexas ao presente despacho, no sentido de lhe ser concedida a posse administrativa das mesmas, com caráter de urgência.
As infraestruturas em causa reputam-se vitais para a implementação do «Sistema de Dessalinização na Região do Algarve» e visam a garantia de abastecimento de água potável, sendo essenciais para dotar a região da resiliência hídrica necessária para fazer face às perspetivas futuras de alterações climáticas e à atualmente sentida escassez de água, a qual se prevê que se venha agravar nos próximos anos.
O Sistema de Dessalinização constitui uma medida de natureza estratégica para a salvaguarda dos recursos hídricos em território nacional, encontrando-se prevista no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), aprovado pela Decisão de Execução do Conselho da União Europeia de 13 de julho de 2021 — submedida «SM6 — Promover a dessalinização de água do mar» do Investimento C09.101 Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve.
O presente despacho não obsta ao necessário cumprimento da demais legislação e regulamentação aplicáveis e da obtenção de quaisquer autorizações necessárias.
Assim, ao abrigo das competências cometidas nos termos do artigo 25.° do Decreto-Lei n.° 32/2024, de 10 de maio, nos termos e para os efeitos do n.° 2 do artigo 13.°, da alínea a) do n.° 1 do artigo 14.°, e do artigo 15.°, todos do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.° 168/99, de 18 de setembro, na sua atual redação, bem como do n.° 1 do artigo 2.° e da alínea a) dos n.ºs 1 e 4 do artigo 3.°, todos do Decreto-Lei n.° 15/2021, de 23 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.° 5/2023, de 20 de janeiro, e com base nos fundamentos constantes da Informação n.° 1005449202404-ARHALG. DPI, da Agência Portuguesa do Ambiente, I. P., determino o seguinte:
1 – A declaração de utilidade pública da expropriação de 125 000 m2, somatório das áreas das parcelas de terreno identificadas no mapa de expropriações e nas plantas parcelares, anexas ao presente despacho e que dele fazem parte integrante, as quais são necessárias à construção, exploração e manutenção da Estação de Dessalinização de Água do Mar e do Parque de Energias Renováveis (central fotovoltaica) que integram o «Sistema de Dessalinização na Região do Algarve».
2 – O reconhecimento do caráter de urgência do processo de expropriação, em conformidade com o artigo 15.° do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.° 168/99, de 18 de setembro, na sua atual redação, e com o n.° 1 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 15/2021, de 23 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.° 5/2023, de 20 de janeiro, o que confere, de imediato, à empresa Á....., S. A., autorização para tomar a posse administrativa dos bens a expropriar, nos termos dos artigos 19.° e seguintes do Código das Expropriações, na sua atual redação, e do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 15/2021, de 23 de fevereiro, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.° 5/2023, de 20 de janeiro.
3 – Os encargos com a indemnização em causa serão suportados pela empresa Á....., S. A., para os quais dispõe de cobertura financeira, podendo o mapa e a planta referidos no n.° 1 ser consultadas na sede da sociedade Á....., S. A., sita Rua do R….., n.° 10, 8000-302 Faro, nos termos previstos na Lei n.° 26/2016, de 22 de agosto, na sua atual redação, que aprova o regime de acesso à informação administrativa e ambiental e de reutilização dos documentos administrativos.”
– cfr. documento n.º 7 junto com o requerimento inicial e fls. 7 e 8 do PA;
38. Por ofício datado de 24-07-2024, remetido através de carta registada com aviso de receção, a Contrainteressada notificou a Requerente do despacho referido no ponto antecedente e reiterou a proposta de aquisição dos prédios desta pelo montante global de 634.022,50 € – cfr. documento n.º 24 junto com o requerimento inicial;
39. Por ofício datado de 25-07-2024, remetido através de carta registada com aviso de receção, a Contrainteressada notificou a Requerente da designação da data para realizar a vistoria “ad perpetuam rei memoriam” (05-08-2024) e do perito nomeado para o efeito pela Presidente do Tribunal da Relação de Évora – cfr. documento n.º 25 junto com o requerimento inicial e documento n.º 23 junto com a oposição da Contrainteressada;
40. Por carta registada datada de 13-08-2024, em resposta ao ofício datado de 24-07-2024, a que se refere o ponto 38., a Requerente notificou a Contrainteressada da rejeição da proposta de aquisição dos seus prédios, manifestando igualmente discordar do montante oferecido por esta última para aquisição daqueles – cfr. documento n.º 24 junto com a oposição da Contrainteressada;
41. Em 22-10-2024, foi celebrado o contrato relativo ao procedimento concursal referido no 31. – cfr. por consulta ao endereço da internet: https://recuperarportugal.gov.pt/2024/10/23/adjudicada-dessalinizadora-do-algarve/.* Factos Não Provados
Com relevo para a decisão da causa, inexistem. * Motivação da Decisão de Facto
A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados indiciariamente provados, resultou do exame crítico do processo administrativo (cuja veracidade não foi colocada em crise), dos documentos juntos aos autos pelas partes, não impugnados, do endereço da internet constante do ponto 41. do probatório, bem como da posição assumida pelas partes nos seus articulados, tal como especificado nos vários pontos do probatório.
Foram considerados, para além dos factos articulados pelas partes, aqueles que, sendo deles instrumentais, resultaram igualmente provados por recurso aos meios de prova supra discriminados (cfr. artigo 5.º n.º 2 alínea a) do CPC).».
Entende a Recorrente que o tribunal recorrido errou ao considerar que a DUP não padece dos vícios que lhe imputou: nulidade por falta de parecer da ERRAA, nos termos do artigo 38º do RJRAN; nulidade nos termos do artigo 22º do RJAIA; e anulabilidade por violação do princípio da proporcionalidade; concluindo que a procedência do recurso deve determinar este Tribunal a antecipar a decisão da acção principal por se verificarem os pressupostos para o efeito, previsto no artigo 121º do CPTA.
Ainda que apresentada como “uma alternativa” que este Tribunal deve adoptar quando considerar verificado o requisito do fumus boni iuris, em vez de conhecer, em substituição, dos demais requisitos exigidos no artigo 120º do CPTA, a antecipação da decisão da causa principal é formulada como pedido principal no termo das alegações e conclusões de recurso, sendo o decretamento da providência apenas um pedido subsidiário.
Razão pela qual se impõe começar por esclarecer que este pedido extravasa manifestamente o objecto do recurso que é a decisão recorrida, isto é, a sentença de improcedência da providência cautelar requerida, proferida em 30.11.2024, pelo TAF de Loulé.
Sobre a antecipação da decisão da acção principal nada consta na sentença recorrida.
Compulsados os autos da providência não se encontra qualquer pedido das partes a requerer a antecipação da decisão da causa principal ou despacho do juiz a quo a suscitar a questão oficiosamente, que o pudesse ter constituído no dever de decidir da referida antecipação, quanto mais a proferir sentença que decida a acção principal.
A prolação de decisão cautelar pressupõe, desde logo, que a faculdade prevista no referido artigo 121º não foi usada pelo juiz a quo, o único (titular da providência e da acção) a quem competia fazê-lo.
Dito de outro modo, o juiz titular do processo cautelar, a pedido das partes ou por sua iniciativa, desde que dê o contraditório a quem ainda não se tenha pronunciado e se verifiquem os pressupostos exigidos para o efeito, pode decidir antecipar a decisão da acção principal, proferindo sentença que, em vez de decidir a providência cautelar requerida, de acordo com os critérios previstos no artigo 120º do CPTA, conhece do mérito da pretensão deduzida nessa acção, nos próprios autos do processo cautelar.
Ou seja, se o juiz antecipa a decisão da acção principal, não decide a providência cautelar [cuja finalidade - assegurar a utilidade da sentença de procedência a proferir na acção principal, atenta a demora perspectivada desta – deixa, assim, de se verificar]. Se julga a providência cautelar é porque não antecipou a decisão da acção principal, que acontecerá, como é regra, nos respectivos autos, com tramitação autónoma, sujeito a normas e visando finalidade, distintas das do processo cautelar.
Em sede de recurso e tendo por referência tão só o decidido na sentença recorrida [que consubstancia o respectivo objecto], este tribunal ad quem apenas poderá, se concluir pelo preenchimento do requisito do fumus boni iuris, determinar a sua revogação e, se o estado dos autos o permitir, conhecer, em substituição, primeiro, do periculum in mora e, a verificar-se este, do da ponderação dos interesses em presença, requisitos cujo conhecimento o tribunal a quo considerou prejudicado por serem de verificação cumulativa, bastando, por isso, a falta de um para que a providência requerida não possa ser adoptada.
Donde, sem necessidade de mais considerandos, é manifesto que, independentemente do que vier a ser decidido sobre o mérito do recurso, o pedido de antecipação da decisão da acção principal, deve ser indeferido por processualmente inadmissível.
A sentença recorrida julgou a providência requerida improcedente, por não verificação do requisito do fumus boni iuris, extraindo-se da respectiva fundamentação o seguinte quanto à alegada nulidade da DUP por falta de parecer prévio vinculativo da autoridade regional da RAN, nos termos dos artigos 23º e 38º do RJRAN:
«Do fumus boni iuris
[…]
i) Falta de parecer da autoridade da RAN
A Requerente alega, brevitatis causae, que:
- Estando os seus prédios, objeto do ato suspendendo, localizados em áreas RAN, a afetação dos mesmos a utilizações não agrícolas, como é o caso da implementação do sistema de dessalinização de água do mar da região do Algarve, pretendida pela Contrainteressada, depende, para além do cumprimento dos pressupostos enumerados no artigo 22.º do RJRAN, da obtenção prévia de parecer vinculativo da autoridade regional da RAN, nos termos previstos no artigo 23.º n.º 1 do RJRAN. Daí conclui que a ausência de tal parecer previamente à emissão da DUP, a torna nula bem como todos os atos que se lhe seguirem, nos termos do artigo 38.º do RJRAN;
- O referido parecer só pode ser dispensado nos termos do artigo 23.º n.º 7 do RJRAN, se tiver sido emitido parecer favorável, expresso ou tácito, da autoridade regional da RAN no âmbito do procedimento de AIA em fase de projeto de execução;
- No caso sub judice não foi emitido qualquer parecer pela autoridade regional da RAN, seja previamente seja no âmbito do procedimento de AIA;
- Ainda que o dito parecer tivesse sido emitido em sede de AIA, o que não aconteceu, não teria qualquer valor, não estando reunidas as condições para operar a dispensa de parecer, nos termos do artigo 23.º n.º 7 do RJRAN, pois a AIA ocorreu em fase de estudo prévio, sem que tenha existido verificação da conformidade ambiental entre a DIA e o projeto de execução;
- A DUP padece de dupla ilegalidade: por um lado, de um vício de forma, por preterição de uma formalidade essencial e, por outro lado, de um vício orgânico, pelo facto de a Entidade Requerida ter ultrapassado a esfera de competências que a lei lhe confere, interferindo com as de outra entidade pública (a autoridade regional da RAN), o que, ao abrigo do disposto no artigo 161.º n.º 2 alínea b) do CPA, determina também a nulidade do ato suspendendo;
- O ato nulo não é passível de sanação nem de aproveitamento, pelo que a eventual emissão posterior do parecer vinculativo da entidade regional da RAN não será apta a sanar a nulidade que afeta a DUP, sob pena de se “frustrar a função de garantia que o legislador pretendeu quando instituiu a obrigatoriedade de aquele parecer ser emitido em momento prévio à emissão da DUP” , ou seja, garantir que a “decisão final é tomada por uma entidade que efetivamente dispõe dos conhecimentos técnicos necessários”, de modo a “proteger os direitos subjetivos dos cidadãos, o interesse público e a instruir o correto exercício da atividade administrativa”.
Para sustentar a sua alegação, a Requerente invoca três acórdãos do STA: de 07-02-2006 (processo n.º 01815/02), de 22-06-2006 (processo n.º 0805/03) e de 21-01-2021 (processo n.º 094/09.3BEPRT), este último de uniformização de jurisprudência.
Cumpre apreciar e decidir.
Os prédios da Requerente sobre os quais incidiu o ato suspendendo localizam-se, de facto, em zona que integra a RAN, conforme decorre do ponto 2. do probatório, pelo que a sua utilização está sujeita aos condicionalismos previstos no RJRAN.
As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN dependem do cumprimento do estatuído nos artigos 22.º e 23.º do RJRAN.
No caso dos autos, mostra-se inequívoco que a construção e funcionamento de um sistema de dessalinização da água do mar nos prédios da Requerente, que inclui uma estação de dessalinização e um parque de energias renováveis (central fotovoltaica) – cfr. pontos 28. e 37. do probatório – consubstanciam uma utilização não agrícola de áreas integradas na RAN.
Vejamos então se se impunha a obtenção do parecer vinculativo da autoridade regional da RAN, previsto no artigo 23.º do RJRAN, previamente à emissão da DUP, tal como defende a Requerente.
Antes de mais, atentemos no teor do referido preceito legal, na redação atual, resultante do DL n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, a que releva nos presentes autos, atenta a data de emissão do ato suspendendo – 02-07-2024 (cfr. ponto 37. do probatório):
“1 - As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia estão sujeitas a parecer prévio vinculativo das respetivas entidades regionais da RAN, a emitir no prazo de 20 dias.
2 - O parecer a que se refere o número anterior é requerido junto das entidades regionais da RAN, nos termos do artigo 1.º do anexo I da Portaria n.º 162/2011, de 18 de abril, sem prejuízo do disposto no artigo 13.º-A do regime jurídico da urbanização e edificação.
3 - A entidade regional da RAN pode solicitar ao requerente ou à entidade competente, consoante o caso, no prazo máximo de 10 dias a contar da data da receção do processo, sempre que tal se mostre necessário e por uma única vez, elementos adicionais relevantes para a decisão, suspendendo-se o prazo para a emissão do parecer referido no n.º 1.
4 - Nos casos em que o município é a entidade competente para a concessão, autorização, licença, aprovação ou comunicação prévia, este deve ser ouvido nos termos do número anterior.
5 - Se o parecer não for emitido no prazo previsto no n.º 1, considera se o mesmo favorável. 6 - Os interessados dispõem de um prazo de um ano para apresentar o pedido de concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou a comunicação prévia relativos à utilização a que o parecer respeita, findo o qual o mesmo caduca.
7 - Quando a utilização esteja sujeita a procedimento de avaliação de impacte ambiental ou de avaliação de incidências ambientais em fase de projeto de execução, o parecer favorável, expresso ou tácito, no âmbito desse procedimento, incluindo na fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, dispensa qualquer parecer.
8 - A emissão do parecer previsto no número anterior é gratuita.
9 - (Revogado.)
10 - Sem prejuízo da possibilidade de impugnação contenciosa, nos termos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, os interessados podem interpor recurso para a entidade nacional da RAN dos pareceres vinculativos desfavoráveis emitidos pelas entidades regionais da RAN, a emitir no prazo de 20 dias.
11 - O parecer emitido no âmbito de procedimento de avaliação de impacte ambiental ou de avaliação de incidências ambientais em fase de projeto de execução incide sobre todos os aspetos relevantes em matéria de RAN.
12 - Encontra-se dispensada de parecer prévio das entidades regionais da RAN a instalação de vedações de prédios integrados na RAN desde que sejam executadas em rede metálica ou plástica e com recurso a estacas de madeira, a prumos de betão ou de cimento, sem murete ou base contínua em betão ou qualquer outro material.”
Prevê o n.º 1 do citado normativo legal, a obrigatoriedade de emissão de parecer prévio vinculativo da entidade regional da RAN quanto a utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN que necessitem de concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia.
Tal parecer é, no entanto, dispensado nas situações previstas no n.º 7 do preceito legal em análise.
Embora a redação de tal preceito não se afigure totalmente clara, julgamos que este deve ser interpretado no sentido de consagrar a dispensa do parecer prévio vinculativo da autoridade regional da RAN, a que alude o n.º 1 do mesmo artigo 23.º do RJRAN, nos seguintes casos: a) se a utilização não agrícola de área(s) integrada(s) na RAN estiver sujeita a procedimento de AIA ou de avaliação de incidências ambientais em fase de projeto de execução, sendo, nesse âmbito, proferido parecer favorável, expresso ou tácito; b) se a utilização não agrícola de área(s) integrada(s) na RAN estiver sujeita a procedimento de AIA em fase de estudo prévio ou anteprojeto, sendo, em fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, proferido parecer favorável, expresso ou tácito.
Naturalmente que o “parecer favorável, expresso ou tácito” a que se refere a norma em causa não será proferido pela autoridade regional da RAN, mas pelas autoridades com competência para o efeito no seio do procedimento de AIA ou de avaliação de incidências ambientais, sob pena de, afinal, não haver lugar à dispensa de parecer a que a norma em questão também alude.
No âmbito do procedimento de AIA, cabe à CA emitir tal parecer, conforme resulta do artigo 9.º n.º 1 alíneas c) e d) do RJAIA (ou à autoridade da AIA, nos termos previstos no artigo 20.º n.º 8 do RJAIA). O referido parecer assume natureza interdisciplinar, na medida em que avalia o projeto sob vários prismas atendendo aos diversos impactes ambientais que este previsivelmente possa desencadear (por exemplo, a nível de geologia, geomorfologia e recursos minerais, recursos hídricos, qualidade do ar, ordenamento do território e condicionantes ao uso do solo, recursos marinhos, alterações climáticas). É, por isso, que a CA é composta por membros pertencentes a entidades com áreas de atuação diversas – cfr. artigo 9.º n.º 2 do RJAIA.
Assim, quando estejam em causa projetos inseridos em áreas integrantes da RAN, as condicionantes ao uso do solo a esta atinentes também são avaliadas em sede de procedimento de AIA. Aliás, nesse sentido, aponta o n.º 11 do artigo 23.º do RJRAN (ainda que se limite a referir o “parecer emitido no âmbito de procedimento de avaliação de impacte ambiental ou de avaliação de incidências ambientais em fase de projeto de execução” e não refira o parecer emitido em fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, quando o procedimento de AIA ocorreu em fase de estudo prévio). Daí que se justifique a dispensa do parecer prévio vinculativo da autoridade regional da RAN, conforme previsto no artigo 23.º n.º 7 da RJRAN. Caso contrário, verificar-se-ia uma duplicação de atos, em contradição com a lógica de simplificação de procedimentos em matéria ambiental visada com a aprovação do Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, que conferiu ao artigo 23.º do RJRAN a sua atual redação.
Com efeito, resulta do preâmbulo do mencionado diploma legal:
“O presente decreto-lei visa, assim, iniciar a reforma de simplificação dos licenciamentos existentes, através da eliminação de licenças, autorizações, atos e procedimentos dispensáveis ou redundantes face à tutela dos recursos ambientais, simplificando a atividades das empresas sem comprometer a proteção do ambiente.
Para o efeito, procura-se promover a eliminação de licenças, autorizações, atos e procedimentos redundantes em matéria ambiental, garantindo-se, todavia, que a sua eliminação não prejudica o cumprimento das regras de proteção do ambiente, passando a Administração Pública a ter um enfoque especial na fiscalização, corresponsabilização e autocontrolo por parte dos operadores económicos.”
Assim, andou bem a entidade regional da RAN ao recusar-se a proferir o parecer prévio vinculativo previsto do artigo 23.º n.º 1 do RJRAN, quando a Contrainteressada lho solicitou, já que o projeto que esta visava implementar estaria sujeito a procedimento de AIA – cfr. pontos 18. a 21. do probatório.
Como bem salienta a Contrainteressada, “o parecer da CA emitido em fase de estudo prévio será sempre condicionado e sujeito a posterior verificação da conformidade do projeto de execução com as condições (ou condicionantes) daquele resultantes” (cfr. artigo 202.º da oposição). É o que resulta da leitura conjugada dos artigos 16.º n.ºs 1 e 2 e 20.º n.º 1 do RJAIA.
Destarte, quando o procedimento de AIA ocorre em fase de estudo prévio (como no caso dos autos), seguir-se-á, uma fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, na qual será emitido parecer técnico final sobre a conformidade ambiental do projeto de execução com a DIA – cfr. artigos 20.º n.ºs 1 e 8 do RJAIA. É com a emissão deste parecer (que ainda não se verificou no caso dos autos) que fica dispensada a emissão do parecer prévio vinculativo da autoridade regional da RAN previsto no artigo 23.º n.º 1 do RJRAN. Carece, por isso, a Contrainteressada de razão na parte em que defende que “bastará a emissão de um parecer favorável pela CA de AIA na fase de avaliação de impacte ambiental” (em fase de estudo prévio), “para que se opere o mesmo efeito de dispensa do parecer da ERRAN previsto no n.º 1 do artigo 23.º do Regime Jurídico da RAN” (cfr. artigo 201.º da oposição).»
Discorda a Recorrente do assim decidido porque os pressupostos que serviram de base ao entendimento do tribunal recorrido não encontram respaldo nas disposições legais aplicáveis se interpretadas correctamente, dado que: não há qualquer elemento ou indicação de que o parecer favorável, expresso ou tácito, previsto no nº 7 do artigo 23º do RJRAN se refere ao parecer emitido pela CA no âmbito do procedimento de AIA, pelo contrário; o RJAIA não prevê que os pareceres técnicos da CA possam ser tácitos, cfr. artigo 9º, nº 1 alíneas c) e d); poderá ser tácito o parecer sectorial a emitir pela ERRAA, nos termos do nº 5 deste artigo 9º, se esta estiver representada na CA, ou nos termos do nº 12 do artigo 14º da RJAIA, se esta não estiver aí representada; a viabilização de uso não agrícola de uma área RAN é da competência exclusiva das entidades regionais da RAN, v. alínea b) do artigo 34º do RJRAN; a Portaria nº 162/2011 prevê no nº 2 do artigo único, que não se aplica a projectos sujeitos a AIA, pressupondo que no âmbito dos procedimentos de AIA as entidades regionais são chamadas a emitir parecer; pelo que o “parecer favorável, expresso ou tácito”, referido no nº 7 do indicado artigo 23º, é o emitido pela entidade regional da RAN no procedimento de AIA e não o parecer técnico da CA.
Vejamos.
O artigo 23º do RJRAN, com a epígrafe “Parecer prévio”, com a redacção dada pelo Decreto-Lei nº 11/2023, de 10 de Fevereiro, que procedeu à reforma e simplificação dos licenciamentos ambientais, dispõe nos nºs 1 e 7 que:
“1 - As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia estão sujeitas a parecer prévio vinculativo das respetivas entidades regionais da RAN, a emitir no prazo de 20 dias.
(…)
7 - Quando a utilização esteja sujeita a procedimento de avaliação de impacte ambiental ou de avaliação de incidências ambientais em fase de projeto de execução, o parecer favorável, expresso ou tácito, no âmbito desse procedimento, incluindo na fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, dispensa qualquer parecer.”
A redacção anterior destes preceitos, dada pelo Decreto-Lei nº 199/2015, de 16 de Setembro, era a seguinte:
“1 - As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia estão sujeitas a parecer prévio vinculativo das respetivas entidades regionais da RAN, a emitir no prazo de 20 dias.
(…)
7 - Quando a utilização esteja associada a um projeto sujeito a procedimento de avaliação de impacte ambiental em fase de projeto de execução, o parecer prévio vinculativo previsto no n.º 1 compreende a pronúncia da entidade regional da RAN nesse procedimento.”
A respectiva redacção inicial, dada pelo Decreto-Lei nº 73/2009, de 31 de Março, era:
“1 - As utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia estão sujeitas a parecer prévio vinculativo das respectivas entidades regionais da RAN, a emitir no prazo de 25 dias.
(…)
7 - Quando a utilização em causa esteja sujeita a procedimento de avaliação de impacte ambiental, a pronúncia favorável da entidade regional da RAN prevista nos n.os 9 e 10 do artigo 13.º do regime jurídico da avaliação de impacte ambiental, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, compreende a emissão do parecer prévio vinculativo referido no n.º 1.”
Os indicados nºs 9 e 10 do artigo 13º do Decreto-Lei nº 69/2000, que aprovou o regime jurídico da avaliação de impacte ambiental, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 85/337/CEE, com as alterações introduzidas pela Directiva n.º 97/11/CE, do Conselho, de 3 de Março de 1997, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 197/2005, de 8 de Novembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 197/2005, de 8 de Novembro, [revogados pelo Decreto-Lei nº 152-B/2017, de 11 de Dezembro], dispunham:
“9 - Declarada a conformidade do EIA, nos termos do n.º 4, este é enviado, para parecer, às entidades públicas com competências para a apreciação do projecto.
10 - Os pareceres a que se refere o número anterior são emitidos no prazo de 40 dias, podendo não ser considerados se emitidos fora desse prazo.”,
Assim, o nº 1 do referido artigo 23º, apenas sofreu, da primeira redacção para a segunda, uma redução em 5 dias do prazo em que o parecer prévio da entidade regional da RAN [doravante apenas ERRAN] deve emitir o parecer prévio vinculativo quando está em causa utilização não agrícola de área integrada na RAN que exija concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia.
Já o nº 7 sofreu grandes alterações, mormente no que respeita à intervenção ou não, da ERRAN no procedimento de AIA.
A saber, na versão inicial deste nº 7 [de 2009], a pronúncia favorável da ERRAN compreendia a emissão do parecer prévio vinculativo, referido no nº 1, que, por a utilização não agrícola de área de RAN estar sujeita a procedimento de AIA, lhe era solicitada pela comissão de avaliação [CA] após (esta) ter emitido declaração de conformidade do EIA, enquanto entidade pública externa ao procedimento de impacte ambiental, sendo que se o parecer fosse emitido fora do prazo de 40 dias, podia não ser considerado. O que também significa que não se previa o parecer favorável tácito.
Na segunda versão [de 2015] passou a ser o parecer prévio vinculativo, previsto no nº 1, a compreender a pronúncia da ERRAN nesse procedimento de AIA. Este continuava a ser regulado pelo Decreto-Lei nº 69/2000, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 197/2005, e porque o artigo 9º, referente à “Comissão de avaliação”, não previa, na respectiva constituição, que integrasse um representante da ERRAN (entidade que tinha de emitir o parecer previsto no nº 1, nos termos do nº 7), o parecer continuava a ter de ser solicitado a esta como entidade pública externa, nos termos dos referidos nºs 9 e 10 do artigo 13º do Decreto-Lei nº 69/2000.
Na versão actual, em vigor, não há referência à pronúncia da ERRAN e ao parecer prévio vinculativo previsto no nº 1, mas a um parecer, expresso ou tácito, no âmbito do procedimento de AIA, que dispensa qualquer parecer.
Assim, quando a utilização não agrícola de áreas integradas na RAN esteja sujeita a procedimento de AIA ou de avaliação de incidências ambientais, é no âmbito do procedimento de AIA que é emitido parecer favorável, expresso ou tácito, deixando de ser necessário [ou dispensando-se] o parecer prévio vinculativo da respectiva ERRAN, no prazo de 20 dias, previsto no nº 1.
O parecer favorável, em questão, continua a poder ser dado no procedimento de AIA pela ERRAN, enquanto entidade externa, caso a autoridade da AIA entenda ser necessário solicitá-lo, conforme resulta dos disposto na alínea h) do nº 3 do artigo 8º, alínea b) do nº 3 e nº 4 do artigo 12º - a emitir no prazo de 15 dias -, e no nº 12 do artigo 14º - no prazo de 20 dias -, todos do RJAIA, regulado pelo Decreto-Lei nº 151-B/2013, de 31 de Outubro, que estabelece o regime jurídico da avaliação de impacte ambiental (AIA) dos projectos públicos e privados susceptíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente, transpondo a Directiva n.º 2011/92/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Dezembro, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente, actualizado [doravante apenas RJAIA], sem indicação de que pode ser considerado tacitamente favorável.
A CA também emite pareceres, os indicados nas alíneas a), c) e d) do nº 1 do artigo 9º do RJAIA, não se prevendo que possam relevar em termos tácitos.
A CA é, consoante as áreas com que o projecto EIA possa contender e se se revelar necessário, constituída por: dois representantes da autoridade de AIA; um representante da entidade com competência em matéria de recursos hídricos ;um representante da entidade com competência em matéria de conservação da natureza; um representante da entidade com competência em matéria de gestão do património arqueológico e arquitectónico; um representante da entidade com competência em matéria de valores geológicos; um representante da entidade competente em matéria de recursos marinhos; um representante da CCDR ou das CCDR territorialmente competentes na área de localização do projecto a licenciar ou autorizar; um representante da entidade licenciadora ou competente para a autorização do projecto; um representante da entidade com competência em matéria de vigilância da saúde humana; um representante da entidade com competência em matéria de alterações climáticas; entidades ou técnicos especializados que assegurem, quando necessário e a convite da autoridade de AIA, outras valências relevantes para a avaliação – v. o nº 2 do referido artigo 9º.
Entre as indicadas entidades representadas na CA, continua a não figurar a ERRAN, mas está a CCDR territorialmente competente na área de localização do projecto, no caso a do Algarve, competindo-lhe, designadamente, assegurar a aplicação do regime jurídico da RAN, preparar e submeter à apreciação da Entidade Regional da RAN os pedidos de parecer prévio vinculativos, a elaborar nos termos do regime legal da RAN [que não sendo exigidos no referido artigo 23º, nº 7 do RJRAN, demonstram conhecimento por parte da CCDR do que releva para os mesmos], e analisar e elaborar pareceres relativos a Avaliação de Impacte Ambiental, Análise de Incidências Ambientais, Propostas de Declaração de Impacte Ambiental e Relatórios de Conformidade Ambiental do Projecto de Execução (RECAPES) – v. alíneas b), c) e h) do nº 2 do artigo 8º, dos respectivos Estatutos, aprovados pela Portaria nº 403/2023, de 5 de Dezembro.
Cada uma das entidades representadas na CA emite pareceres obrigatórios, a remeter à autoridade de AIA, em prazos diferentes consoante respeitam à definição do âmbito do EIA, ao procedimento de avaliação, ou ao procedimento de verificação da conformidade ambiental do projecto de execução, susceptíveis de prorrogação, sendo que, se não forem emitidos, no prazo correspondente, considera-se o parecer favorável – v. os nºs 5 a 7 do mesmo artigo 9º.
Tendo em conta, designadamente, esses pareceres sectoriais nas fases indicadas, a CA emite: parecer sobre a proposta apresentada do EIA [v. artigo 12º, nº 7]; parecer técnico final do procedimento de AIA [v. artigo 16º]; e parecer técnico final sobre a conformidade ambiental do projecto de execução [v. artigo 20º nº 8].
Aqui chegados, constatamos que a alegação da Recorrente de que o parecer deferido no nº 7 do artigo 23º não pode ser da CA porque os pareceres desta são sempre expressos, é igualmente válida para os pareceres a emitir pela ERRAN, como entidade externa, já que não faz parte das entidades que, de acordo com o disposto no nº 2 do artigo 9º do RJAIA, devem estar representadas na CA, nem da CA constituída no procedimento de AIA em referência nos autos – v. o facto indiciariamente provado 24.
No preâmbulo do Decreto-Lei nº 11/2023, que alterou a redacção do nº 7 do artigo 23º do RJRAN, o legislador expressa, designadamente, que a sua intenção foi “[e]m sétimo lugar, evita[r] duplicações como a necessidade de realizar procedimentos e obter atos permissivos, como licenças e autorizações, quando as questões já foram analisadas em sede de AIA realizada com base num projeto de execução e viabilizadas através da DIA favorável ou favorável condicionada. Assim, após obtenção da DIA favorável, expressa ou tácita, deixa de ser necessário realizar qualquer procedimento adicional quanto a essas matérias. // Estão neste caso situações como: (…) iii) o parecer para utilizações não agrícolas em áreas de Reserva Agrícola Nacional” [repare-se que é o usado o termo “DIA favorável, expressa ou tácita” quando no RJAIA só está prevista a DIA favorável ou favorável condicionada ou desfavorável – v. o artigo 18º, nº 1 -, ou a DIA expressa – v. artigo 18º, nº 2 – e não tácita].
Assim, em face do exposto, afigura-se que a interpretação que se impõe do actual nº 7 do artigo 23º do RJRAN, é a de que a emissão, no âmbito do procedimento de AIA, de parecer favorável, expresso da CA – emitido na sequência dos pareceres, expressos ou tácitos, das entidades nela representadas e, se necessário, expressamente pelas entidades externas -, ou tácito – nos casos em que o legislador do Decreto-Lei nº 11/2023 entender que os pareceres favoráveis tácitos das entidades representadas na CA devem ser considerados autonomamente -, dispensa qualquer parecer, incluindo o parecer vinculativo da ERRAN previsto no nº 1.
No mesmo sentido, da dispensa do parecer prévio vinculativo da ERRAN, previsto no nº 1 do artigo 23º, fora do âmbito do procedimento de AIA, pronunciaram-se a ERRAN na proposta e decisão de arquivamento do pedido de licenciamento RAN que a Recorrida CI lhe dirigiu, e a CA no parecer favorável condicionado que emitiu no procedimento de AIA - v. os factos indiciariamente provados 22. e 35.
O entendimento acabado de expor não é infirmado pelo disposto no nº 2 do artigo único da referida Portaria nº 162/2011, de 18 de Abril, invocado pela Recorrente, que definindo os limites e condições para a viabilização das utilizações não agrícolas de áreas integradas na Reserva Agrícola Nacional, no nº 1 e anexos, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 22º do RJRAN (e não do artigo 23º, que aqui estamos a analisar), se limita a determinar a não aplicação da portaria aos projectos sujeitos a um procedimento de avaliação de impacte ambiental nos termos do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, em que tenha sido emitido parecer favorável pelas entidades regionais da Reserva Agrícola Nacional. Ou seja, para além de remeter para um diploma legal já revogado, a referência ao parecer favorável da ERRAN é consentânea com a efectuada nas primeiras versões do nº 7 do artigo 23º do RJRAN, mas já não na que está em vigor, pelo que nada acrescenta ou altera a apreciação aqui efectuada.
Em face do que não procedem as razões invocadas pela Recorrente quanto à alegada nulidade da DUP por falta de parecer prévio vinculativo da autoridade regional da RAN, nos termos dos artigos 23º e 38º do RJRAN.
Quanto à impossibilidade de emissão do parecer da ERRAN após a atribuição da DUP e aplicabilidade ao caso em apreciação da Jurisprudência do STA indicada, expendeu o juiz a quo, na sentença recorrida, que:
«Importa agora aquilatar se o ato suspendendo podia ter sido proferido sem o parecer a que se refere o artigo 23.º n.º 1 do RJRAN.
A Requerente advoga uma resposta afirmativa à questão, ancorando-se na jurisprudência do STA que cita.
O acórdão uniformizador de jurisprudência do STA de 21-01-2021 (processo n.º 094/09.3BEPRT), estribando-se nos outros dois acórdãos do STA citados pela Requerente, de 07-02-2006 (processo n.º 01815/02) e de 22-06-2006 (processo n.º 0805/03), fixou jurisprudência no seguinte sentido:
“É nulo, por violação do disposto no artº 34º do DL nº 196/89, de 14.06, o acto administrativo de declaração de utilidade pública se o mesmo não for precedido de parecer prévio da respectiva comissão regional da reserva agrícola, e, ainda que favorável, tal parecer não produz efeitos positivos se for emitido em momento posterior àquele acto de declaração de utilidade pública”.
O Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de junho estabelecia o anterior regime jurídico da RAN.
Previa o artigo 34.º do mesmo: “São nulos todos os actos administrativos praticados em violação do disposto no n.º 1 do artigo 9.º”.
Por seu turno, o respetivo artigo 9.º n.º 1 prescrevia: “Carecem de prévio parecer favorável das comissões regionais da reserva agrícola todas as licenças, concessões, aprovações e autorizações administrativas relativas a utilizações não agrícolas de solos integrados na RAN.”
Para firmar a primeira parte da referida jurisprudência uniformizada, tal como transcrita supra, o STA sufragou a jurisprudência vertida naqueles seus outros dois acórdãos segundo a qual a declaração de utilidade pública de expropriação devia ser equiparada aos atos permissivos previstos no artigo 9.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de junho, uma vez que todos comungavam do mesmo critério finalístico, “o de através deles se abrir caminho a utilizações não agrícolas de solos integrados na RAN”.
Ora, desde logo, importa salientar que se observam diferenças assinaláveis quanto a esta matéria da obrigatoriedade de parecer prévio da autoridade/ comissão regional da RAN entre a legislação atual (RJRAN) e a pretérita (Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de junho).
Em primeiro lugar, enquanto na legislação anterior, eram os atos permissivos ali elencados (licenças, concessões, aprovações e autorizações administrativas) que estavam sujeitos a parecer prévio favorável da comissão regional da RAN, com o RJRAN, passaram as ser as “utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN” (para as quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia) a estar sujeitas a parecer prévio favorável da autoridade regional da RAN.
Assim, à luz da legislação atual, é a utilização não agrícola e não o correspetivo ato permissivo que deve ser precedido de parecer vinculativo da autoridade regional da RAN (anteriormente, tal solução estava reservada às utilizações não agrícolas de solos integrados na RAN que não dependessem de licença, concessão, aprovação ou autorização – cfr. artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de junho.
Em segundo lugar, a legislação anterior não previa a possibilidade de dispensa do parecer prévio da comissão regional da RAN a que aludia o artigo 9.º n.º 1 do referido diploma legal nos casos em que a utilização não agrícola estivesse sujeita a procedimento de avaliação de impacte ambiental ou de avaliação de incidências ambientais, como prevê o artigo 23.º n.º 7 do RJRAN.
Acresce que este Tribunal não pode concordar com a equiparação feita nos mencionados acórdãos do STA da declaração de utilidade pública de expropriação a atos como a concessão, a aprovação, a licença e a autorização administrativa. É que a declaração de utilidade pública da expropriação visa desencadear um processo tendente à transferência da propriedade privada para o setor público e não direta e imediatamente permitir um determinado uso do solo ou a realização de determinada operação urbanística, tal como acontece com a concessão, a aprovação, a licença e a autorização administrativa.
De salientar ainda que embora a construção do sistema de dessalinização da Região do Algarve esteja isenta de controlo prévio, nos termos do artigo 7.º n.º 1 alínea e) do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (RJUE), depende de parecer prévio não vinculativo da câmara municipal (ou do recurso do prazo previsto para a respetiva emissão), nos termos dos n.ºs 2 e 8 do mesmo preceito legal.
Assim como está sujeita à obtenção de DIA favorável ou favorável condicionada (artigo 18.º do RJAIA) e de decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução que venha a ser apresentado. Este último ato é que permitirá a utilização não agrícola do solo integrante da RAN. Sem ele, e apenas com a declaração de utilidade pública de expropriação, tal desiderato não é concretizável, o que bem evidencia que o ato suspendendo não possui o carácter permissivo inerente a uma concessão, aprovação, licença ou autorização.
De todo o modo, ainda que se entenda que a declaração de utilidade pública de expropriação deva ser equiparada aos atos elencados no artigo 23.º n.º 1 do RJRAN, reitera-se que seria a utilização não agrícola do solo e não aquele ato que, nos termos do preceituado naquele preceito legal, devia ser precedido do parecer prévio vinculativo da autoridade regional da RAN.
Mais, no caso concreto, tendo decorrido procedimento de AIA em fase de estudo prévio, será de aguardar pela fase de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução, pois caso seja emitida decisão favorável nesse âmbito, fica dispensada a emissão do parecer previsto no artigo 23.º n.º 1 do RJRAN, nos termos do n.º 7 do mesmo preceito legal.
Em face do exposto, conclui-se, numa análise perfunctória, que não é provável o êxito da ação principal estribado nesta causa de invalidade assacada ao ato suspendendo, pelo que, nesta parte, não está verificado o requisito da aparência do bom direito.».
Alega a Recorrente que o tribunal recorrido errou ao não considerar nula a DUP e aplicável, ao caso, a jurisprudência uniforme do STA, vertida nos acórdãos que refere, mormente o de uniformização de jurisprudência de 21.1.2021, no proc. nº 094/09.3BEPRT [AUJ], que decidiu que a DUP integra a lista de actos administrativos permissivos constante do nº 1 do artigo 23º do RJRAN, que se mantém plenamente válida, porquanto: a posição do tribunal a quo não tem suporte legal e levaria a resultados absurdos; apesar da diferente redacção dos nºs 1 do artigo 23º do RJRAN e do artigo 9º do Decreto-Lei nº 196/89, o regime legal permaneceu inalterado; o parecer da ERRAN, previsto no nº 1 do artigo 9º, deve ser emitido previamente à emissão de todo e qualquer acto administrativo que “conduza”, “legitime” ou “abra caminho” a uma utilização não agrícola de uma área RAN; a DUP devia ter sido precedida de parecer da ERRAA, sob pena de nulidade; a nulidade decorre da preterição de formalidade essencial, v. artigo 38º da RJRAN; não é sanável, artigo 161º, nº 2, alínea b) do CPA; sem a obtenção dos pareceres previstos nos nºs 1 e 7 do artigo 23º, a DUP viola o artigo 20º, nº 1, do RJRAN, por o fim ser proibido naquele local, pelo que a mesma sempre seria anulável, nos termos do artigo 163º, nº 1 do CPA.
Vejamos.
As alegações da Recorrente têm como pressuposto que as utilizações não agrícolas de áreas integradas na RAN para os quais seja necessária concessão, aprovação, licença, autorização administrativa ou comunicação prévia, mesmo que sujeitas a procedimento de AIA, exigem sempre parecer prévio vinculativo da ERRAN, emitido fora ou no âmbito desse procedimento. O que, conforme acabado de expor, pode não suceder, porque esse parecer pode ser dispensado, nos termos do nº 7 do artigo 23º do RJRAN. Ou seja, ao abrigo do actual regime legal, num procedimento de AIA pode ser proferida DIA e DCAPE, apenas com pareceres prévios favoráveis da CA.
No Decreto-Lei nº 196/89, de 14 de Junho, não existia norma idêntica a este nº 7 do artigo 23º, pelo que, para além da questão relativa à diferente redacção – se é o acto permissivo da utilização não agrícola do solo integrado na RAN que está sujeito a parecer prévio vinculativo da ERRAN (nº 1 do respectivo artigo 9º) ou se é a utilização não agrícola de áreas integradas na RAN, que exigem os mesmos actos permissivos, que estão sujeitos a esses pareceres (o nº 1 do artigo 23º do RJRAN) -, estivesse ou não, a utilização sujeita a procedimento de impacte ambiental era sempre necessário parecer prévio vinculativo da ERRAN.
Foi este o diploma legal interpretado e aplicado no AUJ, tendo-se concluído que a equiparação da DUP aos actos permissivos previstos no respectivo artigo 9º nº 1, uma vez que todos comungavam do mesmo critério finalístico, “o de através deles se abrir caminho a utilizações não agrícolas de solos integrados na RAN”, implicava que o parecer da ERRAN, mesmo que favorável, tivesse de ser praticado antes da sua emissão e, não o tendo sido, a DUP era nula, nos termos do respectivo artigo 34º.
Ora, na situação em apreciação a ERRAN não emitiu parecer prévio ou após a atribuição da DUP, em referência nos autos, pelo que concordamos com o juiz a quo quanto à não aplicabilidade da jurisprudência fixada nesse acórdão ao presente caso.
Com efeito e na sequência do explicitado supra, independentemente da natureza permissiva ou não da DUP, a pretendida utilização não agrícola dos prédios da Recorrente integrados na RAN, que exigiu a DUP, foi sujeita a procedimento de AIA, com pareceres favoráveis da CA e dispensa do parecer prévio vinculativo da ERRAN, nos termos do nº 7 do artigo 23º do RJRAN, não podendo, com este fundamento legal, ser declarada nula, ao abrigo do artigo 38º deste regime, ou anulável, nos termos do artigo 161º do CPA.
Sem necessidade de mais considerações, improcedem os elencados fundamentos do recurso.
Sobre a alegada nulidade da DUP nos termos do artigo 22º do RJAIA, consta da sentença recorrida o seguinte:
«ii) Falta de decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução
A Requerente advoga que a DUP é nula nos termos do n.º 3 do artigo 22.º do RJAIA, por não ter sido precedida de decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução (o qual ainda não existe), tal como postula a alínea b) do n.º 1 do referido preceito legal.
Para tanto, defende que, para efeitos deste normativo e do RJAIA, a DUP deverá ser qualificada como um ato de autorização do projeto da Estação de Dessalinização do Algarve, recorrendo ao mesmo raciocínio utilizado a propósito do artigo 23.º n.º 1 do RJRAN para equiparar a DUP a um ato de concessão, aprovação, licença ou autorização administrativa.
Vejamos.
Dispõe o artigo 22.º do RJAIA:
“1 - O ato de licenciamento ou de autorização de projetos abrangidos pelo presente decreto-lei só pode ser emitido:
a) Após a notificação da DIA, favorável ou favorável condicionada, no caso de projetos sujeitos a AIA em fase de projeto de execução, ou após o decurso do prazo previsto no n.º 2 do artigo 19.º sem que a decisão expressa seja notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização e ao proponente;
b) Após notificação da decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, no caso de projetos sujeitos a AIA em fase de estudo prévio ou anteprojeto, ou após o decurso do prazo previsto no n.º 7 do artigo anterior sem que a decisão expressa seja notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização e ao proponente.
2 - O licenciamento ou a autorização do projeto deve indicar a exigência do cumprimento dos termos e condições fixados na DIA expressa ou na decisão expressa sobre a conformidade ambiental do projeto de execução.
3 - São nulos os atos praticados com desrespeito pelo disposto nos números anteriores.”
À semelhança do referido quanto ao artigo 23.º n.º 1 do RJRAN, entendemos que, também para efeitos do artigo 22.º do RJAIA, a DUP não pode ser equiparada a um ato de licenciamento ou autorização, pois não é ela que permite/ autoriza direta e imediatamente a realização de uma determinada operação ou projeto.
Acresce que o RJAIA define, para efeitos da sua aplicação, os conceitos de “autorização” e “licença”, reconduzindo-os a uma “decisão que confere ao proponente o direito a realizar o projeto” – cfr. artigo 2.º alínea c) – não se subsumindo a DUP a tal definição. Embora a DUP seja, no caso concreto, necessária à realização do projeto, pois sem a mesma não ocorre a expropriação dos prédios da Requerente nos quais a Contrainteressada pretende construir o sistema de dessalinização, não é ela que confere à Contrainteressada o direito de implementar o projeto. Como vimos, tal desiderato está dependente de outros procedimentos e atos, nomeadamente da decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução.
Paralelamente, decorre do artigo 7.º do RJAIA que, para efeitos da aplicação do diploma em causa, a entidade licenciadora ou competente para a autorização possui as seguintes competências:
“a) Remeter à autoridade de AIA os elementos apresentados pelo proponente para efeitos dos procedimentos de AIA e de verificação da conformidade ambiental do projeto de execução com a DIA, quando esses elementos não sejam remetidos através da plataforma eletrónica da autoridade de AIA;
b) Remeter à autoridade de AIA o resultado da apreciação do cumprimento das condicionantes da DIA ou das condicionantes da decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, sempre que essa verificação lhe esteja atribuída;
c) Comunicar à autoridade de AIA e publicitar o conteúdo da decisão final tomada no âmbito do procedimento de licenciamento ou de autorização do projeto;
d) Decidir sobre a sujeição a AIA dos projetos abrangidos pelos n.os 3 a 5 do artigo 1.º e dela dar obrigatoriamente conhecimento à autoridade de AIA no prazo de cinco dias, designadamente quando a avaliação é feita com base numa análise caso a caso.”
Como ressalta a Contrainteressada na sua oposição, a entidade competente para a emissão da DUP, nos termos do artigo 14.º n.º 1 do Código das Expropriações (CE) – o ministro a cujo departamento compete a apreciação final do processo –, in casu, a Ministra do Ambiente, não detém quaisquer competências previstas no artigo 7.º do RJAIA, pelo que também, sob este ponto de vista, não pode ser considerada entidade licenciadora ou competente para a autorização, para efeitos do RJAIA.
Este diploma legal admite, inclusivamente, a existência de “projetos para os quais não se encontram definidos procedimentos de licenciamento ou autorização”, situações em que o projeto de execução e o relatório de conformidade ambiental do projeto de execução deverão ser apresentados junto da autoridade de AIA, justamente por não haver entidade licenciadora ou competente para autorização – cfr. artigo 20.º n.ºs 2 e 3 do RJAIA. Daqui emana mais uma razão para não se “forçar” a identificação da DUP com um ato de licença ou autorização.
A DUP dos autos foi emitida ao abrigo do Decreto-Lei n.º 15/2021, de 23 de fevereiro, que criou um regime especial de expropriação e constituição de servidões administrativas para a execução de projetos integrados no Programa de Estabilização Económica e Social – cfr. ponto 28. do probatório.
À mesma aplica-se subsidiariamente o CE, conforme prevê o artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 15/2021, de 23 de fevereiro.
O artigo 12.º do CE estipula os elementos instrutórios que devem acompanhar o requerimento da DUP, de entre os quais, avulta o “estudo de impacte ambiental, quando legalmente exigido” (cfr. n.º 1 alínea e)). Inexiste qualquer referência à DIA ou à decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, o que também milita a favor do entendimento sobre a não obrigatoriedade de a DUP ser precedida daquela decisão.
Por fim, importa referir que a exigência de emissão de decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução antes da DUP, redundaria, no caso dos autos, na inviabilização da emissão da DUP e da implementação do projeto, o que não é aceitável.
Explicitemos.
No caso concreto, a elaboração do projeto de execução e do relatório de conformidade ambiental do projeto de execução estão dependentes da realização de estudos e sondagens, nomeadamente geotécnicos, que naturalmente, implicam o acesso ao solo dos prédios da Requerente sobre os quais incidiu a DUP. É o que resulta quer do teor da DIA quer do caderno de encargos, conjugado com o anúncio do procedimento concursal de conceção, construção e exploração do sistema de dessalinização da região do Algarve – cfr. pontos 31., 32. e 36. do probatório.
Ora, previamente à DUP, a Contrainteressada solicitou à Requerente o acesso aos seus prédios para fins de realização dos ditos estudos e sondagens necessários à elaboração do projeto de execução, tendo esta manifestado a sua oposição – cfr. pontos 14. e 15. do probatório.
Foi neste contexto, que foi tomada a resolução de expropriar e requerida a DUP ao abrigo do Decreto-lei n.º 15/2021, de 23 de fevereiro, a qual, atento o seu caracter de urgência, conferiu à Contrainteressada, na qualidade de entidade expropriante, a posse administrativa imediata dos bens a expropriar, nos termos dos artigos 2.º e 4.º.
Conclui-se, deste modo, que a DUP, por via do efeito que lhe está associado de conferir a posse administrativa dos bens a expropriar, se mostrava essencial à realização dos estudos e sondagens necessários à elaboração do projeto de execução e do relatório de conformidade ambiental do projeto de execução, pelo que não poderia ter sido emitida posteriormente à decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, como defende a Requerente.».
Alega a Recorrente que o tribunal recorrido errou ao não considerar nula a DUP nos termos do artigo 22º do RJAIA dado que: nos termos da alínea b) do nº 1 deste artigo os actos de autorização de projectos só podem ser emitidos após notificação DCAPE, sob pena de nulidade; o que não sucedeu, pois a DUP foi emitida em 23.7.2024 antes da DCAPE; o tribunal interpreta incorrectamente as normas aplicáveis pois a DUP insere-se no conjunto de actos de autorização que conferem à CI o direito de implementar a Estação, ao permitir a transferência dos seus prédios e a sua afectação à finalidade do projecto; o entendimento do juiz a quo de que a DUP não é o único acto necessário à pretendida implementação, não prejudica a sua natureza de acto administrativo permissivo; a CI não precisava de tomar posse dos prédios para lhes aceder, atento o disposto no artigo 6º, nº 2 do Decreto-Lei nº 15/2021, pelo que a DUP não era necessária para obter a DCAPE.
Vejamos.
O Decreto-Lei nº 151-B/2013, de 31 de Outubro, estabelece o regime jurídico da avaliação de impacte ambiental (AIA) dos projectos públicos e privados susceptíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente, transpondo a Directiva nº 2011/92/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Dezembro, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente. Ou seja, o enfoque deste RJAIA é o projecto cuja execução poderá ter impacto no ambiente.
No caso dos autos o projecto respeita à implementação de um sistema de Dessalinização na Região do Algarve a concretizar com a instalação de uma Estação de Dessalinização da Água do Mar do Algarve [EDAM], nos prédios de que a Recorrente é proprietária, e que se encontra em fase de estudo.
Da factualidade indiciariamente assente resulta que: a CI, concessionária da exploração e da gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Algarve, celebrou, em 12.11.2021, com a Estrutura Missão “Recuperar Portugal”, contrato de financiamento para a realização do investimento relativo ao Plano Regional da Eficiência Hídrica do Algarve [PREHA] - designadamente, para a construção de uma central de dessalinização, medida prevista no quadro de execução da Componente C09 - Gestão Hídrica do PRR; em 10.2.2023, a CI comunicou à Recorrente a sua intenção de adquirir os referidos prédios e solicitou autorização para realizar trabalhos de sondagens, inseridos no âmbito de estudos complementares ao referido projecto; a Recorrente não autorizou a realização dos referidos trabalhos e respondeu não pretender vender os prédios; em 8.3.2023 a CI emitiu resolução de requerer a expropriação dos referidos prédios, e notificou-a à Recorrente; em 19.7.2023, a CI apresentou junto da Agência Portuguesa do Ambiente, IP [APA] formulário e documentos, incluindo estudo de impacto ambiental [EIA] e projecto, em fase de estudo prévio, tendo em vista iniciar procedimento de avaliação de impacto ambiental [AIA] relativamente ao projecto da EDAM em fase de estudo prévio; a APA nomeou uma Comissão de Avaliação [CA] que, em 27.10.2023, emitiu declaração de conformidade do EIA; entre 6.11 e 19.12.2023 decorreu o período de consulta pública, tendo a Recorrente pugnado pela emissão de uma declaração de impacto ambiental [DIA] negativa, foram solicitados pareceres a entidades externas à CA; e Dezembro de 2023 a CI dirigiu à Recorrente proposta de aquisição dos prédios que foi recusada; em 16.2.2024 a CI lançou procedimento de concurso público com publicidade internacional, para a celebração de contrato designado por “Conceção, Construção e Exploração do Sistema de Dessalinização da Região do Algarve” que, designadamente, “inclui[u] as atividades relacionadas com a elaboração de todas as peças escritas e desenhadas do Projeto de Execução da "Obra" a executar, incluindo os desenhos de detalhe (montagem e construção) e os projetos de todas as especialidades envolvidas (…). Inclui igualmente a elaboração dos elementos a entregar em fase de RECAPE, (…)”; especificando na subcláusula 5.2.1. que “A empreitada de conceção-construção inclui: (…) Sondagens prévias à realização do Projeto de Execução, para identificação / confirmação em planta e em perfil, da totalidade dos Serviços Afetados pela “Obra” (incluindo a localização exata do Adutor Oriental-Final da Á....., S.A. (AdA), onde será efetuada a ligação / introdução da conduta que irá transportar a água tratada proveniente da EDAM), bem como todas as sondagens e prospeções complementares que se revelem necessárias para o desenvolvimento do projeto quer durante a fase de construção, quer durante a fase de "Arranque" da instalação e até à sua Receção Provisória, de acordo com o Caderno de Encargos, nomeadamente as mencionadas para o licenciamento ou autorização do projeto, assim como as apresentadas em fase de RECAPE. O contrato misto inclui igualmente a fase de exploração do Sistema de Dessalinização na Região do Algarve”; em 14.3.2024 foi emitido pela CA parecer favorável condicionado ao apresentado projecto de EDAM, em fase de estudo prévio; em 3.4.2024 foi emitida DIA condicionada, indicando as condicionantes e os elementos que devem ser indicados no Relatório de Conformidade Ambiental do Projecto de Execução [RECAPE]; em 2.7.2024 a Ministra do Ambiente e da Energia proferiu despacho, emitindo declaração de utilidade pública da expropriação [DUP] de 125 000 m2, com carácter de urgência, necessária à construção da Estação de Dessalinização de Água do Mar e do Parque de Energias Renováveis (central fotovoltaica) que integram o «Sistema de Dessalinização na Região do Algarve, em conformidade com o artigo 15° do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n° 168/99, de 18 de Setembro, actualizada, e com o n° 1 do artigo 2° do Decreto-Lei n° 15/2021, de 23 de Fevereiro, na redacção dada pela Lei n° 5/2023, de 20 de Janeiro, o que confere, de imediato, à CI, autorização para tomar a posse administrativa dos bens a expropriar, nos termos dos artigos 19° e seguintes do Código das Expropriações, e do artigo 4° do Decreto-Lei n° 15/2021, idem; em 22.10.2024 foi celebrado contrato relativo ao procedimento concursal, referido supra.
Donde, o EIA apresentado pela CI junto da APA, foi acompanhado de um estudo prévio - não de um anteprojecto ou de um projecto de execução -, e mereceu uma DIA, impondo a posterior apresentação do projecto de execução e respectivo RECAPE com vista à obtenção da DCAPE, sendo que esse projecto de execução será (ou já foi, o que não consta dos autos) elaborado e executado pelo concorrente a quem foi adjudicado o contrato a concurso e não pela CI, proponente do estudo prévio.
A CI, antes e depois de dar início ao procedimento de AIA, manifestou intenção e apresentou proposta para adquirir os prédios, em referência nos autos, e pediu autorização à Recorrente para realizar trabalhos de sondagens nos mesmos no âmbito de estudos referentes ao projecto a elaborar. A Recorrente recusou vender e a permitir o acesso requerido, motivando a resolução da CI de requerer a expropriação dos prédios. Assim, a DUP proferida, não visa licenciar ou autorizar a imediata e directa implementação da EDAM, na medida em que o correspondente projecto ainda não tinha sido sequer concebido, mas permitir o acesso, a posse aos prédios para poderem ser realizados os trabalhos preparatórios necessários ou, como resulta da subcláusula 5.2.1 do Caderno de Encargos do procedimento concursal: Sondagens prévias à realização do Projeto de Execução, para identificação / confirmação em planta e em perfil, da totalidade dos Serviços Afetados pela “Obra” (incluindo a localização exata do Adutor Oriental-Final da Á....., S.A. (AdA), onde será efetuada a ligação / introdução da conduta que irá transportar a água tratada proveniente da EDAM).
O que dispõe o artigo 22º, na sequência do previsto no nº 2 do artigo 1º, do RJAIA, é que as decisões proferidas no procedimento de AIA, incluindo na fase de verificação da conformidade ambiental do projecto de execução, são prévias ao licenciamento ou autorização dos projectos susceptíveis de provocar efeitos significativos no ambiente, nos termos do presente decreto-lei, devendo a entidade licenciadora ou competente para a autorização do projecto indeferir o pedido de licenciamento ou autorização sempre que não tenha sido previamente obtida decisão, expressa ou tácita, sobre a AIA, ou, se ainda assim os praticar, tais actos são nulos.
O que aplicado ao caso em apreciação significa que, tendo o EIA apresentado pela CI, em fase de estudo prévio do projecto, obtido uma DIA condicionada, importa[rá] no procedimento de AIA verificar da conformidade ambiental do projecto de execução com a DIA emitida, o que ocorrerá quando o projecto de execução for concebido e for apresentado o correspondente RECAPE.
Assim, na data em que foi emitida a DUP só existia o estudo prévio e não o projecto de execução da implementação da EDAM, logo, a DUP não pode consubstanciar decisão que confere ao preponente o direito a realizar o projecto - v. a alínea c) do artigo 2º do RJAIA – tal como entendeu o juiz a quo.
Pode ser considerada como o primeiro dos actos que vão permitir a instalação da EDAM nos prédios da Recorrente, como esta alega no recurso, mas não permite, por si, a realização do projecto, que ainda não existe, pelo que nos termos e para os efeitos do RJAIA a DUP emitida não é o acto de licenciamento ou de autorização a que se referem os indicados artigos 1º, nº 2 e 22º, nº 1 alínea b).
Com efeito, efectuados os trabalhos preparatórios que a Recorrente impediu levar a cabo nos seus prédios, poderá a entidade contratada conceber o projecto de execução da EDAM, poderá ser apresentado o mesmo com o RECAPE no procedimento de AIA, poderá ser emitida DCAPE, poderá ser praticado acto de licenciamento ou autorização por entidade competente e executada a obra. Ou, por se tratar de factos futuros e de verificação incerta, alguma coisa poderá correr mal com projecto a elaborar, o procedimento de AIA, o licenciamento, o financiamento, a execução do projecto, etc. e não se concretizar a implementação da EDAM nos prédios da Recorrente.
Quanto ao alegado no recurso de que a CI não precisava de tomar posse dos prédios para lhes aceder, atento o disposto no artigo 6º, nº 2 do Decreto-Lei nº 15/2021, pelo que a DUP não era necessária para obter a DCAPE, trata-se de um fundamento que não foi invocado no requerimento inicial e que, por isso, não foi apreciado pelo juiz a quo, pelo que tratando-se de uma questão nova, que extravasa o âmbito do recurso – a sentença recorrida -, não será conhecido por este tribunal.
No mais concordamos com a argumentação expendida pelo juiz a quo, que não foi directamente atacada no recurso, e que aqui reiteramos.
Relativamente ao alegado erro na aplicação do princípio da proporcionalidade, da sentença recorrida extrai-se o seguinte:
«iii) Violação do princípio da proporcionalidade
A Requerente alega que o ato suspendendo viola o princípio da proporcionalidade nas suas três vertentes.
Sustenta, para tanto, que:
- É incerto se a DUP é adequada à prossecução do fim de utilidade pública que visa atingir – a implementação do projeto da estação de dessalinização do Algarve –, pois não é possível antecipar se a autoridade regional da RAN irá emitir parecer favorável à utilização não agrícola dos prédios alvo de expropriação ou se a APA, I.P. irá emitir uma decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, o que dita a violação do princípio da proporcionalidade, na vertente da adequação;
- A mencionada incerteza conduz à violação do princípio da proporcionalidade, na vertente da necessidade, uma vez que o despacho suspendendo foi proferido num momento em que ainda não era necessário e muito menos indispensável para a prossecução do fim que visava atingir, pelo que a Entidade Requerida podia e devia ter aguardado que o projeto se encontrasse numa fase mais avançada, designadamente, quando fosse emitido o parecer da autoridade regional da RAN ou a decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, para avançar com a emissão da DUP e permitir à Contrainteressada tomar imediatamente posse do terreno;
- O custo atual de expropriar os prédios – ablação do direito de propriedade da Requerente – é manifestamente superior aos benefícios que seriam de esperar pelo recurso à DUP nesta fase, dado que não se sabe se o projeto poderá avançar, nem quanto tempo irá demorar até ao início da sua implementação, ficando a Requerente, durante esse período, privada da posse e usufruto da sua propriedade, sem que tal seja necessário para satisfazer o interesse público, o que dita a violação do princípio da proporcionalidade em sentido estrito.
Cumpre apreciar e decidir
É inequívoco que a efetiva implementação do sistema de dessalinização da região do Algarve nos prédios da Requerente pressupunha a emissão do ato suspendendo, já que todas as tentativas de aquisição de tais prédios por via de direito privado encetadas em momento prévio à emissão da DUP em discussão não lograram sucesso – cfr. pontos 14., 15. e 17. do probatório.
A questão que se pode colocar – sendo este o enfoque da argumentação da Requerente – é se o ato suspendendo é ilegal, porque ofensivo do princípio da proporcionalidade que deve reger toda a atividade administrativa, em razão do momento em que foi proferido.
Julgamos que não. Senão vejamos.
Conforme se expôs supra, a implementação do sistema de dessalinização da região do Algarve, fim último da DUP, depende da obtenção de decisão de favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, sendo que para a elaboração deste e, bem assim, do relatório de conformidade ambiental do projeto de execução, é necessária a execução de estudos e sondagens no terreno.
Em virtude da não autorização por parte da Requerente do acesso aos seus prédios pela Contrainteressada, esta teve que recorrer à resolução de expropriação e requerimento da DUP com carácter de urgência, nos termos do Decreto-Lei n.º 15/2021, de 23 de fevereiro, para que lhe fosse conferida a posse administrativa dos prédios a expropriar e fosse, assim, viável executar os ditos trabalhos de sondagens e demais estudos. Nesta medida, a DUP mostra-se necessária, adequada e não excessiva para levar a cabo o fim pretendido.
E tal conclusão não se altera pela incerteza do sentido do parecer da CA e da decisão da autoridade de AIA que venham a ser tomadas em fase de verificação de conformidade ambiental do projeto de execução com a DIA, pois, primeiramente, é preciso alcançar essa fase e, para tanto, era imprescindível a emissão do ato suspendendo.
Por fim, não se afigura que os custos da atuação administrativa consubstanciada na emissão da DUP sejam manifestamente superiores aos benefícios esperados com a mesma.
Os prejuízos a atender são os que decorrem da privação das utilidades proporcionadas pelo direito de propriedade e posse da Requerente sobre os prédios visados pela DUP.
Quanto a tais prejuízos, a Requerente elenca, em síntese, os seguintes: os seus sócios deixarão de poder realizar nos prédios em questão atividades lúdicas ao ar livre e em família, a agricultura, a apicultura e a pecuária, a colheita de frutos e a recolha de mel para consumo próprio; os animais alojados nos prédios correrão risco de vida, ficando ao abandono, sem alimentação e cuidados necessários à sua sobrevivência; as benfeitorias existentes nos prédios, muitas delas construídas pelos sócios da Requerente e, por isso, com valor sentimental para os mesmos, ficarão em risco de ser destruídas.
Conclui-se que grande parte dos prejuízos invocados afetam essencialmente a esfera pessoal dos sócios da Requerente e não a esfera desta, não sendo, nessa medida, atendíveis por falta de legitimidade da Requerente para reclamar tutela quanto aos mesmos.
Restam os eventuais danos nos animais e benfeitorias existentes nos prédios da Requerente. Sendo certo que alguns deles possam não ser passíveis de reconstituição in natura, são, no entanto, indemnizáveis.
Assim, caso não se mostre viável prosseguir com a implementação do sistema de dessalinização da região do Algarve, a expropriação pode ser revertida (cfr. artigo 5.º do CE e artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 15/2021, de 23 de fevereiro) e a Requerente indemnizada dos danos que lhe tiverem sido causados.
Acresce que, tendo em conta que o contrato de conceção, construção e exploração da do sistema de dessalinização da região do Algarve foi outorgado em 22-10-2024 (cfr. ponto 41. do probatório), a breve trecho poderá, em princípio, iniciar-se a elaboração do projeto de execução (se é que ainda tal não ocorreu) (cfr. ponto 31. do probatório). O prazo máximo para a elaboração e aprovação do projeto de execução é de 90 dias contados a partir da data de assinatura do contrato – cfr. ponto 33. do probatório. Já o prazo para a decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução é de 50 dias contados a partir da data de receção pela autoridade de AIA do projeto de execução e documentação que o deve acompanhar, nos termos do artigo 21.º n.º 7 do RJAIA.
Não se afigura, portanto, que seja especialmente longo o período de tempo necessário para ser conhecida a decisão relativa à viabilidade do projeto.
Sopesados os prejuízos que podem advir para a Requerente da emissão do ato suspendendo, considera-se que os mesmos não se mostram (manifestamente) superiores aos benefícios para o interesse público decorrentes daquele ato, quais sejam, o de tornar viável a elaboração do projeto de execução do sistema de dessalinização da região do Algarve, projeto que, previsivelmente, será financiado pelo PRR (cfr. pontos 10. a 12. do probatório) e que visa combater a manifesta escassez de recursos hídricos da região do Algarve (facto notório e que a Requerente não coloca em causa), promovendo a resiliência do abastecimento público de água em tal região.
Ante o exposto, entende-se que, na ação principal, não será provável que seja procedente a anulação da decisão suspendenda com base na violação do princípio da proporcionalidade.
Em face de tudo o exposto, conclui-se pela não verificação do requisito da aparência do bom direito.».
E o assim bem decidido é para manter sem necessidade de mais considerações uma vez que a Recorrente se limita a discordar, reiterando os argumentos já expendidos no requerimento inicial sobre este alegado vício do acto suspendendo.
Quanto à alegação de que, ao abrigo do nº 2 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 15/2021, sempre seria possível à CI realizar os estudos necessários nos seus prédios sem a sua autorização e sem ter de tomar posse dos mesmos, como referimos antes, trata-se de questão que vem invocada de forma inovatória no recurso e que, por isso, não cumpre a este Tribunal ad quem conhecer.
A improcedência dos fundamentos do recurso quanto à não verificação do requisito do fumus boni iuris, obsta à apreciação dos do periculum in mora e da ponderação dos interesses em presença, por serem de verificação cumulativa, significando que a falta de um determina desde logo o não decretamento da providencia requerida, pelo que é de manter a sentença recorrida e negar provimento ao recurso.
Por fim quanto aos incidentes de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida, o juiz a quo considerou os mesmos extintos, por inutilidade superveniente da lide, com a seguinte fundamentação:
«Uma vez recusada a providência cautelar pedida e tendo efeito meramente devolutivo o eventual recurso que desta decisão possa vir a ser interposto (cfr. artigo 143.º n.º 2 alínea b) do CPTA), a DUP emitida mantém os seus efeitos, entre os quais, a posse administrativa dos bens a expropriar conferida à Contrainteressada e os atos pressupostos e consequentes da mesma, ou seja, os atos cuja declaração de ineficácia foi pedida.
Assim sendo, nenhum interesse (em agir) ou utilidade subsiste na apreciação do pedido de declaração de ineficácia dos atos de execução de indevida deduzido pela Requerente.».
Conclui a Recorrente que, revogando a sentença recorrida, deverá este Tribunal revogar o decidido quanto aos incidentes, declarando os fundamentos da Resolução Fundamentada improcedentes e a ineficácia de todos os actos de execução da DUP, mormente, a elaboração e notificação dos Relatórios de peritagem, do Relatório Complementar, a tomada de posse administrativa dos Prédios por parte da CI, dos autos de tomada de posse administrativa dos Prédios e o depósito da quantia de €634 022,50 à sua ordem.
Ora, não havendo que revogar a sentença recorrida, por improcederem os fundamentos do recurso relativamente à providência, resulta desde logo prejudicado o conhecimento do alegado e peticionado pela Recorrente quanto aos referidos incidentes.
Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul, em:
- indeferir o pedido de antecipação da decisão da acção principal, por processualmente inadmissível no âmbito do presente recurso;
- negar provimento ao recurso, e, em consequência, manter a sentença recorrida na ordem jurídica quanto à providência cautelar requerida e aos incidentes de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida deduzidos.
Custas pela Recorrente.
Registe e notifique.
Lisboa, 6 de Novembro de 2025.
Lina Costa, relatora, consigna e atesta que têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Marta Cavaleira e Joana Costa e Nora, em substituição. |