Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 344/09.6 BEBJA |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 01/11/2024 |
Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
Descritores: | VPT 2.ª AVALIAÇÃO NOTIFICAÇÃO DE REPRESENTANTE DO CONTRIBUINTE CARTA REGISTADA COM AR PRESUNÇÃO DE NOTIFICAÇÃO |
Sumário: | I- Em sede de 2.ª avaliação de um prédio urbano devem intervir na mesma, designadamente, o sujeito passivo ou seu representante. II- A marcação da data da 2.ª avaliação de um prédio urbano deve ser notificada ao contribuinte ou ao seu representante através de carta registada com aviso de receção. III- Mesmo nos casos em que seja de considerar perfeita a notificação através de carta registada, nunca será de apelar à presunção prevista no art.º 39.º, n.º 1, do CPPT, quando o terceiro dia útil aí previsto coincida com a exata data que a AT define como a da prática do ato a que se refere a notificação e para o qual o notificando é convocado, uma vez que o conhecimento, por parte do destinatário, tem de ser, por definição, anterior a essa mesma data. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Indicações Eventuais: | Subsecção tributária comum |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: Acórdão I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio recorrer da sentença proferida a 01.03.2019, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por J……………. (doravante Recorrido ou Impugnante), que teve por objeto o ato de segunda avaliação do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de C………., concelho de Grândola, sob o artigo …. O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo. Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “ I Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou procedente a impugnação judicial, apresentada por “J…………………..”, por considerar que o Perito designado pelo Impugnante, como seu representante, não foi notificado para a data designada para reunião da Comissão de Avaliação, resultando, assim, prejudicada a análise do que demais vinha alegado nos autos, sem cuidar de saber se tal notificação exigia ser efectuada a coberto do n.º 3, do artigo 39.º do CPPT. II Decisão com a qual, e salvo o devido respeito, que é muito, a Fazenda Pública não se pode conformar, pelos fundamentos que se passam a expor. III Na sentença recorrida, a Meritíssima Juíza entendeu, assim, que não se mostrava provada a notificação do perito designado pelo Impugnante, “(…) decidindo-se anular o procedimento de segunda avaliação levado a cabo relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de C…………., concelho de Grândola, sob o artigo …., a partir da convocatória para reunião da Comissão de Avaliação.” IV No entanto, como, ainda, salientado pela Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP), conforme douto despacho de 2 de Novembro de 2011, “No seguimento das informações e elementos entretanto juntos aos autos, estamos em crer ter havido conhecimento, por parte do Sr. perito do impugnante, da data de realização da 2ª avaliação.” V Com o devido respeito, que é muito, a junção dos aludidos elementos impedia a decisão tomada pelo Tribunal “a quo”. VI Porém assim não sucedeu. VII Mas a verdade é que, tal como consta dos autos, não só o ofício foi enviado, como foi registado, R ………………. PT, cujo teor se transcreve - ofício n.º ……., de 24-03-2009: Registado Assunto: ADIAMENTO DA DATA 2.ªAVALIAÇÃO REFERENTE AO ARTIGO N.º …. C……… Tenho a honra de informar V. Exª que a realização da 2ª avaliação, referente ao Artigo nº … de C……., Proc 2° avaliação nº……….., agendada inicialmente para o dia 18 de Fevereiro, foi adiada a pedido do sujeito passivo e que, embora requerido novo adiamento, a mesma se vai realizar no dia 27 de Março de 2009 ( pelas 10 horas no local, lote …….). VIII Assim, e a nosso ver, fica provado que, tendo a Meritíssima Juiz do Tribunal “a quo”, ao abrigo do disposto no art. 13.º, do CPPT, e no art. 99.º da LGT, diligenciado pela produção dessa prova, o resultado dessa indagação foi frutuoso, desde logo porque: 1. Se todos os interessados estavam notificados da realização da 2.ª avaliação, agendada para o dia 18 de Fevereiro de 2009 – alínea j) do probatório; 2. Se foi requerido, pelo “Perito indicado”, o adiamento, da mesma, para 18 de Março de 2009 – alínea k) do probatório; 3. Se o sobredito ofício, registado, n.º ……, de 24-03-2009, punha fim aos sucessivos pedidos adiamentos, informando que a avaliação se ia realizar no dia 27 de Março de 2009, pelas 10 horas, no local, lote ……….; IX Que mais era necessário para a douta sentença dar como provado tal facto? Que houve conhecimento, por parte do Sr. perito do impugnante, da data de realização da 2ª avaliação? X Ou será que, para a produção deste efeito, uma notificação, não abrangida pelo n.º 1, do artigo 38.º do CPPT, não pode ser feita através de carta registada? XI Na verdade, conforme artigo 38.º, n.º 3 – “As notificações não abrangidas pelo n.º 1, bem como as relativas às liquidações de tributos que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas por carta registada.” XII Porém, e não obstante a douta sentença apenas fazer referência ao ofício anterior, n.º ……, de 5 de Março de 2009, não cumpriu, a AT, o ónus de demonstrar o envio da carta? XIII Entendemos que sim! XIV Porque o ofício anterior, de 5 de Março de 2009, a que se alude na douta sentença, foi relegado para 2.º plano, atenta a proliferação de pedidos de adiamento, o último dos quais, de 20 de Março de 2009, a que o sobredito ofício, e bem, registado, n.º …, de 24-03-2009, pôs cobro, informando, como antedito, que a avaliação se ia realizar no dia 27 de Março de 2009, pelas 10 horas, no local, lote ……….., tout court. XV E porque o Tribunal “a quo” pugnou pela produção de (qualquer) prova suplementar, aquela que entendesse ser a prova suficiente do envio da carta para notificação, que, como resulta dos autos, existe. XVI E assim sendo, deverá a sentença recorrida ser anulada e substituída por decisão que julgue verificada a notificação do representante do Impugnante e improcedente a presente impugnação, dado o douto Tribunal “a quo” ter incorrido em erro de julgamento. XVII Porque, não obstante a observância do disposto no art.º 13.º do CPPT e no art.º 99.º da LGT, e depois de ter recolhido prova suficiente em como houve conhecimento, por parte do Sr. Perito, do impugnante, da data de realização da 2ª avaliação. XVIII Ainda assim, julgou a impugnação procedente. XIX Mas ao concluir pela procedência da Impugnação, violou os citados preceitos, bem como os artigos 38.º, n.º 3 e 39.º., n.º 1, ambos do CPPT. XX Neste sentido, não podemos deixar de convocar excerto do douto Acórdão de STA, processo 0609/13, de 5.11.2014, consultável em www.dgsi.pt – “v - O registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo, uma presunção legal que se destina a facilitar a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando, presunção que, tendo por base o registo postal, só existe quando se prove que o registo foi efectuado.” XXI Que é o caso. CONFORME REGISTO – R …. PT - CONSTANTE DOS AUTOS. XXII E ainda o excerto do douto Acórdão do mesmo STA, processo 0830/17, de 30 de Maio de 2018, consultável em www.dgsi.pt – “II - A presunção de notificação prevista no nº 1 do art. 39º do CPPT está conexionada com a forma de notificação consagrada no art. 38º, nº 3, preceito que se refere à notificação por carta registada, a qual coenvolve um mecanismo que assegura a certeza e a segurança de que o acto notificado chega à esfera de cognoscibilidade do destinatário, através de recibo assinado pelo próprio ou por outrem por ele mandatado para o efeito, nos termos do estatuído no art. 28º do Regulamento do Serviço Público de Correios, aprovado pelo Decreto-Lei nº 176/88, de 18 de Maio.” XXIII Tendo decidido como decidiu, a douta sentença acaba por violar o disposto no art.º 13.º, do CPPT e no art.º 99.º da LGT, na medida em que não valoriza a prova recolhida nos autos, em como houve conhecimento, por parte do Sr. Perito, do impugnante, da data de realização da 2ª avaliação, bem como bem como os artigos 38.º, n.º 3 e 39.º., n.º 1, ambos do CPPT. XXIV Atento o exposto, deverá a douta sentença recorrida ser anulada e substituída por decisão que julgue verificada a notificação do impugnante e improcedente a presente Impugnação. Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a Vossas Excelências se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituida por douto Acórdão que declare improcedente a Impugnação, tudo com as devidas consequências legais”. O Recorrido não apresentou contra-alegações. Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso. Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.
É a seguinte a questão a decidir: a) Há erro de julgamento, na medida em que houve conhecimento, por parte do perito do Impugnante, da data de realização da 2.ª avaliação do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de C……., concelho de Grândola, sob o artigo ………?
II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “A) Em 10/09/2008 foi apresentada a declaração modelo 1 de IMI relativamente ao prédio urbano, constituído por lote de terreno para construção, inscrito na matriz sob o artigo …… da freguesia de C………., concelho de Grândola em virtude da sua primeira transmissão na vigência do Código do IMI; B) Tal declaração foi entregue pelo seu comproprietário R……………; C) Era igualmente comproprietário o ora Impugnante J……………….; D) O citado imóvel situa-se no então denominado ……..….., lote …………, no lugar de C………..; E) Na declaração citada em A) foi feito constar que a área total do terreno declarado correspondia a 2270 m2, sendo 680 respeitante a área de implantação do prédio e 1090 de área bruta de construção; F) Em 05/10/2008 foi elaborada no Serviço de Finanças de Grândola a 1ªavaliação do imóvel que resultou na fixação do valor patrimonial tributário de 610.230,00 € por aplicação da fórmula legal nos seguintes termos: - Vc – 615,00 - A – 1.090,0000 - % - 40,00 - Ac – 34,0000 - Ad – 1.1200 - Cl – 1,80 - Ca – 1,00 - Cq - 1,170 G) O aqui Impugnante tomou conhecimento da predita avaliação e com a mesma não se conformou; H) Em 27/11/2008 apresentou pedido de 2ª avaliação; I) Neste pedido indicou como Perito J……………. para o representar nesse ato; J) Designada que foi como data para reunião da comissão de avaliação o dia 18/02/2009 com vista à segunda avaliação do imóvel descrito em A) foi remetido ofício datado de 06/02/2009 dirigido ao Perito indicado em I); K) Na sequência do recebimento de tal ofício endereçou o Perito indicado ao Serviço de Finanças requerimento a solicitar adiamento da reunião da comissão para 18/03/2009 fundando-se em impossibilidade do requerente da 2ª avaliação participar na obtenção de elementos indispensáveis ao desempenho das suas funções; L) Foi deferido o adiamento da reunião da comissão e notificados os comproprietários do mesmo; M) Não foi de imediato agendada nova data para a reunião; N) Em 20/03/2009 o ora Impugnante deu entrada a requerimento no Serviço de Finanças invocando situação delicada de saúde e peticionando o adiamento da reunião da comissão até se encontrar restabelecido para cooperar com o Perito que designou; O) Mediante requerimento a que deu entrada em 25/03/2009 o Impugnante apresentou vários requerimentos de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença relativos aos períodos decorrentes entre 02/02/2009 e 13/02/2009, 14/02/2009 e 15/03/2009, 16/03/2009 e 14/04/2009; P) Através do ofício nº ... o Serviço de Finanças remeteu comunicação ao Perito designado pelo Impugnante a data de 27/03/2009 para sua convocação para a reunião da comissão com vista à segunda avaliação do imóvel; Q) A comissão de avaliação reuniu em 27/03/2009 no Serviço de Finanças de Grândola tendo sido elaborado termo de avaliação e pelos presentes subscrito; R) Não compareceu o Perito designado pelo Impugnante, J……………….; S) Do Termo de Avaliação ficou a constar, além do mais que: “(…) A Comissão decidiu aprovar por maioria a avaliação com o voto de desempenho do Presidente da Comissão tendo o Perito da Parte votado contra porque considera injusto não ser aplicado o Caj (coeficiente de ajuste de áreas) previsto no artigo 40º, A do CIMI introduzido exactamente para corrigir o valor patrimonial derivado de áreas brutas privativas e dependentes mais generosas conforme parece ter sido a vontade do legislador para benefício do contribuinte. Por outro lado considerando que o valor da área da implantação é determinado em função da área de construção autorizada ou prevista na qual se inclui a área bruta privativa e a área bruta dependente esta última sujeita à aplicação de um factor de ponderação de 0,30 constata que na avaliação efectuada toda a área foi avaliada como área bruta privativa quando é certo que nas áreas a construir serão efectuadas áreas para garagens, arrumos e outras de utilização acessórias que não podem nem devem ser contabilizadas nas áreas privativas sob pena de inflacionarem o valor do terreno. Em conclusão, o Perito da Parte não se conforma com o facto do procedimento avaliativo deixar de considerar uma percentagem ideal e residual como área bruta dependente.” T) Nesta sequência a comissão aprovou como 2ª avaliação o valor patrimonial tributário que havia sido fixado aquando da 1ª avaliação de acordo com os mesmos factores a que atendeu constantes da alínea F); U) Esta avaliação foi comunicada ao Impugnante através do ofício nº …………; V) Não se conformando com a mesma apresentou em 01/10/2009 a petição inicial que deu origem aos presentes autos”.
II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida: “Não resultou provado que: - o ofício nº ... remetido pelo Serviço de Finanças ao Perito designado pelo Impugnante, J………….., convocando-o para a reunião da comissão, em 27/02/2009, com vista à segunda avaliação do imóvel tenha sido recebido pelo mesmo através da carta registada com aviso de recepção com o código R…………….T”.
II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto: “[Quanto aos factos provados] Resultou a convicção do Tribunal da análise dos documentos constantes dos autos, que não foram impugnados. A decisão da matéria de facto, consoante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo, de acordo com a livre apreciação do julgador e por aplicação dos parâmetros da lógica do homem médio e das regras da experiência. Designadamente atendeu-se ao teor dos documentos juntos pelo Impugnante e constantes do processo administrativo sendo eles o procedimento de avaliação e documentos que o instruíram nas suas 2 fases. [Quanto ao facto não provado] A falta de prova deste facto decorreu da circunstância de não ter sido junto o respetivo aviso de recepção devidamente assinado conforme competia a fim de que se lograsse obter a sua demonstração. A conclusão é medianamente segura no sentido de julgar que efetivamente não teve lugar a notificação do visado na medida em que tendo sido, como foram, notificados outros Peritos na mesma ocasião e para o mesmo efeito e pela mesmíssima forma quanto a estes encontra-se junto comprovativo da segurança da notificação. Ao invés quanto ao Perito nomeado pelo Impugnante no seu pedido de 2ª avaliação assim não ocorreu”.
II.D. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, acorda-se aditar a seguinte matéria de facto provada: W) Foi elaborado, pelos serviços da administração tributária (AT), ofício, datado de 24.03.2009, dirigido a J……………….., indicando que a data da realização da segunda avaliação seria o dia 27.03.2009, pelas 10 horas (cfr. fls. 4 do documento com o n.º ………………… de registo no SITAF neste TCAS). X) No ofício mencionado em W) foi aposta a menção ao registo postal R…………….T (cfr. fls. 4 do documento com o n.º ……………. de registo no SITAF neste TCAS). Y) O objeto postal com o registo mencionado em W) foi expedido a 24.03.2009 (cfr. fls. 5 do documento com o n.º ……………….. de registo no SITAF neste TCAS).
II.E. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, acorda-se aditar a seguinte matéria de facto não provada: A) O ofício mencionado em W) foi entregue ao seu destinatário em momento anterior às 10 horas do dia 27.03.2009 (do processo nada consta sobre a efetividade da notificação em causa).
III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO III.A. Do erro de julgamento Entende a Recorrente que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, porquanto não se verifica qualquer irregularidade em termos de notificação da data da 2.ª avaliação ao perito representante do Recorrido. Vejamos. Com a reforma da tributação do património, de 2003, operou-se uma profunda alteração em termos de avaliação dos prédios urbanos. Como resulta do preâmbulo do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), aprovado pelo DL n.º 287/2003, de 12 de novembro, um dos objetivos desta reforma foi o de aproximar o valor tributário dos prédios ao seu valor de mercado. Citando: “O sistema de avaliações até agora vigente foi criado para uma sociedade que já não existe, de economia rural e onde a riqueza imobiliária era predominantemente rústica. Por essa razão, o regime legal de avaliação da propriedade urbana é profundamente lacunar e desajustado da realidade atual. (…) Com este Código opera-se uma profunda reforma do sistema de avaliação da propriedade, em especial da propriedade urbana. Pela primeira vez em Portugal, o sistema fiscal passa a ser dotado de um quadro legal de avaliações totalmente assente em fatores objetivos, de grande simplicidade e coerência interna, e sem espaço para a subjetividade e discricionariedade do avaliador. (…) Foram acolhidas, no essencial, as recomendações do relatório da Comissão de Desenvolvimento da Reforma Fiscal, bem como os critérios do anteprojeto do Código de Avaliações elaborado em 1991, atualizados mais tarde no âmbito da Comissão da Reforma da Tributação do Património, considerando-se, nomeadamente, a relevância do custo médio de construção, da área bruta de construção e da área não edificada adjacente, preço por metro quadrado, incluindo o valor do terreno, localização, qualidade e conforto da construção, vetustez e caraterísticas envolventes. Estes fatores são complementados com zonamentos municipais específicos, correspondentes a áreas uniformes de valorização imobiliária, com vista a impedir a aplicação de fatores idênticos independentemente da localização de cada prédio e de cada município no território nacional. (…) Os objetivos fundamentais das alterações propostas são, pois, o de criar um novo sistema de determinação do valor patrimonial dos imóveis, o de atualizar os seus valores e o de repartir de forma mais justa a tributação da propriedade imobiliária, principalmente no plano intergeracional. (…) Os prédios urbanos novos e os que forem transmitidos no domínio de vigência do CIMI serão objeto de avaliação com base nas novas regras de avaliação …”. Assim, atento o disposto no art.º 7.º do CIMI, o valor patrimonial tributário (VPT) dos prédios é fixado nos termos definidos naquele código, decorrendo do n.º 4 do seu art.º 37.º que a avaliação se reporta à data do pedido de inscrição do prédio na matriz. Em relação aos prédios urbanos, é desde logo de chamar à colação o art.º 38.º do CIMI, nos termos do qual (redação à época): “1 - A determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços resulta da seguinte expressão: Vt = Vc x A x Ca x Cl x Cq x Cv em que: Vt = valor patrimonial tributário; Vc = valor base dos prédios edificados; A = área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação; Ca = coeficiente de afetação; Cl = coeficiente de localização Cq = coeficiente de qualidade e conforto; Cv = coeficiente de vetustez. 2 - O valor patrimonial tributário dos prédios urbanos apurado é arredondado para a dezena de euros imediatamente superior”. Os elementos que integram a fórmula de cálculo são elementos cuja definição é bastante objetiva, sendo, pois, diminuta a margem de discricionariedade da administração na fixação do VPT. Como referido por José Maria Fernandes Pires 1 “O novo sistema de avaliações do IMI assenta em critérios e coeficientes de avaliação que são objectivos e demonstráveis. Essa objectividade foi assegurada pelo legislador, que plasmou na Lei todos os coeficientes de avaliação, tipificando-os minuciosamente. O Código do IMI enuncia de forma especificada todos os factores que condicionam a determinação do valor patrimonial, descrevendo-os e definindo-os de forma detalhada, com a preocupação clara de evitar que a sua interpretação conduza a valores divergentes, conforme os serviços ou as pessoas que efectuem a avaliação. Essa enunciação é tipificada e exaustiva, pelo que todos os coeficientes de avaliação estão previstos na Lei, não podendo os avaliadores usar quaisquer outros factores em cada avaliação que efectuarem. Além dessa tipificação exaustiva dos coeficientes-de avaliação, a Lei preocupa-se ainda em fixar, relativamente a cada um deles, a respectiva quantificação, estabelecendo a medida da sua contribuição individual para a determinação do valor patrimonial tributário resultante da avaliação. Esta objectivação na Lei dos coeficientes de avaliação é também um importante factor de transparência do sistema, dado que todos os cidadãos interessados podem verificar como se efectua a avaliação, sendo possível que cada um possa prever qual o valor resultante da aplicação dos coeficientes legais aos prédios de que são titulares. (…) A objectividade e transparência do sistema de avaliações permitem ainda eliminar os factores de subjectividade e discricionariedade dos avaliadores e da administração fiscal”. Em termos de procedimento e no que respeita exclusivamente aos prédios urbanos, temos que, sendo efetuada a 1.ª avaliação de um prédio, caso o sujeito passivo discorde da mesma, cabe-lhe requerer 2.ª avaliação. Os termos de realização desta 2.ª avaliação estão previstos no art.º 76.º do CIMI. Assim, a mesma deverá ser realizada por uma comissão, à época constituída por dois peritos regionais, designados pelo diretor de finanças, e pelo sujeito passivo ou seu representante (cfr. o art.º 76.º, n.º 1, do CIMI, em vigor à data da apresentação do pedido de realização de 2.ª avaliação). Apliquemos estes conceitos ao caso dos autos. In casu, como resulta provado, foi realizada a 1.ª avaliação do imóvel, na sequência da qual foi apresentado, pelo ora Recorrido, um pedido de 2.ª avaliação, no qual indicou J…………… como seu representante (perito). Foi designado o dia 18.02.2009 como data para a 2.ª avaliação, tendo sido requerido pelo mencionado perito o respetivo adiamento, conforme fundamentos mencionados em K) do probatório. Este adiamento foi deferido e veio a ser fixada nova data: 27.03.2009. A propósito desse adiamento foram remetidos dois ofícios ao representante (perito) do Impugnante: a) O mencionado em P) do probatório, tendo resultado não provado que o mesmo tenha sido recebido pelo perito através da carta registada com aviso de receção, o que não vem impugnado; b) O ofício mencionado em W), remetido a 24.03.2009, também dirigido ao perito do contribuinte, enviado via correio postal registado, inexistindo qualquer demonstração de que o mesmo tenha chegado à esfera de cognoscibilidade do perito. Considerou o Tribunal a quo que se postergou a formalidade essencial de se convocar o representante do sujeito passivo para a 2.ª avaliação. Desde já se adiante que se acompanha este entendimento. Com efeito, em sede de 2.ª avaliação, o sujeito passivo pode indicar para intervir na mesma um seu representante – in casu, o perito em causa. Estando em causa a participação numa diligência, é de aplicar o n.º 1 do art.º 38.º do CPPT, nos termos do qual a notificação é obrigatoriamente feita por carta registada com aviso de receção quando estamos perante a “convocação para estes [contribuintes] assistirem ou participarem em atos ou diligências”. Sendo J……………….. representante do Impugnante contribuinte, é aplicável esta exigência do ponto de vista de notificação, dado que inexiste norma específica que afaste esta regra geral – e tanto assim foi que o ofício mencionado em P) refere seguir esta formalidade (na medida em que no mesmo foi aposta a menção “Registado com aviso de recepção”, apesar de mais nada a esse respeito constar dos autos). Como decorre da factualidade assente e já referimos, foram remetidos dois ofícios ao perito representante do Recorrido na comissão de avaliação. Em relação ao ofício remetido via correio postal registado com menção de o ter sido com aviso de receção, resulta não provada a sua chegada à esfera de cognoscibilidade do seu destinatário, o que não é posto em causa pela Recorrente. Não há qualquer elemento que nos permita, pois, não só concluir pela efetividade desta notificação, mas também pelo cumprimento da exigência decorrente do n.º 5 do art.º 39.º do CPPT. Quanto ao ofício mencionado em W) do probatório, além de ter sido remetido através de carta registada, nada nos autos permite demonstrar que o mesmo chegou também à esfera de cognoscibilidade do destinatário. Mesmo que se cogitasse ser de aplicar a presunção prevista no n.º 1 do art.º 39.º do CPPT, há que sublinhar que o ofício foi expedido a 24.03.2009 para uma convocatória de diligência a 27.03.2009, às 10 horas. Ora, a presunção de notificação nunca teria o efeito pretendido pela Recorrente, porquanto o terceiro dia posterior ao registo foi precisamente o dia para o qual foi marcada a 2.ª avaliação, da parte da manhã. A notificação para a presença numa determinada diligência exige, naturalmente, a sua efetivação em momento anterior. Como tal, nem por esta via se poderia considerar que, em momento anterior ao da diligência, se presumia notificado o representante do Recorrido. Logo, carece de razão a Recorrente.
Vencida a Recorrente é a mesma responsável pelas custas (art.º 527.º do CPC). Cumpre, no entanto, atento o valor dos autos, considerar o disposto no art.º 6.º, n.º 7, do RCP. Assim, nos termos desta disposição legal, “[n]as causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”. No caso, tendo em conta a simplicidade da questão em apreciação e a conduta processual das partes, determina-se que haja lugar à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, prevista no art.º 6.º, n.º 7, do RCP.
IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em conferência na Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: a) Negar provimento ao recurso; b) Custas pela Recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que exceda os 275.000,00 Eur.; c) Registe e notifique. Lisboa, 11 de janeiro de 2024 (Tânia Meireles da Cunha) (Patrícia Manuel Pires) (Maria Cardoso) 1 José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Reimpressão, Almedina, Coimbra, 2011, pp. 37 e 38.: |