Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 1080/09.9BESNT |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 09/30/2025 |
| Relator: | ISABEL SILVA |
| Descritores: | FUNDAMENTAÇÃO À POSTERIORI VARIAÇÕES PATRIMONIAIS NEGATIVAS REGULARIZAÇÃO DAS EXISTÊNCIAS COMPROVAÇÃO E INDISPENSABILIDADE DOS CUSTOS |
| Sumário: | I) Quando o Tribunal recorrido julga prejudicado o conhecimento de algumas questões, a parte vencedora não decaiu nessa parte (que não chegou a ser apreciada), não havendo, por isso, lugar à ampliação do objeto do recurso, nos termos do artigo 636º do CPC, mas, julgamento em substituição (artigo 665º do CPC).
II) A decisão, em matéria de procedimento tributário, além de dever respeitar os princípios da suficiência, da clareza e da congruência, deve, também, ser contextual ou contemporânea do ato, não relevando a fundamentação inovatória feita a posteriori. III) Sempre que, nos procedimentos de reclamação graciosa e recurso hierárquico forem analisados documentos juntos naqueles procedimentos, na tentativa de justificar a regularização das existências questionadas pelos SIT, e a AT depois de os analisar criticamente, em conjugação com outros elementos, entender que a comprovação/regularização das existências permanecia por demonstrar, tal não corresponda a uma fundamentação à posteriori. IV) Os custos ou perdas dedutíveis fiscalmente, enquanto componente negativa do rendimento tributável, são aqueles que, comprovadamente são indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora (art. 23º do CIRC). V) No que tange à indispensabilidade do custo, cabe à AT pôr em causa a sua indispensabilidade, através da evidenciação de indícios sólidos da sua dispensabilidade “para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora” (art. 74.º, n.º 1, da LGT), face à presunção de veracidade de que goza as declarações dos contribuintes e os dados inscritos na sua contabilidade (art. 75.º, n.º 1 da LGT); VI) O requisito de indispensabilidade do custo ou perda, vertido no do art. 23.º do CIRC, tem de ser aferido através de um juízo casuístico, não podendo associar-se ao êxito de gestão, não se confundindo com a sua oportunidade ou conveniência, não abrangendo apenas custos que direta e imediatamente conduzam à obtenção de ganhos ou à manutenção da unidade produtiva (nexo causal/racionalidade económica), antes abarcando igualmente custos que mediatamente visam esse fim. VII) Ainda que o custo seja indispensável, a falta de comprovação, continua a legitimar o ato corretivo. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | * Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subseção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:I - RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA (ora recorrente) deduziu recurso, dirigido a este Tribunal Central Administrativo, tendo por objeto a sentença de 17.06.2021 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial que a T………- SOCIEDADE …………….., S.A. (recorrida), deduziu, na sequência do indeferimento do recurso hierárquico que interpôs contra a decisão que indeferiu a reclamação graciosa apresentada contra o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º ……….321, emitida na sequência de um procedimento de inspeção ao exercício de 1999, onde foram feitas correções, no valor de 425.183,00EUR, relativamente a regularização de existências contabilizada pela recorrida naquele exercício. * A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, com as seguintes conclusões: “A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos identificados que julga procedente a impugnação deduzida pela Impugnante T............ - SOCIEDADE ……….., S.A. do indeferimento do recurso hierárquico deduzido do indeferimento da reclamação graciosa interposta contra a liquidação de IRC do exercício de 1999, e no referente a correcção à matéria colectável decorrente do acréscimo ao lucro tributável do montante de € 425.183,00. B. Discorda a Fazenda Pública do entendimento sufragado na douta sentença, porquanto, tendo resultado a desconsideração do montante de €425.183,00 da não comprovação da indispensabilidade das variações patrimoniais negativas deduzidas ao lucro tributável pela Impugnante, resultou a mesma reflexamente da ausência de justificação, facultada pela Impugnante em sede de procedimento inspectivo, quanto às diferenças de inventário que motivaram as regularizações de existências, no montante indicado. C. Do procedimento inspectivo na origem do acto de liquidação de IRC nos presentes autos impugnado decorreu, no segmento com relevo para os presentes autos, correcção no montante de € 425.183,00 (85.241.538$00), valor este que acresceu ao lucro tributável, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 dos artigos 23.º e 24.º do Código do IRC, face à não comprovação da indispensabilidade das alegadas diferenças de inventário para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora, com consequente não aceitação fiscal. D. Em sede de procedimento inspectivo e até ao momento da elaboração e notificação à Impugnante do respectivo Projecto de Relatório, tendo sido detectadas alegadas diferenças de inventário justificativas de regularizações de existências no montante de € 425.183,00, constata-se não ter a Impugnante apresentado quaisquer documentos que pudessem, por alguma forma, suportar as apuradas diferenças. E. Sendo que, na sequência do exercício do direito de audição prévia, foi elaborado e notificado à Impugnante o competente relatório de inspecção, cujo teor acima se transcreve, e do qual decorre a manutenção da correcção, na medida em que a análise empreendida aos documentos juntos pela Impugnante e aos argumentos por si explanados não permitiram, não obstante a junção de um mínimo suporte documental, comprovar a não indispensabilidade do custo à luz do artigo 23.º do Código do IRC e do artigo 24.º do Código do IRC. F. Reconduzem-se os referidos documentos a meros documentos internos extraídos de sistema informático de gestão de stocks e dos quais resulta tão-só constatada, de forma notória, as já afirmadas diferenças de inventário, sem justificação adicional, e são ainda documentos referentes a dois levantamentos topográficos relativos apenas à Pedreira ……… - quando em causa igualmente diferenças de inventário derivados de causas diversas - , dos quais constam para o mesmo objecto medido valores divergentes sem qualquer justificação. G. Assim, não se pode concluir que se trate de diferenças de inventário inerentes à actividade normal da empresa que se encontrem documentalmente suportadas de forma a que se possa afirmar demonstrada a indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, não se subsumindo, como determinado em sede de procedimento inspectivo, no nº1 do artigo 23º do CIRC por remissão do nº1 do artigo 24.º do Código do IRC. H. E como decorre do relatório, os serviços de inspecção debruçaram-se e analisaram devidamente os argumentos e documentos apresentados, sendo que, dessa análise resultou, conforme consta igualmente do relatório de inspecção, e na sequência da prévia análise, que tais novos elementos continuavam a não demonstrar a indispensabilidade dos custos nos termos do disposto do artigo 24.º do CIRC, de onde se deduz uma ideia de continuidade da ponderação levada a cabo pelos serviços de inspecção que mantêm a correcção, porque, apesar de apresentar documentos, o sujeito passivo não estabelece, através dos mesmos, porque notoriamente insuficientes para comprovar documentalmente a alegada regularização de existências, a necessária conexão entre as alegadas diferenças de inventário constatadas e a actividade por si prosseguida. I. Acresce que a fundamentação das decisões proferidas em sede de procedimentos administrativos não se reconduz a fundamentação a posteriori, mas antes à confirmação dos argumentos invocados em sede de procedimento inspectivo para efeitos da não aceitação da dedução da variação patrimonial negativa ao lucro tributável, com subsequentes desenvolvimentos, por um lado, não conflituantes com a fundamentação ínsita no relatório, e, por outro lado, motivados pelos factos alegados e provas documentais apresentadas pelo sujeito passivo aqui Impugnante em tais procedimentos (conforme se retira da leitura atenta dos factos constantes das alíneas 10. e 14. do probatório da douta sentença). J. Por outro lado, o juízo conclusivo de que os custos em análise não são indispensáveis à realização dos proveitos, face à ausência de uma mínima demonstração dos mesmos, foi devidamente apreendido pela Impugnante, que alcançou as concretas razões em que a Administração Tributária assentou tal conclusão, como resulta da análise do requerimento de reclamação graciosa (facto a aditar ao probatório, cf. fls. 3 e ss. do documento constante de fls. 294 do SITAF) no qual alega, sem consequente demonstração, de forma mais detalhada do que a efectuada em sede de procedimento inspectivo, factos atinentes à consideração dos valores em causa como custos, contraditando as conclusões obtidas em sede de inspecção. K. Ora, para a afirmação da indispensabilidade do custo impõe-se previamente que seja estabelecido o necessário nexo causal entre o custo e a actividade desenvolvida pela empresa, para o qual concorre a comprovação pela Impugnante, não efectuada nos presentes autos, das alegadas regularizações de existências reconduzidas por si a variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício de 1999. L. E para efeitos dos n.ºs 1 dos artigos 23.º e 24.º do Código do IRC e de determinação da indispensabilidade afigurava-se imprescindível identificar os valores alegadamente devidos a diferenças de inventários como sendo valores com origem em efectivas regularizações de existências, com menção da sua motivação, factos estes que os documentos juntos não logram alcançar, bem como a prova produzida nos presentes autos. M. Apelando aos factos a ter em consideração - para os quais não concorrem os factos constantes das alíneas 1. e 2., uma vez que a douta sentença se atém à apreciação da legalidade do acto atendendo, erroneamente, à fundamentação constante do relatório de inspecção tributária – , tratando-se de alegadas diferenças de inventários cuja origem e motivação se configura desconhecida, tendo por referência os elementos juntos pela Impugnante em sede de procedimento inspectivo, e mesmo nos subsequentes procedimentos administrativos, abstendo-se a Impugnante de demonstrar o inverso, entendemos não verificado um qualquer nexo causal dos custos com os proveitos, atendendo ao escopo societário prosseguido pela Impugnante e à ausência de justificação dos valores. N. Nestes termos, é entendimento da Fazenda Pública não se encontrar suportado documentalmente o custo em análise nos presentes autos, de molde a admitir a sua indispensabilidade, e cabendo à Impugnante, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 74.º da LGT, tal demonstração, contra si terá de ser valorada a ausência de prova produzida nos autos, não sendo, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, conjugado com o n.º 1 do artigo 24.º do mesmo diploma legal, elegível o montante de € 425.183,00 a custo fiscalmente admissível. O. Incorreu, assim, a douta sentença em errónea apreciação dos factos pertinentes, com consequente erro de julgamento de direito, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC e do artigo 24.º do Código do IRC. P. Sendo que, mais se requer, por verificados os requisitos vertidos no n.º 7 do artigo 6.º do RCP, a dispensa na presente sede do pagamento do remanescente da taxa de justiça correspondente ao valor que excede o montante de € 275.000,00. Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença ser revogada, com o julgamento improcedente da impugnação, com as legais consequências. Mais se requer, ao abrigo do disposto no n.º7 do artigo 6º do RCP, a dispensa do pagamento da taxa de justiça correspondente ao valor superior a €275.000,00. Sendo que V. Exas., Decidindo, farão a Costumada Justiça” * A Recorrida, apresentou contra-alegações, e prevenindo a hipótese de o Tribunal conceder provimento ao recurso, requereu a título subsidiário e no uso da faculdade consentida pelo artigo 636.º do CPC, a ampliação do objeto do recurso, tudo com base no seguinte quadro conclusivo:
“1.ª A douta sentença recorrida julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento que recaiu sobre o recurso hierárquico n.º RH ………….. (RHG 241/08), proferida através de despacho de 14.04.2009 da Diretora dos Serviços do IRC, a Exma. Senhora Dr.ª …………, deduzido contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ………., relativa ao ato tributário consubstanciado na liquidação adicional de IRC n.º ………321, de 27.08.2002, respeitante ao exercício de 1999; 2.ª O Tribunal a quo entendeu que a administração tributária fundamenta o ato tributário de forma distinta no relatório de inspeção tributária, na decisão da reclamação graciosa e na decisão de indeferimento do recurso hierárquico, considerando que apenas a fundamentação do relatório de inspeção tributária se afigura legal por ser contemporânea do ato; 3.ª Ademais, a sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial quanto à dedutibilidade dos custos para efeitos de IRC, por entender que a administração tributária não pode limitar-se a aventar que o gasto não é indispensável para a atividade da Recorrida, tendo o ónus de justificar por que motivos julga não se verificar a indispensabilidade, sem tecer juízos sobre a oportunidade ou razoabilidade do custo incorrido; 4.ª A Recorrente deduz o presente recurso arguindo que o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento de Direito por incorreta interpretação da matéria de facto, violando o disposto nos artigos 23.º e 24.º do Código do IRC, alegando para tal: (i) que o custo foi desconsiderado por não ter sido comprovada a sua indispensabilidade, uma vez que os elementos apresentados não permitirem estabelecer o nexo entre o custo e a atividade da Recorrida e (ii) que não se verifica fundamentação a posteriori porquanto as decisões da reclamação graciosa e recurso hierárquico apenas confirmam o disposto no relatório de inspeção tributária, o qual desenvolvem tendo em conta os factos alegados e provas apresentadas pela ora Recorrida; 5.ª Salvo o devido respeito, a tese sufragada pela Recorrente não pode prosseguir porquanto a mesma assenta na errada interpretação da matéria de facto e de Direito; 6.ª Verifica-se fundamentação a posteriori pois: (i) no relatório de inspeção tributária, a administração tributária fundamenta a correção na alegada falta de demonstração da indispensabilidade da variação patrimonial negativa decorrente da regularização de existências; (ii) na decisão da reclamação graciosa, a administração tributária pronuncia-se pela manutenção da correção com fundamento: (a) nas diferenças de stock relevadas pela Recorrida não se encontrarem devidamente justificadas e (b) em não dever ter relevado a referida regularização de existências como variação patrimonial negativa, mas, ao invés, como acerto a repercutir como custo do exercício no resultado líquido do exercício; e (iii) na decisão de recurso hierárquico, a administração tributária defende que não foi demonstrada a indispensabilidade dos custos, por não serem fiáveis os inventários, em resultado das incongruências apuradas nos cálculos dos custos; 7.ª Os fundamentos do relatório de inspeção tributária e das decisões referidas são distintos, pois no relatório apenas se invoca a falta de comprovação da indispensabilidade do custo e nas decisões invoca-se a falta de comprovação dos custos; 8.ª Como bem entendeu a sentença recorrida, a fundamentação tem de ser contemporânea do ato, não sendo permitido suprir ou completar posteriormente as carências e as deficiências da mesma, pelo que os fundamentos deduzidos depois do relatório de inspeção não fundamentam o ato (cf. neste sentido vide: os artigos 36.º e 99.º, alínea c), do CPPT e 77.º, n.º 2, da LGT; os acórdãos do STA de 03.05.2006 (recurso n.º 0154/06), de 06.06.2007 (recurso n.º 0155/07), de 31.01.2007 (recurso 01016/06), de 17.11.2004 (recurso n.º 0772/04), de 09.05.2001 (recurso n.º 25832), do Tribunal Central Administrativo de 27.11.2001 (recurso n.º4975/01); ANTÓNIO LIMA GUERREIRO, in “Lei Geral Tributária Anotada”, Editora Rei dos Livros, pp. 337 e 338, e JOSÉ FERNANDES PIRES, in “Lei Geral Tributária – Comentada e Anotada”, Almedina, 2015, p. 830); 9.ª Resulta incontestado que a fundamentação propugnada pela administração tributária nas decisões de indeferimento da reclamação graciosa e do recurso hierárquico não coloca em causa, por mais que insistentemente esta assim o pretenda ficcionar, a indispensabilidade do custo, mas sim a sua comprovação/quantificação, uma vez que a análise veiculada naquelas decisões tem por objeto a validade dos documentos de per si, bem como a congruência dos valores nestes apurados para efeitos de regularização de existências, constituindo, por isso, fundamentação a posteriori o que a inquina de ilegalidade (cf. pp. 11 e 20 do doc. n.º 2 da p.i.; a propósito dos requisitos de comprovação e indispensabilidade do artigo 23.º do Código do IRC, vide ANTÓNIO MOURA PORTUGAL, in “A dedutibilidade dos custos na jurisprudência fiscal portuguesa”, Coimbra Editora, 2004, pp. 108, 112 e 113); 10.ª Ademais, na decisão da reclamação graciosa sustenta-se o errado enquadramento contabilístico da regularização de existências como variação patrimonial negativa e, na decisão de indeferimento do recurso hierárquico que os custos subjacentes à regularização de existências não podem ser aceites por respeitarem “(…) a variações patrimoniais ocorridas em exercícios anteriores, apenas contabilizadas em 1999.” (cf. p. 21 do doc. n.º 2 da p.i.) e que se verificam incongruências na fundamentação da Recorrida, pelo que sendo estes fundamentos “novos” que não resultam do relatório de inspeção tributária, constituem fundamentação a posteriori e não são, deste modo, suscetíveis de fundamentar o ato; 11.ª Quanto à indispensabilidade do custo, bem andou a sentença recorrida ao referir que a administração tributária tem o dever de fundamentar por que motivos entende não ser o custo indispensável à atividade da Recorrida, não bastando concluir pela não verificação deste requisito, pelo que não tendo fundamentado as suas conclusões improcede a sua tese; 12.ª Quanto ao conceito de indispensabilidade, tem vindo a jurisprudência a entender que este deve ser preenchido numa ótica económico-empresarial, equivalendo os custos indispensáveis aos gastos contraídos no interesse da empresa, excluindo-se, tão-somente, aqueles que não se inserem no interesse da empresa porque não visam o lucro (cf. MIGUEL MALHEIROS E MIGUEL PATRICIO, “A qualificação e o ónus da prova no regime da dedutibilidade de custos fiscais, A reestruturação de empresas e limites do planeamento fiscal”, Coimbra Editora, 2009, p. 230; TOMÁS DE CASTRO TAVARES, “Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal na determinação do rendimento tributável das pessoas colectivas: Algumas reflexões ao nível dos custos”, Ciência e Técnica Fiscal n.º 396, dezembro de 1999, p. 125); 13.ª O requisito da indispensabilidade tem por escopo a apreciação do custo enquanto ato de gestão em função do concreto objeto societário, recusando-se que esta indispensabilidade possa ser aferida livremente a partir de um qualquer juízo subjetivo por parte da administração tributária, pois o controlo a efetuar pela administração tributária só pode ser um controlo negativo, desconsiderando como custos fiscais os que claramente não estejam relacionados com a atividade da empresa e, por essa razão, não tenham potencialidade para gerar ganhos ou proveitos (cf. SALDANHA SANCHES, in “Boletim de Ciência e Técnica Fiscal” n.º 365, pp. 343 e ss.; TOMÁS CASTRO TAVARES, op. cit, p. 136; acórdãos do STA de 29.03.2006 (proc. n.º 01236/05), de 30.11.2011 (proc. n.º 0107/11), de 24.09.2014 (proc. n.º 0779/12) e do Tribunal Central Administrativo Sul de 17.07.2007 (proc. nº 01107/06) e de 12.01.2017 (proc. 09894/16); decisão arbitral de 08.07.2013 (proc. n.º 12/2013-T); 14.ª In casu, a existência de inertes, matérias-primas essenciais no desenvolvimento da atividade da empresa, afigura-se como um valor necessário na realização de operações de afluxo de valores positivos à empresa, pelo que a sua regularização, de forma a evidenciar qual a efetiva quantidade de existências no final do exercício, apresenta uma relação justificada com a atividade da Recorrida e da sua congruência económica com o respetivo sector em que se insere; 15.ª Afigura-se mais do que razoável, face ao volume de negócios da empresa, “quebras” de existências como aquelas que se verificaram no exercício em apreço, constituindo vicissitudes quase inevitáveis da atividade desenvolvida, sendo inquestionável, nessa medida, a subsunção do custo com a sua regularização aos critérios genéricos de elegibilidade dos custos (cf. artigo 23.º do Código do IRC); 16.ª Logo, resultando o ato de liquidação de uma correção na qual a administração tributária nega a dedutibilidade fiscal à variação patrimonial negativa com regularizações de existências, com fundamento em a ora Recorrida não ter comprovado a indispensabilidade da mesma, sem antes se mostrar cumprido o ónus que sobre si recai nos termos do artigo 74.º da LGT, é forçoso concluir que o mesmo padece de ilegalidade nos termos que lhe são assacados pela sentença ora recorrida, que não merece qualquer censura, mesmo porque, conforme se comprovou acima resulta demonstrada a indispensabilidade do custo, motivo pelo qual deve nessa medida o recurso ser julgado improcedente; 17.ª Sem prejuízo do exposto, ainda que se conclua pela procedência do recurso apresentado, o que apenas por dever de patrocínio se admite, sem conceder, desde já se requer a ampliação do objeto do recurso tendo em vista a apreciação pelo Tribunal ad quem do vício da (i) falta de audição prévia, bem como dos demais fundamentos invocados pela administração tributária e que se reconduzem aos seguintes temas (ii) ao registo da variação patrimonial negativa e (iii) às alegadas incongruências: (iii.i) do sistema de inventário utilizado; (iii.ii) do preço unitário dos inertes e das quantidades apuradas; (iii.iii) da existência de diferenças de stock noutras pedreiras (cf. artigo 636.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06.08.2002; ABILIO NETO, in “Código de Processo Civil Anotado”, 23.ª Ed. Actualizada, Ediforum, setembro de 2011, p. 1033); 18.ª Com referência ao vício de falta de audição prévia, a ora Recorrida não foi ouvida antes da prolação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, o que se manifesta lesivo dos seus direitos e interesses, dispondo a lei que o contribuinte tem o direito a participar na formação das decisões que lhe digam respeito, mediante audição prévia à prolação do ato definitivo, assegurando que a administração tributária não tome nenhuma decisão sem ter dado ao contribuinte a oportunidade de se pronunciar sobre as questões que importam a essa mesma decisão (cf. artigos 267.º, n.º 5 da CRP e 60.º da LGT; acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 10.03.2009 (proc. n.º 02641/08); JOSÉ FERNANDES PIRES et. al., in “Lei Geral Tributária – Anotada e Comentada”, Almedina, 2015, p. 618); 19.ª Não se verifica a circunstância prevista no artigo 60.º, n.º 3 da LGT, a qual, a ocorrer, seria suscetível de dispensar o exercício do direito de audição antes da notificação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, pois, embora a Recorrida tenha sido ouvida numa fase anterior do procedimento gracioso, apenas se dispensa o exercício do direito de audição prévia quando a decisão a proferir se baseie nos mesmos factos em que se fundamentou a decisão anterior, o que não sucedeu (cf. pp. 8, 23, 24 e 26 do doc. n.º 2 da p.i.), pelo que existindo factos novos a audição prévia da Recorrida era obrigatória, o que acarreta a improcedência do recurso e a manutenção da sentença recorrida (cf. artigo 60.º, n.º 1, alínea b) da LGT; acórdãos do STA de 26.09.2018 (proc. n.º 01506/17.8BALSB), do Tribunal Central Administrativo Norte, de 27.11.2014 (proc. n.º 00072/01) e do Tribunal Central Administrativo Sul de 04.04.2002 (proc. n.º 5085/00)); 20.ª Quanto ao registo da variação patrimonial negativa, invoca a administração tributária que a mesma deve constituir um custo do exercício de 1999, independentemente de ser, ou não, aceite como custo fiscal ex vi artigo 23.º do Código do IRC e que, por essa razão, deveria encontrar-se refletida no resultado líquido do exercício e não constituir uma componente de resultados transitados; 21.ª A tese da administração tributária é ilegal, pois se desconsiderada pela administração tributária a regularização de existências efetuada pela Recorrida como variação patrimonial negativa impunha-se, então, que a primeira efetuasse o correspondente “ajustamento”, i.e., promovessem a relevação daquela regularização como custo fiscal do exercício, por força do princípio da justiça (cf. artigo 266.º, n.º 2 da CRP), isto porque a consideração da regularização de existências como custo do exercício e não como variação patrimonial negativa, sempre determinaria o apuramento do mesmo lucro tributável do exercício; 22.ª Ademais, não compreende a Recorrida o alcance da afirmação da administração tributária ao considerar que as variações patrimoniais negativas não se apresentam indispensáveis para a obtenção dos proveitos, por decorrerem de variações patrimoniais ocorridas em exercícios anteriores, apenas quantificadas em 1999, já que a periodização das variações patrimoniais nunca foi questionada pelos serviços de inspeção tributária com vista a suportar a correção em apreço e também não se vislumbra possível inferir tal conclusão de um qualquer documento apresentado pela Recorrida ou pela administração tributária, desde logo, por tal não corresponder à verdade dos factos, pelo que, neste sentido, deverá improceder o recurso; 23.ª Quanto às alegadas incongruências do sistema de inventário utilizado, a administração tributária questiona, na decisão de indeferimento do recurso hierárquico, qual o sistema de inventário adotado no exercício de 1999, no entanto, a propósito da explicitação das divergências dos extratos dos produtos e dos valores evidenciados na contabilidade, a Recorrida clarificou no recurso hierárquico que, no exercício de 1999, encontrando-se a preparar a implementação do sistema de inventário permanente para o ano de 2000, atenta a exigência legal do Decreto-Lei n.º 44/99, adotou naquele exercício, extra-contabilisticamente, um sistema de gestão de produto (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha José Manuel Fernandes Calé, minutos 01:34:04); 24.ª Embora a Recorrida tenha adotado no exercício de 1999 um sistema de gestão de produto cujos extratos foram juntos no âmbito da audição prévia na ação de inspeção tributária, o qual tinha por finalidade o mero controlo extra-contabilístico (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha inquirida J …………………., minutos 01:34:04), os seus resultados são irrelevantes para efeitos de regularização contabilística das existências no final do exercício e, consequentemente, também o são as divergências e incongruências que da sua comparação possam resultar, pois encontrando-se a Recorrida legalmente sujeita a um sistema de inventário intermitente e devendo a sua contabilidade ser efetuada de acordo com as regras por este impostas, a junção daqueles extratos apenas pretendeu evidenciar que as existências no final do exercício, também naquele controlo extra-contabilístico, foram consideradas pelo valor das quantidades apuradas nos respetivos levantamentos topográficos pelo que, nunca tendo as quantidades constantes daquele extrato merecido qualquer relevância contabilística, a alegada incongruência entre os valores inscritos naqueles e os inscritos no inventário a 31.12.1999, não tem qualquer procedência; 25.ª O impacto e relevância fiscal, no final do exercício, da regularização de existências afigura- se materialmente indistinta consoante seja adotado o sistema de inventário intermitente ou permanente, sendo que a distinção entre estes dois tipos de sistema reside na possibilidade de, no segundo caso, se dispor a qualquer momento de uma informação atualizada do stock por força do controlo contínuo de entradas e saídas e, no primeiro, apenas no final do exercício pois, se assim não o fosse, estaria a permitir-se às empresas o apuramento das suas existências de forma diferenciada em função do sistema de inventário adotado, em violação dos princípios da comparabilidade e da tributação pelo lucro real (cf. artigo 104.º, n.º 2 da CRP), pelo que o esclarecimento prestado pela ora Recorrida quanto ao sistema de inventário utilizado em nada prejudica as suas explicitações quanto à regularização de existências; 26.ª Por outro lado, não compreende a ora Recorrida o alcance da afirmação da administração tributária no sentido de que, face à adoção do sistema de inventário intermitente no exercício de 1999, não se justifica um controlo contínuo da quantidade de inertes produzidos, bem como que o critério de registo de saída de matérias-primas tenha sido omitido pela Recorrida, pois não só a adoção de um sistema de inventário intermitente não pressupõe que deixe de existir um controlo contínuo da matéria-prima “adquirida”, como não tem de existir controlo das saídas (cf. “Plano Oficial de Contabilidade explicado”, de José Bento e José Fernandes Machado, 26.ª edição, p. 174), pelo que também neste sentido deverá improceder o recurso; 27.ª No que respeita à alegada falta de fiabilidade dos inventários, invoca a administração tributária que o preço unitário dos inertes registados nos extratos dos produtos e no inventário se apresentam distintos, o que não se admite uma vez que a variação do preço de custo, refletida aliás nos próprios extratos dos produtos, decorre das condições que se verifiquem em cada exercício para apuramento daquele custo de produção, inexistindo qualquer imposição legal no sentido de ser necessária a aceitação prévia por parte da administração tributária de um novo valor valorimétrico adotado pelo contribuinte quando este mantenha o critério utilizado, qual seja, o de custo de produção, sem prejuízo do mesmo poder variar de exercício para exercício, atenta a alteração dos condicionantes da sua determinação, no presente caso, relacionados com o custo de extração (custos com maquinaria, mão-de-obra, eletricidade, produção em economias de escala, etc.), bem como de pedreira para pedreira por força das condições específicas de exploração das mesmas (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha J ……………………., minutos 01:37:00); 28.ª Invoca-se ainda na decisão de indeferimento de recurso hierárquico uma suposta incongruência entre o inventário final a 31.12.1999 e os valores constantes dos levantamentos topográficos (cf. p. 26 da decisão de indeferimento do recurso hierárquico), bem como a circunstância de existir mais do que um levantamento topográfico para a pedreira de .............., a qual surge, de resto, melhor sustentada na decisão de indeferimento da reclamação graciosa (cf. p. 7 e ss. da decisão da reclamação graciosa); 29.ª Foram, efetivamente, efetuados dois levantamentos topográficos relativamente à pedreira de ..............: o primeiro levantamento topográfico na pedreira de .............., atenta a falta de consideração de algumas premissas (cf. suporte áudio do depoimento da testemunha João Paulo Simões Henriques, minutos 01:15:00) – morfologia do terreno da pedreira e baridade distinta dos inertes – não foi relevado contabilisticamente e, assim, apenas o segundo levantamento topográfico, por se apresentar mais rigoroso, foi relevado contabilisticamente para efeito de acerto de stock no final do exercício, devendo, deste modo, a regularização de existências ser aferida pelos valores neste apurados e não em qualquer outro, pelo que não se afiguram procedente a alegada incongruência identificada pela administração tributária, pois não há qualquer diferença entre os valores constantes do segundo inventário e os relevados contabilisticamente para efeito de acerto do stock, tendo a diferença constatada pela administração tributária aquando da análise daquele levantamento topográfico resultante da consideração do produto inscrito manualmente naquele do valor de 1,5 como baridade para todos os inertes, lapso este que poderia ter sido facilmente detetado pela administração tributária, uma vez que lhe bastaria proceder à multiplicação dos metros cúbicos apurados pelas diferentes baridades registadas naquele levantamento, igualmente inscritas no inventário físico – diferença, inclusivamente, destacada pela administração tributária, como acima se aludiu – e verificar, então, que o produto obtido se afigurava igual ao constante do inventário; 30.ª Quanto à falta de objetividade e de rigor do critério adotado para controlo das existências, não só este critério não foi questionado pelos serviços de inspeção tributária e refletido no relatório de inspeção tributária, como também não existe qualquer vício na forma de contabilização e acerto das existências no final do exercício decorrente da falta de objetividade e rigor na sua medição, resultando demonstrado que o método e critérios seguidos pela Recorrida na inventariação das existências são os que se afiguram mais objetivos e credíveis à luz das matérias-primas em causa e da atividade exercida pela Recorrida, isto porque contrariamente ao que sucede com a maior parte das matérias-primas, a inventariação de inertes não é suscetível de ser obtida por contagem física, dependendo de outros critérios de contagem (cf., suporte áudio do depoimento da testemunha F …………. ……., minutos 00:42 a 00:46); 31.ª Num primeiro momento, face à impossibilidade de medições topográficas diárias, semanais ou mesmo mensais, esta contagem é efetuada com base em critérios tradicionais de avaliação e, só depois complementada, com vista à elaboração da contagem para efeitos de encerramento das contas, pela rigorosa medição topográfica das pilhas de inertes acumulados; 32.ª Não obstante o rigor da medição topográfica na contagem de inertes, por resultar de medição efetuada por técnicos especializados e com base em critérios científicos, reduzindo substancialmente a margem de erro na avaliação de stocks, porquanto não consubstancia uma contagem física dos mesmos, isto é, “pedra a pedra”, não se encontra isento de quaisquer críticas, nomeadamente por força da existência de uma margem de erro induzida pelo grau de “prensagem” a que cada pilha pode estar sujeita mas tal não conduz à falta de rigor no controlo de existências, porquanto a Recorrida utiliza um critério técnico-científico de medição, ainda que por inerência das matérias-primas em causa contenha uma margem de erro, a qual, contudo, não faz perigar a objetividade dos resultados obtidos; 33.ª Logo, não existe a invocada desconformidade entre os valores da medição topográfica e a regularização de final de ano, nem qualquer outra irregularidade suscetível de colocar em causa, quer a fiabilidade do levantamento efetuado, quer a regularização de existências sustentada por aquela medição topográfica, pelo que, também por este motivo deverá improceder o recurso da Recorrente e manter-se a sentença recorrida; 34.ª Por fim, quanto às alegadas incongruências por existência de diferenças de stock nas pedreiras de .............. e .............., referiu a Recorrente no recurso hierárquico que também relativamente a outras pedreiras, nomeadamente a de Rio Maior, se verificou uma discrepância relativamente ao registo do produto em stock e a quantidade de inertes apurada no levantamento topográfico a 31.12.1999 e que nas pedreiras em que houve acerto de stocks também a diferença apurada concorreu para o lucro tributável do exercício, ainda que, pela sua menor expressão, não tenham sido relevados nos resultados transitados, mas no resultado líquido do exercício, pelo que, também este fundamento não se afigura procedente o recurso da Recorrente e deverá ser mantida a sentença recorrida. Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado, e, nessa medida, manter-se a sentença recorrida, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA! Sendo o valor do recurso superior a €275.000,00 e verificando-se os pressupostos estabelecidos no n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, requer-se que seja a Recorrida dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça.» * Os autos tiveram vista do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, nos termos do art. 288.º, n.º 1 do CPPT, o qual emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.* * Colhidos os vistos legais, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, vem o processo à Conferência para julgamento.* * II -QUESTÕES A DECIDIR:* Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT]. Nesta conformidade, cabe a este Tribunal apreciar e decidir se a decisão recorrida padece de: - Erro de julgamento de direito ao concluir que existe fundamentação a posteriori, e se foi afrontado o disposto nos artigos 23º e 24º do CIRC. - Em caso de proceder o recurso da FP, apreciar as questões cujo conhecimento ficou prejudicado pelo Tribunal a quo. * III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
* A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade: «1. Em 31/12/1999 foram efectuados, no final do exercício, levantamentos topográficos às pedreiras de .............. e .............. (depoimento das testemunhas José …………., F ………..…….., João ……………… e J …………..); 2. De acordo com o levantamento topográfico efectuado as existências de inertes nas referidas pedreiras encontravam-se sobreavaliadas (depoimento da testemunha José ……….,); 3. Em 31/12/1999 a impugnante elaborou um inventário físico à pedreira de .............. do qual consta uma diferença entre as quantidades do inventário e as quantidades de relatórios no montante de Esc.: 57.121.481$00 (cfr. doc. de fls. 133 do processo instrutor junto aos autos – reclamação graciosa); 4. Em 31/12/1999 a impugnante elaborou um inventário físico à pedreira de …… do qual consta uma diferença entre as quantidades do inventário e as quantidades de relatórios no montante de Esc.: 28.120.057$41 (cfr. doc. de fls. 134 do processo instrutor junto aos autos – reclamação graciosa); 5. A impugnante em 31/12/1999 contabilizou, por conta de Regularização de existências na Pedreiras de ……… e ………, a débito a conta 5922 as quantias de 57.121.481$00 e 28.120.057$00 e a crédito as contas 361114 e 361113 nas mesmas quantias, respectivamente (cfr. doc. de fls. 132 do processo instrutor junto aos autos – reclamação graciosa); 6. A impugnante foi sujeita a uma acção inspectiva interna levada a cabo pelos Serviços de Inspecção Tributária no âmbito da qual procederam à analise interna da Declaração Modelo 22 de IRC para o exercício de 1999 (cfr. doc. de fls. 98 a 102 do processo instrutor junto aos autos); 7. Em 02/08/2002 foi elaborado o relatório inspectivo do qual, com interesse para os presentes autos, consta o seguinte: (cfr. doc. de fls. 98 a 102 do processo instrutor junto aos autos); 8. Na sequência da acção inspectiva melhor identificada no ponto anterior foi efectuada, em 27/08/2002, a liquidação de IRC com o nº ……….321 referente ao exercício de 1999, da qual consta o seguinte: (cfr. doc. de fls. 54 dos autos); 9. Em 10/01/2003 a impugnante apresentou uma reclamação graciosa da liquidação melhor identificada no ponto anterior, colocando em causa a correcção efectuada em sede das variações patrimoniais negativas decorrentes de variação de existências (cfr. doc. de fls. 3 a 66 do processo instrutor referente à Reclamação Graciosa, junto aos autos); 10. Em 14/12/2007 foi elaborada uma informação apreciando a reclamação graciosa apresentada pela impugnante, da qual consta o seguinte: «Texto no original» (…)” (cfr. doc. de fls. 139 a 149 do processo instrutor junto aos autos – reclamação graciosa); 11. A impugnante foi notificada para se pronunciar sobre a proposta de decisão (cfr. doc. de fls. 151 a 152 do processo instrutor – reclamação graciosa); 12. Em 08/02/2008 foi elaborada nova informação no sentido de manter o conteúdo da informação identificada no ponto 10 deste probatório (cfr. doc. de fls. 154 do processo instrutor – reclamação graciosa); 13. Em 06/03/2008 foi proferido despacho pelo Director de Finanças Adjunto da Divisão de Justiça Contenciosa da Direcção de Finanças de Lisboa indeferindo a reclamação graciosa nos termos da informação melhor identificada no ponto anterior (cfr. doc. de fls. 153 do processo instrutor junto aos autos – reclamação graciosa); 14. A impugnante recorreu hierarquicamente do despacho identificado no ponto anterior (cfr. doc. de fls. 3 a 38 do processo instrutor – recurso hierárquico); 15. Em 16/02/2009 foi elaborada a informação nº 717/09 da Direcção de Serviços do IRC, da qual consta o seguinte:
(cfr. doc. de fls. 57 a 87 do processo instrutor junto aos autos – recurso hierárquico); 16. Por despacho de 14/04/2009 foi indeferido o recurso hierárquico deduzido pela impugnante (cfr. doc. de fls. 57 do processo instrutor junto aos autos – recurso hierárquico);”. * A decisão recorrida consignou ainda, relativamente aos factos que considerou não provados, com interesse para a decisão a proferir, o seguinte: ”Dos factos constantes da impugnação, todos objetos de análise concreta, não se provaram outros com interesse para a decisão.”. * Quanto à motivação da decisão de facto, o Tribunal recorrido consignou que: “A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, bem como do depoimento das testemunhas arroladas e ouvidas pelo Tribunal. A primeira testemunha José …………………, contabilista certificado, declarou ter feito a auditoria à impugnante, sendo que desde 2001 já não desempenhou funções na impugnante. Explicou como era feita a relação das existências da impugnante, afirmando que a contagem das existências era efectuada através de medição topográfica feito no final do ano. Esclarece que os consumos de inertes eram rigorosos porque eram pesados, no entanto, os inertes extraídos e utilizado na produção era feita por estimativa. Ora, esta situação de calculo por estimativa pode dar origem a divergências. São essas divergências, que deveriam ter sido calculadas mensalmente, foram levadas a resultados transitados porque a administração entendeu que não era possível explicar aos stakholdres esta situação. O depoimento desta testemunha foi credível, seguro, coerente e demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs. A segunda testemunha, F …………….., encarregado da pedreira, e encontrava-se especialmente em Rio Maior. Afirmou que no final ano faziam levantamentos topográficos. Esclareceu o que se entende por baridade explicando que quando maior for a pedra menor é a baridade, porque a pedra preenche pior os espaços vazios. É a testemunha que informa os topógrafos dos montes de inertes que devem ser medidos, não acompanhando o trabalho do topógrafos. O depoimento desta testemunha foi fiável, seguro e demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs. A terceira testemunha, João …………………, topografo na impugnante. Esclareceu que efectuava medições nas pedreiras e nas obras. Deslocava-se às pedreiras para fazer medições topográficas onde fazia as medições em metros cúbicos. Afirmou que as maiores dificuldades que se levantavam no seu trabalho era saber a dimensão dos montes. No que diz respeito a .............. não sabe nada pois nunca trabalhou nessa pedreira. O depoimento desta testemunha foi seguro, coerente e demonstrativo que teve conhecimento directo dos factos a que depôs. A quarta testemunha inquirida, J ………………….., contabilista certificado, afirmou ser contabilista da impugnante desde 1996. Esclareceu como era feita a inventariação das pedreira no exercício de 1999. O depoimento desta testemunha foi seguro, coerente e demonstrativo que teve conhecimento directo dos factos a que depôs. A quinta testemunha, primeira e única da Fazenda Pública, H …………….., economista, coordenador da equipa que efectuou a fiscalização. Esclareceu que estamos perante uma analise interna e que acompanhou a inspecção. Explicou a forma como foi a inspecção e do que levou à conclusão da inspecção. O depoimento da testemunha nada adiantou ao tribunal uma vez que se limitou a explicar o relatório e os mapas. “. * IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO: Importa desde já anotar que, pese embora a recorrida, nas contra-alegações oferecidas refira que pretende ampliar o objeto do recurso, a verdade é que não estamos perante uma ampliação de recurso a que alude o artigo 636º do CPC, mas de um julgamento em substituição, nos termos consagrados no artigo 665º nº 2 daquele mesmo diploma legal. Estar-se-ia diante de uma ampliação de recurso se a parte vencedora (recorrida) tivesse, ainda assim, decaído na apreciação de algumas questões que o Tribunal a quo tivesse julgado improcedentes. Contudo, não é essa a situação em causa nestes autos. Vejamos. Decorre do artigo 636º do CPC, sob epígrafe “Ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido”, o seguinte: “1 - No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação. (…) 3 - Na falta dos elementos de facto indispensáveis à apreciação da questão suscitada, pode o tribunal de recurso mandar baixar os autos, a fim de se proceder ao julgamento no tribunal onde a decisão foi proferida”. Ora, na situação que nos é colocada, a parte não decaiu (como imposto pelo supra transcrito nº 1 do artigo 636º do CPC), isto porque, as questões que pretende ver agora apreciadas por via da ampliação, não chegaram a ser apreciadas pelo Tribunal a quo, por ficarem prejudicadas pela solução encontrada para as questões que analisou, como dissemos. A este respeito, sublinha António Santos Abrantes Geraldes que: “Em tais circunstâncias, a tutela dos interesses do recorrido não passa pela ampliação do objeto do recurso, entrando em funcionamento o mecanismo prescrito pelo artigo 665º nº 2, para o recurso de apelação. Efetivamente, em relação a questão cuja análise foi considerada prejudicada, não pode haver razão para se concluir que a parte vencedora decaiu, como se exige no nº 1 do art. 636º. Tão pouco existe nulidade por omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos do seu nº 2. Se a apelação improceder, mantem-se igualmente a desnecessidade de o tribunal de recurso avançar com resposta às questões cuja apreciação foi considerada prejudicada pelo tribunal a quo. Já se a apelação proceder relativamente aos fundamentos que conduziram à à decisão recorrida, a Relação deve conhecer as questões que ficaram prejudicadas (…) desde que para tal detenha os elementos necessários. Caso contrário, deve determinar a baixa do processo para apuramento dos factos que se mostrem necessários. (…) a extensão do poder de intervenção do Tribunal da Relação decorre diretamente da lei (art 665º nº 2), (…) pelo que a Relação deverá apreciar oficiosamente as questões que ficaram prejudicadas ou, não havendo elementos para isso (designadamente quando esteja em causa a apreciação de meios de prova oralmente produzidos), deve remeter o processo para a 1ª instância, a fim de serem apreciadas, nos termos gerais” – In Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, pág. 153. Consultando, agora, o estabelecido no artigo 665º, nº 2, do CPC, ali se estabelece, como regra de substituição ao tribunal recorrido, que: “2 - Se o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, a Relação, se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários.” Nos presentes autos, o Tribunal a quo decidiu julgar a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de 1999 procedente, anulando a mesma, por entender que se verificava um vício de violação de lei que contaminava a mesma, na medida em que, (i) a indispensabilidade do custo não foi devidamente sindicada e, por outro lado, (ii) a AT socorreu-se de fundamentação à posteriori (vertida nos procedimentos de reclamação graciosa e recurso hierárquico). Foram estas as questões apreciadas na decisão recorrida, tendo as demais (demais vícios alegados que afetam a legalidade da liquidação), sido julgadas prejudicadas quanto ao seu conhecimento (face à solução dada às questões solucionadas). “1 - O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.” (…) 3 - De modo a permitir o apuramento referido no n.º 1, a contabilidade deve: a) Estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade, sem prejuízo da observância das disposições previstas neste Código; b) Reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo e ser organizada de modo que os resultados das operações e variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC possam claramente distinguir-se dos das restantes” O artigo 24.º, nº 1, do CIRC, sob epígrafe “variações patrimoniais negativas”, estabelecia que: “1 - Nas mesmas condições referidas para os custos ou perdas, concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício, excepto: (…)” De acordo com o artigo 23º do CIRC: “1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: (…)” Assim, na situação colocada, para que a regularização de existências fosse aceite como custos, enquanto variação patrimonial negativa, deveria respeitar o estabelecido no artigo 23º do CIRC, ou seja, seriam custos (enquanto componente negativa do resultado do exercício), se fossem comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos (artigo 23º e 24º do CIRC). Na situação colocada a recorrida foi alvo de um procedimento inspetivo pela AT (recorrente), tendo procedido à análise interna da Declaração Modelo 22 de IRC de 1999, tendo culminado com a correção, entre o mais, do valor de 425.183,00EUR relacionado com a regularização de existências relativamente às pedreiras de .............. e .............., que a recorrida contabilizou como custo fiscal e que, no seu entender estavam devidamente documentadas (nomeadamente em mapas resumo do inventário das pedreiras a 31.12.1999 e levantamentos topográficos para acerto dos stocks). No âmbito daquele procedimento inspetivo, foi elaborado o Relatório Final Inspetivo (RIT) em 02.08.2002, tendo os Serviços Inspetivos concluído que, o valor de 425.183,00EUR acima referido teria de acrescer ao lucro tributável, empreendendo a devida correção ao mesmo, com base na seguinte fundamentação, que foi vazada para o RIT e para decisão de facto (cf. ponto 07) dos factos provados pelo Tribunal a quo): “ Regularizações de existências, diferenças de inventário no valor de 425.183 Euros (85.241.538$00). Na contagem de stocks de matérias primas, o sujeito passivo apurou diferenças que não se encontram devidamente justificadas pois não foram apresentados quaisquer documentos que, de algum modo, pudessem suportar as diferenças apuradas. Assim, tendo em conta que o artº 24º do CIRC apenas permite a aceitação das variações patrimoniais negativas nas mesmas condições que as referidas para os custos, e que, tais condições estão elencadas no artº 23º do CIRC, consideram-se requisitos básicos e indispensáveis de aceitação das mesmas variações patrimoniais negativas, a comprovação documental e bem assim a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos. A falta de justificação para as referidas diferenças de inventário e a não comprovação da indispensabilidade para a realização dos proveitos, determina, nos termos dos artºs 23º e 24º do CIRC a não aceitação da dedução ao lucro tributável. (…)” (sublinhado e destaque é nosso). Informa ainda a matéria de facto apurada (e não questionada) que, na sequência do procedimento inspetivo foi emitida a liquidação de IRC de 1999 em causa (cf. ponto 08) dos factos provados) e que, nessa sequência a recorrida (impugnante) apresentou reclamação graciosa, que veio a ser indeferida, a que se seguiu o recurso hierárquico, que também foi indeferido (objeto imediato dos presentes autos) e, após, foi instaurada a impugnação judicial que ocasionou a presente demanda (sendo a liquidação de 1999 o seu objeto mediato). Sobrevoando, de novo, a decisão de facto, constatamos que a Reclamação graciosa contra a liquidação foi apresentada em janeiro de 2003, questionando a recorrida a correção efetuada em sede de variações patrimoniais negativas, decorrente da variação das existências no valor de 425.183,00EUR, tendo junto ao procedimento elementos probatórios que foram analisados e valorados, tendo-se ali concluído pelo acerto da correção questionada e da liquidação subsequente, por não ser feita a comprovação da sobrevalorização das existências que levou à sua regularização enquanto variação patrimonial negativa. No mesmo sentido se decidiu no procedimento de recurso hierárquico onde se concluiu que face às incongruências e discrepâncias nos documentos apresentados pela recorrida, a mesma não logrou demonstrar os custos subjacentes à regularização das existências relevadas contabilisticamente quanto às pedreiras de ……e ………, e que foram indispensáveis à obtenção do lucro em 1999, não sendo, por essa razão subsumíveis a variações patrimoniais negativas nos termos do artigo 24º do CIRC, suscetíveis de concorrer para a formação do lucro tributável daquele exercício. O probatório notícia ainda que, a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que veio a ser confirmada pela decisão de recurso hierárquico, se apoiou numa informação prestada naquele procedimento, onde é proposto o indeferimento da mesma, depois de empreender uma análise aos documentos juntos pela impugnante, nomeadamente, extratos de movimentos relacionados com os diversos produtos das pedreiras de .............. e .............. (doc. 2) onde a recorrida pretendia justificar a regularização efetuada com referência a 1999; cópia de duas medições de brita datadas de 03.01.2000, relativas à pedreira de .............. (doc. 1). Salientam os serviços da recorrente, naquela informação, que a impugnante apenas juntou o inventário relativo à pedreira de .............., sublinhando que a mesma utiliza o sistema de inventário permanente, tornando-se incompreensível que o valor de stocks registado na contabilidade não está em conformidade com o valor constante da ficha de armazém antes do acerto dos stocks, sem que a impugnante justificasse tais diferenças. Acrescenta-se, ainda, na mesma informação, que, foi procurado nos extratos dos produtos os valores encontrados na medição topográfica, que deviam constar como existências finais, inexistindo similitude entre as medições topográficas e os movimentos de regularização de final de ano; que é difícil entender que, tendo a impugnante várias pedreiras pelo país as discrepâncias só se verifiquem em …….. e ……., no que tange às quantidades constantes registradas no extrato do produto e o real existente, etc, não se verificando os requisitos básicos e indispensáveis para efeitos do art. 23º CIRC, e que: “ a sua comprovação de indispensabilidade não se verifica, porquanto as existências (stock) objeto das presentes regularizações são sustentadas por levantamentos topográficos comprovadamente dúbios ( a ter presente o referido no nº 25.3 supra), e tais regularizações não traduzem os respetivos levantamentos topográficos…”. Concluindo, aquela informação do modo seguinte: “…conclui-se que os fundamentos e as provas apresentadas pela ora reclamante são insuficientes para virem a justificar uma regularização em stocks e o respetivo montante, como componente negativa no apuramento do lucro tributável do exercício de 1999…” (cf. ponto 10 e 13 do elenco dos factos provados pelo Tribunal a quo). Diante aquilo que fomos expondo, assalta à evidência que o RIT sustentou a correção questionada, no facto de não estar justificada e demonstrada documentalmente a regularização das existências no montante pretendido quanto às pedreiras de …… e ……., desde logo a sobrevalorização das mesmas, por forma a poderem ser consideradas como custo do exercício de 1999. Tanto assim é que, em sede de reclamação graciosa a impugnante voltou a levar para o procedimento novos elementos documentais para justificar aquelas regularizações de stocks, mas sem sucesso, segundo a apreciação da AT naquele procedimento de reclamação graciosa e no recurso hierárquico que veio a confirmar o decidido no primeiro procedimento. Não se vê, por isso, diferentemente do advogado pela recorrida e do sentenciado, que tenha havido uma fundamentação a posteriori quando a fundamentação contemporânea do ato, vertida no RIT, se centra essencialmente na falta de comprovação dos montantes que compõem as variações patrimoniais negativas registadas das duas pedreiras, respeitantes à regularização de stocks, e que, por isso não se verificam os pressupostos da dedutibilidade daqueles custos, nos termos do artigo 23º e 24º do CIRC. Na decisão recorrida, após discorrer acerca do dever de fundamentação e da indispensabilidade dos custos, afirma que: “(…) não se pode considerar que, em face de argumentos esgrimidos pelos contribuintes se possa alterar a fundamentação do acto inicial, como pretende a AT. O dever de pronuncia sobre as questões suscitadas não pode levar a uma fundamentação distinta do acto tributário. Do caso sub judice decorre que em sede de relatório inspectivo (fundamentação que aqui releva) foi considerado que a impugnante não teria comprovado a indispensabilidade dos custos e, consequentemente, corrige a declaração apresentada pelo sujeito passivo de IRC. Mais tarde, em sede de reclamação graciosa veio a AT afirmar que não se encontra devidamente comprovada a regularização dos stocks por não se encontrar devidamente fundamentada em levantamentos topográficos credíveis, considerando que a variação patrimonial não se encontra fundamentada. Mais defendem que a variação patrimonial constitui um custo e não uma componente de resultados transitados, pelo que não está esta realidade subsumida ao art. 24º do CIRC. Mais tarde, no recurso hierárquico a AT fundamenta a sua decisão de indeferimento nas seguintes circunstâncias: - não poderia a impugnante ter contabilizado estas divergências de stock como variações patrimoniais negativas, por não estarmos perante regularizações não frequentes e de grande significado; - não comprovação da veracidade dos custos que sustentaram a regularização da existências. A questão colocada no relatório inspectivo e que fundamentou a correcção efectuada pelos serviços de fiscalização foi a da indispensabilidade dos custos e a falta da comprovação da sua indispensabilidade. Já em sede de reclamação graciosa e recurso hierárquico os fundamentos para o indeferimento foram a não comprovação dos custos e não a não comprovação da sua indispensabilidade. A questão fulcral que fundamenta os indeferimentos é, quer em sede de reclamação graciosa quer em sede de recurso hierárquico, para além da questão da irregularidade ao contabilizar as regularizações de existências numa conta de resultados transitados, considerando que existem variações patrimoniais negativas, a da não comprovação dos custos em si mesmos, a sua veracidade. Verificamos assim que os motivos que pretendem fundamentar o acto de liquidação são distintos, sendo que num primeiro momento se suscita a questão da indispensabilidade do custo e, num segundo momento, a falta de comprovação da sua veracidade, bem como a impossibilidade de os considerar como variações patrimoniais negativas, ao abrigo do disposto no art. 24º do CIRC. Esta tentativa de introdução de novos fundamentos para sustentar a correcção efectuada não podem ser susceptíveis de fundamentar o acto. (…) A AT desconsiderou estes custos em virtude de ter considerado que a ora impugnante não havia comprovado a indispensabilidade dos mesmos sem que aduza qualquer outra fundamentação. Nem sequer foram aduzidos critérios incidentes sobre a oportunidade e/ou mérito do custo. (…) Acresce que este juízo de falta de indispensabilidade do custo não se compadece com apreciações de oportunidade ou razoabilidade desse mesmo custo, sob pena de se tratar de uma ingerência na liberdade e autonomia de gestão da sociedade. Daqui decorre que à AT está vedado desconsiderar um custo fiscal apenas sob a invocação de que o mesmo não é indispensável à realização dos proveitos, pelo que a liquidação em apreço nos autos se encontra ferida do vício de violação de lei. Julgando-se procedente a presente impugnação, desnecessário se torna apreciar os demais vícios invocados”. Para o Tribunal recorrido, como visto e conforme se adiantou, a fundamentação do ato constante do RIT não corresponde à fundamentação do mesmo nos procedimentos de reclamação graciosa e de recurso hierárquico, e, sendo a fundamentação do ato unicamente a sua indispensabilidade (de acordo com o RIT), não podia imiscuir-se na oportunidade dos custos em causa, desconsiderando o mesmo sob a invocação da indispensabilidade, nos termos em que o fez. Concordamos com a recorrente, como fomos adiantando, na medida em que, repete-se, a fundamentação do ato constante do RIT não se basta com a indispensabilidade do custo/regularização de existências, mas, essencialmente, com a falta de comprovação do mesmo, o que foi discutido em todos os procedimentos (inspetivo, reclamação graciosa e recurso hierárquico). A premissa de que parte a decisão recorrida para concluir pela ilegalidade do ato - ao entender que apenas foi fundamentado o ato corretivo na indispensabilidade e não também (e essencialmente) na falta de comprovação do mesmo-, não pode por nós ser acompanhada, o que por si dita a procedência do recurso nesta parte, na medida em que, escorando-se a AT essencialmente na falta de comprovação do custo/perda, conforme resulta do RIT acima transcrito, acabou por concluir que aquela falta de comprovação é uma componente inovadora da fundamentação corretiva abordada unicamente nos procedimentos de 2º grau, o que não é verdade. É verdade que a decisão em matéria de procedimento tributário, além de dever respeitar os princípios da suficiência, da clareza e da congruência, deve, também, ser contextual ou contemporânea do ato, não relevando a fundamentação inovatória feita a posteriori. É igualmente certo que, no procedimento de reclamação graciosa, que tem na mira a anulação total ou parcial do ato impugnado ou a manutenção dos seus efeitos na ordem jurídica (art.º 68º nº 1 do CPPT), ou no recurso hierárquico, a decisão não pode manter os atos de liquidação impugnados com diferente e inovadora fundamentação, seja de facto ou de direito. A legalidade do ato de liquidação aprecia-se em razão da sua fundamentação contextual e, sendo de anular por vício de lei, a liquidação não subsiste na ordem jurídica ainda que a fundamentação inovadora expressada nos atos tributários de 2.º grau não mereça qualquer censura, hipótese em que estes últimos serão ainda assim de anular em razão (e apenas) da sua fundamentação autónoma e inovadora (vd o acórdão do TCAS de 13.05.2021, processo nº 519/05.7BELSB). Porém, repete-se, não é essa a situação trazida, como se explicou. Aliás, por inexistir qualquer fundamentação na reclamação graciosa e recurso hierárquico, que não constasse já do RIT (como a falta de comprovação do custo/perda), é que, em sede de reclamação graciosa a recorrida junta outros elementos probatórios para afastar o ato corretivo, tentando demonstrar, com a junção dos mesmos, a comprovação da perda (sobrevalorização de existências e sua regularização, de modo a serem aceites como custos fiscais dedutíveis), como acima se explicou. Não se pode afirmar que a AT, mediante os novos documentos juntos, apresentou uma fundamentação nova, como é dito na sentença posta em crise. O que sucedeu é que, nos procedimentos de reclamação graciosa e recurso hierárquico foram analisados, efetivamente, documentos juntos naqueles procedimentos, na tentativa de justificar a regularização das existências questionadas, e a AT depois de os analisar criticamente, em conjugação com outros elementos, entendeu que a comprovação permanecia por demonstrar, sem que tal corresponda a nova fundamentação ou fundamentação à posteriori. Ademais, tanto assim é que, desde o nascimento do ato no procedimento inspetivo, a recorrida permanece a insurgir-se (também) contra a correção esteada em falta de comprovação da realidade material subjacente à regularização das existências nas pedreiras de ………. e ……., o que faz, não só nos meios graciosos deduzidos, como nesta sede, onde faz repousar (também) a sua pretensão no alegado vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, advogando que errou a AT naquele pressuposto da comprovação da realidade subjacente à regularização das existências enquanto variação patrimonial negativa, sendo abundante os meios de prova que foi levando aos procedimentos e processo para a sua demonstração (da comprovação do custo). Em suma, na situação trazida, o probatório e o RIT informam claramente que o ato de liquidação nascido do RIT, teve como fundamentação, essencialmente, a falta de prova para demonstrar /comprovar as regularizações das existências e sua sobrevalorização, sem que se verifiquem os pressupostos do artigo 23º e 24º do CIRC. Já no âmbito da reclamação graciosa, apesar dos (outros) elementos de prova carreados para o procedimento, a AT entendeu que ainda assim não estava comprovada e justificada a regularização das existências pretendida face, desde logo, à discrepância entre os valores divergentes constantes de vários documentos (extratos, levantamentos topográficos, folhas de armazém, etc), o que foi mantido na decisão do recurso hierárquico. A fundamentação vertida na reclamação graciosa e recurso hierárquico, por empreender uma análise a documentos que não foram levados ao procedimento inspetivo, não significa que a fundamentação passa a ser “nova” e posterior ao mesmo, quando a análise é dos documentos que foram naquele outro procedimento apresentados, empreendendo ali a entidade reclamada a sua análise, evidenciando as razões pelas quais o ato se mantinha, desde logo porque os novos documentos não tinham a virtualidade de contrariar o ato corretivo nas suas premissas iniciais que, em causa, como visto, estão relacionadas, essencialmente, com a falta de comprovação da sobrevalorização das existências, compreendendo esta a grande razão, ou fundamentação de facto, do ato corretivo. Conclui-se, assim, que a decisão recorrida não terá realizado a melhor interpretação da realidade em discussão nos presentes autos, quando conclui pela procedência da falta de fundamentação a posteriori, a qual, conforme já densificámos anteriormente, inexiste no caso vertente. Aqui chegados, e tendo a decisão recorrida, tal como já enunciámos anteriormente, fundado, igualmente, a procedência da pretensão material na falta de demonstração do juízo de indispensabilidade, importa, então, proceder à sua análise. Da indispensabilidade do custo. A este respeito, lê-se na decisão sob censura, o seguinte: "Acresce que este juízo de falta de indispensabilidade do custo não se compadece com apreciações de oportunidade ou razoabilidade desse mesmo custo, sob pena de se tratar de uma ingerência na liberdade e autonomia de gestão da sociedade. Daqui decorre que à AT está vedado desconsiderar um custo fiscal apenas sob a invocação de que o mesmo não é indispensável à realização dos proveitos, pelo que a liquidação em apreço nos autos se encontra ferida do vício de violação de lei." A recorrente, sublinha que a decisão recorrida na motivação do ato se fundou na falta de comprovação do custo e por isso o considerou indispensável atento o disposto nos artigos 23º e 24º do CIRC, o que havia sido apreendido pela recorrida (cf. conclusões J), K) e L) do recurso). E, na verdade, assim foi como o dissemos já. No entendimento da recorrida, a pronúncia da decisão recorrida é acertada quanto à indispensabilidade do custo, na medida em que não foi cumprido o ónus probatório por banda da AT, não devendo a mesma imiscuir-se na gestão da mesma. Os custos ou perdas, dedutíveis fiscalmente, enquanto componente negativa do rendimento tributável, são aqueles que, comprovadamente são indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora (art. 23º do CIRC). Além de efetivos/comprovados, os custos devem ser indispensáveis. O conceito de indispensabilidade dos custos, a que se reporta o artigo 23.º do CIRC refere-se aos custos incorridos no interesse da empresa ou suportado no âmbito das atividades decorrentes ao seu escopo societário. Só quando os custos resultarem de decisões que não preencham tais requisitos, nomeadamente quando não apresentem qualquer afinidade com a atividade da sociedade, é que deverão ser desconsiderados; No que tange à indispensabilidade do custo, sabemos que é à AT que cabe pôr em causa a sua indispensabilidade, através da evidenciação de indícios sólidos da sua dispensabilidade “para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora” (art. 74.º, n.º 1, da LGT), face à presunção de veracidade de que goza as declarações dos contribuintes e os dados inscritos na sua contabilidade (art. 75.º, n.º 1 da LGT); O requisito de indispensabilidade do custo ou perda, vertido no do art. 23.º do CIRC tem de ser aferido através de um juízo casuístico, não podendo associar-se ao êxito de gestão, não se confundindo com a sua oportunidade ou conveniência, não abrangendo apenas custos que direta e imediatamente conduzam à obtenção de ganhos ou à manutenção da unidade produtiva (nexo causal/racionalidade económica), antes abarcando igualmente custos que mediatamente visam esse fim. In casu, inversamente ao que sustenta a Recorrida, que secunda o que foi dito na decisão recorrida, entende-se que a AT cumpriu o ónus da prova na vertente da indispensabilidade do custo, não se vislumbrando que tenham sido convocadas opções de gestão e razoabilidade. De uma leitura atenta do RIT, verifica-se que, em rigor, o mesmo interliga as duas realidades, por as reputar indissociáveis. Ou seja, inexistindo, em concreto, documentação suficiente tal determina a falta de demonstração da sua indispensabilidade. Importa esclarecer que, lendo o RIT, assim como os procedimentos de reclamação e recurso hierárquico, as razões factuais empreendidas para o ato corretivo prendem-se com a falta de comprovação do custo, inexistindo um apartar, específico, em termos de nexo da atividade com os custos visados. Noutra formulação, dir-se-á que a AT entende como fundamento legal e como “consequência da falta de comprovação”, que o custo não se reveste de indispensabilidade. Ou seja, congrega a análise desses dois predicados. É certo que estamos a falar de pressupostos e predicados distintos, mas é, igualmente, certo que ambos foram sindicados. Para a dedutibilidade do custo à luz do art. 23º do CIRC, bom de perceber está que para a AT a falta de comprovação ditou a falta de dedutibilidade fiscal donde a concreta demonstração da indispensabilidade, não tecendo qualquer juízo quanto à oportunidade do mesmo, como se diz na decisão recorrida e nas contra-alegações recursivas. Como visto, e já evidenciado anteriormente, há uma interdependência e conexão, ou seja, não se vê que a razão das correções se centrasse na indispensabilidade dos custos vista apartadamente da sua comprovação. Deste modo, não obstante, a AT ter utilizado a expressão indispensabilidade, nunca o fez sem se desviar da falta de comprovação do custo em que faz assentar a razão factual que determinou a correção, fazendo-o como decorrência da falta de comprovação do mesmo e por apelo ao vertido no artigo 23º do CIRC. Mas, sem tecer qualquer ajuizado quanto à oportunidade do mesmo. Vale isto para reafirmar, como o dissemos já acima, que, ainda que o custo seja indispensável (e de facto nenhuma razão factual autoriza o contrário), a verdade é que, mercê da falta de comprovação, os mesmos continuam a legitimar o ato corretivo. Portanto, apesar de se concordar que a AT não se pode ingerir nas opções de gestão da recorrida (importando é que exista racionalidade económica entre os custos que formam a componente negativa do lucro, conquanto haja um nexo dos mesmos com aquele que é o escopo societário da recorrida, independentemente do impacto que os mesmos venham ou não a ter nos resultados), o certo é que não empreendeu essa análise. Contrariamente ao que defende a decisão recorrida, a AT não desconsiderou “um custo fiscal apenas sob a invocação de que o mesmo não é indispensável à realização dos proveitos". Como visto, e tal como expendido anteriormente, não foi esse o juízo de entendimento adotado na fundamentação do ato. Assistindo, assim, razão à Recorrente quando afirma nas suas alegações de recurso que: "Ora, para a afirmação da indispensabilidade do custo impõe-se previamente que seja estabelecido o necessário nexo causal entre o custo e a actividade desenvolvida pela empresa, para o qual concorre a comprovação pela Impugnante, não efectuada nos presentes autos, das alegadas regularizações de existências reconduzidas por si a variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício de 1999." Assim sendo, também não se pode concordar com o ajuizado pelo Tribunal recorrido nesta parte, o que determina a procedência do recurso da FP. Volvidos aqui importa agora analisar e decidir, em substituição (art. 665º nº 2 do CPC), as questões que o Tribunal recorrido não conheceu, por terem ficado prejudicadas. Nas contra-alegações recursivas oferecidas pela recorrida, a mesma pugna pela manutenção do decidido em 1ª instância, sublinhando, em suma, que a fundamentação do ato é a posteriori (vd. conclusão 6ª a 10ª das contra-alegações de recurso) e que se verificam os pressupostos para a dedutibilidade dos custos, desde logo a indispensabilidade e comprovação a que aludem os artigos 23º e 24º do CIRC, destacando que a regularização de stocks está devidamente espelhada nos elementos probatórios que levou aos autos (constantes dos procedimentos), que inexiste qualquer incongruência ou desconformidade entre documentos para apurar o valor das existências nas pedreiras de .............. e ............... Na verdade, esta questão, que se prende com a realidade subjacente às regularizações de existências/comprovação do custo, foi apartada pelo Tribunal a quo, na medida em que, entendeu que o RIT não tinha sindicado essa falta de comprovação, o que havia sido feito apenas nos procedimentos de reclamação graciosa e recurso hierárquico. Por essa razão, na conclusão 17ª das contra-alegações recursivas, aduz a recorrida que, “ainda que se conclua pela procedência do recurso apresentado”, pretende a (apelidada) “ampliação do objeto do recurso” (quando, como se disse o que em causa está é o julgamento em substituição), tendo em vista a apreciação, por este Tribunal, dos demais vícios que em seu entender contaminam o ato de liquidação, desde logo contrariando os fundamentos invocados pela AT (nos procedimentos) que se prendem com a conclusão da falta de documentalidade do custo, decorrente das alegadas incongruências e divergências na documentação; sistema de inventário utilizado; preço unitário dos inertes e das quantidades apuradas; existência de diferenças de stock noutras pedreiras, etc, e falta de audição prévia. Contudo, esta apreciação não pode ser feita por este Tribunal, como veremos de seguida. Relativamente à comprovação/documentalidade dos custos, apesar do alegado na PI pela recorrida, na tentativa de demonstrar a comprovação dos custos, esclarecendo as razões das divergências e incongruências documentais para justificar a sobrevalorização das existências relativamente às pedreiras de .............. e .............., e bem assim a regularização das existências (stocks) enquanto variação patrimonial negativa, é vasta a prova que povoa os autos (desde logo nos procedimentos - levantamentos topográficos; inventários, extrato dos produtos; extratos extra-contabilísticos; registos contabilísticos; etc, e a prova testemunhal), percebendo-se que, como esta questão não foi apreciada, não sentiu o Tribunal a quo a necessidade de proceder à valoração conjugada de todos elementos probatórios para dali extrair toda a factualidade relevante para dar resposta à questão da comprovação do custo. Consultando a PI (assim como as contra-alegações), verificamos que a recorrida sustenta que, contrariamente aos fundamentos da AT para suportar a legalidade da liquidação no que tange à comprovação do custo, ao longo dos vários procedimentos em que foram analisados os documentos que instruíam os mesmos, está devidamente justificada a variação patrimonial negativa relativa à regularização das existências das pedreiras de .............. e .............., afrontando todos os fundamentos em que a AT se apoiou para concluir pela não comprovação das perdas. E, nesse percurso, foi rebatendo a análise feita pela AT aos inventários, extratos, registos contabilísticos, levantamentos topográficos, etc, nomeadamente justificando (alegadamente) as incongruências entre os diversos documentos que constam dos autos/procedimentos (seja dos inventários atentos os diferentes preços de inertes; seja dos inventários das duas pedreiras, no final de 1999, face aos levantamentos topográficos; seja dos levantamentos topográficos entre si; seja dos extratos dos produtos e dos valores contabilizados; stocks, etc), tentando evidenciar que, os fundamentos relacionados com as ditas incongruências e divergências entre documentos, ou inexistem ou têm uma justificação (que alega e apresenta), por forma a demonstrar a realidade subjacente às regularizações. Advoga, nomeadamente que, a existência de mais de que um levantamento topográfico para uma das pedreiras é irrelevante, sendo um provisório e o outro definitivo, inexistindo neste último contradição face ao inventariado e à regularização de existências; que não é verdade que apenas nas pedreiras de .............. e .............. (entre as várias que detém) havia sobrevalorização de existências como pressupõe a AT; apresenta (alegadas) razões para os diferentes preços de matéria prima (segundo aduz, variam de pedreira para pedreira, de exercício económico para exercício económico, do sistema de produção da própria matéria prima/inertes, etc,) em que a AT se focou; etc, Tudo, depois de esclarecer o tipo de inventariação que faz (intermitente), metodologia empregue (num primeiro momento a metodologia tradicional de contagem e no final do ano, para inventariação, socorrendo-se de levantamentos topográficos feitos por pessoal especializado). Perante o alegado pela recorrida para contrariar o adensado pela AT para sustentar o ato corretivo, visto, agora, à luz da decisão de facto (composta por 16 pontos de facto), verificamos que, a par de ser alocado no probatório a realização da ação inspetiva e toda a factualidade subsequente (relatório inspetivo; liquidação; reclamação graciosa e decisão; recurso hierárquico e decisão – cf. pontos 06) a 16) dos factos provados), apenas dali consta que: - Em 31.12.1999 foram feitos levantamentos topográficos (de acordo com a prova testemunhal indicada) – Cf. ponto 01) dos factos provados; - De acordo com aqueles levantamentos as existências estavam sobreavaliadas (prova testemunhal) – Cf. ponto 02) dos factos provados; - Em 31.12.1999 foi elaborado um inventário final à pedreira de .............. e .............. onde se constatou uma diferença entre quantidades do inventário e de relatórios – Cf. pontos 03) e 04) dos factos provados; - Foi contabilizado por conta da regularização de existências nas pedreiras os valores aqui em causa – Cf. ponto 05) dos factos assentes. Ora, perante o que foi alegado pela recorrida na PI (e vazado nas contra alegações); o acervo probatório que compõe os diversos procedimentos (sobre os quais as partes retiram conclusões divergentes); a prova testemunhal produzida nos autos; os factos constantes do probatório, verificamos que, para enfrentar as questões prejudicadas, está este Tribunal carecido de elementos que o habilitem a ajuizar, desde logo, acerca da comprovação dos custos, o que implica, desde logo, empreender uma análise à vasta documentação existente, valorando e ponderando a mesma (conjuntamente com a prova testemunhal) e dela retirar a factualidade que é essencial para solver a questão colocada, considerando o alegado pela recorrida. Ademais, tendo em conta que grande parte dos elementos documentais dos autos comportam um elevado grau de tecnicidade, poderá haver necessidade de ser ordenada (oficiosamente), para melhor perceção e apreciação de factos, prova pericial (art. 116º nº 2 do CCPT). A este respeito, disse-se no acórdão deste TCAS de 07.04.2022, que: “Deve ser ordenada oficiosamente a prova pericial, nos termos do art. 116.º, n.º 2 do CPPT, quando a perceção e a apreciação de factos exigem conhecimentos especiais que o julgador não possui, sendo necessário o parecer de técnicos especializados”. Assim, perante tudo o que fomos sublinhando, e por forma a garantir, também, um duplo grau na apreciação da pretensão da recorrida (se decair e não se conformar), importa determinar o regresso dos autos ao Tribunal recorrido, mercê da apontada ausência de elementos para emitir decisão em substituição (cf. artigo 665º nº 2 do CPC). Mediante todo o exposto, impera concluir que o recurso da FP é procedente, revogando-se a decisão recorrida, ordenando-se a baixa dos autos para conhecimento das questões que ficaram prejudicadas, cujo conhecimento não foi possível a este Tribunal por falta de elementos indispensáveis. * DAS CUSTAS No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo da recorrida, por ser parte vencida. Tendo em conta o valor da ação (425.183,00EUR), e considerando que vai requerida a dispensa do remanescente da taxa de justiça pelas partes, o que sempre poderia ser (ou não) dispensada por este Tribunal, importa percorrer uma análise sobre o decurso dos autos, atento o disposto no artigo 6º nº 7 do RCP, sendo certo que aquele normativo deve ser interpretada em termos de, ser lícito ao julgador dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, quando o valor da causa exceder o patamar de € 275.000,00, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminado pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade. Deve haver proporcionalidade entre o valor da taxa de justiça a pagar por cada interveniente no processo e a contraprestação inerente aos custos deste para o sistema de justiça dada a sua bilateralidade. A tramitação dos presentes autos, no que respeita à atividade processual, foi extensa, com produção de prova testemunhal, prolação de sentença, sendo agora prolatado o nosso acórdão. A verdade é que as decisões proferidas quer na primeira quer na segunda instância, como se alcança da sua análise, não implicaram particular especialização jurídica ou técnica. No que respeita ao critério da conduta processual das partes nada existe de especial a censurar. Considerando o valor da ação (superior a 275.000 EUR), à simplicidade das questões colocadas, ao comportamento das partes ao longo do todo o processo, será de dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça. Importa, por fim, trazer à colação o discorrido pelo STJ, em decisão singular prolatada em 20/12/2021 (relator Cons. Abrantes Geraldes), processo nº 2104712.8 TBALM.L1S1, disponível em www dgsi.pt, onde se consignou o seguinte: “Neste contexto, parece mais correta a tese segundo a qual o último órgão jurisdicional que intervém deve apreciar não apenas a dispensa ou redução da taxa de justiça no respetivo grau de jurisdição, mas também nos precedentes, como se reconheceu explicitamente nos Acs. do STJ, de 24-5-18, 1194/14 e de 8-11-18, 567/11, em www.dgsi.pt. Aliás, esta é a única solução que se harmoniza com o regime da taxa de justiça remanescente que agora emerge do nº 9 do art. 14º do RCP que recentemente foi introduzido, nos termos do qual a parte totalmente vencedora na ação - o que apenas se revela com o trânsito em julgado da decisão - fica desonerada do pagamento da taxa de justiça remanescente. (…) Note-se que o art. 6 nº 7 RCP ao definir o critério para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça está a pressupor um juízo de valoração global do processo, logo só pode ser feito com a decisão final, pelo que o argumento da autonomia dos recursos para efeito das custas (arts. 527 nº 1 CPC e 1 nº 2 RCP) não parece ser consistente, pois que uma coisa é a tributação autónoma em cada um dos graus de jurisdição, outra a dispensa do remanescente do pagamento da taxa de justiça. É certo que a taxa de justiça integra as custas (art.3 nº1 RCP), mas do que se trata não é da dispensa da taxa em cada um dos graus, mas da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nas causas de valor superior a € 275.000,00. Considerando que a Lei nº 27/2019 de 28/3, alterou o nº 9 do art. 14, dando-lhe a seguinte redacção - “9 - Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.º 7 do artigo 6.º, o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final fica dispensado do referido pagamento, o qual é imputado à parte vencida e considerado na conta a final” – daqui resulta agora que dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça já nem sequer está dependente do pedido do interessado, nem sequer da intervenção oficiosa do tribunal, porque a dispensa opera automaticamente (ope legis), e a única condição é obviamente que “não seja condenado a final”. Assim, face a todo o exposto, considera-se que, in casu, se encontram reunidos todos os pressupostos para que seja decretada a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, em ambas as instâncias, na parte em que excede o valor de €275.000,00. * V- DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em: - Conceder provimento ao recurso da FP; - Revogar a decisão recorrida; - Ordenar a baixa dos autos para conhecimento das questões que ficaram prejudicadas e cuja análise ficou obstaculizada a este Tribunal. Custas a cargo da recorrida, com dispensa do remanescente da taxa de justiça. Lisboa, 30 de setembro de 2025. Isabel Silva (Relatora) ___________________ Tiago Brandão de Pinho (1º adjunto) ______________ Patrícia Manuel Pires (2ª adjunta) |