Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:290/12.6BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/09/2025
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:TARIFA DE LIGAÇÃO AO RAMAL/TAXA
FUNDAMENTAÇÃO ECONÓMICO-FINANCEIRA
Sumário:I - A tarifa de ligação ao ramal de águas residuais configura-se como uma taxa.
II – Inexistindo a exigível e legal fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local, o tributo liquidado enferma de ilegalidade.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I. RELATÓRIO

A Câmara Municipal de Loures (doravante Recorrente ou CML) veio recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por C… – C…, SA (doravante Recorrido ou Impugnante), que teve por objeto o indeferimento expresso das reclamações graciosas tendo por objeto as liquidações da tarifa de águas residuais contemplada nas faturas emitidas pelos SMASL n.º 201120030459, n.º 201120033022, n.º 201120034342 e n.º 201120038181, respeitantes aos períodos de junho a setembro de 2011.

Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

“1. O artº 69º, nº 3 do D.L. 194/2009 de 20 de Agosto pôs termo ao princípio da obrigatoriedade da ligação à rede pública relativamente às efluentes águas residuais, permitindo outras opções desde que licenciadas.

2. O aludido artº 69º, nº 3, assegurou o princípio da liberdade de escolha em matéria de escoamento e tratamento de águas residuais.

3. A jurisprudência comunitária vem qualificando as prestações a pagar pelo escoamento de águas residuais como preço (tarifas).

4. A interpretação das normas da Lei das Finanças devem tomar em consideração a doutrina, e jurisprudência comunitária em distinção entre taxas e preços (públicos ou privados).

5. O artº 16º da Lei das Finanças em vigor à data dos factos submetidos a juízo e o artº 21º da atual Lei das Finanças Locais qualificam como preços as prestações a pagar pelos consumidores em matérias de águas residuais, submetendo-os ao princípio da recuperação dos custos e submetendo a atividade aos normativos emanados do Regulador.

6. Consistindo a retribuição (tarifa) a pagar pelos consumidores da rede municipal de águas residuais em preço, o Tribunal Tributário é incompetente em razão da matéria para apreciação do presente litígio.

7. O artº 16º da Lei das Finanças Locais deve interpretar-se conjugadamente com as disposições da POCAL (D.L. 54-A/99, de 22/02, designadamente no seu ponto 2.8.3 sobre a contabilização dos custos das funções.

8. As disposições contabilísticas dos SMAS, sobre custo de atividade de águas residuais servem de base ao cálculo da tarifa.

9. A redução do coeficiente de afluência de águas residuais de 0,90 para 0,53,5 que integra o cálculo da tarifa de águas residuais, resultou da negociação com os chamados grandes consumidores.

10. O estudo referido na alínea d) do probatório demonstra que a fixação do tarifário impugnado obedeceu ao princípio da recuperação de custos.

11. Esse estudo demonstrou igualmente que a tarifa se encontrava bem calculada, com a introdução do fator de afluência de 0,90.

12. A deliberação de Junho de 2006, procurou responder às reclamações dos grandes consumidores, atento o período da crise económica e financeira que o País, em geral, e o Município de Loures em concreto atravessavam, procurando assim manter o emprego e minorar os problemas das empresas grandes consumidoras (mais de 1000 m3 mensais).

13. A douta sentença recorrida ao decidir que o tarifário se revela incompatível com os princípios constitucionais de igualdade e proporcionalidade viola o disposto nos artigos 13º e 266º da Constituição da República Portuguesa, por o tarifário respeitar o princípio da igualdade e da proporcionalidade.

14. A douta sentença recorrida decidindo que o tarifário violou o princípio da recuperação de custos enferma de erro de julgamento violando o artigo 16º, da Lei das Finanças Locais.

15. São por conseguinte válidos e justos os atos de liquidação impugnados.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência revogada a sentença recorrida:

a) Verificada a exceção da incompetência em razão da matéria com a absolvição do impugnado da instância e /ou julgada legal e devidamente calculada a tarifa impugnada.

Com o que se fará JUSTIÇA.”


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A Recorrida devidamente notificada para apresentar contra-alegações, optou por não apresentar contra-alegações.

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Foram os autos com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público, nos termos do artigo 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

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Com dispensa de vistos (artigo 657.º, n.º 4, do CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.

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II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Com relevo para a decisão da causa, tendo em atenção as diversas soluções de direito plausíveis, considero provada a seguinte matéria de facto:

A) A tarifa de águas residuais dos SMAS de Loures tem um valor fixo mensal e um valor variável; (não contestado)

B) No regulamento tarifário dos SMAS de Loures de 2010, em vigor até 31 de dezembro de 2010, o cálculo da componente variável da tarifa de águas residuais (coeficiente de afluência de águas residuais) correspondia, para os consumidores de outras origens de abastecimento de água ao produto da aplicação do valor percentual de 37,2% ao valor do consumo de água equivalente; (cfr. doc. n.º 13 junto com a p.i.)

C) Entre 2010 e 2011, o custo de operação da SMAS de Loures aumentou; (depoimento da testemunha H… e da testemunha F…

D) Foi elaborada Análise Económica – Taxas Águas Residuais, tomando como critério 90% de valor de consumo de água, que se dá por reproduzido, o qual conclui:

«(…) conforme podemos constatar, caso se mantenham os pressupostos definidos nesta análise, a atividade das águas residuais apresentará um resultado positivo no quadriénio 2011/14 mas, em virtude do investimento estimado, este será cada vez menor (…)»; (cfr. doc. n.º 2 junto com a contestação)

E) Em 20.10.2010, o Presidente do Conselho de Administração dos SMAS apresentou proposta de Tarifários de Água, Águas Residuais, Resíduos Sólidos e Serviços Prestados, para vigorar no ano de 2011, que se dá por reproduzido, do seguinte teor: «(…) Considerando o estudo elaborado pelo Instituto Superior Técnico ajustado ao nível do investimento previsto no PPI, nível condicionado pela capacidade de endividamento, embora inferior ao adequado para a modernização das infraestruturas, sobretudo para o controlo de perdas e para a renovação da frota de Resíduos Sólidos Urbanos;

Considerando que os custos do tratamento de efluentes se situa ao nível do preço de aquisição da água;

Considerando que é comummente aceite, pela comunidade científica, um coeficiente de afluência de águas residuais de cerca de 90%.

Proponho, nos termos da Lei das Finanças Locais, o Tarifário a vigorar a partir do dia 1 de Janeiro de 2011 (…)». (cfr. doc. n.º 1 junto com a contestação)

No regulamento tarifário dos SMAS de Loures para 2011, com entrada em vigor em 1 de janeiro desse ano, o cálculo da componente variável da tarifa de águas residuais (coeficiente de afluência de águas residuais) corresponde ao produto da aplicação do fator percentual de 90% ao valor do consumo de água equivalente; (cfr. doc. n.º 5 junto com a p.i. e doc. n.º 1 junto com a contestação)

G) Em 14.6.2011, foi proferido parecer por vogal do Conselho de Administração dos SMAS de Loures, que propõe à Câmara Municipal de Loures um novo tarifário de águas residuais, para aprovação, através do qual se fixa em 53,5% a componente variável da tarifa de águas residuais (coeficiente de afluência de águas residuais) aplicável aos consumidores de água dos SML e/ou de outras origens de abastecimento no 2.º escalão (mais de 1000 m3/mês); (cfr. doc. n.º 6 e n.º 21 juntos com a p.i.)

H) Do referido parecer, que se dá por reproduzido, extrai-se o seguinte conteúdo: «(…) Neste contexto, considerando que:

- A Tarifa de Águas Residuais – TAR – tem uma componente fixa e outra variável, esta calculada em função do valor do consumo de água faturado;

- A TAR, em função percentual do valor do consumo de água faturado, foi, no ano de 2011, alterada de 37,2% para 90%;

- Se tem constatado que tal alteração penaliza significativamente os clientes com consumos de água superiores a 100 m3/mês – fator de grande importância no tecido económico e social – e de que os proveitos que os SMAS auferem são, nesses casos, desproporcionados, face aos custos que têm com a drenagem e tratamento de águas residuais (…)»; (cfr. doc. n.º 21 junto com a p.i.)

I) A alteração ao tarifário foi aprovada por deliberação camarária adotada no dia 22.6.2011, com entrada em vigor a partir do dia 1 de junho; (não contestado)

J) Em 18.8.2011, foi emitida pelos SMAS de Loures a fatura n.º 201120030459, da qual se extrai o seguinte teor:



«Imagem em texto no original»



K) Em 6.9.2011, foi emitida pelos SMAS de Loures a fatura n.º 201120033022 da qual se extrai o seguinte teor:




«Imagem em texto no original»




(cfr. doc. n.º 2 junto com a p.i.)

L) Em 16.9.2011, foi emitida pelos SMAS de Loures a fatura n.º 201120034342, da qual se extrai o seguinte teor:



«Imagem em texto no original»




(cfr. doc. n.º 3 junto com a p.i.)

M) Em 17.10.2011, foi emitida pelos SMAS de Loures a fatura n.º 201120038181, da qual se extrai o seguinte teor:




«Imagem em texto no original»




(cfr. doc. n.º 4 junto com a p.i.)

N) A Impugnante apresentou reclamações da fatura n.º 201120030459, emitida em 18.8.2011, no valor de 40.113,41€, da fatura n.º 201120033022, emitida em 6.9.2011, no valor de 42.739,68€, da fatura n.º 201120034342, emitida em 16.9.2011, no valor de 44.831,37€ e da fatura n.º 201120038181, emitida em 17.10.2011, no valor de 45.227,44€, bem como do Tarifário de Água, Águas Residuais, Resíduos Sólidos e Serviços Prestados, aprovado pela Câmara Municipal de Loures em 3.11.2010, alterado por deliberação da mesma Câmara Municipal em 22.6.2011, ao abrigo da qual foi efetuada a liquidação dos valores inscritos nas faturas acima mencionadas;

(cfr. doc. n.º 9 a 12 juntos com a p.i.)

O) Em 17.11.2011, foi recebido pela Impugnante o ofício n.º 25.250, de 15.11.2011, dos SMAS de Loures, contendo resposta conjunta às reclamações referentes às faturas relativas aos meses de maio, junho e agosto de 2011, que se dá por reproduzida e da qual se extrai o seguinte teor:

«(…) Assim, cumpre recordar, o por V.Exas. já sabido, que depois de vários encontros com V.Exas, e outros clientes do concelho de Loures, entendeu o Conselho de Administração dos SMAS, proceder a uma revisão extraordinária do seu tarifário, demonstrando a sensibilidade necessária aos argumentos esgrimidos por alguns clientes, e que aliás, são semelhantes aos reproduzidos nas reclamações de V.Exas.

Ora, como é ainda do conhecimento de V.Exas, essa alteração ao tarifário em causa, ocorreu em Junho passado, o que, significa que as faturas reclamadas são devidas nos seus precisos termos.

Acresce ainda, o facto das alterações ora contestadas serem do conhecimento público desde Novembro de 2010, e de apenas terem sido reclamadas depois da sua entrada em vigor, e da utilização dos serviços.

Por fim, e prestados os esclarecimentos devidos, cumpre ainda informar que, as faturas mencionadas, devem ser regularizadas em tempo, sob pena de cobrança coerciva das mesmas e da interrupção do serviço por parte destes Serviços Municipalizados (…)»; (cfr. doc. n.º 7 junto com a p.i.)

P) Em 12.12.2011, foi recebido pela Impugnante o ofício n.º 27.085, de 09.12.2011, dos SMAS de Loures, contendo resposta à reclamação referente à fatura relativa ao mês de setembro de 2011, que se dá por reproduzida e da qual se extrai o seguinte teor:

«(…) Assim, cumpre recordar, o por V.Exas. já sabido, que depois de vários encontros com V.Exas, e outros clientes do concelho de Loures, entendeu o Conselho de Administração dos SMAS, proceder a uma revisão extraordinária do seu tarifário, demonstrando a sensibilidade necessária aos argumentos esgrimidos por alguns clientes, e que aliás, são semelhantes aos reproduzidos nas reclamações de V.Exas.

Ora, como é ainda do conhecimento de V.Exas, essa alteração ao tarifário em causa, ocorreu em Junho passado, o que, significa que as faturas reclamadas são devidas nos seus precisos termos. (…) Por fim, e prestados os esclarecimentos devidos, cumpre ainda informar que, as faturas mencionadas, devem ser regularizadas em tempo, sob pena de cobrança coerciva das mesmas e da interrupção do serviço por parte destes Serviços Municipalizados (…)»;

(cfr. doc. n.º 8 junto com a p.i.)

Q) Em 16.01.2012 foi remetida, por carta registada com aviso de receção remetida ao Tribunal Tributário de Lisboa, a petição inicial da presente impugnação judicial; (cfr. anexo 6 ao relatório de inspeção tributária constante do PAT)

R) As faturas ora impugnadas foram pagas voluntariamente pela Impugnante nos prazos nelas indicados; (não contestado)


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A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:

“1. A percentagem de 90% é aceite pela comummente aceite pela comunidade científica como coeficiente de afluência de águas residuais relativamente ao consumo de água;

2. A percentagem de 53,5%, resultante da alteração da tarifa, veio consagrar um “preço político” de atividades económicas;”


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Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A factualidade alegada, supra transcrita, não foi demonstrada nos autos, visto que a mesma não resulta de prova documental nem foi suportada pelos depoimentos das testemunhas inquiridas. Assim, não se tratando de factos que não careçam de prova para que deles o Tribunal conheça (art.412.º do CPC), foram dados como não provados.

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.

A decisão da matéria de facto teve por base o exame dos elementos documentais e informações oficiais constantes dos autos, a que foi sendo feita referência em cada uma das alíneas do probatório, bem como a prova produzida pelo depoimento das testemunhas ouvidas em sede de audiência.

Neste sentido, foi valorada a prova produzida em sede de audiência contraditória de inquirição de testemunhas do proc. n.º 289/12.2BELRS, em cujo aproveitamento ambas as partes manifestaram interesse.

De igual modo, foi sopesado o depoimento da testemunha H…, ouvida em inquirição. Esta testemunha, funcionária do SIMAR, trouxe um relato credível e dotado de razão de ciência.

Tanto H… como F…, ouvido no proc. n.º 289/12.2BELRS, convergiram em afirmar que os SMAS tiveram de aumentar as suas transferências para o Município de Loures no ano de 2011 por imposição deste último, o que justificaram no facto de tais transferências não serem suficientes para cobrir o pagamento devido à SIMTEJO pelo serviço de tratamento de águas residuais.

Do depoimento de ambas as testemunhas ressalta em comum que o preço cobrado até 2011 ao consumidor era inferior ao custo do serviço, tendo o aumento de tarifário (com adoção de coeficiente de 90%) procurado cobrir os custos.

A testemunha P…, fiscal único dos SMAS e do município de Loures (ouvido no proc. n.º 289/12.2BELRS), depôs que elaborou um estudo económico no final de 2010 que versou sobre as taxas das águas residuais, incidindo sobre a estrutura económica dos 5 anos seguintes, sendo o aumento do coeficiente de afluência de águas residuais para 90% um pressuposto desse estudo.

As testemunhas inquiridas mostraram-se dotadas de razão de ciência e prestaram um depoimento fidedigno e convincente, pelo que o mesmo foi valorado como tal pelo Tribunal.”


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III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações de tarifa de águas residuais contemplada nas faturas emitidas pelos SMASL n.º 201120030459, n.º 201120033022, n.º 201120034342 e n.º 201120038181, respeitantes aos períodos de junho a setembro de 2011.

Ab initio, importa relevar que, em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se:

Ø A decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar-se materialmente competente para apreciar o presente litígio;

Ø Se o Tribunal a quo perpetrou erro de julgamento, por errada interpretação dos pressupostos de facto e de direito, na medida em que:

o Incorreu em violação do artigo 16.º, n.ºs 1 e 3, da LFL, e da Recomendação n.º 1/2009 do IRAR, sobre tarifas, porquanto ajuizou que inexiste uma fundamentação económica financeira, não estando, desde logo, fundamentada a base de racionalidade económica e a ligação objetiva ao custeio da atividade dos SMAS;

o Ocorreu violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade.

Vejamos, então.

Comecemos pelo erro de julgamento atinente à incompetência em razão da matéria.

A Recorrente alega que consistindo a retribuição (tarifa) a pagar pelos consumidores da rede municipal de águas residuais em preço, o Tribunal Tributário é incompetente em razão da matéria para apreciação do presente litígio.

Mais advoga que tanto o plasmado no POCAL (DL n.º 54.º-A/99, de 22 de fevereiro), quer a evolução do DL n.º 194/2009, de 20 de agosto, apontam para a qualificação como preço.

Neste particular, e uma vez que a questão foi tratada por este Tribunal, designadamente, nos Acórdãos proferidos no âmbito dos processos nºs 1708/11, de 22 de junho de 2023, 843/12, e 2033/11, ambos de 19 de dezembro de 2024, e uma vez que a questão é, em tudo, idêntica à dos autos, tendo ainda em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito, em conformidade com o preceituado no artigo 8.º, nº 3 do Código Civil, eximimo-nos de expender novas considerações, reproduzindo aqui o raciocínio jurídico vertido no primeiro dos citados Acórdãos, inteiramente transponível para o caso vertente, e no qual integrámos o Coletivo enquanto Segunda Adjunta.

Lê, assim, no aludido Acórdão, e no que para os presentes autos releva o seguinte:

Considera o Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, na medida em que o mesmo é absolutamente incompetente para conhecer o peticionado, dado que, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, as contraprestações dos encargos relativos ao estabelecimento e disponibilidade do sistema de drenagem de águas residuais passaram a ser qualificadas de preços.

Ademais, quer o disposto no POCAL (DL n.º 54.º-A/99, de 22 de fevereiro), quer a evolução do DL n.º 194/2009, de 20 de agosto, apontam para a qualificação como preço.

Vejamos, então.

Nos termos do art.º 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP):

“Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.

Por sua vez, ao nível da lei ordinária, determina o art.º 1.º, n.º 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscal (ETAF; redação vigente à época, a que correspondem futuras menções), que:

“Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.

A este propósito, é de atentar no art.º 49.º do ETAF, nos termos do qual:

“1 - Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, compete aos tribunais tributários conhecer:

a) Das ações de impugnação:

i) Dos atos de liquidação de receitas fiscais estaduais, regionais ou locais, e parafiscais, incluindo o indeferimento total ou parcial de reclamações desses atos;

ii) Dos atos de fixação dos valores patrimoniais e dos atos de determinação de matéria tributável suscetíveis de impugnação judicial autónoma;

iii) Dos atos praticados pela entidade competente nos processos de execução fiscal;

iv) Dos atos administrativos respeitantes a questões fiscais que não sejam atribuídos à competência de outros tribunais;

b) Da impugnação de decisões de aplicação de coimas e sanções acessórias em matéria fiscal;

c) Das ações destinadas a obter o reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos em matéria fiscal;

d) Dos incidentes, embargos de terceiro, reclamação da verificação e graduação de créditos, anulação da venda, oposições e impugnação de atos lesivos, bem como de todas as questões relativas à legitimidade dos responsáveis subsidiários, levantadas nos processos de execução fiscal;

e) Dos seguintes pedidos:

i) De declaração da ilegalidade de normas administrativas de âmbito regional ou local, emitidas em matéria fiscal;

ii) De produção antecipada de prova, formulados em processo neles pendente ou a instaurar em qualquer tribunal tributário;

iii) De providências cautelares para garantia de créditos fiscais;

iv) De providências cautelares relativas aos atos administrativos impugnados ou impugnáveis e às normas referidas na subalínea i) desta alínea;

v) De execução das suas decisões;

vi) De intimação de qualquer autoridade fiscal para facultar a consulta de documentos ou processos, passar certidões e prestar informações;

f) Das demais matérias que lhes sejam deferidas por lei.

2 - Compete ainda aos tribunais tributários cumprir os mandatos emitidos pelo Supremo Tribunal Administrativo ou pelos tribunais centrais administrativos e satisfazer as diligências pedidas por carta, ofício ou outros meios de comunicação que lhe sejam dirigidos por outros tribunais tributários”.

In casu, o Recorrente sustenta que está em causa um preço e, como tal, cai fora da jurisdição tributária.

Vejamos.

O alegado implica a abordagem das noções de tarifa, preço e taxa.

Sobre o conceito de tarifa, cumpre chamar, desde já, à colação o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 76/88, de 07.04.1988, no qual se escreveu:

“Alude-se (…) a "tarifa de saneamento". A nomenclatura aqui utilizada suscita, desde logo, uma pequena interrogação: que deverá entender-se, no domínio das finanças locais, e em rigor, por tarifa?

A este respeito, em termos conceituais abstractos, e sem qualquer referência ao universo das finanças locais, escreve Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, página 59:

‘A prestação de serviços públicos pode efectuar-se em contrapartida de preços ou taxas. Num ou noutro caso as normas regulamentares que fixam a referida contraprestação e regem a sua aplicação denominam-se tarifas, expressão que muitas vezes se utiliza para designar os próprios preços ou taxas que são objecto do aludido regulamento’.

(…) Mas (…) qual será o exacto sentido do termo tarifa, no plano do direito financeiro local?

O artigo 51°, n° 1, alínea p), do Decreto-Lei n° 100/84, de 29/03, dispõe que compete à Câmara municipal, no âmbito da organização e funcionamento dos seus serviços, bem como no da gestão corrente, ‘fixar tarifas pela prestação de serviços ao público pelos serviços municipais ou municipalizados, no âmbito do abastecimento de água, recolha, depósito e tratamento de lixos, ligação, conservação e tratamento de esgotos e transportes colectivos de pessoas e mercadorias’.

Paralelamente, a Lei n° 1/87, de 06/01, depois de no artigo 4º, n° 1, alínea h), especificar que constitui receita dos municípios " o produto da cobrança de taxas ou tarifas resultantes da prestação de serviços pelo município", vem reafirmar, no nº 1 do artigo 12°, a competência tarifária já anteriormente atribuída às Câmaras municipais pelo artigo 51°, n° 1, alínea p), do Decreto-Lei n° 100/84,

Face a este quadro, impõe-se afirmar, e sem delongas, que a tarifa, no campo das finanças locais, se não delineia como uma figura tributária em absoluto nova, ou seja, como uma espécie de tertium genus entre a taxa e o imposto. Ela, de facto, e sob todos os aspectos, apresenta-se como uma simples taxa, embora taxa sui generis cuja especial configuração lhe advém apenas da particular natureza dos serviços a que se encontra ligada. Como, a propósito, se nota em “La Nuova Enciclopédia del Diritto e dell' Economia Garzanti ", 2a edição, página 1265, a taxa ‘diferencia-se da tarifa pública na medida em que o serviço a que corresponde o pagamento da taxa é efectuado pela administração do Estado no desempenho das suas funções institucionais fundamentais e em ordem à realização de fins estaduais primários. Trata-se, assim, de serviços administrativos, judiciários ou de utilidade pública, que o Estado presta na sua qualidade de ente soberano, dotado do poder impositivo’.

A tarifa, se ao nível da lei ordinária pode ter significação própria, não releva, porém, numa perspectiva constitucional, como categoria tributária autónoma. Nesta óptica, ela constitui apenas uma modalidade especial de taxa, e nada mais” (sublinhados nossos).

A lei das finanças locais (LFL) em vigor à época (Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro), optando por não se referir a preços e tarifas, como a sua antecessora, mas a “preços e demais instrumentos de remuneração”, previa, no seu art.º 16.º, os princípios gerais que norteiam a sua fixação, esclarecendo que os mesmos respeitam, designadamente, a atividades de exploração de sistemas municipais ou intermunicipais de saneamento de águas residuais e gestão de resíduos sólidos (cfr. ainda o art.º 10.º deste diploma).

Como referido no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 10.04.2013 (Processo: 015/12):

“No domínio de vigência da Lei das Finanças Locais de 2007 (Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro) e do DL n.º 194/2009, de 20 de Agosto, cabe na competência dos tribunais tributários a apreciação de litígios emergentes da cobrança coerciva de dívidas a uma empresa municipal provenientes de abastecimento público de águas, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos, uma vez que, o termo “preços” utilizado naquela Lei equivale ao conceito de “tarifas” usado nas anteriores Leis de Finanças Locais e a que a doutrina e jurisprudência reconheciam a natureza de taxas”.

Sistematiza o mencionado acórdão:

“Importa (…) reflectir um pouco sobre a natureza das tarifas e dos preços previstos nas normas citadas.

V.1. No Acórdão deste STA, de 30.05.2001- Processo nº 026109- AP DR 8.08.2003 - pág. 1588 e segs., relativo a dívida por fornecimento de água, e no âmbito de vigência da Lei nº 42/98, ficou escrito, para além do mais, o seguinte:

“Logo na alínea d) do seu artº. 16º da Lei nº 42/98 estatui que, entre outras, constituem receitas dos municípios ”o produto da cobrança de taxas, tarifas e preços resultantes da prestação de serviços pelo município”.

E no artº 20º, nº 1 a mesma lei esclarece relativamente a quais actividades é que os municípios podem cobrar as tarifas e preços (…)

Quer isto dizer que, da óptica da lei, os municípios tanto poderão optar pela instituição de tarifas como pela de preços pela utilização por banda dos interessados dos bens propiciados pelo município através das actividades de exploração dos sistemas públicos que identifica (…).

Estamos aqui perante o fornecimento de bens por parte dos municípios que visam satisfazer essencialmente necessidades privadas, mas porque, segundo a concepção política dominante na sociedade se entende que esses bens deverão ser propiciados segundo uma lógica independente da do mercado, "fundando-se em razões distintas, como a justa distribuição dos encargos públicos, ou em considerações de ordem política, como a de facilitar ou dificultar o acesso a certos bens ou serviços”, o legislador confere a possibilidade aos municípios de subtraírem a fixação das contraprestações pela utilização desses serviços ou bens à lógica ou às regras do mercado e submeterem-nas a critérios diferentes, fixando-as autoritariamente, se bem que, - e aqui apela-se a um elemento comum na formação do preço na lógica do mercado -, não “devam, em princípio, ser inferiores aos custos directa e indirectamente suportados com o fornecimento dos bens e com a prestação dos serviços”, segundo se manda no nº 3 daquele artº 20º da Lei nº 42/98.

Mas isso não impede que os municípios não possam fornecer esses bens segundo o regime de preços de mercado, assente essencialmente na regra da oferta e da procura, traduzida juridicamente num acordo de vontades e que dá origem a uma obrigação voluntária em vez de uma obrigação autoritária ou de fonte legal, como ali acontece, e ainda que esses preços não possam ser sujeitos a condicionamentos na sua determinação (preços tabelados, preços condicionados à demonstração dos elementos da sua formação, preços públicos e preços políticos).

Se a receita corresponde a um preço autoritariamente estabelecido pela utilização individual dos referidos bens que atenta aquela concepção são bens semipúblicos- tendo a sua contrapartida numa actividade dos municípios (do Estado ou de outros entes públicos) especialmente dirigida ao obrigado ao pagamento estamos perante uma tarifa; de contrário, estamos perante um preço.

Mas tarifa, aqui equivale-se totalmente, na perspectiva da sua natureza, a taxa, correspondendo a denominação apenas a um simples nomen especificamente atribuído pelo legislador das finanças locais quando ela respeita à utilização de certos bens semipúblicos -precisamente os indicados no nº 1 do artº 20º da citada Lei nº 42/98 e com correspondência em preceitos similares das leis anteriores”.

(…) Em jurisprudência, quer anterior (v., entre outros, os acórdãos de 15.06.2000 – Processo nº 024153 e de 09.10.1996- Processo nº 019322- Apêndice ao DR, de 28.12.1998, págs. 2759 e segs.), quer posterior (v., entre outros, os acórdãos de 22.05.2002 -Processo nº 026472 e de 31.03.2004- Processo nº 01921/03), este Supremo Tribunal reafirmou o mesmo entendimento de que a tarifa não constitui um tertium genus entre o imposto e a taxa, não tendo verdadeira autonomia conceitual, caracterizando-se, afinal, por não dever ser inferior ao preço do serviço prestado.

(…) [S]egundo [Casalta Nabais, Cadernos de Justiça Administrativa, nº 6, 1997, págs. 48 e segs.] (…), as tarifas não passam de taxas que revestem as seguintes particularidades:

a) não dizem respeito a serviços públicos que sejam por essência da titularidade do Estado, uma vez que não correspondem às funções institucionais fundamentais próprias da Administração Pública nem visam, por conseguinte, a realização dos fins estaduais primários;

b) por outro lado, podendo tais serviços ser objecto de oferta e procura e susceptíveis, assim, de uma avaliação em termos de mercado, o seu montante não deve, em princípio, ser inferior ao efectivo custo do correspondente serviço. (…)

(…) [A] (…) Lei das Finanças Locais, aprovada pela Lei nº 2/2007, de 15 de janeiro, deixou de considerar as tarifas entre as receitas dos municípios (…), limitando-se a referir apenas no artº 10º, alínea c) “cobrança de taxas e preços resultantes da concessão de licenças e da prestação de serviços pelo município, de acordo com o disposto nos artigos 15º e 16º”.

Se a isto acrescentarmos que o artº 16º, nº 3, refere que os preços e demais instrumentos de remuneração a cobrar pelos municípios respeitam, designadamente, às actividades de exploração de sistemas municipais ou intermunicipais de abastecimento público de água e que os preços devem obedecer a regulamento tarifário a aprovar, parece que seríamos levados a concluir no sentido de que tais preços deixaram de ser considerados taxas, ficando, por isso, a cobrança das respectivas dívidas sujeita ao foro comum.

Será assim?

(…) Acompanhando António Malheiro de Magalhães (…) diremos que os agora designados “preços” cobrados por serviços prestados e bens fornecidos pelos Municípios não perdem o sentido e o alcance que anteriormente lhes eram assacados pela doutrina e pela jurisprudência em face da Lei das Finanças Locais aprovada pela lei nº 42/98, já que mantêm a mesma natureza das “tarifas e preços” a que se referia o artº 20º daquele diploma.

Com efeito, apesar da supressão do termo “tarifa”, quer as taxas quer os preços agora previstos como receitas municipais nos artºs 15º e 16º, respectivamente, da Lei nº 2/2007, continuam a integrar o conceito de “taxa lato sensu” porque autoritariamente fixados pela prestação de bens semi-públicos, integrando-se, por isso, no conceito dado pelo artº 4º da LGT.

(…)

E não se diga que, no caso concreto, estamos em face de um contrato entre consumidor e prestador do serviço (artºs 59º, 63º e 64º do DL nº 194/2009) pois que isso não é suficiente para afastar o conceito de taxa.

Na verdade, a autonomia da vontade negocial da entidade gestora e do consumidor final nada ou pouco interfere na denominação do respectivo conteúdo e grau de vinculação da relação contraída, pelo que a respectiva contrapartida reveste natureza coativa (Aliás, o artº 69º do DL nº 194/2009, de 24 de Agosto, constitui um bom exemplo da inexistência da autonomia contratual ao impor que todos os edifícios, existentes ou a construir, com acesso ao serviço de abastecimento público de água ou de saneamento de águas residuais devem dispor de sistemas prediais de distribuição de água e de drenagem de águas residuais devidamente licenciados, de acordo com as normas de concepção e dimensionamento em vigor, e estar ligados aos respectivos sistemas públicos, sob pena da aplicação da coima prevista no 72º, nº 2, alínea a).)

Conforme salienta Sérgio Vasques -Manual de Direito Fiscal, Almedina, Coimbra, 2011, págs. 208 e segs., ainda que as taxas sejam exigidas em virtude da prestação de bens ou serviços, dando corpo a uma relação de troca com os contribuintes, elas não deixam de possuir natureza coativa, característica de todos os tributos públicos.

E acrescenta o mesmo autor que dois critérios materiais relevantes para a distinção entre preços e taxas são o do regime económico em que é realizada a prestação administrativa e o da indispensabilidade que essa prestação administrativa reveste para o particular.

Assim, estaremos perante uma taxa quando, por razões de direito ou de facto, não se encontrem no mercado prestações sucedâneas daquelas que a administração realize e o particular se veja por isso verdadeiramente coagido ao seu consumo (ou, por outras palavras, quando o aproveitamento da prestação administrativa se revela imprescindível para a sobrevivência condigna do particular, atentos os padrões sociais de cada momento e da cada lugar); já, pelo contrário, estaremos perante preço se o particular dispuser de liberdade de escolha entre prestações asseguradas pelo sector público e pelo sector privado (isto quando a administração realize essas prestações em condições de concorrência), ou por outras palavras também, quando o particular possa prescindir da prestação administrativa sem sacrifício relevante para a sua qualidade de vida.

Ora, não restam dúvidas, no caso que nos ocupa, quanto à indispensabilidade do serviço de abastecimento de água, tendo aliás, a Assembleia Geral da ONU reconhecido como direito fundamental do cidadão o abastecimento de água potável e o saneamento básico, enquanto realização do direito à saúde e a um nível de vida adequado.

Por outro lado, embora, como adiante se dirá, a gestão da água possa até ser efectuada por várias entidades (entre elas privadas. em regime de concessão), a verdade é que não existe concorrência para que os particulares possam optar por outro fornecedor.

Em face do que ficou dito concluímos então no sentido de que, não obstante a Lei nº 2/2007 (Lei da Finanças Locais) ter eliminado a expressão “tarifas” como receitas das autarquias, que a doutrina e a jurisprudência qualificavam como taxas, a expressão “preços” constante do seu artº 16º, nº 3, reportada a abastecimento público de água e saneamento de águas residuais, mantém o mesmo sentido e alcance das mencionadas “tarifas”” (sublinhados nossos).

Veja-se ainda o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 25.06.2015 (Processo: 045/14), no qual se sumariou:

“Não obstante a Lei n.º 2/2007 ter eliminado a expressão “tarifas” como receitas das autarquias, que a doutrina e a jurisprudência qualificavam como taxas, a expressão “preços” constante do seu art. 16.º, n.º 3, reportada a abastecimento público de água e saneamento de águas residuais, mantém o mesmo sentido e alcance das mencionadas ‘tarifas’”.

A este propósito, refere Sérgio Vasques (Manual de Direito Fiscal, 4.ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 2014, p. 209):

“[D]iremos que tendencialmente se está perante uma taxa quando, por razões de direito ou de facto, não se encontrem em mercado prestações sucedâneas daquelas que a administração realize e o particular se veja por isso verdadeiramente coagido ao seu consumo. Em vez disso, está-se tendencialmente perante preço quando, por razões de direito ou de facto, a administração realize essas prestações em condições de concorrência e o particular disponha por isso de liberdade de escolha entre as prestações asseguradas pelo setor público e pelo setor privado”.

Atento este enquadramento, passemos então à análise do caso dos autos.

In casu, estamos perante a designada tarifa de ligação ao ramal de águas residuais, que se consubstancia numa taxa, na modalidade de tarifa, dado tratar-se de uma prestação pecuniária, exigida por entidade pública com vista a compensar prestações que são efetivamente aproveitadas pelos particulares, e dado não se tratar de situação em que haja no mercado prestações sucedâneas, havendo, no fundo, a tal coação ao seu consumo, mencionada por Sérgio Vasques.

Por outro lado, além de ser pouco claro o que se pretende com a chamada à colação do POCAL (DL n.º 54-A/99, de 22 de fevereiro), sempre se refira que o mesmo, no dito ponto 2.8.3., relativo à contabilidade de custos, abrange preços e tarifas e de modo algum evidencia uma descaraterização da tarifa em causa.

Ademais, a relevância do princípio de recuperação de custos ou da cobertura de custos não é afastada pelo RGTAL, que, a este respeito, determina, sim, que “o valor das taxas (…) não deve ultrapassar o custo da atividade pública local ou o benefício auferido pelo particular”.

Quanto ao disposto no DL n.º 194/2009, de 20 de agosto, a que já se foi fazendo referência, designadamente na jurisprudência citada, cumpre referir o seguinte.

Este diploma veio estabelecer o regime jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos.

Em matéria tarifária, o mesmo refere dever haver uma “eficiência e equidade dos tarifários aplicados”, o que pode ser apreciado pela entidade gestora, em sede de análise de desempenho (cfr. art.º 10.º).

Refere-se ainda que à Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), no âmbito das suas competências em termos de zelar pela sustentabilidade económico-financeira, competia, à época, “[e]mitir recomendações gerais relativas aos tarifários dos serviços objeto do presente decreto-lei, independentemente do modelo de gestão adotado para a sua prestação, e acompanhar o seu grau de adoção, divulgando os respetivos resultados” [cfr. art.º 11.º, n.º 4, al. d)] e “[r]ecomendar à entidade gestora a revisão do tarifário, de acordo com o enquadramento legal, dando disso conhecimento à respetiva assembleia municipal, intermunicipal ou metropolitana e à entidade competente da tutela inspetiva” [cfr. art.º 11.º, n.º 10, al. c)]. Sublinha-se ainda o direito à informação, por parte dos utilizadores, previsto no art.º 61.º, n.º 1.

Este diploma, no art.º 69.º, n.º 1, prevê igualmente que “[t]odos os edifícios, existentes ou a construir, com acesso ao serviço de abastecimento público de água ou de saneamento de águas residuais devem dispor de sistemas prediais de distribuição de água e de drenagem de águas residuais devidamente licenciados, de acordo com as normas de conceção e dimensionamento em vigor, e estar ligados aos respetivos sistemas públicos”, o que reforça a questão da obrigatoriedade de os particulares terem de diligenciar no sentido de promover tal ligação, sob pena de responsabilidade contraordenacional.

Nada no diploma em causa, na redação aplicável, permite afastar a qualificação enquanto tributo da tarifa impugnada, pelos motivos que já referimos e que estão espelhados no já citado Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 10.04.2013 (Processo: 015/12).

São as caraterísticas do tributo que o definem e nada no diploma em análise afasta a sua qualificação como taxa, nem sequer a intervenção da ERSAR, que visa garantir apenas o seu cumprimento.

Trata-se, pois, de ato tributário, nos termos já explanados, motivo pelo qual são competentes para a resolução destes litígios os tribunais tributários.”

Ora, face ao supra expendido, à fundamentação jurídica nele transcrita à qual aderimos na íntegra, concluímos que a designada tarifa de ligação ao ramal de águas residuais, se consubstancia numa taxa, na modalidade de tarifa, sendo, portanto, competente para dirimir o litígio o Tribunal Tributário.

E por assim ser, tendo sido esse o juízo de entendimento propugnado na decisão recorrida nenhuma censura merece a mesma nesse e para esse efeito.

Prosseguindo, ora, com o erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

Advoga a Recorrente que o Tribunal a quo, violou, desde logo, o artigo 16º, da LFL na medida em que o princípio da recuperação de custos, tem de ser conjugado com o alcance operacional financeiro e gestionário do aludido preceito, e bem assim com o que dispõe o POCAL (D.L. nº 54-A/99, de 22/02) quanto a esta matéria.

Evidenciando, ainda neste conspecto, que os custos do serviço de águas residuais se encontram definidos e fundamentados na contabilidade obrigatória dos SMAS, e que, inversamente ao aduzido na decisão recorrida, se encontra, devidamente, fundamentado, em termos económico-financeiros o tributo sub judice, sendo que a alteração do coeficiente 0,90 resultou da aplicação da orientação da Entidade Reguladora, mormente da Recomendação do IRAR nº 1/2009.

Mais alega que, inexiste qualquer violação dos princípios constitucionais de igualdade e proporcionalidade, respeitando ao invés o tarifário os aludidos princípios.

Por seu turno, o juízo de procedência do Tribunal a quo esteou-se, desde logo, numa inexistência de fundamentação económico-financeira, ou seja, numa falta de apresentação objetiva do tarifário que, por sua vez, se mostrou excessivo face ao custo dos serviços em clara violação do princípio da cobertura dos custos, dele se extratando, designadamente, o seguinte:

“O tarifário aprovado para vigorar no ano de 2011 fixou em 90% sobre o valor do consumo de água o coeficiente de afluência de águas residuais, percentagem essa que foi reduzida para 53,5% em junho desse ano. (…)

Contudo, quanto à justificação do coeficiente de afluência de águas residuais, situado nos 90% (cfr. ponto F) do probatório), apenas é dada uma justificação na proposta do novo tarifário apresentada pelo presidente do Conselho de Administração dos SMAS à Câmara Municipal de Loures.

Em resumo, esta proposta fundamentou a alteração do coeficiente por ser “comummente aceite pela comunidade científica”, mas, finda a produção de prova, não se chega a tal conclusão.

Também a alegação de que os custos do tratamento de efluentes se situavam ao nível do preço de aquisição da água estão desprovidas de concretização.

Ou seja, a decisão tomada assentou numa fundamentação cujos pressupostos não foram demonstrados. Embora seja certo que os custos suportados pelos SMAS subiram em 2011, nada permite aferir se a revisão do mencionado coeficiente, para a percentagem em causa, era necessária para cobrir tais custos, ou se bastava um aumento do mesmo em menor proporção como aconteceu em relação à impugnante a partir de junho do mesmo ano.

Não é, pois, possível afirmar que ao tarifário aprovado para vigorar a partir de janeiro de 2011 subjazia, assim, uma base de racionalidade económica e uma ligação objetiva ao custeio da atividade dos SMAS. (…)

Por seu turno, o tarifário aprovado em junho de 2011 veio consagrar um coeficiente de afluência de águas residuais inferior ao custo do serviço (53,5%), no caso dos grandes consumidores de água (mais de 1000 m3/mês), conforme pontos F) a H) do probatório.

Uma vez que a Impugnante se situa nesta categoria, foi abrangida pelo novo valor de tributação, pondo em causa a sua legalidade (…).”

E a verdade é que entende este Tribunal que a decisão recorrida não padece do erro de julgamento que lhe é assacado, na medida em que os atos impugnados padecem, efetivamente, de ilegalidade não contendo, desde logo, a legal e exigível fundamentação económico financeira.

É certo que a decisão recorrida não evidencia, de forma expressa e para esse efeito, o artigo 8.º do RGTAL e conclui mediante convocação do princípio da recuperação de custos, no entanto, tal em nada pode relevar para efeitos de manutenção da cominação legal de anulabilidade dos atos impugnados, na medida em que, por um lado, se retira tal inferência do teor da decisão recorrida, explicitando-se a aduzida falta de fundamentação económico-financeira, designadamente os custos diretos e indiretos, e os encargos financeiros, e por outro lado, porque, como é consabido, o Tribunal não está vinculado a qualquer qualificação e cominação jurídica, em ordem ao consignado no artigo 5.º, nº3 do CPC.

Daí resulta, portanto, que o Tribunal a quo, inversamente ao advogado pela Recorrente, não violou o artigo 16.º, n.ºs 1 e 3, da LFL, e bem assim a Recomendação n.º 1/2009 do IRAR, sobre tarifas.

Mais uma vez, a atestar a ilegalidade dos tributos em contenda, e a inexistência da advogada violação dos normativos invocados, convoque-se, novamente, a Jurisprudência expendida no citado Aresto que vimos acompanhando, extratando-se no que para os autos releva, designadamente, o seguinte:

“[t]endo, em seu entender, o Tribunal a quo violado o art.º 16.º, n.ºs 1 e 3, da LFL, o art.º 5.º, do DL n.º 362/98, de 23 de maio, e a Recomendação n.º 1/2009 do IRAR, sobre tarifas.
Vejamos então.
A 01.01.2007, entrou em vigor a Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro (RGTAL).
Nos termos do seu art.º 1.º:
“1 - A presente lei regula as relações jurídico-tributárias geradoras da obrigação de pagamento de taxas às autarquias locais.
2 - Para efeitos da presente lei, consideram-se relações jurídico-tributárias geradoras da obrigação de pagamento de taxas às autarquias locais as estabelecidas entre as áreas metropolitanas, os municípios e as freguesias e as pessoas singulares ou coletivas e outras entidades legalmente equiparadas”.
Portanto, o tributo em apreciação enquadra-se no âmbito do RGTAL, pelos motivos que já explanamos em III.A. e para os quais remetemos – o que afasta a alegada violação do disposto no art.º 16.º, n.º 1 e 3, da LFL então em vigor.
Não se alcança de que forma este entendimento colide com a jurisprudência da União Europeia, violação essa mencionada sem qualquer tipo de densificação pelo Recorrente, que se limitou a invocá-la sem consubstanciar o seu entendimento e que não nos surge como evidente, pelo menos da perspetiva do Recorrente – nem quanto a violação de qualquer uma das liberdades fundamentais nem quanto a violação dos princípios inerentes à livre concorrência (apenas pertinente caso estivéssemos perante uma situação de concorrência no mercado de diversos operadores, o que não é o caso).
Da mesma forma não é violado o disposto no Estatuto do Instituto Regulador de Águas e Resíduos (DL n.º 362/98, de 18 de novembro), porquanto o seu papel de regulamentação, orientação e fiscalização não é posto em causa pela caraterização da tarifa como tributo nem pela necessidade de serem respeitadas as exigências impostas pelo RGTAL.
Aliás, a própria Recomendação n.º 1/2009 do IRAR sublinha a ausência de fundamentação técnica e económica aparente de vários dos tarifários aplicados e pretendeu, com tal recomendação, trazer maior racionalidade económica e financeira nas estruturas tarifárias (…)
O tributo em análise foi liquidado considerando o Regulamento do Serviço de Drenagem de Águas Residuais da Câmara Municipal de Loures, aprovado por deliberação da Assembleia Municipal de Loures, de 27.01.2005 (cfr. Aviso n.º 1866/2005, publicado no Diário da República, II Série, Apêndice, de 22.03.2005), concretamente o seu art.º 31.º, n.º 2, como decorre do ato impugnado.
Nos termos do seu art.º 30.º:
“1 - Para fazer face aos encargos com as atividades desenvolvidas no âmbito da exploração do sistema público de drenagem de águas residuais, são devidas tarifas pela prestação dos serviços de ligação, drenagem, destino final de águas residuais e de outros, especialmente, previstos no Regulamento de Descargas de Águas Residuais Industriais.
2 - Poderá ainda a entidade gestora, no âmbito das atividades relativas à construção, exploração, conservação e administração dos sistemas públicos de drenagem de águas residuais, cobrar taxas e preços por serviços prestados, designadamente:
a) Conservação;
b) Serviços prestados, tais como, vistorias, ensaios, execução de ramais, limpeza de fossas, outros serviços avulsos, conexos com as atividades desenvolvidas e outros especialmente previstos no Regulamente de Descarga de Águas Residuais Industriais”.
Concretamente quanto à denominada tarifa de ligação, refere o art.º 31.º:
“1 - A tarifa de ligação respeita aos encargos relativos ao estabelecimento e disponibilidade dos sistemas públicos de drenagem de águas residuais.
2 - A tarifa de ligação será determinada em função da área total de construção, de acordo com o tarifário aprovado.
3 - A tarifa de ligação será devida pelo proprietário ou usufrutuário do prédio, no momento do pedido de ligação.
4 - A tarifa de ligação será paga de uma só vez ou no máximo de quatro prestações trimestrais, se assim for requerido, mediante o acréscimo da taxa de juro legal que vigorar em cada momento”.
Por seu turno, o seu art.º 16.º prescrevia que:
“Para assegurar o equilíbrio económico e financeiro com um nível de atendimento adequado, a entidade gestora fixará, por regra, anualmente, por deliberação dos órgãos municipais competentes, as tarifas e preços enumerados no Regulamento do Serviço de Drenagem e Destino Final de Águas Residuais”.
Com a publicação do RGTAL, as exigências, no tocante à criação de taxas, passaram a ser, sob pena de nulidade do regulamento, as seguintes (cfr. art.º 8.º, n.º 2):
“a) A indicação da base de incidência objetiva e subjetiva;
b) O valor ou a fórmula de cálculo do valor das taxas a cobrar;
c) A fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local;
d) As isenções e sua fundamentação;
e) O modo de pagamento e outras formas de extinção da prestação tributária admitidas;
f) A admissibilidade do pagamento em prestações”.
Ciente da necessidade de adaptação dos regulamentos existentes, o RGTAL consagra um regime transitório, no seu art.º 17.º, prevendo a revogação das taxas até então existentes, exceto se o respetivo regulamento estivesse conforme o RGTAL ou se viesse a ser alterado em conformidade com o RGTAL.
Este prazo limite para alteração dos regulamentos, por forma a que os mesmos passassem a estar conformes o RGTAL, foi sendo sucessivamente alterado, fixando-se, com a Lei n.º 117/2009, de 29 de dezembro, em 30.04.2010.
Atentando no Regulamento ora em apreciação, ao qual, nos termos que já referimos supra, são aplicáveis as exigências do RGTAL, o mesmo, no momento temporal pertinente in casu, não foi adaptado a tais exigências, designadamente nele não constando a já referida fundamentação económico-financeira. Tal significa que, ope legis, as taxas foram revogadas.
Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 27.09.2017 (Processo: 0479/16):
“A fundamentação imposta na Lei n° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que aprovou o regime geral das taxas das autarquias locais exige, no artigo 8º, nº 2, alínea c), que o regulamento que crie taxas municipais contenha, obrigatoriamente, sob pena de nulidade, a fundamentação económico-financeira relativa ao valor das mesmas taxas. A citada Lei, que entrou em vigor, em 1 de janeiro de 2007, consagrou um regime transitório, que permitia aos municípios a adequação dos regulamentos até ao início do segundo ano financeiro subsequente à sua entrada em vigor, versão original, ou até início do 3º ano financeiro subsequente à entrada em vigor da presente lei, versão da Lei nº 64-A/2008, de 31-12, OE para 2009, artigo 53º, ou, finalmente, até ao dia 30 de abril de 2010, versão da Lei nº 117/2009, de 29/12”.
É certo que está provado que, em reunião da Câmara Municipal de Loures, de 03.11.2010, foi aprovado um tarifário, com base no qual foi calculado o tributo impugnado.
No entanto, nada foi alegado e, consequentemente, provado no sentido de que as exigências do RGTAL, a que já nos referimos, tenham sido satisfeitas até ao dia 30.04.2010 – aliás, o próprio tarifário de novembro de 2010 limita-se a referir valores, sem que se conheça a respetiva sustentação, mantendo-se uma situação de ausência de previsão da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas.”

Resulta, assim, que conforme ajuizado pelo Tribunal a quo, o tarifário limita-se a referir valores mas sem que se percecione e aquilate, e como legalmente se impõe, a sua sustentação e os vetores que levaram à assunção, como visto, e como evidenciado pelo Tribunal a quo, “o tarifário aprovado para vigorar no ano de 2011 fixou em 90% sobre o valor do consumo de água o coeficiente de afluência de águas residuais, percentagem essa que foi reduzida para 53,5% em junho desse ano” mas sem que se percecionem as concretas premissas que os gizaram, mantendo-se, por conseguinte, uma situação de ausência da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas.

Por outro lado, e inversamente ao advogado pela Recorrente, nada resulta demonstrado, bem pelo contrário, de que a redução do coeficiente de afluência de águas residuais de 0,90 para 0,53,5 que integra o cálculo da tarifa de águas residuais, resultou da negociação com os chamados grandes consumidores e bem assim que o estudo referido na alínea d) do probatório demonstra que a fixação do tarifário impugnado obedeceu ao princípio da recuperação de custos.

Sendo que, para o efeito, basta atentar na factualidade não provada -não impugnada ao abrigo dos requisitos constantes no artigo 640.º do CPC- para se aquilatar em sentido inverso.

Ou seja, o raciocínio que é propugnado pela Recorrente radica, desde logo, num erro a montante concatenado com a natureza jurídica dos atos impugnados e que contamina as asserções, quer de facto, quer de direito que convoca. Sendo que, quanto a esta última esteira de razão, importa relevar que, não tem, de todo, subjacente as realidades de facto que resultam do acervo probatório dos autos, descurando, erradamente, que no caso vertente o Tribunal a quo consignou como factualidade não provada que a percentagem de 90% é comummente aceite pela comunidade científica como coeficiente de afluência de águas residuais relativamente ao consumo de água, e que a percentagem de 53,5%, resultante da alteração da tarifa, veio consagrar um “preço político” de atividades económicas.

De relevar in fine, e face a todo o exposto, carece de qualquer relevo o aduzido quanto à deliberação de junho de 2006, e ao desiderato que subjaz à mesma, quando, ademais as realidades de facto nela patenteadas não resultam, tão-pouco, demonstradas.

Como doutrinado no recente Aresto deste TCAS, proferido no processo nº 843/12, de 19 de dezembro de 2024:

“Tal como no Acórdão transcrito e com base na fundamentação dele constante, também nos presentes autos, e analisado o probatório, não vislumbra o Tribunal a existência de fundamentação económico-financeira para o tarifário aprovado em 03-11-2010, com base no qual foi calculada a taxa aqui impugnada. Com efeito, foi julgado não provado, entre outras situações, que “se tivesse verificado, entre 2010 e 2011, o aumento dos custos com a prestação do serviço de águas residuais” (ponto 1.), que “seja comummente aceite pela comunidade científica que o coeficiente de afluência de águas residuais corresponda a 90% da água consumida.” (ponto 2.) e que “tivesse sido realizado um estudo económico destinado a aferir da adequação da alteração do coeficiente da tarifa de águas residuais para 90%.” (ponto 3.).
Ora, se do tarifário não consta a sua fundamentação económico-financeira, a taxa que nele se fundamentou é, também ela, ilegal.”

Destarte, resulta prejudicado o conhecimento das demais questões, sendo, por conseguinte, de negar provimento ao recurso com a presente fundamentação.


***


IV. DECISÃO

Nestes termos, acorda-se em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, Subsecção Tributária Comum:

Negar provimento ao recurso, e manter a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.


Lisboa, 09 de janeiro de 2025

(Patrícia Manuel Pires)

(Ana Cristina Carvalho)

(Maria da Luz Cardoso)