Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 457/23.1BESNT |
![]() | ![]() |
Secção: | CA |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 07/03/2025 |
![]() | ![]() |
Relator: | MARCELO MENDONÇA |
![]() | ![]() |
Descritores: | PROCESSO CAUTELAR; “FUMUS BONI IURIS”; ÓNUS DA PROVA |
![]() | ![]() |
Sumário: | Atento o vertido conjugadamente nos artigos 23.º, n.º 1, alínea e), e 24.º do DL n.º 226-A/2007, de 31/05, a instalação de apoios de praia nos terrenos de domínio público hídrico é atribuída, por regra, através de um precedente procedimento concursal, ao que se segue o contrato de concessão de utilização privativa dos recursos hídricos do domínio público. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Votação: | C/ DECLARAÇÃO DE VOTO |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Indicações Eventuais: | Subsecção Administrativa Comum |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | I - Relatório. J… & Filhos, Lda., doravante Recorrente, que deduziu no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (TAF de Sintra) processo cautelar contra o Município de Cascais, doravante Recorrido, indicando ainda como Contrainteressado o Instituto da Mobilidade e Transportes, I.P., no âmbito do qual requereu a adopção da providência de suspensão de eficácia do acto administrativo consubstanciado na deliberação n.º 148/2023, de 28 de Fevereiro de 2023, da Câmara Municipal de Cascais, que determinou: (i) a nulidade do ato de desafectação da parcela do domínio público marítimo em que se encontra instalado o “Bar Central”, bem como da sua posterior inscrição a favor do Município de Cascais; (ii) o cancelamento junto da conservatória do registo predial da inscrição AP. 11 de 17/12/1991; (iii) que a [ora Recorrente] ocupa abusivamente o domínio público marítimo relativo à parcela ocupada pelo “Bar Central” ou “Bar das Espanholas”, por carecer de título para o efeito, (iv) que a [ora Recorrente] ocupa abusivamente o domínio público marítimo relativo à parcela ocupada pela “Esplanada” com a área de 58m2 , anteriormente titulado pela Licença 261/00, entretanto caducada, por carecer de título para o efeito, (v) o prazo de 30 dias de calendário para desocupar a referida parcela e (vi) lançamento de procedimento administrativo para o licenciamento da utilização ou concessão de exploração da mesma parcela, inconformada que se mostra com a sentença do TAF de Sintra, de 20/09/2023, que decidiu indeferir a providência cautelar requerida por, no essencial, ter julgado não verificado o pressuposto do “fumus boni iuris”, contra a mesma veio interpor recurso ordinário de apelação, apresentando alegações, nas quais formula as seguintes conclusões: “1.ª A douta sentença recorrida reconheceu que se verifica o requisito do periculum in mora, mas decidiu que não se verifica o requisito do fumus boni iuris, enfermando nesta parte, com o devido respeito, de erro de julgamento. 2.ª A douta sentença recorrida assenta toda a análise sobre fumus boni iuris na conclusão de que tanto as instalações do Bar das Espanholas situadas no edifício por debaixo da Estrada Marginal, como a esplanada montada no paredão, integram o domínio público marítimo. 3.ª A douta sentença recorrida fundamenta esta conclusão no disposto no art.° 11.° do Dec. Lei n.° 309/93 e nas RCM que aprovaram o POOC Cidadela - São Julião da Barra e o POC Alcobaça - Cabo Espichel, aplicáveis naquela praia, os quais, segundo a douta sentença recorrida, configuram decisões que, implicitamente, efectuaram a afectação daquele prédio ao domínio público marítimo, pois nesses instrumentos de gestão territorial o "restaurante/bar das Espanholas" é identificado como parte desse domínio. 4.ª Sucede que não decorre do art.° 11.º do Dec.Lei n.° 309/93 que os equipamentos e apoios de praia integrem automaticamente o domínio público marítimo. 5.ª E este diploma legal não contém qualquer norma especial que habilite os POOC a procederem à integração desses equipamentos e apoios no domínio público marítimo ou a procederem à delimitação do domínio público marítimo. 6.ª O mesmo sucedendo com o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), quer na versão constante do Dec.Lei n.° 380/99, quer na versão actualmente vigente, constante do Dec.Lei n.° 80/2015, diplomas legais que também não contém qualquer norma especial que habilite os Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) ou os Programas da Orla Costeira (POC) a procederem à integração desses equipamentos e apoios no domínio público marítimo ou a procederem à delimitação do domínio público marítimo. 7.ª Razão pela qual não decorre dos respectivos planos para a praia da Parede qualquer integração no domínio público marítimo do edifício situado por debaixo da Estrada Marginal onde se localizam as instalações do Bar das Espanholas. 8.ª Isto porque a dominialidade, ou não, de uma parcela de terreno na margem das águas do mar é determinada de acordo com pertinentes disposições do regime jurídico, constante à data do Dec.Lei 468/71 e actualmente da Lei 58/2005, e não pela previsão de um equipamento com apoio de praia simples no POOC Cidadela - São Julião da Barra ou no Regulamento de Gestão das Praias Marítima do POC-ACE. 9.ª Com efeito, tanto o Dec.Lei 468/71 como a Lei 58/2005, estipulam que o domínio público marítimo compreende os leitos e margens das águas do mar e que o domínio público marítimo pertence ao Estado, cfr. art.° 5.° do Dec.Lei n.° 468/71 e art.° 4.° da Lei n.° 58/2005. 10.ª Mas ambos os diplomas legais em referência prevêem a admissibilidade de desafectação do domínio público de parcelas do leito ou margens e, bem assim, do reconhecimento de propriedade privada sobre parcelas dos leitos ou margens das águas do mar, cfr. art.° 8.° do Dec.Lei n.° 468/71 e arts. 12.°/ 1/a e 19.° da Lei n.° 58/2005. 11.ª E ambos os diplomas legais em referência também prevêem o procedimento administrativo de delimitação do domínio público hídrico pelo Estado através do qual são fixados os limites dos leitos e margens dominiais confinantes com terrenos de outra natureza, cfr. art.° 10.° do Dec.Lei n.° 468/71 e art.° 17.° da Lei n.° 58/2005. 12.ª Ora o edifício situado por debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o Restaurante/Bar das Espanholas, desde 1991, está descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o n.° 1646/19911217 da freguesia da Parede, encontrando-se o respectivo direito de propriedade inscrito a favor do Município de Cascais por "desafectação do domínio público e integração no privado", cfr. alíneas H) e I do probatório. 13.ª De tudo resultando que a mera previsão nos planos da praia da Parede no POOC Cidadela - São Julião da Barra e POC Alcobaça - Cabo Espichel de um equipamento com apoio de praia no edifício situado por debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o Restaurante/Bar das Espanholas não possui idoneidade legal para integrar esse edifício no domínio público marítimo. 14.ª Termos em que ao decidir que o edifício situado por debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o Restaurante/Bar das Espanholas foi integrado no domínio público marítimo pelo art.° 11.° do Dec.Lei n.° 309/93 e pelas Resoluções do Conselho de Ministros que aprovaram o POOC Cidadela - São Julião da Barra e o POC Alcobaça - Cabo Espichel, aplicáveis naquela praia, a douta sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação da citada disposição do Dec.Lei n.° 309/93, dos arts. 5.°, 8.° e 10.° do Dec.Lei n.° 468/71 e art.° 4.°, 12.°/ 1/a, 17.° e 19.° da Lei n.° 58/2005 e dos arts. 42.° 43.° e 44 do Dec.Lei n.° 80/2015. Sem prescindir, 15.ª A douta sentença recorrida ao decidir que não pode proceder o erro sobre os pressupostos de facto e de direito quanto à integração do Restaurante/bar das Espanholas no domínio público rodoviário faz também errada interpretação e aplicação dos arts. 26.°, 227.°, 28.°/2/3 e 37.°/ 1 da Lei 34/2015 e dos arts. 6.°/1/2 e 12.°/1/2/b/3/d do Dec.Lei n.° 91/2015. 16.ª Com efeito, a Estrada Marginal (EN6), construída em 1942, pertence ao Estado e faz parte da rede rodoviária nacional nos termos do Plano Rodoviário Nacional (PNR 2000), integrando o domínio público rodoviário do Estado, cfr. art.° 26.°/ 1 /a da Lei n.° 34/2015, encontrando sob a gestão da Infraestruturas de Portugal, S.A., cfr. art.° 6.°/1/2 do Dec.Lei n.° 91/2015. 17.ª O domínio público rodoviário compreende a zona da estrada e o respectivo subsolo, cfr. art.° 28.°/1/a/3 da Lei n.° 34/2005, razão pela qual o edifício debaixo da Estrada Marginal onde se situam as instalações do Restaurante/bar das Espanholas integra o domínio público rodoviário do Estado. 18.ª O art.° 37.°/1 da Lei 34/2015 prescreve que os prédios destinados à implantação de uma infraestrutura rodoviária podem ser susceptíveis de satisfazer várias utilidades públicas, desde que as mesmas sejam compatíveis entre si, como sucede no caso vertente. 19.ª Porém de acordo com o disposto no Dec.Lei n.° 91/2015 é a Infraestruturas de Portugal S.A. que detém a competência para proceder ao licenciamento e concessão da exploração, da utilização, da ocupação ou do exercício de quaisquer actividades nos terrenos, edificações e outras infraestruturas do domínio público ferroviário e rodoviário, integrados ou afectos à respectivas nacionais, cfr. respectivo art.° 12.°/2/13. 20.ª E é bem assim a Infraestruturas de Portugal S.A. que detém a competência para determinar a remoção de ocupações indevidas de bens do domínio público sob a sua gestão, cfr. art.° 12.°/3/d do Dec.Lei n.° 91/2015. 21.ª Devendo sublinhar-se nesta sede que a Infraestruturas de Portugal S.A., entidade demandada como contrainteressada na acção principal (Proc.° n.° 575/23.6BESNT), na sua Contestação, afirma expressamente e comprova documentalmente que as instalações do Bar das Espanholas e a respectiva esplanada integram o domínio público rodoviário nacional, cfr. respectivos artigos 23.º a 31.º, e a planta com a delimitação do domínio público rodoviário no local. 22.ª E que a zona do Bar das Espanholas é domínio público do Estado sob a sua gestão, incluindo o poder de exploração, estando o Município de Cascais a exercer poderes sobre bem que não integra o seu património, cfr artigos 26.° e 29.° da Contestação. 23.ª Do que antecede resulta que, não se integrando a gestão do domínio público rodoviário nacional nas atribuições do Município de Cascais, este não possui competência legal para a prática dos actos administrativos contidos nos números 3 a 6 da deliberação suspendenda, designadamente no que concerne à desocupação do Bar das Espanholas e à abertura de procedimento administrativo para o respectivo licenciamento ou concessão de exploração. 24.ª Daí resultando que os actos administrativos contidos nos números 3 a 6 da deliberação suspendenda são estranhos às atribuições do Réu Município e, como tal, são nulos, cfr. art.º 161/2/b do CPA. 25.ª Termos em que, contrariamente ao decidido pela douta sentença recorrida, verifica-se o invocado erro sobre os pressupostos de facto e de direito da deliberação suspendenda, decorrente da efectiva integração do Restaurante/Bar das Espanholas no domínio público rodoviário. Mais uma vez sem prescindir, 26.ª A douta sentença recorrida faz também errada apreciação dos factos e errada interpretação e aplicação do regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico, ao decidir que a recorrente sabia desde 1995 que o restaurante que explorava se encontrava localizado em domínio público marítimo, por tal decorrer do teor do ofício que lhe foi remetido pela DRALVT, em resposta ao pedido de autorização de utilização desse domínio, cfr. al. M) do probatório, da assinatura de termos de responsabilidade e pagamento de taxas relativos a essa licença em 1997 e 1998, cfr. als. P), Q), R), S) e T) do probatório, da emissão em 15 de Junho de 1999 da licença 291 pela DRALVT, cfr. al . U) do probatório, da assinatura de sucessivos termos de responsabilidade e do pagamento de taxas relativas a essa licença, cfr. als. V), W), X), Y), AA), BB), DD), GG), HH) e II) do probatório. 27.ª Sucede que todas as licenças, termos de responsabilidade e taxas pagas referidas na douta sentença recorrida não têm por objecto as instalações do Bar/restaurante denominado "Bar Central" ou "Bar das Espanholas" localizadas no edifício situado por debaixo da Estrada Marginal. 28.ª Na verdade, todas essas licenças, termos de responsabilidade e taxas têm exclusivamente por objecto a esplanada desmontável que a recorrente instala no Paredão. 29.ª Efectivamente conforme se pode verificar pelo teor da licença n.º 261/99 emitida em 15 de Junho de 1999 pela DRAVT pelo prazo de um ano (renovada sucessivamente até 2022 com termo em 15 de Junho de 2023), a mesma tem apenas por objecto a esplanada desmontável com 58 m2 que a recorrente instala no Paredão, cfr. al. U) do probatório. 30.ª Foi apenas relativamente a essa licença da esplanada que foram assinados os termos de responsabilidade e liquidadas as taxas de utilização de 58 m2 do domínio público marítimo. 31.ª Ora, o edifício onde funcionam as instalações do "Bar das Espanholas", de acordo com a respectiva descrição predial Cascais (descrição predial n.° 1646/ 19911217 da freguesia da Parede da 1.a Conservatória do Registo Predial de Cascais) tem 467 m2 de área coberta, cfr.. al. I) do probatório. 32.ª Consistindo num prédio urbano composto de restaurante e balneário com 1 divisão, cozinha e 2 casas de banho e sanitários públicos com 2 casas de banho (da CMC) e 2 arrecadações, tudo conforme consta da respectiva matriz predial urbana (artigo 6257 da União de Freguesias de Carcavelos e Parede), cfr. al. H) do probatório. 33.ª Ora, a utilização deste edifício pela recorrente nunca foi titulada por qualquer licença de utilização do domínio público marítimo emitida pela DRALVT ou por qualquer outra entidade, nem nunca foi liquidada ou cobrada qualquer taxa de utilização do domínio público marítimo relativa à área de 467 m2 ocupada por esse edifício, nem pela DRALVT, nem pelas entidades que lhe sucederam nas competências sobre o domínio público marítimo. 34.ª O título de utilização do edifício situado debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o "Bar das Espanholas" é o Alvará n.° 2204 emitido pela Câmara Municipal de Cascais, em 30 de Julho de 1986, através do qual foi concedido a Vicente Ferreira Gonçalves (...) licença para exploração de um estabelecimento de BAR, classificado em "ESTABELECIMENTO DE BEBIDAS DE 3.", situado nas instalações de banhos da Praia Central da Parede (...) ficando o concessionário obrigado a atender na exploração a todas as condições de higiene e de segurança legais ...», e que veio a ser averbado em nome da Autora em 23-10-1990, cfr.. doc. 9 junto com a Pl. 35.ª De tudo resultando que as licenças emitidas exclusivamente para a esplanada pela DRALVT e respectivos termos de responsabilidade e taxas de utilização do domínio público marítimo, como é evidente, não têm por objecto as instalações do "Bar das Espanholas", objecto do alvará n.° 2204 emitido pela Câmara Municipal de Cascais, situadas no edifício debaixo da Estrada Marginal. 36.ª E por isso a licença da esplanada e os respectivos termos de responsabilidade e taxas de utilização do domínio público marítimo não determinaram que a recorrente tornasse por essa via conhecimento de que as instalações do restaurante situadas no edifício por debaixo da Estrada Marginal integrassem o domínio público marítimo, donde se conclui que, contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, a recorrente até à notificação da deliberação suspendenda não tinha conhecimento de que esse restaurante integrasse o domínio público marítimo. 37.ª Do que antecede resulta bem assim que a douta sentença recorrida, ao decidir que improcede a alegada actuação de boa fé da requerente, ora recorrente, e dos efeitos putativos invocados por esta, faz também errada apreciação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do direito, maxime do art.º 266.°/1 da Constituição, dos arts. 10.° e 162.°/3 do CPA, do regime jurídico da titularidade do domínio hídrico, quer o constante da Lei 58/2005 actualmente vigente, quer o constante do Dec.Lei n.° 468/71 anteriormente vigente, dos arts. 1.°, 2.° 3.°/ 1 e 11. 0 do Dec.Lei n.° 309/93 e dos arts. 42.° a 51.° do RJIGT. 38.ª A douta sentença recorrida assenta a conclusão que retira sobre esta matéria no carácter precário e no prazo certo da licença n.° 261 e no facto da ora recorrente saber, pelo menos desde 1995, que o apoio que explora estava inserido no domínio público marítimo. 39.ª Ora, conforme já se referiu a recorrente até à notificação da deliberação suspendenda não tinha conhecimento de que as instalações do restaurante situadas no edifício por debaixo da Estrada Marginal integrassem o domínio público marítimo. 40.ª A utilização do edifício com a área de 467 m2 situado por debaixo da Estrada Marginal onde funcionam as instalações do Bar das Espanholas nunca foi titulada por qualquer licença de utilização do domínio público marítimo, nem tão pouco foi alguma vez liquidada qualquer taxa de utilização de recursos hídricos relativamente ao mesmo, seja por que entidade fosse. 41.ª E a licença n.° 261 tem apenas por objecto a esplanada desmontável com 58 m2 que a recorrente instala no Paredão, razão pela qual o carácter precário dessa licença não é susceptível de afastar a boa fé da recorrente relativamente à exploração das instalações do "Bar das Espanholas" que se situam no edifício que fica debaixo da Estrada Marginal e que são objecto do alvará n.° 2204 emitido pela Câmara Municipal de Cascais. 42.ª Na verdade, desde 1990 até à notificação da deliberação suspendenda a ora recorrente sempre explorou o "Bar das Espanholas" nas instalações situadas no edifício por debaixo da Estrada Marginal ao abrigo do citado alvará n.° 2204 e na convicção de que o prédio em causa integrava o domínio privado do Município de Cascais. 43.ª Isto porque a ora recorrente sempre explorou o estabelecimento em apreço ao abrigo da licença de exploração, titulada pelo alvará 2204 de 30 de Julho de 1986. 44.ª Alvará esse que conjugado com o facto da Câmara Municipal de Cascais se arrogar proprietária do edifício situado debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o "Bar das Espanholas e ter inclusive procedido em 1991 ao registo predial do correspondente prédio urbano, inscrevendo a seu favor o respectivo direito de propriedade por "desafectação do domínio público e integração no privado", cfr. als. H) e I) do probatório, criou na ora recorrente a legítima convicção de que o prédio em causa integrava o domínio privado do Município de Cascais. 45.ª Convicção essa reforçada pelo facto da RALVT nunca ter emitido nenhuma licença de uso privativo para as instalações do Bar das Espanholas situadas no edifício debaixo da Estrada Marginal ou sequer tenha alguma vez liquidado e cobrado qualquer taxa de utilização do domínio público relativa aos terrenos ocupados por esse edifício. 46.ª Ao que acresce que não decorre do art.º 11.° do Dec. Lei n.° 309/93 que os equipamentos e apoios de praia integrem automaticamente o domínio público marítimo e que este diploma legal não contém qualquer norma especial que habilite os POOC a procederem à integração desses equipamentos e apoios no domínio público marítimo ou que habilitem os POOC a procederem à delimitação do domínio público marítimo. 47.ª O mesmo sucedendo com o RJIGT que também não contêm qualquer norma especial que habilite os POC a procederem à integração desses equipamentos e apoios no domínio público marítimo. 48.ª E por isso não decorre dos respectivos planos para a praia da Parede qualquer integração no domínio público marítimo do edifício situado por debaixo da Estrada Marginal onde se localizam as instalações do Bar das Espanholas, razão pela qual tais planos não têm o condão de publicitar o carácter dominial desse edifício. 49.ª De tudo resultando que a ora recorrente sempre agiu de boa fé, explorando o Bar das Espanholas instalado edifício situado por debaixo da Estrada Marginal durante 36 anos ao abrigo do alvará 2204 de 30 de Julho de 1986 emitido pela Câmara Municipal de Cascais, na convicção de que esse edifício pertencia ao Município, conforme consta do registo predial "por desafectação do domínio público e integração no privado". 50.ª Verificando-se por isso, caso se conclua pela nulidade do acto de desafectação, os requisitos previstos no art.º 162.º do CPA para atribuição de efeitos putativos à situação de facto decorrente desse acto nulo, consubstanciados na manutenção dos direitos conferidos pela licença de exploração do prédio onde está instalado o denominado "Bar das Espanholas" titulada pelo alvará n.° 2204 e a condenação do Município a reconhecer esse direito de exploração, conforme peticionado na acção principal. 51.ª A douta sentença faz ainda errada apreciação dos factos e errada interpretação e aplicação do direito quando concluiu que existem apenas duas licenças não procede o alegado pela ora recorrente sobre a existência de três licenças, por em seu entender existirem apenas duas licenças. 52.ª Na verdade, a licença para ocupação do domínio público emitida para a esplanada não tem por objecto a construção edificada (o restaurante/bar e os balneários), sendo o título para a utilização desse edifício constituído pelo alvará n.° 2204 emitido pela Câmara Municipal de Cascais e não pela licença n.° 261 emitida pela DRALVT, razão pela qual, contrariamente ao decidido pela douta sentença recorrida, existem efectivamente três licenças, conforme foi invocado pela ora recorrente. 53.ª A douta sentença recorrida faz também errada apreciação dos factos e errada interpretação da direito quando conclui que improcedem as ilegalidades invocadas pela ora recorrente relativamente aos pontos 3, 4, 5 e 6 da deliberação suspendenda. 54.ª No que concerne ao ponto 3. da deliberação em crise, relativo à parcela ocupada pelo "Bar Central" (i.e. do edifício situado debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o "Bar das Espanholas") porque decorre de tudo quanto antecede que a recorrente não ocupa abusivamente o domínio público marítimo, quer porque utiliza esse edifício ao abrigo do alvará n.° 2204 emitido pela Câmara Municipal de Cascais, quer porque o mesmo o mesmo integra o domínio público rodoviário. 55.ª No que concerne ao ponto 4. da deliberação em crise, relativo à parcela ocupada pela esplanada, porque a licença n.º 261, emitida pelo prazo de um ano a contar da data da sua emissão em 15 de Junho de 1999, cfr. al. U) do probatório, e sucessivamente prorrogada até 2022, tinha o seu termo em 15 de Junho de 2023, pelo que estava ainda vigente na data em que foi tomada a deliberação suspendenda, notificada à ora recorrente em 13 de Março de 2023. 56.ª No que concerne a ponto 5. da deliberação em crise, porque além da recorrente não estar a ocupar abusivamente o domínio público marítimo, o edifício situado debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o "Bar das Espanholas", integra o domínio público rodoviário, não dispondo por isso o Município de Cascais competência para ordenar a respectiva desocupação, posto que tal competência pertence à Infraestruturas de Portugal S.A. cfr. art.º 12/3/d do Dec. Lei n.° 91/2015. 57.ª E finalmente no que concerne a ponto 6. da deliberação em crise, porque no que concerne ao edifício situado debaixo da Estrada Marginal onde está instalado o "Bar das Espanholas", que integra o domínio público rodoviário, o Município também não possui competência para o efeito, posto que tal competência pertence à Infraestruturas de Portugal S.A, cfr. art.º 12/2/b do Dec.Lei n.° 91/2015. 58.ª De tudo resultando em suma a deliberação suspendenda se mostra inquinada pelos vícios que lhe são assacados pela recorrente, razão pela qual a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento quando decide não se verificar o requisito do fumus boni iuris.” O Recorrido Município de Cascais apresentou contra-alegações, que, embora sem concluir, pugnou pelo não provimento do recurso. O Contrainteressado - Instituto da Mobilidade e Transportes, I.P. - também deduziu contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: “1.° O presente recurso foi interposto pelo Requerente "JOSÉ LUÍS, LEDO & FILHOS, LDA." contra a douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra de 20 de setembro de 2023, que absolveu da instância o Contrainteressado IMT, IP, e julgou o pedido cautelar improcedente e, em consequência, negou o decretamento da providência cautelar requerida. 2.° O Requerente, ora Recorrente, alegou na sua PI que o IMT é contrainteressado na presente providência cautelar porquanto a ser nulo o ato de desafetação do domínio público das parcelas em discussão, então estas integram o domínio público marítimo, dado se situarem debaixo da Estrada Marginal (EN6) e, consequentemente, a competência para decidir da utilização privatística do domínio público rodoviário pertence ao IMT. 2.° O IMT, ora Contrainteressado, alegou na sua Oposição não ter atribuições de gestão da rede rodoviária, mas apenas atribuições de regulamentação e fiscalização das atividades desenvolvidas no setor rodoviário. 3.° Na verdade, tal competência pertence atualmente à IP - lnfraestruturas de Portugal. 4.° Também o Município de Cascais alegou a exceção de ilegitimidade passiva do IMT com base nos mesmos argumentos. 5.° Neste sentido, bem decidiu a douta Sentença do TAF de Sintra que entendeu que o IMT não é contrainteressado na presente lide, pois independentemente da questão de saber quem tem atribuições de gestão de rede rodoviária, nos presentes autos é pedida tão só a suspensão de eficácia de um ato, a deliberação da Câmara Municipal de Cascais de 28 de fevereiro de 2023, que determina a nulidade do ato de desafetação do domínio público para o privado do Município e a desocupação pela Requerente das parcelas em causa. 6.° Sendo certo que o IMT, IP, ou a empresa lnfraestruturas de Portugal. S.A., em nada podem ser prejudicados com a suspensão de eficácia desse ato. 7.° Ou seja, tendo em conta como a Requerente, ora Recorrente, configura a ação, a procedência da presente providência não prejudica diretamente o IMT, IP. 8.° Face ao exposto, a douta Sentença do TAF de Sintra julgou a exceção de ilegitimidade passiva procedente e, em consequência, absolveu o IMT, IP da instância, nos termos do artigo 89.°, n.°s 1, 2 e 4, alínea e) do CPTA.”. O Ministério Público (MP) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para os efeitos do previsto no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, não emitiu parecer. Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente (cf. artigo 36.º, n.º 2, do CPTA), mas com apresentação prévia do projecto de acórdão, o processo vem à conferência da Subsecção Administrativa Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste TCAS para o competente julgamento. *** II - Delimitação do objecto do recurso.Considerando que são as conclusões de recurso a delimitar o seu objecto, nos termos conjugados dos artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicáveis “ex vi” do artigo 140.º, n.º 3, do CPTA, cumpre apreciar e decidir, resumidamente, se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento no que concerne à apreciação do pressuposto do “fumus boni iuris” vertido no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA. *** III - Matéria de facto.Da sentença recorrida consta a seguinte fundamentação de facto: “A) A Requerente é uma sociedade por quotas cujo objeto social é “Exploração de locais destinados à hotelaria e comércio” - cfr. documento 2 do requerimento inicial, documento n.º 006668374 dos autos no SITAF; B) Em 20 de julho de 1986, a Câmara Municipal de Cascais emitiu alvará sanitário com n.º 2204 do qual consta o seguinte: «hei por bem conceder a Vicente Ferreira Gonçalves, licença para exploração de um estabelecimento de BAR, classificado em "ESTABELECIMENTO DE BEBIDAS DE 3.ª", situado nas instalações de banhos da Praia Central da Parede [...] ficando o concessionário obrigado a atender na exploração a todas as condições de higiene e de segurança legais» - cfr. fls. 11 e 12 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; C) Em 1 de fevereiro de 1990, José Luís Ledo Nunez e esposa, Magdalena Lopez Carrasco, celebraram com os herdeiros de Vicente Ferreira Gonçalves, um contrato de cedência de estabelecimento balnear, nos termos do qual foi cedida à Requerente: «a exploração do aluguer de toldos e barracas, devidamente licenciada pela Capitania do Porto de Cascais, numa área de cerca de 440 metros quadrados […] na Praia Central da Parede, bem como uma licença de exploração de um estabelecimento de Bar Esplanada classificado como "estabelecimento de bebidas de 3.ª” situado nas instalações de banhos da mesma praia titulada pelo Alvará n.º 2204 da Câmara Municipal de Cascais, proprietária do imóvel, e ainda os balneários e arrecadação anexos ao mencionado bar» - cfr. fls. 13 a 16 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; D) Em 2 de fevereiro de 1990, os herdeiros de Vicente Ferreira Gonçalves requereram ao Capitão do Porto de Cascais a transferência do licenciamento de toldos e barracas com área aproximada de 440 metros quadrados na Praia da Parede para o nome da Requerente - cfr. fls. 17 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; E) Em 6 de março de 1990, Adelina Rosa Nunes Gonçalves, herdeira de Vicente Ferreira Gonçalves, declarou à Câmara Municipal de Cascais ter cedido à Requerente o estabelecimento do qual era concessionária - cfr. fls. 19 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; F) Em 16 de março de 1990, a Requerente solicitou à Câmara Municipal de Cascais e, em data não apurada, obteve autorização para a realização de obras de alteração aos balneários existentes e ao bar e para instalar cozinha e casas de banho - cfr. fls. 20 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; G) Em 7 de novembro de 1990, por despacho da Câmara Municipal de Cascais de 23 de outubro de 1990, foi averbado o nome da Requerente ao alvará n.º 2204 – cfr. fls. 11 e 12 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; H) Em 17 de dezembro de 1991, pela AP. 11/171291, foi inscrita a aquisição a favor do Município de Cascais do prédio com o artigo matricial 4505 da freguesia de Parede, ora inscrito com o artigo matricial 6257 da União das Freguesias de Carcavelos e Parede, por “desafetação do domínio publico e integração no privado” - cfr. fls. 22 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; I) Em 21 de fevereiro de 1992, pela Ap. 11/210292, foi inscrita a composição do prédio por: bar, balneários, sanitários públicos e duas arrecadações com a área de 467 metros quadrados- cfr. fls. 21 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668378 dos autos no SITAF; J) Em data não apurada, a Câmara Municipal de Cascais requereu à Conservatória do Registo Predial de Cascais a retificação da inscrição identificada na alínea I), para o seguinte teor: “pretende-se que seja retificada a designação de bar para restaurante que inicialmente foi indicado por lapso, possuindo também arrecadação” - cfr. fls. 39 do documento 5 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; K) Em 1990 e 1994, a Requerente efetuou o pagamento da taxa devida à Capitania do Porto de Cascais pela concessão da frente de praia – cfr. cópias dos recibos juntos a fls. 26 a 28 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; L) Em 30 de dezembro de 1994 a Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério do Ambiente e dos Recursos Naturais emitiu um Aviso com o seguinte teor: “Com a publicação do D.L 309/93 de 2 Setembro na redacção dada pelo D.L 218/94 de 20 de Agosto, as competências para atribuição de licenças de utilização de domínio público marítimo passaram a ser exercidas peias Direcções Regionais do Ambiente e Recursos Naturais. Assim, a Direcção Regional de Ambiente e Recursos Naturais de Lisboa e Vale do Tejo, com sede em Lisboa, na Rua Antero de Quental, n.º 44, informa que as licenças de utilização do Domínio Público Marítimo relativas à época balnear de 1995, deverão ser requeridas na sua delegação de Caldas da Rainha, sita na Rua Sebastião de Lima. n° 4, 1º ou na sua sede era Lisboa. É condição necessária para a obtenção de uma licença de Ocupação do Domínio Público Marítimo, ter sido titular de uma licença nos anos anteriores. (…)” – cfr. fls. 29 do documento 4 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; M) Em data não concretamente definida a Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério do Ambiente e dos Recursos Naturais notificou a Requerente, através do ofício n.º 31.014/DPS, no âmbito do procedimento n.º 1031/CAS/DPM, da informação prévia sobre a viabilidade de ocupação de uma parcela do domínio público marítimo, de onde consta o seguinte: “ASSUNTO INFORMAÇÃO PRÉVIA SOBRE VIABILIDADE DE OCUPAÇÃO DE UMA PARCELA DO DOMÍNIO PÚBLICO MARÍTIMO (…) Em resposta ao solicitado, pelo vosso requerimento, relativo ao assunto mencionado em epígrafe informa-se V. Exa. nos termos do art. 15° do D. L. 46/94 de 22 de Fevereiro em articulação com o disposto no art. 17° do D.L. 218/94 de 20 de Agosto, que para a época balnear de 1995, a pretensão merecer parecer favorável nas condições que constam na ficha anexa. A utilização pretendida está sujeita à obtenção de licença para utilização do Domínio Público Marítimo que será emitida por esta Direcção Regional, após vistoria conjunta ao local com as entidades competentes. (…)” - cfr. cópia do ofício de fls. 30 do documento 4 do requerimento inicial, cujo teorse dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; N) Em 16 de janeiro de 1995, pela Ap. 32/210292, foi retificada a designação do prédio mencionada na alínea I) para restaurante - cfr. cópia de certidão predial constante de fls. 21 do documento 4 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; O) Em 24 de maio de 1996 a Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério do Ambiente e dos Recursos Naturais notificou o Presidente do Conselho de Administração dos SMAS de Cascais no âmbito do processo de licenciamento de equipamentos e apoios de praia em domínio público marítimo para obter a colaboração desses serviços na tramitação dos mesmos, de onde consta o seguinte: “assunto LICENCIAMENTO de equipamentos e apoios de praia em dpm No decorrer da tramitação dos processos de licenciamento de ocupação do DPM e no que se refere às condições de saneamento básico de alguns equipamentos, foram detectadas situações de sistemas de tratamento e destino final de efluentes que suscitam dúvidas sobre a existência de eventuais descargas no solo. Neste contexto, solicita-se a colaboração dos serviços que V.Exa. preside, no sentido de serem efectuadas vistorias técnicas aos sistemas de saneamento instalados, a fim de serem verificadas as condições de funcionamento e corrigidas as que não estejam em conformidade com a adopção de sistemas estanques ou ligação à rede de colector municipal. (…) 5- José Luís Ledo& Filhos, Ida Parede (…)” - cfr. cópia do ofício de fls. 32 do documento 4 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; P) Em 13 de março de 1997 a Requerente e a representante da Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério do Ambiente assinaram um termo de responsabilidade com o seguinte teor: “Aos 13 de março do ano de mil novecentos e noventa e sete perante (…) representante da Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais de Lisboa e Vale do Tejo, e na presença das testemunhas adiante mencionadas, compareceu José Luís Ledo Nunes, na qualidade de requerente/representante do requerente da licença de ocupação do Domínio Público Marítimo com o nº 261 / 96 / DPM, que declarou ter tomado conhecimento das condições em que a referida licença lhe é concedida e que com as mesmas se conforma, obrigando-se a cumpri-las, em fé do que se lavra o presente termo de responsabilidade que, depois de lido e achado conforme, vai ser encerrado e assinado pelo representante da Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais de Lisboa e Vale do Tejo, pelo titular e testemunhas.” – cfr. cópia do termo de responsabilidade de fls. 34 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; Q) Em 21 de abril de 1997, a Requerente procedeu ao pagamento da taxa devida pela emissão da licença de ocupação do domínio público marítimo com o n.º 261/96 emitida pela Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo - cfr. fls. 36 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; R) Em 5 de março de 1998 a Requerente e a representante da Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério do Ambiente assinaram um termo de responsabilidade com o seguinte teor: “Aos 5 de março do ano de mil novecentos e noventa e oito perante (…) representante da Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais de Lisboa e Vale do Tejo, e na presença das testemunhas adiante mencionadas, compareceu José Luís Ledo Nunes, na qualidade de requerente/representante do requerente da licença de ocupação do Domínio Público Marítimo com o nº 261 / 97/ DPM, que declarou ter tomado conhecimento das condições em que a referida licença lhe é concedida e que com as mesmas se conforma, obrigando-se a cumpri- las, em fé do que se lavra o presente termo de responsabilidade que, depois de lido e achado conforme, vai ser encerrado e assinado pelo representante daDirecção Regional do Ambiente e Recursos Naturais de Lisboa e Vale do Tejo, pelo titular e testemunhas.” – cfr. cópia do termo de responsabilidade de fls. 37 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; S) Em 25 de abril de 1998, a Requerente procedeu ao pagamento à Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo da taxa devida pela emissão da licença de ocupação do domínio público marítimo com o n.º 261/97 - cfr. fls. 39 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; T) Em 28 de abril de 1999 e 14 de junho de 1999, a Requerente efetuou o pagamento da taxa devida pela emissão da licença de ocupação do domínio público marítimo, com o n.º 261/99, à Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo - cfr. fls. 40 e 41 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; U) Em 15 de junho de 1999 foi emitida a favor da Requerente pela Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo licença de ocupação de domínio público marítimo com o n.º 261/99 para esplanada desmontável da qual consta, na secção princípios e condições gerais, a seguinte informação: “1 – A presente licença é válida por um ano a contar da data da sua emissão. 2 – O titular tem um prazo de 4 meses, a contar da data da emissão desta licença, para apresentar um Projeto, de acordo com as condições especificas acima expressas, findo o qual sem que tenha ocorrido a apresentação do Projeto a licença perde a sua validade. 3 – Esta licença é concedida a título precário, sem prejuízo de direitos e com a condição expressa de que o titular tenha direito a qualquer indemnização. [...] 11 – A licença caduca com o decurso do prazo nela previsto bem como com a morte da pessoa singular ou a extinção da pessoa coletiva […] 15 – A presente licença anula todas as outras anteriores” – cfr. fls. 42 e 43 do documento 4 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; V) Em 2 de fevereiro de 2000 e 5 de abril de 2000, a Requerente efetuou o pagamento da taxa devida pela licença de ocupação do Domínio Público Marítimo à Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo, referente ao ano 2000 - cfr. cópia da guia de deposito n.º 24083, constante de fls. 45 do documento 4 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; W) Em 21 de setembro de 2000 a Requerente e a representante da Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território de Lisboa e Vale do Tejo assinaram um termo de responsabilidade com o seguinte teor: “Aos 21 de setembro do ano 2000 perante (…) representante da Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território de Lisboa e Vale do Tejo, e na presença das testemunhas adiante mencionadas, compareceu José Luís Ledo Nunes, na qualidade de requerente/representante do requerente da licença de ocupação do Domínio Público Marítimo com o nº 261/ DPM, que declarou ter tomado conhecimento das condições em que a referida licença lhe é concedida e que com as mesmas se conforma, obrigando-se a cumpri-las, em fé do que se lavra o presente termo de responsabilidade que, depois de lido e achado conforme, vai ser encerrado e assinado pelo representante da Direcção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território de Lisboa e Vale do Tejo, pelo titular e testemunhas.” – cfr. cópia do termo de responsabilidade de fls. 47 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; X) Em 15 de dezembro de 2001, a Requerente efetuou o pagamento à Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo da taxa devida pela emissão da licença de ocupação do Domínio Público Marítimo referente ao ano 2001 - cfr. cópia da guia de depósito n.º 38054, fls. 48 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; Y) Por ofício de 19 de fevereiro de 2003, com a ref.ª 94/DSLI, a Direção Regional do Ambiente e Ordenamento do Território de Lisboa e Vale do Tejo notificou a Requerente para efetuar o pagamento da taxa de utilização privativa de terreno do domínio público marítimo, do ano de 2001, do qual consta o seguinte: “PLANO DE ORDENAMENTO DA ORLA COSTEIRA (POOC) CIDADELA / FORTE DE S. JULIÃO DA BARRA. DESIGNAÇÃO: BAR CENTRAL; PRAIA: DA PAREDE CONCELHO: CASCAIS PORMENOR: TAXA DE UTILIZAÇÃO PRIVATIVA DE TERRENO DO DOMÍNIO PÚBLICO MARÍTIMO RELATIVO AO ANO DE 2001 De acordo com o estipulado no Decreto-Lei n.° 47/94, de 22 de fevereiro, e em cumprimento do Despacho n.° 5 / SERN/97, de 29 de Janeiro, fica V.Exa notificado a proceder ao pagamento da Taxa de Utilização Privada de Terreno do Domínio Público Marítimo, relativa ao ano de 2001, e a que corresponde a Licença n.° 261 / Cascais. (…)” - cfr. fls. 51 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; Z) Em 7 de abril de 2003, o Capitão do Porto de Cascais remeteu à Requerente um convite para, querendo, “estar presente nas reuniões dos Concessionários das Praias dos Concelhos de Cascais e Sintra” - cfr. fls. 53 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; AA) Em 13 de outubro 2003, a Requerente efetuou o pagamento à Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo da taxa devida pela emissão da licença de ocupação do Domínio Público Marítimo referente ao ano 2002 - cfr. cópia da guia de depósito n.º 09861, fls. 55 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; BB) Em 18 de março de 2005, a Requerente efetuou o pagamento à Direção Regional do Ambiente de Lisboa e Vale do Tejo da taxa devida pela emissão da licença de ocupação do Domínio Público Marítimo referente ao ano 2004/5 - cfr. cópia da guia de depósito n.º 18012, fls. 48 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; CC) Nos anos de 2008, 2015, 2016, 2019, a Capitania do Porto de Cascais, através das licenças 272/2008, 122/2015, 892/2016,181/2019, autorizou a concessão de toldos e barracas na praia da Parede à Requerente – cfr. cópias das licenças, constantes de fls. 62, 69, 70 e 78 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; DD) Por ofícios datados de 6 de fevereiro de 2015, 20 de fevereiro de 2017, 22 de janeiro de 2019, a Agência Portuguesa do Ambiente remeteu à Requerente as notificações das liquidações da taxa de recursos hídricos, dos anos de 2014, 2016 e 2018, respetivamente, com fundamento na licença 261 – cfr. fls. 66 a 68, 71 a 77 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; EE) Em 18 de junho de 2020, a Câmara Municipal de Cascais emitiu em nome da Requerente licença de ocupação do domínio público marítimo frente de praia com o n.º 115/2020 para a ocupação de areal em 228 metros quadrados entre 18 de junho a 15 de outubro de 2020 – cfr. fls. 82 do documento 4 do requerimento inicial, documento n.º 006668381 dos autos no SITAF; FF) Em 6 de agosto de 2020, a Câmara Municipal de Cascais emitiu em nome da Requerente licença de ocupação do domínio público marítimo com o n.º 174/2020 destinada ao fornecimento de alimentos e bebidas nas áreas concessionadas; GG) Por ofício datado de 30 de junho de 2022, a Câmara Municipal de Cascais notificou a Requerente da liquidação da Taxa de Recursos Hídricos referente aos anos de 2020 e 2021, do qual consta, designadamente, o seguinte: “licença 261/99 – Competências transferidas a esta autarquia, ao abrigo da Lei n.º 50/2018, de 16 de agosto e do Decreto-Lei n.º 97/2018, de 27 de novembro/Notificação para pagamento de TRH dos anos 2020 e 2021” – cfr. documento 79 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668466 dos autos no SITAF; HH) Em 20 de julho de 2022 e em 29 de julho de 2022, a Requerente procedeu ao pagamento da Taxa de Recursos Hídricos de 2020 e 2021 à Câmara Municipal de Cascais, conforme ofício referido no facto anterior - cfr. documento 79 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668466 dos autos no SITAF; II) Em data não concretamente apurada, a Câmara Municipal de Cascais remeteu à Requerente da liquidação da taxa de recursos hídricos do ano de 2022 - cfr. documento 80 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668467 dos autos no SITAF; JJ) Em 28 de fevereiro de 2023 foi proferida deliberação n.º 148/2023 pela Câmara Municipal de Cascais, da qual consta o seguinte: «Tenho a honra de propor que a câmara Municipal delibere, nos termos do artigo 33.º, n.º 1, subalínea qq) da Lei das Autarquias Locais: 1. Declarar a nulidade do ato de desafetação da parcela do domínio público marítimo em que se encontra instalado o “Bar Central”, bem como da sua ulterior inscrição a favor do Município de Cascais, ao abrigo do disposto no artigo 162.º, n.º 2 do CPA, por violação do artigo 3.º, n.º 2 e 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei 468/71, de 5 de novembro, vigente à data da desafetação, bem como dos vigentes artigos 3.º, e), 4.º e 11, n.º 2 do Decreto-Lei 54/2005, de 15 de novembro; 2. Proceder ao cancelamento junto da conservatória do registo predial do registo de inscrição AP. 11 de 17/12/1991 que teve por objeto a aquisição da propriedade a favor do Município, bem como da descrição predial n.º 1646, da antiga freguesia de Parede; 3. Declarar que, a “José Luís, Ledo & Filhos” ocupa abusivamente o domínio publico marítimo relativo à parcela ocupada pelo “Bar Central” (ou “Bar das Espanholas”), por carecer de título para o efeito, nos termos do artigo 2.º do DL 226-A/2007, de 31 de maio; 4. Declarar que a “José Luís, Ledo & Filhos” ocupa abusivamente o domínio publico marítimo relativo à parcela ocupada pela “Esplanada” com a área de 58m2, anteriormente titulado pela Licença 261/00, entretanto caducada, por carecer de título para o efeito, nos termos do artigo 2.º do DL 226-A/2007, de 31 de maio; 5. Conceder-se um prazo de 30 dias de calendário para cessar essa ocupação, após o qual, não se verificando a referida desocupação, deverão acionados os meios adequados à cessação dessa situação de ilegalidade; 6. Lançar procedimento administrativo para o licenciamento da utilização, ou concessão da exploração, das parcelas do domínio publico ocupadas pelo “Bar Central” e “Esplanada”. […] DELIBERAÇÃO: aprovado por unanimidade» - cfr. documento 1 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668373 dos autos no SITAF; KK) Nos anos de 2017, 2018, 2019, 2020 e 2021, a Requerente apresentou um resultado líquido de € 7.850,58; € 2.769,49; € 3.949,70; € 2.407,83 e € 6.220,76, respetivamente – cfr. documentos 82 a 85 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documentos n.ºs 006668471 e 006668472 dos autos no SITAF; LL) Entre 2000 e 2022, a Requerente teve ao serviço 1 trabalhador por conta de outrem - cfr. documento 85 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668472 dos autos no SITAF; MM) Entre junho de 2022 e agosto de 2022, a Requerente teve ao serviço 2 trabalhadores a termo - cfr. documento 85 do requerimento inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, documento n.º 006668472 dos autos no SITAF; NN) A exploração do “restaurante/bar das Espanholas”, esplanada e respetiva frente de praia e zona de apoio balnear é a única atividade comercial e fonte de receitas da Requerente – facto não impugnado.” *** IV - Fundamentação de Direito.Vejamos, então, se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento no que toca à apreciação que fez sobre o pressuposto do “fumus boni iuris”. Não é por demais enfatizar que, tendo presente o n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, o que releva é determinar que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente, tendo presente o disposto no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA. Conforme doutrinado no “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, de Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, 5.ª Edição, Almedina, 2022, nas páginas 1022 e 1023, trata-se, pois, de aferir a “aparência de bom direito”, designadamente, “nos casos em que o litígio envolva a apreciação da legalidade de atos administrativos, a formulação de um juízo sobre as perspetivas de êxito que se oferecem ao requerente no processo principal”. No caso vertente, quer isto dizer que ao julgador importa dilucidar, perfunctoriamente, assente em juízos sumários e não definitivos - porque a decisão cautelar se deve caracterizar pela sumariedade e provisoriedade -, se existe um panorama de provável sucesso quanto à procedência dos vícios de violação de lei que foram assacados contra o acto administrativo suspendendo, com vista a poder concluir sobre a plausibilidade de êxito da pretensão anulatória peticionada ou a peticionar no respectivo processo principal. E aqui, como vimos, o Tribunal a quo concluiu pela não verificação do pressuposto do “fumus boni iuris”, juízo com o qual a ora Recorrente não se conforma. Atentemos, pois, o caso vertente, tendo por fio condutor, porém, a delimitação que decorre das conclusões de recurso. O acto suspendendo é composto de seis segmentos decisórios distintos, que aqui se destacam do seguinte modo (cf. alínea JJ) do probatório): “1. Declarar a nulidade do ato de desafetação da parcela do domínio público marítimo em que se encontra instalado o “Bar Central”, bem como da sua ulterior inscrição a favor do Município de Cascais, ao abrigo do disposto no artigo 162.º, n.º 2 do CPA, por violação do artigo 3.º, n.º 2 e 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei 468/71, de 5 de novembro, vigente à data da desafetação, bem como dos vigentes artigos 3.º, e), 4.º e 11, n.º 2 do Decreto-Lei 54/2005, de 15 de novembro; 2. Proceder ao cancelamento junto da conservatória do registo predial do registo de inscrição AP. 11 de 17/12/1991 que teve por objeto a aquisição da propriedade a favor do Município, bem como da descrição predial n.º 1646, da antiga freguesia de Parede; 3. Declarar que, a “José Luís, Ledo & Filhos” ocupa abusivamente o domínio publico marítimo relativo à parcela ocupada pelo “Bar Central” (ou “Bar das Espanholas”), por carecer de título para o efeito, nos termos do artigo 2.º do DL 226-A/2007, de 31 de maio; 4. Declarar que a “José Luís, Ledo & Filhos” ocupa abusivamente o domínio publico marítimo relativo à parcela ocupada pela “Esplanada” com a área de 58m2, anteriormente titulado pela Licença 261/00, entretanto caducada, por carecer de título para o efeito, nos termos do artigo 2.º do DL 226-A/2007, de 31 de maio; 5. Conceder-se um prazo de 30 dias de calendário para cessar essa ocupação, após o qual, não se verificando a referida desocupação, deverão acionados os meios adequados à cessação dessa situação de ilegalidade; 6. Lançar procedimento administrativo para o licenciamento da utilização, ou concessão da exploração, das parcelas do domínio publico ocupadas pelo “Bar Central” e “Esplanada.” Este facto tem de ser relacionado com outro que, cronologicamente, o antecede e explica. É o facto inscrito na alínea H) do probatório: “Em 17 de dezembro de 1991, pela AP. 11/171291, foi inscrita a aquisição a favor do Município de Cascais do prédio com o artigo matricial 4505 da freguesia de Parede, ora inscrito com o artigo matricial 6257 da União das Freguesias de Carcavelos e Parede, por “desafetação do domínio publico e integração no privado”. Daqui se infere que o Município de Cascais, em 1991, no que toca ao prédio onde se encontra instalado o “Bar Central” (ou “Bar das Espanholas”), decidiu inscrever a aquisição a seu favor, desafectando-o do “domínio público” e integrando-o no seu domínio privado. O acto suspendendo, emitido já em 02/2023, por entender que a parcela onde se encontra instalado o “Bar Central” está inserida no “domínio público marítimo”, decidiu declarar a nulidade daquele acto de desafectação e determinar o cancelamento junto da conservatória do registo predial do registo da inscrição que teve por objeto a aquisição da propriedade a favor do Município de Cascais. E é logo por conta desta primeira vertente decisória que a Recorrente pretende defender a sua posição de inconformismo face ao acto suspendendo, lançando o argumento de que o prédio em causa, no essencial, não se encontra enquadrado no “domínio público marítimo”, mas sim no “domínio público rodoviário”, sustentando, com tal argumento, que o Município Recorrido se teria imiscuído no exercício de uma competência que pertenceria a outra entidade (no que se reputa como a invocação do vício de incompetência do município - cf., entre outros, o artigo 10.º do requerimento inicial e ss.), dado que, segundo propugnou no requerimento inicial, as instalações do “Bar Central” estão situadas numa área debaixo da Estrada Marginal (EN6) e, consequentemente, a competência para decidir da utilização privatística do domínio público rodoviário pertence ao Contrainteressado Instituto da Mobilidade e Transportes, I.P. (IMT). Cumpre dizer, previamente, que a sentença recorrida considerou o Contrainteressado IMT parte ilegítima, em virtude de ter entendido que a procedência da providência não o prejudicava directamente, ao que, em consequência, foi tal entidade absolvida da instância, sem que agora a Recorrente mostre qualquer contrariedade quanto a tal absolvição. Isto significa, pois, que se algum “domínio público rodoviário” haveria a defender no caso vertente, a Recorrente não chamou à presente demanda cautelar quem convenientemente poderia pleitear pela sua defesa, por se mostrar eventualmente prejudicado com o determinado no ponto 1. do acto suspendendo, ficando tão-só na lide quem a tal “domínio público rodoviário”, enquanto estrada nacional (segundo a tese da Recorrente), não cabia, com certeza, defender, isto é, o Município de Cascais. Por outro lado, a Recorrente alude em conclusões de recurso (cf. 21.ª e 22.ª) que, já em sede da contestação da Contrainteressada Infraestruturas de Portugal, S.A., apresentada, porém, na respectiva acção principal, tal entidade “afirma expressamente e comprova documentalmente que as instalações do Bar das Espanholas e a respectiva esplanada integram o domínio público rodoviário nacional”. Ora, sobre tal conclusão de recurso, dizemos que não é de molde a colocar em crise a sentença recorrida, porquanto, ao aduzir aos argumentos de como essa Contrainteressada Infraestruturas de Portugal, S.A. se havia defendido na competente acção principal, a Recorrente o que vem fazer é lançar uma questão nova em sede recursiva, por assim não a ter colocado nesses contornos à análise da 1.ª instância (tanto mais que, como afirmámos, quem demandou como contrainteressado neste processo foi o IMT - já absolvido da instância cautelar - e não a Infraestruturas de Portugal, S.A.), e, como tal, era inexigível a sua sindicância pelo Tribunal a quo, sendo igualmente ineficaz como motivo recursivo para pôr em causa a decisão “sub judice”. Isto é, ainda que a Recorrente, no sentido de comprovar a sua tese, remeta na sua conclusão 21.ª para documentação (uma suposta planta), alegadamente apresentada com a contestação da Infraestruturas de Portugal, S.A. e aparentemente comprovativa da inserção da parcela do “Bar Central” no domínio público rodoviário, tal prova documental, contudo, não foi indexada ao requerimento inicial, ou seja, se relevante, não pôde ser levada, em tempo, à instrução do processo cautelar e, como tal, também não pôde ser considerada pela sentença recorrida. Daí que, somente aduzido em conclusões de recurso tal argumento, nenhum efeito invalidante tem para a sentença recorrida. A sentença recorrida, no sentido de retirar a ilação factual-jurídica de que a parcela do “Bar “Central” estava integrada no domínio público marítimo, afirmou o seguinte entendimento: “Com a publicação do Decreto-Lei n.º 309/93, de 2 de setembro, diploma que veio prever e regular a elaboração dos planos de ordenamento da orla costeira, designados por POOC, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 218/94, de 20 de agosto, foi alterado o regime dos direitos de uso privativo das instalações de apoio à fruição pública das praias, conforme resulta do disposto no artigo 11.º, onde se diz o seguinte: “1 - É de utilidade pública o uso privativo destinado à instalação de serviços de apoio à fruição pública das praias que exija a realização de investimentos em instalações fixas ou indesmontáveis. (…) 5 - Os restantes direitos de uso privativo são atribuídos mediante licença ou concessão pela DRARN respectiva ou, no caso das Regiões Autónomas, pela capitania do porto, nos termos da legislação em vigor.”. Em consequência da citada alteração do regime legal, pelo menos desde 1995 que o “restaurante/bar das Espanholas” se considera integrado no domínio público marítimo, facto que a Requerente tinha conhecimento, como decorre do teor do ofício que lhe foi remetido pela Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo, do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, em resposta ao pedido que apresentou de autorização para a utilização desse domínio - (cfr. alínea M) do probatório). Em 19 de outubro de 1998 foi aprovado o Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Cidadela – São Julião da Barra, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 123/98, onde se inclui a praia da Parede, no qual se encontra previsto, na Planta 1.7 – referente à Praia das Avencas e Parede, sob o n.º P40, um serviço de snack-bar, esplanada e concessão de toldos, a que corresponde à localização do estabelecimento explorado pela Requerente.” Ora bem, a Recorrente critica a sentença recorrida neste conspecto por, alegadamente, ter justificado que decorria do artigo 11.º do DL n.º 309/93, de 02/09, que os equipamentos/apoio de praia integravam automaticamente o domínio público marítimo (cf. conclusões de recurso 46.ª a 48.ª), mais dizendo que este diploma legal não contém qualquer norma especial que habilite os POOÑ a procederem à integração desses equipamentos e apoios no domínio público marítimo ou que habilitem a procederem à delimitação do domínio público marítimo, concluindo que não decorre dos respectivos planos para a Praia da Parede qualquer integração no domínio público marítimo do edifício situado por debaixo da Estrada Marginal onde se localizam as instalações do “Bar das Espanholas” (ou “Bar Central”), razão pela qual tais planos não têm o condão de publicitar o carácter dominial desse edifício. E aqui a Recorrente até tem razão. Do citado comando legal e do Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Cidadela – São Julião da Barra, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 123/98, não dimana expressamente que a concreta parcela onde se encontra o “Bar Central” integra o “domínio público marítimo” ou que tais normas regulamentares disciplinem de modo preciso sobre o domínio dessa parcela/edifício. Mas isto não significa que o Recorrente tivesse logrado provar o aspecto fundamental, ou seja, ainda que em termos meramente perfunctórios, e tendo presente a tese que afincadamente propugnou no requerimento inicial e nas conclusões de recurso, cabia-lhe não só alegar, mas também provar, ainda que sumariamente (frisa-se), que a referida parcela do “Bar Central” se encontrava inclusa, indubitavelmente, no domínio público rodoviário, ilação essa que, a ser demonstrada (que não foi), consubstanciaria, ao fim e ao cabo, o cerne do vício de violação de lei que, no essencial, assacou contra o acto suspendendo, mas que, todavia, não logramos retirar do probatório da sentença recorrida, não impugnado, como vimos, de acordo com o ónus que impende à Recorrente por conta do citado artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC. Aliás, de forma acrescida, cabe ainda mencionar quais os fundamentos de direito convocados efectivamente pelo próprio acto suspendendo, no seu ponto 1., que têm por alicerce o seguinte cenário legal: “3.º, n.º 2 e 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei 468/71, de 5 de novembro, vigente à data da desafetação, bem como dos vigentes artigos 3.º, e), 4.º e 11, n.º 2 do Decreto-Lei 54/2005, de 15 de novembro” (sublinhados nossos). Vale a pena, em acrescento do que atrás afirmámos, escalpelizar os comandos legais acabados de sublinhar, que, na verdade, são a sustentação do do acto suspendendo. O artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, que vigorava no momento da desafectação do prédio e que regulava sobre o regime jurídico dos terrenos do domínio público hídrico, dispunha o seguinte: “A margem das águas do mar, bem como a das águas navegáveis ou flutuáveis sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas ou portuárias, tem a largura de 50 m”. O artigo 5.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, por seu turno, estipulava o seguinte: “Consideram-se do domínio público do Estado os leitos e margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis, sempre que tais leitos e margens lhe pertençam, e bem assim os leitos e margens das águas não navegáveis nem flutuáveis que atravessem terrenos públicos do Estado.” Os artigos 3.º, alínea e), 4.º e 11.º, n.º 2, da Lei 54/2005, de 15 de Novembro (Lei e não Decreto-Lei, como consta do acto suspendendo, situação que se atribui a simples erro de escrita), que estabelece a titularidade dos recursos hídricos, por sua vez, ditam, respectivamente, o seguinte: “O domínio público marítimo compreende: (…) e) As margens das águas costeiras e das águas interiores sujeitas à influência das marés.”; “O domínio público marítimo pertence ao Estado.”; “A margem das águas do mar, bem como a das águas navegáveis ou flutuáveis sujeitas à jurisdição dos órgãos locais da Direção-Geral da Autoridade Marítima ou das autoridades portuárias, tem a largura de 50 m.”. Ora, tendo presente o cerne do caso vertente e atenta a fundamentação aposta no ponto 1. do acto suspendendo, temos por certo que, no sentido de evidenciar o suposto erro nos seus pressupostos de facto e/ou de direito, competia à Recorrente, atento o ónus da prova que sobre si impende no que concerne à demonstração do pressuposto do “fumus boni iuris” (cf. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil), demonstrar, ainda que de modo sumário, os mínimos indícios de que o prédio onde se encontra instalado o “Bar Central” está fisicamente inserido numa área que extravasa a largura de 50 metros que caracteriza a margem das águas do mar. Ou seja, compulsada a matéria de facto levada ao probatório, contra a qual, em sede de conclusões recursivas, a ora Recorrente não dirigiu qualquer censura segundo o ónus de especificação prescrito pelo artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC, a quem queira impugnar a decisão relativa à matéria de facto, sobretudo, no sentido de alcançar a sua modificabilidade, nos termos preconizados pelo artigo 662.º do CPC, nenhum facto concreto é apontado, segundo as conclusões de recurso, no sentido de podermos concluir, ainda que perfunctoriamente, que o “Bar Central” está claramente inserido em área que já extravasa a largura de 50 metros da margem das águas do mar. E era à Recorrente, como aludimos, a quem competia comprovar essa factualidade, ou seja, alegando e comprovando factos que lograssem colocar em crise a perspectiva contrária que havia sido propugnada pelo Município Recorrido no acto suspendendo, que é, como vimos, a de que o prédio, afinal, se insere no “domínio público marítimo” (ou hídrico). Portanto, nada do alegado pela Recorrente em conclusões de recurso demonstra, ainda que de modo sumário, o eventual erro do Município Recorrido, ou seja, atentos os comandos legais supra citados, como dissemos, a Recorrente não logra provar que o prédio em causa se inseria numa porção de terreno para além da largura dos 50 metros que caracteriza a margem das águas do mar. E ainda que a Recorrente tivesse convocado o já esgrimido argumento de que o prédio onde se instala o “Bar Central” se situa debaixo da Estrada Marginal (EN 6), para assim justificar a sua tese de que estaria em causa o “domínio público rodoviário”, o certo é que, para além de não lhe competir salvaguardar tal domínio e de não ter feito surgir pelo lado passivo da lide cautelar quem a tal interesse eventualmente competiria defender, compulsado o probatório incluso na sentença recorrida (não impugnado, como vimos, de acordo com o artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC), nenhum dos factos provados é de molde a podermos retirar de forma razoavelmente segura e logo nesta sede cautelar essa mesma ilação factual-jurídica, ou seja, de que o prédio pertence, em exclusivo, ao alegado “domínio público rodoviário” e não ao “domínio público marítimo/hídrico”. Ademais, pode até dar-se o caso de existir uma confluência ou sobreposição dos dois domínios, isto é, da Estrada Marginal (e o seu subsolo), ainda que integrante do domínio público geral do Estado como “estrada nacional” (cf. artigo 4.º, alínea h), do DL n.º 477/80, de 15/10), se encontrar construída e inclusa na “faixa de terreno contígua à linha que limita o leito das águas”, na largura dos 50 metros a que diz respeito a margem das águas do mar, situação essa que, ainda assim, face à inexistência de outros factos provados na sentença recorrida que a tal questão permitisse esclarecer logo nesta sede cautelar, não nos habilita a concluir de modo inabalável que a parcela de implantação do “Bar Central” está definitivamente afastada do específico domínio público hídrico. Aliás, neste conspecto, não é despiciendo o entendimento formulado pelo Município de Cascais a propósito do artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei nº 468/71, de 5 de Novembro, e do artigo 11.º, n.º 2, da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, que, ao disciplinarem, respectivamente, sobre a margem das águas do mar e, depois, sobre o domínio público marítimo, constituem elas próprias normas legais que sucederam a outros regimes ainda mais antigos e que regeram sobre a mesma matéria, conforme decorre do preâmbulo Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, em que é aflorada a antiguidade desses regimes transactos, ao referir que “grande parte das disposições até agora vigentes datavam de 1892, ano em que foi publicado o Regulamento dos Serviços Hidráulicos, que regulou o assunto segundo as concepções da época, e vários outros preceitos agora substituídos, embora mais recentes, vinham já dos regulamentos marítimos de 1919 ou das reformas de 1926” (destaques nossos). Admite-se, portanto, face à análise sempre perfunctória que caracteriza o processo cautelar, ser plausível que o regime legal sobre as margens das águas do mar e sobre o domínio público hídrico, datando já de tempos mais remotos, não foi colocado em crise pela legislação rodoviária posterior, nomeadamente, pela inclusão das estradas e, em concreto, do subsolo das estradas, no domínio público do Estado, pois que, não só tal inserção resultou de legislação posterior, no caso, o artigo 4.º, alínea h), do Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de Outubro, e o artigo 28.º da Lei n.º 34/2015 de 27 de Abril, tal como não se consente que o seu objectivo (o da legislação rodoviária) tivesse sido o de conflituar, alterando ou revogando, a legislação sobre o domínio público marítimo e o que ela rege sobre as margens das águas do mar e a sua faixa de protecção. Ademais, a existirem as dúvidas que a Recorrente meramente alegou quanto à dominialidade do prédio, não comprovou que alguma vez tivesse existido sequer o procedimento administrativo de delimitação preconizado quer no artigo 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, quer no artigo 17.º, n.º 1, Lei 54/2005, de 15 de Novembro, que, respectivamente, assim regia o primeiro e ainda estipula o segundo: “1. A delimitação dos leitos e margens dominiais confinantes com terrenos de outra natureza compete ao Estado, que a ela procederá oficiosamente, quando necessário, ou a requerimento dos interessados.” (…) “1 - A delimitação do domínio público hídrico é o procedimento administrativo pelo qual são fixados os limites dos leitos e das margens dominiais confinantes com terrenos de outra natureza.” Em suma, como atrás repetidamente dito, nenhum facto consta do probatório que nos mostre, ainda que indiciariamente, que o prédio em causa (o que se refere à instalação do “Bar Central”) está inserido no “domínio público rodoviário”, e afastado, inexoravelmente, do “domínio público hídrico”, porquanto, como referido, a Recorrente não demonstrou tal asserção. E assim concluímos que a Recorrente, nesta sede cautelar, não logrou evidenciar o apontado vício de incompetência. Aliás, isto impele-nos a dizer que o juízo definitivo sobre tal questão fica, então, reservado para o processo principal, pois que, do que nos é possível vislumbrar nesta fase, a mesma exigirá uma instrução adensada que não se compadece com os juízos sumários e provisórios que são típicos do processo cautelar. Ademais, tendo presente o que foi determinado nos pontos 3. e 4. do acto suspendendo, o importante era que a ora Recorrente, ainda que de modo perfunctório, tivesse conseguido demonstrar o erro nos pressupostos de facto ou/e de direito do acto suspendendo, sobretudo, de que, para tal estabelecimento, diversamente do entendimento propugnado pelo Recorrido Município de Cascais, era detentora de um título que especificamente a permitisse ocupar o referido domínio, assim como, de um título ainda válido para a ocupação do domínio público marítimo relativo à parcela ocupada pela esplanada com a área de 58m2. Analisemos a questão da falta de título para os dois espaços de modo separado. No que concerne à parcela ocupada pelo “Bar Central”, a Recorrente, visto o alegado, designadamente, na conclusão de recurso 34.ª, convoca o Alvará n.º 2204. Acontece que o predito Alvará, referido na alínea B) do probatório e comprovado por intermédio do documento n.º 9 junto com o requerimento inicial, não mais consubstancia do que um Alvará sanitário, que visou conceder uma “licença de exploração de um estabelecimento de BAR, classificado em “ESTABELECIMENTO DE BEBIDAS DE 3.ª”, situado nas instalações de banhos da Praia Central da Parede…nos termos da Portaria n.º 6065”. Trata-se de um Alvará emitido ao abrigo da Portaria n.º 6065, de 11/04/1929, que aprovou “novas instruções para o licenciamento dos estabelecimentos insalubres, incómodos e perigosos e para o licenciamento sanitário de casas de espectáculo e lugares de reunião, de hotéis e hospedarias, de restaurantes, cafés, tabernas e estabelecimentos similares”. Portanto, como facilmente se depreende, do Alvará sanitário n.º 2204 não se pode inferir que a ora Recorrente fosse portadora de uma autorização, licença ou concessão especificamente emitida no sentido de lhe permitir a ocupação de qualquer parcela do domínio público marítimo/hídrico. Aliás, neste conspecto, a sentença recorrida não errou, pois na sua página 25 faz referência a tal título, precisamente, como o Alvará sanitário, ao referir o seguinte: “Em 20 de julho de 1986, a Câmara Municipal de Cascais emitiu alvará sanitário com n.º 2204 referente ao restaurante/bar e balneários, com fundamento na Portaria 6065, de 1929 (cfr. alínea B) do probatório)” – (facto não impugnado de acordo com o artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC). Daí que, o DL n.º 226-A/2007, de 31/05, que estabeleceu o regime da utilização dos recursos hídricos, prescreva no seu artigo 1.º que só “a autorização, a licença ou a concessão constituem títulos de utilização dos recursos hídricos”, e que, conforme preceitua o seu artigo 2.º, “Se for abusivamente ocupada qualquer parcela do domínio público hídrico, ou nela se executarem indevidamente quaisquer obras, a autoridade competente intimará o infractor a desocupá-la ou a demolir as obras feitas, fixando para o efeito um prazo.”. Importa agora saber se a ora Recorrente logrou demonstrar se, face ao probatório fixado na sentença recorrida, ainda possuía um título ainda válido para a ocupação do domínio público marítimo relativo à parcela ocupada pela esplanada com a área de 58m2, isto, claro está, por referência à data da prolação do acto suspendendo - 28/02/2023 - (“tempus regit actum”). Nesta vertente, disse a Recorrente na conclusão de recurso 55.ª que “No que concerne ao ponto 4. da deliberação em crise, relativo à parcela ocupada pela esplanada, porque a licença n.º 261, emitida pelo prazo de um ano a contar da data da sua emissão em 15 de Junho de 1999, cfr. al. U) do probatório, e sucessivamente prorrogada até 2022, tinha o seu termo em 15 de Junho de 2023, pelo que estava ainda vigente na data em que foi tomada a deliberação suspendenda, notificada à ora recorrente em 13 de Março de 2023.” – (destaques nossos). Acontece que, apesar do alegado na referida conclusão de recurso, a Recorrente, para além da indicação da alínea U) do probatório fixado na sentença recorrida (frisa-se, de novo, não impugnado pela Recorrente de acordo com o ónus de especificação imposto pelo artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC), não indicou qualquer outro facto que aponte inequivocamente no sentido de que a licença n.º 261 ainda estaria em vigor em 15/06/2023. E, compulsado o teor do facto levado à alínea U) do probatório, tal ilação factual do mesmo não se extrai. Aliás, nem a alegação da Recorrente se mostra coerente com os factos inscritos nas alíneas HH) e II) do probatório, assentes que foram nos documentos sob os n.ºs 79 e 80 juntos com o requerimento inicial, respectivamente, que claramente demonstram que os pagamentos das taxas de recursos hídricos para a ocupação dos 58m2 da esplanada foram relativos a taxas que são cobradas anualmente e indexadas, no caso concreto, tão-só aos anos de 2020, 2021 e 2022, inexistindo qualquer comprovativo que se refira ao ano de 2023. E, neste sentido, bem julgou a sentença recorrida, ao dizer, na sua página 32, que: “A Requerente invoca a que a licença de exploração do restaurante e da esplanada n.º 261 se mantém atualmente em vigor, não tendo ocorrido a caducidade da mesma. A referida licença n.º 261 foi emitida em 1996 e depois renovada em 13 de março de 1997, em 5 de março de 1998, em 15 de junho de 1999 e em 21 de setembro de 2000…- cfr. alíneas Q), S), T), U), V), X), Y), AA), BB) e HH) do probatório. (…) Efetivamente, como acima se disse, o que sucedeu foi que a Requerente ao longo dos anos de 2000 e seguintes assinou termos de responsabilidade que significaram apenas que tomou completo conhecimento das condições em que a licença n.º 261 foi emitida, com as quais se conformou e se obrigou integralmente a cumpri-las, sendo certo que exatamente uma das condições que dela constavam era o prazo de validade de um ano, e que a Administração pretendeu renovar nos anos posteriores, até 2022.” Bem se vê o acerto da sentença recorrida, pois, de novo, sem qualquer impugnação da decisão relativa à matéria de facto (cf. artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) a c), do CPC), a Recorrente acaba por não provar qualquer prorrogação da licença (anual) n.º 261 para além do ano de 2022, ou seja, claudicando por completo a conclusão recursiva que pugnava pela validade de tal licença no momento da prolação do acto suspendendo (13/03/2023). Por outro lado, arguiu a Recorrente nas conclusões recursivas 51.ª e 52.ª que existem três licenças, censurando a sentença recorrida por dizer que se deparavam apenas duas licenças. Veja-se o que disse a sentença recorrida: “Por sua vez, também não pode proceder o alegado pela Requerente quanto à existência de três licenças, pois existem apenas duas licenças: (i) uma para ocupação do domínio publico marítimo, onde se incluiu a construção edificada (o restaurante/bar e os balneários), que tem como finalidade específica a prestação de serviços de apoio de praia e, como acima se disse, nessa perspetiva a utilização desses espaços é instrumental em relação à licença de ocupação do domínio público marítimo, emitida para a esplanada; (ii) uma segunda licença emitida para instalação de toldos, desde 1990 – cfr. alíneas K), P), R), U), W) e CC) do probatório.” (destaques nossos) E, de novo, decidiu com acerto a sentença recorrida, porquanto, não impugnando a decisão relativa à matéria de facto, a Recorrente também não logra identificar de modo preciso que 3.ª licença seria essa, tratando-se, pois, de uma mera conclusão recursiva não concretizada factualmente, já que, como apontado na decisão recorrida, vislumbra-se apenas o Alvará sanitário n.º 2204 (para o “Bar Central”) e a licença n.º 261 (para a esplanada com 58m2), esta última, que foi sendo renovada anualmente até 2022. Nenhum erro de julgamento se pode assinalar à sentença recorrida por ter considerado a existência de duas licenças e não de três. Avançando, a Recorrente vem pugnar pela atribuição de efeitos jurídicos à situação de facto que decorreu do acto declarado nulo pela decisão ora suspendenda, apoiando-se no artigo 162.º, n.º 3, do CPA, ao que afirma, em resumo, que sempre actuou com a “convicção de que o edifício onde se localiza o estabelecimento do “Bar Central” pertencia ao domínio privado do Município de Cascais, conforme consta do registo predial "por desafectação do domínio público e integração no privado", pretendendo a manutenção dos direitos conferidos pela licença de exploração do prédio onde está instalado o mencionado bar, titulada pelo alvará n.° 2204, e a condenação do referido Município a reconhecer esse direito de exploração, conforme peticionado na acção principal”. Vejamos o que ajuizou a sentença recorrida. “A Requerente alega que a declaração de nulidade constante do ponto 1 deliberação tem de ter efeitos putativos porque agiu sempre de acordo com o princípio da boa-fé, considerando que a sua licença se mantinha em vigor. Nos termos e para os efeitos do n.º 3 do artigo 162.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), está possibilitada a atribuição de efeitos jurídicos a situações decorrentes de atos nulos de harmonia com os princípios da boa-fé, da proteção da confiança e da proporcionalidade, designadamente, quando associados ao decurso do tempo. Com efeito, o atual regime legal admite a possibilidade de atribuição de certos efeitos jurídicos a situações de facto decorrentes de atos nulos, por força, designadamente do simples decurso do tempo, de modo a assegurar a estabilidade das relações jurídico-sociais, tendo em consideração os princípios gerais de direito, designadamente, do princípio da boa-fé. Dispõe o n.º 1 do artigo 266º da Constituição da República Portuguesa o seguinte: “A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.”. A norma transcrita consagra o princípio da boa-fé. O mesmo princípio encontra-se igualmente previsto no artigo 10.º do CPA, onde se diz que: “1 - No exercício da atividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa-fé. 2 - No cumprimento do disposto no número anterior, devem ponderar-se os valores fundamentais do Direito relevantes em face das situações consideradas, e, em especial, a confiança suscitada na contraparte pela atuação em causa e o objetivo a alcançar com a atuação empreendida.”. De acordo com a norma transcrita o princípio da boa-fé é concretizado pelo princípio da tutela da confiança. A tutela da confiança pressupõe a verificação cumulativa de diversas circunstâncias, nomeadamente, uma atuação de um sujeito de direito que crie a confiança na manutenção de uma situação jurídica existente, uma situação de confiança justificada do destinatário na atuação da Administração, a efetivação de um investimento de confiança e, por último a existência de um nexode causalidade entre a atuação geradora de confiança e a frustração da confiança por parte do sujeito jurídico que a criou. Na situação dos autos, em 1996 foi atribuída pela Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério do Ambiente à Requerente uma licença de ocupação do domínio público marítimo, com o n.º 261 (cfr. alínea P) do probatório). Mais recentemente foi-lhe atribuída pela Entidade requerida uma licença com idêntico teor (cfr. alíneas EE) e FF) do probatório). Sucede que essa licença foi sendo renovada desde 1996 até 2022, como resulta dos termos de responsabilidade assinados, da licença emitida em 1999, das guias de pagamento de taxa de utilização do domínio público hídrico emitidas pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo e das notificação para pagamento da referida taxa emitidas pela Administração da Região de Hidrográfica do Tejo, IP, para os anos de 2014, 2016 e 2018, das emitidas pela APA (cfr. alíneas Q), S), T), V), X), U), Y), AA), BB), DD) e HH) do probatório). Diz-se nas condições gerais dessa licença (n.º 261) renovada em 13 de março de 1997, em 5 de março de 1998 e em 21 de setembro de 2000, o seguinte: “1- A presente licença é válida por um ano a contar da data da sua emissão.” – cfr. alíneas P), R), U) e W) do probatório. Assim, o ponto 1 das condições gerais visa precisamente conferir um carácter precário e transitório da licença, mediante a fixação de um termo certo, que no caso é de um ano. Os subsequentes termos de responsabilidade assinados pelos representantes da Requerente são apenas revalidações anuais daquela licença, não lhe conferindo qualquer direito para além do período tempo em que vigorariam. A Requerente sabia que, pelo menos desde 1995, o apoio de praia que explora estava inserido no domínio público marítimo, pois isso mesmo consta da licença n.º 261, a qual foi emitida a seu pedido, conforme resulta do teor do ofício n.º 31.014/DPS, emitido pela Direção Regional de Lisboa e Vale do Tejo, do Ministério do Ambiente (cfr. alínea M) do probatório). O facto de durante 30 anos lhe ter sido revalidada uma licença emitida em 1995 e no ano de 2023 a Entidade requerida ter entendido que a mesma não iria ser renovada, não viola o princípio da boa-fé, pois a Requerente tinha conhecimento do prazo de validade da mesma. Deste modo, atento o exposto, tem de improceder a alegada atuação de boa-fé da Requerente e dos efeitos putativos invocados.” (sublinhado nosso). Pois bem, do acima exposto, verifica-se que a sentença recorrida, a propósito da presente temática (n.º 3 do artigo 162.º do CPA) e tendo presente a licença n.º 261, ou seja, a que diz respeito à esplanada com 58m2, não julgou de modo errado, posto que, novamente, não tendo a Recorrente impugnado a decisão relativa à matéria de facto, temos de assentir, como bem afirmou a sentença recorrida, que a ora Recorrente não podia ignorar que, desde 1996, fora-lhe atribuída pela Direcção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério do Ambiente uma “licença de ocupação do domínio público marítimo”, a tal com o n.º 261 (cfr. alíneas Q), S), T), V), X), U), Y), AA), BB), DD) e HH) do probatório), daqui que, não há como não concluir, como fez a 1.ª instância, que, pelo menos, desde 1996 (e não 1995, como admitiu a sentença recorrida, mas cuja diferença de 1 ano é irrelevante para o caso), o apoio de praia explorado pela Recorrente estava indiciariamente (pelo menos, para o efeito da sumariedade deste processo cautelar) inserido no domínio público marítimo, isso mesmo constando da licença n.º 261, a qual fora emitida a seu pedido (da Recorrente), conforme resulta do teor do ofício n.º 31.014/DPS, emitido pela Direcção Regional de Lisboa e Vale do Tejo, do Ministério do Ambiente (cfr. alínea M) do probatório). Por isso, mão se mostra errada a ilação factual-jurídica da sentença recorrida ao dizer que, desde, pelo menos, 199[6] (e não 1995), a Recorrente não podia ignorar que a tal licença n.º 261 tinha por finalidade a ocupação do “domínio público hídrico/marítimo”. Sobre a mesma temática (n.º 3 do artigo 162.º do CPA), e tendo presente as conclusões de recurso, entendemos que a tese da Recorrente não pode proceder, atentos os seguintes argumentos: O primeiro, é que o alvará n.º 2204, como alvará sanitário em que se consubstancia, não confere à ora Recorrente outra prerrogativa que não seja a de apenas garantir que, no momento em que foi emitido, o estabelecimento cumpria as condições higiénico-sanitárias então vigentes, do mesmo não se podendo extrapolar que também tivesse garantido à ora Recorrente um título suficiente para a ocupação/exploração de uma parcela do domínio público marítimo/hídrico; O segundo, é que o acto suspendendo não atingiu a emissão desse mesmo alvará, pois, como vimos, o que visou foi declarar a nulidade de um acto antecedente de desafectação de uma parcela; O terceiro, é que do teor do alvará sanitário n.º 2204 não dimana que a parcela ocupada pelo “Bar Central” é pertença do domínio privado ou do domínio público; O quarto, é que a Recorrente não pode obter em processo cautelar, atenta a sua provisoriedade e instrumentalidade que a este caracterizam, a tutela definitiva que consistiria na procedência do pedido de condenação do reconhecimento do direito de exploração do estabelecimento; O quinto, e último, é que, nos termos do artigo 162.º, n.º 3, do CPA, ainda que se reconheça a relevância do decurso do tempo no caso vertente e a sua influência na eventual protecção da confiança que a ora Recorrente pudesse ter criado de que tal parcela era pertença do domínio privado do Município de Cascais, até porque assim se encontrava registada na competente Conservatória do Registo Predial (cf. alínea H) do probatório), ao que acresce que, desde a decidida desafectação até à prolação do acto suspendendo, haviam decorrido mais de trinta anos (cf. alíneas H) e JJ) do probatório), importa ter presente, contudo, que ao acto suspendendo subjazem interesses de ordem pública, que visam, sobretudo, a salvaguarda do domínio público marítimo/hídrico, nomeadamente, no que tange à utilização que pode, ou não, ser dada à faixa costeira correspondente às margens das águas do mar. É por isto que, ainda que perfunctoriamente, não vemos que seja provável a procedência da pretensão anulatória por conta da salvaguarda dos clamados “efeitos putativos” preconizados no n.º 3 do artigo 162.º do CPA, porquanto, aqui perspectiva-se que a posição individual da ora Recorrente deva ceder ante razões superiores de protecção e salvaguarda do domínio público marítimo/hídrico e com o que isso implica na preservação de interesses públicos, como sejam, os paisagísticos, ambientais ou geofísicos. Neste conspecto, em questão com algum paralelismo, citamos o acórdão deste TCAS, de 13/07/2023, proferido no processo sob o n.º 934/13.2BELLE, consultável em www.dgsi.pt, do qual destacamos o seguinte excerto: “Igualmente se escreveu no Acórdão do STA proferido no processo 014/12.8BELLE de 08/10/2018, que "o certo é que no âmbito do licenciamento urbanístico, não há, por regra, lugar ao reconhecimento da relevância jurídica de situações de facto, criadas e duradouramente mantidas com base em atos nulos, sendo que os efeitos putativos têm sido tradicionalmente reconhecidos na jurisprudência, em especial, nas relações laborais entre a administração e os seus funcionários. Mas, em matéria de urbanismo, como é sabido, os interesses de ordem pública prevalecem sobre as expectativas individuais, podendo o "jus aedifícandi", ceder por razões relacionadas com a proteção de integridade geofísica, ambiental ou paisagística da zona em questão (cfr. Acs. TCA-Sul de 27.09.2013 e de 08/05/2014, proferido no processo 10124/13, bem como Fernando Alves Correia, "Manual de Direito do Urbanismo", Almedina, Vol. III, p.172 e ss).” Acresce dizer que não se pode perder de vista que, no caso vertente, está em causa, também, um apoio de praia que é explorado pela ora Recorrente, não se vislumbrando que esse apoio se possa alicerçar apenas com o recurso à mera esplanada com 58m2, o que nos impele a considerar que tal estrutura só se completa e torna operacional com a sua interligação à parcela que é ocupada pelo “Bar Central”. E assim o consideramos, pois que, das alíneas B) e C) do probatório fixado na sentença recorrida, a propósito do alvará n.º 2204, emitido, precisamente, para o estabelecimento a que corresponde o “Bar Central”, consta que tal estabelecimento está “situado nas instalações de banhos da Praia Central da Parede” e que o mesmo dispõe ainda de “balneários e arrecadação anexos ao mencionado bar”. Ora, isso entronca com o decidido nos pontos 5. e 6. do despacho suspendendo, mormente, no aspecto em que, tratando-se de um conjunto que funciona como apoio de praia, não pode o mesmo escapar ao entendimento de que, “atento o vertido conjugadamente nos artigos 23.º, n.º 1, alínea e), e 24.º do DL n.º 226-A/2007, de 31/05, a instalação de apoios de praia nos terrenos de domínio público hídrico é atribuída, por regra, através de um precedente procedimento concursal, ao que se segue o contrato de concessão de utilização privativa dos recursos hídricos do domínio público.”, conforme o enunciado no ponto IV do sumário e respectiva posição já sufragada por este mesmo TCAS nos acórdãos de 10/04/2025, tirados nos processos sob os n.ºs 588/23.8BEALM e 877/23.1BEALM (destaques nossos), consultáveis em www.dgsi.pt. Isto é, face à legislação vigente no momento da prolação do acto impugnado, e não tendo a Recorrente demonstrado estar na posse de qualquer título válido para a utilização do domínio público hídrico/marítimo, ainda que perfunctoriamente, não se mostra ostensivamente ilegal tal acto na estrita medida em que, na falta desse título, considerou a ocupação abusiva, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do DL n.º 226-A/2007, de 31/05, submetendo a utilização desse domínio público hídrico a concessão e ao competente procedimento concursal, conforme exigem os já citados artigos 23.º, n.º 1, alínea e), e 24.º, n.º 1, do mesmo diploma legal. Portanto, é de concluir que, vista a matéria de facto provada e as conclusões de recurso, ainda que, com diferente fundamentação face à vertida na sentença recorrida, a Recorrente não logrou demonstrar o pressuposto cumulativo do “fumus boni iuris”, ou seja, de que seja provável a procedência da pretensão anulatória do acto suspendendo que venha a formular, ou que já tenha formulado, em sede do respectivo processo principal, o que equivale a dizer que, atento o previsto no artigo 120.º, n.º 1, do CPTA, não é de adoptar a medida cautelar requerida, conforme decidiu a 1.ª instância. Tudo visto, é de negar provimento ao presente recurso e, como tal, com a presente fundamentação, é de confirmar, ainda assim, a sentença recorrida. *** Custas a cargo da Recorrente – cf. artigos 527.º, n.º 1, do CPC, 1.º e 189.º do CPTA, 7.º, n.º 2, e 12.º, n.º 2, do RCP. *** Em conclusão, é elaborado sumário, nos termos e para os efeitos do estipulado no artigo 663.º, n.º 7, do CPC, aplicável “ex vi” do artigo 140.º, n.º 3, do CPTA, nos seguintes moldes:Atento o vertido conjugadamente nos artigos 23.º, n.º 1, alínea e), e 24.º do DL n.º 226-A/2007, de 31/05, a instalação de apoios de praia nos terrenos de domínio público hídrico é atribuída, por regra, através de um precedente procedimento concursal, ao que se segue o contrato de concessão de utilização privativa dos recursos hídricos do domínio público. *** V - Decisão.Ante o exposto, acordam, em conferência, os Juízes-Desembargadores que compõem a Subsecção Administrativa Comum da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, com a presente fundamentação, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida. Custas a cargo da Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 03 de Julho de 2025. Marcelo Mendonça – (Relator) Não acompanho a fundamentação do Acórdão quanto aos seguintes pontos. Joana Costa e Nora – (1.ª Adjunta) Ricardo Ferreira Leite – (2.º Adjunto) Declaração de voto Em primeiro lugar, tendo a requerente invocado que o acto suspendendo padece do vício de incompetência por estar em causa domínio público rodoviário e o mesmo ter sido praticado por órgão do Município, sem que este detenha competências relativamente a bens daquele domínio, não assume qualquer relevância para a apreciação do recurso, na parte relativa ao erro de julgamento quanto a tal vício, que seja parte no processo quem "defenda" o domínio público rodoviário, como se refere no Acórdão. Em segundo lugar, referindo a recorrente na sua alegação de recurso que a contrainteressada na acção principal afirmou e comprovou documentalmente que as instalações do Bar das Espanholas e a respectiva esplanada integram o domínio público rodoviário nacional, estando o Município de Cascais a exercer poderes sobre bem que não integra o seu património, não está, desse modo, a colocar qualquer questão (muito menos, qualquer questão nova, como se refere no Acórdão), limitando-se a invocar um argumento para reforçar a sua tese de que está em causa domínio público rodoviário. Por fim, diferentemente do que resulta do Acórdão, entendo que a requerente alegou factos para concluir que o prédio em causa se integra em domínio público rodoviário, a saber: que o prédio se situa debaixo da Estrada Marginal (EN6), e que faz parte da rede rodoviária nacional nos termos do Plano Rodoviário Nacional (PNR 2000). O que sucede é que tais factos não resultam provados na sentença, sem que a matéria de facto tenha sido impugnada, o que basta para que não se possa concluir pela pretendida integração. Joana Costa e Nora |