Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:513/10.6BEALM
Secção:CA
Data do Acordão:06/06/2024
Relator:ELIANA CRISTINA DE ALMEIDA PINTO
Descritores:ARTIGO 175.º DO CPA DE 1991
ARTIGOS 64.º E 65.º DO CPTA
O RECURSO HIERÁRQUICO NECESSÁRIO E SEU IMPACTO NA IMPUGNAÇÃO CONTENCIOSO
Sumário:I - Em conformidade com o disposto no artigo 175.º, n.º 3, do CPA, na redação aplicável, decorrido o prazo para a entidade competente conhecer do recurso hierárquico interposto sem que tenha proferido decisão, considera-se o recurso tacitamente indeferido, devendo presumir-se que o superior hierárquico se revê no ato administrativo praticado pelo seu subordinado – ato primário – o qual adquiriu de novo eficácia.
II - O prazo para a decisão do recurso hierárquico é de 30 dias, a contar da remessa do procedimento ao órgão competente para dele conhecer, podendo ser elevado até ao máximo de 90 dias quando haja lugar à realização de nova instrução ou de diligências complementares. Após o decurso dos prazos referidos sem que haja sido tomada uma decisão, o recurso considera-se tacitamente indeferido, conforme dispõe o n.º 3 do preceito transcrito.
III - É admissível, por decorrer dos artigos 64.º e 65.º do CPTA, que, no decurso da ação administrativa de impugnação do ato que fora objeto de recurso hierárquico não decidido, o superior hierárquico do autor do ato impugnado contenciosamente venha ainda, por ato expresso, a decidi-lo, com os efeitos que resultarem para a ação pendente do sentido de tal decisão, com possibilidade de modificação da instância.
IV - Uma vez usado o recurso hierárquico necessário, a via de reação contenciosa a seguir no caso de ela não surtir efeito é, portanto, a mesma que teria sido utilizada, logo desde início, se a lei não impusesse o ónus da prévia impugnação administrativa – e isto, quer a reclamação ou o recurso hierárquico necessário tenham sido objeto de indeferimento expresso, quer não tenham merecido resposta da parte do órgão competente para os decidir dentro do prazo legal de decisão.
V - Não haverá, em caso algum, lugar, neste contexto, à dedução de um pedido de condenação à prática de um ato administrativo, com fundamento no facto de a impugnação administrativa ter sido indeferida ou não ter merecido resposta da parte do órgão competente para a decidir.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I – RELATÓRIO

O Almirante Chefe do Estado Maior da Armada, devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 30 de maio de 2017, que, no âmbito da ação administrativa especial contra si instaurada por J......., julgou procedente o pedido de anulação do despacho datado de 28/05/2010, que indeferiu o recurso apresentado pelo Autor, “… bem como o ato avaliativo referente ao período de 2007-11-06 a 2008-06-10 devendo, em consequência, ser aplicada por analogia e com as necessárias adaptações a norma prevista no artigo 18º, nº5, alínea f), do Regulamento de Avaliação do Mérito dos Militares do Exército aprovado pela Portaria nº 1246/2002, de 7 de setembro...”.
***
Formula o aqui recorrente, Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada, nas respetivas alegações de recurso, as seguintes conclusões que se reproduzem em seguida:

“...
1) Com a ação interposta o aqui Recorrido pretendia a anulação/declaração de nulidade da avaliação atribuída ao período em esteve em comissão de serviço em Timor, concretamente de 06.11.2007 a 10.06.2008, e a condenação à prática do ato devido, neste caso, decisão sobre recurso hierárquico apresentado relativamente à avaliação.

2) No entanto, o verdadeiro objeto do processo, ou seja, a apreciação de fundo da questão suscitada por este era a legalidade da avaliação extraordinária do Recorrido.

3) Porém, considerando-se o prazo da interposição da ação, e o objeto da mesma, a contagem desse prazo não poderá ser feita nos termos em que o foi verificando-se uma exceção perentória, que não foi corretamente apreciada, concretamente a caducidade do direito de ação.

4) Isto porque, entendeu estar perante uma omissão, nos termos do n.º 1 do artigo 69.º do CPTA, cujo pressuposto levou à conclusão que o prazo de impugnação contenciosa seria de um ano, todavia, o ato avaliativo decorreu de procedimento de 1º grau, de iniciativa oficiosa, sendo evidente que não existiu inércia da Administração na sua prática,

5) Ou seja, foi proferida decisão expressa que consistiu num ato de avaliação de desempenho extraordinária feita pelo Recorrido.

6) Assim, quando estão em causa procedimentos de 2.º grau, decisões sobre atos já praticados, não é possível uma ação especificamente interposta para condenar o órgão que decide da impugnação, à emissão de decisão sobre o recurso hierárquico.

7) No presente caso, existindo um recurso hierárquico necessário, após o decurso do prazo de decisão para o mesmo, abre-se a via contenciosa, devendo contar-se desde essa data o prazo de impugnação judicial do ato de avaliação, conforme previsto no n.º 3 do artigo 175.º CPA e n.º 5 do artigo 105.º do Decreto-Lei n.º 236/99, de 25.06 que aprovou o EMFAR em vigor à data.

8) Afastando-se a aplicação do prazo de um ano do n.º 1 do 69.º do CPTA, previsto efetivamente para os casos de inércia da Administração, mas em procedimentos de primeiro grau conforme supra explicitado.

9) O prazo aplicável é assim, o previsto no n.º 2 do referido artigo 69.º do CPTA, de 3 meses.

10) Logo, tendo a presente ação entrado em juízo em 22.04.2010, decorreram mais de 3 meses, desde a data que era possível recorrer contenciosamente do ato avaliativo, devendo considerar-se procedente a exceção de caducidade de ação.

11) Sobre a alteração da instância, nos termos previstos no artigo 70.º do CPTA, a regularidade da instância claudicou, quando o ato de avaliação do desempenho não foi impugnado tempestivamente.

Nestes termos, pede que o presente recurso ser considerado procedente, e em consequência, anulada a douta sentença recorrida.

…”



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O recorrido, J......., notificado, não apresentou contra-alegações.

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Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

***
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento na apreciação de exceção dilatória de caducidade do direito de ação.

***
III – FUNDAMENTOS

III.1. DE FACTO
Na decisão judicial recorrida foi dada por assente, por provada, a seguinte factualidade que não vem impugnada, pelo que se mantém:

“...
A - Entre 2007-11-06 e 2008-06-10, o A. prestou serviço na República de Timor Leste, como assessor técnico do Projeto n.º 2, Cooperação Técnico-militar com Timor Leste, período em que foi avaliado pelo 1º avaliador CTEN P......., Diretor Técnico (acordo).

B - A avaliação atribuída ao A., no período mencionado em A) e referida a 10 de junho de 2008, foi a seguinte: “…


“(texto integral no original; imagem)”

(cfr. Doc.1, fls. 19 a 21 e Doc. 5, fls. 139 e 140, depoimento testemunhal do Capitão-Tenente P.......)

C - O Juízo ampliativo, em anexo à ficha acima reproduzida, datado de 10 de junho de 2008 e assinado pelo Diretor Técnico do Projeto 2, CTEN P....... é do seguinte teor: “…



“(texto integral no original; imagem)”



cfr. anexo ao Doc,1, fls. 22 a 24 e Doc. 6, fls. 141 a 143 e depoimento testemunhal do Capitão-Tenente P........

D - Em 2009-03-31, o ato de avaliação foi notificado ao A.,

cfr. Doc.1, fls. 19 a 21 e Doc. 5, fls. 139 e 140.

E - Em 2009-04-17 apresentou reclamação da avaliação referente ao período de 2007-11-06 a 2008-06-10, subscrita pelo seu Il. Mandatário, à qual juntou sete documentos,

cfr. Doc. 2 a 9, cfr. fls. 25 a 38 e Doc.7, fls. 144 a 151.

F - Em 2009-05-27 requereu a junção à reclamação de documentos, sendo estes 29,

cfr. Doc. 10 a 38, fls. 39 a 68.

G - O CTEN P....... pronunciou-se, em 2009-07-06, sobre a reclamação apresentada, como se transcreve por extrato:

[...]
2.°
O reclamado na posição de avaliador, ao longo da sua carreira de vinte anos, nunca teve qualquer reclamação às avaliações dadas aos seus subordinados e tem como princípio básico a total isenção; rejeita, assim, categoricamente a acusação de juízo pré-concebido, uma vez que o reclamado não tinha qualquer conhecimento da existência do reclamante antes da sua chegada à missão. A prova de que não existia qualquer juízo resultante de qualquer informação anterior, está na declaração do pedido de prorrogação feito pelo reclamante a 6 de Fevereiro de 2008, em que o reclamado, seu superior hierárquico opinou "Concordo". A objectividade foi cumprida, tendo como pressuposto a necessidade de ser sucinto e directo, de modo a evitar a elaboração de um documento de juízo ampliativo longo.
3.°
Uma das recomendações, que os militares recebem quando vão para uma missão no estrangeiro, é relativa à necessidade de uma atitude correcta, tanto ao nível profissional como social, fora ou dentro das suas horas efectivas de serviço. Todo o período fora de Portugal é considerado como comissão de serviço (Art. 6.° alínea 3, DL 238/96, de 13Dez) pelo que os Directores Técnicos dos Projectos, no cumprimento da sua missão, são responsáveis pelos que lhes estão na dependência hierárquica a tempo inteiro, tendo o reclamado considerado este pressuposto para avaliar algumas das aptidões. Assim, não se compreende quando se diz " ... o 1° Avaliador não se apoia em fados relativos ao desempenho profissional, mas em opinião subjetiva não relacionada com o serviço, ... “:
4.°
Quanto ao desaconselhamento relativo a futuras missões públicas, o reclamado baseia a sua avaliação nas frequentes atitudes inconvenientes, do reclamante no tratamento pessoal na sua vida em sociedade.
Num caso específico, chegou mesmo a existir vontade do Embaixador de Portugal, na altura, de que a sua forma de actuar tivesse outras consequências.
5.º
Os documentos em anexo à reclamação, demonstram um desempenho compatível com a avaliação atribuída, designadamente a aptidão n.º 20. Relativamente aos documentos 6 e 7, considera o reclamado, que o reclamante naturalmente desenvolveu relações de amizade durante a sua comissão que deixaram a possibilidade de serem pedidos documentos a posteriori, com opiniões abonatórias (ver datas de assinaturas). O referido no ponto 17., é um documento elaborado pelo reclamado e assinado pelo referido Comandante, e que se encontra no âmbito do já mencionado neste número.
6.º
Relativamente ao ponto 9., no que diz respeito ao seu desempenho, considera-se, como já referido em 5.°, que o desempenho é compatível com a avaliação atribuída, designadamente a aptidão n.º 20.
7.º
Relativamente ao ponto 11., o reclamado estava efectivamente em gozo de férias superiormente autorizadas, pelo que este assunto nada tem a ver com os factos. Na altura, a responsabilidade de colocar as lanchas do porta-contentores para o cais estava a cargo da empresa contratada cara a reparação: caso esta não cumprisse o determinado, a Componente Naval de Timor-Leste tinha pelo menos dois militares capazes de o fazer (como se constatou nas navegações seguintes), por outro lado faz parte das atribuições dos assessores dar esse tipo de ajuda, de acordo com as competências descritas no Job description para o referido cargo, designadamente o de ter experiência de navegação em lanchas.
8.°
É necessário ter-se atenção, que não estamos a falar, na realidade, de uma navegação, mas sim de uma deslocação das lanchas do porta-contentores para o cais da Base Naval (aproximadamente 3 milhas náuticas). Considera-se que este relato é francamente exagerado uma vez que no referido dia de Janeiro o mar estava calmo, não sendo previsível nenhum fenómeno meteorológico que provoque uma alteração do mar em tão curto espaço de tempo (minutos) e I considerando a distância a percorrer. O mar norte de Timor (a que se refere) durante o período de Novembro a Abril é extremamente calmo, sendo a justificação despropositada. A questão da habilitação para desempenhar tal tarefa é infundada em virtude da experiência do reclamante obtida na Marinha em navios do tipo lancha e das missões por si cumpridas posteriormente, em conjunto com o reclamado.
9.°
Relativamente ao ponto 13., o reclamado não o percebe, julgando que o reclamante se está a referir à situação em que uma ordem não foi cumprida, tendo sido efectuado uma navegação a bordo de uma das lanchas no dia 11 de Fevereiro de 2008, sem autorização do Director Técnico, como infra referido.
10.º
O reclamante jamais fez as acções preconizadas no ponto 14., limitando-se a desculpar o reclamante perante as diversas queixas a si chegadas. Cingindo-se no final da missão, a avaliar de acordo com a sua orientação, sentido de justiça e respeitando as regras do RAM.
11.º
No que se refere ao ponto 16., o episódio mencionado ocorrido a 11 de Fevereiro de 2008, o reclamante recebeu ordens do reclamado para permanecer no seu alojamento devido à situação de perigosidade que se vivia no país e tendo em conta que não se enquadrava no âmbito da missão de Cooperação Técnico-militar. Apesar da ordem não ter sido cumprida, por não ter felizmente ocorrido nenhum incidente, após ter feito uma advertência grave, o reclamado decidiu não proceder contra o reclamante em termos disciplinares. Em aditamento a este ponto, o reclamado julga discutível o mérito da junção ao processo de documentos não assinados pelos referidos signatários.
12.º
No que respeita ainda às alegações que o recorrente faz, relativamente ao ponto 22., importo referir que a avaliação foi efectuada à luz do preconizado no RAM, o qual no n.º 4. a) do artigo 17.º refere que o grau "Com deficiências" significa que "o avaliado atinge minimamente a nível exigível e o seu comportamento é aceitável mas apenas a nível suficiente ou denota falta de experiência ou deficiências menores que podem ser corrigidas"; Neste sentido, este grau é apropriado em algumas das aptidões, face ao comportamento do reclamante.
13.º
As avaliações dadas pelo reclamado, são avaliações feitas dentro do escrupuloso dever de bem servir a Marinha, elaboradas com a máxima honestidade, sentido de justiça e profissionalismo.
14.º
Por tudo o que foi apresentado e analisado no presente documento, considera-se que nenhuma ilegalidade foi cometida, decidindo assim o signatário, perante o recurso apresentado, reiterar na totalidade a sua posição, no que diz respeito à avaliação efectuada ao recorrente, respeitante ao período em causa.” cfr. Doc. 40, fls. 81 a 85, Doc.8, fls. 153 a 157 e depoimento testemunhal do Capitão- Tenente P........

H - Em 2009-07-17, o A. apresentou recurso hierárquico para o Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada, no qual formulou o seguinte pedido:

“…

Termos em que, atentos os fundamentos expostos, deve ser anulada ou considerada nula ou sem efeito, ou modificada a avaliação atribuída, de modo a que tenha se tenha em conta o desempenho de facto do agora recorrente e não a opinião parcial e não fundamentada que lhe foi atribuída, conforme é de inteira justiça”, cfr. Doc. 39, fls. 71 a 80...”.

I - Em 2010-03-25, o CTEN P......., em relação à apreciação do recurso manteve a sua avaliação,


[…]


cfr. fls. 190 e depoimento testemunhal do próprio.

J - Em 2010-04-22, o A. interpôs a presente ação administrativa especial contra o Sr. Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada,

cfr. fls. 2 e ss.

K - Em 2010-05-27, a assessoria jurídica dos serviços da Entidade demandada, elaborou o Parecer nº 3/10, sob o assunto: “Recurso hierárquico interposto pelo 438891 1 SAR MO J.......”, no qual se pode ler:

108. Mas, a esse respeito, sempre se dirá que a expectativa de obter classificações homogéneas ao longo de todo o percurso profissional de um militar só seria possível para aqueles que prestem serviço de forma homogénea, sempre sob as mesmas circunstâncias de modo e lugar.

109. Consequentemente, não podem relevar os documentos juntos pelo Recorrente ao presente recurso que se concretizem a períodos e prestações de serviço em tempo e circunstâncias diversos.

(…)

118. (…) fez ainda juntar o Recorrente declarações de apreço pessoais de entidades que não se configuram como sendo aquelas que detêm competência legal para o avaliar nos termos legais. 119. Sobre o que deve referir-se que a escolha dos avaliadores pelo legislador não é inócua e tem ínsito o espírito de que apenas quem estiver em situação funcional directa de hierarquia superior poderá legitimamente apreciar as aptidões e desempenhos do avaliado.

120. Por, apenas deste modo ser possível distinguir as aptidões e desempenhos de diversos avaliados.

121. Ao mesmo tempo que se pretende distinguir aqueles mesmos parâmetros em momentos diferentes.

122. Para o que apenas se concebe que seja possível fazê-lo através de contacto directo com o avaliado.

123. E na inserção da hierarquia funcional e militar.

124. Por esse motivo, os testemunhos de outros que não aqueles que são competentes para avaliar o Recorrente não podem ser relevados do mesmo modo.

(…)

128. Ora, o avaliador veio declarar expressamente as situações nas quais assenta a sua avaliação.

129. E especificamente referiu os factos que o Recorrente não contestou como sendo: «Frequentemente várias pessoas alertavam o Director Técnico desta sua característica, tendo este sempre contornado as várias situações incómodas, até ao surgimento de uma que levou ao pedido de não prorrogação da sua missão.

[…] Esta cegueira fê-lo perder capacidades de raciocínio levando-o a sair da razão, atacando o Director Técnico, seu superior hierárquico com uma arma branca e que graças à resistência deste e a vários ferimentos na mão direita, o conseguiu dominar e fazer desistir. Processo de Averiguações a ser iniciado proximamente.»,

cfr. fls. 192 a 225.

L - Em 2010-05-28 foi proferido despacho de indeferimento do recurso apresentado pelo A.,

cfr. fls. 180 e fls. 231.

M - Em 2010-06-25, o A. foi notificado do despacho de indeferimento do recurso,

cfr. fls.340.

N - Em 2010-09-08, o A. requereu a modificação objetiva da instância e apresentou petição inicial alterada,

cfr. fls. 227 e seguintes.

O - No questionário de avaliação de qualidades para ingresso nos QP’s consta a seguinte apreciação “Elemento pouco activo e por vezes com temperamento agressivo, contudo cumpre o que lhe é pedido”, datada de 13 de fevereiro de 1993,

cfr. Doc.1, fls. 133.

P - Na avaliação periódica referida a 1 de julho de 2000, o A. foi classificado com “Bom” em todos os itens,

cfr. Doc.15 e 16, fls. 45 e 46.

Q - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2001, o A. foi classificado com “Bom” exceto nos dois itens em que foi classificado com “Muito Bom”, tendo esta classificação sido objeto de juízo ampliativo,

cfr. Doc.19, fls. 49.

R - Na avaliação periódica referida a 1 de julho de 2001, o A. foi classificado com “Bom” em todos os itens,

cfr. Doc.20 e 21, fls. 50 e 51.

S - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2002, o A. foi classificado com “Bom” em todos os itens,

cfr. Doc.22 e 23, fls. 52 e 53.

T - O A. juntou uma menção de apreço, datada de 23 de maio de 2002, relativa ao trabalho desenvolvido, no dia da celebração do 68º aniversário da criação da Escola de Mecânicos,

cfr. Doc.11, fls. 40 e 41.

U - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2003, o A. foi classificado com “com deficiências” em 2 itens, com “Regular” em 12 itens e com “Bom” em 7 itens,

cfr. Doc.3, fls. 136 e 137.

V - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2004, o A. foi classificado com “Bom” exceto nos dois itens em que foi classificado com “Regular”,

cfr. Doc.24 e 25, fls. 54 e 55.

W - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2005, o A. foi classificado com “regular” em 7 itens e “Bom” em 13,

cfr. Doc.26 e 27, fls. 56 e 57.

X - O A. juntou uma declaração de louvor individual, datada de 6 de outubro de 2005, relativa ao serviço desenvolvido na qualidade de Formador,

cfr. Doc.13, fls. 43.

Y - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2006, o A. foi classificado com “regular” em 15 itens e “Bom” em 4,

cfr. Doc.28 e 29, fls. 58 e 59.

Z - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2007, o A. foi classificado com “regular” em 12 itens, “Bom” em 7 e “Muito Bom” em 2,

cfr. Doc.30 e 31, fls. 60 e 61.

AA - Na avaliação de destacamento do avaliado, referida a 20 de agosto de 2007, o A. foi classificado com “Regular” em 9 itens, “Bom” em 9 e “Muito Bom” em 3,

cfr. Doc.32 e 33, fls. 62 e 63.
AB - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2008, consta “não observado” num item, “com deficiências” em 7 itens, “regular” em 13 itens,
cfr. Doc.2, fls. 134 e 135.
AC - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2008, consta “não observado” em todos os itens,
cfr. Doc.34 e 35, fls. 64 e 65.
AD - O A. juntou um diploma de louvor assinado pelo Comandante da Componente Naval Capitão Tenente, H......., da Força de Defesa de Timor-Leste, Componente Naval, datado de 28 de maio de 2008, no qual se pode ler:
“Louvo o 1º Sargento J......., Assessor Técnico da Componente Naval Projecto 2 das F-FDTL, ao longo destes seis meses como Assessoria Técnica pelas suas extraordinárias capacidades técnicas e (…) das suas obrigações aliadas a um elevado sentido de dever e vontade de bem servir.
Assessor altamente (…) e espírito de sacrifício (…)”,
cfr. Doc.7, fls. 36.
AE - O A. juntou um certificado assinado pelo Comandante da Componente Naval Capitão-de-Fragata, H......., das Forças Armadas de Timor-Leste, datado de 10 de junho de 2008, no qual se pode ler:
“Tendo contribuído para o desenvolvimento da Componente Naval das Forças Armadas de Timor-Leste, F-FDTL, certifica-se o altamente apreciado trabalho desenvolvido e o extraordinário êxito alcançado (…)”,
cfr. Doc. 6, fls. 35.
AF - Na avaliação periódica referida a 1 de janeiro de 2009, o A. foi classificado com “Regular” em 8 itens e “Bom” em 12,
cfr. Doc.36 e 37, fls. 666 e 67.
AG - Com referência a 2009-07-16 foi efetuada a avaliação de desempenho do Requerente, tendo-lhe sido atribuídos 9 “Muito Bons” e 9 “Bons", constando da ficha de avaliação individual, por extrato, o seguinte: “…






cfr. Doc. 41, fls. 86 a 87.

AH - O Tenente-Coronel de Infantaria M......., assinou a seguinte declaração a respeito do ora Autor, datada de 13 de abril de 2009: “…


“(texto integral no original; imagem)”
cfr. Doc. 8, fls. 37 e depoimento testemunhal do próprio M..., Tenente Coronel do Exército.
AI - O Tenente-Coronel A........, assinou a seguinte declaração a respeito do ora Autor, datada de 8 de abril de 2009: “…

“(texto integral no original; imagem)”


cfr. Doc.9, fls. 38 e depoimento testemunhal do próprio, A........, Tenente Coronel do Exército;

AJ - Em 2009-07-16, o CMG J.J.........louvou o agora A., nos seguintes termos: “…


“(texto integral no original; imagem)”

cfr. Doc. 38, fls. 68 e 43, fls. 89.
AK - Em 2009-11-02, o Comandante do Navio Almirante Gago Coutinho, através de mensagem dirigida aos seus subordinados, destacou as qualidades de desempenho profissional do Autor, no período em que o mesmo se encontrou embarcado no mesmo navio, de 9 de setembro de 2009 a 31 de outubro de 2009,
cfr. Doc. 42, fls. 88.
AL - Em 2010-02-24 foi proferido despacho de arquivamento pelo Departamento de Investigação e Ação Penal “pelos crimes estritamente militares, nos termos do artº. 277º nº2 do C.P. Penal; ex vi do artº. 107º do CJM, aprovado pela Lei 100/2003, de 15.11”, e no qual pode ler-se: “…
As declarações prestadas pelo Participado, quer no âmbito do Processo de Averiguações (vide fls. 78 a 80), quer como testemunha no presente inquérito (vide fls. 108 a 110), são contraditórias com o teor da Participação de Ocorrência e as declarações prestadas pelo Capitão-tenente P......., quer em sede de Processo de Averiguações (vide fls. 59 a 62), quer no presente inquérito, cfr. fls. 105 a 107.”, cfr. Doc. 10, fls. 165 a 176.
AM - O A. requereu o arquivamento do processo disciplinar correspetivo,
cfr. Doc. 11, fls. 177 e 178.
AN - O Anexo referente à “aplicação do Código de Justiça Militar”, Ordens OA1 43/19-10-05,
Cf. Doc.9, fls. 158 a 163.
AO – O Anexo A com a menção a quatro louvores consta do processo individual do Autor, cfr. fls. 39 dos autos.
AP - Relativamente ao período do seu desempenho em Timor e a que se refere a avaliação reclamada, a missão principal por si recebida em Lisboa consistia em pôr duas lanchas, tipo Águia, existentes na Indonésia, a navegar,
cfr. artº. 34º da p.i. por depoimento por declaração de parte e depoimentos testemunhais.
AQ - Em de janeiro de 2008, o A. trabalhou nas referidas lanchas, diariamente, desde cerca a manhã até altas horas da noite, incluindo sábados e domingos, até as por a trabalhar, o que conseguiu, em cerca de três semanas,
cfr. artº. 35º da p.i. por depoimento por declaração de parte e depoimentos testemunhais.
AR - E foi o A. que efetuou a navegação, até à Base Naval de HERA, o que competia ao Diretor Técnico P......., por não o conseguir contactar para tal desempenho, sendo que se havia deslocado para o exterior em gozo de férias,
cfr. artº. 36º da p.i. por depoimento por declaração de parte e depoimentos testemunhais.
AS - Foi o Autor que efetuou a navegação acima até à Base Naval de HERA, apesar de não se encontrar habilitado funcionalmente a fazê-lo por não possuir curso de navegação oficial,
cfr. artº. 37º da p.i. depoimento por declaração de parte e depoimentos testemunhais.
AT - Em fevereiro de 2008 ocorreu um dissenso entre o Autor e o Diretor Técnico P....... e não se deram bem desde então,
cfr. artº. 38º e 39º da p.i. depoimento por declaração de parte e depoimentos testemunhais.
…”
***

III.2. DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso, segundo a sua ordem de precedência.
Sobre o assunto, o recorrente defende que em momento antecedente à propositura da ação, discordando das avaliações e mediante a existência de recurso hierárquico necessário, nos termos do 105.º do Decreto-Lei n.º 236/99, de 25.06 que aprovou o Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), o Recorrido apresentou recurso hierárquico da decisão que avalia o seu desempenho em 29 de maio de 2009. Não existindo decisão, em 22.04.2010 apresentou a ação administrativa especial em apreço. Explicita que foi notificado de decisão do recurso hierárquico 25.06.2010, o que que levou ao deferimento do pedido de modificação objetiva da instância nos termos do n.º 2 do artigo 70.º do CPTA.
Assim, prossegue o recorrente afirmando que, alterando-se o pedido inicial para a anulação da decisão do recurso hierárquico posteriormente emitido e do ato avaliativo em si, e que resultou na condenação de que foi alvo a recorrente e cujos pressupostos processuais se pretendem ver reapreciados, e, considerando-se o prazo da interposição da ação, e o objeto da mesma - condenação à prática de ato devido - a contagem desse prazo não poderá ser feita nos termos em que o foi.
Em Despacho Saneador foi decidido que a ação de condenação à prática de ato devido era o meio processual indicado para condenar a Recorrente a decidir o recurso hierárquico interposto pelo Recorrido em 29.05.2009, porque, se entendeu estar perante uma omissão nos termos do n.º 1 do artigo 69.º do CPTA, cujo pressuposto levou à conclusão que o prazo de impugnação contenciosa seria de um ano.
Recorda o recorrente que o verdadeiro objeto do processo é a legalidade da avaliação extraordinária do Recorrido, ou seja, a apreciação de fundo da questão suscitada por este, pelo que, considerando que o ato avaliativo decorreu de procedimento de 1º grau, de iniciativa oficiosa, é evidente que não existiu inércia da Administração na sua prática, portanto, foi proferida decisão expressa que consistiu num ato de avaliação de desempenho extraordinária do recorrido.
Apreciando e decidindo.
A decisão sobre a exceção dilatória de caducidade do direito de ação, proferida no despacho saneador, não se enquadra em nenhuma das situações previstas nos n.ºs, 1 e 2 do artigo 644.º do CPC, onde se preveem os casos de recurso autónomo, sendo assim passível de ser impugnada no recurso a interpor da decisão que ponha termo à causa, no caso, a sentença final. Ora, ao não ter sido absolvido réu da instância quanto aos pedidos, o recurso do sentido do referido despacho saneador pode ser interposto a final, com a sentença, o que foi feito, e, por isso, será apreciado.
Começa por nos dizer o n.º 1 do artigo 66.º do CPTA que “A ação administrativa pode ser utilizada para obter a condenação da entidade competente à prática, dentro de determinado prazo, de um ato administrativo ilegalmente omitido ou recusado”. Ora, o objeto da ação instaurada com vista à obtenção da condenação à prática do ato devido corresponde ao ato que tenha sido ilegalmente omitido ou recusado, isto é, aquele ato que, no entender do interessado, deveria ter sido praticado pelo órgão competente e não o foi. A estes casos acresce aqueloutro em que o ato, embora tenha sido praticado, não satisfaz inteiramente a pretensão do particular e se traduz num ato devido para estes efeitos. Neste sentido, dispõe a alínea b) do n.º 4 do artigo 67.º que caso o interessado “(…) pretenda obter a substituição de um ato administrativo de conteúdo positivo”, ainda que não tenha apresentado requerimento, pode igualmente recorrer à condenação à prática do ato administrativo. Em todo o caso, como esclarece o n.º 3 do artigo 66.º, aquela possibilidade “(…) não prejudica a faculdade do interessado de optar por proceder, em alternativa, à impugnação dos atos em causa”.
Em síntese, dir-se-á que, de acordo com o n.º 1 do artigo 67.º do CPTA, aquela ação abrange um amplo quadro de situções pois que pode ser pedida quando, apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir, não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido, mas, também, quando tenha sido recusada a prática do ato devido ou quando tenha sido recusada a apreciação do requerimento dirigido à prática do ato. Portanto, o silencio da Administração deixou de configurar uma ficção jurídica de ato para efeitos de recurso contencioso ou de mero pressuposto do recurso contencioso, para quem assim quisesse, e passou a ser considerado como verdadeiro incumprimento do dever de decisão, contra o qual se reage através desse meio próprio que e a ação administrativa especial de condenação à prática de ato administrativo legalmente devido. Deixou de haver ficção de ato tácito de indeferimento.
Em conformidade com o disposto no artigo 175.º, n.º 3, do CPA, na redação aplicável, decorrido o prazo para a entidade competente conhecer do recurso hierárquico interposto sem que tenha proferido decisão, considera-se o recurso tacitamente indeferido, devendo presumir-se que o superior hierárquico se revê no ato administrativo praticado pelo seu subordinado – ato primário – o qual adquiriu de novo eficácia. Formando-se nesse momento o ato silente – ato tácito – de rejeição do recurso hierárquico, tem então início o prazo para a impugnação judicial do ato primário objeto de recurso hierárquico necessário, ou é retomado o prazo, que se encontrava suspenso, para a impugnação contenciosa do ato no caso de recurso hierárquico facultativo, conforme disposto no artigo 59.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA). Em suma, o prazo para a decisão do recurso hierárquico é de 30 dias, a contar da remessa do procedimento ao órgão competente para dele conhecer, podendo ser elevado até ao máximo de 90 dias quando haja lugar à realização de nova instrução ou de diligências complementares. Após o decurso dos prazos referidos sem que haja sido tomada uma decisão, o recurso considera-se tacitamente indeferido, conforme dispõe o n.º 3 do preceito transcrito.
Certo é que, se considera admissível, por decorrer dos artigos 64.º e 65.º do CPTA, que no decurso da ação administrativa de impugnação do ato que fora objeto de recurso hierárquico não decidido, o superior hierárquico do autor do ato impugnado contenciosamente venha ainda, por ato expresso, a decidi-lo, com os efeitos que resultarem para a ação pendente do sentido de tal decisão, com possibilidade de modificação da instância.
Uma vez usado o recurso hierárquico necessário, a via de reação contenciosa a seguir no caso de ela não surtir efeito é, portanto, a mesma que teria sido utilizada, logo desde início, se a lei não impusesse o ónus da prévia impugnação administrativa – e isto, quer a reclamação ou o recurso hierárquico necessário tenham sido objeto de indeferimento expresso, quer não tenham merecido resposta da parte do órgão competente para os decidir dentro do prazo legal de decisão. Não haverá, em caso algum, lugar, neste contexto, à dedução de um pedido de condenação à prática de um ato administrativo, com fundamento no facto de a impugnação administrativa ter sido indeferida ou não ter merecido resposta da parte do órgão competente para a decidir.
Este entendimento decorre da circunstância de serem distintas as situações contempladas nos artigos 109.º e 175.º, n.º 3, do CPA. De facto, no artigo 109.º do CPA, estamos perante a omissão de atos administrativos de primeiro grau, estando em causa situações jurídicas pretensivas dos interessados que aspiram à emissão do ato por eles requerido. Por seu lado, no artigo 175.º encontramo-nos perante a omissão de atos administrativos de segundo grau, a proferir no âmbito de impugnações administrativas, estando em causa tanto situações jurídicas pretensivas, como situações jurídicas opositivas dos interessados. Relativamente à inércia na decisão dos recursos hierárquicos, o artigo 175.º, n.º 3, do CPA acolhe uma conceção de ato tácito que se distingue da que se contempla no artigo 109, n.º 1, do CPA. Como se lê no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 1/2005 (Revista Excecional, Publicado no Diário da República, I série A, n.º 8, de 12 de janeiro de 2005), sobre a diferença de consequências que a lei faz resultar da falta de decisão administrativa, no artigo 175.º, n.º 3, do CPA está em causa “...uma falta de resposta em recurso administrativo, situação em que a omissão é de ato secundário, mas existe e regula a situação um ato primário», sendo que, «nestas condições o indeferimento tácito tem todas as condições para ser um ato suscetível de ser equiparado pela lei, sem grande artifício nem presunção, a um ato expresso de indeferimento, porque ele tem o conteúdo, os fundamentos, a direção e toda a carga genética que constam do ato primário...” - in Recurso hierárquico, ato tácito e condenação à prática de ato devido”, Cadernos de Justiça Administrativa, N.º 53, setembro/outubro 2005, p. 19.
A lei pretende estabelecer um marco preciso para o indeferimento em caso de inércia do órgão ad quem em recurso hierárquico. Decorrido o prazo para a decisão da impugnação administrativa necessária sem a mesma ser proferida, abre-se de imediato a via contenciosa pertinente. O silêncio do órgão hierárquico superior no âmbito de um recurso hierárquico necessário tem, assim, o alcance de considerar o ato objeto da impugnação administrativa como ato final do procedimento, de o tornar, em si mesmo, passível de impugnação contenciosa.
Também se sublinha que os artigos 64.º e 65.º do CPTA admitem que, na pendência do processo, seja proferido ato revogatório do ato administrativo impugnado, acompanhado de nova regulação da situação, com efeitos retroativos ou sem efeitos retroativos. Nesta situação, o autor pode requerer que o processo prossiga contra o novo ato ou que prossiga em relação aos efeitos produzidos, constituindo uma modificação objetiva da instância revelada pela nova regulação da situação litigada.
Reitera-se, este artigo 175°, n.º 3, do anterior CPA, o aplicável aos autos, não foi tacitamente revogado pela emergência do CPTA, pois a sua supressão da ordem jurídica só aconteceu com a entrada em vigor do atual CPA – vide Acórdão STA, proferido em 11 de maio de 2017, processo 075/17. E só com o novo CPA, aprovado pela Lei 4/2015, de 7 de janeiro, no seu artigo 198. °, n.º 4, foi afastado, inovadoramente, o indeferimento tácito dos recursos hierárquicos - optando por outra solução, adjetivada no novo teor do n.º 2 do artigo 69° do CPTA.
Confrontado com a falta de decisão do recurso hierárquico que deduzira, o recorrido devia tê-la encarado como um indeferimento tácito do seu meio gracioso, já que esse resultado era imposto pelo artigo 175°, n.º 3, do CPA, que então ainda vigorava.
Mas decidiu o Tribunal a quo no Despacho Saneador, improceder a exceção suscitada de caducidade do direito de ação, defendendo que “... Ora, o artigo 67° n°1, al. a) do CPTA, estabelece que, a condenação à prática do ato administrativo legalmente devido pode ser proferida quando, "tendo sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir, não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido...” e que “... E, tal como acontece no caso dos autos, o prazo de interposição da ação é o previsto no artigo 69° n°1 do CPTA que dispõe: "em situações de inércia da Administração, o direito de acção caduca no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a emissão do acto ilegalmente omitido...”.
Esta inusitada decisão judicial esquece que estamos no âmbito de uma decisão judicial de segundo grau, não esclarecendo a diferença de regimes.
Pois bem, o ato de avaliação referente ao período de 2007-11-06 a 2008-06-10 foi notificado ao recorrido, ali autor, em 2009-03-31, sendo que, do mesmo, em 2009-04-17 aquele apresentou reclamação. Posteriormente, em 2009-07-17, apresentou recurso hierárquico para o Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada (factos provados B, C e E). Por fim, em razão da omissão do dever de decidir que se traduz na não prolação do ato administrativo devido, veio o Autor, interpor a presente ação administrativa especial, em 2010-04-22, ou seja, muito além dos 3 meses de que dispunha para lançar mão da respetiva impugnação judicial, deixando caducar o seu direito de ação.
Assim, a exceção de caducidade suscitada deveria ter procedido.
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Em consequência, será de negar/conceder provimento ao recurso, e em revogar a sentença recorrida, procedendo a exceção de caducidade do direito de ação, com a fundamentação antecedente, e, por isso, absolvendo da instância o réu da instância, conforme artigo 89.º, n.º 4, al. k) do CPTA.
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IV – DISPOSITIVO

Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes da Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, e em revogar a decisão recorrida, procedendo a exceção de caducidade do direito de ação e absolvendo o réu da instância.
Custas a cargo do recorrido.
Registe e Notifique.
Lisboa, dia 6 de junho de 2024
(Eliana de Almeida Pinto - Relatora)

(Teresa Correia – 1.ª adjunta)

(Frederico Branco - 2.º adjunto)