Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:863/25.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:11/13/2025
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:INTEMPESTIVIDADE
DESENTRANHAMENTO
PRAZO
CONTRADITÓRIO
Sumário:I - Quando o prazo para a prática do acto processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte (art. 138º, nº 2 do CPC).
II - A inobservância do contraditório constitui uma omissão grave, representando uma nulidade processual (art. 195º, do CPC) sempre que tal omissão seja suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, sendo de anular a decisão quando à parte não foi dada possibilidade de se pronunciar sobre os factos e respetivo enquadramento jurídico.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

O INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.- Secção de Processo de Lisboa II, com os demais sinais nos autos, veio, em conformidade com o artigo 283.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso do Despacho e da Sentença, proferidos pelo Tribunal Tributário de Lisboa, ambos em 14 de agosto de 2025, que, respetivamente, decidiu pelo desentranhamento da resposta apresentada pelo IGFSS-SP Lisboa II, em 21 de julho de 2025, por considerá-la intempestiva, e julgou procedente a reclamação deduzida pela .... , S.A. da decisão de penhora do órgão de execução fiscal (IGFSS-SP Lisboa II) para cobrança coerciva de dívida à Segurança Social, no valor de €135.903,99 e, consequentemente, anulou a penhora de saldos bancários realizada no âmbito do Processo de Execução Fiscal (PEF) n.º 102202500069981 e apensos (nºs 1102202500070041 e 1102202500070149),

A Recorrente, termina as alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«DO DESPACHO:

I. Em, 11 de julho de 2025 foi o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP.-Secção de Processo de Lisboa II, notificado para na qualidade de reclamado/a, para responder no prazo de 8 dias, nos temos e para os efeitos do disposto no n.° 2 do artigo 278.°, do Código de Procedimento e Processo Tributário.

II. O próprio despacho menciona que o IGFSS.IP, foi notificado nessa data, quando remete para comprovativo junto aos autos.

III. No entanto se dúvidas subsistiram, veja-se o n.º do registo dos ctt, que atesta que o Reclamado foi notificado nessa data, conforme se pode verificar pelo documento que ora se junta (doc. n.º 1).

IV. Ora se, o prazo era de oito dias, tendo sido notificado a 11 de julho de 2015, o prazo terminaria a 19 de julho de 2025, sendo que, esse dia corresponde a um sábado.

V. Sucede que, dispõe o n.º 2 do art.º 138º do CPC e alínea e) do art. 279.º do Código Civil, que “Quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte.

VI. Mais, nos termos da alínea b) do art.º 279.º do Código Civil é mencionado que “Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr”.

VII. Assim, atento o dispositivo legal enunciado, tendo o prazo terminado a um sábado, no caso, dia 19 de julho de 2025, transfere-se a prática do ato processual para o primeiro dia útil seguinte, ou seja, segunda-feira dia 21 de julho de 2025.

VIII. Pelo que, a resposta à reclamação apresentada em 21 de julho de 2025 deverá ser considerada tempestiva, não podendo ocorrer o seu desentranhamento. (Doc. n.º 2).

IX. Ainda assim, refira-se em abono da verdade, que mesmo que o tribunal considerasse, que o prazo havia sido ultrapassado, fato que se refuta face ao ora exposto, a prática do ato poderia ocorrer dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento de uma multa.

X. Acresce e por último referir, que tendo em conta o postulado no nº 3 do art.º 3º do CPC, parece-me que s.m.o, o tribunal deveria ter dado cumprimento ao princípio do contraditório, permitindo que o Recorrente se pronunciasse sobre a tempestividade da ação, o que não ocorreu.

XI. Assim, face ao supra exposto, conclui-se pela tempestividade da resposta à reclamação apresentada pelo ora Recorrente/ Reclamado, pelo que, a mesma não pode ser desentranhada.

DA SENTENÇA:

XII. O Tribunal “a quo” decidiu pela anulação da penhora de saldos bancários realizada no âmbito do PEF n.º 102202500069981 e apensos (nºos 1102202500070041 e 1102202500070149) por ter considerado a mesma ilegal.

XIII. Isto porque, vem arguir, que “não obstante, antes de o Instituto da Segurança Social decidir sobre a garantia apresentada, o Exequente- IGFSS emitiu mandado de penhora de depósitos bancários, concretizando uma penhora no montante de €141.206,72, existente na conta de depósito a prazo n.º 100834900918, titulada pela Reclamante junto do .... (cf. alíneas F.e M. do probatório).”

XIV. Mais, refere que, “Este agir evidencia que o órgão de execução fiscal praticou atos de cobrança coerciva sem que tivesse sido previamente apreciado o pedido de prestação de garantia — apresentado contemporaneamente à reação judicial —,em violação do disposto no artigo 169.º, nºs 6 e 7, do CPPT, que consagram a denominada “suspensão provisória da execução”, a qual, seguindo o douto tribunal, se mantém desde a apresentação da garantia até à notificação da decisão que sobre a mesma recaia”.

XV. Refere ainda o tribunal “a quo”, que “Tal atuação contraria ainda os princípios da boa fé e da colaboração da Administração com os contribuintes, previstos no artigo 59.º, n.º 2, da LGT, pois o órgão de execução fiscal não pode ordenar medidas executivas, como a penhora, sem antes decidir o requerimento de prestação de garantia formulado pela Executada.”

XVI. Atento o supra exposto, e para melhor esclarecimento dos presentes autos, cumpre referir, os fatos ocorridos referentes à tramitação do processo de execução fiscal, que demonstram que o Recorrente agiu dentro dos princípios da boa fé :

XVII. Os processos executivos 102202500069981 e apensos (1102202500070041 e 1102202500070149), foram instaurados contra a sociedade .... , S.A., NIPC .... , por dívida ao Sistema de Segurança Social, tendo por base as certidões de dívida e respetivos tributos, (Cfr. Fls. 3 a 5 do Processo de Execução Fiscal, doravante PEF);

XVIII. Os processos de execução fiscal foram instaurados em 10-02-2025;

XIX. Em 24-03-2010 foi enviada a citação eletrónica n.º 25CIT1553408 ao processo de execução fiscal n.º 102202500069981 e apensos (1102202500070041 e 1102202500070149), (Cfr. Fls. 1 a 7 do PEF);

XX. A citação n.º 25CIT1553408 foi disponibilizada através da Segurança Social Direta (área reservada do NISS .... ). Foi feita nos termos do art.º 6.º-A do Decreto-Lei n.º 42/2001 de 9 de fevereiro e do art.º 23.º-A do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro e do art.º 15.º do Decreto-Lei n.º 93/2017, de 1 de agosto (ambos na sua versão atual), equivalendo, consoante os casos, à remessa por via postal, via postal registada ou por via postal registada com aviso de receção. Esta citação considera-se efetuada no quinto dia posterior ao registo da sua disponibilização na Segurança Social Direta, nos termos do art.º 191.º, n.ºs 6 e 7, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro (na sua versão atual).

XXI. Não obstante o tribunal só ter dado como fato provado a data da leitura da citação, o efeito legal da mesma ocorreu em 21-02-2025, data em que foi confirmada (Cfr. Fl. 8 do PEF), fato esse que também não pode ser desconsiderado, dando-se por provado.

XXII. Não foi apresentada oposição judicial, pagamento em prestações ou pagamento por dação;

XXIII. A execução não se encontrava suspensa;

XXIV. Em 16-04-2025, foi ordenada penhora de crédito tributário IVA, (Cfr. Fl. 12 do PEF);

XXV. Em 20-05-2025, foram ordenadas penhoras bancárias, (Cfr. Fls. 9 a 12 do PEF);

XXVI. Decorrente das penhoras bancárias, foram transferidos valores cativos que extinguiram o processo de execução fiscal n.º 1102202500069981 e apensos, (Cfr. Fls. 13 a 15 do PEF);

XXVII. Em resposta à ordem de penhora, em 11-06-2025, a devedora originária apresentou reclamação do ato de penhora do órgão de execução fiscal, (Cfr. Fls. 16 a 45 do PEF).

XXVIII. Da reclamação apresentada vem a Reclamante alegar, que a dívida exequenda é objeto, desde 2021 de discussão no âmbito de uma ação administrativa sob o n.º 1806/21.2BELSB, que corre termos na Unidade Orgânica 3 do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.

XXIX. E que, deu entrada um requerimento de prestação de garantia dirigido ao Presidente do Instituto da Segurança Social com vista à suspensão de uma eventual execução dos atos de anulação da decisão de atribuição de apoio à retoma progressiva.

XXX. Acresce que, é mencionado na douta decisão que “Não obstante, antes de o Instituto da Segurança Social decidir sobre a garantia apresentada, o Exequente- IGFSS emitiu mandado de penhora de depósitos bancários, concretizando uma penhora no montante de €141.206,72, existente na conta de depósito a prazo n.º 100834900918, titulada pela Reclamante junto do Novo Banco”.

XXXI. Sucede que, tais fatos não eram do conhecimento do Recorrente.

XXXII. Note-se, que era ao Recorrido/Reclamante que incumbia a obrigação de trazer ao processo de execução fiscal, elementos/ informações, nos termos e para os efeitos do art.º 169.º do CPPT, que suspendessem o processo, tendo optado por nada fazer, quando teve essa oportunidade, nomeadamente, refira-se, em sede de oposição e ainda assim, reitere-se uma vez mais, nada fez.

XXXIII. A esse propósito sempre se dirá, que a tramitação do processo de execução fiscal foi cumprida nos termos da lei, não se verificando e não tendo, conhecimento de qualquer ato que enviesasse essa tramitação, e/ ou colocasse em causa a legalidade dos atos praticados

XXXIV. Pelo que, a penhora em causa é legal.

XXXV. Não se vislumbrando, s.m.o, o motivo pelo qual o tribunal “a quo” decidiu pela ilegalidade da penhora, quando a tramitação legal do processo de execução fiscal foi comprida.

XXXVI. Da decisão extrai-se que “foi apresentado requerimento de prestação de garantia sob a forma de garantia bancaria”.

XXXVII. Sucede que, o requerimento em si mesmo, apenas demonstra uma intenção do Recorrido de prestar garantia, não podendo essa intenção ser juridicamente considerada, para efeitos de suspensão do processo, quando em boa da verdade, a garantia não foi prestada.

XXXVIII. Mais, no próprio requerimento de prestação de garantia apresentado pelo Recorrido, nomeadamente nos pontos 10 e 11 extrai-se que a garantia ainda não se encontra prestada conforme exigido legalmente, não passando, o requerimento em apreço, de uma mera intenção.

XXXIX. Senão vejamos, o teor dos mencionados pontos, que ora se transcrevem:

XL. “Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 3.9, alínea a) da Lei 110/2009, de 16 de setembro, 52.9, n.9 1 e 2 da Lei Geral Tributária, aprovada pelo DL 398/98, de 17 de dezembro,169.°-, n.°-1 e 2 do CPPT e 50.C-n.C-Z do CPTA, "a impugnação de um ato administrativo suspende a eficácia desse ato quando esteja apenas em causa o pagamento de uma quantia certa, sem natureza sancionatória, e tenha sido prestada garantia por qualquer das formas previstas na lei tributária, bem como suspende os termos da execução fiscal, desde que se mostre prestada a garantia. (sublinhado nosso).
XLI. A ora requerente pretende prestar garantia (sublinhado nosso) através de garantia bancária, a qual se mostra idónea para assegurar a eventual restituição das prestações em causa, no caso de improcedência dos meios de impugnação graciosos e contenciosos a propor pela Requerente.”.

XLII. Ora, a apresentação de requerimento a comunicar a intenção de prestar garantia, com pedido de fixação do valor da garantia a prestar não tem virtualidade de suspender o processo.

XLIII. A cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução que detenham por objeto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, em todos os casos, desde que tenha sido prestada garantia idónea nos termos das leis tributárias – Cfr. artºs 52º da LGT e 169º do CPPT.

XLIV. O que constitui pressuposto da suspensão da execução é a prestação da garantia, prestação de garantia essa a efetuar no âmbito da apresentação dos meios judiciais ou graciosos contemplados nos art.º 52º da LGT e 169º do CPPT, não conferindo estes meios processuais, por si só, a virtualidade de suspensão da execução.

XLV. Em abono da conclusão ora exposta, veja-se jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Norte, nomeadamente o acórdão de 11.02.2011 proferido no processo 02308/10.8 BEPRT.

XLVI. Por todo o exposto, deverá ser considerada a penhora legal.

Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Ex.ª doutamente suprirá, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado e ser revogada a sentença emanada pelo tribunal “a quo”.»

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A Recorrida, apresentou as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:
«A) O presente recurso tem por objecto, entre outros, a sentença de fls… “que julgou procedente a reclamação de atos do órgão do órgão de execução fiscal” e, em consequência “anula a penhora de saldos bancários realizada no âmbito do PEF n.º 102202500069981 e apensos (…) com as legais consequências”.
B) O IGFSS recorre da Sentença, seja quanto à decisão preferida quanto à matéria de facto, seja da decisão proferida quanto à matéria de Direito.
C) Porém, o Recorrente, não dá cumprimento ao ónus processual que sobre o mesmo impende, não curando de identificar os concretos pontos da matéria de facto que considera terem sido incorretamente julgados, não indicando quais os meios de prova existentes nos autos que imporiam decisão diversa daquela que foi tomada e, finalmente, não indicando qual o sentido que a decisão impugnada deveria ter tido.
D) Ora, a falta de cumprimento dos ónus processuais aplicáveis determina, in casu, a rejeição do recurso quanto a este ponto, o que se requerer.
E) No que tange à matéria de Direito, para sustentar a sua pretensão de ver revogada a sentença a quo, o Recorrente alega, em suma, que não era conhecedor (i) da existência da acção melhor identificada no artigo nem (ii) do requerimento de prestação de garantia, ambos datados de 2021, mais de 4 anos antes da presente execução.
F) Porém, por nenhum momento se questiona o Recorrente se seria sua obrigação ter conhecimento destes factos, ou obrigação do Instituto da Segurança Social, I.P. ter-lhe dado conhecimento destes factos, e, muito menos, considera ater-se na materialidade dos factos cuja existência já não ignora e na qual a Recorrida confiou, para rever/revogar a sua actuação.
G) Ora, é, precisamente, para evitar este tipo de actuação da Administração que o artigo 10.º do Código do Processo administrativo dispõe, no seu n.º 1, que “No exercício da atividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa-fé.” E, no seu segundo número que “No cumprimento do disposto no número anterior, devem ponderar-se os valores fundamentais do Direito relevantes em face das situações consideradas, e, em especial, a confiança suscitada na contraparte pela atuação em causa e o objetivo a alcançar com a atuação empreendida”.
H) O princípio da materialidade subjacente, plasmado no citado n.º 2 do artigo 10.º do Código do Processo Administrativo, como referem ELIANA ALMEIDA PINTO, ISABEL SILVA, JORGE COSTA “(…) é fruto do histórico combate ao formalismo, que pode ser resumido com a exigência de submissão dos casos a decidir às disposições legais pertinentes. De acordo com o princípio da primazia da materialidade subjacente, deve ser dada maior relevância à materialidade em contraposição com o formalismo legalmente imposto” .
I) Ora, a Recorrida (i) impugnou os actos tributários em tempo, há mais de 4 anos a esta parte; (ii) requereu de imediato a prestação de garantia bancária para suspender uma eventual execução, sem que tenha, até ao instante, recebido qualquer resposta, e (iii) obteve, após a emissão das certidões de dívida que constituem título da presente execução, certidão de não dívida à Segurança Social (cfr. pontos B. C e H. da Decisão proferida quanto à matéria de facto).
J) É, pois, evidente, que estão reunidos os pressupostos de facto de que o artigo 169.º do Código do Procedimento e Processo Tributário faz depender a suspensão da execução, e que um comportamento do Recorrente arreigado em critérios meramente formais é claramente violador do princípio da boa-fé.
K) Parece ainda entender o Recorrente que, ainda que tivesse conhecimento da existência da acção de impugnação administrativa proposta pela aqui Recorrida, e da circunatância de esta, de imediato, ter requerido a prestação de garantia para suspensão de uma eventual execução, tal facto não determinaria que a mesma se suspendesse porquanto, no entender do Recorrente, apenas a efectiva prestação de garantia suspende a execução em curso.
L) Semelhante entendimento não se afigura compatível com os princípios de boa-fé e colaboração que devem nortear a actuação da Administração e, igualmente, a letra artigo 169.º do CPPT (cfr. TCA Sua, em Acórdão de 16 de Dezembro de 2015).
M) Face a todo o exposto, é forçoso concluir que não assiste qualquer razão ao Recorrente, porquanto a Sentença não merece qualquer reparo.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a Sentença recorrida nos seus exactos termos.»
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Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, emitiu parecer no sentido de que o recurso referente ao douto despacho merece provimento «(…), devendo, consequentemente, revogar-se o douto despacho em análise, assim como dar-se sem efeito a douta sentença proferida, e ordenar-se a baixa dos autos à primeira instância a fim de aí prosseguirem com a resposta apresentada, sob pena de violação do princípio do contraditório.»

Acrescenta ainda que «(…)caso assim não se entenda, somos de parecer que os fundamentos do recurso não permitem abalar os fundamentos de facto e de direito que sustentam a douta sentença recorrida, a qual se mostra correta e bem fundamentada, mostrando-se sustentada em jurisprudência com pertinência à situação em apreciação, devendo, assim, ser confirmada na ordem jurídica.»
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Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.
De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.
Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, as questões fundamentais a decidir são as de saber:
a) se o despacho recorrido errou quando decidiu pelo desentranhamento da resposta apresentada pelo IGFSS-IP Lisboa II, em 21 de Julho de 2025, por considerá-la intempestiva;
E em caso negativo,
b) se a sentença recorrida errou no seu julgamento quando anulou a penhora de saldos bancários.
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Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente dos autos, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

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II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. De facto
A decisão recorrida fixou a seguinte matéria de facto:
«Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:
A. Em 01.07.2021 a Reclamante foi notificada da decisão que determinou a anulação do pedido de apoio à retoma progressiva por si formulado, relativo aos períodos compreendidos entre 15.03.2021 e 30.04.2021 (cf. fls. 27 a 31 do PEF, cujo teor se reproduz na íntegra);
B. Em 30.07.2021, a Executada apresentou requerimento para prestação de garantia, com vista à suspensão da cobrança da dívida identificada na alínea anterior (cf. fls. 32 do PEF);
C. Em 15.10.2021, deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa uma ação administrativa, sob o número 1806/21.2BELSB, entre a ora Reclamante e o Instituto da Segurança Social, IP,
D. A qual tem o seguinte objeto:

(cf. ata junta aos autos, cujo teor se reproduz na íntegra confirmada pela tramitação do SITAF do mencionado processo);
E. Em 10.02.2025, o Exequente emitiu as seguintes certidões de dívida:
“(texto integral no original; imagem)”

“(texto integral no original; imagem)”

“(texto integral no original; imagem)”


(cf. fls. 3 a 5 do PEF);
F. Na mesma data- 10.02.2025- foram instaurados os processos executivos 102202500069981 e apensos (1102202500070041 e 1102202500070149), pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., contra a sociedade .... , S.A., NIPC .... , por dívida ao Sistema de Segurança Social do ano de 2021, quantia exequenda no valor de €135.903,99 e acrescidos (cf. informação junta aos autos);
G. Em 14.02.2025, foi enviada a citação eletrónica n.º 25CIT1553408, relativa ao processo de execução fiscal n.º 102202500069981 e apensos (1102202500070041 e 1102202500070149, cf. fls. 1 a 7 do PEF);
H. Em 07.03.2025 o Instituto da Segurança Social emitiu uma declaração com o seguinte teor: (cf. juntos com a p.i.);
“(texto integral no original; imagem)”


(cf. juntos com a p.i.);

I. No âmbito do PEF supra identificado, em 16.04.2025, foi ordenada penhora de crédito tributário IVA,
J. E em 20.05.2025, foram ordenadas penhoras bancárias (cf. fl. 12 do PEF);
K. A comunicação – citação eletrónica- foi lida pelo destinatário em 28.05.2025 (cf. fls. 8 do PEF);
L. Na mesma data- 28.05.2025- a Executada tomou conhecimento da penhora do valor de €141.206,72,

M. Que se encontravam depositados na sua conta de depósito a prazo com o número 100834900918, junto do .... (cf. fl. 9 a 13 do PEF);
N. Decorrente das penhoras bancárias, foram transferidos valores cativos que extinguiram o processo de execução fiscal n.º 1102202500069981 e apensos (cf. Fls. 13 a 15 do PEF);
O. Até à presente data o pedido identificado na alínea B. não foi apreciado (acordo).»
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No que respeita a factos não provados, nada refere a sentença recorrida.
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Em matéria de convicção, refere o Tribunal a quo:
«A decisão da matéria de facto provada efetuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que resulta dos autos e do processo de execução fiscal junto aos presentes autos, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»

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Ao abrigo do art. 662º do CPC, por se encontrarem provados documentalmente, e poderem relevar para a decisão da causa, aditam-se os seguintes factos:
P. Por despacho de 04/07/2025, foi determinada a notificação do Representante da Fazenda Publica para responder no prazo de 8 dias, nos termos do disposto n.º 2 do artigo 278.º do CPPT.
Q. O Instituto Gestão Financeira Segurança Social Sec. Processo Executivo Lisboa II, foi notificado para responder, por ofício da mesma data do despacho anterior (04/07/2025);
R. O Instituto Gestão Financeira Segurança Social Sec. Processo Executivo Lisboa II recebeu a notificação, referida na alínea anterior sob o registo PT 50.0033.0000.06280433293.14, em 11 de Julho de 2025, conforme consta do despacho recorrido e do detalhe de objeto dos CTT, junto aos autos a 22/07/2025;
S. A resposta foi apresentada pelo Instituto Gestão Financeira Segurança Social Sec. Processo Executivo Lisboa II, em 21.07.2025, conforme consta do despacho recorrido e se extrai dos próprios autos;
T. No despacho recorrido considerou-se que a resposta, referida na alínea anterior, se mostrava intempestiva, pelo que se determinou o seu desentranhamento.
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II.2. De Direito

DO DESPACHO
O despacho recorrido tem o seguinte teor:
«Considerando que a notificação efetuada nos termos e para os efeitos do artigo 278.º do CPPT ocorreu em 11.07.2025 (cf. comprovativos juntos aos autos), a resposta apresentada pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., em 21.07.2025 mostra-se intempestiva, pelo que deve ser desentranhada.
Desentranhe-se e notifique-se.
D.N.»

Vem o reclamado Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP. - Secção de Processo de Lisboa II, interpor recurso do despacho que considerou a resposta por si apresentada, ao abrigo do art. 278º, nº 2, do CPPT, intempestiva, pelo que determinou o seu desentranhamento.

Alega que em 11 de julho de 2025 foi o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP.-Secção de Processo de Lisboa II, notificado para na qualidade de reclamado/a, para responder no prazo de 8 dias, nos temos e para os efeitos do disposto no n.° 2 do artigo 278.°, do Código de Procedimento e Processo Tributário. O próprio despacho menciona que o IGFSS.IP, foi notificado nessa data, quando remete para comprovativo junto aos autos. No entanto se dúvidas subsistiram, veja-se o n.º do registo dos ctt, que atesta que o Reclamado foi notificado nessa data.

Mais alega que se, o prazo era de oito dias, tendo sido notificado a 11 de julho de 2015, o prazo terminaria a 19 de julho de 2025, sendo que, esse dia corresponde a um sábado.

Sucede que, dispõe o n.º 2 do art.º 138º do CPC e alínea e) do art. 279.º do Código Civil, que “Quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte.

Mais, nos termos da alínea b) do art.º 279.º do Código Civil é mencionado que “Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr”.

Assim, atento o dispositivo legal enunciado, tendo o prazo terminado a um sábado, no caso, dia 19 de julho de 2025, transfere-se a prática do ato processual para o primeiro dia útil seguinte, ou seja, segunda-feira dia 21 de julho de 2025.

Pelo que, a resposta à reclamação apresentada em 21 de julho de 2025 deverá ser considerada tempestiva, não podendo ocorrer o seu desentranhamento.

Desde já, se adianta, que assiste razão ao recorrente.
Vejamos.
O despacho recorrido não fundamenta a intempestividade da resposta apresentada pelo IGFSS, IP.
Desconhecemos qual o dia que, no entender do Tribunal a quo, seria o prazo limite para apresentação da mesma, bem como que norma aplicou para sustentar o seu entendimento.
A recorrida também nada alega a respeito do recurso do despacho de desentranhamento da resposta do IGFSS, IP.

A resposta do IGFSS, IP (peça processual que está em causa) foi apresentda no prazo legal de 8 dias concedido para o efeito, pois a notificação foi recebida no dia 11 de julho de 2025 (como o próprio Tribunal a quo reconhece) e cfr. alínea R) do probatório, e a resposta deu entrada no processo no dia 21 de Julho de 2025, cfr. alínea S) do probatório, sendo que dias 19 e 20 eram, respetivamente, sábado e domingo.
Dispõe o artigo 138.º, sob a epígrafe “Regra da continuidade dos prazos”:
1 - O prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de atos a praticar em processos que a lei considere urgentes.
2 -
Quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte. (1) - Sublinhado nosso.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se encerrados os tribunais quando for concedida tolerância de ponto.
4 - Os prazos para a propositura de ações previstos neste Código seguem o regime dos números anteriores.

Assim, embora o último dia de prazo para apresentação da resposta fosse o dia 19 de Julho de 2025, em virtude desse dia ser um sábado - dia em que os tribunais estão encerrados – o termo do prazo para apresentação da resposta transferiu-se para o dia 21 de Julho de 2025 (2ª feira e 1º dia útil ao seu termo).
Pelo que tendo o IGFSS, IP apresentado a resposta no dia 21 de Julho de 2025, a apresentou tempestivamente, pelo que não se vislumbra motivo para determinar o desentranhamento da mesma, sob pena de violação do princípio do contraditório, nos termos do art. 3º, nº 3, do CPC.
A inobservância do contraditório constitui uma omissão grave, representando uma nulidade processual (art. 195º, do CPC) sempre que tal omissão seja suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, sendo de anular a decisão quando à parte não foi dada possibilidade de se pronunciar sobre os factos e respetivo enquadramento jurídico.

Assim, acolhendo o alegado, no recurso do despacho, pelo IGFSS, IP., julgamos que, nesta parte, o recurso merece provimento, devendo, consequentemente, revogar-se o despacho em crise, assim como anular a sentença proferida, e ordenar-se a baixa dos autos à 1ª instância a fim de aí prosseguirem com a resposta apresentada.

Em face do agora decidido, não se irá tomar conhecimento do recurso da sentença.




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III. DECISÃO

Face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso do despacho, revogando-se o mesmo, anular a sentença proferida, e ordenar-se a baixa dos autos à 1ª instância a fim de aí prosseguirem com a resposta apresentada.

Sem Custas.

Registe e notifique.


Lisboa, 13 de Novembro de 2025



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[Lurdes Toscano]

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[Luísa Soares]

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[Isabel Vaz Fernandes]