Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:316/09.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:07/15/2025
Relator:MARIA DA LUZ CARDOSO
Descritores:IRS
ESCRITURA DE COMPRA E VENDA
FUNDADA DÚVIDA
Sumário:I - Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora – cfr. artigo 371º, n.º1 do CC.
II - Se é o vendedor que afirma, perante o notário, qual o montante do preço estipulado e afirma já o ter recebido entretanto, esta sua declaração de já ter recebido o preço implica o reconhecimento de um facto que lhe é desfavorável, o que a qualifica como confissão, nos termos do artigo 352º do CC.
III - A força probatória plena da confissão pode ser contrariada por meio de prova do contrário, nos termos do disposto no artigo 347º do CC que dispõe: “A prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto (...)”.
IV - Subsistindo dúvidas probatórias sobre a existência do facto tributário, as mesmas devem ser valoradas a favor do contribuinte (cf. artigo 100º, n.º 1, do CPPT).
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção Tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I - RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente), veio recorrer da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa no dia 25.03.2021, na impugnação judicial intentada por J......... e H......... (doravante Recorridos) contra o ato de liquidação de IRS n.º 20........., relativo ao ano de 2004 e respetivos juros compensatórios, que julgou a impugnação procedente e em consequência anulou o ato de liquidação impugnado.

*

Com o requerimento de interposição do recurso, a Recorrente apresentou alegações,
formulando, a final, as seguintes conclusões:

CONCLUSÕES:

A. Entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, dado que da prova produzida e dos elementos levados aos autos, não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.

B. No caso em apreço, considerou o douto Tribunal que os Impugnantes através do documento em G (da fundamentação de facto) e da prova testemunhal arrolada conseguiram criar a dúvida sobre a existência do facto tributário, tendo neste seguimento o Tribunal decidido anular a liquidação em causa, com base no n.º 1 do artigo 100.º do CPPT.

C. In casu, encontramo-nos perante um ato de liquidação oficiosa que corporiza a fixação de matéria tributável não declarada, decorrente da alienação de bens imóveis, e consequente tributação enquanto rendimento de mais valias.

D. Salvo o devido respeito, por opinião contrária, não pode a Fazenda Pública concordar com tal decisão, pois a Autoridade Tributária procedeu a uma ação de inspeção que teve origem na Ordem de Serviço Interna OI200400530, de 03/01/2006, referente ao IRS de 2004, para averiguar os factos e consequentemente tributar de acordo com as opções efetuadas pelos Impugnantes.

E. Conforme resulta do probatório, a AT aquiescendo que os Impugnantes alienaram os bens imóveis, no ano de 2004, e conforme consta na escritura pública onde os Impugnantes declararam a venda, o valor da venda e o recebimento do preço por essa venda.

F. Não sendo uma questão que se poderá por em causa a menos que haja arguição de falsidade por parte dos Impugnantes sobre o documento da escritura, o que não aconteceu, apenas vieram juntar um balanço da sociedade adquirente, com um crédito sobre a sociedade pelos sócios (que são os próprios Impugnantes), no valor de 650.000€, que corresponde ao valor da venda.

G. Conforme se asseverou através do entendimento vertido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no processo n.º 2816/08.OTVLSB. L1. S1, sobre a força probatória de uma escritura pública “a escritura pública de compra e venda, não fazendo prova plena do pagamento do preço à vendedora, fá-lo, no entanto, da sua declaração de já ter recebido o preço, pois que a realidade da afirmação cabe nas percepções do notário, o que constitui uma confissão extrajudicial, em documento autêntico, feita à parte contrária, que goza de força probatória plena contra o confitente.”.

H. A declaração foi feita “…pelo preço, “já recebido”, de €650.000,00”, não há dúvidas que consistindo a declaração numa prova plena, com força probatória extrajudicial, porque corresponde a uma confissão na presença de um conservador civil, pelo que não soçobra com a apresentação do balanço da sociedade adquirente ou através da prova testemunha.

I. Razão pela qual tende a discordar a Fazenda Pública relativamente à douta decisão, até porque é contrária ao Direito, à segurança jurídica e distorce a realidade dos factos, ao anular a liquidação por dúvidas atinentes ao facto tributário, nos termos do artigo 100.º, n.º 1, do CPPT.

J. E na incerteza caberia ao Tribunal dissipar qualquer a dúvida, devendo-se considerar validamente realizada a liquidação oficiosa de IRS, no qual procedeu à visada correção da tributação, enquanto rendimento de mais valias, improcedendo os argumentos
atinentes à pretensa inexistência do pagamento do preço.

K. Salvo o devido respeito, não andou bem o douto tribunal a “quo” e isto porque, se o Tribunal considera que a escritura pública, não faz prova suficiente, do recebimento do preço, caberia sempre ao mesmo, “socorrer-se” dos circunstancialismos de que revestem o ato da escritura pública, declarações perante o notário, que revestem natureza de um ato solene.

L. Assim e salvo o devido respeito, por todo o exposto, o douto Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento, por errónea aplicação da Lei, mormente o disposto nos artigos da alínea a) do número 1, do artigo 10.º, alínea a) do n.º 1 do artigo 3.° e da alínea a) do número 1 do artigo 28.º todos do CIRS, também preteriu o artigo 100.º do CPPT e os artigos 347.º, 352.º, 358.º - n.º 3, 363.º - n.º 2, 369.º - n.º 1, 371.º - n.º 1, 372.º - n.º1, 393.º todos do Código Civil.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a oposição judicial totalmente improcedente.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!”
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Os Recorridos devidamente notificados da admissão do recurso, não apresentaram contra-alegações.
*


O MINISTÉRIO PÚBLICO neste Tribunal Central Administrativo Sul, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais (artigo 657º, n. º2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), cumpre apreciar e decidir.

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Delimitação do objeto do recurso

Em ordem ao consignado no artigo 639º do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282º do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir:

i) Se a sentença recorrida padece da apontada errónea apreciação de facto e de direito, consubstanciada em erro de julgamento.

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II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1- De facto

III. Com interesse para a decisão a proferir, consideram-se provados os factos referidos no ponto I supra e, bem assim, os seguintes factos:

A. Por escritura de compra e venda outorgada em 22 de Dezembro de 2004, os Impugnantes, por si e o Impugnante na qualidade de gerente e representante da S........., Lda. (doravante S.........), com o NIPC 50........, alienaram a esta sociedade dois imóveis sitos na C........, inscritos na matriz sob o artigo…, anteriormente artigo .. e sob o artigo.., anteriormente artigo …., pelo preço, “já recebido”, de € 650.000,00 (cf. fls. 48 e segs. e fls. 135 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

B. A S......... exerce a actividade de compra e venda de bens imobiliários (cf. fl. 119 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

C. O Impugnante é seu gerente (cf. fl. 120 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

D. Com referência aos dois imóveis objecto do contrato referido na letra A supra, o Director Municipal havia emitido, em 3 de Agosto de 2004, notificação com o seguinte teor essencial (cf. fl. 54 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):


“(texto integral no original; imagem)”


E. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 0I200400530, de 3 de Janeiro de 2006, referente a IRS do ano de 2004, foi realizada uma inspecção aos Impugnantes, que terminou com a elaboração, em 25 de Novembro de 2008, de Relatório final de inspecção, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 30 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por egralmente reproduzido):


“(texto integral no original; imagem)”


“(texto integral no original; imagem)”

F. Sobre o Relatório final de inspecção referido na letra anterior, foi emitido parecer e proferido despacho concordantes, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 28 e 29 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

G. Ao requerimento que consubstancia o exercício do direito de audição prévia, os Impugnantes haviam junto “Cópia do Balanço da conta de sócios da S.........”, com o seguinte teor (cf. fls. 44 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).


«Imagem em texto no original»

H. Em 4 de Dezembro de 2008, a Administração Tributária emitiu liquidação adicional de IRS n.º 20........., relativo ao exercício de 2004 e respectivos juros compensatórios, no valor total de € 48.083,63 (cf. fls. 14 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

I. Em 4 de Fevereiro de 2009, foi emitida certidão de dívida n.º 2009/129577, em nome dos Impugnantes, referente a IRS do ano de 2004 e juros compensatórios, no montante total de € 48.083,63, com pagamento voluntário até 14 de Janeiro de 2009 (cf. fl. 20 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

J. Em 5 de Fevereiro de 2009, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 33……, para cobrança coerciva das dívidas referidas na letra anterior (cf. fl. 19 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

K. Em 2 de Fevereiro de 2009, os Impugnantes enviaram, via mensagem de correio electrónico dirigida à DGCI, a p. i. da presente impugnação judicial (cf. fl. 4 verso);

L. Apesar do que estava escrito na escritura, o valor de € 650.000,00 ficou em dívida; nunca foi pago aos Impugnantes, situação que estava espelhada na contabilidade da S......... (cf. depoimento da testemunha inquirida, contabilista da S.........);

M. A sociedade não tinha dinheiro; teve que contrair empréstimo para proceder à reabilitação dos imóveis; os Impugnantes entraram com dinheiro e venderam bens à sociedade; nunca houve lucros para distribuir (Idem).”



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Motivação

“Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos autos e do PAT apenso, atenta a fé que merecem e o facto de terem sido impugnados e no depoimento da testemunha inquirida, que se revelou isento e credível e prestado com conhecimento directo dos factos, na parte relevada, dada a sua razão de ciência e tendo sido suficientemente segura e coerente na exposição dos factos que relatou como advindos da sua qualidade de contabilista da S........., tal como referido em cada letra do probatório.”

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II.2 - De direito

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial e em consequência anulou o ato de liquidação impugnado - IRS n.º 20........., relativo ao exercício de 2004 e os respetivos juros compensatórios.

Discorda a Recorrente do teor da sentença recorrida, porquanto considera existir erro de julgamento, por no seu entender, da prova produzida e levada aos autos, não se

poderem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.

Na sua petição de impugnação, defenderem os Impugnantes (ora Recorridos) em síntese, não ser devido o valor liquidado, uma vez que “consta do Balanço da S........., na conta de sócios um crédito sobre a sociedade no valor de 650.000€, que corresponde ao valor da venda”; “não tendo os Contribuintes, aqui Impugnantes recebido, até à presente data esse rendimento não o podem declarar”; “no acto impugnado o rendimento nunca foi posto à disposição dos Impugnantes”; “não estão assim os aqui AA na previsão do art 31º nº 2 do CIRS, pelo que não devem ser tributados em sede de IRS” (cf. artigos 7.º e 8.º e 20.º e 21.º da p. i.).

Considerou o Tribunal a quo que a razão está do lado dos Recorridos, com a seguinte argumentação: “(…) No caso vertente, não tendo sido impugnado o documento junto com o requerimento que consubstancia o exercício do direito de audição prévia (cf. letra G do probatório), nem tendo sido arguida a falsidade do mesmo documento, no sentido de estar em dívida o preço de € 650.000,00, referente à compra dos imóveis, integra o referido documento declaração que constitui prova plena dessa dívida e que, assim, contraria ou anula a declaração confessória anterior dos Impugnantes, constante da escritura de compra e venda, já que torna fortemente verosímil a possibilidade de não corresponder à realidade a declaração de recebimento do preço feita pelos Impugnantes na escritura de compra e venda.

A circunstância de, face à prova testemunhal realizada, conjugada com o aludido documento, se ter provado que o valor de € 650.000,00 ficou em dívida; nunca foi pago aos Impugnantes, situação que estava espelhada na contabilidade da S......... (cf. letra L do probatório) e, bem assim, que a sociedade não tinha dinheiro; teve que contrair empréstimo para proceder à reabilitação dos imóveis; os Impugnantes entraram com dinheiro e venderam bens à sociedade; nunca houve lucros para distribuir (cf. letra M do probatório), gera fundada dúvida sobre o juízo de probabilidade elevado feito pela Administração Tributária para prova da existência do facto tributário.

Subsistindo dúvidas probatórias sobre a existência do facto tributário, as mesmas devem ser valoradas a favor do contribuinte (cf. artigo 100.º, n.º 1, do CPPT).

Pelo que, o acto de liquidação impugnado padece do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos fáctico-jurídicos que lhe vem assacado pelos Impugnantes na p. i., o que determina a sua anulação.”

A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, alegando em suma, que o Tribunal a quo errou ao considerou que os Impugnantes através do documento em G (da fundamentação de facto) e da prova testemunhal arrolada conseguiram criar a dúvida sobre a existência do facto tributário, tendo com esse fundamento decidido anular a liquidação em causa, com base no n.º 1 do artigo 100º do CPPT.

A Recorrente invoca que nos encontramos perante um ato de liquidação oficiosa que corporiza a fixação de matéria tributável não declarada, decorrente da alienação de
bens imóveis, e consequente tributação enquanto rendimento de mais valias.

Mais advoga a Recorrente nas suas conclusões de recurso, que não concorda com a decisão recorrido, pois a Autoridade Tributária procedeu a uma ação de inspeção que teve origem na Ordem de Serviço Interna OI200400530, de 03/01/2006, referente ao IRS de 2004, para averiguar os factos e consequentemente tributar de acordo com as opções efetuadas pelos Impugnantes (ora Recorridos).

Adensa a sua discordância do sentenciado, defendendo que resulta do probatório que os Impugnantes alienaram os bens imóveis, no ano de 2004, o que consta na escritura pública onde os Impugnantes declararam a venda, o valor da venda e o recebimento do preço por essa venda.

No entender da Recorrente tais factos não poderiam ter sido postos em causa, a menos que tivesse havido arguição de falsidade por parte dos Impugnantes sobre o documento da escritura, o que não aconteceu, pois apenas vieram juntar um balanço da sociedade adquirente, com um crédito sobre a sociedade pelos sócios (que são os próprios Impugnantes), no valor de € 650.000, correspondente ao valor da venda.

A Recorrente diz ainda nas suas conclusões de recurso, que a sentença recorrida é contrária ao Direito, à segurança jurídica e distorce a realidade dos factos, ao anular a liquidação por dúvidas atinentes ao facto tributário, nos termos do artigo 100º, n.º 1, do CPPT.

Na sua opinião, se o Tribunal entendeu que a escritura pública, não faz prova suficiente, do recebimento do preço, caberia sempre ao mesmo, “socorrer-se” dos circunstancialismos que revestem o ato da escritura pública, um ato solene.

Vejamos de que lado está a razão.

Comecemos pelo erro de julgamento de facto.

A Recorrente começa por impugnar o facto provado em L. (“Apesar do que estava escrito na escritura, o valor de € 650.000,00 ficou em dívida; nunca foi pago aos Impugnantes, situação que estava espelhada na contabilidade da S.........”), ao referir na alínea H. das conclusões de recurso, que “A declaração foi feita “…pelo preço, “já recebido”, de €650.000,00”, não há dúvidas que consistindo a declaração numa prova plena, com força probatória extrajudicial, porque corresponde a uma confissão na presença de um conservador civil, pelo que não soçobra com a apresentação do balanço da sociedade adquirente ou através da prova testemunhal.”

A Recorrente alega que o Tribunal a quo incorreu assim, em erro de julgamento de facto, uma vez que a factualidade considerada provada pela Meritíssima Juíza impunha uma decisão diferente da que foi tomada.

No entender da Recorrente, mal andou, o Tribunal a quo, ao considerar que “No caso vertente, não tendo sido impugnado o documento junto com o requerimento que consubstancia o exercício do direito de audição prévia (cf. letra G do probatório), nem tendo sido arguida a falsidade do mesmo documento, no sentido de estar em dívida o preço de € 650.000,00, referente à compra dos imóveis, integra o referido documento declaração que constitui prova plena dessa dívida e que, assim, contraria ou anula a declaração confessória anterior dos Impugnantes, constante da escritura de compra e venda, já que torna fortemente verosímil a possibilidade de não corresponder à realidade a declaração de recebimento do preço feita pelos Impugnantes na escritura de compra e venda.”.

No entanto, fá-lo sem cumprir os ónus do artigo 640º do CPC.

Vejamos porque assim o entendemos.

Importa, em primeiro lugar, ter presente que a impugnação da matéria de facto, tal como resulta do disposto no artigo 640.º do CPC, obedece a regras que não podem deixar de ser observadas. Em tal preceito se dispõe que:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Tem, por isso, de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida.

No caso vertente, conforme se extrai com clareza do teor das alegações de recurso, a Recorrente não cumpriu o ónus a que estava adstrita, limitando-se a convocar de forma absolutamente genérica e sem fazer alusão a qualquer alínea do probatório por que motivo a prova constante dos autos foi erradamente valorada. Note-se que no caso dos autos, houve lugar à produção de prova testemunhal e a Recorrente no seu quadro conclusivo nem tão-pouco a convoca.

É certo que no corpo das suas alegações alude ao depoimento das testemunhas, porém fá-lo de forma pouco definida e vaga, limitando-se a dizer que “Além do mais não nos parece que o recebimento do valor declarado fique minimamente beliscado com os elementos juntos pelos Impugnantes nestes autos, muito menos pela prova testemunhal realizada, o que existe é uma errada interpretação dos efeitos jurídicos e da aplicação da Lei e nessa sequência vimos suscitar que a sentença padece de erro de julgamento”, o que é manifestamente insuficiente para colocar em crise o depoimento das mesmas.

Acresce que quanto à credibilidade dos depoimentos consta na motivação da matéria de facto toda a ponderação que fundou o iter de fixação da matéria de facto, ou seja, o julgador exteriorizou o percurso lógico que o conduziu à formulação do juízo probatório sobre recorte probatório dos autos.

Aduza-se, em abono da verdade, que não são permitidos, recursos genéricos contra a matéria de facto assente pelo tribunal recorrido: o recurso não pode ser genérico atacando a matéria de facto no seu conjunto sem precisar os pontos concretos, nem pode ser genérico apontando para a prova em geral produzida no processo.

Ora, em face de todo o exposto, em consonância com o disposto, no nº1, alíneas a) e b) e 1ª parte da alínea a) do nº 2 do artigo 640º, impõe-se a rejeição, nessa parte, do recurso.

Aqui chegados, uma vez estabilizada a matéria de facto há, então, que apurar se a decisão recorrida padece de erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

Atenhamo-nos aos factos que relevam, ou seja, aqueles que antecedem a liquidação de IRS impugnadas, a saber:

- Por escritura de compra e venda outorgada em 22 de dezembro de 2004, os Impugnantes, por si e o Impugnante na qualidade de gerente e representante da S........., Lda. (doravante S.........), com o NIPC 50........, alienaram a esta sociedade dois imóveis sitos na C........, inscritos na matriz sob o artigo…, anteriormente artigo … e sob o artigo…, anteriormente artigo 68, pelo preço, “já recebido”, de € 650.000,00 [alínea A. dos factos provados];

- Os ora Recorridos entregaram a declaração de IRS relativa ao ano em análise, em 30.03.2005, constando da mesma os Anexos A, E e H [alínea E. dos factos provados];

- A S......... exerce a atividade de compra e venda de bens imobiliários [alínea A. dos factos provados];

- O Impugnante (ora Recorrido) marido é seu gerente [alínea C. dos factos provados];

- Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 0I200400530, de 3 de janeiro de 2006, referente a IRS do ano de 2004, foi realizada uma inspeção aos Impugnantes, que terminou com a elaboração, em 25 de novembro de 2008, de Relatório final de inspeção [alínea E. dos factos provados];

- Os ora Recorridos foram notificados no dia 12.11.2008 através do Ofício Notificação nº086901, de 11.11.2008, para o exercício do seu direito de audição prévia da proposta de correções na sequência da inspeção realizada ao seu IRS de 2004 [alínea E. dos factos provados];

- Direito que exercerem, no qual manifestaram a discordância da correção proposta, invocando os seguintes motivos:

“- No projeto de correcções do relatório de inspecção é considerado que, como está declarado na escritura outorgada no 2º Cartório Notarial de Lisboa, de 22 de Dezembro de 2004, os requerentes receberam o dinheiro do processo da S......... e devem declarar esse rendimento.

- Só que os contribuintes não o receberam. A S......... tem como únicos sócios os contribuintes e não teve até à data liquidez para proceder ao pagamento do preço, só o podendo fazer quando vender as fracções, o que não aconteceu até à presente data.

- Consta do Balanço da S......... na conta Sócios um crédito sobre a sociedade no valor de 650 000€, não tendo os contribuintes recebido até à presente data esse rendimento pelo que não o podem declarar.

- A obrigação de declaração do rendimento só se vence quando o rendimento entra na esfera patrimonial do contribuinte, tendo este uma expectativa jurídica de cobrar o seu crédito, mas a cobrança não acontece, não sendo assim aplicável o regime jurídico do número 2 do artigo 31º do CIRS, não tendo os contribuintes cometido qualquer infracção, pelo que o projecto de correcções em sede de IRS relativo a 2004 não proceder, sendo arquivado.” [alínea E. dos factos provados];

- Em 4 de Dezembro de 2008, a Administração Tributária emitiu liquidação adicional de IRS n.º 20........., relativo ao exercício de 2004 e respetivos juros compensatórios, no valor total de € 48.083,63.

Prosseguindo.

O ato de liquidação impugnado foi praticado na sequência de uma ação de inspeção em que a Administração Tributária constatou que os Impugnantes, no exercício de uma atividade comercial, alienaram dois imóveis, não tendo declarado o valor dessa alienação.

Sustentam os Impugnantes que não o fizeram porque nunca receberam qualquer quantia pela venda dos imóveis.

Importa não perder de vista que in casu, caberá à AT provar a existência e quantificação dos factos tributários, isto é, demonstrar os pressupostos de facto da sua atuação (artigo 74º, nº1 da LGT).

Quando a Administração Tributária se depara com o incumprimento ou cumprimento defeituoso dos deveres de colaboração: seja porque a declaração não foi apresentada; seja porque apresenta incorreções ou incongruências que permitem, só por si, duvidar objetivamente dos dados nela insertos; seja porque não foram apresentados, quando solicitados, todos os dados da escrita ou os documentos de suporte correspondentes e disponíveis não permitem aceder à verdade fiscal; seja porque, tendo sido apresentados, revelam desconformidade com o teor das declarações ou contêm outros indicadores de que não refletem a verdadeira situação patrimonial do contribuinte; seja porque, por último, não sendo obtidos esses indicadores a partir dos elementos do contribuinte, a divergência entre uns e outros é revelada por elementos colhidos da fiscalização cruzada a outros contribuintes ou resultantes do processamento de dados objetivos pela própria Administração Tributária, cessa a presunção de veracidade da declaração e emerge uma nova presunção: a presunção de legalidade das informações prestadas pela Administração Tributária, desde que devidamente fundamentadas e baseadas em dados objetivos (cf. artigo 76.º da LGT).

Caberá, então, ao contribuinte demonstrar os factos relevantes para a fixação da matéria coletável, nos pontos em que há deficiências nas declarações, contabilidade ou escrita, justificar o incumprimento dos seus deveres ou os indicadores obtidos de que a contabilidade não reflete a sua verdade fiscal, alegar e provar outros factos que ponham em dúvida a existência e quantificação do facto tributário (cf. artigo 100.º, n.º 1, do CPPT).

Cumpre, assim, averiguar se, in casu, é, ou não, sustentável alguma dúvida fundada sobre o cabimento da quantia em causa na norma de incidência do imposto.

Estatuía o artigo 3.º, n.º 1, alínea a), do CIRS, sob a epígrafe “Rendimentos da categoria B”:

“Consideram-se rendimentos empresariais e profissionais (…) os decorrentes do exercício de qualquer actividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária”.

Regra geral, o ganho considera-se obtido no momento em que são praticados os atos previstos no n.º 1 do artigo 10.º.

No caso de alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis, o ganho tem-se como obtido quando ocorrer a alienação do bem. Porém, outras situações especiais poder-se-ão verificar. Assim, pode acontecer que os interessados no negócio de venda celebrem, antes desta, um contrato promessa de compra e venda ou troca. Neste caso, logo que verificada a tradição ou posse do imóvel objeto do contrato (alínea a) do n.º 3 do artigo 10º), verifica-se o ganho objeto de tributação.

Concluímos assim que o conceito de transmissão relevante para efeitos fiscais mostra-se mais abrangente que para efeitos de direito privado e tem lugar independentemente da celebração da respetiva escritura, uma vez que em causa estão os aspetos económicos e não a titularidade dos bens.

Nos casos de afetação de um bem do património particular à atividade empresarial e profissional exercida pelo proprietário, a tributação do ganho é postergada para o momento da alienação onerosa que ocorra posteriormente ou para o momento em que ocorra um qualquer facto que determine o apuramento em condições análogas. A exigibilidade do imposto fica assim diferida para momento posterior, com vista a tributar a mais-valia efetivamente realizada (alínea b) do n.º 3 do artigo 10º).

Já no que respeita à mais-valia imobiliária tributada em sede de Categoria B (transferência para o património particular dos empresários de bens afetos à atividade), diz-nos o n.º 6 do artigo 3º do CIRS, que tais rendimentos ficam sujeitos a imposto desde que para efeitos de IVA, seja obrigatória a emissão de fatura ou documento equivalente, ou não se mostrando esta obrigatória, desde o momento do pagamento ou colocação à disposição dos respetivos titulares, sem prejuízo da aplicação do disposto no artigo 18º do IRC, sempre que o rendimento seja apurado numa base contabilística.

Se o regime de determinação da matéria colectável for o da contabilidade organizada, os rendimentos ficam sujeitos a imposto de acordo com o princípio da "competência económica", que conduz a contabilidade da empresa a registar créditos e dívidas e não recebimentos e pagamentos. No caso dos autos, não possuindo contabilidade organizada e não sendo sujeitos passivos de IVA, os Impugnantes vêem o IRS respeitante aos seus rendimentos da categoria B nascer só no momento do recebimento – cfr. Xavier de Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, p. 171 e ss..

Na construção do conceito de rendimento tributário, o CIRS adota um conceito de rendimento-acréscimo ou de rendimento em sentido lato, segundo o qual a base de incidência deste tributo abrange todo o aumento do poder aquisitivo do contribuinte (cf. artigo 1.º, n.º 1, do CIRS), no sentido de que o que releva para efeitos de tributação são “os acréscimos patrimoniais líquidos que afluem a um titular num determinado período” (cf. a José Guilherme Xavier de Basto, IRS Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra: Coimbra Editora, 2007, p. 42).

Como bem refere o Tribunal a quo: “Se a escritura de compra e venda referida na letra A do probatório não faz prova plena do pagamento do preço aos vendedores, ora Recorridos, fá-lo, no entanto, da sua declaração de terem recebido o preço, pois que a realidade da afirmação cabe nas perceções do notário (cf. artigo 371.º do CC), o que implica o reconhecimento de um facto que lhes é desfavorável, beneficiando a compradora e que os artigos 352.º e 358.º, n.º 2, do CC qualificam como confissão.”

De facto, não suscita dúvidas o teor do artigo 371º, n.º 1, do CC:
Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora;”.

Isto é, o documentador garante, pela fé pública de que está revestido, que os factos que documenta, se passaram; mas não garante, nem pode garantir, que os factos relatados e que resultam das suas perceções correspondem à verdade. Ou seja, designadamente no que se refere ao que foi afirmado perante ele, o documentador não garante a veracidade das declarações, a sua sinceridade, eficácia ou validade que os outorgantes fazem ao documentador; só garante que eles as fizeram (VAZ SERRA, RLJ, 111.º, p. 302.).

Consequentemente, o simples facto de se ter atestado que as partes declararam determinado preço e que o mesmo já tinha sido recebido, não resulta plenamente provado da escritura.

Porém, se é o vendedor que afirma, perante o notário, qual o montante do preço estipulado e afirma já o ter recebido entretanto, esta sua declaração de já ter recebido o preço implica o reconhecimento de um facto que lhe é desfavorável, o que a qualifica como confissão, nos termos do artigo 352º do CC.

Trata-se de uma confissão extrajudicial em documento autêntico, feita à parte contrária, admissível pela sua própria essência, que goza de força probatória plena contra o confitente, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 355º, n.ºs 1 e 4, e 358º, n.º 2 do CC.

Acontece que, a força probatória plena da confissão pode ser contrariada por meio de prova do contrário, nos termos do disposto no artigo 347.º do CC que dispõe: “A prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto (...)”.

Significa isto, “que o vendedor é admitido a destruir a força da confissão de haver recebido o preço mediante a prova de que, na realidade, o não recebeu; que o certo é outro facto contrário ao da afirmação que consciente e voluntariamente produziu perante o notário” – Ac do STJ de 3.06.99, CJSTJ, 1999, 2, 136.

Neste sentido, chamaremos à colação o acórdão deste STJ de 23.02.2010, proferido no processo n.º 566/06.1TVPRT.P1.S1, em cujo sumário se pode ler:

I – A prova testemunhal relacionada com convenção contrária ao conteúdo da escritura pública é de ter como admissível quando complementar (coadjuvante) de um elemento de prova escrito que constitua um suporte documental suficientemente forte para que, constituindo a base da convicção do julgador, se possa, a partir dele, avançar para a respectiva complementação.”

A jurisprudência dos tribunais superiores tem, porém entendido, maioritariamente, que quando houver determinado circunstancialismo, por exemplo um começo ou princípio de prova por escrito, que torne verosímil o facto a provar, contrário à declaração confessória, ficará aberta a possibilidade de complementar esse circunstancialismo mediante testemunhas, de modo a fazer a prova do facto contrário ao constante dessa declaração, ou seja, no caso, a prova de onde resulte não corresponder à realidade o afirmado recebimento da totalidade do preço (cf., por todos, acórdão do TRC de 9 de Janeiro de 2018, proferido no processo n.º 8470/15, disponível em www.dgsi.pt).

Deste modo, ao alegar que não receberam da compradora qualquer quantia referente à venda dos imóveis em causa, apesar de terem confessado exatamente o contrário na escritura, competia aos ora Recorridos a prova em contrário.

Regra que também encontramos no artigo 414º do CPC (anterior artigo 516º), a qual faz recair sobre o onerado com a prova de um facto a desvantagem da dúvida.

A norma é aplicável quando da prova produzida resultem fundadas dúvidas sobre a existência do facto tributário.

Nesta situação, cabia aos Impugnantes /Recorridos, fazer a contraprova a respeito dos mesmos factos, isto é, da quantificação dos seus rendimentos apurada pela AT, destinada a torná-los duvidosos e, conseguindo-o, a questão deve ser decidida contra a parte onerada com a prova. Esta é a regra que se extrai do artigo 346º do Código Civil e que também decorre do artigo 100º, nº 1 do CPPT.

Portanto, aos ora Recorridos não competia a demonstração do excesso na quantificação (como aconteceria se estivéssemos face a correções por métodos indiretos), bastando-lhe suscitar a dúvida sobre os factos que à AT competia provar.

No caso vertente, não tendo sido impugnado o documento junto com o requerimento que consubstancia o exercício do direito de audição prévia (cf. letra G do probatório), nem tendo sido arguida a falsidade do mesmo documento, no sentido de estar em dívida o preço de € 650.000,00, referente à compra dos imóveis, integra o referido documento declaração que constitui prova plena dessa dívida e que, assim, contraria ou anula a declaração confessória anterior dos Impugnantes, ora Recorridos, constante da escritura de compra e venda.

A circunstância de, face à prova testemunhal realizada, conjugada com o aludido documento, se ter provado que o valor de € 650.000,00 ficou em dívida; nunca foi pago aos ora Recorridos, situação que estava espelhada na contabilidade da S......... (cf. letra L do probatório) e, bem assim, que a sociedade não tinha dinheiro; teve que contrair empréstimo para proceder à reabilitação dos imóveis; os Impugnantes entraram com dinheiro e venderam bens à sociedade; nunca houve lucros para distribuir (cf. letra M do probatório).

Ora, diga-se em abono da verdade, que, da prova produzida nos autos, não resultou a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário nos termos do artigo 100º, nº 1, do CPPT, pois provou-se que os Recorridos não receberam a quantia de €650.000, correspondente ao valor da venda dos imóveis.
A obrigação tributária nasce com o recebimento, uma vez que só a partir desse momento a AT está em condições de exigir a prestação tributária do contribuinte.

Podemos assim dizer, que, não há facto tributário, "tout court".

Pelo que, nenhum reparo nos merece a decisão recorrida, ao concluir que “… o acto de liquidação impugnado padece do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos fáctico-jurídicos que lhe vem assacado pelos Impugnantes na p. i., o que determina a sua anulação.”, apesar de com fundamentação distinta.

Improcedem, por isso, as conclusões de recurso.

*

III. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 15 de julho de 2025.
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[Maria da Luz Cardoso]

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[Ângela Cerdeira]
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[Rui A. S. Ferreira]