Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1781/08.9BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 06/05/2025 |
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Relator: | FILIPE CARVALHO DAS NEVES |
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Descritores: | CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO INEXIGIBILIDADE DA DÍVIDA RESPONSÁVEL ORIGINÁRIO REVERSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL |
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Sumário: | I – O prazo para apresentações de alegações de recurso nos termos do art.º 282.º, n.º3 (na redação em vigor em 2017), sendo processual, suspende-se, designadamente, durante as férias judiciais (cf. art.º 20.º, n.º2 do CPPT e art.º 144.º - atual art.º 138.º - do CPC). II – A falta de notificação tout court das liquidações exequendas constitui fundamento legalmente admissível de oposição à execução fiscal, nos termos da alínea i) do n.º1 do art.º 204.º do CPPT. III – O art.º 158.º do CPPT refere-se à determinação do executado nos casos de impostos sobre a propriedade mobiliária ou imobiliária cujo elemento definidor da incidência objetiva é constituído pela posse, fruição ou propriedade de determinados bens. Não se trata de situações de responsabilidade subsidiária, visto que a pessoa contra quem será revertida a execução é devedor originário do imposto. IV – Tendo a AT revertido, ao abrigo do disposto no art.º 158.º do CPPT, as execuções fiscais contra o Recorrido para cobrança de dívidas respeitantes a Contribuição Autárquica relativas aos anos de 1996 a 2000, em que foi apenas o possuidor do respetivo prédio, tendo sido notificado das liquidações exequendas apenas quando foi citado em 21/04/2006, estava, então, decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação, sendo que a eventual notificação da anterior proprietária não é suficiente para se ter por impedido o decurso daquele prazo, pois que o revertido – ora Recorrido - é responsável originário e não responsável subsidiário pela dívida exequenda. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO A Fazenda Pública veio apresentar recurso da sentença proferida a 25/01/2017 pelo Tribunal Tributário de Lisboa («TTL»), que julgou procedente a oposição judicial deduzida por J…, melhor identificado nos autos, no processo de execução fiscal («PEF») n.º 3344299802009990 e apensos, contra si revertidos, depois de originariamente instaurados contra a sociedade «A… - Comércio de Automóveis e Acessórios Lda.», para cobrança de dívidas de Contribuição Autárquica («CA»), relativa aos anos de 1996, 1997, 1998, 1999 e 2000, no valor total de 8.499,10 Euros. A Recorrente apresentou alegações, rematadas com as seguintes conclusões: «I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a oposição à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, por ter considerado que encontrava verificada a caducidade do direito a liquidar todos os tributos. II - Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em saber se em saber se o oponente foi ou não notificado das liquidações de Contribuição Autárquica, para os anos de 1996 a 2000. III - A Fazenda como questão dirá que o meio não é o próprio, havendo erro na forma de processo pois o que foi apreciado não foi a inexigibilidade da dívida exequenda mas sim, a legalidade da mesma. IV - Quanto a este aspecto o Ac. do STA de 20/10/2010, ao qual se adere na integra à sua fundamentação e se transcreve na parte mais relevante, 7 - Em processo de oposição apertas pode ser discutida a falta de notificação ou a falta de notificação tempestiva (no prazo de caducidade) da liquidação dos tributos que constituem a dívida exequenda, na medida em que essas situações são susceptíveis de retirar eficácia ao acto notificado e impedir, desse modo, a exigibilidade da correspondente dívida. Já a discussão da caducidade do direito à liquidação em si na medida em que constitui matéria que contende com a legalidade desse concreto acto de liquidação, não é permitida em sede de oposicão por força do disposto no artigo 204°. n.° 1, alínea h). do CPPT" (bold e sublinhado nosso) - vide Ac. do STA de 20/10/2010, proferido no rec. n.° 01089/09 V - Mas, caso assim se não considere, a Fazenda dirá que a devedora originária foi notificada das notas de cobrança relativas à CA desde 1996 até 2000, conforme os documentos ora juntos, sendo que aquelas notas de cobrança nunca foram devolvidas ao Serviço de Finanças. VI - No aresto a que temos vindo a aludir, no parecer do DMMP é mencionado que "(...) A questão objecto do presente recurso prende-se com a exigibilidade em processo de execução fiscal das liquidações de contribuição autárquica e IMI nomeadamente saber se a lei impõe, ou não, a notificação dessas liquidações ao contribuinte. Alega a recorrente que na contribuição autárquica e no IMI, só a notificação ao contribuinte da liquidação efectuada dentro do prazo de caducidade impede a preclusão do direito de liquidar o imposto. E que o art° 10°, 6, do Código da Contribuição Autárquica e o art° 9º, 5 do CIMI, ao preverem como cominação para a não comunicação que o imposto seja devido, mesmo que materialmente a empresa esteja em condições de beneficiar da não tributação, são inconstitucionais, por violação do princípio da boa fé, do princípio da segurança jurídica e do princípio da proporcionalidade. Afigura-se-nos que o recurso não merece provimento. Como se sublinha no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18.09.2008, recurso 300/08, citado na decisão recorrida, «independentemente de notificação-interpelação, há mora do devedor, se a obrigação tiver prazo certo - cf., v.g. a alínea a) do n° 2 do artigo 805° do Código Civil. E, assim, se esse for o regime legal consagrado, a dívida de imposto pode tornar-se certa, líquida e exigível sem necessidade da respectiva notificação, logo após a sua liquidação». Ora a CA e o IMI são impostos periódicos que devem ser pagos durante o mês de Abril do ano seguinte àquele a que respeitam. Daí que só haja lugar a notificação da liquidação quando esta é feita fora do prazo legal ou é adicional. Nos demais casos, ocorrendo a liquidação no prazo normal, a dívida é exigível sem necessidade da respectiva notificação." - vide Ac. do STA de 20/10/2010, proferido no rec. n.° 01089/09 VII - Na verdade, o oponente carece de razão porquanto, a devedora originaria foi notificada das seguintes liquidação de CA: a) A liquidação de CA relativa a 1996, foi notificada em 10/03/1997, tendo como data limite de pagamento 30/04/1997, referente à 1.ª prestação; b) A liquidação de CA relativa a 1996, foi notificada em 10/03/1997, tendo como data limite de pagamento 30/09/1997, referente à 2.a prestação; c) A liquidação de CA relativa a 1997, foi notificada em 10/03/1998, tendo como data limite de pagamento 30/04/1998, referente à 1. a prestação; d) A liquidação de CA relativa a 1997, foi notificada em 10/03/1998, tendo como data limite de pagamento 30/09/1998, referente à 2. a prestação; e) Consta do resumo da nota de cobrança, para o ano de 1997 que a devedora originária pagou o montante de € 1.273,30, em 04/09/2008; f) A liquidação de CA relativa a 1998, foi notificada em 02/03/1999, tendo como data limite de pagamento 30/04/1999, referente à 1. a prestação; g) A liquidação de CA relativa a 1998, foi notificada em 02/03/1999, tendo como data limite de pagamento 30/09/1998, referente à 2. a prestação; h) Em relação à liquidação de 1998 de CA, a devedora originária pagou o montante de € 91,35, em 04/09/2008; i) A liquidação de CA relativa a 1999, foi notificada em 10/03/2000, tendo como data limite de pagamento 12/05/2000, relativa à 1. a prestação; j) A liquidação de CA relativa a 1999, foi notificada em 10/03/2000, tendo como data limite de pagamento 30/09/2000, relativa à 2. a prestação; k) A liquidação de CA relativa a 2000, foi notificada em 20/03/2001, tendo como data limite de pagamento 30/04/2001, relativa à 1. a prestação; l) A liquidação de CA relativa a 1999, foi notificada em 26/08/2001, tendo como data limite de pagamento 30/09/2001, relativa à 2. a prestação. VIII - Ora, as liquidações emitidas para a devedora originária não foram devolvidas ao Serviço de Finanças pelo que se presume que foram as mesmas recebidas, ou seja, a devedora originária foi notificada das mesmas. IX - Mas, caso assim não fosse, o art° 22.° da CA estipulava que “1 - Os serviços da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos enviarão a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, a competente nota de cobrança, com discriminação, em relação a cada município, dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor tributável e colecta. 2 - No mesmo período serão enviadas às camaras municipais da área da situação dos prédios, em suporte magnético ou por transferência electrónica, os elementos referidos no número anterior. 3 - Caso o contribuinte não receba a nota mencionada no n.° 1, deverá solicitar à repartição de finanças da área da situação dos prédios uma 2. a via." X - No aresto supra mencionado, ao qual aderimos na sua fundamentação e que transcrevemos "(…)3.1. Quanto à primeira questão, importa desde já salientar que o tribunal “a quo" configurou, e bem, a situação explanada pela oponente como sendo de falta de notificação da liquidação da CA e do IMI no prazo de caducidade, e não como caducidade do direito de liquidar esses tributos, integrando-a no fundamento de oposição previsto da alínea e) do n° 1 do artigo 204° do CPPT. Efectivamente, no processo de oposição apenas pode ser discutida a falta de notificação ou a falta de notificação tempestiva (no prazo de caducidade) da liquidação dos tributos que constituem a dívida exequenda, na medida em que essas situações são susceptíveis de retirar eficácia ao acto notificado e impedir, desse modo, a exigibilidade da correspondente dívida. Já a discussão da caducidade do direito à liquidação em si, na medida em que constitui matéria que contende com a legalidade desse concreto acto de liquidação, não é permitida em sede de oposição à execução fiscal por força do disposto no artigo 204°, n° 1, alínea h) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, uma vez que a lei concede a possibilidade de reacção contra a liquidação de impostos através dos meios contenciosos próprios – cfr. artigo 95.° da Lei Geral Tributária e artigos 97° e 102° do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Feito este breve enquadramento, resta-nos dizer que aderimos, sem reservas, à doutrina professada no acórdão proferido por esta Secção do Supremo Tribunal Administrativo em 18/09/2008, no processo n.° 0300/08, segundo a qual a liquidação de CA e de IMI, efectuada dentro do prazo normal, não carece de notificação ao sujeito passivo, bastando o envio do documento de cobrança aludido nos artigos 22° e 23° do CCA e nos artigos 119°e 120° do CIMI para tornara dívida exigível. Essa notificação do acto de liquidação apenas se impõe quando está em causa uma liquidação "fora do prazo normal" ou quando se trata de uma “liquidação adicional”. Como se deixou ali explicitado, justifica-se «que a falta de notificação da liquidação do tributo, no prazo de caducidade, constitua hoje abertamente fundamento expresso de oposição à execução fiscal - por força do disposto na alínea e) do n.° 1 do artigo 204 ° do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Com efeito, compreende-se, em tal hipótese, a necessidade de haver um meio de oposição à execução fiscal, sob pena de se postergar um direito inalienável dos interessados de serem notificados dos actos externos que lhes digam respeito. (...) E o fundamento de oposição, de não notificação da liquidação no prazo de caducidade, nada tem a ver com a apreciação, em concreto, da legalidade da liquidação da dívida exequenda, uma vez que não envolve apreciação da legalidade da liquidação, nem representa interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que extrai o título executivo (…) No entanto, a falta de notificação de uma liquidação pode ser que em nada contenda com a (i)nexigibilidade da obrigação liquidada. Pode acontecer que a obrigação se encontre já vencida, e, portanto, seja exigível independentemente da notificação da sua liquidação. Na verdade, a notificação da liquidação só é devida, quando legalmente imposta - valendo a notificação como interpelação para pagamento da obrigação liquidada, e ficando o contribuinte constituído em mora a partir de tal notificação. Sendo certo que, independentemente de notificação-interpelação, há mora do devedor, se a obrigação tiver prazo certo - cf., v. g., a alínea a) do n° 2 do artigo 805° do Código Civil. E, assim, se esse for o regime legal consagrado, a divida de imposto pode tornar-se certa, líquida e exigível sem necessidade da respectiva notificação, logo após a sua liquidação. Em relação à contribuição autárquica, o artigo 22° do Código da Contribuição Autárquica, na redacção do Decreto-Lei n° 211/90, de 27 de Junho, reza que «Os serviços da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos enviarão a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, a competente nota de cobrança, com discriminação, em relação a cada município, dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor tributável e colecta» [n.° 1]; «No mesmo período serão enviados às câmaras municipais e repartições de finanças da área da situação dos prédios listas contendo os elementos referidos no número anterior, que poderão ser aí consultadas pelos interessados» [n.° 2]; «Caso o contribuinte não receba a nota mencionada no n° 1, deverá solicitar à repartição de finanças da área da situação dos prédios uma 2. a via» [n.º 3], Diz o n° 1 do artigo 23° do mesmo Código da Contribuição Autárquica que «A contribuição deverá ser paga em duas prestações, nos meses de Abril e Setembro, desde que o seu montante seja superior a 50 000$00, devendo o pagamento, no caso desse montante ser igual ou inferior àquele limite, ser efectuado de uma só vez, durante o mês de Abril». E o n° 3 ainda deste artigo 23° do Código da Contribuição Autárquica reza do seguinte modo: «Sempre que a liquidação deva ter lugar fora do prazo normal e nos casos de liquidação adicional, o sujeito passivo será notificado para proceder ao pagamento, que deverá ter lugar até ao fim do mês seguinte ao da notificação, findo o qual passarão a ser devidos juros de mora». Como imediatamente se vê, a lei exige, dentro do prazo normal de liquidação-pagamento da contribuição autárquica, não a notificação formal (que sempre seria desproporcional, excessiva), mas o simples envio a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, da competente nota de cobrança: e, caso o contribuinte não receba a nota mencionada, deverá solicitar à repartição de finanças da área da situação dos prédios uma 2.a via dessa nota. [O regime acabado de descrever para a contribuição autárquica é, no essencial, idêntico ao que se encontra consagrado para o imposto municipal sobre imóveis (IMI), que veio suceder à contribuição autárquica - cf. os artigos 119° e 120° do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis].». No caso vertente, a oponente, ora recorrente, nunca invocou a falta de liquidação e/ou a falta de recebimento das notas de cobrança aludidas nos citados preceitos do CCA e do CIMI (as quais nunca foram, aliás, devolvidas ao Serviço de Finanças - cfr. ponto 6o do probatório) ou que as dívidas exequendas resultassem de liquidações efectuadas fora do prazo normal ou de liquidações adicionais, limitando-se a insistir que não foi notificado dos actos de liquidação desses tributos. Por conseguinte, não sendo legalmente devida a notificação de tais actos de liquidação ao sujeito passivo, bastando o envio das notas de cobrança para acautelara exigibilidade da respectiva obrigação tributária, não pode deixar de improceder a concernente conclusão do recurso." - vide Ac. do STA de 20/10/2010, proferido no rec. n.° 01089/09 XI - Assim sendo, a douta sentença do Tribunal ad quo padece de erro de julgamento, devendo ser revogada porquanto apreciou a caducidade do direito à liquidação quando não poderia e porque as liquidações, isto é, notas de cobrança foram emitidas e não devolvidas ao Serviço de Finanças, tendo sido notificado a devedora originária. Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a oposição improcedente, com as devidas consequências legais. PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA». * «I - Questão prévia - Da intempestividade do recurso 1. A douta sentença sob sindicância foi comunicada as partes em 26 de Janeiro de 2017. 2. A Recorrente foi notificada da admissão do recurso em 12 de Abril de 2017. 3. No entanto, a Recorrente só veio apresentar as suas alegações em 3 de Maio de 2017. 4. Dispõe o n° 3 do art.° 282.° do CPPT que "o prazo para alegações a efetuar no tribunal recorrido é de 15 dias...". 5. Pelo que, salvo melhor, está prescrito o direito ao recurso da Recorrente, devendo o mesmo ser julgado deserto. II - Da improcedência do recurso 6. Em todo o caso, e por dever de ofício, sempre se dirá que não assiste à Fazenda Pública/Recorrente a mínima razão pelos fundamentos alegados para a pretendida revogação da sentença do tribunal a quo, a qual deve ser confirmada in totum. 7. Com efeito, a sentença do tribunal de 1ª instância é exemplar, não merecendo a menor critica, pois, identifica com rigor e exaustivamente todas as questões de facto e de direito que lhe foram submetidas, decidindo de acordo com a Lei e a realidade. 8. O Tribunal a quo apreciou todos os argumentos de direito invocados pelo Opoente/Recorrido, decidindo inevitavelmente pela procedência daquele (fundamento de direito) que mais fere a sensibilidade dos juristas (a inexistência de um direito), refletindo a sentença um dos mais preciosos direitos fundamentais: a Justiça. 9. De facto, na ordem jurídica existem parâmetros que balizam a atuação das partes, como leis, regras e procedimentos, no sentido de evitar que se cometam injustiças por negligência ou dolo por parte de qualquer dos sujeitos da relação tributária, no caso. 10. Na doutrina e jurisprudência, é princípio adquirido de que o primeiro filtro da legalidade e da justiça é feito (deve ser) por quem tem a capacidade de intervir num processo de partes, apesar de não decidir, evitando o protelamento inútil de litígios, sempre com grave e manifesto prejuízo para a parte mais fraca. 11. Nos processos entre o Estado e os particulares, essa diferença de posição é óbvia, quer quanto aos custos processuais inerentes, quer relativamente às garantias (à prévia vantagem forçada) obtidas. 12. Salvo o devido respeito, o caso dos autos configura uma situação que não deveria ter ocorrido (continuado) por via deste recurso, na medida em que não assiste a menor razão à Fazenda Pública, tal como demonstram as suas equivocadas alegações. 13. Na verdade, o tribunal a quo decidiu da procedência da Oposição por efeito de se ter operado a caducidade do direito a exigir o pagamento de um imposto, 14. E por virtude do seu putativo obrigado (sujeito) a pagar, no caso, por reversão, não ter sido notificado nos prazos que imperativamente a Lei Tributário impõe (o CPT e a LGT). 15. A Fazenda Pública vem fundamentar as suas alegações numa circunstância jurídica que não ocorre, relacionada com o direito de liquidar um imposto, e apela à presuntiva prova da notificação do devedor originário. 16. Não é nada disto (objeto) que tratam os presentes e procedentes autos. 17. O direito à liquidação (Estado) dos impostos, não se confunde com o direito a notificação ao obrigado (contribuinte) ao seu pagamento, em tempo legal, sob pena de caducidade de tal direito, de resto, prazo previsto nas leis de um Estado de Direito. 18. Ora, na sequência desse equivocado raciocínio, com o devido respeito, vem a Fazenda Pública avocar ainda em defesa da sua tese, o erro na forma de processo, por inadmissibilidade do fundamento vencedor não se enquadrar na norma que cita. 19. Falece toda a argumentação da FP, quer relativamente ao direito de liquidar impostos - que não é matéria objeto de discussão nestes autos - quer quanto ao erro na forma de processo, alegação só admissível por consequência de equivocada conceção do primitivo argumento (fundamento). 20. O que parece decorrer deste recurso e das suas alegações, salvo o devido respeito, é a tentativa de trazer agora ao processo argumentos que poderiam ter sido invocados em sede de contestação da Oposição, faculdade que a Fazenda Pública não usou, como bem salienta a douta sentença do tribunal a quo e insuscetível de discussão nesta sede. Termos em que, deve o presente recurso interposto pela Fazenda Pública ser julgado deserto, por intempestivo, ou, caso assim não se entenda, deve o mesmo recurso ser julgado totalmente improcedente, confirmando-se in totum a douta sentença do Tribunal de 1.a Instância. ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA». * O Exmo. Magistrado do Ministério Público («EMMP») junto deste Tribunal, no parecer proferido, sustenta que se verifica a exceção de incompetência absoluta deste Tribunal em razão da hierarquia, sendo competente a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo («STA»), porquanto a matéria em recurso é exclusivamente de direito.Regularmente notificadas as Partes para, querendo, se pronunciarem quanto ao parecer do EMMP, nada vieram dizer ou requerer. * Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul para decisão.* O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cf. art.º 635.º, n.º 4 e art.º 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil - «CPC» - ex vi art.º 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - «CPPT»), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente. Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações dos Recorrentes, importa decidir se: - existe erro na forma do processo utilizado pelo Recorrido, porquanto em sede de oposição à execução fiscal não pode ser apreciado o vício de violação de lei consubstanciado na caducidade do direito à liquidação; - deve ser revogada a sentença proferida nos presentes autos por errada aplicação do direito, dado que a Recorrida foi devidamente notificada das liquidações de CA dos anos de 1996 a 2000; e, - as alegações recursivas são intempestivas. Mais importa decidir se este Tribunal é incompetente em razão da hierarquia para apreciar o presente recurso jurisdicional interposto da sentença recorrida. * III.A - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «a) O serviço de finanças de Lisboa - 1 instaurou o processo de execução fiscal n.º 3344299802009990 e apensos contra a sociedade A… - C… Ld.ª, para cobrança coerciva de créditos fiscais, provenientes de Contribuição Autárquica que incidiu sobre o imóvel inscrito na matriz urbana sob o artigo 2….º da freg. do Lumiar, relativa aos anos de 1996, 1997, 1998, 1999 e 2000, no valor global de € 8.499,10 (oito mil, quatrocentos e noventa e nove euros e dez cêntimos) - certidões de dívida de fls. 17 a fls. 26 dos autos e aviso citação da devedora originária de fl s. 33 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos. b) Em sede do processo de execução fiscal, identificado na alínea antecedente, em 18/01/2006 foi emitido mandato de penhora dos bens pertencentes à devedora originária, para pagamento da quantia exequenda e acrescidos - mandato de fls. 35 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido; c) Em 24/05/2006, é lavrado auto de diligências constatando que o mandato de penhora não foi cumprido, em virtude de não terem sido encontrados quaisquer bens, se ter verificado que a executada não tem actividade desde 31/12/2001 e que o imóvel encontrado (pré-fabricado) foi vendido - auto de diligências de fls. 36 e 37 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido. d) Em 21/04/2006 foi prestada informação no processo de execução fiscal de que o contribuinte J…, NIF n.º 1… foi legítimo possuidor do imóvel, que originou a dívida objecto da execução fiscal, dados que foram comprovados pelos documentos fornecidos pela Câmara Municipal de Lisboa em 11/07/2006 - ofício de citação de fls. 38 dos autos e documentos juntos de fls. 39 a fls. 49 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos. e) Em 13/10/1995, o ora oponente, na qualidade de sócio gerente da sociedade S… - Comércio de Automóveis Ld.ª foi autorizado pelo Município de Lisboa a ocupar, a título precário, um terreno municipal situado na Av.º Padre Cruz, para instalar um “stand” de automóveis com 300 m2 de área coberta e 150 m2 de área descoberta - citados documentos juntos de fls. 3 9 a fls. 49 dos autos. f) Em 10/11/2000, o ora oponente pediu ao Município de Lisboa para alterar a titularidade da concessão, descrita na alínea antecedente para a sociedade R… - Comércio de Automóveis Ld.ª, mantendo-se a mesma morada - doc. de fls. 50 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido. g) Por despacho, datado de 21/04/2006, o ora oponente foi citado para os termos do processo de execução fiscal e apensos, identificados em a), nos seguintes termos: “Fica V. Ex.ª por este meio citado, nos termos e com as formalidades prescritas nos artigos (...) de que é executado por REVERSÃO, nos termos do artigo 160.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, na qualidade de possuidor de bens, para no prazo de 30 dias, a contar da citação pagar (...)a quantia de € 8.499,10 (oito mil, quatrocentos e noventa e nove euros e dez cêntimos e do acrescido, por dívida de CA, dos anos de 1996 a 2000, de que era devedor A… Ld.ª (...)” - ofício de citação de fls. 38 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido;» * A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:«1 - Que o ora oponente foi notificado para o exercício de audição prévia, antes da prolação do despacho de reversão/citação. 2 - Que o ora oponente foi notificado dos tributos ora cobrados coercivamente, em data anterior ao da sua citação para os termos da execução fiscal, id. em 4.1.a) - consulta dos autos.». * Mais resulta consignado em termos de motivação da matéria de facto o seguinte:«Resultou a convicção do Tribunal da análise dos documentos juntos aos autos, supra identificados a propósito de cada uma das alíneas do probatório, nomeadamente, certidões de dívida, mandato de penhora, auto de diligências e ofícios de citação. Quanto aos factos dados como não provados, resultou a convicção do Tribunal da ausência de prova dos mesmos, por parte da AT, sendo certo que era esta que se encontrava onerada com a referida prova. Efectivamente, todo o acto tributário necessita de ser notificado para produzir plenos efeitos na esfera jurídica do destinatário (artigos 77.º, n.º6 da LGT e 36.º, n.º1 do CPPT). E, o ónus de demonstrar que fez a notificação, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais, cabe à entidade exequente. Conclui-se assim que, alegando o oponente que, nunca foi notificado dos tributos subjacentes execução (artigo 74.º da LGT), cabia à entidade exequente o ónus da prova da quelas notificações, que não cumpriu, pois que, não juntou aos autos qualquer elemento que prove ter em sido expedidas cartas para notificação do ora oponente.». * III.B De DireitoInsurge-se a Recorrente contra a sentença recorrida por, alegadamente, padecer de erro de julgamento, concretamente em relação à conclusão quanto à falta de notificação das liquidações subjacentes ao apuramento dos créditos exequendos. Vem, assim, a Recorrente peticionar a revogação da sentença que recaiu sobre a oposição à execução fiscal apresentada no PEF n.º 3344299802009990 e apensos, defendendo, em suma, que in casu se pode concluir que não se verifica a falta de notificação das liquidações em referência. Mais alega que se verifica a exceção de erro na forma do processo, dado que em sede de oposição à execução fiscal está vedada a apreciação do vício de violação de lei consubstanciado na caducidade do direito à liquidação. Por seu turno, advoga o Recorrido, por um lado, que as alegações de recurso são intempestivas, e, por outro, que a sentença recorrida não padece dos vícios que lhe são assacados nas conclusões recursivas, devendo ser mantida na ordem jurídica. Sustenta, ainda, o EMMP que este Tribunal é incompetente em razão da hierarquia, devendo os autos ser remetidos ao Supremo Tribunal Administrativo («STA») por estar unicamente em dissídio uma «questão de direito». Assim, tendo sido suscitada pelo EMMP no parecer proferido a incompetência deste Tribunal em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, cumpre, antes de mais, apreciar esta questão, pois a infração às regras de competência em razão da hierarquia determina, nos termos do disposto no art.º 16.º, n.º 1 do CPPT, a incompetência absoluta do tribunal. Seguidamente, em caso de improcedência da sobredita questão, por razões de precedência lógica, a ordem de apreciação dos vícios invocados nesta sede será a seguinte: (i) intempestividade das alegações de recurso; (ii) erro na forma do processo; e, (iii) erro de julgamento. Apreciemos, então. Da incompetência deste Tribunal em razão da hierarquia A competência do Tribunal em razão da hierarquia constitui questão que o tribunal deve conhecer oficiosamente ou mediante arguição, com prioridade sobre qualquer outra, até ao trânsito em julgado da decisão final (cf. acórdão do STA de 09/04/2014, proc. n.º 0161/14, disponível em www.dgsi.pt). Se face às conclusões de recurso, podemos constatar que as questões controvertidas se resolvem mediante uma exclusiva aplicação e interpretação de normas jurídicas, então será competente o STA; pelo contrário, será competente o Tribunal Central Administrativo se aquelas questões implicam a necessidade de dirimir questões de facto «seja por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, seja porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, seja ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos» (cf. o acórdão do STA acima citado). O critério jurídico para diferenciar se estamos perante uma questão de direito ou uma questão de facto, passa por saber se o recorrente faz apelo, nos fundamentos do recurso substanciados nas conclusões, apenas a normas ou princípios jurídicos que tenham sido na sentença recorrida supostamente violados na sua determinação, interpretação ou aplicação, ou se, por outro lado, também apela à consideração de quaisquer factos materiais ou ocorrências da vida real, independentemente da sua pertinência, merecimento ou acerto para a solução do recurso. Vejamos, agora, o caso em apreço. Nas conclusões das alegações de recurso ora apresentadas, verifica-se que a Recorrente, insurge-se contra a decisão recorrida também por deficiente apreciação e valoração dos factos, discordando do decidido no que respeita ao juízo de apreciação da prova efetuada pelo Tribunal recorrido. É que vindo questionada, designadamente, a valoração feita pelo Tribunal a quo da factualidade relevante associada à questão da notificação das liquidações subjacentes aos créditos de CA exequendos, é evidente a conclusão que se encontra também em discussão matéria de facto. Desta forma, e sem necessidade de mais amplas considerações, se conclui que os fundamentos do presente recurso não versam exclusivamente sobre matéria de direito, pelo que improcede a questão prévia de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia, suscitada pelo EMMP. Da intempestividade das alegações de recurso Neste âmbito, sustenta o Recorrido, fundamentalmente, que as alegações recursivas foram apresentadas pela Recorrente já após o prazo de 15 dias consignado no n.º 3 do art.º 282.º do CPPT (na redação vigente à data). Vejamos. Estabelecia o n.º2 do art.º 282.º do CPPT, na redação aplicável, que «O despacho que admitir o recurso será notificado ao recorrente, ao recorrido, não sendo revel, e ao Ministério Público», mais determinando o seu n.º3 que «O prazo para alegações a efetuar no tribunal recorrido é de 15 dias contados, para o recorrente, a partir da notificação referida no número anterior e, para o recorrido, a partir do termo do prazo para as alegações do recorrente.». Ora, na sequência da apresentação pela Recorrente de recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal a quo, foi em 04/04/2017 proferido despacho quanto à respetiva admissão, tendo, além do mais, sido ordenada a notificação das Partes nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 282.º, n.ºs 2 e 3 do CPPT (cf. fls. 192 na numeração SITAF). A notificação da Recorrente nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 282.º, n.ºs 2 e 3 do CPPT foi emitida pelo Tribunal a quo em 12/04/2017 (cf. fls. 194 na numeração SITAF), dispondo, portanto, de 15 dias para apresentar as alegações de recurso. Este prazo, sendo processual, suspende-se, designadamente, durante as férias judiciais (cf. art.º 20.º, n.º2 do CPPT e art.º 144.º - atual art.º 138.º - do CPC). Considerando que no ano de 2017 as férias judiciais decorreram entre 09/04/2017 e 17/04/2017 (cf. art.º 28.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário – Lei n.º 62/2013, de 26/08), verifica-se que o prazo para apresentar as alegações de recurso apenas começou a decorrer em 18/04/2017 e terminou em 02/05/2017. Conforme resulta de fls. 196 do SITAF, as alegações de recurso deram entrada no Tribunal a quo em 02/05/2017, razão pela qual se conclui que foi observado o supra indicado prazo de 15 dias plasmado no n.º3 do art.º 282.º do CPPT. Assim sendo, e sem necessidade de mais nos alongarmos, concluímos que as alegações recursivas foram tempestivamente apresentadas, pelo que improcedem estas alegações do Recorrido. Do erro na forma do processo Pugna a Recorrente, no que respeita a este vício, pela ocorrência de erro na forma processual utilizada pelo Recorrido, dado que em sede de oposição à execução fiscal não é admissível, tendo em conta o elenco de fundamentos taxativos consignado no art.º 204.º do CPPT, a apreciação do vício de violação de lei consubstanciado na caducidade do direito a liquidação. Sustenta o Recorrido, em suma, que o que está em causa é sim a falta de notificação das liquidações de CA exequendas e que esse fundamento ínsito na oposição à execução fiscal é legalmente admissível. Vejamos. Também aqui facilmente constatamos que não tem razão a Recorrente: é que através da leitura da oposição à execução fiscal apresentada e da sentença recorrida, verificamos que o que foi alegado e apreciado pelo Tribunal a quo foi precisamente a falta de notificação das liquidações exequendas, e não a caducidade do direito à liquidação. E a falta de notificação das liquidações exequendas constitui fundamento legalmente admissível de oposição à execução fiscal. Senão vejamos. Os fundamentos da execução fiscal são os taxativamente indicados nas várias alíneas do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT. A alínea e) do mencionado art.º 204.º, n.º 1, prevê como fundamento de oposição a «[f]alta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade». Este fundamento é utilizável nos casos em que foi efetuada uma notificação válida, mas ela não foi feita dentro do prazo de caducidade, situação em que, independentemente do ato de liquidação notificado enfermar ou não de qualquer vício, ele não produz efeitos em relação ao destinatário, por a notificação não ser efetuada dentro do prazo previsto na lei. Por seu turno, é fundamento de oposição constante na alínea i) do citado art.º 204.º, n.º 1 do CPPT a falta de notificação do ato de liquidação. Verificando-se a falta de notificação do ato que subjaz à instauração da execução fiscal, estar-se-á perante uma omissão de um ato imposto por lei, necessário para assegurar a sua eficácia, nos termos das citadas normas legais, que se reconduz ao fundamento previsto na alínea i) do mencionado art.º 204.º, n.º 1 do CPPT. Sobre a diferenciação da falta de notificação da liquidação do tributo no prazo da caducidade e a falta de notificação da liquidação tout court, e a possibilidade de o Tribunal, face ao acervo probatório, enquadrar a factualidade alegada nas alíneas e) ou i) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, pronunciou-se já o STA, em acórdão de 02/06/2010, no proc. n.º 0181/10, disponível para consulta em www.dgsi.pt, do seguinte modo: «A notificação da liquidação do ato tributário constitui um requisito de eficácia do mesmo, sendo inexigível a prestação tributária enquanto aquela não ocorrer. Uma vez que essa ausência de notificação ficou provada, era lícito ao juiz aplicar a norma jurídica adequada, no caso, a norma do artº 204º, nº 1, alínea i) do CPPT. É certo, como se referiu, que os factos da petição poderiam conduzir ao preenchimento do fundamento da alínea e) do nº 1 do mesmo artigo. Mas, o facto invocado e apurado em sede factual, aliado ao conhecimento oficioso da data da instauração da execução, permitia também a aplicação do fundamento legal que veio a ser adotado na sentença. E, como o juiz se serviu de facto alegado pela recorrida e de ato processual de conhecimento oficioso, e não está obrigado, quanto ao direito, à aplicação das normas invocadas pelas partes, tendo-se o tribunal a quo limitado a operar uma nova qualificação jurídica, face ao preceituado no artº 204º do CPPT – jus novit curia -, concluímos que não foi cometido o vício de excesso de pronúncia a que se refere o artº 668º, nº 1, alínea d) do CPC.». Bem como em acórdão posterior, de 28/09/2011, no proc. n.º 0473/11, igualmente disponível para consulta em www.dgsi.pt: «Nos casos em que não foi efetuada validamente uma notificação da liquidação e, se não se demonstrar que houve uma notificação validamente efetuada, estará afetada a eficácia da liquidação (arts. 77.º, n.º 6, da L.G.T. e 36.º, n.º 1, do C.P.P.T.), o que justificará a procedência da oposição, por se estar perante um fundamento de oposição enquadrável na alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do C.P.P.T. De qualquer forma, nada impede que nos autos se aprecie a oposição à face deste enquadramento, uma vez que o Tribunal não está sujeito às alegações das partes, no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artº. 664.º do C.P.C.). Ora, pelo que acima ficou dito, não estando provada a realização de qualquer notificação válida, o ato de liquidação tempestivamente efetuado é ineficaz, o que determina a procedência da oposição e a consequente extinção da execução, tal como foi decidido em 1ª instância.». E assim sendo, não se afigurando necessário maior e mais aprofundada elaboração quanto a esta questão suscitada pela Recorrente, concluímos que improcedem também estas alegações recursivas. Do alegado erro de julgamento Insurge-se a Recorrente contra o julgado pelo Tribunal a quo alegando, fundamentalmente, que as liquidações emitidas para a devedora originária não foram devolvidas ao Serviço de Finanças, pelo que se presume que foram as mesmas recebidas, ou seja, a devedora originária foi notificada das mesmas. Ou seja, na perspetiva da Recorrente deve considerar-se que a sociedade devedora originária foi validamente notificada das liquidações exequendas ou, caso assim não se entenda, que deveria a devedora originária ter solicitado no Serviço de Finanças uma 2.ª via das notas de liquidação, nos termos do n.º2 do art.º 22.º do Código da CA. Vejamos, então, se assiste razão à Recorrente. Adiantando, desde já, a nossa posição, consideramos que também aqui não tem razão a Recorrente. Expliquemos porquê. Comecemos por recuperar o discurso fundamentador gizado na sentença recorrida para motivar a decisão de procedência da oposição à execução fiscal apresentada: «Sobre a questão em apreciação, cumpre ressaltar que, a notificação relevante para efeitos de obstar à caducidade do direito de liquidação é a relativa ao contribuinte, o sujeito passivo originário do tributo (e não a dos outros responsáveis subsidiários ou solidários). E, à face da LGT, o facto que obsta à caducidade é a notificação do contribuinte, devedor originário no prazo de 4 anos (artigo 45.º, n.º1). Por isso, ocorrendo essa notificação não é necessária a notificação de qualquer outra pessoa para obstar à ocorrência da caducidade. Assim e, no que concerne às notificações ou citações dos responsáveis solidários ou subsidiários, não lhes reconhecendo a lei qualquer relevo para efeitos de caducidade, é indiferente que ocorram após o termo desse prazo (neste sentido vide os acórdãos do STA de 18/05/2005, processo n.º 381/05 e de 02/11/2005, processo n.º 361/05). Contudo, diferente da situação de citação de responsáveis subsidiários é a citação do revertido na sequência de reversão com fundamento em posse, fruição ou propriedade dos bens, a que se referem a alínea b) do n.º1 do artigo 204.º e o n.º do artigo 158.º do CPPT, conforme ocorre in casu. Na verdade, o verdadeiro possuidor, fruidor ou proprietário, contra quem possa reverter a execução, com fundamento no facto de a dívida exequenda ser anterior/posterior a essa posse, fruição ou propriedade é um responsável originário e não subsidiário, pelo que, o que releva para efeitos de caducidade do direito de liquidação é a sua própria notificação ou citação. “Por se tratar de uma responsabilidade originária e não subsidiária, o que releva para efeitos de afastar a caducidade do direito de liquidação é a notificação ou citação da pessoa contra quem reverte a execução e não a daquela contra quem foi originariamente dirigida a execução”(Jorge Lopes de Sousa, em “op. cit., loc. cit.”). No caso em apreço, conforme decorre do probatório, o ora oponente não foi notificado da liquidação em momento anterior ao da sua citação para os termos da execução, o que ocorreu em data não apurada após 21/04/2006. Assim, tendo em conta que os tributos em causa se referem aos anos de 1996 a 2000 e que são impostos periódicos, os respectivos prazos de caducidade iniciaram-se respectivamente em 31/12/1997, 31/12/1998, 31/12/1998, 31/12/1999 e 31/12/2000 (artigo 45.º, n.º4 da LGT). E, o termo do prazo de caducidade dos tributos em apreço ocorreu cinco anos após as referidas datas, quanto aos tributos relativos a 1997, 1998 e 1999, por lhes ser ainda aplicável o disposto no artigo 33.º do CPT, e quatro anos após aquelas datas, quanto aos tributos referentes aos anos de 1999 e 2000, por lhes ser aplicável o disposto no artigo 45.º da LGT. Em conclusão: em 31/12/2004, já se encontrava verificada a caducidade do direito de liquidar todos os tributos. Assim e, uma vez que o ora oponente não se pode considerar regularmente notificado dos tributos em data anterior ao da sua citação, o que ocorreu em 2006, na referida data, a notificação da liquidação dos tributos já foi efectuada fora do prazo de caducidade. Do exposto se conclui que, se encontra preenchido o fundamento previsto no artigo 204.º, n.º1, alínea e) do CPPT da falta de notificação da liquidação dos tributos, subjacentes à execução, no prazo de caducidade.». E o assim decidido pelo Tribunal a quo não manifesta qualquer desacerto na aplicação do direito à factualidade assente nos presentes autos, que, diga-se, não vem impugnada pela Recorrente. Senão vejamos. O n.º 1 do art.º 21.º do revogado Código da CA, dispunha, na redação à data dos factos: «1. Só poderão ser efetuadas ou corrigidas liquidações, ainda que adicionais, nos 5 anos seguintes àquele a que a contribuição respeita». Por sua vez, o art.º 45.º da LGT dispõe que: «1. O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro. (...) 4. O prazo de caducidade conta-se, os impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu». Estão em causa, no presente caso, as liquidações de CA dos anos de 1996 a 2000, relativas ao prédio inscrito na matriz urbana sob o artigo 2624.º da freguesia do Lumiar (cf. alínea a) do probatório). Ressalta também da factualidade assente que nos anos de 1996 a 2000 a devedora da CA era a sociedade A… - Comércio de Automóveis e Acessórios Lda. tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira («AT») instaurado contra si as execuções fiscais em causa para cobrança coerciva dos respetivos valores (cf. alíneas a), b) e c) do probatório). Com efeito, nos termos do art.º 8.º do Código da CA, a contribuição era devida pelo proprietário do prédio em 31 de dezembro do ano a que a mesma respeitasse (cf. n.º 1 desse normativo), presumindo-se proprietário ou usufrutuário, para efeitos fiscais, quem, naquela data, como tal figurasse ou devesse figurar na matriz ou, na falta de inscrição, quem em tal data tivesse a posse do prédio (cf. n.º 4 da citada norma). Decorre, ainda, do probatório que perante a impossibilidade de identificar bens suscetíveis de penhora da sociedade A… - Comércio de Automóveis e Acessórios Lda. (cf. alíneas b) e c) dos factos provados), foi exarada informação na execução fiscal de que o Recorrido foi legítimo possuidor do imóvel sujeito a tributação em sede de CA nos anos em causa (cf. alínea d) do probatório). E, assim, tal como dimana da nota de citação, o chamamento, por via do acionamento por parte da AT do instituto da reversão, do Recorrido à execução fiscal resulta da «sua qualidade de possuidor de bens» (cf. alínea g) da factualidade assente). Esta reversão foi, assim, executada ao abrigo do disposto no art.º 158.º do CPPT, cujo n.º 2 estatui que se nas execuções por impostos sobre a propriedade mobiliária ou imobiliária, se verificar que os títulos de cobrança foram processados em nome do antigo possuidor, fruidor ou proprietário, o funcionário ou outra pessoa que deva realizar a citação informará quem foi o possuidor, fruidor ou proprietário dos bens durante o período a que respeita a divida exequenda, para que o órgão da execução fiscal o mande citar, se for caso disso, segundo as leis tributárias. Porém, como se diz na sentença recorrida, tendo o Recorrido sido notificado das liquidações em causa apenas quando foi citado para a execução fiscal em 21/04/2006, estava, então, já transcorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação da CA. Tal como se aponta na sentença recorrida, «tendo em conta que os tributos em causa se referem aos anos de 1996 a 2000 e que são impostos periódicos, os respectivos prazos de caducidade iniciaram-se respectivamente em 31/12/1997, 31/12/1998, 31/12/1998, 31/12/1999 e 31/12/2000». Donde, o termo do prazo de caducidade dos tributos em apreço ocorreu cinco anos após as referidas datas, quanto aos tributos relativos a 1996, 1997 e 1998, por lhes ser ainda aplicável o disposto no art.º 21, n.º1 do Código da CA, e quatro anos após aquelas datas, quanto aos tributos referentes aos anos de 1999 e 2000, por lhes ser aplicável o disposto no art.º 45.º da LGT. Em consequência, como acima se apontou, quando o Recorrido rececionou as liquidações em referência já se encontrava decorrido o prazo de caducidade. A eventual notificação da proprietária não é suficiente para se ter por impedida a caducidade do direito à liquidação, à semelhança do que sucede nas situações de reversão contra os responsáveis subsidiários em que, como se sabe, é bastante para impedir a caducidade a notificação do responsável originário. Com efeito, como refere Jorge Lopes de Sousa (in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. III, 6ª edição, Áreas Editora, 2011, anotação 3 ao art.º 158.º, pág. 102) não se tratando de situações de responsabilidade subsidiária, mas, antes de responsabilidade originária «o que releva para efeitos de afastar a caducidade do direito de liquidação é a notificação ou citação da pessoa contra quem reverte a execução e não a daquela contra quem foi originariamente dirigida a execução». Também neste sentido, veja-se o acórdão do STA de 09/05/2012, proc. n.º 0911/11, disponível em www.dgsi.pt, no qual se sumariou: «Tendo a AT instaurado execução fiscal contra um contribuinte, para cobrança de dívida respeitante a Contribuição autárquica relativa a período decorrido entre os anos de 1994 a 1999, em que o mesmo já não era o proprietário dos respectivos prédios, tendo posteriormente a execução revertido contra a impugnante, ao abrigo do disposto no art. 158º do CPPT, e tendo esta sido notificada das liquidações apenas quando foi citada para a execução fiscal em 22/8/2005, estava, então, decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação, sendo que a eventual notificação da anterior proprietária não será suficiente para se ter por impedida a caducidade, pois que a revertida é responsável originária e não responsável subsidiária pela dívida exequenda.». E no caso dos autos, perscrutando a factualidade assente e perfeitamente estabilizada, não ficou provado que o Recorrido tenha sido notificado das liquidações de CA em causa em momento anterior à sua citação, o que seria essencial para sustentar a sua exigibilidade, nos termos acima melhor explanados. E também não se vê que obste à conclusão que acima foi retirada a circunstância de a proprietária não ter solicitado no Serviço de Finanças a 2ª via da nota de cobrança (cf. n.º 3 do art.º 22.º do Código da CA), tendo em conta o que acima se deixou dito quanto à natureza originária da responsabilidade do revertido nos termos do art.º 158.º do CPPT. Pelo que, perante o exposto, concluímos que a sentença recorrida julgou com acerto esta questão atinente à falta de notificação das liquidações de CA no prazo de caducidade, razão pela qual improcedem também estas conclusões da Recorrente, não merecendo, assim, provimento o recurso jurisdicional apresentado, sentido em que adiante se decidirá. * IV- DECISÃO Termos em que acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso. Custas pela Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 5 de junho de 2025 (Filipe Carvalho das Neves) (Susana Barreto) (Lurdes Toscano) |