Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1525/16.1BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 01/09/2025 |
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Relator: | MARIA DA LUZ CARDOSO |
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Descritores: | IRS SEGURO DE VIDA RESGATE ANTECIPADO PROVA |
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Sumário: | I - Nos termos da subalínea 3 da alínea b) do n.º 3 do artigo 2º do CIRS, as importâncias despendidas pela entidade patronal com a constituição a favor dos seus trabalhadores de seguros de vida, se estes forem objeto de resgate antecipado pelos beneficiários, são considerados rendimentos do trabalho dependente sujeitos a tributação. II - A prova de que houve uma antecipação de resgate, pertence à AT, pois que recai sobre ela o ónus de prova dos pressupostos legais da sua atuação vinculada, ou seja, da demonstração dos pressupostos de tributação dos rendimentos auferidos pelo beneficiário a título de resgate de seguro de vida grupal. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | I - RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente), veio interpor recurso da sentença proferida em 22 de fevereiro de 2024 pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por C......., (doravante Recorrido) na sequência do indeferimento da reclamação graciosa que teve por objeto as retenções na fonte efetuadas ao aqui Impugnante pela sociedade G....... S.A. referente a alegados rendimentos das Categorias A de IRS e à Apólice n.º ........1, no valor global de € 58.902.72, tendo determinado a anulação dos atos tributários impugnados e reconhecido o direito do Impugnante à restituição do imposto indevidamente pago e ao recebimento de juros indemnizatórios, computados desde a data do indeferimento da reclamação graciosa. Com o requerimento de interposição do recurso, a Recorrente apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: “Das Conclusões I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a impugnação deduzida por C.........., com o NIF n.º ..........6, na sequência do indeferimento da reclamação graciosa que teve por objeto as retenções na fonte efetuadas ao aqui Impugnante pela sociedade G.......S.A. referente a alegados rendimentos das Categorias A de IRS e à Apólice n° ........1, no valor global de € 58.902.72. II. Por sentença datada de 22-02-2024, ora recorrida, foi a presente instância julgada procedente fundada no entendimento de que “(…) A prova dos correspondentes factos pertence à AT, pois que recai sobre ela o ónus de prova dos pressupostos legais da sua actuação vinculada, ou seja, da demonstração dos pressupostos de tributação dos rendimentos auferidos pelo beneficiário a título de resgate de seguro de vida grupal, tal como se decidiu no citado acórdão do TCA Sul de 16 de Novembro de 2023, proferido no processo n.º 896/07.5BEALM. Não existe facto tributário à luz das considerações expostas e verifica-se a ilegalidade substantiva das retenções na fonte impugnadas.” III. A questão a decidir é a de saber se em face dos factos dados como provados o ato de liquidação em crise nos presentes autos padece do vicio de violação de lei (artigos 2.º, nº 3, alínea b), ponto 3, do Código do IRS, 74.º e 75.º, n.º 1, e alínea b), ambos do Código do IRS), suscetível de determinar a sua anulação, como propugna do tribunal a quo. Ou se, pelo contrario, a liquidação controvertida não enferma daquele vicio, resultando a mesma de uma correta aplicação do mencionado direito aos factos dados como provados, devendo por isso ser mantida com as inerentes consequências legais, como é nossa firme convicção. IV. Impõe-se dizer, antes do mais, que sobre os factos alegados pelo Impugnante em sede de PI, se prenunciou já o TCAS, de 09-07-2020, Proc. 896/07.5BEALM, cujo sumário se transcreve: “I. As importâncias despendidas pela entidade patronal com a constituição de seguros de vida a favor dos seus trabalhadores, são considerados rendimentos do trabalho dependente e sujeitos a tributação em sede de categoria A do IRS, se e quando forem objeto de resgate antecipado pelos seus beneficiários, nos termos previstos no ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS (na redação em vigor á data dos factos). II. Para efeitos fiscais não releva, que o resgate tenha ocorrido nas condições permitidas pelo contrato de seguro, mas sim a antecipação da disponibilidade do montante recebido pelo resgate do certificado individual de seguro, o que na situação em apreço se verifica sempre que essa disponibilidade ocorra antes do beneficiário do seguro completar os 60 ou 65 anos de idade, consoante opção efetuada na data da adesão ao contrato. III. Neste tipo de produtos financeiros, o que constitui pressuposto da incidência tributária, em sede de IRS (Cat. A), é a antecipação da disponibilidade, do resgate, adiantamento, remição, ou recebimento do capital.”. V. Posição que subscrevemos integralmente, dúvidas não existem, que da correta interpretação do ponto 3, da aliena b), do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS, só se pode tirar a conclusão de que a norma determina a tributação em sede de IRS, categoria A, o resgaste antecipado pelos beneficiários de qualquer um dos produtos nela previstos, bem como o adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade, ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado, e como tal sujeitas a retenção na fonte. É o quem resulta, inclusive, dos acórdãos proferidos pelo STA, em 12.12.2017, no processo n.º 0303/17 e em 11.10.2017, no processo n.º 0195/16. VI. O ora Recorrido, como resulta da matéria de facto dada como assente, foi trabalhador da TAP – piloto de aviões – sendo que a sua entidade patronal, na qualidade de segurado, é parte num contrato de seguro em que aquele, tal como cada um dos demais funcionários, usufrui, como tomador do seguro, de um benefício de reforma a atribuir a partir dos 60 anos, podendo ao atingir esta idade e até à data do vencimento do certificado individual, pedir o pagamento do valor do resgate. Foi o que o ora Recorrido fez: no ano em que atingiu 60 anos de idade, pediu o resgate do seu certificado individual. VII. Decidiu o Tribunal a quo que “(…) no caso vertente, faltou a prova de que houve uma antecipação da disponibilidade, parecendo, antes, que houve uma condição efectiva, a saber, a passagem do Impugnante à condição de reformado…A prova dos correspondentes factos pertence à AT, pois que recai sobre ela o ónus de prova dos pressupostos legais da sua actuação vinculada, ou seja, da demonstração dos pressupostos de tributação dos rendimentos auferidos pelo beneficiário a título de resgate de seguro de vida grupal…”. Com todo o respeito, que é muito, não podemos concordar, de todo, com a decisão proferida pelo tribunal recorrido, por a mesma padecer de vício de violação de lei (artigos 2.º, nº 3, alínea b), ponto 3, do Código do IRS, 74.º e 75.º, n.º 1, e alínea b), ambos do Código do IRS e Artigo 43.º, n.º 1 e 3, alínea c), da LGT e 61.º, n.º 5 do CPPT) e de uma errónea aplicação do direito aos factos dados como provados, não devendo ser mantida. VIII. In casu, como resulta provado e é facto não controvertido o Impugnante, quando atingiu os 60 anos de idade, procedeu ao resgaste total de um seguro de vida, constituído num complemento de reforma. Resulta, aliás, confessado pelo próprio Impugnante/Recorrido nos autos que “Embora o Impugnante tenha expressado a sua vontade, no sentido de o vencimento do certificado individual ocorrer quando atingisse os 60 anos de idade, não pode juntar documento referido no Douto Despacho porquanto a opção foi tomada e lavrada em acta do Sindicato de Pilotos da Aviação Civil (SPAC) (…) Tal sendo um documento que, atenta a sua vetustez decorrente do facto de a opção ter sido tomada há décadas, o Impugnante não possui, aliás nem se recorda de lhe ter sido entregue qualquer cópia da aludida acta, e a existir será nos arquivos do SPAC. O Impugnante podia fazer o resgate por ter mais de 10 anos de TAP assim como a sua licença de voo era cancelada ao atingir os 60 anos de idade, pois a alteração legislativa que veio a permitir que os pilotos aviadores voassem até mais tarde ao serviço da TAP dependia de opção expressa a tomar pelo piloto, coisa que o aqui Impugnante não fez.” Confissão que o Tribunal a quo optou por desconsiderar. IX. Com todo o respeito, que é muito, discordamos em absoluto, que o ónus da prova de uma decisão potestativa do Impugnante, de optar com que idade pretendia que ocorresse a data de vencimento do seu certificado individual do seguro em causa, se aos 60 anos ou aos 65 anos, efetuada à data da adesão ao contrato, que só ele pode demonstrar, possa recair sobre a Administração Tributária, como decidido pelo tribunal recorrido, ainda que suportado no referido acórdão do TCAS. X. Efetivamente, no que respeita ao ónus da prova, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 75.º do Código do IRS, não se poderá de deixar ter presente que “o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque” - artigo 74.º, n.º da LGT. XI. Entende a Fazenda Pública, salvo melhor opinião, que, em face do referido contrato de seguro e à exigência de o segurado optar, na data da adesão ao seguro, pelo seu resgate aos 60 anos ou aos 65 anos, ao contrário do entendimento do tribunal recorrido, é sobre o Impugnante que recai o ónus da prova dos factos do direito que se arroga, e tal prova nunca foi concretizada, nem em sede de procedimentos graciosos, nem agora aqui nos presentes autos. Prova que só pode recair sobre o Impugnante, tanto mais que os elementos de prova os factos invocados não se encontram em poder da Autoridade Tributária. XII. Muito embora se possa considerar que a interpretação do ponto 3 a aliena b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS, seja de “Complexidade superior à comum”, na situação sub judice, tal complexidade não se verifica, pois resulta claro da norma que no tipo de produto financeiro nela referidos, o que constitui pressuposto da incidência tributária, em sede de IRS (Categoria A), é a antecipação da disponibilidade, do resgate, adiantamento, remição, ou recebimento de capital com aqueles relacionados. Invocando o Impugnante/Recorrido que essa antecipação não ocorreu, reiteramos, não pode deixar de ser sobre ele que impede o ónus de provar tal facto. XIII. E não se diga que assim não é por estarmos em presença de um ato tributário que aplicou uma norma material que impõe a tributação dos rendimentos auferidos em função de um seguro de vida grupal antes da data do resgate convencionada, e que por ser produto de atos instrumentais demonstrativos de que ocorreu uma antecipação do resgate por referência à data convencionada e á própria idade do beneficiário, a prova dos correspondentes factos pertence à AT, pois recai sobre ela o ónus de prova dos pressupostos legais da sua atuação vinculada. XIV. In casu, competia ao Impugnante provar, que o capital foi resgatado quando perfez a idade de 60 anos, porque no momento da adesão ao contrato, optou para que o mesmo ocorresse com esta idade. Prova que o Impugnante não fez em momento algum, reafirma-se. E por o não ter feito, como lhe competia, não pode esse ónus ser imputado à AT, por tal não resultar de lei (artigo 74.º, nº 1 do CPPT, “in fine”), como se demonstrou detalhadamente. E em consequência, determinar-se a anulação da liquidação mediatamente controvertida. XV. Numa definição paradigmática relativa à repartição do ónus da prova, afastada a presunção prevista no artigo 75.º, n.º 1 da LGT, por força do disposto na aliena a) do n.º 2 do mesmo artigo, só ao contribuinte/Reclamante/Impugnante, cabe provar a existência dos factos tributários que alega como fundamento do seu direito. Não o tendo feito, como lhe competia, não pode esse ónus ser imputado à AT, por tal não resultar de lei (artigo 74.º, nº 1 do CPPT, “in fine”), como se demonstrou detalhadamente. E em consequência, determinar-se a anulação da liquidação mediatamente controvertida, como determinou o tribunal a quo na sentença recorrida. XVI. Esta regra do ónus da prova aplica-se também nos casos em que o contribuinte impugna a sua própria autoliquidação, sem prévia reclamação graciosa (situações previstas no n.º 3 do art. 131.°- do CPPT) ou vem impugnar liquidação efetuada pela Administração Tributária com base na declaração apresentada pelo próprio contribuinte (inclusivamente quando tiver apresentado uma declaração de substituição, corrigindo alegados erros de uma primeira declaração, vindo, depois, impugnar a liquidação com fundamento na não correspondência entre a realidade e o declarado na segunda). (Jorge Lopes de Sousa, em comentário ao artigo 100.º do CPPT, in: “Código do Procedimento e de Processo Tributário” – II Volume – Areas Editora”). XVII. Logo, por assim não o considerar, a sentença proferida pelo tribunal recorrido padece de vício de violação de lei (artigo 347.º do CC, artigo 74.º, n.º 1 e 75.º “à contrário” e n.º 2, aliena a), ambos da LGT) e de uma errónea aplicação do direito aos factos dados como provados, não podendo ser mantida, devendo assim ser revogada e substituída por douto acórdão que faça uma correta aplicação do direito aos factos, o que se requer com as inerentes consequências legais. TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA! * O Recorrido, devidamente notificada para o efeito, apresentou contra-alegações, tendo as suas conclusões o seguinte teor: “CONCLUSÕES a) O que a Recorrente refere quanto ao que consagra o artigo 2º, nº 3 b) do CIRS, no sentido de haver tributação quando ocorresse um resgate antecipado, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da disponibilidade, é correcto mas não foi isso que se passou in casu, nem os autos o demonstram. b) E só se ocorresse tal antecipação é que a Recorrente se encontraria legitimada para tributar. c) Para que ocorresse tributação era condição sine qua non que houvesse uma antecipação no resgate em relação à data prevista no contrato de seguro e contra isto nem se adverse com o segmento do referido preceito do CIRS que assim reza: «ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.» d) Pois que a norma em causa tem a seguinte redacção: «3) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, bem como as que, não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade, ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.» e) O preceito permite identificar duas situações matriz, a saber: I) A de direitos adquiridos e individualizados; II) A de não existência de direitos adquiridos e individualizados mas em que existe resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade. f) A acrescer a estes dois segmentos surge, efectivamente, o trecho que refere: «ou, em qualquer caso, de recebimento em capital, mesmo que estejam reunidos os requisitos exigidos pelos sistemas de segurança social obrigatórios aplicáveis para a passagem à situação de reforma ou esta se tiver verificado.» g) Sucede que este trecho complementa os dois segmentos anteriores sendo tal o que resulta da expressão «em qualquer caso». h) Quer isto dizer que o mesmo não é autónomo como que valendo de per se. i) O referido trecho legislativo só admite a seguinte interpretação/leitura: I) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários e em que haja recebimento de capital; II) Não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade e em que haja recebimento de capital. j) Ou seja, o recebimento do capital tem de, cumulativamente, articular-se com qualquer uma das duas situações atrás referidas e assim sendo, como inegavelmente o é, tem SEMPRE de se ver se esse recebimento se reporta ou não a uma situação de direitos adquiridos e individualizados ou a uma situação em que não existem direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários. k) Ora pensa-se que facilmente se conclui que a situação não é de direitos adquiridos e individualizados do beneficiário pelo que a primeira situação supra referida fica excluída. l) Mas para se aplicar a segunda hipótese supra referida teria que existir SEMPRE uma antecipação do recebimento pois que o preceito legal refere: «sejam por estes objecto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade m) Sendo assim evidente de concluir que o resgate só seria passível de cair sob a alçada da norma de incidência se houvesse uma antecipação do recebimento em relação à data prevista no contrato mas não foi isso que se passou, pelo que não se está, efectivamente, perante a ocorrência de facto tributário. n) Também não corresponde à verdade nem os autos o demonstram que o Recorrido efectuou o resgate ao perfazer 60 anos de idade pois uma coisa é a opção tomada pela data em que se pretendia que o resgate ocorre-se e outra, completamente diferente, em que se fez efectivamente o resgate. o) E o Recorrido, por cautela e para que dúvidas não se levantassem, apenas fez, efectivamente, o resgate após atingir os 65 anos de idade, o que deve constar da sua ficha biográfica integrada no procedimento administrativo e significando tal que quando o Recorrente efectuou o resgate, e já o tendo feito sendo portador da provecta idade de 65 anos, o efectuou sem que tenha ocorrido qualquer antecipação. p) E não a tendo havido então a norma de incidência, do artigo 2º, nº 3, 3), ii) do CIRS, não é aplicável. q) O que a nu é colocado no Douto e muito recente Aresto desse Tribunal Central Administrativo Sul, tirado em relação a um colega do aqui Recorrido citado no corpo alegatório supra. r) Também não se afigura assertivo o argumento da Recorrente acima identificado como d), isto porquanto a afirmação feita no recurso é desmentida pelo artigo 74º, nº 1 da LGT, pois que estando-se perante uma pretensão de tributar a prova dos factos constitutivos que a legitimem incumbiria à AT. s) Mas admitindo- como hipótese académica que não conste do Procedimento Administrativo Tributário (PAT) a ficha biográfica do Recorrido e que a AT tenha decidido na fase administrativa alheando-se do facto de o resgate ter sido feito após aquele ter atingido os 65 anos de idade, ainda assim tal não daria sufrágio ao provimento do recurso nos termos em que o pedido é feito no mesmo t) Uma vez que se tal tiver ocorrido no presente caso ainda assim a consequência não pode ser a da crua procedência do recurso, antes devendo a Douta Sentença ser anulada por défice instrutório, sendo ordenada a realização das necessárias diligências complementares de prova para se aferir da efectiva idade em que o Recorrido efectuou o resgate e em conformidade com tal se aplicar subsequentemente o Direito, que não se deverá afastar no decidido no Douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15/02/2024, Processo nº 396/20.8BESNT supra citado. u) Assim o deve ser atento o princípio do inquisitório ou da investigação vigente(s) no Contencioso Tributário e que é um princípio estruturante do contencioso tributário português. v) Não violou a Douta Sentença qualquer preceito legal, assim como fez uma correcta interpretação dos factos, merecendo, por tal ordem de razões, o beneplácito da confirmação e devendo o recurso ser declarado completamente improcedente. Nestes termos e nos melhores de Direito deverá o recurso ser declarado improcedente mantendo-se na ordem jurídica a Douta Sentença recorrida, tudo o mais com as consequências legais. * O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso. * Colhidos os vistos legais (artigo 657º, n. º2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 281º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)), cumpre apreciar e decidir. * Delimitação do objeto do recurso Em ordem ao consignado no artigo 639º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir: i)se a sentença recorrida incorre em erro de julgamento na apreciação dos factos e na aplicação do direito ao julgar procedente a impugnação.
* II. FUNDAMENTAÇÃO II.1- De facto A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “III. Com interesse para a decisão a proferir, consideram-se provados os factos referidos no ponto I supra e, bem assim, os seguintes factos: A. Em 31 de Dezembro de 1990, o SPAC celebrou com a Companhia de Seguros G.........., um contrato de seguro de grupo (apólice n.º 425.229), constando das respectivas condições particulares a atribuição a “todos os associados do segurado constantes na relação anexa” de um “capital igual a 16 vezes o último salário mensal declarado”, com “data de vencimento do certificado individual” no “1.º dia do trimestre civil seguinte ao da data em que cada pessoa segura atinge os 65 anos”, mas constando do artigo 1.º (Definições), 1.1, alínea f) das respectivas “condições gerais” que se considera a “data de vencimento do certificado individual” o “1.º dia do trimestre civil seguinte ao da data em que a Pessoa Segura atinge os 60 anos ou 65 anos, consoante opção efetuada na data da adesão ao contrato” e bem assim, dos artigos 1.2 e 1.3 dos respectivos “princípios subjacentes” que “são incluídos neste Plano todos os Pilotos da Empresa que se encontrem em efectvidade de serviço, de idades inferiores a 60 anos” e que “a Idade Normal de Reforma é 60 anos” (cf. doc. junto a fl. 92 do SITAF); B. Em 16 de Junho de 1994, a posição do SPAC como tomador de seguro passou a ser assumida pela TAP – Air Portugal (Idem); C. De harmonia com a declaração modelo DMR submetida pela G.........., S. A., referente ao ano de 2013, ao Impugnante foi pago um rendimento da categoria A no valor de € 175.323,37 (cf. fl. 34 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso); D. A retenção e a isenção respectivas haviam sido declaradas pela G.........., S. A., nos seguintes termos essenciais (cf. fl. 5 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso): “(texto integral no original; imagem)” E. A liquidação impugnada foi efectuada, através da guia de retenção na fonte identificada sob o n.º 80377647918, em 17 de Janeiro de 2014, na importância de € 58.902,72, referente ao período de 2013 (cf. informação a fl. 9 do PAT apenso); F. Em 23 de Abril de 2014, o Impugnante apresentou reclamação graciosa (cf. fls. 1 e segs. e 19 do procedimento respectivo constante do PAT apenso); G. Por Ofício n.º 069176, de 21 de Dezembro de 2015, recebido em 23 de Dezembro de 2015, foi o Impugnante notificado de que a reclamação graciosa havia sido indeferida por despacho de 18 de Dezembro de 2015, tendo por base informação dos serviços com o seguinte teor essencial (cf. fls. 48 e segs. do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso):(…) “(texto integral no original; imagem)” H. A p. i. da presente impugnação judicial foi enviada a juízo, via correio electrónico, em 24 de Março de 2016 (cf. fl. 1 do SITAF); I. O Impugnante prestou serviço, como piloto de aviação associado do SPAC por conta da TAP – Air Portugal, até atingir a idade da reforma (acordo das partes - cf. artigos 13.º a 20.º da p. i., não impugnados pela Fazenda Pública).” * Factos não provados “Nada mais resultou provado com interesse para a decisão a proferir. Não resultou, designadamente, provada a opção da idade atinente ao vencimento do certificado individual do seguro em causa, particularmente 60 anos ou 65 anos.” * “Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos autos e do PAT apenso, atenta a fé que merecem e o facto de não terem sido impugnados, na posição processual assumida pelas partes nos respectivos articulados e em consulta no SITAF, tal como referido em cada letra do probatório. Está em causa determinar se a norma de incidência do artigo 2.º, n.º 3, alínea b), ponto 3) do CIRS é, ou não, aplicável ao caso dos autos, com a consequente sujeição a tributação em sede de IRS, categoria A, da importância auferida pelo Impugnante da Companhia de seguros, por referência à data convencionada no contrato de seguro grupal e à sua própria idade. Neste conspecto, a motivação das decisões a que o Impugnante se refere na p. i., relativas a colegas seus, assenta num circunstancialismo concreto diferente do presente processo, o qual se desconhece e é, por isso, intransponível para o caso dos autos. Relativamente à orientação administrativa ínsita no Ofício a que o Impugnante igualmente se refere na p. i., a mesma só vincula os funcionários e os órgãos da AT, não se impondo ao tribunal.” * II.2 - De direitoIn casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por C....... contra o ato de liquidação de IRS referente a retensões na fonte por alegado resgate antecipado do contrato de seguro celebrado com a G.......S. A. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a decisão recorrida: - Incorreu em erro de julgamento, por errónea enunciação e interpretação do ónus probatório, porquanto inversamente ao propugnado na decisão recorrida, o ónus probatório circunscrevia-se na esfera jurídica do Recorrido, e não da Administração Tributária; - Estabeleceu uma errónea valoração da prova, concretamente da falta de prova de opção. Vejamos, então. De relevar, ab initio, que a Recorrente não procedeu à impugnação da matéria de facto em ordem ao consignado no artigo 640º do CPC, nada requerendo em termos de aditamento ou supressão do competente acervo probatório, razão pela qual a mesma se encontra devidamente estabilizada. A Recorrente, alega que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, na medida em que enunciou e valorou, erroneamente, o ónus probatório, porquanto o mesmo se circunscreve na esfera jurídica do Recorrido. Mais relevando que, o Recorrido não fez prova da opção efetuada na data da adesão ao contrato, sendo que resulta clausulado na apólice que a data do vencimento do certificado individual, é o primeiro dia do trimestre civil seguinte ao da data em que a pessoa segura atingir os 60 anos ou 65 anos, consoante opção efetuada na data da adesão ao contrato. Defende, para o efeito, que não obstante tal repartição do encargo probatório tenha sido materializada em cumprimento do Acórdão do TCAS, a verdade é que o ónus da prova de uma decisão potestativa do Impugnante, concretamente de opção da idade atinente ao vencimento do certificado individual do seguro em causa, particularmente 60 anos ou 65 anos, só pode ser atestada pelo Recorrido e não pela Administração Tributária, até porque tais elementos não se encontram na sua posse e disponibilidade. Comecemos por convocar a fundamentação que suportou a procedência da presente impugnação judicial. “(…) Quanto aos demais requisitos da norma, nomeadamente, a questão “do direito adquirido do trabalhador” e à “possibilidade de antecipação” antes de preenchidas as condições previstas no contrato, diz o referido acórdão que “constitui pressuposto da incidência tributária, em sede de IRS (Cat. A), nos produtos financeiros derivados de contrato de seguro, a antecipação da disponibilidade, do resgate, adiantamento, remição, ou recebimento do capital”. Ora, no caso vertente, faltou a prova de que houve uma antecipação da disponibilidade, parecendo, antes, que houve uma condição efectiva, a saber, a passagem do Impugnante à condição de reformado (cf. letras A, C, D e I do probatório e motivação da matéria de facto supra). A prova dos correspondentes factos pertence à AT, pois que recai sobre ela o ónus de prova dos pressupostos legais da sua actuação vinculada, ou seja, da demonstração dos pressupostos de tributação dos rendimentos auferidos pelo beneficiário a título de resgate de seguro de vida grupal, tal como se decidiu no citado acórdão do TCA Sul de 16 de Novembro de 2023, proferido no processo n.º 896/07.5BEALM.” Vejamos então de que lado está a razão: Dizia o artigo 2º do CIRS, com a epígrafe Rendimentos da categoria A: “(…) 3 - Consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente: (…) a) As remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica, designadamente: (…) 3) As importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal: i) Com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respetivos beneficiários, bem como as que, não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respetivos beneficiários; ii) Para os fins previstos na subalínea anterior e que não constituindo direitos adquiridos e individualizados dos respetivos beneficiários, sejam por estes objeto de resgate, adiantamento, remição ou qualquer outra forma de antecipação da correspondente disponibilidade” O Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) acolheu o conceito de rendimento acréscimo (artigo 1º, n.º2 CIRS), em que a tributação incide, em princípio, sobre todo e qualquer incremento patrimonial. Na Categoria A são tributados os rendimentos do trabalho dependente, que incide sobre todas as vantagens acessórias postas à disposição do trabalhador (fringe benefits), quer em dinheiro quer em espécie. Estas vantagens acessórias, são definidas no artigo 2º, n.º3 b) CIRS como abrangendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica. Nas diversas alíneas da mesma norma, o legislador ensaiou a construção de uma lista, não exaustiva, de remunerações acessórias do trabalho dependente passíveis de tributação em IRS. Na situação dos autos o ato tributário em causa aplicou a norma material que impõe a tributação dos rendimentos percebidos em função de um seguro de vida grupal antes da data de resgate convencionada [artigo 3º, n.º 3, al. b), do CIRS]. Mas esse ato é produto de atos instrumentais demonstrativos de que ocorreu uma antecipação do resgate por referência à data convencionada e a própria idade do beneficiário. Ora o Impugnante, ora Recorrido, era piloto aviador e trabalhava para a TAP. Acolhendo as diretivas e recomendações da Organização Internacional da Aviação Civil (ICAO), agência especializadas das Nações Unidas, foi publicado o Decreto Regulamentar nº 46/77, de 4 de julho, o limite de idade para um piloto de linha aérea exercer serviços de voo em transporte público é de 60 anos. O Decreto-Lei nº 392/90, de 10 de dezembro, veio possibilitar que os pilotos de aeronaves que, nos termos do artigo 1º do Decreto Regulamentar nº 46/77, de 4 de julho, fiquem impedidos de continuar o exercício da sua atividade em transporte público a partir dos 60 anos de idade podiam requerer a atribuição de pensão de reforma por velhice (cf. artigo 1º do Decreto-Lei citado). O Impugnante, ora Recorrente, subescreveu/aderiu ao contrato de seguro identificado na alínea A) dos factos provados prestou serviço, como piloto de aviação associado do SPAC por conta da TAP – Air Portugal, até atingir a idade da reforma (cfr. alínea I. do probatório). O contrato de seguro em causa foi celebrado em 31/12/1990 e continha, entre outras reproduzidas no ponto 1 do probatório, a seguinte cláusula: «f) DATA DE VENCIMENTO DO CERTIFICADO INDIVIDUAL – 1.º dia do trimestre seguinte ao da data em que a Pessoa Segura atinge os 60 ou 65 anos, consoante a opção efectuada na data de adesão ao contrato» (cfr. alínea A. do probatório). A questão do resgate antecipado do seguro de vida constituído a favor dos pilotos de aviação da TAP pela SPAC (posteriormente substituída pela TAP) e a sua sujeição a tributação em sede de IRS, tem vindo a ser colocada aos tribunais em modos e formas processuais diferenciadas, o que tem originado respostas dispares. Porém, do ponto de vista substantivo, a jurisprudência das instâncias é pacifica e tem decidido em linha com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 10/11/2017, tirado no proc.º 0195/16, no qual se consigna além dos mais: «De acordo com o ponto 3 da alínea b) do n.º 3 do art. 2.º do CIRS (na redacção vigente ao tempo), as importâncias despendidas pela entidade patronal com a constituição a favor dos seus trabalhadores de seguros de vida, se estes forem objecto de resgate antecipado pelos beneficiários são considerados rendimentos do trabalho dependente sujeitos a tributação (categoria A). Nos termos da mesma norma legal, a incidência mantém-se ainda que os beneficiários, à data do resgate antecipado, reúnam os requisitos legais para passarem à situação de reforma ou se encontrem, efectivamente, nessa situação». Ora, no caso em análise, como bem refere o Tribunal a quo, faltou a prova de que houve uma antecipação de resgate, parecendo, antes, que houve uma condição efetiva, a saber, a passagem do ora Recorrido à condição de reformado (cfr. alíneas A, C, D e I do probatório e motivação da matéria de facto). A prova dos correspondentes factos pertence à Administração Tributária, pois recai sobre esta o ónus de prova dos pressupostos legais da sua atuação vinculada, ou seja, da demonstração dos pressupostos de tributação dos rendimentos auferidos pelo beneficiário a título de resgate de seguro de vida grupal, tal como se decidiu no Acórdão deste TCA Sul de 16 de Novembro de 2023, proferido no processo n.º 896/07.5BEALM. Em face do exposto, concluímos que, bem andou o tribunal a quo ao julgar procedente a impugnação judicial, por ilegalidade das retensões na fonte, impugnadas. Pelo exposto, na improcedência das conclusões do recurso interposto, impõe-se julgar o mesmo improcedente, mantendo-se, em consequência, a sentença recorrida. * III. DECISÃO Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção do Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida. Custas pela Recorrente (artigo 527º, n.ºs 1 e 2, do CPC). Registe e notifique. Lisboa, 9 de janeiro de 2025. ---------------------------------- [Maria da Luz Cardoso] ---------------------------------- [Ângela Cerdeira] (em substituição) ------------------------------ [Teresa Costa Alemão] |