Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1209/19.9BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:10/20/2021
Relator:PAULA FERREIRINHA LOUREIRO
Descritores:PROCEDIMENTO DE MASSA- CONCURSO INGRESSO PSP- ENTREVISTA PESSOAL DE SELEÇÃO- FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I- O art.º 11.º, n.º 1 da Portaria n.º 236-A/2010, de 28 de abril, prescreve que a entrevista profissional de seleção visa avaliar, de modo objetivo e sistemático, a experiência profissional do candidato, bem como aspetos comportamentais evidenciados durante a interação estabelecida no decurso da entrevista, aspetos esses respeitantes, mormente, à capacidade de comunicação e relacionamento interpessoal.

II- O n.º 2 do mesmo preceito estipula, ainda, que por cada entrevista profissional de seleção deve ser elaborada uma ficha individual, contendo o resumo dos temas abordados, os parâmetros de avaliação a classificação obtida em cada um deles, devidamente fundamentada.

III- No entanto, examinadas as fichas individuais dos candidatos, facilmente se conclui que não existe qualquer resumo dos temas abordados e que a classificação obtida pelo Recorrido em cada um dos parâmetros de avaliação não se encontra devidamente fundamentada, visto que, para além da ficha-modelo não exprimir a razão das concretas notações parcelares que foram sendo atribuídas ao Recorrido, também não se logra percecionar a motivação do Júri que justifique as conclusões exaradas quanto aos parâmetros de avaliação.

IV- Ou seja, face ao que se encontra exarado na ficha individual do Recorrido, não é possível refazer o iter cognoscitivo-valorativo trilhado pelo Júri da entrevista e, desse modo, indagar se a avaliação do Júri foi realizada de modo objetivo e sistemático e tendo em conta, somente, os aspetos relevantes para apurar e qualificar a experiência profissional do Recorrido e os aspetos comportamentais relevantes. Na verdade, face ao teor conclusivo das afirmações exaradas na ficha individual do Recorrido, bem como face à indemonstração dos motivos subjacentes às notações parcelares, não pode este Tribunal concluir pelo acerto da apreciação do Júri, do mesmo modo que não pode concluir pelo desacerto da apreciação do mesmo Júri. E tanto basta para desembocar na assunção da ausência de adequada e suficiente fundamentação referentemente ao resultado da entrevista profissional de seleção que foi realizada pelo Recorrido.

V- Quer isto significar, portanto, que o ato de exclusão do Recorrido não pode manter-se, por violação do disposto no art.º 11.º, n.ºs 1 e 2 da Portaria n.º 236-A/2010, de 28 de abril e ainda do preceituado no art.º 153.º, n.ºs 1 e 2 do CPA.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
*** ***
Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO
O Ministério da Administração Interna (Recorrente), vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa em 15/11/2019, que julgou parcialmente procedente a ação administrativa urgente de contencioso dos procedimentos de massa, proposta A...(Recorrido).

Nesta ação, o Recorrido veio peticionar o seguinte:
“a) A anulação da Deliberação dos membros do Júri constante da ata n.º 8, de 04/06/2019 e, consequentemente de todos os atos subsequentes, nomeadamente da homologação do Director Nacional da PSP por despacho de 04/06/2019 da referida Deliberação e da Lista Unitária de Ordenação dos Candidatos Aprovados ao Procedimento Concursal à Admissão ao Curso de Formação de Agentes da Policia de Segurança Pública; Por conseguinte,
b) Seja a administração condenada a repetir a Entrevista Profissional de Seleção ao aqui A., com outros entrevistadores diferentes dos entrevistadores que realizaram a entrevista no dia 16/04/2019, devendo, um deles desempenhar funções de psicólogo na Divisão de Psicologia da PSP, com as legais consequências.”
Por sentença prolatada em 15/11/2019, a ação foi julgada parcialmente procedente nos seguintes termos: julga-se a presente acção parcialmente procedente e, consequentemente, anula-se o acto do Director Nacional da PSP, de 04/06/2019, que homologou a deliberação do júri vertida na acta nº 8, nos termos da qual se procedeu à aprovação das listas de ordenação final dos candidatos aprovados e excluídos do concurso para a admissão ao Curso de Formação de Agentes, aberto pelo Aviso nº 12686/2018, condenando-se a Entidade Demandada a adoptar os actos e operações necessários à reconstituição do procedimento de avaliação e ordenação final dos candidatos, expurgado dos vícios supra apontados.”

Inconformado com a sentença vem o Recorrente apelar a este Tribunal Central Administrativo, clamando pela revogação da sentença a quo e, consequentemente, pela sua substituição por outra que julgue a ação improcedente.
As alegações do recurso que apresenta culminam com as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES:
1.ª A Douta Sentença Recorrida padece de erro nos pressupostos de direito;
2.ª A Douta Sentença Recorrida padece de erro de julgamento;
3.ª Ao contrário do que foi decidido, a motivação ou fundamentação para a classificação obtida por cada candidato, especificadamente o Autor / Recorrido encontra-se densificada na respetiva ficha individual de avaliação;
4.ª A referida fundamentação encontra-se, ainda, manifestada no relatório final anexo à ficha individual, quer na análise à reclamação formulada pelo Recorrido elaborada pelo júri do procedimento, quer, finalmente, na ata n.° 8 que suportou o ato homologatório da lista de classificação final, proferido pelo Diretor Nacional da PSP;
5.ª A ficha individual de avaliação elaborada pelo júri densifica os temas colocados ao Recorrido na respetiva entrevista profissional de seleção;
6.ª A ficha individual exterioriza, com objetividade, os temas em que as respostas do Recorrido foram dadas na entrevista profissional de seleção, com as designações classificativas previamente definidas;
7.ª A ficha individual exterioriza a classificação numérica e quantitativa do valor atribuído pela unanimidade dos membros do júri;
8. ª Os temas a abordar na entrevista profissional de seleção pré-definidos pelo júri do procedimento na ata n.° 1 foram transpostos para a ficha individual do Recorrido;
9.ª Ainda que se pudesse considerar que a ficha de avaliação não contém o resumo dos temas abordados não se poderá, daí, concluir que aquela ficha se encontra insuficientemente fundamentada;
10.ª Os temas abordados encontravam-se previamente definidos e conhecidos e ainda que se considerasse a sua ausência na ficha, a mesma se tornava desnecessária, sob pena da mesma se tornar exaustiva e densa;
11.ª A ficha individual também transpôs, de forma fidedigna, os critérios que haviam sido definidos na ata n.° 1, quer de forma quantitativa, quer qualitativa;
12.ª A ficha individual encontra-se, ainda que de forma sucinta, suficientemente fundamentada, sendo que todos os concorrentes, em especial o Recorrido, ficaram na posse de todos os elementos que estiveram na base da decisão, podendo reconstituir o itinerário cognoscitivo
e valorativo seguido pelo júri para a tomada de decisão;
13.ª A fundamentação da ficha individual cumpre o dever geral de fundamentação consagrado no artigo 152.° do CPA, enquanto corolário do princípio constitucional constante no artigo 268.°, n.° 3 da CRP, assim como preenche os requisitos mencionados no artigo 153.° do CPA;
14.ª Concretamente, a fundamentação contida na ficha individual do Recorrido, quer dos restantes candidatos, não contém obscuridades ou contradições que impeçam os concorrentes, em particular o Recorrido, de controlar o ato;
15.ª A ficha individual contém os critérios elencados na ata n.° 1 e, ainda que se considerasse que a mesma se encontrava insuficientemente fundamentada, o que não se concede, a mesma não afetaria o ato que determinou a eliminação do Recorrido do procedimento;
16.ª Tal eliminação encontra-se fundamentada em todo o procedimento, não só na ficha individual, mas também no relatório anexo á ficha, bem como na resposta à reclamação administrativa do Recorrido e no despacho homologatório de 04.06.2019 vertido na ata n.° 8;
17.ª O dever de fundamentação encontra-se cumprido com a referência à matéria que versou a entrevista e o comportamento do Recorrido perante as questões que lhe foram colocadas;
18.ª O Recorrido percecionou o ato, conhecendo o seu conteúdo e porque assim se decidiu,
habilitando-o a impugnar o ato mediante recurso hierárquico para S. Ex.a o Ministro da Administração Interna e mediante impugnação contenciosa com a interposição do presente procedimento;
19.ª O relatório final encontra-se suficientemente fundamentado, de modo a permitir a um destinatário normal aperceber-se do seu teor e impugná-lo;
20.ª O relatório é um daqueles atos em que não é exigível uma fundamentação exaustiva„ que constituiria uma atividade complexa e morosa, encontrando-se suficientemente fundamentado;
21.ª O relatório justifica a nota da entrevista através de uma análise qualitativa da mesma onde se refere "a sua capacidade de comunicação manifesta-se minimamente satisfatória", "demonstra algumas dificuldades em se integrar na sociedade", "não evidencia empatia e confiança necessária para trabalhar em equipa", "acusa dificuldades perante as situações e questões que lhe são colocadas", "desvia constantemente os olhos dos seus interlocutores" e "tem um projeto de vida pouco definido", concluindo com um parecer no sentido de "revela insegurança que podem prejudicar o desempenho das funções a que se candidata. A sua motivação é pouco consistente. Deixa transparecer fortes reservas à adaptação, evolução e eficácia nas funções.";
22.ª O relatório não contém obscuridades ou contradições que impeçam, como não impediram, o Recorrido de impugnar o ato;
23.ª O júri havia previamente definidos os assuntos a abordar e os critérios de classificação, de forma clara e rigorosa, pelo que o relatório não se mostra contraditório aos temas abordados e aos critérios classificativos;
24.ª Porque fundamentada, a entrevista profissional de seleção, de acordo com o princípio geral e requisitos legalmente exigíveis, o ato de homologação da lista de classificação final do candidato, não se reveste de qualquer vício, nomeadamente de forma, por falta ou insuficiente fundamentação;
25.ª O artigo 11.°, n.° 3 da Portaria n.° 236-A/2010, de 28 de abril, não impõe a obrigatoriedade da presença de um psicólogo da Divisão de Psicologia da PSP na qualidade de membro do júri;
26.ª Quer porque a entrevista profissional de seleção não se reveste de uma prova clínica ou de foro psicológico, mas sim de uma entrevista profissional;
27.ª Quer porque o candidato esteve em igualdade de condições com os restantes candidatos pois em nenhuma entrevista esteve perante um psicólogo;
28.ª Concluindo-se que a Douta Sentença Recorrida padece de erro de julgamento e de direito.
Termos em que deverão V.- Ex.aas dar provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se a Sentença Recorrida, substituindo-se por Douto Acórdão que julgue inteiramente válido o ato contenciosamente impugnado, como é de JUSTIÇA!”

Notificado, o Recorrido apresentou as respetivas contra-alegações, pugnando, em suma, pelo acerto da decisão recorrida e consequente manutenção da mesma, concluindo nestes termos:
CONCLUSÕES
1. A fundamentação do acto administrativo só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando permite àquele conhecer as razões de facto e de direito por que o autor do acto decidiu de determinada forma, para poder accionar os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação.
2. “(...) a decisão final – o despacho de homologação da lista de ordenação final dos candidatos aptos e excluídos do procedimento -, nos termos da qual se excluiu o Autor por eliminação na fase da entrevista profissional de selecção, se baseia (...) no teor da ficha individual preenchida pelos entrevistadores e respectivos relatório e parecer, no qual se atribuiu a classificação de 8 valores (reduzido) ao ora Autor nesse método de selecção”.
3. (...) da análise do teor da ficha de avaliação elaborada pelos entrevistadores que, por sua vez, serviu de base à deliberação do júri e consequente homologação pelo Director Nacional da PSP no sentido da exclusão do Autor do procedimento por eliminação no método de selecção “entrevista profissional de selecção”, se conclui que o acto padece da falta de fundamentação que lhe vem apontada pelo Autor, por falta de indicação, na referida ficha, do resumo dos temas abordados e por inexistência de fundamentação objectiva da classificação atribuída na entrevista em cada um dos parâmetros de avaliação previamente definidos no guião.”
4. “(...) na ficha de avaliação ora em análise, não vêm indicados os critérios diferenciadores dos diferentes níveis classificativos, isto é, nela não se referem, com uma suficiente densificação, os critérios que presidem à atribuição de cada uma das diferentes pontuações, numa escala de 1 a 5. Com efeito, os parâmetros e sub-parâmetros pré-definidos pela Entidade Demandada, não vêm acompanhados dos critérios que densificam e justificam a atribuição das diferentes notações existentes, não estando pré-definido pela Administração qual o desempenho que o candidato deveria ter revelado ou o que é que teria de estar verificado para que lhe fosse atribuída a classificação de 1, 2, 3, 4 ou 5 (correspondentes à classificação de Excelente, Bom, Suficiente, Reduzido e Insuficiente, respectivamente), em cada factor de avaliação. Na verdade, compulsada a ficha de avaliação aqui em causa, é possível verificar que os critérios para a atribuição das diferentes pontuações apenas vêm definidos para a notação máxima (1 – Excelente) e para a pontuação mais baixa (5 – Insuficiente), desconhecendo-se os critérios que presidem à atribuição, pelos entrevistadores, da classificação de 2, 3 ou 4. Pelo que não existe um mínimo de fundamentação para cada um dos níveis classificativos pré-definidos, afigurando-se, neste aspecto, a fundamentação insuficiente, o que equivale à sua falta (cfr. art. 153º, nº 2, do CPTA).”
5. (...) em sede de relatório elaborado pelos entrevistadores e anexo à aludida ficha de avaliação, também não foram expostas pelos entrevistadores as razões concretas da atribuição de cada um dos níveis classificativos, por referência aos diferentes parâmetros e sub-parâmetros definidos no guião, não se encontrando, assim, minimamente justificadas as diferentes pontuações obtidas pelo candidato nos diversos parâmetros.”
6.Da análise do referido relatório, verifica-se que do mesmo não consta, ainda que de modo sucinto, uma justificação para cada uma das classificações atribuída, nos diversos sub-parâmetros objecto de avaliação, mas, sim, uma observação muito vaga e abrangente (a respeito da apresentação, história de vida, relações interpessoais, aspectos da personalidade, estabilidade emocional e atitude e motivação) que não encontra correspondência, nem com os 7 parâmetros relevantes fixados nem com os subparâmetros em que os mesmos se dividem e que foram em concreto alvo de pontuação.”
7. “(...) não estando os critérios que presidem à atribuição de cada um dos níveis classificativos pré-definidos na ficha de avaliação e não resultando minimamente densificado no relatório do entrevistador qual o desempenho do candidato em cada um dos parâmetros e sub-parâmetros que determinou a atribuição da nota concretamente obtida, numa escala de 1 a 5, forçoso é concluir pela falta de fundamentação do acto avaliativo. Também não evidenciando esse mínimo de fundamentação, ressalve-se, a justificação do parecer dado em sede de entrevista, porquanto, as considerações ali tecidas nem sequer abrangem cada um dos parâmetros relevantes de avaliação, nem justificam as classificações concretamente obtidas pelo candidato em cada um dos subfactores que especificam os aludidos parâmetros. Acresce que, as vagas observações feitas no relatório anexo à ficha individual da entrevista revelam, ainda, a incongruência da parca fundamentação existente, na medida em que ali é dito que a capacidade de comunicação do Autor se revelou minimamente satisfatória, ao passo que, na avaliação feita pelos entrevistadores ao parâmetro “Expressão Verbal” foi atribuída a classificação de 4 (Reduzido), em todos os subparâmetros do mesmo (Dicção e articulação das frases; Discurso; e Coerência e articulação das ideias), o que não se coaduna com o juízo formulado pela Administração quanto ao carácter minimamente satisfatório da capacidade de comunicação do ora Autor, sendo certo que, compulsado o guião, se verifica que o parâmetro “Apresentação” se reporta ao aspecto físico, postura física e comportamental, expressão gestual e fisionómica, higiene/asseio e indumentária, não estando relacionado com a capacidade de comunicação do candidato.
8. O mesmo sucedendo quanto à classificação atribuída ao sub-parâmetro 6.2 “Bom contacto visual”, em que o mesmo foi pontuado com o nível 3 – Suficiente, quando do relatório anexo à ficha de avaliação consta a seguinte observação “Desvia constantemente o olhar”, circunstância que, à luz dos critérios constantes do guião corresponderia, aparentemente, ao nível 5 (“Tentativas sucessivas de esquivar o olhar”). Ademais, verifica-se, ainda, uma total omissão na indicação, ainda que sucinta, dos assuntos abordados, o que se impunha, atento o disposto no já referido art. 11º, nº 2, da Portaria nº 236-A/2010, conjugado com o disposto no art. 153º do CPA. Com efeito, e considerando que as questões a colocar não estavam previamente definidas ou pelo menos não se encontravam divulgadas na ficha de avaliação, à luz das citadas disposições legais, impunha-se a elaboração do resumo dos temas abordados, bem como a mínima explicitação do desempenho ou reacção do candidato em cada um dos assuntos abordados, pois só dessa forma seria permitido ao tribunal aferir se foram avaliadas de forma objectiva as aptidões profissionais e pessoais do Autor.
9. O que não foi feito no caso vertente. A elaboração deste resumo surge, assim, como indispensável para se considerar cumprido o dever de fundamentação da classificação atribuída na entrevista, em cada um dos parâmetros relevantes. O resumo dos assuntos da entrevista surge como um elemento objectivo que, conjugado com os parâmetros relevantes e com a fundamentação dada à notação atribuída a cada um deles, vai permitir que possa ser sindicada a ocorrência de eventual erro grosseiro por parte do júri na classificação atribuída.
10. (...) não constando do acto avaliativo aqui em causa nem a justificação da classificação atribuída na entrevista de selecção a cada um dos parâmetros e sub-parâmetros pré-definidos, nem a indicação dos assuntos abordados naquele método de selecção, nos termos supra expostos, resta concluir pela verificação do vício de falta de fundamentação da entrevista profissional de selecção, o qual inquina o acto final emitido no procedimento – acto de homologação da lista de ordenação final dos candidatos aprovados e excluídos do concurso – determinando a sua anulabilidade (cfr. art. 163º, nº 1, do CPA). Procedendo, assim, a acção, nesta parte.
11. Quanto à violação do disposto no art. 11º, nº 3, da Portaria nº 236-A/2010, concluiu a Mma Juiz a quo que o júri deliberou que as entrevistas seriam realizadas individualmente, por dois entrevistadores, contudo não foram mencionadas nem deliberadas as razões pelas quais a entrevista não iria ser realizada, pelos menos, por um psicólogo da Divisão de Psicologia da PSP. Motivo pelo qual ocorre a violação do citado preceito.
Termos em que deverá ser totalmente improcedente o presente recurso, porquanto assim se fará inteira e merecida JUSTIÇA!

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O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo não emitiu parecer de mérito.
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Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à Conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.
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Questões a apreciar e decidir:
As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respetivas conclusões, consubstanciam-se, em suma, em apreciar, primeiramente, se a sentença recorrida decidiu incorretamente que o ato proferido pelo Diretor Nacional da PSP, em 04/06/2019, que homologou a classificação final, graduação e exclusão de candidatos ao concurso para constituição de reserva de recrutamento para admissão ao curso de Formação de Agentes, destinado ao ingresso na carreira de agentes da polícia e da Banda de Música da Polícia de Segurança Pública, padece de ilegalidade, por erradamente ter julgado ocorrer violação do disposto no art.º 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, e art.ºs 152.º e 153.º do Código do Procedimento Administrativo, em virtude da devida fundamentação do resultado da entrevista pessoal, bem como por violação do disposto no art.º 11.º, n.º 3 da Portaria n.º 236-A/2010, de 28 de abril.

II- FACTOS PROVADOS
É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a qual se reproduz ipsis verbis:

1) Pelo Aviso nº 12686/2018, publicado na 2ª Série do Diário da República nº 170, de 04/09/2018, foi publicitada a abertura do procedimento concursal para constituição de reserva de recrutamento para a admissão ao curso de Formação de Agentes, destinado ao ingresso na carreira de agentes de polícia e da Banda de Música da Polícia de Segurança Pública, extraindo-se do teor do referido aviso, designadamente, o seguinte: “(…)
7 - Métodos de seleção
7.1 - No presente concurso serão utilizados os seguintes métodos:
a) Provas físicas;
b) Prova de conhecimentos;
c) Provas de avaliação psicológica;
d) Entrevista profissional de seleção;
e) Exame médico;
f) Para além das provas referidas anteriormente, os candidatos ao Curso de Formação de Agentes da Banda de Música prestarão provas de caráter técnico-musical.
Cada um dos métodos de seleção tem carácter eliminatório, podendo ser aplicados por fases, igualmente eliminatórias.
(…)
7.5 - Entrevista profissional de seleção - A entrevista profissional de seleção visa avaliar, de forma objetiva e sistemática, a experiência profissional e aspetos comportamentais evidenciados durante a interação estabelecida entre os entrevistadores e o entrevistado, nomeadamente os relacionados com a capacidade de comunicação e de relacionamento interpessoal.
(…)
8 - Valoração dos métodos de selecção
(…)
8.5 - A entrevista profissional de seleção é avaliada segundo os níveis classificativos de Elevado, Bom, Suficiente, Reduzido e Insuficiente, aos quais correspondem, respetivamente, as classificações de 20, 16, 12, 8 e 4 valores, sendo a sua ponderação, para a lista de ordenação final, de 25 %.
(…)
8.9 - É excluído do procedimento o candidato que tenha obtido uma menção de "Não apto" ou uma valoração inferior a 9,5 valores num dos métodos ou fases, não lhe sendo aplicado o método ou fase seguintes.
9 - Ordenação final dos candidatos - Após a aplicação dos métodos de seleção, é feita ordenação final dos candidatos de acordo com a escala classificativa de 0 a 20 valores, em resultado da média aritmética ponderada das classificações quantitativas obtidas em cada método de seleção.
(…)” - cfr. fls. 299-306 dos autos;

2) Em 25/09/2018, o júri do concurso identificado no ponto antecedente deliberou, conforme consta da acta nº 1, designadamente, o seguinte: (…)
1.2. Ordem das provas:
Embora a Portaria 236-A/2010, de 28 de abril tenha as provas designadas por uma ordem,
nada na Lei obriga a que seja seguida essa ordem na sua aplicação. Assim, o Júri deliberou
pela aplicação da prova de conhecimentos em primeiro lugar. Depois da Prova de Conhecimentos, os candidatos serão submetidos, às Provas Físicas, Provas de Avaliação Psicológica, Entrevista profissional de seleção e Exame Médico.
Não obstante a possibilidade da aplicação faseada dos métodos de selecção, prevista no ponto 7.1 do Aviso de Abertura do Concurso, o Júri deliberou aplicar os métodos de selecção à totalidade dos candidatos aprovados no método imediatamente anterior. A prova de conhecimentos será aplicada a todos os candidatados admitidos.
(…)
1.3 Classificação final
Relativamente à classificação final, o júri deliberou que, tal corno exige a lei, na mesma será utilizada uma escala de O a 20 valores, que resultará da média aritmética ponderada das pontuações atribuídas à prova de conhecimentos, às provas de avaliação psicológica, entrevista profissional de seleção c à prova de caráter técnico-musical, sendo efetuada de acordo com as seguintes fórmulas:
(…)
1.8. Entrevista Profissional de Seleção
Relativamente a este método de seleção, o júri deliberou que os entrevistadores deverão, na medida do possível, colocar a todos os candidatos as mesmas questões, de modo a apurar os fatores constantes do guião, o mesmo se aplicando à linguagem utilizada no relatório e justificação do parecer final.
Para tal, acordou o júri que, serão realizadas reuniões prévias com os entrevistadores, a fim de se uniformizar a linguagem e a fundamentação, com particular precaução para os candidatos considerados "Insuficientes" e "Suficientes", antecipando-se, desta forma, eventuais reclamações ou recursos.
A entrevista será levada a efeito individualmente, por dois entrevistadores e a prova incidirá basicamente sobre factos e atividades relacionados com a experiência de vida do candidato, sua maturidade, motivação ou outros consignados na ficha de avaliação da entrevista. Os candidatos sobre os quais haja dúvidas sobre o seu perfil para o exercício das funções policiais, serão submetidos, caso seja possível, a parecer do Gabinete de Psicologia da PSP.
A entrevista profissional de seleção é avaliada segundo os níveis classificativos de Elevado, Bom, Suficiente, Reduzido e Insuficiente, aos quais correspondem, respetivamente, as classificações de 20, 16, 12, 8 e 4 valores, sendo a sua ponderação, para a lista de ordenação final, de 25 %, para as candidaturas ao CFA c de 10%, para as candidaturas ao CEM.
(…)”- cfr. fls. 344 e seguintes dos autos.

3) O ora Autor apresentou candidatura ao concurso referido no ponto 1) que antecede, nos termos do instrumento de fls. 308 e 309 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. fls. 308 e 309 dos autos;

4) O Autor foi admitido a prestar provas no âmbito do procedimento concursal identificado em 1) antecedente, tendo-lhe sido atribuído o nº de candidato 1… – por acordo;

5) O Autor obteve a classificação de 13 valores da prova de conhecimentos – cfr. doc. nº 1 junto com a p.i.;

6) O Autor ficou apto nas provas físicas e no exame médico – cfr. doc. nº 2 junto com a p.i.;

7) O Autor obteve a classificação de 12 valores na prova de avaliação psicológica – cfr. doc. nº 3 junto com a p.i.;

8) Em 16/04/2019, o ora Autor preencheu o instrumento denominado “Questionário Biográfico”, cujo teor se considera aqui integralmente reproduzido e do qual se extrai, designadamente, o seguinte:
“C. EXPERIENCIA PROFISSIONAL
1. Já exerceu alguma(s) profissão(ões) ou teve experiências de trabalho?
(…)
Sim. Qual (ais) e em que regime? Segurança-Porteiro
Quando? A exercer de momento
(…)
14.Teve algum processo em Tribunal? (…) Sim. Porquê? Como testemunha
(…)”- cfr. fls. 321 e 324 dos autos;

9) Em 16/04/2019, foi realizada ao ora Autor, por dois comissários da PSP, a entrevista profissional de selecção – por acordo e, ainda, cfr. doc. nº 5 junto com a p.i.;

10) Na sequência da entrevista realizada ao Autor, foi preenchido e subscrito, pelos entrevistadores, o instrumento junto como doc. nº 5 com a p.i., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e do qual se extrai, designadamente, o seguinte: “
«Imagem no original»

“- cfr. doc. n.º 5 junto com a p.i.;

11) Com data de 19/04/2019, o ora Autor dirigiu ao Presidente do Júri o instrumento junto como doc. nº 6 com a p.i., consubstanciado na pronúncia em sede de audiência dos interessados relativamente à classificação obtida na fase da entrevista profissional de selecção, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e do qual se extrai, designadamente, o seguinte: “(…) Se requer a Vª Exa, que, com a brevidade possível, a entrevista do dia 16 seja dada sem efeito, Que o candidato seja notificado em dia e hora a definir pelo Digníssimo júri para outra entrevista, seguindo-se as outras provas a que tem direito Que os entrevistadores sejam pessoas diferentes e imparciais a este incidente (…)” – cfr. doc. nº 6 junto com a p.i.;

12) Em 29/04/2019 os entrevistadores que realizaram a entrevista referida no ponto 9) que antecede, elaboraram o instrumento com o assunto “Resposta dos entrevistadores à exposição do candidato nº 1… – A…”, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e do qual se extrai, designadamente, o seguinte: “(…)


(…)”- cfr. doc. n.º 7 junto com a p.i.;

13) Em 04/06/2019, o júri do concurso identificado no ponto 1) que antecede apreciou as reclamações apresentadas no decurso das provas de conhecimentos, avaliação psicológica, exame médico e entrevista profissional de selecção, nos termos constantes da acta nº 8, tendo deliberado, em relação à reclamação do candidato ora Autor, o seguinte:
“(…)


“- cfr. doc. n.º 8 junto com a p.i.;

14) Por deliberação datada de 04/06/2019 e vertida na acta nº 8, o júri do concurso identificado no ponto 1) antecedente procedeu à aprovação das listas de ordenação final, contendo os candidatos aptos, seriados por ordem de classificação, os candidatos excluídos e os candidatos que ficaram inaptos no concurso, conforme artigo 31.º, n.º 2 da Portaria 236-A/2010, de 28 de Abril, listas que fazem parte integrante da referida acta, que foi presente para homologação ao Director Nacional da PSP, tendo o Autor ficado não aprovado, por eliminação na fase de entrevista profissional de selecção
– cfr. doc. nº 8 junto com a p.i.; fls. 216 e seguintes dos autos;
E lista final de candidatos não aprovados (disponível em:https://www.psp.pt/Documents/Documentos%20Noticias/18CCFA_Nao%20Aprovados.pdf;

15) As deliberações referidas nos pontos 13) e 14) que antecedem foram homologadas por despacho do Director Nacional da PSP de 04/06/2019 – cfr. doc. nº 8 junto com a p.i;

16) Em 21/06/2019, o ora Autor apresentou recurso hierárquico do acto de homologação da deliberação identificada no ponto 13) antecedente, nos termos da qual se excluiu o candidato do procedimento concursal – cfr. doc. nº 9 junto com a p.i.;

17) Por despacho de 24/10/2019, o Ministro da Administração Interna negou provimento ao recurso hierárquico identificado no ponto antecedente, nos termos e com os fundamentos vertidos no parecer nº 692-D/2019 da Direcção de Serviços de Assessoria Jurídica, Contencioso e Política Legislativa da Secretaria-Geral do MAI, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. fls. 501 e seguintes dos autos.
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Nada mais foi provado com interesse para a decisão a proferir.
*
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base nos documentos constantes dos autos e do processo administrativo junto (a fls. 298 e seguintes), bem como, com base na posição assumida pelas partes nos respectivos articulados, conforme discriminado em cada um dos pontos supra fixados. O facto vertido no ponto 14) resulta, ainda, da consulta do documento disponível no sítio da Internet da PSP, através do link identificado supra, cuja consulta se realizou em 12/11/2019.”


III- APRECIAÇÃO DO RECURSO
O Recorrente vem atacar a sentença a quo, atribuindo-lhe um conjunto de erros de julgamento.
Assim, o Recorrente impetra, em primeiro lugar, o julgamento realizado pelo Tribunal a quo no tocante à fundamentação do ato recorrido, e que excluiu o Recorrido da lista de candidatos admitidos ao curso de ingresso na formação para agente da Polícia de Segurança Pública (doravante, apenas PSP). Sufraga o Recorrente, com efeito, que a avaliação efetuada pelo Júri encontra-se suficientemente densificada na ficha individual do Recorrido, quer na ficha-modelo preenchida, quer na apreciação qualitativa e valorativa plasmada pelo Júri nessa mesma ficha-modelo.
Clama o Recorrente, também, que a sentença recorrida padece de erro de julgamento no tocante à decisão prolatada pelo Tribunal recorrido no que concerne ao prescrito no art.º 11.º, n.º 3 da Portaria n.º 236-A/2010, de 28 de abril, dado que a presença de um psicólogo da Divisão de Psicologia da PSP durante a entrevista profissional não é obrigatória.
Vejamos, então, se a impetração do Recorrente merece acolhimento.

O primeiro ataque desferido pelo Recorrente é atinente a uma problemática comum na litigiosidade jurídico-administrativa, e que se consubstancia no apuramento da adequação e suficiência da fundamentação vertida no ato recorrido, e que, no caso posto explica e justifica a exclusão do Recorrido do concurso para ingresso no curso de formação de agente da PSP.
O Tribunal recorrido alcançou um juízo de insuficiência fundamentadora do aludido ato, explanando o seu julgamento na sentença agora visada com o seguinte discurso fáctico-jurídico:
“(…)
Invocou o Autor que a deliberação do júri que teve por base a ficha da entrevista preenchida pelos entrevistadores está ferida de falta de fundamentação, porquanto, em momento algum os entrevistadores indicam quais as perguntas efectuadas para cada um dos temas/itens, assim como, em momento algum mencionam a resposta dada pelo candidato, a resposta que deveria ter sido dada para uma melhor classificação e as razões por que foi atribuída determinada nota ao candidato aqui Autor.
Mais referiu o Autor que a classificação obtida pelo mesmo a cada um dos temas abordados não se encontra devidamente fundamentada, até porque, a grelha que foi previamente aprovada ficou limitada ao preenchimento de uma matriz sem qualquer justificação da classificação atribuída, recorrendo os entrevistadores a expressões conclusivas e genéricas que não se mostram minimamente densificadas.
Concluiu o Autor defendendo que no caso concreto os entrevistadores, quando lhe atribuíram a nota de 8 (reduzido) na entrevista profissional de selecção e, consequentemente, quando o júri deliberou e o Director Nacional da PSP homologou a deliberação, em momento algum se procedeu a uma explanação das razões de facto e de direito que permitissem ao destinatário do acto, aqui Autor, ficar bem ciente do raciocínio traçado para a decisão tomada.
Por seu lado, alegou a Entidade Demandada que a ficha individual da entrevista se encontra suficientemente fundamentada, de forma tal que permitiu ao Autor dela reagir e, bem assim, que os juízos formulados pela Administração no exercício de prerrogativas de avaliação, o que é o caso, encontram-se enquadradas no âmbito da discricionariedade técnica, só sindicável quando haja violação de qualquer preceito legal ou ocorra a existência de erro manifesto. No entendimento propugnado pela Demandada, a referida ficha contém 7 parâmetros, todos devidamente avaliados, bem como, um relatório, um parecer e uma justificação, nos quais os avaliadores espelham, de forma inequívoca, a sua motivação comportamental obtida no decorrer da entrevista e que determina a decisão/classificação atribuída.
Ora, o dever de fundamentação das decisões da Administração, plasmado no art. 268º, nº 3, da CRP, vem concretizado nos arts. 152º e seguintes do CPA.
Quanto aos requisitos da fundamentação, importa atentar no disposto no art. 153º do CPA, que dispõe o seguinte: “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respectivo acto.” (cfr. nº 1). Nos termos do nº 2, “Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.”.
Exige-se, assim, à luz das citadas disposições legais, que a entidade que pratica o acto demonstre o iter cognoscitivo da decisão, permitindo ao destinatário normal a compreensão das razões que motivaram a decisão num determinado sentido, ou seja, exige-se que o autor do acto explique os termos em que procedeu ao preenchimento dos pressupostos legais, descrevendo as circunstâncias de facto que, correspondendo, no seu entender, à previsão legal, o levaram a concluir pela prática daquele acto administrativo (neste sentido, veja-se MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria Geral do Direito Administrativo, 3ª edição, Almedina, 2015, p. 299).
As exigências de fundamentação do acto resultam, assim, satisfeitas se esta se revelar expressa, por meio de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam aqueles fundamentos; suficiente, possibilitando um conhecimento concreto da motivação do acto e congruente, de modo que a decisão constitua um desfecho lógico e necessário, à luz das razões invocadas.
Não obstante, a lei permite a fundamentação por declaração de concordância com os fundamentos constantes de pareceres, informações ou propostas, ou seja, a fundamentação por remissão para o teor desses elementos, que, desse modo, passam a constituir parte integrante da decisão final.
É o que se verifica no caso dos presentes autos, em que a decisão final – o despacho de homologação da lista de ordenação final dos candidatos aptos e excluídos do procedimento -, nos termos da qual se excluiu o Autor por eliminação na fase da entrevista profissional de selecção, se baseia (e manteve, em sede de apreciação da reclamação apresentada pelo Autor no decurso da entrevista que lhe foi realizada) no teor da ficha individual preenchida pelos entrevistadores e respectivos relatório e parecer, no qual se atribuiu a classificação de 8 valores (reduzido) ao ora Autor nesse método de selecção.
Importa, assim, atentar no teor da referida ficha individual, com vista a aferir da (in)suficiência da fundamentação do acto final emitido.
A Portaria nº 236-A/2010, de 28 de Abril, que define os requisitos de admissão ao Curso de Formação de Agentes (CFA) de Polícia da Polícia de Segurança Pública (PSP) e regulamenta a tramitação do respectivo procedimento concursal, estabelece, no seu art. 5º, relativo ao âmbito do recrutamento, que “Para a frequência do CFA, o recrutamento opera-se com recurso à modalidade de emprego público por tempo determinado, em regime de nomeação transitória.” (nº 1) e, após “a conclusão do CFA, com aproveitamento, os candidatos ingressam na carreira de agentes da Polícia de Segurança Pública na modalidade de emprego público por tempo indeterminado, em regime de nomeação definitiva.” (nº 2).
Sob a epígrafe “Métodos de selecção”, preceitua o art. 6º, ainda do mencionado diploma legal, o seguinte:
“1 - No concurso para a admissão à carreira de agente de polícia da PSP são utilizados os seguintes métodos de selecção: a) Provas físicas; b) Prova de conhecimentos; c) Provas de avaliação psicológica; d) Entrevista profissional de selecção; e) Exame médico.
2 - Os candidatos aprovados em todos os métodos de selecção previstos no número anterior serão chamados à frequência do CFA, por ordem de classificação, até ao número de vagas fixadas por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da administração pública e da administração interna.”.
Já o art. 7º, da mesma Portaria, estabelece que todos os métodos de selecção têm carácter eliminatório, pelo que a eliminação num método de selecção implica a exclusão do candidato do procedimento concursal.
No que concerne especificamente ao método da entrevista profissional de selecção, dispõe o art. 11º, da Portaria nº 236-A/2010, designadamente, o seguinte:
“1 - A entrevista profissional de selecção visa avaliar, de forma objectiva e sistemática, a experiência profissional e aspectos comportamentais evidenciados durante a interacção estabelecida entre os entrevistadores e o entrevistado, nomeadamente os relacionados com a capacidade de comunicação e de relacionamento interpessoal.
2 - Por cada entrevista profissional de selecção é elaborada uma ficha individual contendo o resumo dos temas abordados, os parâmetros de avaliação e a classificação obtida em cada um deles, devidamente fundamentada.
3 - A entrevista profissional de selecção é realizada, pelo menos, por dois entrevistadores, com formação prévia para esse efeito, sendo um deles, sempre que possível, psicólogo da Divisão de Psicologia da PSP. (…)” (itálico nosso).
A propósito da valoração do método de selecção ora em análise, determina o art. 13º, nº 5, da aludida Portaria, que “A entrevista profissional de selecção é avaliada segundo os níveis classificativos de Elevado, Bom, Suficiente, Reduzido e Insuficiente, aos quais correspondem, respectivamente, as classificações de 20, 16, 12, 8 e 4 valores, sendo a sua ponderação, para a lista de ordenação final, de 25 %.”.
Sendo certo, porém, que, nos termos do nº 7 do citado preceito, “É excluído do procedimento o candidato que tenha obtido uma menção de Não apto ou uma valoração inferior a 9,5 valores num dos métodos ou fases, não lhe sendo aplicado o método ou fase seguintes.”.
Extrai-se, assim, do quadro normativo supra exposto, que no concurso para a admissão à carreira de agente de polícia da PSP são utilizados os seguintes métodos de selecção: Provas físicas; Prova de conhecimentos; Provas de avaliação psicológica; Entrevista profissional de selecção; e Exame médico. Sendo que todos os métodos de selecção aplicáveis têm carácter eliminatório, pelo que a eliminação num método de selecção determina a exclusão do candidato do procedimento concursal.
Concretamente no que respeita à entrevista profissional de selecção, a mesma é avaliada segundo os níveis classificativos de Elevado, Bom, Suficiente, Reduzido e Insuficiente, aos quais correspondem, respectivamente, as classificações de 20, 16, 12, 8 e 4 valores, visando tal método de selecção avaliar, de forma objectiva e sistemática, a experiência profissional e aspectos comportamentais evidenciados durante a interacção estabelecida entre os entrevistadores e o entrevistado, nomeadamente os relacionados com a capacidade de comunicação e de relacionamento interpessoal, impondo-se à entidade administrativa a elaboração de uma ficha individual contendo o resumo dos temas abordados, os parâmetros de avaliação e a classificação obtida em cada um deles, devidamente fundamentada.
Os requisitos previstos na Portaria ora em apreço para o procedimento concursal e, especificamente, para o método de selecção “entrevista profissional de selecção”, foram igualmente transpostos para o Aviso nº 12686/2018, através do qual se procedeu à publicitação da abertura de “procedimento concursal para constituição de reserva de recrutamento para a admissão ao curso de Formação de Agentes, destinado ao ingresso na carreira de agentes de polícia e da Banda de Música da Polícia da Polícia de Segurança Pública”, conforme se pode constatar da leitura dos pontos 7 e 8 do mencionado Aviso – cfr., supra, ponto 1) da matéria de facto.
De igual modo, no início do procedimento concursal, o júri do concurso deliberou, a propósito do método “entrevista profissional de selecção”, que “os entrevistadores deverão, na medida do possível, colocar a todos os candidatos as mesmas questões, de modo a apurar os factores constantes do guião, o mesmo se aplicando à linguagem utilizada no relatório e justificação do parecer final”, mais tendo deliberado que a prova incidiria sobre “factos e actividades relacionados com a experiência de vida do candidato, sua maturidade, motivação ou outros consignados na ficha de avaliação da entrevista”. Cfr. ponto 2) do probatório.
Cientes das exigências de fundamentação dos actos administrativos a que se aludiu supra e também do seu carácter essencialmente instrumental, que pode variar em função do tipo de acto concretamente em causa, revertendo à situação dos autos, em que o ora Autor se insurge contra a sua exclusão do procedimento concursal na fase da entrevista profissional de selecção, cumpre, antes de mais, salientar que a propósito da fundamentação da avaliação da entrevista profissional, e conforme resulta do entendimento que tem sido reiterado pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, não obstante o nível de fundamentação possa ser de certo modo suavizado, atendendo às características de uma entrevista profissional de selecção, que implica necessariamente uma apreciação traduzida em juízos de carácter pessoal baseados em impressões subjectivas, torna-se imprescindível a existência de um mínimo de densidade do conteúdo declarativo do discurso fundamentador.
Ou seja, pese embora a fundamentação possa variar em função das circunstâncias concretas de cada caso, certo é que a mesma tem de indicar minimamente, com suficiência e clareza, as razões de facto e de direito que justificaram a prática do acto num determinado sentido, por forma a que o mesmo possa ser impugnado, de modo esclarecido, pelo respectivo destinatário e, em caso de impugnação contenciosa, de modo a que o Tribunal possa sindicar a validade material da decisão, a partir da sua fundamentação contextual.
Como se salientou no acórdão do STA, de 16/12/2009, proferido no proc. nº 0882/09 (disponível em www.dgsi.pt) “Ao exigir que a avaliação seja feita de forma objectiva e que a classificação tenha de ser devidamente fundamentada o legislador está a impor ao Júri o uso de padrões racionalmente comunicáveis - informando-o que não basta a transmissão de uma impressão subjectiva assente em meros critérios pessoais e obrigando-o a indicar de modo claro, perceptível e tanto quanto possível objectivo as razões da sua escolha - a fim de que o interessado possa compreender porque é que lhe foi atribuída uma determinada classificação e, se o quiser, a possa impugnar com o necessário esclarecimento. É certo que, tratando-se de entrevista pessoal, é impossível escapar a alguma dose de subjectividade e ao recurso a juízos de carácter pessoal baseados em impressões subjectivas, mas também o é que é por isso que se deve exigir uma cabal explicitação das razões da notação. O que quer dizer que fundamentação da notação dada na entrevista profissional não pode ser genérica e abstracta, constituindo meros juízos de valor ou considerações de tal modo abrangentes que podem ser aplicáveis a todo um conjunto de candidatos, nem pode ficar dependente de meros critérios pessoais desligados de qualquer objectividade.
Deste modo, e pese embora a fundamentação ter essencialmente uma função instrumental e variar em função do tipo legal do acto e das circunstâncias concretas de cada caso, certo é que a mesma tem de indicar, com suficiência e clareza, as razões de facto e de direito que justificaram o acto, por forma a que o mesmo possa ser impugnado com o necessário e indispensável esclarecimento. – Vd. a este propósito o Acórdão deste STA de 2/04/2008 (rec. 882/07).
E por ser assim é que este STA tem entendido que "em concurso de acesso na função pública, o acto valorativo e classificativo da entrevista de selecção satisfaz os requisitos legais da fundamentação, desde que da respectiva acta constem os factores objectivos a que se reportou a entrevista de todos os candidatos e as razões concretas, invocadas pelo júri em justificação da pontuação por ele atribuída a cada um daqueles,
de sorte que, nessas circunstâncias, um destinatário normal, possa aperceber-se se a pontuação atribuída ao interessado resultou ou não de erro grosseiro na valoração das capacidades e aptidões deste para o exercício das funções inerentes ao cargo a concurso." - Sumário do Acórdão STA de 25.3.93 proferido no recurso 30412) com sublinhado nosso. No mesmo sentido, podem ver-se os acórdãos de 23.6.99 no recurso 33901, de 6.10.99 no recurso 35267, de 15.2.01 no recurso 41530, de 7.3.01 no recurso 36948, de 21.3.01 no recurso 38624, de 25.10.01 no recurso 38638 e de 16.4.02 no recurso 46378.” (fim de citação).
Na mesma linha argumentativa, sublinhou-se no aresto daquele Supremo Tribunal, de 26/04/2018, proferido no proc. nº 0287/17 (igualmente disponível em www.dgsi.pt), o seguinte: “não pode atingir essa densidade mínima uma fundamentação «em que, de uma forma genérica e abstrata, se invocam meros juízos de valor ou considerações de tal modo abrangentes que podem ser aplicáveis a uma série de situações», ou com apelo a uma «mera indicação dos fatores de avaliação e das correspondentes notações quantitativas, sem explicitação das razões concretas motivadoras das pontuações atribuídas pelo júri», mostrando-se, ao invés, como bastante ou como suficiente «a motivação da entrevista que, apesar de ser feita mediante uma ficha-modelo, contém a indicação sucinta dos assuntos abordados, os parâmetros de avaliação relevantes, a classificação atribuída e o critério de notação que concretiza o desempenho individual do entrevistado», ou em que da «ata constem os fatores objetivos a que se reportou a entrevista de todos os candidatos e as razões concretas, invocadas pelo júri em justificação da pontuação por ele atribuída a cada um daqueles, de sorte que, nessas circunstâncias, um destinatário normal, possa aperceber-se se a pontuação atribuída ao interessado resultou ou não de erro grosseiro na valoração das capacidades e aptidões deste para o exercício das funções inerentes ao cargo a concurso».” (sublinhado nosso).
Por outro lado, também importa salientar, atento o alegado pela Entidade Demandada, que a circunstância de os juízos formulados pela Administração no exercício de prerrogativas de avaliação se enquadrarem no âmbito da chamada discricionariedade técnica, não significa que a actividade administrativa que se insira no âmbito do exercício de poderes discricionários não esteja submetida a vinculações jurídicas ou que tal actividade esteja subtraída ao controlo judicial.
De resto, e como resulta, desde logo, do disposto no art. 3º, nº 1, do CPTA, a natureza do acto em nada impede o Tribunal de exercer a sindicância judicial sobre o mesmo, porquanto, o controlo jurisdicional da actuação da Administração, sempre que a mesma se insira no âmbito do exercício de poderes discricionários, deve “estender-se à cabal fiscalização do respeito pelas regras e princípios jurídicos (cfr. artigo 3º do CPTA)”, sendo certo que, “existem sempre vinculações jurídicas, pois não há decisões totalmente discricionárias”, assumindo neste âmbito um papel fundamental a “verificação do respeito pelos princípios gerais da actividade administrativa, consagrados no artigo 266º, nº 2, da CRP e nos artigos 3º e segs. do CPA, pelos quais devem orientar-se as opções discricionárias da Administração e que, portanto, consubstanciam limites internos ou intrínsecos ao exercício do poder discricionário” – cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria Geral do Direito Administrativo, 3ª edição, Almedina, 2015, pp. 312 e 313.
Sendo certo que um dos vínculos ao exercício do poder discricionário por parte da Administração é, precisamente, a observância das determinações legais respeitantes à tramitação do procedimento administrativo, à forma do acto e à exteriorização dos motivos da concreta actuação administrativa, por forma a que o Tribunal possa efectuar o controlo associado aos pressupostos em que a administração baseou a sua decisão e fiscalizar a eventual ocorrência de desvio de poder ou de um erro manifesto de apreciação.
Regressando ao causo dos autos, desde já se adianta que, da análise do teor da ficha de avaliação elaborada pelos entrevistadores que, por sua vez, serviu de base à deliberação do júri e consequente homologação pelo Director Nacional da PSP no sentido da exclusão do Autor do procedimento por eliminação no método de selecção “entrevista profissional de selecção”, se conclui que o acto padece da falta de fundamentação que lhe vem apontada pelo Autor, por falta de indicação, na referida ficha, do resumo dos temas abordados e por inexistência de fundamentação objectiva da classificação atribuída na entrevista em cada um dos parâmetros de avaliação previamente definidos no guião.
Vejamos melhor.
Como se viu supra, a entrevista profissional de selecção visa avaliar, de forma objectiva e sistemática, a experiência profissional e aspectos comportamentais evidenciados durante a interacção estabelecida entre os entrevistadores e o entrevistado, nomeadamente os relacionados com a capacidade de comunicação e de relacionamento interpessoal, devendo ser elaborada, por cada entrevista profissional de selecção, uma ficha individual contendo o resumo dos temas abordados, os parâmetros de avaliação e a classificação obtida em cada um deles, devidamente fundamentada. Isso mesmo determina o já citado art. 11º, nºs 1 e 2, da Portaria nº 236-A/2010, de 28 de Abril, e encontra-se, igualmente, vertido no ponto 7.5. do aviso de abertura do concurso.
E também como resulta de tudo quanto acima se expôs, ao exigir que a avaliação seja feita de forma objectiva e que a ficha individual elaborada por cada entrevista contenha o resumo dos temas abordados e que a classificação atribuída em cada um dos parâmetros de avaliação definidos tenha de ser devidamente fundamentada, a lei exige que o acto valorativo e classificativo da entrevista deve conter, ainda que sucintamente, as razões concretas invocadas em justificação da notação atribuída, não bastando a transmissão de uma impressão subjectiva assente em meros critérios pessoais, não podendo, de igual modo, a fundamentação da pontuação obtida na entrevista profissional revestir um carácter genérico e abstracto.
Ora, in casu, e como se alcança do probatório [cfr. pontos 9) e 10)], constata-se que a ficha individual elaborada pelos entrevistadores contém a indicação dos parâmetros relevantes que serviram de base à avaliação (apresentação, expressão verbal, sociabilidade, espírito crítico, maturidade, estabilidade emocional e motivação) e, bem assim, os sub-parâmetros que especificam cada um dos 7 factores de apreciação, contendo, ainda, os valores pontuais que foram atribuídos a cada um desses sub-parâmetros e a correspondência numérica com os níveis classificativos pré-definidos de Excelente/Elevado, Bom, Suficiente, Reduzido e Insuficiente.
Contudo, a primeira observação a fazer é que na ficha de avaliação ora em análise, não vêm indicados os critérios diferenciadores dos diferentes níveis classificativos, isto é, nela não se referem, com uma suficiente densificação, os critérios que presidem à atribuição de cada uma das diferentes pontuações, numa escala de 1 a 5.
Com efeito, os parâmetros e sub-parâmetros pré-definidos pela Entidade Demandada, não vêm acompanhados dos critérios que densificam e justificam a atribuição das diferentes notações existentes, não estando pré-definido pela Administração qual o desempenho que o candidato deveria ter revelado ou o que é que teria de estar verificado para que lhe fosse atribuída a classificação de 1, 2, 3, 4 ou 5 (correspondentes à classificação de Excelente, Bom, Suficiente, Reduzido e Insuficiente, respectivamente), em cada factor de avaliação.
Na verdade, compulsada a ficha de avaliação aqui em causa, é possível verificar que os critérios para a atribuição das diferentes pontuações apenas vêm definidos para a notação máxima (1 – Excelente) e para a pontuação mais baixa (5 – Insuficiente), desconhecendo-se os critérios que presidem à atribuição, pelos entrevistadores, da classificação de 2, 3 ou 4. Pelo que não existe um mínimo de fundamentação para cada um dos níveis classificativos pré-definidos, afigurando-se, neste aspecto, a fundamentação insuficiente, o que equivale à sua falta (cfr. art. 153º, nº 2, do CPTA).
Por outro lado, em sede de relatório elaborado pelos entrevistadores e anexo à aludida ficha de avaliação, também não foram expostas pelos entrevistadores as razões concretas da atribuição de cada um dos níveis classificativos, por referência aos diferentes parâmetros e sub-parâmetros definidos no guião, não se encontrando, assim, minimamente justificadas as diferentes pontuações obtidas pelo candidato nos diversos parâmetros.
Da análise do referido relatório, verifica-se que do mesmo não consta, ainda que de modo sucinto, uma justificação para cada uma das classificações atribuída, nos diversos sub-parâmetros objecto de avaliação, mas, sim, uma observação muito vaga e abrangente (a respeito da apresentação, história de vida, relações interpessoais, aspectos da personalidade, estabilidade emocional e atitude e motivação) que não encontra correspondência, nem com os 7 parâmetros relevantes fixados nem com os sub-parâmetros em que os mesmos se dividem e que foram em concreto alvo de pontuação.
Veja-se, por exemplo, que no parâmetro 6 (Estabilidade Emocional) foram atribuídos níveis classificativos a 9 sub-parâmetros, sendo que do relatório do júri apenas surge justificado o sub-parâmetro 6.2 – Bom contacto visual, nada sendo dito quanto aos demais. O mesmo sucedendo relativamente aos restantes parâmetros.
Assim, não estando os critérios que presidem à atribuição de cada um dos níveis classificativos pré-definidos na ficha de avaliação e não resultando minimamente densificado no relatório do entrevistador qual o desempenho do candidato em cada um dos parâmetros e sub-parâmetros que determinou a atribuição da nota concretamente obtida, numa escala de 1 a 5, forçoso é concluir pela falta de fundamentação do acto avaliativo.
Também não evidenciando esse mínimo de fundamentação, ressalve-se, a justificação do parecer dado em sede de entrevista, porquanto, as considerações ali tecidas nem sequer abrangem cada um dos parâmetros relevantes de avaliação, nem justificam as classificações concretamente obtidas pelo candidato em cada um dos sub-factores que especificam os aludidos parâmetros.
Acresce que, as vagas observações feitas no relatório anexo à ficha individual da entrevista revelam, ainda, a incongruência da parca fundamentação existente, na medida em que ali é dito que a capacidade de comunicação do Autor se revelou minimamente satisfatória, ao passo que, na avaliação feita pelos entrevistadores ao parâmetro “Expressão Verbal” foi atribuída a classificação de 4 (Reduzido), em todos os sub-parâmetros do mesmo (Dicção e articulação das frases; Discurso; e Coerência e articulação das ideias), o que não se coaduna com o juízo formulado pela Administração quanto ao carácter minimamente satisfatório da capacidade de comunicação do ora Autor, sendo certo que, compulsado o guião, se verifica que o parâmetro “Apresentação” se reporta ao aspecto físico, postura física e comportamental, expressão gestual e fisionómica, higiene/asseio e indumentária, não estando relacionado com a capacidade de comunicação do candidato.
O mesmo sucedendo quanto à classificação atribuída ao sub-parâmetro 6.2 “Bom contacto visual”, em que o mesmo foi pontuado com o nível 3 – Suficiente, quando do relatório anexo à ficha de avaliação consta a seguinte observação “Desvia constantemente o olhar”, circunstância que, à luz dos critérios constantes do guião corresponderia, aparentemente, ao nível 5 (“Tentativas sucessivas de esquivar o olhar”).
Ademais, verifica-se, ainda, uma total omissão na indicação, ainda que sucinta, dos assuntos abordados, o que se impunha, atento o disposto no já referido art. 11º, nº 2, da Portaria nº 236-A/2010, conjugado com o disposto no art. 153º do CPA.
Com efeito, e considerando que as questões a colocar não estavam previamente definidas ou pelo menos não se encontravam divulgadas na ficha de avaliação, à luz das citadas disposições legais, impunha-se a elaboração do resumo dos temas abordados, bem como a mínima explicitação do desempenho ou reacção do candidato em cada um dos assuntos abordados, pois só dessa forma seria permitido ao tribunal aferir se foram avaliadas de forma objectiva as aptidões profissionais e pessoais do Autor. O que não foi feito no caso vertente.
A elaboração deste resumo surge, assim, como indispensável para se considerar cumprido o dever de fundamentação da classificação atribuída na entrevista, em cada um dos parâmetros relevantes. O resumo dos assuntos da entrevista surge como um elemento objectivo que, conjugado com os parâmetros relevantes e com a fundamentação dada à notação atribuída a cada um deles, vai permitir que possa ser sindicada a ocorrência de eventual erro grosseiro por parte do júri na classificação atribuída.
Em sentido próximo, vejam-se as considerações expendidas no já citado acórdão do STA, de 16/12/2009, no qual se pode ler, designadamente, que “era obrigação do Júri avaliar de forma objectiva as aptidões profissionais e pessoais da Recorrida e elaborar a ficha correspondente à entrevista donde constasse o resumo dos assuntos abordados, os parâmetros classificatórios relevantes e a notação obtida em cada um deles, fundamentando devidamente a classificação atribuída. (…) a ficha da Recorrida contém apenas a indicação dos parâmetros que serviram de base à sua classificação (Capacidade de comunicação; Capacidade de relacionamento; Motivação; Sentido crítico face e Capacidade de adaptação) e os valores que lhes foram atribuídos (1 ponto para cada um deles, no total de 5) sem fazer qualquer referência às razões para esta notação, isto é, sem identificar as matérias a que ela respondeu e sem indicar porque é que se entendeu que as suas respostas revelaram deficiente capacidade de comunicação, de relacionamento, de motivação e de adaptação e revelaram também deficiente sentido crítico. O que nos força a concluir que o Júri não só não exteriorizou as razões concretas que o levaram atribuir apenas um ponto a qualquer um dos mencionados itens como também não fez, como a lei obrigava, um resumo dos assuntos abordados nem indicou porque é que considerava deficiente a reacção da Recorrida aos assuntos que lhe foram colocados. É certo - como já se disse - que não era obrigatório que a fundamentação daquelas notações fosse uma exaustiva descrição de todas as razões que estiveram na sua base, bastando que se traduzisse numa sucinta exposição dos seus fundamentos Vd. art.º 125º do CPA. e que, atento o elevado número de candidatos, não era exigível que a mesma tivesse uma grande densidade, mas também o é que a indicação da nota relativa a cada um dos itens desacompanhada de qualquer indicação acerca dos elementos que a determinaram é insuficiente para que a mesma se possa considerar fundamentada.”.
Ainda no mesmo sentido, veja-se o discurso fundamentador do também já mencionado acórdão do STA, de 26/04/2018, do qual se pode retirar o seguinte: “(…) in casu, para além da ausência de uma indicação, ainda que sucinta, dos assuntos abordados ou mesmo das questões que foram colocadas em cada entrevista profissional de seleção, também os níveis classificativos de notação quanto às variações de desempenho, pré-fixados e transcritos na ficha-modelo, não permitem encontrar a justificação para a atribuição de classificações numéricas diferenciadas, visto o júri se haver limitado a informar quais as classificações que iria atribuir e os valores que lhes correspondiam sem indicar os critérios diferenciadores de tais notações, de modo a que cada candidato se pudesse considerar como informado, não só das razões pelas quais lhe foi atribuída a concreta notação, mas também, por comparação com a justificação das demais, dos motivos porque não obteve uma qualquer outra classificação numérica, superior ou inferior.”.
Nesta conformidade, no caso vertente, não constando do acto avaliativo aqui em causa nem a justificação da classificação atribuída na entrevista de selecção a cada um dos parâmetros e sub-parâmetros pré-definidos, nem a indicação dos assuntos abordados naquele método de selecção, nos termos supra expostos, resta concluir pela verificação do vício de falta de fundamentação da entrevista profissional de selecção, o qual inquina o acto final emitido no procedimento – acto de homologação da lista de ordenação final dos candidatos aprovados e excluídos do concurso – determinando a sua anulabilidade (cfr. art. 163º, nº 1, do CPA).
Procedendo, assim, a acção, nesta parte.
*
Alegou, ainda, o Autor que o acto aqui impugnado enferma de invalidade por erro nos pressupostos de facto.
Argumentou, a este propósito, que não aceita que, no âmbito da entrevista, se tenha dado relevância a alegadas ocorrências policiais ou ilícitos criminais e que tenha sido dado por assente, quer pelos entrevistadores, quer pelo júri, o facto de o Autor estar alegadamente envolvido em ocorrências dessa natureza, porquanto, o mesmo não tem averbado no seu registo criminal nenhuma condenação nem tem em curso contra si nenhum processo de natureza criminal. Pelo que, ao pretender-se imputar ao Autor factos de natureza ilícita e criminal, ainda que indirectamente, para daí ser retirada a conclusão de que tais factos não poderiam ser ignorados na tomada de decisão, os entrevistadores violaram o princípio da legalidade.
Por seu lado, defendeu a Entidade Demandada que não corresponde à verdade que quer os entrevistadores, quer o júri, tivessem dado como assente que o Autor estivesse alegadamente envolvido em ocorrências policiais, assim como não corresponde à verdade que isso constasse na ficha de avaliação ou no processo do candidato.
Mais referiu a Demandada que, eventualmente, tal tema poderá ter sido abordado na entrevista, pois o mesmo é relevante para a apreciação dos aspectos comportamentais evidenciados pelo Autor durante a interacção estabelecida entre entrevistador e entrevistado, bem como, à forma como o mesmo reagia a situações de pressão.
Ora, está em causa saber se os entrevistadores e, posteriormente, o júri do concurso, basearam a classificação atribuída ao Autor no método de selecção da entrevista profissional em pressupostos de facto errados, concretamente, se atribuíram relevância, na avaliação dos parâmetros definidos, a alegados envolvimentos do Autor em ocorrências de natureza criminal, quando do registo criminal do mesmo nada consta quanto a prática de ilícitos dessa natureza.
Contudo, a este respeito, e tendo em conta a conclusão a que se chegou supra quanto à deficiente fundamentação do acto ora impugnado, cumpre salientar que essa ausência de fundamentação não permite ao Tribunal aferir se, in casu, se verifica um erro manifesto de apreciação quanto aos pressupostos de facto em que a Administração baseou o seu acto avaliativo.
É que, como já ficou dito, as exigências de fundamentação dos actos administrativos visam não só dar a conhecer aos respectivos destinatários as razões de facto e de direito que estão na sua génese, de modo a permitir ao destinatário optar, de forma esclarecida, entre acatar o acto ou accionar os meios de reacção contenciosa mas, também, e na hipótese de accionamento da via de impugnação contenciosa, permitir ao tribunal exercer o efectivo controlo da legalidade do acto, aferindo o acerto dos pressupostos factuais e jurídicos em que o mesmo se baseia, a partir dos fundamentos emitidos.
Quanto à circunstância ora invocada pelo Autor de os entrevistadores terem dado por assente e valorizado o facto de o mesmo ter estado alegadamente envolvido em ocorrências policiais ou ilícitos criminais, os factos provados nos presentes autos apenas nos dão a conhecer a este respeito que na data da realização da entrevista profissional de selecção, o Autor preencheu um questionário biográfico onde, no campo relativo à sua intervenção em processos pendentes em Tribunal, referiu que terá tido uma participação num processo judicial na qualidade de testemunha; que os entrevistadores, em sede resposta à reclamação do Autor dirigida ao método de selecção da entrevista, referiram que “as perguntas dirigidas ao candidato procuraram somente aferir os gostos, relações e personalidade do [mesmo], no sentido de avaliar se o mesmo reunia o perfil indicado para as funções a que se candidatava, colocando-o fora da sua zona de conforto, por forma a que expressasse as suas motivações” e, bem assim, que o júri do procedimento, deliberou manter a nota atribuída ao candidato em sede de entrevista profissional de selecção com a seguinte argumentação: “Se no decurso da entrevista surgiu o conhecimento de factos configurados como ocorrências policiais ou ilícitos criminais em que o candidato esteve de algum modo envolvido, directa ou indirectamente, não poderiam os entrevistadores ignorá-los e não poderiam deixar de explorá-los na interacção com o candidato”.
Porém, considerando que da ficha individual elaborada pelos entrevistadores não consta, nem um resumo dos assuntos abordados na entrevista, nem a indicação, ainda que sucinta, das respostas dadas pelo candidato às perguntas que lhe foram colocadas ou da reacção do mesmo perante os assuntos que lhe foram colocados, e não resultando ainda demonstrado nos autos que o alegado envolvimento do Autor, ainda que indirecto, em ocorrências de natureza criminal e participação em processos judicias, haja efectivamente motivado a classificação atribuída a um determinado parâmetro avaliativo e em que medida, porquanto, e desde logo tal não resulta evidenciado da (insuficiente) motivação do acto, ao Tribunal não é permitido aferir se a pontuação atribuída ao interessado resultou ou não de erro grosseiro na valoração das capacidades e aptidões deste para o exercício das funções inerentes ao cargo a concurso, designadamente, por essa valoração assentar em pressupostos manifestamente errados.
Pois, reitere-se, da matéria de facto provada nos autos não resulta, desde logo, que o envolvimento do Autor em ocorrências policiais ou sua participação em processos judiciais haja sido um assunto efectivamente aflorado na entrevista, não permitindo o teor do acto, de igual modo, aferir se e em que medida tal assunto e o consequente desempenho do candidato a esse respeito contribuiu para a motivação da classificação atribuída pelos entrevistadores, por referência aos diferentes parâmetros de avaliação.
Deste modo, “sem a exteriorização suficiente dos raciocínios em que assenta a decisão administrativa é impossível apurar se há ou não um erro grosseiro e se há ou não uma violação de algum dos muitos princípios jurídicos vinculativos de toda a atividade administrativa. Essa fundamentação há de ser, portanto, de molde a permitir conhecermos não só os pressupostos e os motivos em que assentou a decisão, bem como aquilatarmos se foram (ou não) cumpridas as normas do procedimento administrativo, se a decisão reflete (ou não) a exatidão material dos factos, se houve (ou não) erro manifesto de apreciação e se existiu (ou não) desvio de poder.” – assim, ver o acórdão do TCA Sul, de 16/06/2016, proferido no proc. nº 12565/15 (disponível em www.dgsi.pt).
(…)”.
Escrutinada a posição exposta na sentença agora recorrida, e concatenando a mesma com a factualidade que resulta do probatório positivo, é nosso entendimento que o julgamento realizado pela Instância a quo revela-se acertado.
Efetivamente, tomando em consideração os objetivos que se visa alcançar com a realização da entrevista profissional, não podemos deixar de assinalar que as observações registadas pelo Júri da mesma assumem um caráter essencialmente conclusivo, destituído de qualquer lastro ou suporte explicativo que permitam apreender o iter percorrido pelo Júri para construir a sua conclusão final de incapacidade e de inadequação do perfil do Recorrido.
Realmente, relembre-se que o art.º 11.º, n.º 1 da Portaria n.º 236-A/2010 prescreve que a entrevista profissional de seleção visa avaliar, de modo objetivo e sistemático, a experiência profissional do candidato, bem como aspetos comportamentais evidenciados durante a interação estabelecida no decurso da entrevista, aspetos esses respeitantes, mormente, com a capacidade de comunicação e relacionamento interpessoal.
O n.º 2 do mesmo preceito estipula, ainda, que por cada entrevista profissional de seleção deve ser elaborada uma ficha individual, contendo o resumo dos temas abordados, os parâmetros de avaliação a classificação obtida em cada um deles, devidamente fundamentada.
Ora, perscrutando a factualidade vertida no ponto 10 do probatório, facilmente se conclui que não existe qualquer resumo dos temas abordados e que a classificação obtida pelo Recorrido em cada um dos parâmetros de avaliação não se encontra devidamente fundamentada.
Com efeito, para além da ficha-modelo não exprimir a razão das concretas notações parcelares que foram sendo atribuídas ao Recorrido, também não se logra percecionar a motivação do Júri que justifique as conclusões exaradas quanto aos parâmetros de avaliação.
Concretamente, a análise da ficha individual da entrevista do Recorrido não permite apreender, v.g, o que é que permitiu ao Júri da entrevista concluir que o nível de autonomia e vida própria independente do Recorrido é “Reduzido” (8 valores), ou porque é que a indumentária do Recorrido era quase do extravagante, ou porque é que o Júri concluiu que o Recorrido revela incapacidade de inserção ou participação em grupos, etc..
De modo similar, também não entendemos as razões que conduziram o Júri a concluir, relativamente ao Recorrido, que, quanto à “Apresentação”, "a sua capacidade de comunicação manifesta-se minimamente satisfatória"; que, quanto à “História de Vida”, porque é que o Recorrido "demonstra algumas dificuldades em se integrar na sociedade"; que, quanto às “relações Interpessoais”, porque é que o Recorrido "não evidencia empatia e confiança necessária para trabalhar em equipa"; que, quanto a “Aspetos da Personalidade”, porque é que o Recorrido "acusa dificuldades perante as situações e questões que lhe são colocadas"; que, quanto à “Atitude e Motivação”, porque é que o Recorrido "tem um projeto de vida pouco definido".
Ou seja, face ao que se encontra exarado na ficha individual do Recorrido, não é possível refazer o iter cognoscitivo-valorativo trilhado pelo Júri da entrevista e, desse modo, indagar se a avaliação do Júri foi realizada de modo objetivo e sistemático e tendo em conta, somente, os aspetos relevantes para apurar e qualificar a experiência profissional do Recorrido e os aspetos comportamentais relevantes. Na verdade, face ao teor conclusivo das afirmações exaradas na ficha individual do Recorrido, bem como face à indemonstração dos motivos subjacentes às notações parcelares, não pode este Tribunal concluir pelo acerto da apreciação do Júri, do mesmo modo que não pode concluir pelo desacerto da apreciação do mesmo Júri. E tanto basta para desembocar na assunção da ausência de adequada e suficiente fundamentação referentemente ao resultado da entrevista profissional de seleção que foi realizada pelo Recorrido.
Ressalte-se que, no concernente a esta temática, não subsistem dissidências relevantes na Jurisprudência, que tem vindo a afirmar, claramente- e para além da Jurisprudência citada na sentença impetrada-, que “a entrevista profissional de selecção implica uma apreciação traduzida necessariamente em juízos de carácter pessoal baseados em impressões subjectivas, pelo que, nesse caso, a exigência legal de fundamentação basta-se com um mínimo de densidade do conteúdo declarativo do discurso fundamentador”, mas que “não atinge essa densidade mínima a fundamentação em que, de uma forma genérica e abstracta, se invocam meros juízos de valor ou considerações de tal modo abrangentes que podem ser aplicáveis a uma série de situações”- Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 02/04/2008 no processo 0882/0.
A este propósito, releva convocar o julgamento realizado pela mesma Suprema Instância, no Acórdão proferido em 31/10/2013, no processo 0296/11, que bem explicita, a nosso ver, a dificuldade e as exigências específicas de fundamentação numa situação similar à do caso posto. Neste Aresto, o Supremo Tribunal Administrativo exprimiu o seguinte:
“(…)
Mas, a fundamentação de uma entrevista é, a nosso ver, um campo específico no qual interagem forças cuja conciliação, na aplicação prática da lei escrita, é, para a Administração, um exercício difícil. E o Tribunal não pode deixar de ponderar essa particular dificuldade quando sindica a suficiência da motivação.
Na verdade, por um lado, estamos num domínio que envolve escolhas em espaços de valorações próprias da Administração, no qual, por isso mesmo, a fundamentação é especialmente exigível, uma vez que a “liberdade” de valoração, a grande abertura normativa, a falta de regulamentação substancial prévia, tem de ser compensada com uma imposição de transparência capaz de assegurar uma protecção judicial efectiva; (Vide, a propósito, Vieira de Andrade, in “O Dever da Fundamentação Expressa de Actos Administrativos”, p. 138 e, por todos, o Acórdão do Pleno STA de 2008.09.18 – rec. nº 941/05)) por outro lado, tem de se ter em conta a dificuldade do júri em externar, num silogismo perfeito, o juízo que faz sobre os candidatos, pois, como é sabido, os actos de avaliação das pessoas, uns mais do que outros, envolvem sempre impressões do avaliador que não são fáceis de passar para o discurso justificativo.
Entendemos, assim que, se para as avaliações em entrevistas profissionais, por razões garantísticas, deve valer a jurisprudência este Supremo Tribunal, segundo a qual, “a fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo, cuja densidade varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação” (Cfr., por todos, o acórdão do Tribunal Pleno de 2005.12.06 – rec. nº 1126/02), também, para esses mesmos actos, se justifica, por razões de praticabilidade, que a jurisprudência não seja demasiado rigorosa na apreciação da densidade mínima aceitável do conteúdo declarativo da fundamentação.
Dito isto, consideramos que, no acto administrativo impugnado, a entidade demandada conseguiu harmonizar bem os valores do par garantia/praticabilidade.
Na verdade, com ganhos de objectividade, o júri começou por fixar, antes da entrevista: (i) os factores de avaliação relevantes; (ii) o que se iria ponderar em cada um deles (vide 3.2. da Acta nº 1, ponto 4. do probatório) e (iii) o modo de valoração desses factores, definindo os critérios de atribuição das diversas notações da escala numérica (cfr. 3.2 da Acta nº 1, ponto 4. do probatório).
Depois, a fundamentação concreta de cada entrevista individual foi levada a cabo pelo preenchimento de uma ficha-modelo, na qual está inscrita uma grelha de classificação graficamente apresentada em quadriculado, em que cada quadrícula contém uma notação numérica, resultante do cruzamento de colunas verticais encimadas pela indicação dos factores avaliados, e de colunas horizontais correspondentes aos diversos modos de avaliar esses mesmos factores, nas quais estão transcritos os critérios de classificação pré-definidos (tal como estão enunciados no ponto 4. do probatório supra).
Método que, com ser célere e eficiente, cumpre as exigências do dever de fundamentar, pois que, quando se assinala (com uma cruz) cada uma das quadrículas, dão-se a conhecer, a um tempo, os assuntos/factores abordados na entrevista, os parâmetros de avaliação relevantes, a classificação atribuída e o respectivo critério de notação.
E como podemos ver, pelos respectivos enunciados linguísticos, os critérios de notação, pré - fixados e transcritos na ficha - modelo, indicam, com clareza, os elementos de ponderação considerados e as variações de desempenho (ainda que ligeiras e subtis nas notas mais aproximadas) que justificam a atribuição de classificações numéricas diferenciadas.
Assim, o candidato fica informado, não só das razões pelas quais lhe foi atribuída aquela notação concreta, mas também, por comparação com a justificação das demais, dos motivos porque não obteve uma qualquer outra classificação numérica, superior ou inferior.
O mesmo é dizer que o candidato, suposto destinatário médio do acto, fica a conhecer as razões pelas quais a entidade demandada lhe atribuiu a classificação e em condições de desencadear os adequados meios administrativos e/ ou contenciosos de impugnação.
Deste modo, improcede o alegado vício de falta de fundamentação.
(…)”
Sucede, todavia, que ainda que a problemática jurídica versada no presente recurso seja similar à que foi tratada no Acórdão vindo de transcrever, a verdade é que a situação dos presentes autos não assume a mesma facticidade que estava em causa no citado Acórdão. Referimo-nos- evidentemente- ao prévio labor do Júri na identificação dos temas concretos a tratar na entrevista, “o que se iria ponderar em cada um deles” (…) “e o modo de valoração desses factores, definindo os critérios de atribuição das diversas notações da escala numérica”. Realmente, como decorre do probatório, este labor não foi concretizado adequadamente, nem suficientemente, pelo Júri, redundando tal omissão- após a realização de um exercício intelectual racional e lógico- na incompreensão da motivação subjacente à notação atribuída ao Recorrido e à qualificação das suas capacidade e competência.
Quer isto significar, portanto, que o ato de exclusão do Recorrido não pode manter-se, por violação do disposto no art.º 11.º, n.ºs 1 e 2 da Portaria n.º 236-A/2010, de 28 de abril e ainda do preceituado no art.º 153.º, n.ºs 1 e 2 do CPA.
Sendo assim, o julgamento efetivado na sentença recorrida, no tocante à fundamentação do ato recorrido, revela-se acertado, importando concluir pela improcedência do alegado pelo Recorrente nas conclusões 1.ª a 23.ª das suas alegações de recurso.

O Recorrente impetra ainda a decisão a quo por discordar do entendimento vertido na mesma no que se refere à violação do n.º 3 do art.º 11.º da Portaria n.º 236-A/2010, de 28 de abril.
Com efeito, a sentença recorrida julgou que o Recorrente desrespeitou o ditame contido no sobredito normativo, não por considerar que a entrevista profissional de seleção devesse ter sido realizada por, pelo menos, um psicólogo da Divisão de Psicologia da PSP, mas por considerar que a não intervenção de tal psicólogo deveria ter sido fundamentada, atenta a circunstância do legislador ter consignado a expressão “sempre que possível”.
Por conseguinte, o ataque dirigido pelo Recorrente a esta parte do julgado revela-se inócuo e fútil, pois que, em momento algum, o Tribunal recorrido exarou a necessidade de estar presente um Psicólogo durante a entrevista. O que estabeleceu foi, sim, que o Recorrente deveria ter fundamentado a ausência de um psicólogo no Júri da entrevista, explicitando as razões pelas quais tal presença não se mostrava possível.
Seja como for, acompanhamos a visão espraiada na sentença recorrida quanto a esta matéria, pois que, assoma evidente a preferência legislativa pela integração de um psicólogo no Júri da entrevista profissional de seleção, somente admitindo a substituição de tal profissional quanto tal não seja possível. Pelo que, reiteramos o entendimento de que a não integração de um psicólogo da Divisão de Psicologia da PSP no Júri da entrevista deveria ter sido justificada e fundamentada.
Do que vem de expender-se deriva, pois, a violação da norma contida no mencionado n.º 3 do art.º 11.º da Portaria n.º 236-A/2010, não subsistindo incorreção na apreciação que foi realizada pela sentença recorrida.


E, sendo assim, o ato de exclusão do Recorrido não pode manter-se, em virtude da ilegalidade que advém do desrespeito do estatuído nos art.ºs 11.º, n.ºs 1, 2 e 3 da Portaria n.º 236-A/2010, de 28 de abril e 153.º, n.º 1 e 2 do CPA.

Desta feita, atenta a factualidade provada e o enquadramento legal em que se movimenta o caso em análise, apresenta-se inequívoco que a sentença a quo não padece dos erros de julgamento que lhe são assacados, antes revelando um acerto insuscetível de ser abalado pelo vertente recurso jurisdicional.
Pelo que, em conformidade, terá de negar-se provimento ao presente recurso e confirmar-se a sentença recorrida.


IV- DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em Conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.


Custas a cargo do Recorrente.

Registe e notifique.




Lisboa, 20 de outubro de 2021,

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Paula Cristina Oliveira Lopes de Ferreirinha Loureiro- Relatora

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Jorge Pelicano

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Celestina Castanheira