Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:618/18.5BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:09/26/2019
Relator:HELENA AFONSO
Descritores:SUSPENSÃO DE EFICÁCIA DE ACTO DE ALTERAÇÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO.
NULIDADE DA SENTENÇA – VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
CONFISSÃO DE FACTOS.
DIREITO DE AUDIÊNCIA PRÉVIA.
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO – ARTIGOS 1.º E 3.º DO REGULAMENTO N.º 2988/95, DO CONSELHO.
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO.
Sumário:
I – Com a suspensão da eficácia do acto peticionada nos presentes autos, a Requerente visava, entre outros efeitos, que a Entidade Recorrida fosse intimada a abster-se de compensar, ou seja, de reter subsídios a que a mesma, alegadamente, teria direito, não efectuando a retenção dos mesmos para compensar o pagamento da quantia cuja restituição foi determinada pelo acto suspendendo.
II - Assim, a sentença recorrida apreciou questão que não lhe foi colocada e decidiu indeferir pedido de compensação que não lhe havia sido formulado pela Requerente, ora Recorrente, em violação do estabelecido nos artigos 609.º, n.º 1 e 615.º n.º 1, alíneas d) e e), do CPC ambos do CPC, verificando-se a apontada nulidade da mesma.
III - Tendo havido oposição, nos termos do art.º 118.º, n.º 2, do CPTA e estando os referidos factos em oposição com a defesa efectuada pela Entidade Requerida na oposição, nos termos previstos no artigo 574.º. n.º 2, do CPC, supletivamente aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, não poderia presumir-se que os factos invocados no r.i. eram verdadeiros.
IV - Face às dúvidas que se suscitaram à Entidade Recorrida era à ora Recorrente que competia provar – por documento - que as despesas que apresentou relativas à realização dos trabalhos em causa observam as normas aplicáveis, o que não logrou fazer, pelo que, a sentença recorrida não incorreu no invocado erro de julgamento da matéria de facto e de direito, não violando o disposto no artigo 342.º do Código Civil.
V – A data a considerar para aferir se ocorreu a prescrição é a data da prática da irregularidade, que deverá considerar-se como sendo a do último pagamento efectuado, que ocorreu em 28.11.2014, e não a data da aprovação do financiamento ou a data da celebração do contrato, pelo que, tendo a Requerente sido notificada, por ofício datado de 27.09.2016, do projecto de decisão e para exercer o direito de audiência prévia, ocorreu uma causa de interrupção do procedimento, iniciando-se novo prazo de prescrição a partir desse evento. Assim, quando foi proferido o acto suspendendo, notificado à Recorrente com data de 22/06/2018, ainda não se tinha completado o prazo de prescrição de 4 anos, não incorrendo a sentença recorrida nos imputados vícios de violação dos artigos 1.º e 3.º do Reg. CE n.º 2988/95, de 18 de Dezembro de 1995.
VI – O acto suspendendo está suficientemente fundamentado de facto e de direito, pois referiu, designadamente, os trabalhos, valores e respectivos prestadores, relativamente aos quais apontou irregularidades, invocou o artigo 33.º do Regulamento (CE) 65/2011 da Comissão para decidir que não existe pista de controlo das despesas apresentadas pela Recorrente, o n.º 1, do artigo 30.º do referido Regulamento, bem como, as cláusulas B.1, B.3, C1, e I.1, do contrato.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – Relatório:

A……… – Associação de Produtores F….. do Alto Alentejo, NIF ..............…, com sede na Rua …, lote … – Zona Industrial S….., 7400-…. Ponte de Sor, instaurou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, processo cautelar contra o IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P., pessoa colectiva de direito público com o NIF ..........…., com sede na Rua C…., n.º 45-…, 1269-…Lisboa, no qual pediu que fosse decretada a suspensão da eficácia da decisão do Presidente do Conselho Directivo do IFAP que determinou a alteração do contrato de financiamento n.º 02024…./0, referente ao pedido de apoio na operação n.º ...............…, designada por Z…I…F. do Viso e Anexas, e a devolução do valor de € 463.122,69, recebido pela Requerente a título de subsídio de investimento, notificada à Requerente através do ofício 0049…/2018 ….-UREC, de 22-06-2018 e recepcionado em 25-06-2018.

Por sentença de 21 de Junho de 2018 do referido Tribunal foi decidido julgar a presente providência cautelar improcedente.

Inconformada, a Requerente interpôs o presente recurso da referida decisão, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:
“1º Nos termos do art.º 118.º, n.º 2, do CPTA e do art.º 574.º nº 1 CPC, ao contestar, deve o R. tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor, considerando-se como admitidos por acordo os factos que não forem impugnados na contestação (cfr. artº 574º nº 2 CPC);
2º No caso “sub judice” o Requerido não impugnou especificadamente, como a lei impõe, a substancialidade dos factos articulados na petição inicial, dando o seu acordo/confessando factualidade que é essencial para a boa decisão da causa, mas que o Meritíssimo Juiz desprezou no seu julgamento sobre a matéria de facto;
3º É o que sucede com toda a factualidade articulada na p.i. relativa à integral execução dos trabalhos objeto da operação; à aceitação pelo Requerido dos trabalhos executados na operação; ao controlo do Requerido de toda a execução dos trabalhos no decurso da operação; ao controlo dos pagamentos dos trabalhos executados; à aprovação e aceitação do Requerido de todos os pedidos de pagamento e respetivos comprovativos de despesas da operação, com expressa validação das despesas apresentadas pela Requerente, sobre as quais recai agora o argumento da ausência da pista de controlo da sua execução e pagamento;
4º Ora porque essa factualidade é manifestamente relevante para a decisão da causa, à luz do artº 118º nº 2 CPTA e do artº 574º nºs. 1 e 2 CPC, devem ser levados à matéria assente nos autos a factualidade alegada pela Recorrente nos artºs. 52º a 55º; 63º a 68º; 82º a 85º; 88º a 91º; 94º a 96º; 99º a 103º; 107º a 110º; 113º a 116º, 119º a 121º; 124º a 128º; 132º a 135º da p.i.;
5º Face à matéria de facto dada como provada, a análise e julgamento sobre a verificação do “fumus boni iuris”, da forma perfunctória que caracteriza o julgamento em sede de providência cautelar, deve ser feito de forma diametralmente oposta àquela que é adotada na sentença “a quo”;
6º É óbvio que existe a pista de controlo das despesas da operação, salvo prova em contrário, pois de outra forma o Recorrido não teria aceite como boas as despesas apresentadas pela Recorrente e não as teria liquidado, como liquidou, integralmente;
7º Se o Recorrido validou e pagou bem, ou não, as despesas da operação, é matéria que pela sua natureza só pode ser apurada em sede da instrução a levar a cabo na ação principal;
8º Nos presentes autos não há qualquer fundamento de facto que permita concluir, em sede de providência cautelar, que não existe a necessária pista de controlo das despesas apresentadas pela Requerente na operação, dado que está provado nos autos que essas despesas foram fiscalizadas, validadas e pagas pelo Recorrido;
9º À luz do artº 342º CC era ao Requerido que competia fazer prova dos factos que evoca para fundamentar a anulação dos subsídios atribuídos à Requerente;
10º É manifesto que o Requerido não fez prova nos autos de qualquer facto que infirme a anterior decisão de aceitação e pagamento dos trabalhos executados pela Requerente, e que agora foram objeto da anulação do subsídio atribuído;
11º A sentença “a quo” fez uma errada interpretação e aplicação do artº 342º CC;
12º A decisão “a quo” faz um errado julgamento da matéria de facto discutida nos autos, devendo por isso ser revogada;
13º A decisão de fundo da causa com fundamento nos identificados vícios alegados, e o plano de direito que importa analisar nos diversos diplomas de índole do direito nacional e do direito europeu aplicáveis, não se compagina com a simplicidade e celeridade caraterística do processo cautelar;
14º O vício invalidante que justifica materialmente o ato impugnado, isto é, o vício relativo ao erro nos pressupostos de facto e de direito evocado pela Recorrente, mostra-se, de forma perfunctória, como verificado, considerando a matéria de facto que deve ser dada como assente nos autos;
15º Deve ser julgado como verificado o requisito do “fumus boni iuris” e assim decretada a providência requerida;
16º Ao assim não entender, a sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação do artº 120º nº 1 CPTA;
Sem prescindir,
17º A sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação dos artºs 121º e 122º CPA;
18º A sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação do disposto no artº 1º do Regulamento (CE/EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho, de 18-12-95;
19º A sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação do disposto nos artºs 151 nº 1 d), 152º nº 1 e 153 nºs 1 e 2 CPA;
20.º A sentença “a quo” é nula por violação do princípio do dispositivo na vertente relativa à conformação objetiva da instância, não observando os limites impostos pelo artº 609º nº 1 CPC, decidindo sobre objeto diverso do pedido;
21º A sentença “a quo” é nula, pronunciando-se sobre questão que não lhe foi colocada à decisão, violando o disposto no artº 615º nº 1 d) e e) ex vi artº 140º nº 3 CPTA;
Nestes termos e nos melhores de direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, com as devidas consequências legais.
Assim se cumprirá a Lei e fará Justiça.”

A Entidade Requerida/Recorrida apresentou contra-alegação de recurso, na qual formulou as seguintes conclusões:
“1ª A factualidade que a Recorrente pretende que seja aditada à Fundamentação de Facto da Sentença recorrida é absolutamente irrelevante para infirmar a ausência de pista de controlo que se tornou necessária a partir da constatação de que entre A…… e alguns dos seus “fornecedores” (designadamente a ARBO…… LDA e a P…G…F… LDA) existiam relações especiais em virtude de as mesmas pessoas dirigentes da A....... também serem Administradores destes alegados “fornecedores”;
2ª Aliás, sobre a questão suscitada pela Recorrente nas primeiras 16 Conclusões do recurso, já exaustivamente se pronunciou o STA no Acórdão de 04/10/2017, prolatado no recurso de Revista tramitada sob o nº 550/17 (e no qual foi Recorrente o IFAP e Recorrida a A....... em caso absolutamente análogo), com o seguinte Sumário:
I - É legítimo o IFAP considerar como não elegíveis, para efeito de financiamento pelo FEADER, despesas apresentadas pelo promotor, em pedido de pagamento, consubstanciadas em facturas emitidas por fornecedor subcontratado, naquilo em que tais despesas, sem correspondência real, ultrapassam o chamado preço de entrada, ou 1º preço.
II - O acto administrativo que exclui essas despesas está acobertado pelo regime comunitário e nacional no que respeita à elegibilidade de despesas.
3ª Assim sendo, bem andou o Mº Juiz a quo ao julgar improcedentes todos os vícios invalidantes imputados pela Recorrente à Decisão suspendenda pelo que se afigura ser de manter a decisão recorrida, ainda que com fundamentos diversos, designadamente no que tal respeite à improcedência da invocada prescrição do procedimento, tendo presente a jurisprudência do STA e do TCA Sul sobre a questão, atrás mencionada;
***
Termos em que, por via da improcedência das Conclusões extraídas pela Recorrente das suas Alegações, deverá ser negado provimento ao presente recurso, assim se fazendo
JUSTIÇA.”.

A Digno Magistrada do Ministério Público, notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1 e 147.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), não emitiu pronúncia.

Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vem o processo à conferência.
*
II. Questões a apreciar e decidir:
As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pela alegação de recurso e respectivas conclusões, consistem em apreciar e decidir se: i) a sentença recorrida fez errada decisão da matéria de facto; ii) a sentença recorrida incorreu em erro sobre os pressupostos de facto e de direito; ou se: iii) a sentença recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 121.º e 122.º do CPA, do artigo 1.º do Regulamento (CE/EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho, de 18/12/95, dos artigos 151.º, n.º 1, alínea d), 152.º, n.º 1 e 153.º n.ºs 1 e 2, do CPA e se incorreu em nulidade, por violação do princípio do dispositivo e do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) e e) do CPC.
*
III – Fundamentação:
3.1. De facto:
Na 1.ª instância foi decidida a matéria de facto, nos seguintes termos:
Com relevância para a decisão da presente causa, considero indiciariamente provados os seguintes factos:
A) Em 13.12.2005, a Requerente foi constituída, entre outros, por J…….., portador do bilhete de identidade n.º 424…. emitido pelos Serviços de Identificação Civil da Guarda _ cfr. Documento n.º 1 junto com o requerimento inicial;

B) A Requerente é uma associação de direito privado, sem fins lucrativos, que tem por objecto social “a defesa e promoção dos interesses dos produtores e proprietários florestais e o desenvolvimento de acções de preservação e valorização das florestas, dos espaços naturais, da fauna e flora; a defesa e valorização do ambiente, do património natural construído, a conservação da natureza, bem como (…) a valorização do património fundiário e cultural dos seus associados” _ cfr., de novo, Documento n.º 1 junto com o requerimento inicial;
C) Pelo menos desde 11.12.2009, J....... exerceu o cargo de Vice-Presidente da Direcção da Requerente _ cfr. fls. 153 do processo administrativo apenso ao processo cautelar n.º 49/19.0BEBJA;

D) Actualmente, J....... exerce o cargo de Presidente da Direcção da Requerente _ cfr. Declarações de Parte da Requerente prestadas, em 10.05.2019, no âmbito do processo cautelar n.º 49/19.0BEBJA;

E) Desde, aproximadamente o ano de 2010, J……. é sócio e gerente de “Arbo-B…… - Gestão F…., Lda.”, NIPC 505 354 ….. e de “P…G…F…, Lda.”, NIPC 509 859 … _ cfr. Declarações de Parte da Requerente prestadas, em 10.05.2019, no âmbito do processo cautelar n.º 49/19.0BEBJA;

F) Tendo por objecto a Zona de Intervenção Florestal do “Viso e Anexas”, a Requerente apresentou candidatura ao Programa de Desenvolvimento Rural do Continente (PRODER) - Eixo “Melhoria do Ambiente e da Paisagem Rural”, subprograma 2 (“Gestão Sustentável do Espaço Rural”), Medida 2.3. (“Gestão do Espaço Florestal e Agro-Florestal”), acção 2.3.3. (“Valorização Ambiental dos Espaços Florestais”), sub-acção 2.3.3.3. (“Proteção contra Agentes Bióticos Nocivos”), contemplando um investimento total de € 1.046.182,14 _ cfr. artigo 3.º do requerimento inicial e, ainda, fls. 38 a 43 do processo administrativo;

G) Em 14.11.2012, foi aprovada a candidatura da Requerente, como tal, tendo-lhe sido concedendo subsídio ao investimento no valor de € 616.007,69 (seiscentos e dezasseis mil, sete euros e sessenta e nove cêntimos) _ cfr. Documento n.º 2 junto com o requerimento inicial e, ainda, fls. 43 “in fine” do processo administrativo;

H) Em 28.12.2012, as Partes outorgaram o contrato de financiamento n.º 02024…/0 referente à concessão de subsídio ao investimento na operação n.º 020000030… (Zona de Intervenção Florestal do “Viso e Anexas”) _ cfr. Documento n.º 2 junto com o requerimento inicial e, ainda, fls. 43 a 51 do processo administrativo;

I) O subsídio concedido era liquidado, pela Entidade Requerida, mediante crédito na conta de depósitos à ordem da Requerente _ cfr. Documento n.º 2 junto com o requerimento inicial e, ainda, artigo 8.º do requerimento inicial;

J) Em 17.03.2013, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0, a Requerente submeteu junto da Entidade Requerida o primeiro pedido de pagamento de despesas no montante de € 145.645,07 _ cfr. artigo 80.º do requerimento inicial e, ainda, fls. 38 do processo administrativo;

K) Em 29.11.2013, a Entidade Requerida liquidou, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0 e por referência ao pedido mencionado em J), o montante de € 87.387,05 _ cfr. fls. 38 do processo administrativo;

L) Em 09.04.2014, o Presidente da Entidade Requerida aprovou o “Manual Técnico do Beneficiário - Contratação e Pedidos de Pagamento FEADER (Investimento) e FEP”, no qual se lê:
“(...).
6.2. DISPOSIÇÕES COMPLEMENTARES DE ELEGIBILIDADE DA DESPESA
Os casos de verificação da elegibilidade de despesa a que se referem os pontos seguintes são aplicados a cada Medida / Acção com as devidas adaptações, tendo em conta as portarias enquadradoras dos apoios, os seus normativos específicos ou, caso existam, orientações das respectivas autoridades de gestão. Nestas circunstâncias, a Entidade Requerida competente pela análise do pedido de pagamento procede às seguintes verificações complementares:
(...) h) Relações especiais: Considera-se que existem relações especiais entre duas Entidade Requeridas nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente entre: (...) 4. Entidade Requeridas em que a maioria dos membros dos órgãos sociais, ou dos membros de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, sejam as mesmas pessoas ou, sendo pessoas diferentes, estejam ligadas entre si por casamento, união de facto legalmente reconhecida ou parentesco em linha recta; (...) No âmbito das relações especiais, o beneficiário deve assegurar que as transacções efectuadas são identificadas apropriadamente e relevadas nas demostrações financeiras.
No âmbito da análise do pedido de pagamento, podem ser solicitados os seguintes elementos: (i) Documentos emitidos pelo fornecedor ou prestador de serviço que demostrem e comprovem a composição do preço final; (ii) Os preços de aquisição dos bens / serviços pelo grupo, através do dossier de preços de transferência. A despesa a considerar elegível é a que estiver de acordo com os preços de mercado, sendo que no âmbito da subcontratação, o valor aceite será limitado ao montante dessa subcontratação (1° preço de venda / preço de entrada) (...).” _ cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 04.10.2017, proferido no processo n.º 550/17, em www.dgsi.pt, “ex vi” artigo 412.º, n.º 2, do Código de Processo Civil;

M) Em 10.07.2014, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0, a Requerente submeteu junto da Entidade Requerida o segundo pedido de pagamento de despesas no montante de € 467.688,68 _ cfr. artigo 105.º do requerimento inicial e, ainda, fls. 38 do processo administrativo;

N) Em 29.08.2014, a Entidade Requerida liquidou, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0 e por referência ao pedido mencionado em M), o montante de € 280.613,21 _ cfr. fls. 38 do processo administrativo;

O) Em 17.10.2014, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0, a Requerente submeteu junto da Entidade Requerida o terceiro pedido de pagamento de despesas no montante de € 158.537,38 _ cfr. artigo 130.º do requerimento inicial e, ainda, fls. 38 do processo administrativo;

P) Em 28.11.2014, a Entidade Requerida liquidou, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0 e por referência ao pedido mencionado em O), o montante de € 95.122,69 _ cfr. fls. 38 do processo administrativo;

Q) Conjunta e respectivamente com os pedidos de pagamentos mencionados em J), M) e O), a Requerente submeteu facturas emitidas por “Arbo-B….., Lda.”, “S….., Lda.”, “C……, Lda.”, “Com…., Lda.”, “Agro….., C. C. P. para a Agricultura, Unipessoal Lda.”, “M… & C…, Lda.” e por “P…G…F, Lda.” _ cfr. artigos 80.º a 133.º do requerimento inicial e, ainda, Documento n.º 3 junto com este último;

R) Entre 30.03.2016 e 06.04.2016, tendo por objecto a operação n.º operação n.º 020000030… (Zona de Intervenção Florestal do “Viso e Anexas”), a Entidade Requerida procedeu a acção de Verificação Física do Local (VFL), no âmbito do qual foi exarada a seguinte Informação: “Regular” _ cfr. fls. 39 do processo administrativo;

S) Em 04.05.2016, a Entidade Requerida determinou a alteração de vinte e três contratos de financiamento e a devolução de subsídios atribuídos à Requerente, no valor global de € 3.013.668,57, no âmbito das seguintes operações: n.º 020000038…. (Área Agrupada de Figueira Negra e Barba Torta), n.º 020000043… (Área Agrupada da Barba Torta), n.º 020000038… (Área Agrupada da Faia e Monte Junto e Velho), n.º 020000040… (Área Agrupada de Tremelgas e Anexas), n.º 020000038799 (Área Agrupada de Courelas e Zambujinho), n.º 020000038… (Área Agrupada de Marmelos), n.º 020000038… (Área Agrupada de Sernada e Moutinho), n.º 020000040… (Área Agrupada Vale Penedos e Anexos), n.º 020000040… (Área Agrupada da Herdade da Torre e Anexas), n.º 020000043… (Área Agrupada de Vale Penedo e Anexas), n.º 020000045… (Área Agrupada Herdade Vale das Águias e Leões), n.º 020000043… (Área Agrupada de Tremelgas e Anexas), n.º 020000038… (Área Agrupada da Lobeira), n.º 020000043… (Área Agrupada de Torre e Anexas), n.º 020000043… (Área Agrupada da Courela do Salgueiro e Trepada), n.º 020000018… (Área Agrupada de Andreu), n.º 020000030… (Área Agrupada Fonte da Pipa), n.º 020000045… (ZIF do Viso e Anexas), n.º 020000034… (ZIF do Viso e Anexas), n.º 020000040… (Área Agrupada de Vale Bom), n.º 020000034… (ZIF de São Bartolomeu da Serra), n.º 020000017… (Área Agrupada da Courela do Salgueiro e Trepada), e n.º 020000017… (Área Agrupada de Vale Grande e Ramalhais) _ cfr. artigo 148.º do requerimento inicial e, ainda, Documentos n.ºs 6 a 28 juntos com este último;

T) Mediante o ofício n.º 0093…/2016 …-UREC, de 27.09.2016, a Entidade Requerida informou a Requerente como se segue:
(…)


“Texto Integral com Imagem”

(…)

(…)

“Texto Integral com Imagem”

_ cfr. Documento n.º 4 junto com o requerimento inicial e, ainda, fls. 12 a 17 do processo administrativo;

U) Mediante carta datada de 12.10.2016, em sede de audiência prévia, a Requerente veio pugnar pela improcedência do projecto de decisão e respectiva argumentação vertida no ofício n.º 0093…/2016 …-UREC, de 27.09.2016 _ cfr. Documento n.º 5 junto com o requerimento inicial e, ainda, fls. 8 a 11 do processo administrativo;

V) Em 22.06.2018, mediante o ofício n.º 0049…/2018 …-UREC, a Entidade Requerida informou a Requerente como se segue:

(…)

“Texto Integral com Imagem”


(…)

“Texto Integral com Imagem”


(…)

(…)

“Texto Integral com Imagem”


(…)

“Texto Integral com Imagem”



_ cfr. Documento n.º 3 junto com o requerimento inicial e, ainda, fls. 1 a 7 do processo administrativo;

W) Em 25.06.2018, a Requerente recebeu o ofício n.º 0049.../2018 ...-UREC, de 22.06 _ cfr. proémio do requerimento inicial;

X) A Requerente não tem capacidade para proceder à restituição do montante de € 463.122,69 (quatrocentos e sessenta e três mil, cento e vinte dois euros e sessenta e nove cêntimos) _ cfr. declarações de parte da Requerente e depoimento do respectivo contabilista – J………. Vargas - que relevou possuir conhecimento directo dos documentos comprovativos dos proveitos e despesas da Requerente e respectivos fluxos financeiros, os quais foram prestados, em 10.05.2019, no âmbito do processo cautelar n.º 49/19.0BEBJA, de forma clara, segura e, logo, convincente;

Y) A Requerente não possui meios económicos ou bens que lhe permitam constituir garantia de pagamento de € 463.122,69 (quatrocentos e sessenta e três mil, cento e vinte dois euros e sessenta e nove cêntimos) _ cfr. depoimento de J......... Vargas, prestado em 10.05.2019 no âmbito do processo cautelar n.º 49/19.0BEBJA, o qual se revelou claro, seguro e, por conseguinte, convincente;

Z) A devolução do valor do subsídio de € 463.122,69 (quatrocentos e sessenta e três mil, cento e vinte dois euros e sessenta e nove cêntimos), provocará o estrangulamento financeiro da Requerente e conduzirá à sua insolvência _ cfr. depoimento do contabilista da Requerente - J......... Vargas -, prestado em 10.05.2019, no âmbito do processo cautelar n.º 49/19.0BEBJA, o qual revelou possuir conhecimento directo dos documentos comprovativos dos proveitos / despesas da Requerente e respectivos fluxos financeiros de uma forma clara, segura e, logo, convincente;

AA) Em 26.07.2018, junto do Instituto da Segurança Social, IP - Centro Distrital de Setúbal, a Requerente requereu a concessão do benefício da protecção jurídica, na modalidade de “dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo”, tendente a propor “acção judicial - providência cautelar” cujo valor ascendia a € 463.122,69 (quatrocentos e sessenta e três mil, cento e vinte dois euros e sessenta e nove cêntimos) _ cfr. fls. 203 a 206 dos autos;

BB) Em 25.09.2018, o presente processo cautelar deu entrada em juízo _ cfr. fls. 1 dos autos.

*
FACTOS NÃO PROVADOS
Nos presentes autos, ainda que indiciariamente, não se provou que:
A) Por causa do acto administrativo suspendendo, a Entidade Requerida suspendeu os pagamentos à Requerente no âmbito do PRODER e a análise e aprovação das candidaturas, entretanto, submetidas em sede do “PDR 2020” _ cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil “ex vi” artigos 151.º a 153.º do requerimento inicial, pois, não foi produzida qualquer prova que permita ao tribunal sustentar a convicção quanto à veracidade dos factos ora alegados; com efeito, nem dos autos nem do processo administrativo consta qualquer informação, proposta ou despacho neste sentido;

B) A Requerente aplicou o valor do subsídio que lhe foi atribuído e liquidado em sede da operação n.º 020000030... (Zona de Intervenção Florestal do “Viso e Anexas”), na aquisição de bens e no pagamento dos trabalhos relativos à respectiva execução _ cfr. declarações de parte da Requerente “ex vi” artigo 155.º do requerimento inicial, as quais - a este respeito - não se revelaram claras, seguras e, como tal, convincentes.

*
MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
No que concerne aos factos provados, o Tribunal fundou a sua convicção na matéria alegada pelas Partes, na prova documental carreada para os autos, aqui se incluindo o processo administrativo apenso, nas declarações de parte prestadas e, ainda, na prova testemunhal produzida, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.
Quanto ao facto não provado A), pois, não foi produzida qualquer prova que permita ao tribunal sustentar a convicção quanto à veracidade dos factos ora alegados; com efeito, nem dos autos nem do processo administrativo consta qualquer informação, proposta ou despacho neste sentido. No que concerne ao facto não provado B), o mesmo decorre de as declarações de parte da Requerente, nesta parte, não se revelarem realizadas de forma clara, segura e, por estes motivos, convincente.
*
3.2. De Direito:
3.2.1. A ora Recorrente instaurou o presente processo cautelar no qual peticionou que fosse decretada a providência cautelar de suspensão da eficácia da decisão do Presidente do Conselho Directivo do IFAP que determinou a alteração do contrato de financiamento n.º 020242…/0, referente ao pedido de apoio na operação n.º 020000030..., designada por Z.I.F. do Viso e Anexas, e a devolução do valor de € 463.122,69, recebido pela Requerente a título de subsídio de investimento, notificada à Requerente através do ofício 0049.../2018 ...-UREC, de 22-06-2018 e recepcionado em 25-06-2018.
Requerendo que se determinasse, designadamente, “que o Requerido se abstenha de:
1. Executar o ato requerido, exigindo à Requerente, por qualquer forma, a devolução do valor do subsídio atribuído na operação identificada nos autos;
2. Compensar o valor do subsídio atribuído na operação identificada nos autos, com o valor de outros subsídios devidos à Requerente nas restantes operações financiadas pelo Requerido;”.
Pela sentença recorrida foi decidido julgar improcedente o presente processo e não decretar as providências cautelares, por se ter julgado que não se encontrava preenchido o requisito do fumus boni iuris, previsto no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA. E considerando que os requisitos de concessão das providências cautelares são de verificação cumulativa, o não preenchimento de um deles, como, no caso sucedeu, com o fumus boni iuris, julgou-se inútil a apreciação do periculum in mora e a realização da ponderação de interesses.
3.2.2. Como resulta das conclusões da alegação de recurso e das questões a apreciar e decidir enunciadas em II., a Recorrente interpôs recurso da sentença que julgou improcedente o presente processo cautelar e decidiu não decretar as providências, com fundamento na falta de verificação do requisito fumus boni iuris, por considerar que não se verifica este requisito.
No artigo 112.º, n.º 1 do CPTA prevê-se que “Quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adoção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo.”.
Os processos cautelares caracterizam-se pelos traços da instrumentalidade, da provisoriedade e da sumariedade.[1]”, dependem da causa que tem por objecto a decisão sobre o mérito, destinando-se a assegurar a utilidade da sentença que nela vier a ser proferida.
Como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, em anotação ao artigo 112.º do CPTA “(…) as providências cautelares existem para assegurar a utilidade das sentenças a proferir nos processos judiciais. As providências cautelares são adotadas para prevenir a inutilidade, total ou parcial, das sentenças, seja por infrutuosidade, seja por retardamento. (…) Logo do n.º 1 do artigo em anotação, transparece, assim, o principal traço característico da tutela cautelar, que é a sua instrumentalidade: ela existe em função dos processos em que se discute o fundo das causas, em ordem a assegurar a utilidade das sentenças a proferir no âmbito desses processos, que, por isso, são qualificados como processos principais, por contraponto aos processos cautelares. Aspetos importantes do regime respeitante à tutela cautelar são conformados por esta característica essencial.[2]”.
Para efeitos de decisão do pedido de decretamento da providência cautelar requerida é aplicável o regime previsto no artigo 120.º do CPTA, que dispõe:
1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
2 - Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
(…).”.
A adopção da providência requerida depende, assim, da verificação cumulativa dos requisitos do periculum in mora e do fumus boni iuris. Este exige a formulação de um juízo de probabilidade de procedência da pretensão de fundo do Requerente formulada ou a formular, em sede de acção principal. O periculum in mora, é configurado em duas vertentes. Uma, quando com a não adopção da providência haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado.
Como refere Mário Aroso de Almeida, in Manual de Processo Administrativo, 2.ª Edição, 2016, Almedina, pág. 449, o único sentido que pode ser atribuído à expressão “facto consumado”, será o de que “… os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade.”. Quanto à outra das vertentes, ou seja, quando haja fundado receio de, se a providência vier a ser recusada haver a possibilidade de se produzirem prejuízos de difícil reparação, para os interesses que o Requerente visa assegurar no processo principal e, ainda, citando o mesmo autor e obra, pág. 449 “… Nestas situações em que a providência é necessária para evitar o risco da infrutuosidade da sentença a proferir no processo principal o critério não pode ser, portanto, o da susceptibilidade ou insusceptibilidade da avaliação pecuniária dos danos, mas tem de ser o da viabilidade do restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar.”.
José Carlos Vieira de Andrade, in “A JUSTIÇA ADMINISTRATIVA”, (Lições), 14.ª Edição, pág. 293, a este respeito refere que “O juiz deve, pois, fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica.
Neste juízo, o fundado receio há-de corresponder a uma prova em princípio a cargo do requerente, de que tais consequências são suficientemente prováveis para que se possa considerar “compreensível ou justificada” a cautela que é solicitada.”.
Verificados que estejam estes dois pressupostos, o tribunal terá, ainda, de proceder nos termos do n.º 2 do artigo 120.º do CPTA à ponderação dos interesses públicos e privados em presença, ponderação esta, que determinará a recusa da providência quando, num juízo de proporcionalidade, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.
3.2.3. Cumpre apreciar se: i) a sentença recorrida fez errada decisão da matéria de facto; se: ii) a sentença recorrida incorreu em erro sobre os pressupostos de facto e de direito; e em caso de improcedência destes fundamentos, se: iii) a sentença recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 121.º e 122.º do CPA, do artigo 1.º do Regulamento (CE/EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho, de 18/12/95, dos artigos 151.º, n.º 1, alínea d), 152.º, n.º 1 e 153.º n.ºs 1 e 2, do CPA, e se, a sentença recorrida é nula por violação do princípio do dispositivo, por não observar os limites do artigo 609.º do CPC e por se pronunciar sobre questão que não lhe foi colocada à decisão, violando o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) e e), do CPC.
Debrucemo-nos, então, sobre as referidas questões que constituem o objecto do recurso, esclarecendo que este Tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos na alegação e conclusões de recurso, mas apenas as questões suscitadas.
3.2.4. Comecemos por apreciar e decidir se a decisão recorrida incorreu na nulidade que lhe foi imputada, concretamente, se enferma de nulidade por violação do princípio do dispositivo, na vertente relativa à conformação objectiva da instância, não observando os limites impostos pelo art.º 609.º n.º 1 CPC, decidindo sobre objecto diverso do pedido, pronunciando-se sobre questão que não lhe foi colocada à decisão, violando o disposto no art.º 615.º n.º 1, alíneas d) e e), do CPC, ex vi art.º 140.º n.º 3 CPTA.
O artigo 609.º, n.º 1, do CPC, dispõe que “A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.”.
“Limitado pelos pedidos das partes, o juiz não pode, na sentença, deles extravasar: a decisão, seja condenatória, seja absolutória, não pode pronunciar-se sobre mais do que o que foi pedido ou sobre coisa diversa daquela que foi pedida. (…) o réu não pode ser absolvido dum pedido que o autor contra ele não deduziu[3]”.
Nos termos do artigo 615.º do CPC: “1 - É nula a sentença quando: (…)
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. (…).”.
Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in obra citada, pág. 735 referem que “Os casos das alíneas b) a e) do n.º 1 (…) constituem rigorosamente, situações de anulabilidade da sentença, e não de verdadeira nulidade.”.
Contudo, atenta a formulação legal “É também nula a sentença que, violando o princípio do dispositivo na vertente relativa à conformação objectiva da instância (…) não observe os limites impostos pelo art. 609-1, condenando ou absolvendo em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso do pedido. (…)[4]
Relativamente às “Questões a resolver - Ordem do julgamento”, o artigo 608.º, do CPC dispõe, no n.º 2 que “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”.
Prevê-se no artigo 260.º do Código de Processo Civil que “Citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.”.
Referiu a Recorrente que por manifesto lapso, a sentença “a quo” decidiu indeferir um pedido que a Requerente não peticionou. A Requerente não fez um pedido de compensação do valor do subsídio atribuído na operação identificada nos autos, mediante o valor de outros subsídios devidos à Requerente nas restantes operações financiadas pelo Requerido. O que a Requerente peticionou foi que se determinasse que o Requerido se abstenha de, por sua iniciativa, compensar o valor do subsídio atribuído nesta operação, com o valor de outros subsídios devidos à Requerente. É manifesto que a sentença “a quo” absolve/indefere em objecto diverso do pedido.
Em sede de requerimento inicial formulou a Requerente o seguinte pedido:
“requer-se se digne decretar a suspensão da eficácia do ato requerido, suspendendo-se todos os efeitos e consequências do ato requerido, determinando-se, designadamente, que o Requerido se abstenha de:
1. Executar o ato requerido, exigindo à Requerente, por qualquer forma, a devolução do valor do subsídio atribuído na operação identificada nos autos;
2. Compensar o valor do subsídio atribuído na operação identificada nos autos, com o valor de outros subsídios devidos à Requerente nas restantes operações financiadas pelo Requerido; (…)”.
Para melhor compreensão da questão transcreve-se o seguinte excerto da sentença recorrida “(…) Em particular, nas providências antecipatórias - como é o caso ora em análise -, o pedido formulado não pode exceder os limites da pretensão formulada no processo principal, nem obter um efeito que corresponda ao provimento antecipado do pedido de mérito ou o torne irreversível” (a este respeito, cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 12.01.2017, in processo n.º 13683/16, disponível em www.dgsi.pt).
(…) Conforme decorre do pedido em apreço, a Requerente pretende o decretamento da seguinte providência: a compensação do valor do subsídio atribuído na operação n.º 020000030… (Área Agrupada de “Fonte da Pipa e Anexas”), com o valor de outros subsídios (alegadamente) devidos à Requerente nas restantes operações financiadas pelo Requerido.
Assim sendo, e sumariamente, o decretamento da mesma importaria, no caso da acção administrativa principal improceder, uma situação de facto consumado, pois a restituição dos montantes - hipoteticamente - transferidos em favor da ora Requerente (i) estaria já concretizada (ii) não sendo possível reverter os efeitos entretanto criados, maxime não seria possível transferir - de novo - o(s) montante(s) em causa.
Ou seja, a compensação requerida - feita a título cautelar - assumiria natureza irreversível, pois, tal decisão não seria passível de revogação (cfr. artigo 124.º do CPTA), nem de substituição pela sentença que viesse a ser proferida na acção administrativa principal – tornando-se a mesma, neste estrito campo, inútil -, por eventual inexistência de objecto (v.g., por inexistência de saldo que pudesse ser transferido).
Nestes termos, dados os limites da tutela cautelar, impostos pela provisoriedade que a estruturam, não é admissível o decretamento da presente medida antecipatória peticionada, conforme infra se determinará.”.
Sendo a correspondente parte do dispositivo da sentença recorrida, o seguinte:
B) Indefere-se o pedido de compensação do valor do subsídio atribuído na operação n.º 020000030... (Zona de Intervenção Florestal do “Viso e Anexas”), mediante o valor de outros subsídios devidos à Requerente nas restantes operações financiadas pelo Requerido.
No caso em apreciação – e sem prejuízo do lapso material de que enferma a sentença, no que respeita à identificação da operação, pois, referiu-se a operação “Área Agrupada de Fonte da Pipa e Anexas”, em dessintonia com o subtítulo referido em III.2.2 da sentença e respectivo dispositivo - dúvidas não subsistem que o Mmo. Juiz a quo, apreciou questão que não lhe foi colocada.
Pois, analisado e interpretado o pedido formulado pela Requerente, ora Recorrente, em sede de requerimento inicial, verifica-se que a mesma peticionou a suspensão do identificado acto que determinou a devolução por aquela da quantia que recebeu, de € 463.122,69, referindo, a ora Recorrente, a título exemplificativo, os efeitos e consequências que pretende ver suspensos, um dos quais é que o Requerido se abstenha de compensar o valor do subsídio com outros subsídios que a Recorrente alegadamente tenha direito a receber do IFAP. Este efeito pretendido de que a ER se abstenha de efectuar a referida compensação, é uma decorrência lógica e necessária do pedido de suspensão de eficácia formulado. Não tem autonomia relativamente ao pedido formulado pela ora Recorrente, nem de resto, a mesma o formulou de forma autónoma.
Com efeito, a ora Recorrente não requereu que fosse efectuada qualquer compensação pelo IFAP, ao invés, com a suspensão da eficácia do acto peticionada nos presentes autos, visava o inverso, isto é, que a Entidade Recorrida fosse intimada a abster-se de compensar, ou seja, de reter subsídios a que a Recorrente alegadamente teria direito, não efectuando a retenção dos mesmos para compensar o pagamento da quantia cuja restituição foi determinada pelo acto suspendendo.
Assim, a sentença recorrida apreciou questão que não lhe foi colocada e decidiu indeferir pedido de compensação que não lhe havia sido formulado pela Requerente, ora Recorrente, em violação do estabelecido nos artigos 609.º, n.º 1 e 615.º n.º 1, alíneas d) e e), do CPC ambos do CPC.
Em face do exposto, conclui-se que, nesta parte, verifica-se a apontada nulidade da sentença.
3.2.5. Referiu a Recorrente que nos termos do art.º 118.º, n.º 2 e do art.º 574.º n.º 1 CPC, ao contestar, deve o R. tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo Autor, considerando-se como admitidos por acordo os factos que não forem impugnados na contestação (cfr. artº 574º nº 2 CPC). E que o Requerido não impugnou especificadamente, a substancialidade dos factos articulados na petição inicial, dando o seu acordo/confessando factualidade que é essencial para a boa decisão da causa, mas que o Meritíssimo Juiz desprezou no seu julgamento sobre a matéria de facto. É o que sucede com toda a factualidade articulada na p.i. relativa à integral execução dos trabalhos objeto da operação; à aceitação pelo Requerido dos trabalhos executados na operação; ao controlo do Requerido de toda a execução dos trabalhos no decurso da operação; ao controlo dos pagamentos dos trabalhos executados; à aprovação e aceitação do Requerido de todos os pedidos de pagamento e respetivos comprovativos de despesas da operação, com expressa validação das despesas apresentadas pela Requerente, sobre as quais recai agora o argumento da ausência da pista de controlo da sua execução e pagamento. Porque se trata de factualidade que é manifestamente relevante para a decisão da causa, à luz do art.º 118.º n.º 2, do CPTA e do art.º 574º nºs. 1 e 2 CPC, deve ser levada à matéria assente nos autos a factualidade alegada pela Recorrente nos artºs. 52.º a 55.º; 63º a 68º; 82º a 85º; 88º a 91º; 94º a 96º; 99º a 103º; 107º a 110º; 113º a 116º, 119º a 121º; 124º a 128º; 132º a 135º da p.i.; o que determina que o julgamento do “fumus boni iuris” seja feito de forma oposta à que é adoptada na sentença recorrida.
Vejamos, então.
O artigo 118.º, n.º 2, do CPTA dispõe que “Na falta de oposição, presumem-se verdadeiros os factos invocados pelo requerente.”.
O artigo 574.º, do CPC, com a epígrafe “ónus de impugnação” prescreve:
1 - Ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.
2 - Consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se só puderem ser provados por documento escrito; a admissão de factos instrumentais pode ser afastada por prova posterior.
(…)”.
Estamos no âmbito de um processo cautelar, que se rege pelo disposto nos artigos 112.º e ss. do CPTA, maxime, no que a esta questão respeita pelo previsto no n.º 2, do artigo 118.º do CPTA, pelo que, tendo havido oposição, nos termos do art.º 118.º, n.º 2, do CPTA, não poderia presumir-se que os factos invocados no requerimento inicial eram verdadeiros.
Analisada a oposição, concretamente, os artigos 5.º a 11.º, 34.º a 37.º e 42.º a 46.º, verifica-se que nos mesmos foi alegada factualidade em sentido diferente ou oposto dos factos alegados pela Requerente, no r.i., portanto, em contradição com os mesmos.
Assim, não se podia ter por indiciariamente provada a factualidade alegada pela Requerente nos artigos 52.º a 55.º; 63.º a 68.º; 82.º a 85.º; 88.º a 91.º; 94º a 96º; 99º a 103º; 107º a 110º; 113º a 116º, 119º a 121º; 124º a 128º; 132º a 135º da p.i.;., sendo que nestes artigos a Requerente para além de alegar factos, faz alegações de direito e extrai conclusões, contendo, igualmente, matéria de direito e conclusiva.
Assim, tendo havido oposição, nos termos do art.º 118.º, n.º 2, do CPTA e estando os referidos factos em oposição com a defesa efectuada pela ER na oposição, nos termos previstos no artigo 574.º. n.º 2, do CPC, supletivamente aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, não poderia presumir-se que os factos invocados no r.i. eram verdadeiros.
Em face do que têm de improceder as conclusões 1.ª a 5.ª da alegação de recurso.
3.2.6. Referiu a Recorrente que a decisão recorrida fez errado julgamento da matéria de facto discutida nos autos, pois é óbvio que existe a pista de controlo das despesas da operação, salvo prova em contrário, pois de outra forma o Recorrido não teria aceite como boas as despesas apresentadas pela Recorrente e não as teria liquidado, como liquidou, integralmente.
Se o Recorrido validou e pagou bem, ou não, as despesas da operação, é matéria que pela sua natureza só pode ser apurada em sede da instrução a levar a cabo na acção principal. Nos presentes autos não há qualquer fundamento de facto que permita concluir, em sede de providência cautelar, que não existe a necessária pista de controlo das despesas apresentadas pela Requerente na operação, dado que está provado nos autos que essas despesas foram fiscalizadas, validadas e pagas pelo Recorrido. É manifesto que o Requerido não fez prova nos autos de qualquer facto que infirme a anterior decisão de aceitação e pagamento dos trabalhos executados pela Requerente, e que agora foram objecto da anulação do subsídio atribuído, pelo que, a sentença “a quo” fez uma errada interpretação e aplicação do art.º 342.º CC.
Vejamos.
A sentença recorrida apreciou esta questão do invocado erro sobre os pressupostos de facto e de direito, do seguinte modo:
«o fundamento em que assenta - na perspectiva da ora Requerente - a probabilidade de procedência da acção principal prende-se com o (alegado) erro acerca da (in)eligibilidade das despesas submetidas ao crivo da Administração e, em particular (atento o recurso à subcontratação verificada), na ausência de demonstração pela Entidade Requerida em como os valores cobrados - à Requerente - pelas empresas subcontratadas - v.g., “Arbob……, Lda.” e “P…G…F., Lda.” - não foram aplicados no âmbito da operação n.º 020000030... (Zona de Intervenção Florestal do “Viso e Anexas”). Vejamos então.
Sucede que, em situação em tudo similar à presente, mediante a prolação do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 04.10.2017, in processo n.º 550/17, disponível em www.dgsi.pt, o presente dissídio ficou definitivamente resolvido, nos seguintes moldes:
“(…)
Mas, note-se, não só as despesas, para «serem elegíveis», terão de ser enquadradas numa das espécies expressamente previstas em cada um dos subpontos do ponto 1, como também resulta - do intróito do referido ponto 1 - que o serão atendendo ao respectivo valor de mercado e até ao limite dos valores constantes nas tabelas da Comissão de Acompanhamento para as Operações Florestais [CAOF] quando aplicável.
(…)
Por fim, importará referir o chamado “Manual Técnico do Beneficiário - Contratação e Pedidos de Pagamento FEADER [Investimento] e FEP” (cuja 1ª versão foi «aprovada» em Junho de 2012, e a 2ª versão em Abril de 2014, pelo Presidente do IFAP) - que «de uma forma simplificada visa dar a conhecer as principais regras nacionais e comunitárias que os beneficiários dos Programas de Desenvolvimento Rural e do FEP devem adoptar em sede de contratação das operações e na apresentação dos pedidos de pagamento».
Ora, segundo este Manual, as «facturas apresentadas a pagamento» no âmbito de operações de financiamento comunitário, devem integrar sempre, como elemento obrigatório, a «Quantidade e denominação dos bens/serviços» adquiridos e prestados, e prescreve o seu ponto «6.2», sobre «Disposições Complementares de Elegibilidade da Despesa», e além do mais, que: «A despesa a considerar elegível é a que estiver de acordo com os preços de mercado, sendo que no âmbito da subcontratação o valor aceite será limitado ao montante dessa subcontratação [1º preço de venda/preço de entrada].
(…)
Assim, temos que, decorre do plasmado no artigo 24.º do Regulamento n.º 65/2011, de 27.01 (estabelece as regras de execução do Regulamento (CE) n.º 1698/2005 do Conselho relativas aos procedimentos de controlo e à condicionalidade no que respeita às medidas de apoio ao desenvolvimento rural) o dever de a Entidade Requerida excluir as despesas sem correspondência real, ou seja, aquelas que não obstante corresponderem a uma acção executada não lhes subjaza o correspectivo bem ou prestação [é esta, aliás, e ao que tudo indica, a razão de ser da consagração, no aludido Manual Técnico do Beneficiário - Contratação e Pedidos de Pagamento FEADER [Investimento] e FEP, do ali denominado critério do “1º preço de venda / preço de entrada”, aplicável no âmbito da subcontratação, o qual - em sintonia com o plasmado no Decreto-Lei n.º 37-A/2008, de 05.03 (estabelece as regras gerais de aplicação dos programas de desenvolvimento rural, adoptados no âmbito do Plano Estratégico Nacional para o período de 2007 a 2013), e na Portaria n.º 1137-D/2008, de 09.10 (aprova o Regulamento de Aplicação da Acção n.º 2.3.3, «Valorização Ambiental dos Espaços Florestais», da medida n.º 2.3, «Gestão do espaço florestal e agro-florestal», integrada no subprograma n.º 2, «Gestão sustentável do espaço rural», do Programa de Desenvolvimento Rural do Continente - PRODER), exige a ponderação do “valor de mercado” como necessária à elegibilidade das despesas comparticipadas].
Pelo que, no caso dos autos, atento o postulado no Decreto-Lei n.º 37-A/2008, de 05.03, na Portaria n.º 1137-D/2008, de 09.10, e no Manual Técnico, se constata que a Administração se “limitou”, precisamente, a observar o dever que emerge da norma consagrada no artigo 9.º, n.º 1 alínea a), do Regulamento [CE] n.º 1290/2005, de 21.06 (relativo ao financiamento da política agrícola comum), que determina a adopção de todas as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias à protecção eficaz dos interesses da Comunidade (maxime gerindo e verificando de forma inteligente a concessão e aplicação dos recursos dos membros comunitários).
Por conseguinte, uma vez deparando-se perante situação de despesas emergentes de subcontratação, impunha-se ao IFAP, IP - de molde a poder considerá-las “elegíveis” (ou não) para pagamento -, a sua aferição, o que, todavia, se revelou in concreto impossível, porquanto (cfr. alínea Y) do probatório):
“(…).
Mais se acrescente que, a existência de “pista de controlo” das despesas - visando a “conciliação entre os montantes globais declarados à Comissão e as facturas contabilísticas e outros documentos comprovativos mantidos pelo organismo pagador ou por outro serviço relativamente a todas as operações objecto do apoio” - é, na verdade, exigida pelo artigo 33.º do Regulamento (UE) n.º 65/2011 de 27 de Janeiro, não sendo passível de ser demonstrada por intermédio de qualquer outro meio de prova que não seja o documental (neste sentido, cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21.09.2017, in processo n.º 305/16.9BELSB, confirmado pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 30.11.2017, in processo n.º 01303/17, ambos disponíveis em www.dgsi.pt; negrito e sublinhado nossos).
Com efeito, nos presentes autos - estando em causa, por um lado, a falta de coincidência entre a descrição constante das facturas apresentadas, pela ora Requerente, aquando da submissão dos três pedidos de pagamento do subsídio ao investimento contratualizado em 28.12.2012 e, por outro, a ausência de elementos essenciais para indexar a efectiva execução daquelas despesas à operação material na qual foram - alegadamente - realizadas -, deve prevalecer aqui o regime de controlo plasmado no artigo 33.º do Regulamento da Comissão (EU) n.º 65/2011, de 27.01, por força do qual a existência de tais elementos essenciais [isto é, de molde a indexar a execução de determinada(s) e concreta(s) despesa(s) à operação - no âmbito da qual foram realizadas], só é passível de demonstração através de prova documental.
Circunstância que a Requerente (cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil) não logrou demonstrar.
Doutro prisma ainda, defender por “razões contabilísticas” que, aquando da apresentação das facturas em apreço, as atinentes despesas se consideram - desde logo - elegíveis, consubstancia uma errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 33.º do Regulamento da Comissão (UE) n.º 6/2011 da Comissão, de 27.01, conjugado com o seu Anexo I (e, ainda, nos artigos 21.º e 22.º da Portaria n.º 1137-D/2008, de 09.10).
Deste modo, e em suma, a Entidade ora Requerida agiu em consonância com o preceituado no artigo 24.º, n.º 3 alínea b), do Regulamento [EU] n.º 65/2011, de 27.01, que exclui do financiamento despesas sem comprovativo da sua correspondência e/ou de real e efectiva existência.
(…)”.
Adiante-se, desde já, que a sentença recorrida é para confirmar, pois, a mesma, contrariamente, ao defendido pela Recorrente não efectuou errada ou deficitária apreciação da factualidade alegada no requerimento inicial pela Requerente, não incorreu em erro sobre os pressupostos de facto e de direito, tal como, não efectuou errada interpretação e aplicação da lei ou errada qualificação jurídica dos factos.
Analisados os fundamentos apresentados pela ora Recorrente em sede de audiência prévia, relativamente a cada um dos pedidos de pagamento (PP), a ponderação dos mesmos efectuada pela Entidade Recorrida no acto suspendendo, bem como, dos fundamentos invocados pela Recorrente no requerimento inicial, os quais, no essencial, reiteram os fundamentos invocados em sede de audiência prévia, não está demonstrado que o acto suspendendo incorreu em erro sobre os pressupostos de facto.
Por outro lado, não se provaram factos que permitam estabelecer um pista de controlo da despesa.
Ora, no caso como se refere nos pontos 8, 9 e 13 do acto suspendendo a consideração do valor de € 771.872,13 como despesa não elegível deve-se à “ausência de pista de controlo da despesa – cuja necessidade de ser assegurada se encontra prevista no artigo 33.º do Regulamento n.º 65/2011 – dada a impossibilidade, quer de confirmação da existência de meios para a realização dos serviços facturados, quer de comprovação da execução da despesa (por subcontratação ou através de recursos do fornecedor constante do pedido de pagamento), quer ainda por ausência de modos de pagamento e incoerência de datas entre as facturas de subcontratação e os fornecedores constantes do pedido de pagamento. Por conseguinte a falta de idoneidade dos documentos de suporte, não permite a validação destas despesas, já que não há conciliação entre as facturas do projecto e a execução da despesa.”, o que determinou a alteração do contrato de financiamento e a devolução do valor de € 463.122,69.
A Recorrente não logrou provar documentalmente em sede de procedimento administrativo, tal como, lhe competia, nem de resto, nos presentes autos, de forma perfunctória, a realização das referidas despesas da operação cujo pagamento solicitou através dos denominados 1.º, 2.º e 3.º pedido de pagamento. Isto é, os autos não indiciam a existência da referida pista de controlo das despesas da operação. Sendo que o facto de o ora Recorrido ter procedido à alegada fiscalização, validação e ao respectivo pagamento das despesas apresentadas pela Requerente na operação, só por si não permite concluir naquele sentido. Na verdade, conforme resulta, designadamente, do artigo 9.º, n.º 1, alínea a), do Regulamento CE 1290/2005, à ED compete-lhe por um lado, adoptar quaisquer medidas necessárias para assegurar uma protecção eficaz dos interesses financeiros da Comunidade em especial a fim de: “i) se certificarem da realidade e regularidade das operações financiadas pelo FEAGA e pelo FEADER, ii) prevenir irregularidades e proceder judicialmente contra as mesmas”, e por outro “recuperar os montantes perdidos devido a irregularidades ou negligências”. Assim, o facto de a ER ter efectuado o pagamento das despesas apresentadas pela ora Recorrente, só por si, não permite concluir no sentido da existência da referida pista de controlo.
E isto porque na sequência da acção de controlo administrativo, realizada em 7/06/2016, não se logrou provar, documentalmente, como exigido, nomeadamente o pagamento de facturas e a capacidade de execução da despesa facturada – cfr. n.ºs 4 a 7 da decisão final (alínea V) do probatório).
Como se decidiu no acórdão do TCA Sul, de 21 de Setembro de 2017, proc. n.º 305/16.9BELSB[5], de que se cita o seguinte excerto do respectivo sumário: “XIII)-No regime de controlo exigido pelo artigo 33° do Regulamento (EU) n° 65/2011 de 127/01 o mesmo só é passível de demonstração através de prova documental.
(…) XV) -Sustentando a Recorrente que para a boa decisão da causa no que diz respeito às despesas dos trabalhos de arranque de árvores secas, aos quais se refere uma dada factura identificada o Juiz "a quo" deveria promover as diligências instrutórias requeridas pela Recorrente na petição inicial da acção principal pois só com a realização das requeridas diligências probatórias será possível avaliar se está ou não assegurado uma pista de controlo suficiente que permita a validação final das despesas apresentadas a pagamento pela Recorrente, conforme exigido no art° 33° n° 2 do Regulamento (CE) n°65/2011 da Comissão, de 27-1, conjugado com o seu Anexo i, e nos art°s. 21° e 22° da Portaria n° 1137-0/2008, de 9-10; ou seja, para a Recorrente, ao decidir-se que por razões meramente contabilísticas, aquando da apresentação das facturas e dos recibos, as despesas não se consideravam elegíveis, consubstancia uma errada interpretação e aplicação do disposto no art° 33° do Regulamento (UE) n° 65/2011 da Comissão, de 27-1, conjugado com o seu Anexo I, e dos art°s. 21° e 22° da Portaria n° 1137-0/2008, de 9-10.
XVI) -Mas o certo é que, a pista de controlo, cuja existência é exigida pelo artigo 33.º do Regulamento (UE) n° 65/2011, de 27 de Janeiro, visando "a conciliação entre os montantes globais declarados à Comissão e as facturas, os documentos contabilísticos e outros documentos comprovativos mantidos pelo organismo pagador ou por outro serviço relativamente a todas as operações objecto do apoio do FEADER" não é passível de ser demonstrada por intermédio de qualquer outro meio de prova que não seja o documental. (…).”.
Por outo lado e como se decidiu no acórdão do STA, de 04-10-2017, proc. n.º 550/17 “I - É legítimo o IFAP considerar como não elegíveis, para efeito de financiamento pelo FEADER, despesas apresentadas pelo promotor, em pedido de pagamento, consubstanciadas em facturas emitidas por fornecedor subcontratado, naquilo em que tais despesas, sem correspondência real, ultrapassam o chamado preço de entrada, ou 1º preço. II - O acto administrativo que exclui essas despesas está acobertado pelo regime comunitário e nacional no que respeita à elegibilidade de despesas.”.
E no caso dos autos verifica-se que na sequência da acção de controlo administrativo realizada em 7 de Junho de 2016, a Recorrente foi notificada pela Entidade Recorrida de que a despesa respeitante à prestação de serviços, no âmbito deste contrato, carecia de verificação adicional, designadamente no que se “refere à evidência dos fluxos financeiros entre o promotor e os fornecedores em causa, bem como, os movimentos contabilísticos entre as empresas, repercutindo-se, tal verificação adicional, na análise de elegibilidade da despesa apresentada, de forma a assegurar a necessária pista de controlo da despesa, em termos de fornecimento do bem, prestação do serviço, faturação e pagamento com vista à sua validação, no caso de os valores faturados, efetivamente fornecidos, se encontrarem em conformidade com os preços de mercado.”.
Referindo-se que “No caso de se verificar o recurso à subcontratação (por parte de uma entidade com relações especiais) os custos máximos elegíveis, para efeitos de co-financiamento, são limitados ao montante da referida subcontratação ou seja, ao 1.º preço de venda/preço de entrada, devendo ser apresentado o comprovativo dessa transação, com vista a uma eventual adequação dos montantes considerados, para efeitos de elegibilidade, por confirmação dos valores incorridos na subcontratação.”.
E no caso de não ter ocorrido o recurso à subcontratação, a verificação adicional assenta na análise de outros documentos de suporte, designadamente de “mapas de imobilizado da empresa fornecedora referentes aos exercícios económicos a que respeitam as despesas, declarações de remuneração remetidas à Segurança Social, reportadas ao período de emissão das faturas e outros documentos de valor probatório equivalente, com evidência de ser detida a necessária capacidade para a realização das tarefas faturadas, quer em termos de meios técnicos, quer no que se refere a recursos humanos.”.
Tendo a Entidade Recorrida, relativamente a cada um dos pedidos indicado quais as facturas que careciam de verificação adicional, os serviços a que respeitavam, assim como, as insuficiências de que padeciam e os elementos de careciam para poderem ser validadas as correspondentes despesas – cfr. alínea T) dos factos provados.
Sucede que a ora Recorrente, prestou esclarecimentos à Recorrida sem que tenha logrado efectuar a prova que permitisse validar as despesas referidas. O que também não logrou efectuar nos presentes autos.
E face às dúvidas que se suscitaram à Entidade Recorrida era à ora Recorrente que competia provar – por documento - que as despesas que apresentou relativas à realização dos trabalhos em causa observam as normas aplicáveis, o que não logrou fazer.
Em face do que se conclui que a sentença recorrida não incorreu no invocado erro de julgamento da matéria de facto e de direito, não violando o disposto no artigo 342.º do Código Civil, não padecendo, assim, do invocado erro sobre os pressupostos de facto e de direito.
3.2.7. No que respeita à invocada violação do direito de audiência prévia a Recorrente na alegação de recurso referiu que dá como inteiramente reproduzidos os artigos 16.º a 26.º, 27.º a 32.º, 33.º a 41.º do requerimento inicial, sendo evidente para a mesma que o acto está viciado dos vícios de violação dos artigos 121.º e 122.º do CPA. E que é “manifesto que não foi respeitado o direito de audiência prévia do Requerente, quer porque a decisão final é diferente da decisão notificada em sede de audiência de interessados; quer porque, sem qualquer fundamento, o Recorrido não procedeu às diligências complementares requeridas pela Recorrente. Defendeu, assim, que a sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação dos artºs 121.º e 122.º CPA.”.
O direito de audiência prévia está constitucionalmente consagrado no artigo 267.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa (CRP), que estabelece que “O processamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.”.
Esta norma foi concretizada no Código do Procedimento Administrativo (CPA), designadamente, nos artigos 12.º e 121.º e ss..
Com a epígrafe “Princípio da participação” prevê-se no artigo 12.º, do CPA que “Os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objeto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes digam respeito, designadamente através da respetiva audiência nos termos do presente Código.”.
E no artigo 121.º, n.º 1, do CPA prevê-se que “Sem prejuízo do disposto no artigo 124.º, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.”. E no n.º 2, deste artigo estabelece-se que “No exercício do direito de audiência, os interessados podem pronunciar-se sobre todas as questões com interesse para a decisão, em matéria de facto e de direito, bem como requerer diligências complementares e juntar documentos.”.
No artigo 122.º, do CPA, estabelece-se:
1 - Para efeitos do disposto no artigo anterior, o órgão responsável pela direção do procedimento determina, em cada caso, se a audiência se processa por forma escrita ou oral e manda notificar os interessados para, em prazo não inferior a 10 dias, dizerem o que se lhes oferecer.
2 - A notificação fornece o projeto de decisão e demais elementos necessários para que os interessados possam conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, em matéria de facto e de direito, indicando também as horas e o local onde o processo pode ser consultado.
3 - No caso de haver sítio na Internet da entidade em causa onde o processo possa ser consultado, a notificação referida no número anterior deve incluir a indicação do mesmo para efeitos de o processo poder também ser consultado pelos interessados pela via eletrónica.”.
Após transcrever os pontos 2 a 5 do “projecto de decisão final” sobre o qual recaiu a pronúncia da Requerente expedida em 12 de Outubro de 2016, e os pontos 8 a 10 da decisão final concluiu-se na sentença recorrida que “já no projecto de decisão comunicado – em Setembro – Outubro de 2016 se fundava a decisão (a adoptar) pela Administração - em 22.06.2018 - na ausência da “pista de controlo” de determinadas e concretas despesas apresentadas - referentes a serviços subcontratados pela Requerente - conjuntamente com os três pedidos de pagamento deduzidos no âmbito da operação em apreço, conforme consagrado no artigo 33.º do Regulamento (UE) n.º 65/2011 de 27 de Janeiro.
Neste contexto, de igual forma, há que afastar a probabilidade de vencimento, neste estrito domínio, da acção administrativa principal, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.”.
E o assim decidido não merece qualquer censura, pois, a sentença recorrida confrontou o teor do projecto de decisão com o teor do acto suspendendo, tendo concluído de forma correcta que efectivamente a decisão final não diverge do projecto de decisão.
Não subsistem dúvidas, atentos os factos provados em T) a V), que aquando da notificação efectuada à ora Requerente para exercer o direito de audiência prévia entre os fundamentos do projecto de decisão de modificação do contrato e devolução do montante concedido, constavam para além da alegação da existência de relações especiais com os fornecedores Arbo-B…., Lda., e P…G…F., a necessidade de a despesa respeitante a prestação de serviços, por parte das referidas empresas, bem como, a razoabilidade dos custos nesta circunstância, carecer de verificação adicional, designadamente, no que se refere à evidência dos fluxos financeiros entre o promotor e os fornecedores, a análise da elegibilidade da despesa apresentada de forma a assegurar a necessária pista de controlo da despesa, ou seja, a verificação de conformidade dos documentos apresentados para aferir da razoabilidade dos custos declarados, indicando-se as exclusões e reduções a efectuar, como resulta dos pontos 2 a 13 do ofício indicado em T). Na verdade, as referidas relações especiais são invocadas para fundamentar a necessidade de verificação da elegibilidade das despesas respeitantes a estes dois fornecedores. Tendo a ora Recorrente emitido a correspondente pronúncia negando a existência de relações especiais entre a mesma e os fornecedores, alegando que os trabalhos executados por aqueles fornecedores, bem como, os respectivos preços foram aceites e aprovados pela DRAPAL, explicitando, designadamente, os trabalhos que foram realizados, quem os realizou, os valores/hora e valores/hectare, a razão de ser das discrepâncias entre as datas de facturação e de execução dos serviços. Portanto, a Entidade Recorrida apreciou a pronúncia da ora Recorrente e no essencial, concluiu que não era adequada a alterar a decisão projectada em virtude de por um lado existirem facturas sem evidência do comprovativo de pagamento da subcontratação, diferenças não justificadas entre a data de emissão de facturas e a data do subfornecimento, que impedem a validação da despesa por ausência de pista de controlo; falta de menção de afectação de trabalhadores, impossibilitando a confirmação da capacidade de execução da despesa facturada pela Arbo B….., Lda., ou ainda, por não existir comprovativo de pagamento, considerando-se não elegível a despesa por ausência de pista de controlo da despesa e por ausência de pista de auditoria.
Considerou, assim, a Entidade Recorrida que, no essencial, estava em causa a ausência de pista de controlo da despesa - cuja necessidade de ser assegurada se encontra prevista no artigo 33.º do Regulamento n.º 65/2011. da Comissão de 27/01 - dada a impossibilidade, quer de confirmação da existência de meios para a realização dos serviços facturados, quer de comprovação da execução da despesa (por subcontratação ou através de recursos do fornecedor constante do pedido de pagamento), quer ainda per ausência de modos de pagamento e incoerência de datas entre as faturas de subcontratação e os fornecedores constantes do pedido de pagamento. Concluindo que a falta de idoneidade dos documentos de suporte, não permite a validação destas despesas, já que não há conciliação entre as facturas do projecto e a execução da despesa.
Igualmente, no que respeita à invocada falta de pronúncia sobre as requeridas diligências tal omissão sendo consubstanciadora da preterição do direito de audiência prévia, em conformidade com o previsto no artigo 121.º, n.º 2, do CPA, em face dos factos em causa, nos presentes autos, verifica-se que as diligências requeridas não eram idóneas a suprir as faltas de demonstração na pista de controlo.
Pois, face às apontadas irregularidades a prova de que as mesmas não ocorreram teria de ser feita por documento, como tem sido decidido por este TCA, designadamente no citado acórdão de 21/09/2017, proc. n.º 305/16.9BELSB.
Em face do que se conclui que a sentença recorrida não padece do invocado erro de interpretação e aplicação do disposto nos artigos 121.º e 122.º do CPA.
3.2.8. Referiu a Recorrente, na conclusão 18.ª da alegação de recurso que a sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação do disposto no art.º 1.º do Regulamento (CE/EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho, de 18-12-95.
Referindo em sede de alegação que é manifesto que prescreveu o procedimento de aplicação das sanções e de restituição dos subsídios à Requerente, à luz do disposto no art.º 1º do Regulamento (CE/EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho, de 18-12-95, pois, à data em que a Recorrente foi notificada pelo Recorrido em sede de audiência prévia, já haviam decorrido os 4 anos prescricionais fixados na citada norma legal. Uma vez que não só a operação em causa não está abrangida pelo conceito de “programa plurianual”, dado que o Programa em causa não identifica acções concretas a executar, que só aparecem nos contratos de financiamento, como as irregularidades em causa não podem ser consideradas irregularidades continuadas ou repetidas, à luz do entendimento consagrado pelo TJUE (cfr. neste sentido Acórdãos STA nos processos 0299/13, de 29-01-2014; 687/11.9BELSB, de 19-06-2015; 01154/16, de 14-06-2018; e 0220/16, de 14-06-2018 in www.dgsi.pt).
Vejamos, então.
O Regulamento (CE, EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho de 18 de Dezembro de 1995 relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, estabelece no artigo 1.º o seguinte:
1. Para efeitos da protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, é adoptada uma regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito comunitário.
2. Constitui irregularidade qualquer violação de uma disposição de direito comunitário que resulte de um acto ou omissão de um agente económico que tenha ou possa ter por efeito lesar o orçamento geral das Comunidades ou orçamentos geridos pelas Comunidades, quer pela diminuição ou supressão de receitas provenientes de recursos próprios cobradas directamente por conta das Comunidades, quer por uma despesa indevida.”.
E o artigo 3.º do Regulamento n.º 2988/95, do Conselho prevê:
1. O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no nº 1 do artigo 1º. Todavia, as regulamentações sectoriais podem prever um prazo mais reduzido, que não pode ser inferior a três anos.
O prazo de prescrição relativo às irregularidades continuadas ou repetidas corre desde o dia em que cessou a irregularidade. O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa.
A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção.
Todavia, a prescrição tem lugar o mais tardar na data em que termina um prazo igual ao dobro do prazo de prescrição sem que a autoridade competente tenha aplicado uma sanção, excepto nos casos em que o procedimento administrativo tenha sido suspenso em conformidade com o nº 1 do artigo 6º
2. O prazo de execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este prazo corre desde o dia em que a decisão se torna definitiva.
Os casos de interrupção e de suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional.
3. Os Estados-membros conservam a possibilidade de aplicar um prazo mais longo que os previstos respectivamente nos nºs 1 e 2.”.
A sentença recorrida concluiu que à data em que foi praticado o acto suspendendo o procedimento de aplicação de sanções e de restituição de subsídios não se encontrava prescrito, com a seguinte fundamentação: “o prazo de prescrição aqui aplicável é (era) de 4 (quatro) anos (cfr. artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento (CEE) n.º 2988/95, de 18.12).
Sucede, todavia, que “a prescrição do procedimento é interrompida por qualquer acto, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade” (cfr. artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento (CEE) n.º 2988/95, de 18.12), designadamente como acontece com o instituto da “audiência dos interessados” (neste sentido, cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 08.03.2018, in processo n.º 0480/17 e do Tribunal Central Administrativo Norte, de 15.09.2017, in processo n.º 0852/12.1BEPRT, de 09.09.2016, in processo n.º 00131/12.4BEBRG e de 22.05.2015, in processo n.º 01509/07.0BEPRT, disponíveis em www.dgsi.pt).
Pelo que, assim sendo, há que julgar improcedente a excepção peremptória “sub judice”, visto que:
Entre 14 de Novembro de 2012 (data da aprovação da candidatura da Requerente e da concessão do subsídio ao investimento em apreço) e - no limite - 12 de Outubro de 2016 (data em que a Requerente se pronunciou em sede de audiência prévia, a qual constitui o primeiro «momentum» onde é manifestada, pela Administração, a intenção de proceder à instauração de procedimento por alegadas irregularidades detectadas), não decorreram mais de 4 (quatro) anos.
Sendo que, em Outubro de 2016, “o prazo de prescrição” - in casu, de 4 anos - começou a correr de novo a interrupção - concretamente - operada com a audiência dos interessados promovida através do ofício n.º 0093…/2016 …-UREC, de 27.09.2016 (cfr., de novo, artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento (CEE) n.º 2988/95, de 18.12).
Consequentemente, cumpre considerar, de igual modo, como não provável a procedência da presente providência em sede da acção administrativa principal, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.”.
Este TCA Sul tem entendido, em processos em que estão em causa questões idênticas às discutidas nos presentes autos, nos quais as partes são as mesmas dos presentes autos, e nos quais está, também, em causa a inelegibilidade de despesas facturadas à ora Recorrente, que se trata de infracções de natureza continuada, como se verifica do excerto do acórdão de 23 de Maio de 2019, proc. n.º 27/19.9BEBJA “sendo tal irregularidade praticada repetidamente pela ora Recorrente, infringindo-se, em todas elas, como arguido pelo Recorrido, a mesma norma referente à elegibilidade de despesas. E tendo presente, por um lado, a natureza continuada e/ou repetida das irregularidades em causa e, por outro lado, a data do último pagamento efectuado na Operação - 23.12.2015 - e a data em que a A............... foi notificada da intenção de o IFAP recuperar as quantias tidas por indevidamente recebidas no seu âmbito - 11.09.2018 -, ter-se-á que concluir que nesta data (11.09.2018), o procedimento não se acha prescrito pelo decurso de um prazo de 4 anos, sendo que sempre teria que considerar-se que se teria interrompido o prazo prescricional entretanto decorrido. Pelo que, na data da prolação da Decisão suspendenda - em 4.10.2018 -, o procedimento não se encontrava prescrito.[6]”.
Ora, o entendimento seguido pela decisão recorrida, não merece censura e por isso é para confirmar. Pois, como se provou, indiciariamente, e como se referiu na sentença recorrida, está indiciariamente provada a seguinte factualidade:
- Em 14.11.2012, tendo por objecto operação [n.º 020000030...] a concretizar na “Zona de Intervenção Florestal do Viso e Anexas”, foi aprovada a candidatura da Requerente ao PRODER, mediante a qual foi concedido à Requerente “subsídio não reembolsável” no montante de € 616.007,69 (seiscentos e dezasseis mil, sete euros e sessenta e nove cêntimos);
- Em 28.12.2012, as Partes outorgaram o contrato de financiamento n.º 02024…/0, referente a pedido de apoio na operação n.º 020000030... (Zona de Intervenção Florestal do “Viso e Anexas”);
- Em 17.03.2013, em 10.07.2014 e em 17.10.2014, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0, a Requerente submeteu junto da Entidade Requerida pedidos de pagamento de despesas nos montantes de € 145.645,07, de € 467.688,68 e de € 158.537,38 respectivamente;
- Em 29.11.2013, em 29.08.2014 e em 28.11.2014, a Entidade Requerida liquidou, ao abrigo do contrato de financiamento n.º 02024…/0, os montantes de € 87.387,05, de € 280.613,21 e de € 95.122,69 respectivamente;
- Mediante o ofício n.º 009399/2016 DAI-UREC, datado de 27.09.2016, “nos termos dos artigos 121.º e 122.º do Código do Procedimento Administrativo”, a Entidade Requerida deu conhecimento à Requerente do projecto de decisão de “(…) determinar a modificação do contrato de financiamento e a devolução do montante (…) indevidamente recebido, no valor de € 463.122,69”;
- Mediante carta datada de 12.10.2016, em sede de audiência prévia, a Requerente veio pugnar pela improcedência do projecto de decisão e respectiva argumentação vertida no ofício n. 009…/2016 …-UREC, de 27.09.2016;
- Em 22.06.2018, o IFAP, IP determinou a “modificação” do contrato de financiamento em causa, outorgado em 28.12.2012, com a inerente exigibilidade da devolução da quantia de € 463.122,69 (decisão notificada à Requerente em 25.06.2018).
No caso sub iudice é manifesto que não ocorreu a prescrição do procedimento, mesmo que se atendesse à data da aprovação da candidatura que ocorreu em 14 de Novembro de 2012, na data em que a ora Recorrente foi notificada do projecto de decisão, em 27 de Setembro de 2016, ainda não tinham decorrido os referidos 4 anos, para que pudesse ocorrer a prescrição do procedimento, em conformidade com o estabelecido nos artigos 1.º e 3.º, n.º 1, do Reg. 2988/95, do Conselho.
Sendo que as datas a considerar para aferir se ocorreu ou não a prescrição é a data da prática da irregularidade, que deverá considerar-se como sendo a do último pagamento efectuado e não a data da aprovação do financiamento ou a data da celebração do contrato.
Sucede que, por ofício datado de 27.09.2016, a Requerente foi notificada do projecto de decisão e para exercer audiência prévia, o que fez por missiva de 12.10.2016, o que constitui causa de interrupção do procedimento, iniciando-se novo prazo de prescrição a partir desse evento.
Assim, quando foi proferido o acto suspendendo, notificado à Recorrente com data de 22/06/2018, ainda não se tinha completado o prazo de prescrição de 4 anos, não incorrendo a sentença recorrida nos imputados vícios de violação dos artigos 1.º e 3.º do Reg. CE n.º 2988/95, de 18 de Dezembro de 1995.
Em face do que improcede este vício.
3.2.9. Defendeu a Recorrente que sentença “a quo” faz uma errada interpretação e aplicação do disposto nos art.ºs 151.º, n.º 1 d), 152.º n.º 1 e 153.º n.ºs 1 e 2 CPA. Que é manifesto que o acto requerido não se encontra suficientemente fundamentado de direito, quando apenas invoca como motivo de direito o art.º 33.º do Regulamento (CE) n.º 65/2011 da Comissão, de 27-1, não identificando as normas legais que concretizem a base legal para decidir que não existe pista de controlo das despesas apresentadas pela Recorrente.
O artigo 151.º, n.º 1, alínea d) do CPA, com a epígrafe “Menções obrigatórias”, prevê: “1- Sem prejuízo de outras referências especialmente exigidas por lei, devem constar do ato: (…); d) A fundamentação, quando exigível;
(…)”.
No artigo 152.º, do CPA consagra-se o dever de fundamentação dos actos administrativos, prevendo-se no n.º 1, que “Para além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente:
a) Neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos, ónus, sujeições ou sanções;
b) Decidam reclamação ou recurso;
c) Decidam em contrário de pretensão ou oposição formulada por interessado, ou de parecer, informação ou proposta oficial;
d) Decidam de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes, ou na interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou preceitos legais;
e) Impliquem declaração de nulidade, anulação, revogação, modificação ou suspensão de ato administrativo anterior.”
No artigo 153.º, prevêem-se os “requisitos da fundamentação”, nos seguintes termos:
“1 - A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato.
2 - Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato. (…)”.
A decisão recorrida considerou que o acto suspendendo não padecia do vício de falta de fundamentação que a Requerente lhe tinha imputado, em virtude de resultar “da factualidade indiciariamente provada, por um lado, que a fundamentação de facto e de direito exigida relativamente ao acto suspendendo se mostra, integralmente, observada, nos termos e para os efeitos consagrados, sucessivamente, nos artigos 151.º, n.º 1 alínea d), 152.º, n.º 1 alínea e), e 153.º do Código do Procedimento Administrativo, e, por outro e como tal, que não sendo exigível nem permitida uma análise aprofundada de cada ilegalidade imputada, o que poderia esvaziar de conteúdo a acção principal, de que estes autos são apenso.”.
O acto administrativo suspendendo carece de ser fundamentado, devendo conter as razões ou motivos que conduziram o órgão à prática do mesmo, com aquele conteúdo, sendo que o mesmo deverá conter os fundamentos de facto e de direito em que a decisão assenta.
Mas no caso sub iudice não assiste razão à Recorrente.
Basta atentar nas alegações efectuadas pela mesma no requerimento inicial, para se compreender que o que ocorre não é que a Requerente, ora Recorrente não tenha entendido o acto suspendendo, o que se verifica é que discorda dos fundamentos do mesmo.
A questão da aplicação insuficiente ou errada do art.º 33.º do Regulamento n.º 65/2011, da Comissão de 27 de janeiro, não se pode confundir com falta de fundamentação do ato suspendendo.
Assim, da análise do acto suspendendo, retira-se que o mesmo contém fundamentação de facto e de direito, perceptível pelo seu destinatário. E da leitura do requerimento inicial verifica-se que a Requerente não teve dificuldades em entender o acto, nem a fundamentação de direito expressa no mesmo.
Efectivamente, assim, a Recorrente revelou compreender perfeitamente as razões de facto e os fundamentos jurídicos pelos quais a Entidade Requerida, ora Recorrida praticou o acto suspendendo, discordando, contudo dos mesmos, como claramente alegou em sede de requerimento inicial. Assim como, no presente recurso, discordando da invocação do artigo 33.º do Regulamento (CE) 65/2011 da Comissão para decidir que não existe pista de controlo das despesas apresentadas pela Recorrente. E atentando no estabelecido neste artigo 33.º, n.º 2, que prevê que “Deve ser mantida uma pista de controlo suficiente. Consta do anexo a descrição indicativa dos requisitos de uma pista de controlo satisfatória.”, quanto a esta concreta questão da pista de controlo a fundamentação de direito, contrariamente ao alegado pela Recorrente, é suficiente. Igualmente foi invocado no acto suspendendo o disposto no n.º 1, do artigo 30.º do referido Regulamento, bem como, as cláusulas B.1, B.3, C1, e I.1, do contrato.
Assim e como se decidiu no acórdão deste TCA de 4/07/2019, proc. n.º 162/18.0BECTB, que tem inteira pertinência para o caso dos presentes autos, dada a identidade de situações fácticas e jurídicas de ambos os processos e o facto julgado indiciariamente provado sob o n.º 13, “apreciada a fundamentação do acto tal como decorre do facto G), constata-se que tal acto ostenta uma fundamentação de facto completa e exaustiva e uma fundamentação de Direito suficiente, remetendo-se para o contrato de financiamento e as concretas cláusulas que se dizem violadas – correspondendo esta indicação a uma alegação normativa.
Neste contexto, ainda que do acto sindicado não constem as normas legais que se entendem violadas, daí não decorre a insuficiência da fundamentação de Direito, pois esta escoa dos normativos contratuais, que são o fundamento jurídico para decisão tomada.
Com os indicados fundamentos normativos era possível ao Recorrente compreender as razões em que se fundava a decisão tomada e reagir eficazmente contra a mesma, tal como o fez.”.
Em face do que, quanto a este fundamento, também não pode proceder o presente recurso.
Em suma, não estando demonstrado o fumus boni iuris, fica prejudicado o conhecimento do periculum in mora e a realização da ponderação dos interesses públicos e privados, pelo que, deve a sentença recorrida, nesta parte, ser confirmada.
Concluímos, assim, que improcede, parcialmente, o presente recurso.
*
As custas do recurso serão suportadas pela Recorrente – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, todos do Regulamento das Custas Processuais.
*
IV. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
- Conceder parcial provimento ao recurso, e consequentemente declarar nula a sentença, na parte em que apreciou a questão da compensação supra identificada;
- No mais, negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pela Recorrente.
Lisboa, 26 de Setembro de 2019.

____________________________
(Helena Afonso – relatora)

____________________________
(Pedro Nuno Figueiredo)

_____________________________
(Cristina dos Santos)



[1] Cfr. Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2016 – 2.ª Edição, pág. 415.
[2] Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 4ª Edição, 2017, pág. 914.
[3] Cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, 3.ª Edição, Almedina, Pág. 714-715.
[4] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in obra citada, pág. 737.
[5] Consultável em www.dgsi.pt., como todos os acórdãos citados sem indicação de fonte.
[6] Cfr. no mesmo sentido o Ac. do TCA Sul, de proc. 76/19.7BEBJA, de 6 de Junho de 2019.