Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1148/13.7BEALM
Secção:CA
Data do Acordão:11/06/2025
Relator:ANA CARLA TELES DUARTE PALMA
Descritores:MULTA CONTRATUAL; PRAZO DE EXECUÇÃO DOS TRABALHOS; AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS.
Sumário:
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de Contratos Públicos
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de Contencioso Administrativo, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul.

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Relatório

C…………….- Congevia, Engenharia …………., S.A., intentou contra a Academia …………………….., ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo na qual pediu a anulação da decisão que determinou a aplicação da multa contratual, no valor de 87.174,69 €, por violação do prazo de execução da obra respeitante à empreitada de “recuperação do Cine-Teatro da Academia ………………….“.

Por sentença proferida pelo TAF de Almada, ação foi julgada procedente, e, em consequência, anulado “o ato que aplicou à autora uma multa contratual, no valor de 87.174,69 €, no âmbito da execução da empreitada de “recuperação do Cine-Teatro da Academia ………………..”

Inconformada, a ré interpôs recurso para este Tribunal Central Administrativo Sul, tendo formulado, após convite, as seguintes conclusões da alegação:

«1- A Omissão de Pronuncia geradora de nulidade da sentença

Apesar de alegada, pela Recorrida que a data de comunicação do DPSS, ocorreu na data da respectiva aprovação e assinatura, e de alegada pela Recorrente, que o DPSS foi aprovado com as peças do procedimento pré-contratual, facto este que foi dado por provado pelo Tribunal A Quo, na sentença, este não se pronuncia quanto à efectiva data em que deve ser considerada como comunicada essa aprovação, ou mesmo se essa comunicação é, ou não devida.

Ao não se ter pronunciado sobre este facto, o Tribunal A Quo feriu a sentença de nulidade, prevista no art.º615º0, n.º1, al. d) do CPC, aplicável subsidiariamente, nos termos do n.º1, do art.º 1º do CPC, cuja declaração se pede, e, em consequência, se produza nova decisão, que inclua, nos factos provados, que a aprovação do DPSS foi comunicada à ora recorrida, na data da assinatura daquele documento, por força da assinatura simultânea, e decida em conformidade com esse facto, o que, igualmente se pede.

2-A Omissão de Pronuncia geradora de nulidade da sentença

Mesmo que não se entendesse procedente o vicio atrás apontado, o que se admite sem conceder, porque foi alegado e considerado provada a apresentação de desenvolvimentos ao DPSS, pela A, ora Recorrida, e que por isso, não se considerasse existir um DPPS totalmente aprovado, e que a aprovação dependia, da aprovação dos referidos desenvolvimentos, certo e que estes foram apresentados, apreciados, aprovados e comunicados à ora Recorrida, na data que resulta da conjugação das comunicações constantes dos factos dados por provados sob as alíneas g) a 0) da sentença, ou seja, em 7 de Janeiro de 2013.

Ao não se ter pronunciado sabre este facto, o Tribunal A Quo feriu a sentença de nulidade, prevista no art.º615º, nº 1, al. d) do CPC, aplicável subsidiariamente, nos termos do nº1, do art.º1º do CPC, cuja declaração se requer, e, em consequência, se produza nova decisão, com inclusão nos factos provados que a aprovação do DPSS foi comunicada à ora Recorrida, em 7 de Janeiro de 2013, e se decida em conformidade com esse facto, o que igualmente se pede.

3- Vicio de violação de lei - erro de julgamento

O Tribunal A Quo deu como não provado, sob a alínea c), que A e R tenham prescindido, através da apresentação e aprovação de vários planos de trabalhos, onde foi feito constar, pela A., ora Recorrida, como data de início de execução da obra, 27/12/2012, que corresponde à data da consignação, que o início ocorresse apenas com a aprovação do Plano de Segurança e Saúde.

A decisão do tribunal A Quo mostra-se:

Contrária à prova documental produzida, quer a consubstanciada nos citados planos de trabalhos, quer a constante das declarações que instruíram as declarações de abertura de estaleiro, enviadas à ACT, datadas de 28.12.2012, todos posteriores a data da consignação e da autoria da A., ora Recorrida;

• Em violação do previsto no n.° 2 do art.° 376.° do CPC, já que os citados documentos sendo da autoria da A., ora Recorrida, os factos contidos nos mesmos são factos próprios daquela, contra os quais a mesma não pode vir, e mostrando-se os mesmos contrários aos seus interesses, impunham que se considerasse o acto como provado.

O Tribunal A Quo, ao dar como não provado facto que se encontrava provado por documentos, fê-lo contra a prova produzida, e em violação do previsto no n.° 2, do art.° 376.° do CPC, em errada aplicação do direito e feriu a sentença de vício de violação da lei, gerador da anulabilidade da sentença, pelo qual se pede a declaração de anulação da sentença quanta ao facto nao provado sob a alínea c), e a sua substituição por outra que considere o facto como provado, e, em consequência se produza nova decisão de direito, concretamente avalie o acto de aplicação da multa como não ferido de vício de erro nos pressupostos de facto e de direito, e absolva a R, ora Recorrida, do pedido.

4-Improcedendo os supra citados vícios, o que apenas se admite sem conceder, sempre a decisão A Quo estaria ferida de vício de violação de lei - erro de julgamento

O Tribunal A Quo, contra o alegado e pedido pela A., ora Recorrida, que faz coincidir a data de assinatura do DPSS com a data da comunicação ao ao empreiteiro da aprovação do DPSS, e logo, contra o alegado pela A. de que existiu comunicação da aprovação, na data da assinatura do PSS, na data de assinatura do contrato, facto que não foi contrariado pela R, ora Recorrida, e que devia ser considerado por provado, por acordo das partes, conclui, não levando, nem aos factos provados nem aos factos não provados, que a comunicação da aprovação do DPSS, ocorreu na data da aprovação do DPSS, ou seja, na data da sua assinatura, já que, consta dos factos provados que foi aprovado em 7 de Janeiro de 2013 (cfr. al. o) da sentença).

O Tribunal A Quo fez, assim, errada apreciação da prova, no julgamento dos factos, fundamento pelo qual se pede a declaração de anulação da sentença, nesta parte, e a sua substituição por outra, que inclua, quanta aos factos provados que a comunicação da aprovação do DPSS, ocorreu em 7 de Janeiro de 2013, com a aprovação do mesmo DPSS, e, em consequência, decida pela verificação de mero erro de cálculo da multa aplicada, procedendo à sua correção e absolvendo a R, ora Recorrida, do pedido, o que se requer.

5- Vício de violação de lei • Erro de julgamento

A dispensa de realização da audiência prévia não obriga à produção de acto prévio e expresso nesse sentido, conforme dispõem os art.°s 308.°, n.° 3 do CCP, e 124.° do CPA, por remissão do n.º2, do art.°308.° atrás referido, nem a existência de créditos que possam ser compensados com a multa contratual constitui pressuposto de dispensa de audiência prévia.

Pelo que o Tribunal A Quo ao decidir como decidiu, fez errada interpretação do direito aplicável, eivando a sentença de vício de violação de lei, por erro de julgamento, gerador da sua anulabilidade, cuja declaração se requer com as legais consequências, designadamente, com a prolação de nova decisão que aplicando o citado artigo conclua pela existência de dispensa de audiência prévia.

6-Vicio de violação de lei - Erro de julgamento

O Tribunal A Quo não considerou provados, como devia, porque alegados e demonstrados pela R., ora Recorrente, sem oposição da A, ora Recorrida, os factos integradores dos pressupostos da dispensa de audiência prévia, o que constitui erro de julgamento, por errada aplicação do art.º308º, nº 3 do CCP, que enferma a decisão A Quo de vicio de violação de lei, gerador de anulabilidade, cuja declaração se requer, com as legais consequências, designadamente a prolação de nova decisão que declare verificados os citados pressupostos e a dispensa da audiência prévia prevista no art.º308º, nº3 do CCP, e, em consequência, declare improcedente por não provado o vício de forma - não realização da audiência previa, e absolva a R., ora Recorrida do pedido, o que se requer.

7- Vicio de viola o de lei - erro de julgamento

O Tribunal A Quo ao decidir, como não provado, o facto sob a alínea d), por considerar que a A., ora Recorrida, não foi notificada para o exercício do direito de audiência prévia, da decisão de aplicação da multa contratual, apesar de ter dado por provada que, aquela foi notificada, com 10 dias de antecedência, relativamente à data em que se devia considerar aplicada a multa (termo dos dez dias uteis, concedidos para a aceitação do acordo), multa que se quantificou e que se demonstrou como foi calculada, fez errada interpretação do direito aplicável, concretamente do princípio subjacente ao art.º 308.º, nº 2, do CCP, eivando a sentença de vício de violação de lei, por erro de julgamento, porquanto foi concedido o prazo de dez dias para a ora recorrida se pronunciar sobre a aplicação da multa contratual .

Vício de violação de lei cuja declaração se pede, com a correspondente anulação da decisão recorrida, e, em consequência se produza nova decisão que conclua pela concessão do exercício do direito de audiência prévia, e se declare o vicio de forma - preterição de audiência prévia, alegado pela A., ora Recorrida, improcedente, por não provado, e se absolva a R., Recorrente, do pedido.

Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso proceder por provados os vícios apontados, declarando-se nula e / ou anulada a sentença, quanto à matéria objecto de impugnação e substituindo-se por outra que, sanando os vícios, decida pela improcedência, por não provados, dos vícios assacados ao acto de aplicação da sanção contratual, pela A., e absolva a R, ora Recorrida, do pedido.

Com o que se fara a costumada justiça.»

A autora, ora recorrida, contra-alegou e formulou as seguintes conclusões:

«a) A Sentença recorrida é uma boa e justa Sentença que nenhum reparo merece da parte desta Instância;

b) O recurso interposto pela Recorrente não tem qualquer fundamento, sendo apenas um expediente dilatório;

c) As obrigatórias conclusões de recuso devem ser sintéticas, e não uma integral reprodução das alegações que as precedem.

d) É jurisprudência assente que invocação de nulidade de Sentença por omissão de pronúncia não serve para proceder à alteração da matéria de facto, como pede a Recorrente;

e) Também é jurisprudência firme que os tribunais não têm de se pronunciar sobre todas as questões, nomeadamente as que não têm relevância ou são meras opiniões;

f) Para efeitos de anulação do acto, que era o que estava em causa, era indiferente saber qual a data em concreto em que tinha sido comunicado o PSS ao empreiteiro, ou mesmo a data da sua aprovação pelo dono de obra, pois o que estava em causa era um erro sobre os pressupostos de Direito por parte do acto, uma vez que este estabelecia como pressuposto da sua emissão a data consignação da obra para efeitos da contagem do prazo da execução, quando legalmente, e nos termos da Sentença recorrida, devia ser o da comunicação do PSS.

g) Não tendo o Tribunal "a quo", após a produção de toda a prova, "formado a convicção" sobre a verificação de determinado facto, não se vislumbra como pretende a Recorrente que este douto Tribunal altere a matéria de facto, sabendo-se o que diz a melhor superior jurisprudência a este propósito, e o que como configura o princípio da livre apreciação da prova.

h) Aliás, é a própria Recorrente que chega à conclusão que determinada prova documental se limita a "indiciar", a verificação de determinado facto, e não que dela, prova documental, se pode retirar uma certeza absolutíssima da sua verificação.

i) Do facto do Coordenador da Segurança ter assinado o DPSS no momento em que o dono de obra o aprova, não significa que se deva considerar como comunicado o mesmo ao empreiteiro;

j) O Coordenador da Segurança tem competências próprias nas quais não se incluem certamente a representação do empreiteiro;

k) O Coordenador da Segurança não aprova o DPSS, o coordenador valida tecnicamente o mesmo, nos termos legalmente prescritos.

l)Não há qualquer erro de julgamento no facto de não se ter dado como provado que o empreiteiro teve conhecimento do DPSS pelo facto do Coordenador de Segurança o ter assinado na mesma data em que o dono de obra o aprovou;

m) A Recorrente não se limita a pedir alteração da matéria de facto, a Recorrente sugere mesmo alterações ao decisório da Sentença,

n) As alterações sugeridas pela Recorrente passam pelo Tribunal "a quo" alterar, ele próprio, o valor da multa aplicada,

o) O que a Recorrente pretende é que o Tribunal "a quo" altere, no âmbito de uma acção de impugnação de acto administrativo, o conteúdo de um acto emitido pela Administração, administrando ao invés de apenas julgar, e assim, ultrapassar as limitações decorrentes do princípio da separação de poderes.

p) Insurge-se a Recorrente contra o facto da Sentença recorrida ter decidido que inexistia dispensa de audiência prévia neste caso, e que em qualquer caso não se verificavam os pressupostos da sua dispensa;

q) Diz isto quem, como a Recorrente, começou por alegar, na sua contestação, que não estava obrigada a proceder à audiência prévia antes de aplicar a multa;

r) Diz isto quem, só em sede de contestação à acção de anulação da sanção contratual - multa - é que vem arguir que alegadamente existiam fundamentos para dispensar a audiência prévia da Recorrida,

s) Diz isto quem, compensou o valor da multa com créditos que a Recorrida tinira junto da Recorrente e, portanto, tinha o valor da multa assegurado.

t) Não obstante invoca erro de julgamento pelo facto da douta Sentença não ter dado como provado que existiu dispensa de audiência prévia e que se verificam os fundamentos para a mesma;

u) A Recorrente invoca ainda, e mais uma vez, nulidade de sentença por omissão de pronúncia, ainda que o faça no final do capítulo dedicado ao erro de julgamento e "como quem não quer a coisa", porque, na sua opinião deviam ter sido dados como provados os factos constantes dos art.° 33 a 63, e 70 e 71, isto de uma contestação que tem 73 artigos!

v) O que a Recorrente invoca é que a Sentença é nula por omissão de pronuncia por não ter dado como provado, por exemplo que "Existindo fundado receio, materializado na situação económica difícil da A. e na conduta supra explanada, de a mesma impedir a execução da garantia bancária, por exemplo, através da interposição de providência cautelar"(art.° 70 da contestação);

w) Invoca novamente erro de julgamento porque se devia ter dado como provado que a Recorrida se pronunciou em audiência prévia, pelo facto de nada ter dito apesar de ter sido notificada para tal.

x) A "notificação" a que a Recorrente alude e que queria que o Tribunal desse como provado que havia sido recebida, era um documento onde se propunha um acordo de rescisão, e se dizia que havia multas no valor de 133 625,44 euros, e se concediam 10 dia para pagar!

y) Andou bem o Tribunal "a quo" ao considerar que não tinha sido feita qualquer notificação para audiência prévia, e portanto, o acto padecia de invalidade;

z) Aliás, se ainda na contestação a Recorrente afirmava que não estava abrangida pelo dever de proceder à audiência prévia da Recorrida, como podia tal documento ter a virtualidade de ser a notificação para esse fim;

aa) A douta Sentença não é "nula e anulável", ao contrário do que afirma a Recorrente;

bb) A douta Sentença não merece qualquer reparo, e deve ser confirmada por este douto e Superior Tribunal.

Nestes Termos,

E com o douto suprimento de V. Exas., Venerando Senhores Desembargadores, deve o presente recurso ser julgado improcedente por não provado, confirmando-se assim a decisão proferida pelo Tribunal "a quo", nos exactos termos em que este decidiu.»


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O Ministério Público foi notificado para os efeitos previstos no artigo 146.º, n.º 1, do CPTA.

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Sem vistos, nos termos do disposto no artigo 657.º, n.º 4, do CPC, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

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Questões a decidir

O objeto do presente recurso, delimitado pelas conclusões da alegação (cfr. artigos 635º nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nº 1, do CPC), é a sentença proferido pelo TAF de Almada, sendo as questões a decidir as de saber, se a sentença é nula por omissão de pronúncia, e se incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, nos termos apontados pela recorrente.


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Fundamentação

O tribunal a quo, na sentença recorrida, considerou provados os seguintes factos:

«a) A autora é uma sociedade comercial que exerce a sua actividade no sector da construção civil e obras públicas [acordo].

b) Na sequência do concurso público para a adjudicação da empreitada “de recuperação do Cine-teatro da Academia …………………..”, com o nº396/2012, no dia 06/12/2012, entre a autora e a entidade demandada, respectivamente, na qualidade de adjudicatário e entidade adjudicante, foi celebrado um contrato de empreitada [documento de fls. 12 a 19 dos autos].

c)A cláusula 3ª do contrato referido em b) tem o seguinte teor: “a) - O prazo global da execução da obra é de 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias a contar da data da consignação total ou da aprovação do Plano de Segurança e Saúde, caso esta data seja posterior, de acordo com o previsto no número 1 do art° 362° do C.C.P. b) - A consignação da obra obedecerá ao previsto nos artigos 355° e seguintes do C.C.P.” [documento de fls. 12 a 19 dos autos].

d)A cláusula 8ª do contrato referido em b) tem o seguinte teor: “O incumprimento de prazos, por facto imputável à empreiteira, fundamentará a aplicação das sanções pecuniárias a que se reportam os n°s 1 e 2 do artigo 403° do CCP, cláusula décima primeira das Cláusulas Jurídicas Gerais e cláusula trigésima segunda das Cláusulas Jurídicas Especiais ambas do Caderno de Encargos.” [documento de fls. 12 a 19 dos autos].

e) O Plano de Segurança e Saúde constava do projecto submetido a concurso [documento de fls. 56 a 89 dos autos e depoimento testemunhal].

f) Em 27/12/2012, teve lugar a consignação da obra, tendo sido elaborado o correspondente auto [documento de fls. 21 e 22 dos autos].

g) Em 28/12/2012, a autora apresentou à entidade demandada um Plano de Segurança e Saúde (PSS) [acordo e documento de fls. 17 dos autos].

h) Em 29/12/2012, através de correio electrónico, foi solicitado à autora que efectuasse correcções ao plano referido em g), o qual deveria apresentado como Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde (DPSS) [documento de fls. 90 e 91 dos autos].

i) Em 30/12/2012, a autora, através de correio electrónico, apresentou o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde [documento de fls. 92 a 95 dos autos].

j) Em 31/12/2012, foi comunicado à autora, através de correio electrónico, que, de uma forma geral, o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde se encontrava nas devidas condições, “tirando umas notas” [documento de fls. 96 a 99 dos autos].

k) Em 03/01/2013, a autora enviou à entidade demandada as declarações para elaborar a Comunicação Prévia a entregar na Autoridade para as Condições do Trabalho [documento de fls. 100 dos autos].

l) Na mesma data, a entidade demandada entregou à Autoridade para as Condições do Trabalho a Comunicação Prévia de Abertura de Estaleiro [documento de fls. 101 a 116 dos autos].

m) Em 06/01/2013, a autora enviou para a entidade demandada o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde com as alterações solicitadas: legenda das siglas nas matrizes de avaliação de riscos; indicação do autor do DPSS e o plano de estaleiro actualizado [documento de fls. 117 e 118 dos autos].

n) Em 07/01/2013, o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde foi assinado e validado pelo coordenador de segurança da obra [acordo, documento de fls. 25 e depoimento testemunhal].

o) Na mesma data, o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde foi assinado e aprovado pelo dono de obra [depoimento testemunhal].

p) A montagem do estaleiro da obra teve início no dia 09/01/2013 [documento de fls. 119 a 121 dos autos].

q) Em 15/01/2013, o Director de Obra, engenheiro Pedro ……….., enviou para o coordenador da fiscalização da obra, engenheiro Abílio……………, uma mensagem de correio electrónico, onde consta, além do mais, o seguinte: “(…)

« Texto no original»

(...).” [documento de fls. 24 dos autos].

r) Desde 22/01/2013 que se encontra registada formação dada pela autora aos trabalhadores sobre o Plano de Segurança e Saúde [documentos de fls. 127 a 138 dos autos].

s) Num contrato de subempreitada celebrado pela autora em 25/02/2013, consta que se encontra disponível em obra, no contentor do encarregado, uma cópia do Plano de Segurança e Saúde em vigor na empreitada [documento de fls. 122 a 126 dos autos].

t)Em 27/09/2013, através de telecópia e carta, a entidade demandada enviou à autora um ofício, a remeter uma minuta de acordo, onde consta, designadamente, o seguinte:

“(…)
Considerando a eventualidade de a Va empresa não aceitar outorgar o acordo identificado no parágrafo anterior e por forma a obviar a maiores atrasos, considerem, desde o termo do prazo para se pronunciarem sobre a celebração daquele acordo, sem que haja aceitação, resolvido o contrato de empreitada, a título sancionatório com fundamento no incumprimento definitivo do contrato, nos termos constantes do art°s 333.°, n.°1, al. a), 405.°, n°1, al. f) e 404, n°3, todos do CCP;
Mais considerem, notificados da aplicação das multas contratuais no valor de 133.625.44€ (cento e trinta e três mil, seiscentos e vinte cinco euros e quarenta e quatro cêntimos), conforme anexo 2 ao presente ofício e que do mesmo faz parte integrante, e para efectuar o respectivo pagamento, no prazo de 10 dias úteis, sob a cominação do pagamento ser efectuado por compensação com os créditos da V.ª empresa, e accionamento das garantias prestadas para assegurar o exacto e pontual cumprimento do contrato, como previsto no art.° 296.° do CCP. [documento de fls. 269 a 277 dos autos].

u) Em 07/10/2013, a entidade demandada solicitou à autora a entrega de um plano de trabalhos modificado para recuperação dos atrasos [documento de fls. 278 e 279 dos autos].

v) No dia 14/10/2013, a autora apresentou um plano de trabalhos modificado [documentos de fls. 280 a 298 dos autos].

w) Em resposta ao plano apresentado pela autora, em 18/10/2013, a entidade demandada informou que não o aprovava e remeteu um plano modificado, no qual foi fixada como data da conclusão dos trabalhos o final da oitava semana de 2014 [documento de fls. 26 a 31 dos autos].

x) No ofício a remeter o plano de trabalhos modificado, consta que caso se verifiquem novos desvios, será promovida a resolução do contrato [documento de fls. 26 dos autos].

y) Em 25/10/2013, a autora remeteu uma carta à entidade demandada, onde, além do mais, refere que o prazo limite para o termo da obra é o dia 07/07/2014, uma vez que a aprovação do plano de segurança e saúde tinha ocorrido no dia 07/07/2013, pelo que o prazo para a execução só se inicia a partir deste dia [documento de fls. 305 a 307 dos autos].

z) A obra foi objecto de candidatura e financiamento do QREN, com prazo de conclusão a 31/12/2013 [documento de fls. 309 a 319 dos autos].

aa) Em data não concretamente apurada, a Direcção da entidade demandada deliberou tomar posse administrativa da obra, resolver o contrato de empreitada e aplicar multas contratuais à autora no valor de €87.174.69 [documento de fls. 34 a 36 dos autos].

bb) O cálculo das multas contratuais foi efectuado da seguinte forma: 

[documento de fls. 36 dos autos].

cc) Através de ofício datado de 31/10/2013, a autora foi notificada da deliberação referida em aa) [documento de fls. 34 e 35 dos autos].

d) No ofício referido em cc), consta, além do mais, o seguinte: 

“(…)

(...).” [documento de fls. 34 e 35 dos autos].

ee) A autora prestou caução destinada a garantir as suas obrigações contratuais, no valor de €63.631.16, mediante garantia bancária à primeira solicitação [documento de fls. 368 a 370 do processo administrativo apenso, pasta “Concurso Público. Contrato. Consignação. Facturação. Pagamentos”].»

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A decisão recorrida consignou ainda, relativamente à factualidade considerada não provada, o seguinte: “Não resultaram provados outros factos com relevância para a decisão da causa, designadamente, os seguintes:

a) O Plano de Segurança e Saúde esteve disponível no estaleiro desde o dia 09/01/2013.

b) Apenas em 07/07/2013, o dono da obra procedeu à aprovação do Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde.

c)Autora e entidade demandada vincularam-se, através da apresentação e aprovação de vários planos de trabalhos, ao prazo de início da obra em 27/12/2012, prescindindo que o início ocorresse apenas com a aprovação do Plano de Segurança e Saúde e o termo com o decurso de 365 dias de calendário.

d) Na sequência do ofício referido em t), a autora pronunciou-se sobre a aplicação das multas contratuais.»


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Considerou-se ainda na decisão recorrida o seguinte, quanto à motivação da decisão de facto:

«A decisão da matéria de facto assentou no acordo das partes, na análise dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo apenso e na prova testemunhal produzida, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

Quanto à matéria da alínea e) dos factos provados, o Tribunal formou a sua convicção com base na análise do documento de fls. 56 a 89 dos autos, onde consta que uma das peças escritas do projecto é o Plano de Segurança e Saúde, sendo que resultou do depoimento das testemunhas que, após a consignação da obra, apenas foi aprovado o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde, uma vez que o Plano já constava do projecto submetido a concurso.

Assim, a testemunha José Luís Amaro disse que o Plano de Segurança e Saúde “faz parte dos projectos iniciais”, sendo obrigação da empresa desenvolver o mesmo.

Relativamente à matéria da alínea n) dos factos provados, foi determinante o teor do documento de fls. 25 dos autos, onde consta a assinatura do coordenador de segurança, Frederico …………….., e está aposta a data de 07/01/2013.

Acresce que o coordenador de segurança da obra foi ouvido como testemunha e confirmou que assinou o referido documento na data nele aposta.

O Tribunal formou a sua convicção relativamente à matéria da alínea o) dos factos provados com base no depoimento das testemunhas Maria ………………., José L……………….., bem como no depoimento de parte de Domingos ……………….., Presidente da Direcção da entidade demandada.

As referidas testemunhas afirmaram estar presentes quando o professor Domingos ………………….. assinou a aprovação do Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde e que tal aprovação teve lugar, no dia 07/01/2013, nas instalações da entidade demandada, em virtude do estaleiro da obra ainda não estar pronto.

Por sua vez, Domingos ………………. disse que assinou a aprovação no mesmo dia que o coordenador de segurança e na presença de outras pessoas, constituindo a data que consta do documento de fls. 25 - 07/07/2013 - “um erro de simpatia”, tendo, também, referido, quando confrontado com aquele documento, que “isto que aqui está não pode ser” e que “é impossível ser aqui” [em Julho de 2013].

O depoimento de parte e o depoimento das referidas testemunhas não resultou infirmado pelo depoimento da testemunha Pedro ………………….., o qual confirmou ser o autor do documento de fls. 24 dos autos.

O documento de fls. 24 é um email enviado pela testemunha Pedro ………………. para o coordenador da fiscalização da obra, onde consta, além do mais, o seguinte: “Não obstante da consignação já ter sido assinado á três semanas, lembramos que é condição fundamental para início de quaisquer trabalhos, a assinatura do PSS e a instalação do Estaleiro que garanta as condições de segurança e de saúde no trabalho mínimas regulamentares.

Assim sendo iremos tomar as diligências necessárias para garantir as prescrições mínimas de carácter técnico do estaleiro e seguidamente iniciar os trabalhos".

Ora, o teor do citado email sugere que o Plano de Segurança e Saúde ainda não se encontrava assinado na data em que aquele foi enviado, 15/01/2013, sendo certo que a testemunha Pedro …………….., autor do email, afirmou ter confirmado com a técnica de segurança se o PSS estava ou não aprovado e que não teria enviado o email sem tal confirmação.

Contudo, importa distinguir entre a assinatura da aprovação do Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde pelo dono da obra da comunicação ao empreiteiro de que tal aprovação teve lugar, ou seja, é de admitir que embora o referido plano tenha sido aprovado em 07/01/2013, tal aprovação não tenha sido imediatamente comunicada ao empreiteiro.

Em suma, o plano em causa pode ter sido aprovado, em 07/01/2013, sem que disso tenha sido dado conhecimento ao empreiteiro, o que explica o teor do email supra citado.

Refira-se, ainda, que o facto de não existir acta de uma reunião realizada no dia 07/01/2013, data da aprovação do Desenvolvimento Plano de Segurança e Saúde, não significa que aquela não teve lugar e, por maioria de razão, que o plano não foi assinado naquela data.

Pelo exposto, não obstante no documento de fls. 25 constar a data de 07/07/2013 como sendo a data da aprovação pelo dono da obra, formou-se a convicção de que tal data não se encontra correcta, tendo sido determinante, para este efeito, o facto de as testemunhas, cujo depoimento se mostrou credível, terem presenciado a assinatura do documento, quer pelo coordenador de segurança, quer pelo professor Domingos …………….., no dia 07/01/2013.

Tendo presente o alegado pela autora em sede de alegações escritas, cumpre referir que, nos termos do artigo 376º, n.°1, do Código Civil, “o documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor”, o que significa que a força probatória plena se limita à materialidade da declaração, isto é, à existência das declarações contidas no documento, não abrangendo a exactidão das mesmas, pelo que se mostra admissível a prova de que tais declarações não correspondem à verdade.

Como pode ler-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07/04/2005, proferido no Processo n.º 05B3318, “(...) apesar de demonstrada a autoria de um documento, daí não resulta necessariamente que os factos compreendidos nas declarações dele constantes se hajam de considerar provados, que o mesmo é dizer que daí não advém que os documentos provem plenamente os factos neles referidos.
É que “a força ou eficácia probatória plena atribuída pelo n°1 do art. 376° do C.Civil às declarações documentadas limita-se à materialidade, isto é, à existência dessas declarações, não abrangendo a exactidão das mesmas” (6).
Na verdade, mesmo que um documento particular goze de força probatória plena, tal valor reporta-se tão só às declarações documentadas, ficando por demonstrar que tais declarações correspondiam à realidade dos respectivos factos materiais. (7)
E, sobretudo, não se exclui a possibilidade de o seu autor demonstrar a inveracidade daqueles factos por qualquer meio de prova, uma vez que “embora um documento prove as declarações das partes, deve poder provar-se que elas não correspondem à verdade” (8)

Acresce que a data aposta num documento particular como sendo a data da sua assinatura não constitui um facto contrário ao interesse do declarante, pelo que o documento de fls. 25 não faz prova plena de que o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde foi aprovado no dia 07/07/2013, ou seja, não é aqui aplicável a norma do n°2 do artigo 376.° do Código Civil, que estabelece que “os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante”.

Com efeito, o âmbito de aplicação da norma citada está delimitado às declarações que constituam confissão, isto é, que traduzam o reconhecimento pela parte da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária [artigo 352.° do Código Civil]. Ora, a aposição de uma determinada data num documento particular como sendo a data da sua assinatura não consubstancia o reconhecimento da realidade de um facto desfavorável ao declarante, pelo que, reitere-se, tal facto não pode ser considerado provado ao abrigo do disposto no artigo 376.°, n°2, do Código Civil.

Pelo exposto, considerámos não provado que o Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde apenas foi aprovado pelo dono da obra em 07/07/2013 [alínea b) dos factos não provados], tendo, com a fundamentação supra exposta, considerado provado que tal aprovação teve lugar no dia 07/01/2013.

Não se formou a convicção de que o Plano de Segurança e Saúde esteve disponível no estaleiro desde o dia 09/01/2013 [alínea a) dos factos não provados], uma vez que resulta da acta de reunião de fls. 119 a 121 que, naquela data, estava a ter início a montagem do estaleiro.

Não estando o estaleiro montado no dia 09/01/2013, não era possível que o Plano de Segurança e Saúde estivesse disponível no mesmo, sendo certo que embora as testemunhas tenham referido que aquele Plano estava disponível no estaleiro, nenhuma delas logrou concretizar em que data o mesmo foi lá colocado.

Não se formou, também, a convicção de que a autora e a entidade demandada se vincularam, através da apresentação e aprovação de vários planos de trabalho, ao prazo de início da obra em 27/12/2012, prescindindo que o início ocorresse apenas com a aprovação do Plano de Segurança e Saúde e o termo com o decurso de 365 dias de calendário [alínea c) dos factos provados].

Com efeito, embora no plano de trabalhos modificado apresentado pela autora, em 08/10/2013, conste que o início da obra, com a montagem do estaleiro, tem início em 27/12/2012 e que o final do prazo contratual termina em 26/12/2013 [cfr. documento de fls. 189 a 193 do processo administrativo apenso, pasta “Livro de obra + Actas de reunião + Correspondência”], tal é insuficiente para concluirmos que a autora prescindiu, designadamente, para efeitos de aplicação de multas contratuais, que o início do prazo contratual fosse contabilizado a partir da comunicação da aprovação do Plano de Segurança e Saúde.

Por fim, não se formou a convicção de que a autora se pronunciou sobre a aplicação das multas contratuais, uma vez que não consta dos autos, nem do processo administrativo apenso qualquer pronúncia da autora sobre aquelas.

Resta referir que os factos relativos aos atrasos na execução da obra e aos sucessivos planos de trabalhos apresentados pela autora, alegados nos artigos 32.° a 49.°, não são relevantes para a decisão da causa, razão pela qual não constam da matéria de facto.»


*

a) da nulidade da sentença

A recorrente veio apontar à sentença recorrida a nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, por ter omitido pronúncia quanto à data em que deve ser considerada comunicada a aprovação do DPSS à autora e sobre a questão de a aprovação do DPSS depender da aprovação dos desenvolvimentos ao referido DPSS, devendo ter concluído que a aprovação do DPSS foi comunicada na data da assinatura daquele documento, a 7 de janeiro de 2013.

Nos termos da disposição do artigo 615.º, n.º 1, alínea, d), do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, sendo que, determina o n.º 2, do artigo 608.º, do CPC, que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Sobre esta causa de nulidade das decisões judiciais têm-se pronunciado os tribunais superiores, convocando-se, pela pertinência e relevância para a decisão de que nos ocupamos, o vertido no ponto II do sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11.02.2021 (P.º 487/20), no qual se referiu que:

« II – Na apreciação da nulidade por omissão de pronúncia, prevista no art. 615.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Civil, importa não confundir questões colocadas ao tribunal para decidir e fundamentos ou argumentação, sendo que o tribunal apenas se encontra vinculado às questões invocadas pelas partes, já não aos fundamentos/argumentações invocados

Compulsados os autos, verifica-se que o tribunal a quo referiu, a este propósito, nada ter sido alegado quanto à data em que a aprovação do plano de trabalhos foi comunicada à autora (cfr. p. 17 da sentença), sendo que, já a propósito da fundamentação sobre a decisão proferida sobre a matéria de facto, referira que «…importa distinguir entre a assinatura da aprovação do Desenvolvimento do Plano de Segurança e Saúde pelo dono da obra da comunicação ao empreiteiro de que tal aprovação teve lugar, ou seja, é de admitir que embora o referido plano tenha sido aprovado em 07/01/2013, tal aprovação não tenha sido imediatamente comunicada ao empreiteiro.».

Acresce que, compulsados os articulados, petição inicial e contestação, constata-se que pela autora foi alegado que a aprovação e comunicação do plano de trabalhos ocorreu a 7 de julho de 2013 (tendo o tribunal a quo considerado não provado que a aprovação tenha ocorrido nessa data – cfr. alínea b) dos factos não provados), sendo que a entidade demandada referiu, a propósito, que o PSS foi assinado e aprovado a 7 de janeiro de 2013, e não a 7 de julho, não tendo apresentado qualquer alegação a respeito da data em que essa aprovação foi comunicada. Referiu, no artigo 25.º da contestação, que o PSS esteve disponível e devidamente assinado, no estaleiro, desde o primeiro dia de obra, a 9 de janeiro de 2013, tendo o tribunal a quo considerado, também, esse facto não provado (cfr. alínea a) dos factos não provados), referindo, na fundamentação dessa decisão, que «Não estando o estaleiro montado no dia 9/01/2013 não era possível que o Plano de Segurança e Saúde estivesse disponível no mesmo, sendo certo que embora as testemunhas tenham referido que aquele plano estava disponível no estaleiro, nenhuma delas logrou concretizar em que data o mesmo foi lá colocado.».

Do exposto resulta que o tribunal a quo não omitiu pronúncia quanto à questão da comunicação da aprovação do Plano de Saúde e Segurança e seus desenvolvimentos tendo, antes, procedido ao conhecimento dessa questão, tanto no âmbito do julgamento da matéria de facto como na de direito, não tendo incorrido na nulidade que a recorrente lhe aponta.

b) do erro de julgamento de facto

A recorrente insurge-se quanto à decisão proferida sobre a matéria de facto por nesta se ter dado como não provado que a autora e o réu tenham prescindido, através da apresentação e aprovação de vários planos de trabalhos, que o início da execução da obra ocorresse apenas com a aprovação do Plano de Segurança e Saúde e, ainda, por não ter considerado, no elenco dos factos provados, que a comunicação da aprovação do DPSS ocorreu na data da sua aprovação e assinatura, ou seja, a 7 de janeiro de 2013.

Vejamos.

A modificabilidade da decisão proferida sobre a matéria de facto, pelo tribunal de apelação, apenas pode ter lugar no âmbito do quadro normativo estabelecido pelo artigo 662.º, do CPC, e desde que a alteração propugnada assuma relevância para a decisão da causa.

Como se referiu no Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 09.02.2021 (P.26069/18), «(…) 3.A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem considerado que nada impede o Tribunal da Relação de apreciar se a factualidade indicada pelos recorrentes é ou não relevante para a decisão da causa, podendo, no caso de concluir pela sua irrelevância, deixar de apreciar, nessa parte, a impugnação da matéria de facto por se tratar de ato inútil. Assim, “Não viola o dever de reapreciação da matéria de facto a decisão do Tribunal da Relação que não conheceu a matéria fáctica que o Apelante pretendia que fosse aditada ao factualismo provado (factos complementares e concretizadores de factos essenciais) tendo subjacente a sua irrelevância para o conhecimento do mérito da causa (por a mesma, por si só, na ausência de demonstração de factualidade essencial para o efeito, não poder alterar o sentido da decisão, ou seja, afastar a qualificação da insolvência como culposa)”[14]. Na verdade, “se os factos cujo julgamento é impugnado não forem susceptíveis de influenciar decisivamente a decisão da causa, segundo as diferentes soluções plausíveis de direito que a mesma comporte, é inútil e contrário aos princípios da economia e da celeridade a reponderação pela Relação da decisão proferida pela 1.ª instância”[15].(…)».

No mesmo sentido se pronunciou o Tribunal da Relação de Guimarães, podendo ler-se no sumário do Acórdão de 2.11.2017 (P. 501/12.8TBCBC.G1), designadamente o seguinte: «II. Por força dos princípios da utilidade, da economia e da celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto quando o(s) facto(s) concreto(s) objecto da impugnação for(em) insusceptível(eis) de, face às circunstância próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter(em) relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil (arts. 2º, n.º 1 e 130º, ambos do C.P.C.).».

Compulsada a decisão proferida, quanto ao facto considerado não provado na alínea c) do probatório negativo – Autora e entidade demandada vincularam-se, através da apresentação e aprovação de vários planos de trabalhos, ao prazo de início da obra em 27/12/2012, prescindindo que o mesmo ocorresse apenas com a aprovação do plano de segurança e saúde e o termo com o decurso de 365 dias de calendário – e a fundamentação aduzida na sentença quanto a este ponto da decisão proferida sobre a matéria de facto - Não se formou, também, a convicção de que a autora e a entidade demandada se vincularam, através da apresentação e aprovação de vários planos de trabalho, ao prazo de início da obra em 27/12/2012, prescindindo que o início ocorresse apenas com a aprovação do Plano de Segurança e Saúde e o termo com o decurso de 365 dias de calendário [alínea c) dos factos provados]. Com efeito, embora no plano de trabalhos modificado apresentado pela autora, em 08/10/2013, conste que o início da obra, com a montagem do estaleiro, tem início em 27/12/2012 e que o final do prazo contratual termina em 26/12/2013 [cfr. documento de fls. 189 a 193 do processo administrativo apenso, pasta “Livro de obra + Actas de reunião + Correspondência”], tal é insuficiente para concluirmos que a autora prescindiu, designadamente, para efeitos de aplicação de multas contratuais, que o início do prazo contratual fosse contabilizado a partir da comunicação da aprovação do Plano de Segurança e Saúde – é forçoso concluir pela improcedência da alegação da recorrente, nesta parte, pois que o juízo levado a efeito pelo tribunal a quo não merece a censura que lhe vem dirigida, designadamente quanto o juízo que fez da prova documental junta, que considerou insuficiente para concluir no sentido preconizado. Na verdade, os prazos indicados, pela autora, nos planos de trabalhos apresentados, não permitem extrair a conclusão avançada pela recorrente, segundo a qual a indicação, nesses planos, da data do início da execução dos mesmos a 27.12.2012 equivale a uma declaração de vontade no sentido de prescindir da disciplina aplicável em matéria de contagem do prazo de execução para o efeito de fiscalização e sancionamento do incumprimento do contrato.

Igualmente improcedente é a alegação a respeito da prova de que a aprovação do DPSS foi comunicada à autora a 7 de janeiro de 2013, data em que esse DPSS foi aprovado e assinado. Na verdade, remetendo para o que a propósito se referiu acima, não é verdade que esse facto tenha sido alegado pela autora e aceite pela entidade demandada. Como referido, o que autora alegou, a esse propósito, foi que o PSS foi aprovado e comunicado à autora a 7 de julho de 2013, facto que a entidade demandada contestou com a alegação de que essa aprovação ocorrera a 7 de janeiro do mesmo ano e que pelo menos a 9 de janeiro era já do conhecimento da autora.

Improcede, assim, na totalidade, a alegação respeitante ao erro de julgamento de facto.

c) do erro de julgamento de direito

Compulsado discurso fundamentador do julgamento de direito levado a cabo pelo tribunal a quo verifica-se que aquele tribunal concluiu pela anulação do ato impugnado por considerar que o termo inicial da contagem do prazo de execução da obra não ocorreu com a consignação, como considerado pela demandada, mas com a comunicação da aprovação do Plano de Segurança e Saúde, cuja data não ficou provada. Considerou, ainda, procedente a outra causa de invalidade que a autora lhe apontara, qual seja a da preterição da audiência dos interessados.

A recorrente não questionou o juízo levado a efeito quanto ao termo inicial da contagem do prazo de execução dos trabalhos; questionou, a este respeito, o julgamento de facto, ao não ter considerado provado que a comunicação da aprovação do DPSS ocorreu a 7 de janeiro de 2013, julgamento que, como visto, não mereceu a censura que a recorrente lhe dirigiu.

Mas a recorrente insurge-se, também, quanto à parte do julgado que considerou ter sido violado o direito de audiência prévia do cocontratante quanto à decisão que determinou a aplicação da sanção contratual.

A recorrente sustenta a alegação respetiva na circunstância de se mostrarem verificados os pressupostos, previstos no artigo 308.º, n.º 3, do CCP, que permitem que essa formalidade seja dispensada, ao que acrescentou ser desnecessário para essa dispensa a prática de ato expresso nesse sentido. Referiu, ainda, que a sentença incorreu em erro de julgamento ao ter considerado não provado que a autora tenha sido notificada para se pronunciar sobre a aplicação da multa contratual uma vez que esta foi notificada com a antecedência de 10 dias relativamente à data em que devia considerar-se aplicada.

Referiu-se, na sentença recorrida, a este respeito, designadamente o seguinte:

«(…)

Nos termos do artigo 308.° do CCP, “1. A formação dos actos administrativos emitidos no exercício dos poderes do contraente público não está sujeita ao regime da marcha do procedimento estabelecido pelo Código do Procedimento Administrativo. 2. Exceptuam-se do disposto no número anterior a aplicação de sanções contratuais através de acto administrativo, a qual está sujeita a audiência prévia do co-contratante, nos termos previstos no Código de Procedimento Administrativo. 3. O contraente público pode, todavia, dispensar a audiência prévia referida no número anterior se a sanção a aplicar tiver natureza pecuniária e se encontrar caucionada por garantia bancária à primeira solicitação ou por instrumento equivalente, desde que haja fundado receio de a execução da mesma se frustrar por virtude daquela audiência”.

Atento o disposto na norma citada, e tendo presente o disposto nos artigos 100.° a 103.° do CPA, aprovado pelo Decreto-lei n.°442/91, de 15 de Novembro, alterado pelo Decreto-lei n.°6/96, de 31 de Janeiro, em vigor à data em foi praticado o acto impugnado, conclui-se que antes da aplicação de qualquer sanção contratual, impende sobre o contraente público, salvo se dispensar a audiência nos termos previstos no n.°3, o dever de notificar o co-contratante sobre a intenção de aplicação da sanção, devendo fornecer todos os elementos necessários para que o co- contratante fique a conhecer todos os aspectos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito.

Tendo presente o alegado pela entidade demandada, cumpre referir que o facto de ser uma associação privada sem fins lucrativos não a dispensava de proceder à audiência prévia, uma vez que a realização desta, no quadro dos procedimentos concursais, é imposta pelo CCP e não pelo CPA, sendo certo que, como não é controvertido, o primeiro código referido é aplicável ao contrato em causa nos autos.

Por outro lado, não só inexiste qualquer acto que tenha dispensado a realização da audiência prévia, ao abrigo do disposto no artigo 308.°, n.°3, do CCP, como, atenta a factualidade provada, não podemos concluir que se verificavam os respectivos pressupostos, na medida em que a entidade demandada não demonstra que existisse um fundado receio de a execução da garantia bancária se frustrar devido à realização da audiência.

Com efeito, a invocada situação económica difícil da autora e a possibilidade da mesma intentar um processo cautelar destinado a impedir a execução da garantia bancária é insuficiente para concluirmos pela existência de um fundado receio de a execução da garantia se frustrar.

Importa ter presente que a entidade demandada recorreu à compensação para o pagamento da multa contratual, o que significa que era devedora de determinadas quantias à autora, pelo que não teria, como não teve, que accionar a garantia para satisfazer o seu crédito, o que significa que a questão da garantia bancária se frustrar devido à realização da audiência prévia não se colocava.

Pelo exposto, concluímos que, nos termos do artigo 308.°, n.°2, do CCP, impendia sobre a entidade demandada o dever de realizar a audiência prévia antes de proceder à aplicação de multas contratuais à autora.

Da factualidade provada não resulta que a entidade demandada tenha notificado a autora para se pronunciar, em sede de audiência prévia, sobre a intenção de aplicação da sanção contratual em causa nos presentes autos, sendo certo que o ofício enviado à autora em 27/09/2013 procede à sua notificação da aplicação de multas contratuais no valor de €133.625.44, ou seja, um valor superior às multas em causa nos autos, e não lhe concede qualquer prazo se pronunciar sobre aquelas, mas apenas sobre o acordo proposto no mesmo ofício.

Não resultou provado nos autos que a autora se pronunciou sobre a aplicação de multas contratuais na sequência da notificação que lhe foi efectuada através do ofício enviado em 27/09/2013 [alínea d) dos factos não provados].

Assim, não resultando da factualidade provada que a entidade demandada comunicou à autora a intenção de lhe aplicar as multas contratuais em causa nos autos, concluímos que o acto impugnado padece de vício de forma, por ter sido preterida a formalidade essencial de audiência dos interessados, pelo que deve ser anulado também com este fundamento. (…)».

O julgamento enunciado é de acompanhar integralmente e não merece qualquer censura.

É incontroverso que a aplicação de sanções por incumprimento do contrato reveste a natureza de atos administrativos, nos termos do que se dispõe no artigo 307.º, n.º 2, alínea c), do CCP e que deve ser antecedida de audiência prévia do cocontratante, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 308.º, a qual pode ser dispensada, nos casos previstos no n.º 3.

A recorrente alega que se verificavam os pressupostos aí previstos, para a dispensa da audiência prévia, a qual não tinha que ser objeto de decisão prévia e expressa nesse sentido. Mas não lhe assiste razão.

Na verdade, a matéria dos autos não é reveladora da verificação dos pressupostos previstos no n.º 3 do artigo 308.º do CCP, que consente a dispensa daquela formalidade nos casos em que a sanção a aplicar tiver natureza pecuniária e se encontrar caucionada por garantia bancária à primeira solicitação ou por instrumento equivalente, desde que haja fundado receio de a execução da mesma se frustrar por virtude daquela audiência (o sublinhado é nosso).

Com efeito, como concluiu o tribunal recorrido, não só não ficaram provados factos que permitam concluir pela existência de fundado receio de a execução da garantia se frustrar por virtude daquela audiência, como ficou provado que o pagamento da multa aplicada se efetivaria através da compensação com créditos, detidos pela entidade demandada sobre a autora, e não do acionamento da garantia bancária.

Não se mostrando verificados os pressupostos previstos no artigo 308.º, n.º 3, do CCP, para a dispensa da audiência dos interessados, fica prejudicado o conhecimento da questão de saber se a referida dispensa dependia ou não da prática de um ato expresso nesse sentido.

Quanto à alegação de que a autora foi notificada para os efeitos previstos no artigo 308.º, n.º 2, do CCP, através do ofício mencionado em t) do probatório assente, não assiste razão à recorrente, pois que como bem se referiu na sentença recorrida, através daquele ofício a autora foi notificada para se pronunciar sobre o teor de uma minuta de acordo a celebrar entre a entidade demandada e a autora com vista à conclusão da obra, determinando-se, no mesmo ofício, que no termo do prazo para aquela pronúncia sem aceitação por parte da autora, considerar-se-ia resolvido o contrato e notificada a autora da aplicação de multas contratuais no montante de € 133 625,44, com prazo para pagamento voluntário de 10 dias, sob cominação de o pagamento ser efetuado por compensação de créditos ou acionamento da garantia bancária prestada. Ora, é cristalino que a notificação em causa não facultou à autora o exercício da audiência prévia quanto à aplicação daquela sanção contratual ou da que constitui o objeto dos presentes autos, pois que naquela notificação não se concede à autora qualquer faculdade de pronúncia sobre a decisão ali tomada, sob condição de não ser aceite o acordo proposto, ao que acresce que está em causa um montante diverso daquele que está em litígio nos presentes autos.

Deve, assim, ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida.

As custas serão suportadas pela recorrente, em razão do decaimento, que foi total, nos termos do disposto no artigo 527.º, do CPC).

Decisão

Por tudo o que vem de ser expendido, acordam em conferência os juízes que compõem a presente formação da subsecção de Contratos Públicos da secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 6 de novembro de 2025


Ana Carla Teles Duarte Palma (relatora)

Helena Telo Afonso

Jorge Martins Pelicano