Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 1013/11.2BESNT.CS1 |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 11/06/2025 |
| Relator: | HELENA TELO AFONSO |
| Descritores: | NULIDADE DA SENTENÇA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO AUDIÊNCIA PRÉVIA CADUCIDADE DA ADJUDICAÇÃO - PERDA DA CAUÇÃO PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA PROPORCIONALIDADE |
| Sumário: | I – A decisão de caducidade da adjudicação com fundamento na não outorga do contrato deve ser precedida de audiência prévia do adjudicatário, em conformidade com o previsto no artigo 100.º do CPA`91, pois importa apurar se esse facto é imputável ao adjudicatário. II – A declaração da caducidade da adjudicação, por facto que seja imputável ao adjudicatário, tem como consequência a perda da caução prestada a favor da entidade adjudicante, e a adjudicação da proposta ordenada em lugar subsequente – cfr. artigo 105.º, n.º 2, do CCP. III – Resultando da factualidade provada que toda a atuação da entidade adjudicante foi no sentido de adjudicar a proposta da autora, ora recorrida e de celebrar com esta o contrato referente ao lote 3, em conformidade com a vinculação manifestada pela mesma no procedimento pré-contratual não se verifica a violação do princípio da boa fé, na denominada vertente da tutela da confiança – cfr. artigo 6.º-A do CPA`91. IV – Tendo a entidade adjudicante decidido declarar a caducidade da adjudicação, com os fundamentos analisados – sem que a autora tenha reagido contra este ato, seja mediante impugnação administrativa, seja judicial – não há lugar à aplicação do princípio da proporcionalidade para efeitos de redução da caução, por estarmos no domínio de uma atividade vinculada. |
| Votação: | Unanimidade |
| Indicações Eventuais: | Subsecção de Contratos Públicos |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam na Subseção de Contratos Públicos, da 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório: S… SEGURANÇA, S.A., instaurou a presente ação administrativa comum, sob a forma de processo ordinário, contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, pedindo a declaração de nulidade ou, caso assim se não entenda, a anulação do ato do Diretor Geral dos Impostos, que considerou perdida a favor do Estado/Direcção Geral dos Impostos a caução prestada através da garantia bancária n.º 364070 do B…, no valor de € 104 844,36 e determinou o acionamento dos mecanismos necessários para que tal valor revertesse para o Estado. Por sentença proferida a 20 de outubro de 2016 foi julgada procedente a ação e anulado o ato impugnado. Vencido na ação, o Réu Ministério das Finanças interpôs recurso da referida sentença, apresentando alegação, tendo formulado as seguintes conclusões: “I. A ED requer a reapreciação da sentença com fundamento em nulidade da sentença por oposição dos fundamentos de facto com a decisão, por errónea fixação da matéria de facto, e não especificação dos fundamentos de direito que especificam a decisão e com fundamento em erro de julgamento por violação de lei. II. O segmento decisório que julga violado o direito de participação mostra-se em clara oposição com a factualidade dada por provada em 14., 15., 16., 17. e 18. da sentença sob recurso. III. Dali resulta que a autora foi notificada da proposta de decisão em 21/01/2011 - o Despacho do Senhor Director Geral que aprova o 2.º Relatório Final (junto ao PA). Relatório que, ao abrigo do n.º 1 do art. 105° do CCP, determina a caducidade da adjudicação E, IV. Que, em 28/01/2011, vem, efectivamente, a exercer o direito de audição. Com efeito, o 2.º Relatório Final, aprovado em 21/01/2011, e notificado à autora na mesma data, contém o sentido da decisão e a respectiva fundamentação. V. Que foi inteiramente entendida pela autora, conforme bem se deduz do teor do exercício do direito de audição (pronuncia de 28/01/2011). VI. A sentença não pode ignorar que à A. foi atribuída a faculdade de se pronunciar, que a A. se pronunciou efectivamente e que esse exercício do direito de participação foi devidamente avaliado pelo autor do acto aqui em causa, como decorre do despacho de 01/07/2011, ora sindicado: “(...) Em 28/1/2011 a S… vem reagir a esta intenção (...) § Analisados os argumentos expostos pela S…, os mesmos não merecem provimento (...) § Face ao exposto e considerando que a falta não justificada do adjudicatário à outorga do contrato implica a perda da caução prestada (...) proponho que seja notificada a empresa (...) nos termos do ofício anexo.” - sublinhado nosso. VII. Mais, a jurisprudência da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal de Justiça tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do acto a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se degradam em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las. VIII. Confira-se o ac. do STA de 06/12/2006, no rec. n° 0496/06, que fixa, sobre a notificação para a audiência prévia, “porque a mesma constituiu uma formalidade essencial a violação da referida norma procedimental ou a sua incorrecta realização tem como consequência normal a ilegalidade do próprio acto final e a sua consequente anulabilidade. § III- Todavia, nem sempre assim acontece pois (...) a mesma pode degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que daí resulte ilegalidade determinante da anulação do acto.” - sublinhado nosso. IX. A matéria de facto mostra-se erroneamente fixada. Como resulta do PA, X. Em 05/01/2011, a autora é notificada da minuta do contrato, sendo-lhe concedido o prazo de 5 dias para sobre a mesma se pronunciar. XI. Em 07/01/2011, e em resposta, a autora aceita a minuta do contrato e indica os Administradores que, em representação da requerente, outorgarão no mesmo. Na mesma data, mas em mensagem posterior, a autora solicita que não seja considerada a mensagem. Ainda na mesma data, a autora envia mensagem requerendo que seja considerada “(...) sem efeito e revogada a comunicação de aceitação de minuta.”. XII. A autora não substitui a primeira mensagem de 07/01/2011, em que procede à aceitação da minuta, por nenhuma outra. E, nada mais oferece no procedimento. A ora autora nada diz, remetendo-se ao absoluto silêncio. XIII. A mensagem de notificação para outorga do contrato foi remetida em 13/01/2011 e lida pela autora a 14/01/2011. XIV. A autora não comparece na data e horas para que foi notificada. E abstém-se de qualquer contacto com a entidade adjudicante. XV. Todos os factos que vêm de se alegar mostram-se provados no PA, foram invocados exaustivamente na contestação e levados a conclusões nas alegações finais, deduzidas pela ED. Nenhum documentos dos autos os contraria, nem foi produzida qualquer outra prova que os abale, de resto a prova testemunhal oferecida pela A. e pela ED, e que estas não dispensaram, não foi mandada produzir pelo tribunal. XVI. Pelo que, provados que estão aqueles factos devem os mesmos ser levados ao probatório. Precisamente porque, o tribunal a quo, para decidir, ancorou-se na resposta negativa que deu à questão que colocou “Pode imputar-se à Autora a sua não comparência na assinatura do contrato?” - Resposta que não resulta da prova produzida nos autos. XVII. A verdade é que, em 03 de Dezembro de 2010 a ora autora, pronunciando-se em sede de audiência prévia (ref. 187868 junta ao PA), revela: “(...) por erro de digitação, a aposição do valor hora, no Lote 3, foi efectuado por um valor (€7,32) (...) que determinou a apresentação de um preço global para a prestação do serviço inferior ao pretendido.” - negrito nosso. XVIII. Mais, a 23 de Dezembro de 2010, a ora autora conforma-se com a decisão do 2° Relatório preliminar de manter a proposta com o valor apresentado. XIX. Querendo mesmo, quanto ao lote 2, manter a proposta com um preço mais baixo (e insurgindo-se, apenas, quanto à proposta de decisão referente a este lote 2). XX. Notificada do Despacho final (a 29/12/2010 vide supra 16.º), e podendo ainda, tal como lhe foi notificado, deduzir impugnação, opta por apresentar a garantia bancária, o que faz a 03/01/2011. XXI. Ora, o alegado erro já era conhecido da autora desde 03/12/2010 (há um mês)! XXII. Ademais, se em razão daquele erro, a autora teria, segundo alega em 139° da PI, “um fundamento legitimo para a sua intenção de não proceder à assinatura do contrato.” - negrito nosso -, o certo é que, esse erro, não deixa de lhe ser imputável. Assim como não deixa de lhe ser imputável a sua não comparência. XXIII. No documento 12 junto à PI, é solicitado à autora que, através da plataforma ANCP/V…, informe se vem ou não assinar o contrato. XXIV. E é notificada da data e hora para o fazer. De que resulta, evidente, nada haver sido acordado. XXV. Posto que vai requerido o aditamento à factualidade provada. XXVI. A decisão é omissa quanto aos fundamentos de direito em que assenta. XXVII. Com efeito, no discurso de fls. 24 não se vê em que disposições legais sustenta o tribunal a quo a sua decisão. O que, para além de constituir nulidade de sentença, resultou em erro de julgamento. XXVIII. A caução exigida ao adjudicatário, prestada pela ora requerente, e objecto dos presentes autos, destina-se a “(...) garantir a sua celebração (...)” - a celebração do contrato - n° 1 do art. 88° do CCP, negrito nosso. XXIX. Ao invés do regime anterior, do RJEOP (n° 1 do art. 112°), a caução prevista no art. 88° do CCP, não se limita ao cumprimento do contrato, “(...) é também destinada a garantir a própria celebração do contrato, assim se regressando à função da antiga caução provisória (...)” - Jorge Andrade da Silva, in “Código dos Contratos Públicos Comentado e Anotado’’, Almedina, 3.ª ed. 2010. XXX. Ora, ao contrário do pretendido pela requerente, mas como bem demonstrado ficou, à adjudicatária é inteiramente imputável a não comparência, no dia e hora fixados, para a assinatura do contrato. XXXI. Se violação houve dos princípios da boa fé e da tutela da confiança, essa violação foi perpetrada pela autora. XXXII. Ao contrário do afirmado na sentença, a A. pese embora tenha informado do lapso, conformou-se com ele, não tendo reclamado ao contrário do que fez quanto ao lote 2. XXXIII. E, ao contrário igualmente do afirmado na sentença, não agiu de boa fé, porquanto tendo-lhe sido solicitado para responder e para inserir resposta na plataforma, nada fez, sequer reagiu à notificação com a data e hora de celebração do contrato. XXXIV. Pelo que, com toda a legitimidade, Sendo, como é, o alegado erro conhecido da autora desde 03/12/2010, não tendo a autora exercido o direito de audição quanto ao mesmo (apenas o tendo feito quanto ao lote 2), não tendo deduzido impugnação da decisão final, tendo apresentado todos os documentos para a assinatura do contrato e a garantia bancária correspondente, e não tendo respondido notificação de 13/01/2011 nem à mensagem de 14/01/2011, foi criada, pela Administração, a expectativa de celebração do contrato. XXXV. O incumprimento da autora estende-se ao incumprimento da obrigação de contratar, ou seja, à não celebração do contrato, no dia e hora marcados. XXXVI. Quer isto dizer que, está em causa, não só a não manutenção da sua proposta, como também o atraso sofrido pela administração na aquisição do serviço que pretendia contratar e de que deixou de beneficiar enquanto não foram reunidos os requisitos para a celebração de outro contrato com a concorrente colocada em 2° lugar. XXXVII. Ademais, a perda da garantia bancária a favor do adjudicante não tem a natureza de indemnização. Tem uma função preventiva, dissuasora de certas condutas - umas negligentes, outras resultantes de estratégias de grupo de empresas. XXXVIII. O acto de concorrer a um concurso público, de aceitar uma adjudicação e fazer junção de toda a documentação necessária à celebração do contrato, a prestação de garantia, quando se estava ciente de uma alegada incorrecção no valor proposto, não é visto pelo ordenamento jurídico como acto desprovido de consequências na esfera jurídica de quem o vem perpetrando. XXXIX. Razão pela qual a lei determina, sem qualquer ressalva, a perda da caução - n°2 do art. 105° do CCP. E perda na sua totalidade. XL. Sendo portanto inaceitável a conclusão da decisão sob recurso quanto à violação do princípio da proporcionalidade.”. A recorrida S… SEGURANÇA, S.A. apresentou contra-alegação de recurso, que concluiu nos seguintes termos: “I. Alega a Recorrente que, das alíneas 14), 15), 16), 17) e 18) dos Factos Assentes, resulta que a S…, previamente à prolação do acto administrativo impugnando, terá sido notificada para exercer o direito de audiência prévia, e que, consequentemente, o Tribunal a quo deveria ter decidido pela não verificação desse vício; Porém, ainda que tais alegações fossem procedentes - o que não são, como veremos nas conclusões IX a XIII das presentes contra-alegações -, o que resultaria das mesmas seria um erro de julgamento e não a nulidade prevista no artigo 615,° n.º l al. c) do CPC por oposição dos fundamentos com a decisão. II. Apenas a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade das decisões judiciais, o que não se verifica já que, de fls. 21 a 24 da sentença, o Tribunal a quo enuncia as razões pelas quais entende que os vícios invocados pela S... são procedentes, sendo que a Recorrente demonstrou compreender perfeitamente a ratio da decisão, tendo-a impugnado no seu recurso, pelo que não se verifica a nulidade prevista no artigo 615.° n.°l al. b) do CPC. III. Na impugnação da decisão quanto à matéria de facto, ao requerer o aditamento de factualidade, a Recorrente não deu cumprimento ao ónus exarado no artigo 640.° n.º 1 al. b) do CPC, já que se limitou a remeter a pretensa demonstração dos factos para o processo administrativo instrutor, na sua globalidade, sem identificar os documentos que reputa relevantes e sem indicar as fls. em que tais documentos se encontram. IV. Não compete ao Tribunal superior analisar todos os meios de prova produzidos, pelo que, não tendo a Recorrente especificado os concretos meios probatórios que, no seu entender, impunham decisão diversa, deve aplicar-se a cominação exarada no artigo 640.º n.º l do CPC. V. Acresce que os factos referidos nas conclusões X, XI, XIII, XIV (primeira frase) e XVII das alegações de recurso já resultam (ou extraem-se) das alíneas 3), 4), 5), 7), 11) e 13) dos Factos Provados, não se vislumbrando qualquer utilidade no seu aditamento. VI. Os “factos" referidos nas conclusões XII, XIV (segunda frase), XVIII, XIX, XX e XXI das alegações de recurso não consubstanciam verdadeiros factos, isto é, acontecimentos objectivos e concretos, mas sim juízos conclusivos ou valorações subjectivas da Recorrente. VII. O comportamento que a S… objectivamente adoptou na sequência do Relatório Preliminar, do Relatório Final e da decisão de adjudicação já decorre do referido nas alíneas 3), 4), 5), 11) e 12) dos Factos Assentes. VIII. Pelo que deve improceder a impugnação da decisão quanto à matéria de facto. E IX. A exigência exarada no artigo 100.° do CPA 1991 só se considera cumprida se o interessado for informado da intenção de adopção de certo acto administrativo e se lhe forem comunicados os elementos necessários para que este apreenda os dados que serão considerados na decisão final, do ponto de vista factual e jurídico, por forma a que possa expor o seu ponto de vista quanto aos factos que lhe são imputados, invocar outros factos relevantes, contraditar as provas contra si apresentadas, apresentar novas provas, debater a questão de direito e, bem assim, pronunciar-se sobre todas as questões relevantes para a decisão. X. A notificação à S… do Segundo Relatório Final no qual foi proposta a adjudicação à S… não cumpre minimamente os pressupostos referidos na conclusão anterior, porquanto tal acto não revela qualquer intenção de aplicação de qualquer sanção por parte do órgão decisor, não consubstancia qualquer projecto de decisão de aplicação de sanção de perda de caução, no mesmo não é referido que a entidade demandada pretende aplicar qualquer sanção nem o respectivo fundamento jurídico e factual e muito menos é efectuada qualquer notificação ou comunicação à S… para se pronunciar sobre tais (inexistentes) elementos. XI. Acresce que a notificação para o exercício do direito de audiência prévia não pode ser efectuada de forma velada ou obscura de permeio num acto (Relatório Final de procedimento pré-contratual) cujo âmbito e objecto é totalmente distinto. XII. Como a S… não foi notificada para exercer o direito de audiência prévia (e muito menos de acordo com os formalismos prescritos na lei) não poderia, de forma eficaz, “discutir, contestar e valorar", influenciando, de forma efectiva o desenvolvimento do procedimento. XIII. Na carta de 28 de Janeiro de 2011, a S… não se pronuncia - como não estava em condições de o fazer - sobre as questões relevantes para a decisão, isto é, sobre a verificação ou não dos pressupostos da caducidade da adjudicação e da perda da caução, sobre a sanção que lhe veio a ser aplicada, e sobre as provas produzidas, pelo que não se pode entender que tal acto consubstancia exercício efectivo do direito de audiência prévia. XIV. A aplicação do princípio do aproveitamento do acto administrativo à falta de audiência prévia da S… consubstancia uma questão nova que a Recorrente não invocou perante o Tribunal a quo (artigo 83.º do CPTA 2004 e artigo 489.º n.º l do CPC 1995 em vigor à data da prática dos actos processuais), que o Tribunal a quo não conheceu e que, consequentemente, não pode ser apreciada em sede de recurso. XV. De qualquer forma, o princípio do aproveitamento do acto administrativo apenas poderia ser aplicável se se demonstrasse, sem margem para dúvidas, que o conteúdo do acto só podia ser um e que a pronúncia da S…, em sede de audiência prévia, não teria qualquer influência na decisão final. XVI. Dependendo a decisão de caducidade da adjudicação e de perda de caução da verificação dos pressupostos de falta de comparência do adjudicatário e de imputabilidade ao adjudicatário da falta de comparência, é conferida alguma margem de discricionariedade à Administração, não sendo um acto absolutamente vinculado. XVII. Não é possível afirmar, com certeza e sem margem para dúvidas, que caso a S… tivesse tido a oportunidade de expor à Recorrente a posição expressa nas conclusões XVIII a XL das presentes contra-alegações quanto à não verificação dos pressupostos do artigo 105. ° n.º l e 2 do CCP, o entendimento da Recorrente não se teria alterado, pelo que o princípio do aproveitamento do acto administrativo não pode operar. E XVIII. A caducidade da adjudicação e a perda da caução não operam automaticamente, estando dependentes da emissão de acto administrativo no qual se declare a verificação dos competentes requisitos. XIX. O juízo de imputabilidade da não comparência deve ser efectuado de acordo com a gravidade do incumprimento, os motivos invocados para o incumprimento e as consequências da decisão, à luz do princípio da proporcionalidade. XX. A S… apresentou a sua proposta com base em erro já que propôs o preço total, para o Lote 3, de 2.096.887,20€ quando a sua intenção era de propor o preço total de 2.380.662,62€ [alíneas 8), 9) e 10) dos Factos Assentes). XXI. Como expressamente decidido a fls. 24 da sentença recorrida, e não impugnado pela Recorrente, o erro material que inquinava a proposta da S… era rectificável (artigo 56.° n.º l do CCP e artigos 249.º e 250.º do CC). XXII. A S…, na sequência do Segundo Relatório Preliminar e ainda na fase de análise e avaliação das propostas, alertou o Júri para o erro verificado na sua proposta e solicitou a respectiva correcção (alínea 3) dos Factos Assentes). XXIII. A S… adoptou tal comportamento não obstante o mesmo lhe ser desfavorável já que, caso o Júri tivesse aceitado a correcção do erro, a S… deixaria de estar classificada em primeiro lugar (alínea 3) dos Factos Assentes). XXIV. O Júri recusou-se a aceitar a correcção do erro e o procedimento pré-contratual prosseguiu com prolação de acto a adjudicar os serviços à S... (alíneas 3) e 4) dos Factos Assentes). XXV. Face a tal posição, a S... tentou obter uma solução consensual junto do Júri já que a assinatura de um contrato baseada numa proposta viciada em erro traduzir-se-ia na celebração de um contrato não querido pela S... e, assim, numa violação intolerável do princípio da liberdade contratual e da livre formação da vontade (artigo 405. ° CC). XXVI. A S... comunicou à Recorrente a sua intenção de não comparecer à assinatura do contrato devido ao erro que enfermava a sua proposta, tendo a Recorrente aceite tal intenção (ou, pelo menos, reconhecido que foi informada de tal intenção) (alíneas 7, 11) e 12) dos Factos Assentes). XXVII. Tendo a Recorrente reconhecido que lhe tinha sido transmitida a intenção da S... de não comparecer à assinatura do contrato e logo aludido à adjudicação ao concorrente classificado em segundo lugar (alínea 12) dos Factos Assentes), é patente que a Recorrente aceitou que a assinatura do contrato havia sido dada sem efeito, pelo que, desde logo, não se verifica o pressuposto exarado no artigo 105.º n.º l e 2 do CCP de falta de comparência. XXVIII. A S... tinha um fundamento legítimo para a sua intenção de não comparecer à assinatura do contrato (conclusões XX, XXI e XXV), adoptou as diligências possíveis para evitar que o procedimento prosseguisse até essa fase (conclusões XXII a XXIV), comunicou à Recorrente a sua intenção de não comparecer à assinatura do contrato, o que a Recorrente reconheceu (conclusões XXV e XXVI), e ficou convicta que tal assinatura havia sido dada sem efeito (conclusão XXVII) pelo que a não assinatura do contrato não é imputável à S... (conclusão XIX). XXIX. Não se verificam os pressupostos exarados no artigo 105.° n.° l e 2 do CCP. XXX. A S..., nas suas relações com a Recorrente, pautou-se por uma conduta transparente e de boa-fé tendo alertado para a situação de erro em momento anterior à decisão de adjudicação (não obstante tal lhe ser desfavorável - conclusões XXII a XXIV) e numa fase procedimental em que ainda era possível a correcção da sua proposta com as inerentes consequências evitando-se toda a situação que se veio a verificar posteriormente, posição que manteve mesmo após a decisão de adjudicação (conclusões XXV, XXVI e XXVII). XXXI. A S... nunca criou na Recorrente a expectativa de que iria celebrar o contrato, tendo mantido uma conduta constante com a sua intenção de não celebrar contrato com aquele conteúdo (conclusões XXII a XXVII). XXXII. A Recorrente, ao recusar aceitar a correcção do erro na proposta da S... e ao criar na S... a legítima expectativa de que a assinatura do contrato havia ficado sem efeito (conclusões XXVI e XXVII) (que posteriormente frustrou ao aplicar a sanção prevista para a falta de comparência) não adoptou a conduta leal e correcta a que estava adstricta nos termos dos artigos 6.º-A e 7.° do CPA 1991. XXXIII. A S... investiu nessa situação de confiança criada pela Recorrente, adoptando um comportamento coerente com a mesma (isto é, não estando presente no dia 21 de Janeiro de 2011 para a assinatura do contrato), pelo que a aplicação da sanção prevista para a falta de comparência é também violadora do princípio da boa-fé e da tutela da confiança. XXXIV. O princípio da proporcionalidade rege toda a actividade administrativa (artigo 5° n.° 2 do CPA 1991) e deve ser aplicável também na decisão de perda de caução (designadamente no juízo que a antecede sobre a imputabilidade da não comparência ao adjudicatário - conclusão XIX). XXXV. Tal princípio impõe que não sejam adoptadas medidas excessivas, devendo ser aplicada a menos gravosa dentro das possíveis para o fim pretendido, sendo que, na determinação da medida das sanções deverá atender-se, designadamente, à culpa do agente, à gravidade do incumprimento e às consequências da sua actuação. XXXVI. É inconstitucional, por violação do princípio da proibição do excesso (artigo 18.º n.° 2 da CRP), qualquer interpretação do artigo 105.° n.° 2 do CCP no sentido de que a perda da caução será sempre integral, independentemente das circunstâncias concretas do caso (designadamente, mesmo nos casos em que gravidade do incumprimento pelo adjudicatário é diminuta, a culpa do adjudicatário é diminuta e os prejuízos gerados à Administração pela caducidade da adjudicação são (substancialmente) inferiores ao valor da caução). XXXVII. A considerar que a S... incumpriu qualquer obrigação, a gravidade de tal incumprimento sempre havia de se entender como diminuta tal como o é também a culpa da S... (cfr. conclusões XX a XXXIII). XXXVIII. Não ficou demonstrado que a não celebração do contrato tenha causado quaisquer prejuízos à Recorrente, nem esta os alegou, identificou ou quantificou e menos ainda demonstrou. XXXIX. Tendo a Recorrente adjudicado os serviços à concorrente classificada em segundo lugar no mesmo dia em que estava inicialmente designada a data de assinatura do contrato com a S... (alíneas 9) e 14) dos Factos Provados) a Recorrente não teve quaisquer prejuízos. XL. É claramente atentatório do princípio da proporcionalidade que a Recorrente exija à S... o pagamento da quantia de 104.844,36€ quando não sofreu quaisquer prejuízos com a não celebração do contrato, ainda para mais quando o motivo para a não celebração do contrato foi o erro em que, involuntariamente, a S... incorreu na formulação da sua proposta de preço, erro do qual a entidade adjudicante teve conhecimento em momento anterior à adjudicação, que se recusou a aceitar que fosse corrigido e que aceitou como constituindo fundamento bastante para a não celebração do contrato. XLI. Nos termos do artigo 636. ° n.º l do CPC requer-se a ampliação do objecto do recurso à questão da consequência da preterição do direito de audiência prévia da S.... XLII. A perda da caução é a penalidade prevista para o incumprimento da obrigação de assinatura do contrato imputável ao adjudicatário (artigo 105.º n.º 2 do CCP) pelo que está em causa um procedimento de natureza sancionatória. XLIII. Nos procedimentos administrativos de natureza sancionatória a audiência do interessado constitui um direito fundamental, já que se consubstancia na concretização, no plano ordinário, do princípio exarado no artigo 32.° n.° 10 da CRP (Acórdãos do STA de 02 de Maio de 2006, processo 01244/05, de 12 de Maio de 1999, processo 032880 e do TCA Sul de 27 de Maio de 2010, processo 06142/10), pelo que a consequência da preterição dessa fase procedimental é a nulidade (artigo 133.° n.° 2 al. d) do CPA 1991) e não a anulabilidade como decidido na sentença recorrida. XUV. O acto de aplicação da perda de caução é nulo pelo que não pode ser aplicado o princípio do aproveitamento do acto administrativo (conclusões XIV a XVII).”. O Digno Magistrado do Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), não se pronunciou. Sem vistos, com prévio envio do projeto de acórdão aos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o presente processo à conferência para decisão. * II. Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pela entidade demandada e recorrente são as seguintes: - se a sentença recorrida padece de nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos previstos na alínea c), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC e por não especificação dos fundamentos de direito que justificam a decisão, nos termos previstos na alínea b), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC; - se a sentença recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto; - se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito; e, Subsidiariamente, conhecer da ampliação do objeto do recurso apresentada pela autora quanto à qualificação do vício de preterição da audiência prévia como nulidade. III – Fundamentação: 3.1. De facto: Na sentença recorrida foi julgada a matéria de facto com interesse para a decisão, nos seguintes termos: “1. A Autora apresentou proposta no âmbito do procedimento n.º 43 (36/UMC/MFAP/2010) para a aquisição de serviços de vigilância e segurança humana ao abrigo do Acordo Quadro n.º 13-Lote 3, da Agência Nacional de Compras Públicas E.P.E. (ANCP), nos termos dos artigos 257.º e seguintes do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo Decreto-Lei n° 18/2008, de 29 de Janeiro - Documentos n.°s 1, 2 e 5 juntos com a p.i. 2. Tendo proposto o preço total sem IVA para o lote 3 de € 2 096 887,20 - doc. n° 5. 3. Em 27 de Dezembro de 2010 foi elaborado pelo Júri do procedimento n° 43 (36/UMC/MFAP/2010), para a aquisição de serviços de vigilância e segurança humana ao abrigo do Acordo Quadro n° 13-Lote 3, da Agência Nacional de Compras Públicas E.P.E. (ANCP), "Relatório Final" no qual pode ler-se o seguinte: " [...] 20. Por sua vez, na sua pronúncia, o concorrente S... veio alegar que: "por erro de digitação, a aposição do valor hora, no Lote 3, foi efectuado por um valor (€ 7,72) que não tem correspondência com o praticado pela concorrente nos restantes Lotes do presente concurso (€ 8,32) facto que determinou a apresentação de um preço global para a prestação do serviço inferior ao pretendido. Assim, deve ser corrigido o valor constante da proposta, sendo considerado, ao invés de 2.096.887,20 € (...) o valor de 2.383.347,20 € (...). 21. Assim, na sua pronúncia, o concorrente S... vem expressamente alterar o preço hora do serviço diurno excluindo feriados de € 7,32 e o valor global da proposta de 2.096.887,20 constantes da sua proposta /vide Anexo VI), respectivamente, para € 8,32 e € 2.383.347,20, o que não pode ser aceite, uma vez que tal alteração constitui uma verdadeira alteração à sua proposta, quando o mesmo não pode alterar os atributos da proposta apresentada. Desta forma não pode ser atendível esta alteração apresentada pelo concorrente S..., pois a proposta é imutável desde a data do termo para a apresentação da mesma até ao prazo da obrigação da sua manutenção, que in casu é de 90 dias, nos termos da alínea b) do ponto VII do Convite e vide n.º 2 do artigo 72.° e artigo 65.° do CCP. 22. Deste modo, considerando, além das exclusões iniciais, também a exclusão do concorrente S... do Lote 2 (sub-lote A) e a avaliação das propostas já efectuadas, o júri deliberou manter a ordenação das propostas para os Lotes 1, 3 e 5 e alterar a ordenação para o Lote 2, que se passa a indicar: […] Lote 3 1.° classificado: S... 2.° classificado: S… 3.° classificado: X… 4.° classificado: P… 5.° classificado: P… […] 23. Nos termos do artigo 148.° do CCP, o júri deliberou proceder a nova audiência dos Concorrentes, (...). […] 25. Em sede de audiência prévia foram apresentadas as seguintes pronúncias (...): […] b. O concorrente S... Segurança, S.A., no dia 23 de Dezembro de 2010, em sede de pronúncia, veio por duas vezes (...) contestar os motivos que fundaram a exclusão da proposta que apresentou para o lote 2, tendo a propósito referido que: […] 27. Assim sendo, não é alterado, suprimido ou acrescentado qualquer factor de exclusão nem, a ordenação de propostas exposta no 2° relatório preliminar deste procedimento, pelo que o júri reitera todo o seu teor e propõe aos órgãos com competência para autorizar a despesa, a adjudicação dos seguintes lotes, aos concorrentes indicados, pelos valores das respectivas propostas, que fica junto a este relatório, dele fazendo parte integrante: […] Lote 3 - Para a vigilância das instalações do DGCI sitas em Lisboa (...) e ainda em Setúbal (...), ao concorrente S...Segurança, S.A., pessoa colectiva n.° 1..., pelo valor total de € 2.096.887,20, acrescido de IVA. [...]"- Documento n.° 3 junto ao requerimento inicial nos autos cautelares. 4. Por despacho de 28 de Dezembro de 2010, do Director Geral dos Impostos foi aprovado o Relatório Final do procedimento e adjudicado à Requerente o respectivo lote 3 - Documento n.º 1 junto ao requerimento inicial no p. cautelar. 5. Notificada da adjudicação, a Autora entregou na DGCI, quer os documentos de habilitação, quer a garantia bancária a que aludem os artigos 89.° e 90.° do Código dos Contratos Públicos (CCP) - Documentos n.°s 2 e 7 juntos com a p.i. 6. Esta garantia bancária foi emitida pelo valor de Euros 104.844,36 (Cento e quatro mil oitocentos e quarenta e quatro euros e trinta e seis cêntimos) - Documento n.° 4 junto ao requerimento inicial no p. cautelar. 7. No dia 13 de Janeiro de 2011, a Requerente foi notificada para a assinatura do Contrato, a qual teria lugar no dia 21 de Janeiro de 2011, às 10h 30m na sede da Direcção Geral dos Impostos na Rua da Prata n.º 10 em Lisboa - Documentos n.°s 1 e 5 juntos ao requerimento inicial no P. cautelar. 8. A Autora constatou que a pessoa encarregada de formular a proposta tinha aposto na mesma um preço total sem IVA para o Lote 3 de € 2 096 887,20 (dois milhões, noventa e seis mil, oitocentos e oitenta e sete euros e vinte cêntimos) - doc. n° 5 junto com a p.i. 9. Preço esse que corresponde a um preço de referência por portaria, 24 horas, todos os dias do ano, de € 6 068,74, quando o preço mínimo que o Conselho da Administração da a. tinha definido para a portaria, 24 horas, todos os dias do ano era de € 6 890,22 (seis mil, oitocentos e noventa euros e vinte e dois cêntimos. 10. A que corresponderia um preço total sem IVA para o Lote 3 de € 2 380 662,62 11. A Autora informou o Ministério das Finanças de que a informação de aceitação da minuta contratual tinha sido introduzida na plataforma por lapso, logo após 7 de Janeiro 2011 - doc. 9 a 11 juntos com a p.i. que aqui se dão como reproduzidos. 12. Em 14 de Janeiro de 2011 a Presidente do Júri enviou à Autora mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: " [...] Dr. M… Enviei ontem uma mensagem na plataforma ANCP/V... a notificar a S... para a assinatura do contrato com a DGCI, relativamente ao lote 3 do proc. 43 (36/UMC/MFP/2010) - vigilância para as instalações de Lisboa. A manter-se a posição da S... que me transmitiu pessoalmente, agradecia sua disponibilidade para informar-me, através da citada plataforma, que essa Empresa não vem assinar o contrato. Esta mensagem apenas reduziria o lapso de tempo necessário para a elaboração de um novo Relatório Final, a adjudicar ao 2. ° classificado no mesmo lote. Porém tal decisão fica ao seu critério, como é óbvio. [...]" - Documento n.° 12 junto com a p.i. 13. A Autora não compareceu na data e horas designadas para a assinatura do contrato - Admitido por acordo; 14. Em 21 de Janeiro de 2011 foi elaborado pelo Júri do procedimento n° 43 (36/UMC/MFAP/2010), para a aquisição de serviços de vigilância e segurança humana ao abrigo do Acordo Quadro n.º 13-Lote 3, da Agência Nacional de Compras Públicas E.P.E. (ANCP), o "2.° Relatório Final" no qual pode ler-se o seguinte: " [...] No dia e hora marcados, não compareceu nas instalações da Direcção-Geral dos Impostos qualquer representante da S... Segurança, SA para a outorga do contrato. Nos termos do n.º 1 do artigo 105.° do CCP, a adjudicação caduca ser, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato. De harmonia com o disposto no n.º 2 do mesmo dispositivo legal, o adjudicatário perde a favor da entidade adjudicante a caução prestada, devendo o órgão competente para a decisão de contratar, adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente. […] Nestes termos, tendo ocorrido a caducidade da adjudicação efectuada, propõe-se ao Sr. Director-Geral dos Impostos que adjudique o lote 3 do procedimento 43 (36/UMC/MFAP/2010) ao concorrente S…, SA, pelo valor da sua proposta (...). [...]" - Documento n.° 1 junto ao requerimento inicial no p. cautelar; 15. A Requerente foi notificada do "2.° Relatório Final" em 21 de Janeiro de 2011 - Documento n.° 8 junto ao requerimento inicial no p. cautelar. 16. Em 28 de Janeiro de 2011, a Autora apresentou requerimento com o seguinte teor: " [...] Nos termos do 2.° Relatório Final do Procedimento n.° 43 (...), de 21 de Janeiro de 2011, foi adjudicado o lote 3 do referido procedimento à concorrente S…, pelo valor de € 2.100.000,48. No mesmo Relatório refere-se que nos termos do art.° 105°, n.° 2 do CCP a S... perde a favor da entidade adjudicante a caução prestada. […] Nos termos do art. 296.°, n.° 1, b) a execução da caução, deverá ser pelo prejuízo incorridos pelo contraente público. A S... apresentara um proposta no valor de € 2.096.887,20, sobre a qual mais tarde, se pronunciou alegando um erro pelo que pediu que a mesma não fosse adjudicada, razão pela qual não compareceu para assinatura do contrato. […] 17. Por despacho de 1 de Julho de 2011, do Director-Geral dos Impostos, considerando que a falta não justificada do adjudicatário à outorga do contrato implica a perda da caução prestada, conforme determina o n.° 2 do artigo 105.° do Código dos Contratos Públicos, foi determinada a notificação da Requerente - Documento n.° 2 junto com a p.i. 18. Tal Despacho foi exarado sobre a Informação de 24/06/2011, n.º 822/2011/DALP, do teor seguinte: Processo DALP n.º 19/UMC/2010 Através do Procedimento n.º 36/UMC/MFAP/2010, conduzido pela UMC da SG do MFAP, foi aberto procedimento para a aquisição de serviços de vigilância e segurança para os anos de 2011 e 2012, ao abrigo do disposto no art.º 259.º e segs. do CCP, conjugado com o previsto no art.º 3.º n.º 2 do DL n.º 37/2007, 19/2, e nos termos do Despacho n.º 13477/2009, do SETF, publicado no DR, II série, n.º 111, de 9/6. A agregação da DGCI e aceitação das condições gerais para a aquisição foi dada por despacho de 3/11/2010, do Sr. Director-Geral dos Impostos, exarado na informação n.º 1490/DALP/20l0, de 22/10/2010; Ao Lote referente aos edifícios de Lisboa e Setúbal, foi atribuída a referência “Procedimento 43”; O procedimento correu os seus trâmites legais, e por despacho de 28/12/2010, do Sr. Director Geral dos Impostos, a prestação de serviços que constitui o objecto do procedimento foi adjudicada à firma S.... SA; Em 03/01/2011 a S... apresentou a caução, sob a forma de garantia bancária, dando cumprimento ao previsto no art.º 88.º do CCP, a qual se encontra em conformidade - ver Anexo I. Por despacho de 4/1/2011, do Sr. Director Geral dos Impostos, foi aprovada a minuta do contrato, de que o adjudicatário foi notificado em 5 de Janeiro de 2011. Não tendo sido apresentada reclamação sobre a minuta do contrato, em 13 de Janeiro de 2011, foi o adjudicatário notificado para a outorga do contrato, para o dia 21 Janeiro de 2011, às 10H30, nas instalações da Direcção-Geral dos Impostos, na Rua da Prata, n.º 10, em Lisboa - Anexo II. No dia e hora marcados, não compareceu nas instalações da Direcção-Geral dos Impostos qualquer representante da S... - Segurança. SA para a outorga do contrato. Nos termos do n.º 1 do artigo 105.º do CCP, a adjudicação caduca se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, facto que foi comunicado a todos os concorrentes que apresentaram propostas - Anexo III. Na comunicação supra referida, foi anexado o 2.° Relatório Final, no qual se refere que, de harmonia com o disposto no art.º 105.º n.º 2 do CCP, a caução prestada pela S... se considera perdida a favor da entidade adjudicante. Em 28/1/2011, a S... vem reagir a esta intenção, através de carta dirigida à Sr.ª Directora de Serviços da UMC da SG do MFAP - Anexo IV. Não contestando a perda da caução, põe em causa o valor a considerar, uma vez que argumenta que não deve ser a totalidade do valor da mesma, mas sim a diferença que resulta entre o valor do contrato que era para ser celebrado pela S..., e o que veio a ser celebrado com o concorrente posicionado em 2.° lugar. Analisados os argumentos expostos pela S..., os mesmos não merecem provimento, considerando que a função da caução é apenas caucionar a celebração e o cumprimento do contrato, não constituindo uma figura indemnizatória. Face ao exposto, e considerando que a falta não justificada do adjudicatário à outorga do contrato implica a perda da caução prestada, conforme determina o art.º 105.º n.º 2 do CCP, proponho que seja notificada a empresa S..., SA. nos termos do ofício anexo. À consideração superior O Chefe de Divisão Doc. n° 2, junto com a p.i. 19. No dia 6 de Julho de 2011, a Requerente recebeu o ofício n.° 199, datado de 4 de Julho de 2011, subscrito pelo Director Geral dos Impostos, pelo qual se notifica a Requerente do seguinte: "[…] 1. Considerando a caducidade da adjudicação que fora efectuada a essa empresa, no âmbito do acima indicado procedimento concursal e considerando, também, que a verificação dessa caducidade se deveu à não comparência, por facto imputável a essa empresa (n.º 1 do artigo 105.° do Código dos Contratos Públicos), vem o Estado/Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), na qualidade de entidade adjudicante, notificar a S... SEGURANÇA, SA que, em conformidade com o referido no 2.° Relatório Final do indicado procedimento e por força do disposto no n.° 2 do antes citado artigo 105.° do Código dos Contratos Públicos, considera perdida, a seu favor a caução prestada através da garantia bancária n.° 364070 do B… SA (BES), no valor de € 104. 844,36; 2. Desta forma, convida-se a S... SEGURANÇA, SA, enquanto adjudicatária faltosa, no prazo de 15 dias, proceder à entrega ou depósito, à ordem da Direcção Geral dos Impostos, da quantia correspondente ao valor da caução, contra a entrega da garantia bancária prestada, sob pena de, esgotado esse prazo, o Estado/DGCI accionar a garantia bancária junto da instituição bancária que a prestou, exigindo-lhe o imediato pagamento correspondente. [...]" - Documento n.° 1 junto com a na p.i.; 20. Previamente à presente acção, a Autora requereu o decretamento de providência cautelar, que foi julgada procedente - cf. autos cautelares em apenso, com o n° 996/11.7 BESNT”. * Nos presentes autos de ação administrativa comum, sob a forma de processo ordinário, formulou a autora o pedido de anulação do ato do Diretor Geral dos Impostos, que considerou perdida a favor do Estado a caução prestada através da garantia bancária n.º 364070 do B…, no valor de € 104 844,36 e determinou o acionamento dos mecanismos necessários para que tal valor revertesse para o Estado. A presente ação foi julgada procedente, tendo o ato impugnado sido anulado. Inconformado o Réu interpôs recurso dessa sentença. * Importa, então, apreciar e decidir o recurso interposto pelo réu e recorrente, sendo as questões a decidir, tal como vêm delimitadas pela alegação de recurso as supra enunciadas em II. E subsidiariamente o recurso apresentado pela recorrida.* Defendeu o recorrente que se verifica oposição entre os fundamentos de facto e a decisão no que respeita à questão da “notificação e o exercício do direito de participação”, dizendo que o seguinte segmento decisório da sentença recorrida “(...) assiste razão à Autora, neste caso uma vez que a entidade demandada omitiu a formalidade essencial de audiência prévia, num acto constitutivo de direitos como seria a caducidade da adjudicação.” mostra-se em clara oposição com a factualidade dada por provada em 14., 15., 16., 17. e 18. da sentença sob recurso. Dali resulta que a autora foi notificada da proposta de decisão em 21/01/2011 - o Despacho do Senhor Diretor Geral que aprova o 2° Relatório Final, que ao abrigo do n.º 1 do artigo 105.º do CCP, determina a caducidade da adjudicação e, que em 28/01/2011, vem a exercer o direito de audição. O 2.º Relatório Final, aprovado em 21/01/2011, e notificado à autora na mesma data, contém o sentido da decisão e a respetiva fundamentação, que foi inteiramente entendida pela autora, conforme bem se deduz do teor do exercício do direito de audição (pronúncia de 28/01/2011). A sentença não pode ignorar que à A. foi atribuída a faculdade de se pronunciar, que a A. se pronunciou efetivamente e que esse exercício do direito de participação foi devidamente avaliado pelo autor do ato aqui em causa, como decorre do despacho de 01/07/2011, ora sindicado. Mais defendeu que a jurisprudência da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal de Administrativo tem formado uma sólida orientação no sentido de que os vícios de forma não impõem, necessariamente, a anulação do ato a que respeitam, e que as formalidades procedimentais essenciais se degradam em não essenciais se, apesar delas, foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-las. Concluiu dizendo que provados que estão os factos enunciados sob os n.ºs 14, 15, 16, 17 e 18 impunha-se decisão diferente da proferida. Por sua vez a recorrida defendeu que ainda que a alegação do recorrente de que dos referidos pontos da matéria resultasse que a autora foi notificada para exercer o direito de audiência prévia e que o exerceu, e que, consequentemente, o Tribunal a quo deveria ter decidido pela não verificação desse vício o que resultaria das mesmas seria um erro de julgamento e não a nulidade prevista no artigo 615.º n.º 1, alínea c), do CPC por oposição dos fundamentos com a decisão. Vejamos. As causas de nulidade da sentença encontram-se previstas no artigo 615.º do Código de Processo Civil (CPC) (1-Aplicável ex vi artigo 140.º, n.º 3, do CPTA, tal como os demais artigos do CPC invocados relativamente aos recursos.), nos seguintes termos: “1 - É nula a sentença quando: (…) c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; (…)”. No acórdão do STJ de 09.02.2017, proferido no processo n.º 2913/14.3TTLSB.L1.S1 (2-Consultável em www.dgsi.pt., como todos os acórdãos sem indicação de fonte.) decidiu-se que “Ocorre a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, al. c) do CPC quando os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente, não se verificando quando a solução jurídica decorreu de interpretação dos factos, diversa da pretendida pelo arguente.”. O recorrente pode discordar da fundamentação adotada na decisão recorrida, mas a mesma não é reconduzível a uma nulidade da decisão, pois, a decisão não padece de qualquer contradição entre os fundamentos de facto ou de direito e a decisão, nem é ininteligível. Com efeito, considerou-se na sentença recorrida que “A não comparência do adjudicatário à outorga do contrato acarreta, como consequência lógica, a caducidade da adjudicação que lhe foi feita. No entanto, "como acto constitutivo de direitos que é, a declaração de caducidade da adjudicação, seja qual for o respectivo fundamento legal, deve ser precedida de audiência prévia do adjudicatário, como resulta do regime geral estabelecido nos artigos 100.º e seguintes do CPA" (anterior ao aprovado pela Lei n.º 42/2014, 11/07, aplicável á data dos factos). Assim sendo, assiste razão à Autora, neste caso, uma vez que a entidade demandada omitiu a formalidade essencial de audiência prévia, num acto constitutivo de direitos como seria a caducidade da adjudicação. Tem sido neste sentido a nossa melhor jurisprudência, citando alguns exemplos”. Os fundamentos que o recorrente aduziu nestes pontos das conclusões traduzem-se em discordância do mesmo relativamente à subsunção dos factos às normas jurídicas aplicáveis e, como tal, configuráveis como hipotéticos erros de julgamento de facto ou de direito, que apreciaremos infra. Na verdade, os fundamentos aduzidos na sentença recorrida não são suscetíveis de conduzir a uma decisão de sentido oposto ou diferente da proferida. Não se verifica, assim, a invocada nulidade da decisão, improcedendo este fundamento de recurso. * Defendeu, ainda, o recorrente que a decisão é omissa quanto aos fundamentos de direito em que assenta. No discurso de fls. 24 não se vê em que disposições legais sustenta o tribunal a quo a sua decisão, o que constitui nulidade de sentença.A recorrida veio dizer que apenas a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade das decisões judiciais, o que não se verifica já que, de fls. 21 a 24 da sentença, o Tribunal a quo enuncia as razões pelas quais entende que os vícios invocados pela S... são procedentes, sendo que a Recorrente demonstrou compreender perfeitamente a ratio da decisão, tendo-a impugnado no seu recurso, pelo que não se verifica a nulidade prevista no artigo 615.° n.º l al. b) do CPC. Vejamos. O artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, dispõe: “É nula a sentença quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;”. Deve o juiz especificar os factos que considera provados e não provados, que tenham relevância para a decisão e em que faz assentar o seu raciocínio decisório e deve indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas que conduzem à decisão final. O Tribunal a quo procedeu à enunciação dos factos considerados provados com relevância para a decisão da causa, identificando-os de forma especificada, com base nos documentos constantes dos autos e nas posições assumidas pelas partes. A decisão recorrida enunciou de forma suficiente os fundamentos quer de facto, quer de direito, citando o correspondente artigo 105.º do CCP, para considerar que estavam verificados os requisitos relativos à perda da caução constituída pela recorrente e invocando os princípios da boa fé, da confiança e da proporcionalidade, tendo explicitado o raciocínio efetuado pelo Tribunal a quo. O recorrente pode discordar da fundamentação adotada na decisão recorrida, mas a mesma não é reconduzível a uma nulidade da decisão, pois, a decisão não padece de insuficiência de fundamentação quer de facto, quer de direito. Com efeito, os fundamentos que o recorrente aduziu neste ponto traduzem-se em discordância do mesmo relativamente à subsunção dos factos às normas jurídicas aplicáveis e, como tal, configuráveis como hipotéticos erros de julgamento de facto ou de direito, que apreciaremos infra. Em suma, o Tribunal a quo especificou de forma suficiente os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão recorrida, não enfermando esta decisão da invocada nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 615. ° do CPC. Não se verifica, assim, a invocada nulidade da decisão, improcedendo este fundamento de recurso. * 3.2.2. Do invocado erro de julgamento da matéria de facto.Defendeu o recorrente que a matéria de facto mostra-se erroneamente decidida. Requereu o aditamento à factualidade provada dos factos que indicou sob os n.ºs i) a xii) [conclusões X, XI, XII, XIII, XIV e XVII a XXIV da alegação de recurso] dizendo que se mostram provados no PA, foram invocados exaustivamente na contestação e levados a conclusões nas alegações finais, deduzidas pela ED. Nenhum documento dos autos os contraria, nem foi produzida qualquer outra prova que os abale, de resto a prova testemunhal oferecida pela A. e pela ED, e que estas não dispensaram, não foi mandada produzir pelo tribunal. Pelo que, provados que estão aqueles factos devem os mesmos ser levados ao probatório. Precisamente porque, o Tribunal a quo, para decidir, ancorou-se na resposta negativa que deu à questão que colocou “Pode imputar-se à Autora a sua não comparência na assinatura do contrato?” - Resposta que não resulta da prova produzida nos autos. Por seu lado a recorrida defendeu que a recorrente não deu cumprimento ao ónus exarado no artigo 640.º n.°1 al. b) do CPC, já que se limitou a remeter a pretensa demonstração dos factos para o processo administrativo instrutor, na sua globalidade, sem identificar os documentos que reputa relevantes e sem indicar as fls. em que tais documentos se encontram. Não compete ao Tribunal superior analisar todos os meios de prova produzidos, pelo que, não tendo a Recorrente especificado os concretos meios probatórios que, no seu entender, impunham decisão diversa, deve aplicar-se a cominação exarada no artigo 640.º n.º l do CPC. Acresce que os factos referidos nas conclusões X, XI, XIII, XIV (primeira frase) e XVII das alegações de recurso já resultam (ou extraem-se) das alíneas 3), 4), 5), 7), 11) e 13) dos Factos Provados, não se vislumbrando qualquer utilidade no seu aditamento. Os “factos" referidos nas conclusões XII, XIV (segunda frase), XVIII, XIX, XX e XXI das alegações de recurso não consubstanciam verdadeiros factos, mas sim juízos conclusivos ou valorações subjetivas da recorrente. O comportamento que a S... objetivamente adotou na sequência do Relatório Preliminar, do Relatório Final e da decisão de adjudicação já decorre do referido nas alíneas 3), 4), 5), 11) e 12) dos Factos Assentes, pelo que deve improceder a impugnação da decisão quanto à matéria de facto. Vejamos. O artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) dispõe que “1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”. “Com a nova redacção do art.º 662.º pretendeu-se que ficasse claro que (…) quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente, em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência. (…) a Relação deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem. (3-Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, 2.ª Edição, Almedina, págs. 232-233.)”. O artigo 640.º, n.º 1, do CPC, prevê os ónus que estão a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, nos seguintes termos: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (…)”. No acórdão deste TCA Sul, de 22 de agosto de 2019, proc. n.º 580/18.4BEBJA, consultável em www.dgsi.pt, considerou-se que “a impugnação da matéria de facto e a modificabilidade da mesma pelo tribunal superior não visa alterar a decisão de facto fundada na prova documental ou testemunhal, apenas porque a mesma é susceptível de produzir convicções diferentes, podendo ser diversa a tomada no tribunal superior daquela que teve o tribunal da 1.ª instância. Diferentemente, este tribunal superior só pode alterar a matéria de facto porque as provas produzidas na 1.ª instância impunham, decisiva e forçosamente, outra decisão diversa da aí tomada (cf. art.º 662.º do CPC). Portanto, para a modificação da matéria de facto é necessário que haja uma dada matéria de facto que foi identificada e apreciada pelo tribunal de 1.ª instância e que este tenha exteriorizado a sua convicção na fixação da matéria provada e não provada. Só depois, se face às provas produzidas e para as quais o Recorrente remete, se impuser forçosamente decisão diversa da tomada pela 1.ª instância, há que alterar aquela. Mas terá que se tratar de uma prova firme, indiscutível ou irrefutável, que necessariamente abala a convicção que o tribunal de 1.ª instância retirou da prova produzida. Igualmente, a matéria de facto que se exige fixada e que pode justificar a alteração em sede de recurso é apenas a que releve para a decisão da causa e não qualquer outra que haja sido alegada pelo A. e R. Ou seja, ainda que seja alegada determinada matéria de facto e ainda que a mesma resulte provada nos autos, se a mesma for irrelevante para a decisão a proferir, não há-de ser tomada em consideração pelo juiz em sede de 1.ª instância e tal omissão também não conduz a um erro decisório.”. Pretende o recorrente o aditamento de doze pontos à matéria de facto julgada provada. Com efeito, o recorrente indica os factos que considera que devem ser julgados provados limitando-se a referir, genericamente, que nenhum documento dos autos os contraria, nem foi produzida qualquer outra prova que os abale, de resto a prova testemunhal oferecida pela A. e pela ED, e que estas não dispensaram, não foi mandada produzir pelo tribunal e provados que estão aqueles factos devem os mesmos ser levados ao probatório. Sucede que só relativamente a 2 pontos da matéria que pretende que seja julgada como provada deu cumprimento ao ónus que lhe compete de indicar - ainda que o tenha feito de forma pouco esclarecedora-, os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. Na verdade, o recorrente pretende que seja ampliada a matéria de facto, nos termos acima enunciados, limitando-se a remeter genericamente para o procedimento administrativo, sem indicar/identificar os concretos documentos ou fls. do processo ou dos autos de que os mesmos constam. São feitas afirmações no sentido de que os factos devem ser julgados provados sem que se indiquem os concretos meios probatórios que as fundamentam. Como é consabido não compete a este Tribunal de recurso reapreciar toda a prova produzida nos autos. Sendo que só os factos com relevância para a decisão devem ser levados ao probatório. Todavia, ainda assim, e no uso dos poderes oficiosos de modificabilidade da decisão de facto conferidos a este Tribunal – cfr. artigo 662.º do CPC - apreciando a impugnação da decisão da matéria de facto diremos que a matéria que o recorrente pretende que seja aditada aos factos provados trata-se nalguns casos de factos já incluídos no probatório, noutros de ilações ou conclusões a extrair de factos já provados, ou ainda de factos destituídos de relevância para a decisão da causa e do recurso. É a seguinte a redação dos factos que o recorrente pretende sejam aditados aos factos provados: “i. A autora em 03 de Dezembro de 2010, pronunciando-se em sede de audiência prévia (ref. 187868 junta ao PA), revela: “(...) por erro de digitação, a aposição do valor hora, no Lote 3, foi efectuado por um valor (€7,32) (...) que determinou a apresentação de um preço global para a prestação do serviço inferior ao pretendido.” ii. A 23 de Dezembro de 2010, a autora conforma-se com a decisão do 2.º Relatório preliminar de manter a proposta com o valor apresentado, insurgindo-se, apenas, quanto à proposta de decisão referente ao lote 2. iii. Em 29 de Dezembro de 2010, notificada do Despacho final, e podendo ainda, tal como lhe foi notificado, deduzir impugnação, opta por apresentar a garantia bancária, o que faz a 03/01/2011 iv. Em 05/01/2011, a autora é notificada da minuta do contrato, sendo-lhe concedido o prazo de 5 dias para sobre a mesma se pronunciar. v. Em 07/01/2011, e em resposta, a autora aceita a minuta do contrato e indica os Administradores que, em representação da requerente, outorgarão no mesmo. vi. Na mesma data, mas em mensagem posterior, a autora solicita que não seja considerada a mensagem. vii. Ainda na mesma data, a autora envia mensagem requerendo que seja considerada "(...) sem efeito e revogada a comunicação de aceitação de minuta.”. viii. A autora não substitui a primeira mensagem de 07/01/2011, em que procede à aceitação da minuta, por nenhuma outra. ix. A autora nada mais oferece no procedimento. x. A mensagem de notificação para outorga do contrato (referência 205065, cfr. PA) foi remetida em 13/01/2011 e lida pela autora a 14/01/2011. xi. Em 14/01/2011, documento 12 junto à PI, é solicitado à autora que, através da plataforma ANCP/V... informe se vem ou não assinar o contrato. xii. A autora não comparece na data e horas para que foi notificada, e abstém-se de qualquer contacto com a entidade adjudicante. Ora, o facto indicado sob o ponto i) extrai-se do facto provado sob o n.º 3, no qual consta transcrição do relatório final, que não foi impugnado. O alegado sob ii), é uma conclusão, extraível da pronúncia da ora recorrida relativamente ao 2.º relatório preliminar e constante do relatório final (cfr. facto provado n.º 3). A 1.ª parte do ponto iii) é matéria conclusiva e a parte final respeitante à apresentação da garantia bancária consta como matéria provada sob o n.º 5 do elenco dos factos provados. A matéria indicada sob os pontos iv) a ix) respeitante à notificação da minuta do contrato, ao prazo concedido para a autora se pronunciar sobre a mesma, aceitação da minuta e pedido de que seja dada sem efeito e revogada a comunicação de aceitação da minuta e com relevância para a decisão dos presentes autos já consta do probatório sob o n.º 11. A alteração da decisão da matéria de facto só se justifica quando a mesma tenha relevância para a decisão a proferir, o que não sucede quanto a estes pontos. No mais estamos perante juízos conclusivos que não podem ser levados ao elenco dos factos provados. A matéria alegada sob os pontos x) a xii), relacionada com a notificação para a outorga do contrato consta já provada sob os n.ºs 7, 8 e 13 do elenco dos factos provados. Sendo que a parte final da alínea xii) é conclusiva. Em suma os factos que o recorrente pretende que sejam julgados provados e referidos sob os pontos acima elencados extraem-se dos referidos factos provados. Sendo que a matéria conclusiva e a matéria destituída de relevância para a decisão não constitui fundamento de aditamento aos factos provados. Deste modo, a impugnação de facto do recorrente não merece acolhimento e a decisão de facto da sentença recorrida permanece intocada. * 3.2.3. Do erro de julgamento de direitoDa violação do direito de audiência prévia da recorrida Nas conclusões II a VIII o recorrente para além de defender que a sentença é nula por oposição entre os fundamentos e a decisão – o que como já vimos não sucede - insurge-se contra a decisão recorrida por ter anulado o ato impugnado com fundamento na preterição da audiência prévia, dizendo que foi dado cumprimento a esse dever, pois o 2.º relatório final aprovado em 21 de janeiro de 2011 contém o sentido da decisão e respetiva fundamentação, o qual foi notificado à autora que o entendeu, como bem se deduz da sua pronúncia em 28 de janeiro de 2011, que foi devidamente avaliada, como decorre do despacho impugnado de 1 de julho de 2011. Defendeu, ainda, que os vícios de forma não impõem necessariamente a anulação do ato a que respeitam, podendo esta formalidade essencial ser degradada em formalidade não essencial. A recorrida pronunciou-se em sentido contrário dizendo que a notificação à S... do Segundo Relatório Final no qual foi proposta a adjudicação à S… não cumpre minimamente os pressupostos referidos no artigo 100.º do CPA`91, porquanto tal ato não revela qualquer intenção de aplicação de qualquer sanção por parte do órgão decisor, não consubstancia qualquer projeto de decisão de aplicação de sanção de perda de caução, no mesmo não é referido que a entidade demandada pretende aplicar qualquer sanção nem o respetivo fundamento jurídico e factual e muito menos é efetuada qualquer notificação ou comunicação à S... para se pronunciar sobre tais (inexistentes) elementos. Na carta de 28 de Janeiro de 2011, a S... não se pronuncia - como não estava em condições de o fazer - sobre as questões relevantes para a decisão, isto é, sobre a verificação ou não dos pressupostos da caducidade da adjudicação e da perda da caução, sobre a sanção que lhe veio a ser aplicada, e sobre as provas produzidas, pelo que não se pode entender que tal ato consubstancia exercício efetivo do direito de audiência prévia. No que respeita à aplicação do princípio do aproveitamento do ato administrativo à falta de audiência prévia da S... referiu que consubstancia uma questão nova que a recorrente não invocou perante o Tribunal a quo (artigo 83.° do CPTA 2004 e artigo 489.° n.° l do CPC 1995 em vigor à data da prática dos actos processuais), que o Tribunal a quo não conheceu e que, consequentemente, não pode ser apreciada em sede de recurso. Para além de que não é possível afirmar, com certeza e sem margem para dúvidas, que caso a S... tivesse tido a oportunidade de expor à Recorrente a posição expressa nas conclusões XVIII a XL das contra-alegações quanto à não verificação dos pressupostos do artigo 105.º n.º l e 2 do CCP, o entendimento do recorrente não se teria alterado, pelo que o princípio do aproveitamento do ato administrativo não pode operar. Vejamos se assiste razão ao recorrente. No artigo 105.º (4-Na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, aplicável ao caso dos autos.), do Código dos Contratos Públicos (CCP), sob a epígrafe: “Não outorga do contrato” previa-se: “1 - A adjudicação caduca se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, bem como, no caso de o adjudicatário ser um agrupamento, se os seus membros não se tiverem associado nos termos previstos no n.º 4 do artigo 54.º. 2 - Nos casos previstos no número anterior, o adjudicatário perde a caução prestada a favor da entidade adjudicante, devendo o órgão competente para a decisão de contratar adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente. 3 - Se, por facto que lhe seja imputável, a entidade adjudicante não outorgar o contrato no prazo previsto no n.º 1 do artigo anterior, o adjudicatário pode desvincular-se da proposta, devendo aquela liberar a caução que este haja prestado, sem prejuízo do direito a ser indemnizado por todas as despesas e demais encargos em que comprovadamente incorreu com a elaboração da proposta e com a prestação da caução. 4 - No caso previsto no número anterior, o adjudicatário pode, em alternativa, exigir judicialmente a celebração do contrato. 5 - No caso de se tratar de um contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, a não outorga do contrato por parte do adjudicatário deve ser imediatamente comunicada ao Instituto da Construção e do Imobiliário, I. P., pela entidade adjudicante.”. A caducidade depende de um ato jurídico que declare verificada a causa que a determina, não opera, ope legis, como referem Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira (5-In Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina, maio de 2011, pág. 1034-1041.). “A caducidade da adjudicação é um efeito ou consequência inelutável da ocorrência de factos que, segundo a lei, a produzem (...) mas não se trata de um efeito produzido exclusivamente ope legis, independentemente de uma declaração ou de um acto jurídico em que se dê como verificada a causa que a determinou” (...) A necessidade de uma declaração expressa justifica-se dados os drásticos efeitos da caducidade da adjudicação e a circunstância de na sua origem estarem (poderem estar) factos juridicamente censuráveis do adjudicatário - declaração, essa, que, para nós, configura um acto administrativo declarativo de efeitos constitutivos. (...) sendo a caducidade da adjudicação consequência de uma conduta (pelo menos, objectivamente) censurável do adjudicatário - que deixou assim de honrar o compromisso de celebrar o contrato, que assumira com a apresentação da proposta - mais se requer ao órgão adjudicante que lha impute formalmente. (…) Finalmente, decorre da caducidade da adjudicação, pelo menos daquela que resulta de facto censurável do adjudicatário, constituir-se este em responsabilidade pelos prejuízos causados à entidade adjudicante em virtude da decadência da respetiva proposta, de não se honrarem os compromissos de celebração do contrato assumidos com a sua apresentação. (…) Note-se que a caducidade da adjudicação, se já tiver sido prestada caução, não leva à perda desta senão no caso de falta de comparência à outorga do contrato (art. 105.º/2)”. A decisão de caducidade da adjudicação deve ser precedida de audiência prévia do adjudicatário em conformidade com o previsto no artigo 100.º do CPA`91 (6-Aqui aplicável, atenta a data dos factos.), que previa “Concluída a instrução, e salvo o disposto no artigo 103.º, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.”, em conformidade com o comando constitucional previsto no artigo 267.º, n.º 5 da CRP. No caso da não outorga do contrato deve haver audiência prévia antes da declaração da caducidade da adjudicação, pois importa apurar se o facto é imputável ao adjudicatário (7-Neste sentido, v.j. Pedro Costa Gonçalves, in Direito dos Contratos Públicos, 3.ª edição, Almedina, pág. 984.). Não subsistem dúvidas que a declaração da caducidade da adjudicação depende de um juízo avaliativo a efetuar pela entidade adjudicante acerca da verificação da imputabilidade ao adjudicatário da causa da caducidade da adjudicação – no caso da não comparência no dia e hora designados para a adjudicação, devendo tal decisão ser precedida de audição prévia. Verificada ou declarada a caducidade da adjudicação, por facto que seja imputável ao adjudicatário, a declaração de caducidade da adjudicação tem como consequência a perda da caução prestada a favor da entidade adjudicante, e a adjudicação da proposta ordenada em lugar subsequente – cfr. artigo 105.º, n.º 2, do CCP. Ora, no caso dos autos a caducidade da adjudicação foi verificada em 21 de janeiro de 2011, nos termos constantes do “2.° Relatório Final” e nessa mesma data foi proposto “ao Sr. Director-Geral dos Impostos que adjudique o lote 3 do procedimento 43 (36/UMC/MFAP/2010) ao concorrente S…, SA, pelo valor da sua proposta”. Este “2.º Relatório Final” foi notificado à ora recorrida nesse mesmo dia 21 de janeiro de 2011 e do mesmo constava o seguinte: “[...] Por despacho de 28 de Dezembro de 201[0], do Sr. Director-Geral dos Impostos (…) foi aprovado o Relatório Final deste procedimento e adjudicado o respectivo lote 3 ao concorrente da S... - Segurança, SA. Desta adjudicação foi notificado ao adjudicatário no dia 29 de Dezembro de 2010. A S... apresentou os documentos de habilitação e a garantia bancária que se impunha, no dia 3 de janeiro de 2011. (…) Não tendo sido apresentada reclamação sobre a minuta do contrato, em 13 de janeiro de 2011, foi o adjudicatário notificado para a outorga do contrato para o dia 21 Janeiro de 2011, às 10H30 (…) A mensagem de notificação para a outorga do contrato foi lida pelo adjudicatário, no dia 14 de Janeiro de 2011. No dia e hora marcados, não compareceu nas instalações da Direcção-Geral dos Impostos qualquer representante da S... - Segurança, SA para a outorga do contrato. Nos termos do n.º 1 do artigo 105.° do CCP, a adjudicação caduca ser, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato. De harmonia com o disposto no n.º 2 do mesmo dispositivo legal, o adjudicatário perde a favor da entidade adjudicante a caução prestada, devendo o órgão competente para a decisão de contratar, adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente. […] Nestes termos, tendo ocorrido a caducidade da adjudicação efectuada, propõe-se ao Sr. Director-Geral dos Impostos que adjudique o lote 3 do procedimento 43 (36/UMC/MFAP/2010) ao concorrente S…, SA, pelo valor da sua proposta (...)”. Nesta sequência, em 28 de janeiro de 2011 a ora recorrida pronunciou-se nada dizendo sobre a caducidade da adjudicação do lote 3 do referido procedimento e a consequente adjudicação do mesmo à concorrente S…, pelo valor de € 2.100.000,48. Tendo-se pronunciado apenas quanto à perda da caução, nos termos do art.º 105.º, n.º 2 do CCP, a favor da entidade adjudicante, dizendo que nos termos do artigo 296.º, n.º 1, b) a execução da caução, deverá ser pelo prejuízo incorrido pelo contraente público. Ou seja, a “S... apresentara uma proposta no valor de € 2.096.887,20, sobre a qual mais tarde, se pronunciou alegando um erro pelo que pediu que a mesma não fosse adjudicada, razão pela qual não compareceu para assinatura do contrato.”. Mais referindo que “a entidade adjudicante, conforme se diz no 2.º Relatório Final do Procedimento n.º 43, adjudicou a prestação do serviço à concorrente que ficara em segundo lugar, a saber, a S…, com uma proposta de € 2.100.00,48. O prejuízo para o contraente público é pois a diferença entre os valores da primeira e da segunda propostas, isto é, € 3.113,28 (…). Solicita-se pois a V. Exa, que caso a entidade adjudicante venha a executar a referida garantia bancária, o faça pelo prejuízo de € 3.113,28” – cfr. ponto 16 dos factos provados. Assim, ainda que a ora recorrida não tivesse sido expressamente notificada para exercer o direito de audiência prévia, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 100.º e 101.º, n.º 1 do CPA`91, foi notificada do entendimento expresso pelo júri no 2.º relatório final de que a S... apresentou os documentos de habilitação e a garantia bancária que se impunha, no dia 3 de janeiro de 2011; não tendo sido apresentada reclamação sobre a minuta do contrato, em 13 de janeiro de 2011, foi o adjudicatário notificado para a outorga do contrato para o dia 21 Janeiro de 2011, às 10H30; a mensagem de notificação para a outorga do contrato foi lida pelo adjudicatário, no dia 14 de Janeiro de 2011; no dia e hora marcados, não compareceu nas instalações da Direcção-Geral dos Impostos qualquer representante da S... Segurança, SA para a outorga do contrato; nos termos do n.º 1 do artigo 105.° do CCP, a adjudicação caduca ser, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato. Entendendo, assim, o júri que em face da não comparência da S... na data e hora da assinatura do contrato ocorreu a caducidade da adjudicação, nos termos do n.º 1 do artigo 105.º do CCP por facto que lhe é imputável, e que de “harmonia com o disposto no n.° 2 do mesmo dispositivo legal, o adjudicatário perde a favor da entidade adjudicante a caução prestada, devendo o órgão competente para a decisão de contratar, adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente.”. Constava, ainda, da referida notificação que “tendo ocorrido a caducidade da adjudicação efectuada, propõe-se ao Sr. Director-Geral dos Impostos que adjudique o lote 3 do procedimento 43 (36/UMC/MFAP/2010) ao concorrente S…, SA, pelo valor da sua proposta”. Em face desta notificação, a ora recorrida compreendeu bem o sentido da proposta do júri, como resulta da resposta que enviou ao recorrente em 28 de janeiro de 2011 – cfr. facto provado n.º 16 – da qual se infere que aceitou a adjudicação do lote 3 à concorrente S…, discordando apenas da perda total da caução, propondo em alternativa que a mesma fosse reduzida ao montante que considerava adequado e proporcional a ressarcir os prejuízos que no seu entender sofreu o contraente público decorrentes da adjudicação da proposta subsequente. Ainda que a notificação não tenha sido efetuada indicando os normativos aplicáveis, para efeitos de exercício do direito de audição prévia, assim como não lhe foi fixado prazo para emitir a respetiva pronúncia, à ora recorrente foi facultado o projeto de decisão, no qual o júri propôs à entidade adjudicante a declaração da caducidade da adjudicação da proposta da autora e a adjudicação da proposta subsequente, podendo, assim, a ora recorrida pronunciar-se sobre o projeto de decisão de caducidade da adjudicação, tendo optado por não o fazer. Limitando, voluntariamente, a sua pronúncia apenas a uma parte das consequências resultantes da declaração da caducidade da adjudicação, ou seja, à aplicação da perda da caução. Não pode assim concluir-se que ocorreu preterição do direito de audiência prévia dado que a autora pode pronunciar-se sobre o projeto de decisão de perda da caução, e efetivamente pronunciou-se, tendo as observações apresentadas sido levadas em consideração no ato impugnado, nos seguintes termos: “Nos termos do n.º 1 do artigo 105.º do CCP, a adjudicação caduca se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, facto que foi comunicado a todos os concorrentes que apresentaram propostas - Anexo III. Na comunicação supra referida, foi anexado o 2.º Relatório Final, no qual se refere que, de harmonia com o disposto no art.° 105.º n.º 2 do CCP, a caução prestada pela S... se considera perdida a favor da entidade adjudicante. Em 28/1/2011, a S... vem reagir a esta intenção, através de carta dirigida à Sra. Directora de Serviços da UMC da SG do MFAP - Anexo IV. Não contestando a perda da caução, põe em causa o valor a considerar, uma vez que argumenta que não deve ser a totalidade do valor da mesma, mas sim a diferença que resulta entre o valor do contrato que era para ser celebrado pela S..., e o que veio a ser celebrado com o concorrente posicionado em 2.° lugar Analisados os argumentos expostos pela S..., os mesmos não merecem provimento, considerando que a função da caução é apenas caucionar a celebração e o cumprimento do contrato, não constituindo uma figura indemnizatória. Face ao exposto, e considerando que a falta não justificada do adjudicatário à outorga do contrato implica a perda da caução prestada, conforme determina o art.º 105.º n.º 2 do CCP, proponho que seja notificada a empresa S... SA. nos termos do ofício anexo.” – cfr. pontos 16 a 19 dos factos provados. Assistindo, assim, razão ao ora recorrente, não podendo considerar-se que foi preterido o direito de audição prévia da recorrida. Refira-se, ainda, que a questão da aplicação do denominado princípio da degradação das formalidades essenciais em não essenciais não configura uma questão nova, inserindo-se nos poderes de aplicação da lei pelo Tribunal, dado que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – cfr. artigo 5.º, n.º 3 do CPC. Bastando que as partes aleguem os factos essenciais que constituem a causa de pedir, o que se verifica nesta situação. Razão pela qual não estamos perante uma questão nova. Como se concluiu, entre muitos outros, no acórdão do STA de 27.04.2016, proc. n.º 0288/15 “Os recursos são meios para obter o reexame das questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre”. Com efeito, os recursos, como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na jurisprudência, têm por objeto a reapreciação de decisões anteriores - visando anulá-las ou alterá-las com fundamento em vício de forma (nulidade) ou de fundo (erro de julgamento) – e não a decisão de questões que não foram anteriormente suscitadas. E no caso foi submetida ao Tribunal a quo a apreciação da questão da preterição da audiência prévia, tendo as partes alegado os factos e efetuado o enquadramento jurídico considerados pertinentes, não estando, como já referido, o Tribunal vinculado ao enquadramento jurídico feito pelas partes, razão pela qual não está vedado a este Tribunal de recurso apreciar a questão da preterição da audiência prévia e de efetuar o seu enquadramento jurídico, designadamente na vertente da aplicação do princípio do aproveitamento do ato administrativo ou da degradação das formalidade essenciais em formalidades não essenciais. A discricionariedade da Administração ou margem de livre apreciação ou decisão administrativa, neste caso, está limitada à verificação da imputabilidade ou não à recorrida da não comparência no ato de celebração do contrato sendo que concluindo o recorrido nesse sentido, como concluiu, aquando da declaração de caducidade da adjudicação e da subsequente adjudicação da proposta graduada de seguida – ato este que não foi impugnado nos presentes autos -, o efeito da perda de caução é vinculado, atento o teor do disposto no artigo 105.º, n.º 2 do CCP, pelo que não estamos perante uma impossibilidade de aproveitamento do ato que determinou a perda da caução prestada pela recorrida a favor do Estado. Com efeito, da factualidade provada resulta que a recorrida não pretendia celebrar o contrato nos termos em que se vinculou na proposta apresentada e como se sabe a proposta deve manter-se inalterada, sob pena de violação designadamente dos princípios da intangibilidade da proposta, da concorrência, da transparência e da igualdade. Não há o mínimo indício nos autos de que a autora pretendesse celebrar o contrato nos termos em que se vinculou, não obstante vir dizer em sede de processo judicial que celebraria o contrato, o certo é que não o alegou quando foi notificada da caducidade da adjudicação e da decisão de adjudicação ao concorrente classificado em 2.º lugar – cfr. pontos 14 a 16 do probatório. Pelo contrário o que resulta provado nos autos é que transmitiu pessoalmente que a S... não assinaria o contrato, e que ainda que solicitado a fazê-lo por escrito, em 14 de janeiro de 2011, não o fez, sendo que não compareceu na data e hora designadas para a assinatura do contrato – cfr. factos provados n.ºs 12 e 13. Em face do que nada emerge dos autos que permita indiciar, sequer, que a falta de comparência da S... não lhe é imputável. Pelo contrário, numa situação, como a que está em causa nos autos, impunha a diligência mínima que fosse justificada, por iniciativa da S..., a razão pela qual não pode comparecer ao ato para o qual estava devidamente notificada, o que não sucedeu. O que levou a entidade adjudicante a declarar a caducidade da adjudicação da proposta da S... e a adjudicar a proposta da S…. Note-se que nos presentes autos não foi impugnada a decisão de declaração de caducidade da adjudicação e de adjudicação da proposta da S…, mas tão-somente a decisão de 4 de julho de 2011 que considerou perdida a favor do Estado a caução prestada pela recorrida. De todo o modo, estando demonstrado o fundamento que determinou a não comparência da recorrida no local e hora designados para a assinatura do contrato – a ausência de vontade de cumprir a proposta apresentada uma vez que, como a própria recorrida referiu a proposta terá sido apresentada em erro “pelo que pediu que a mesma não fosse adjudicada, razão pela qual não compareceu para assinatura do contrato” (cfr. designadamente facto provado n.º 16) – não pode senão considerar-se que tendo sido declarada a caducidade da adjudicação e adjudicada a proposta da concorrente S…, ato com a qual a ora recorrida se terá conformado, ou pelo menos não alegou e consequentemente não provou que o tivesse impugnado, o ato impugnado que considerou a caução perdida a favor do Estado não poderia ser outro senão a consequente perda da caução já prestada, atenta a previsão do artigo 105.º, n.º 2, do CCP. Nada obstando, assim, à aplicação do princípio do aproveitamento do ato administrativo de perda da caução a favor do Estado – pelo facto de a ora recorrida não ter sido expressamente notificada para exercer o direito de audição prévia, com menção das normas aplicáveis, o que no caso não impediu o exercício desse direito e a ponderação das observações pelo recorrente - não pode manter-se a decisão recorrida na parte que concluiu que o ato administrativo impugnado deve ser anulado com fundamento na preterição da audiência prévia. * Da violação do disposto no artigo 105.º, n.º 2, do CCPNas conclusões XXVIII a XXX o recorrente invoca a existência de erro de julgamento de direito fundado na violação do disposto no artigo 105.º, n.º 2, do CCP, dado que se impunha à Administração, vinculada que está ao princípio da legalidade decidir com decidiu acionando o mecanismo do n.º 2 do artigo 105.º do CCP. Defendeu que “a caução exigida ao adjudicatário, prestada pela ora requerente, e objecto dos presentes autos, destina-se a “(...) garantir a sua celebração (...)” - a celebração do contrato – n.º 1 do art. 88° do CCP, negrito nosso. Ao invés do regime anterior, do RJEOP (n° 1 do art. 112°), a caução prevista no art. 88° do CCP, não se limita ao cumprimento do contrato, “(...) é também destinada a garantir a própria celebração do contrato, assim se regressando à função da antiga caução provisória (...)” - Jorge Andrade da Silva, in “Código dos Contratos Públicos Comentado e Anotado’’, Almedina, 3.ª ed. 2010.”. Defendeu, ainda, que ao contrário do pretendido pela requerente, mas como bem demonstrado ficou, à adjudicatária é inteiramente imputável a não comparência, no dia e hora fixados, para a assinatura do contrato. A recorrida por seu lado referiu, em suma, que o juízo de imputabilidade da não comparência deve ser efetuado de acordo com a gravidade do incumprimento, os motivos invocados para o incumprimento e as consequências da decisão, à luz do princípio da proporcionalidade. Referiu nas conclusões “XX. A S... apresentou a sua proposta com base em erro já que propôs o preço total, para o Lote 3, de 2.096.887,20€ quando a sua intenção era de propor o preço total de 2.380.662,62€ (alíneas 8), 9] e 10) dos Factos Assentes). XXI. Como expressamente decidido a fls. 24 da sentença recorrida, e não impugnado pela Recorrente, o erro material que inquinava a proposta da S... era rectificável (artigo 56.° n.°l do CCP e artigos 249.° e 250.° do CC). (…) XXV. Face a tal posição, a S... tentou obter uma solução consensual junto do Júri já que a assinatura de um contrato baseada numa proposta viciada em erro traduzir-se-ia na celebração de um contrato não querido pela S... e, assim, numa violação intolerável do princípio da liberdade contratual e da livre formação da vontade (artigo 405.° CC).”. Defendeu que tinha um fundamento legítimo para a sua intenção de não comparecer à assinatura do contrato, adotou as diligências possíveis para evitar que o procedimento prosseguisse até essa fase, comunicou à Recorrente a sua intenção de não comparecer à assinatura do contrato, o que a Recorrente reconheceu, e ficou convicta que tal assinatura havia sido dada sem efeito, pelo que a não assinatura do contrato não é imputável à S... (conclusão XIX). Vejamos. A ora recorrida só nas presentes alegações veio referir que a proposta enfermava de erro material retificável (artigo 56. ° n.º l do CCP e artigos 249.° e 250. ° do CC). Com efeito, a S..., na sequência do Segundo Relatório Preliminar e ainda na fase de análise e avaliação das propostas, invocou que a proposta tinha sido apresentada com base em erro de digitação (sem que concretizasse em que consistiu esse erro), mas não num erro de escrita ou de cálculo ou ainda num erro na transmissão da declaração – cfr. artigo 72.º, n.º 4 do CCP e 249.º e 250.º do CC. Na verdade, em sede de petição inicial defendeu que o erro consistia na “errada determinação do preço”, o qual se traduzia numa venda com prejuízo, nunca tendo sido invocado um qualquer erro de escrita. Sendo que a impugnação do recorrente ainda que não refute diretamente esta qualificação jurídica feita ex novo na sentença recorrida impugna a sentença imputando-lhe erro de julgamento na aplicação do artigo 105.º, n.º 2, do CCP. Na verdade, em face da pronúncia sobre o relatório preliminar apresentada pela recorrida, o júri em sede de relatório final considerou o seguinte: “o concorrente S... vem expressamente alterar o preço hora do serviço diurno excluindo feriados de € 7,32 e o valor global da proposta de 2.096.887,20 constantes da sua proposta /vide Anexo VI), respetivamente, para € 8,32 e € 2.383.347,20, o que não pode ser aceite, uma vez que tal alteração constitui uma verdadeira alteração à sua proposta, quando o mesmo não pode alterar os atributos da proposta apresentada. Desta forma não pode ser atendível esta alteração apresentada pelo concorrente S..., pois a proposta é imutável desde a data do termo para a apresentação da mesma até ao prazo da obrigação da sua manutenção, que in casu é de 90 dias, nos termos da alínea b) do ponto VII do Convite e vide n.° 2 do artigo 72.° e artigo 65.° do CCP. (…) 27. Assim sendo, não é alterado, suprimido ou acrescentado qualquer factor de exclusão nem, a ordenação de propostas exposta no 2° relatório preliminar deste procedimento, pelo que o júri reitera todo o seu teor e propõe aos órgãos com competência para autorizar a despesa, a adjudicação dos seguintes lotes, aos concorrentes indicados, pelos valores das respectivas propostas, que fica junto a este relatório, dele fazendo parte integrante: […] Lote 3 - Para a vigilância das instalações do DGCI sitas em Lisboa (...) e ainda em Setúbal (...), ao concorrente S... Segurança, S.A., pessoa colectiva n.° 1..., pelo valor total de € 2.096.887,20, acrescido de IVA.” – cfr. ponto 3 dos factos provados. Nesta sequência e como resulta dos factos provados por despacho de 28 de dezembro de 2010, do Diretor Geral dos Impostos foi aprovado o Relatório Final do procedimento e adjudicado à Requerente o respetivo lote 3. Notificada da adjudicação, a Autora entregou na DGCI, quer os documentos de habilitação, quer a garantia bancária a que aludem os artigos 89.° e 90.° do Código dos Contratos Públicos (CCP). Esta garantia bancária foi emitida pelo valor de Euros 104.844,36 (Cento e quatro mil oitocentos e quarenta e quatro euros e trinta e seis cêntimos) – cfr. factos provados 4 a 6. No dia 13 de janeiro de 2011, a requerente foi notificada para a assinatura do Contrato, a qual teria lugar no dia 21 de janeiro de 2011, às 10h 30m na sede da Direcção Geral dos Impostos na Rua da Prata n.º 10 em Lisboa. Sucede que em 14 de janeiro, o recorrente enviou à recorrida, dirigida a “Dr. M…”, uma comunicação na qual se referia “Enviei ontem uma mensagem na plataforma ANCP/V... a notificar a S... para a assinatura do contrato com a DGCI, relativamente ao lote 3 do proc. 43 (36/UMC/MFP/2010) - vigilância para as instalações de Lisboa. A manter-se a posição da S... que me transmitiu pessoalmente, agradecia sua disponibilidade para informar-me, através da citada plataforma, que essa Empresa não vem assinar o contrato. Esta mensagem apenas reduziria o lapso de tempo necessário para a elaboração de um novo Relatório Final, a adjudicar ao 2.° classificado no mesmo lote. Porém tal decisão fica ao seu critério, como é óbvio.”. O certo é que não se provou que a recorrida tivesse efetuado qualquer comunicação ao recorrente em resposta a este pedido de informação “através da citada plataforma, que essa Empresa não vem assinar o contrato”. Tendo-se, no entanto, provado que a autora, ora recorrida, não compareceu na data e hora designadas para a assinatura do contrato. E que nesta sequência e no mesmo dia designado para a outorga do contrato, o júri do procedimento elaborou o “2.º Relatório Final”, no qual considerando que a não outorga do contrato ocorreu por facto que imputável à adjudicatária, ora recorrida, concluiu que ocorreu a caducidade da adjudicação da proposta da autora e propôs a adjudicação da proposta da S… quanto ao lote 3 – cfr. factos provados 14 e 15. A ora recorrida não impugnou a decisão de declaração da caducidade da adjudicação da sua proposta, e de adjudicação da proposta subsequente, impugnando apenas a decisão que determinou a perda total da caução, como já referido. Com efeito, o artigo 88.º, n.º 1 do CCP dispunha que “[n]o caso de contratos que impliquem o pagamento de um preço pela entidade adjudicante, deve ser exigida ao adjudicatário a prestação de uma caução destinada a garantir a sua celebração, bem como o exacto e pontual cumprimento de todas as obrigações legais e contratuais que assume com essa celebração.”. A “celebração do contrato pode ser precedida da prestação, pelo adjudicatário, de uma caução destinada, primeiro, a garantir a sua comparência na data marcada para a sua outorga (8-Pedro Fernández Sanchez, Direito da Contratação Pública, vol II, 2.ª Edição, pág. 641.)”. A perda da caução é um ato vinculado, trata-se de uma consequência da declaração da caducidade da adjudicação – cfr. artigo 105.º, n.º 2, do CCP. Como refere Pedro Gonçalves “Embora se trate de uma consequência prevista apenas no artigo 105.º, n.º 2, a caducidade da adjudicação implica, em todos os casos, a perda da caução que já tiver sido prestada a favor da entidade adjudicante: eis o que resulta de a prestação de caução se destinar (também) a garantir a celebração do contrato, nos termos do artigo 88.º, n.º 1 (9-In obra citada, págs. 987-988.)”. Não obstante não ter sido impugnado, nos presentes autos, o ato que declarou a caducidade da adjudicação e adjudicou a proposta ordenada em lugar subsequente – da S… - ainda diremos que emerge da factualidade provada que a não outorga do contrato ocorreu por facto imputável à adjudicatária, ora recorrida, que apresentou proposta ao denominado lote 3, e que estava obrigada a mantê-la pelo prazo de 90 dias, em conformidade com o previsto nos artigos 65.º, 72.º, n.º 2 e 137.º do CCP e nos termos da alínea b) do ponto VII do Convite. Com efeito, notificada que foi da decisão de adjudicação, para apresentar os documentos de habilitação e prestar caução, aceitou tacitamente aquela decisão, pois apresentou os documentos, prestou caução e aceitou a minuta do contrato. Assim, tendo a S... apresentado uma proposta que estava obrigada a manter pelo prazo de 90 dias, não se pode concluir que a assinatura de um contrato baseada nessa proposta traduzir-se-ia numa violação intolerável do princípio da liberdade contratual e da livre formação da vontade (artigo 405.° CC). É certo que se provou que, posteriormente, informou o Ministério das Finanças de que a informação de aceitação da minuta contratual tinha sido introduzida na plataforma por lapso. No entanto, solicitada, em 14 de janeiro de 2011, a informar através da plataforma que “essa Empresa não vem assinar o contrato”, nada disse, não tendo, no entanto, comparecido na data e hora designados para a assinatura do contrato, sem que tenha apresentado justificação para a ausência, conformando-se com a declaração da caducidade da adjudicação – cfr. factos provados 11 a 16. Deste modo, concluindo-se que por facto que lhe é imputável, a adjudicatária, ora recorrida, não compareceu no dia e hora fixados para a outorga do contrato, tendo sido declarada a caducidade da adjudicação por facto que lhe é imputável, estão verificados os requisitos para aplicação da estatuição do artigo 105.º, n.º 2, do CCP – perda da caução prestada a favor da entidade adjudicante, tendo a sentença recorrida incorrido em violação desta norma legal, por ter considerado que a não comparência no dia e hora fixados para a outorga do contrato não pode imputar-se à autora ora recorrida. Termos em que procede este fundamento do recurso. * Da violação dos princípios da boa-fé e da tutela da confiança e da proporcionalidadeDefendeu o recorrente que se ocorreu violação dos princípios da boa-fé e da tutela da confiança, essa violação foi perpetrada pela autora. Ao contrário do afirmado na sentença, a A. pese embora tenha informado do lapso, conformou-se com ele, não tendo reclamado ao contrário do que fez quanto ao lote 2. E, ao contrário igualmente do afirmado na sentença, não agiu de boa-fé, porquanto tendo-lhe sido solicitado para responder e para inserir resposta na plataforma, nada fez, sequer reagiu à notificação com a data e hora de celebração do contrato. Pelo que, com toda a legitimidade, sendo, como é, o alegado erro conhecido da autora desde 03/12/2010, não tendo a autora exercido o direito de audição quanto ao mesmo (apenas o tendo feito quanto ao lote 2), não tendo deduzido impugnação da decisão final, tendo apresentado todos os documentos para a assinatura do contrato e a garantia bancária correspondente, e não tendo respondido à notificação de 13/01/2011, nem à mensagem de 14/01/2011, foi criada, pela Administração, a expectativa de celebração do contrato. O incumprimento da autora estende-se ao incumprimento da obrigação de contratar, ou seja, à não celebração do contrato, no dia e hora marcados. Está em causa, não só a não manutenção da sua proposta, como também o atraso sofrido pela administração na aquisição do serviço que pretendia contratar e de que deixou de beneficiar enquanto não foram reunidos os requisitos para a celebração de outro contrato com a concorrente colocada em 2.º lugar. Ademais, a perda da garantia bancária a favor do adjudicante não tem a natureza de indemnização. Tem uma função preventiva, dissuasora de certas condutas - umas negligentes, outras resultantes de estratégias de grupo de empresas. O ato de concorrer a um concurso público, de aceitar uma adjudicação e fazer junção de toda a documentação necessária à celebração do contrato, a prestação de garantia, quando se estava ciente de uma alegada incorreção no valor proposto, não é visto pelo ordenamento jurídico como ato desprovido de consequências na esfera jurídica de quem o vem perpetrando. Razão pela qual a lei determina, sem qualquer ressalva, a perda da caução – n.º 2 do artigo 105.º do CCP. E perda na sua totalidade. Sendo, portanto, inaceitável a conclusão da decisão sob recurso quanto à violação do princípio da proporcionalidade. A recorrida por seu lado referiu que nas suas relações com a Recorrente, pautou-se por uma conduta transparente e de boa-fé tendo alertado para a situação de erro em momento anterior à decisão de adjudicação (não obstante tal lhe ser desfavorável) e numa fase procedimental em que ainda era possível a correção da sua proposta com as inerentes consequências evitando-se toda a situação que se veio a verificar posteriormente, posição que manteve mesmo após a decisão de adjudicação. Nunca criou na Recorrente a expectativa de que iria celebrar o contrato, tendo mantido uma conduta constante com a sua intenção de não celebrar contrato com aquele conteúdo. O recorrente, ao recusar aceitar a correção do erro na proposta da S... e ao criar na S... a legítima expectativa de que a assinatura do contrato havia ficado sem efeito (que posteriormente frustrou ao aplicar a sanção prevista para a falta de comparência) não adotou a conduta leal e correta a que estava adstrita nos termos dos artigos 6.°-A e 7.° do CPA 1991. A S... investiu nessa situação de confiança criada pela Recorrente, adotando um comportamento coerente com a mesma (isto é, não estando presente no dia 21 de janeiro de 2011 para a assinatura do contrato), pelo que a aplicação da sanção prevista para a falta de comparência é também violadora do princípio da boa-fé e da tutela da confiança. O princípio da proporcionalidade rege toda a atividade administrativa (artigo 5.º n.º 2 do CPA 1991) e deve ser aplicável também na decisão de perda de caução (designadamente no juízo que a antecede sobre a imputabilidade da não comparência ao adjudicatário). É inconstitucional, por violação do princípio da proibição do excesso (artigo 18.º n.º 2 da CRP), qualquer interpretação do artigo 105.° n.°2 do CCP no sentido de que a perda da caução será sempre integral, independentemente das circunstâncias concretas do caso (designadamente, mesmo nos casos em que gravidade do incumprimento pelo adjudicatário é diminuta, a culpa do adjudicatário é diminuta e os prejuízos gerados à Administração pela caducidade da adjudicação são (substancialmente) inferiores ao valor da caução). A considerar que a S... incumpriu qualquer obrigação, a gravidade de tal incumprimento sempre havia de se entender como diminuta tal como o é também a culpa da S.... Não ficou demonstrado que a não celebração do contrato tenha causado quaisquer prejuízos à Recorrente, nem esta os alegou, identificou ou quantificou e menos ainda demonstrou. Tendo a Recorrente adjudicado os serviços à concorrente classificada em segundo lugar no mesmo dia em que estava inicialmente designada a data de assinatura do contrato com a S... a Recorrente não teve quaisquer prejuízos. É claramente atentatório do princípio da proporcionalidade que a Recorrente exija à S... o pagamento da quantia de 104.844,36€ quando não sofreu quaisquer prejuízos com a não celebração do contrato, ainda para mais quando o motivo para a não celebração do contrato foi o erro em que, involuntariamente, a S... incorreu na formulação da sua proposta de preço, erro do qual a entidade adjudicante teve conhecimento em momento anterior à adjudicação, que se recusou a aceitar que fosse corrigido e que aceitou como constituindo fundamento bastante para a não celebração do contrato. Vejamos. A sentença recorrida decidiu que o recorrente incorreu em violação dos princípios da boa fé, da confiança e da proporcionalidade, com a seguinte fundamentação: “A Autora informou a entidade adjudicante do erro material constatado na sua proposta, em relação ao preço apresentado (cf. n° 9 e 10 do probatório). Agiu de Boa Fé, tendo procurado não trair a confiança da adjudicante, através de comunicações posteriores (cf. n° 12 do probatório). A perda da caução a favor da entidade adjudicante seria sanção manifestamente desproporcionada, atendendo ao elevado montante da caução (n° 6 do probatório).”. O artigo 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa estabelece: “Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.”. Estabelecia o artigo 6.º-A do CPA`91, sob a epígrafe: “princípio da boa-fé”, o seguinte: “1. No exercício da actividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa fé. 2. No cumprimento do disposto no número anterior, devem ponderar-se os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas, e, em especial: a) A confiança suscitada na contraparte pela actuação em causa; b) O objectivo a alcançar com a actuação empreendida.”. Em anotação a este artigo Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco de Amorim, in Código do Procedimento Administrativo, comentado, 2ª Edição, Almedina, pág. 110-113 referem que as potencialidades do princípio da boa fé podem resumir-se a dois vectores básicos, “um de sentido negativo, em que se visa impedir a ocorrência de comportamentos desleais e incorrectos (obrigação de lealdade) e um de sentido positivo, mais exigente em que se intenta promover a cooperação entre os sujeitos (obrigação de cooperação). Naquele primeiro sentido, podem subsumir-se certas exigências típicas da boa –fé, tais como a inadmissibilidade, em certas condições da invocação de vícios formais, a proibição de venire contra factum proprium (ou proibição do comportamento contraditório) (…) Parece-nos, por tudo, que o preceito deve ser lido de uma maneira bem cautelosa e reservada. (…) E não dispensa, certamente, também da necessidade de adaptar a boa fé às realidades juspublicisticas, sobretudo à relevância que representa, no direito administrativo, o interesse público legalmente definido. (…) a confiança criada, a boa fé não é factor isolado de valorização de uma conduta jurídico-administrativamente relevante.”. Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos referem, in Direito Administrativo Geral, Tomo I, Dom Quixote, 1ª Edição, outubro de 2004, pág. 216 que “O princípio da tutela da confiança visa salvaguardar os sujeitos jurídicos contra actuações injustificadamente imprevisíveis daqueles com quem se relacionem. (…) A tutela da confiança pressupõe a verificação de diversas circunstâncias: primeira, uma actuação de um sujeito de direito que crie a confiança, quer na manutenção de uma situação jurídica, quer na adopção de outra conduta; segunda, uma situação de confiança justificada do destinatário da actuação de outrem (…) bem como a presença de elementos susceptíveis de legitimar essa convicção não só em abstracto mas em concreto; terceiro a efectivação de um investimento de confiança, isto é, o desenvolvimento de acções ou omissões, que podem não ter tradução patrimonial, na base da situação de confiança; quarto o nexo de causalidade entre a actuação geradora de confiança e a situação de confiança, por um lado, e entre a situação de confiança e o investimento de confiança por outro; quinto, a frustração da confiança por parte do sujeito jurídico que a criou. (…)”. Ora, no caso sub iudice não se verificam os pressupostos para que se possa considerar que o recorrente incorreu em violação do princípio da boa fé e da tutela da confiança, pois, como resulta da factualidade provada toda a atuação da entidade adjudicante foi no sentido de adjudicar a proposta da autora, ora recorrida e de celebrar com a mesma o contrato referente ao lote 3, em conformidade com a vinculação manifestada pela mesma no procedimento pré-contratual em causa, ainda que a recorrida tenha emitido pronúncia em sede de audiência prévia no sentido de alterar a proposta. O certo é que, ainda, assim, o recorrente entendeu que a recorrida estava vinculada à proposta apresentada e que não podia deixar de a adjudicar, nos termos das normas legais e regulamentares aplicáveis e dessa forma praticou todos os atos tendentes à celebração do contrato, o que não veio a suceder, dado a recorrida não ter comparecido no dia e hora que lhe foi indicado para tal, como já está suficientemente explicitado, e cuja fundamentação ou explicitação aqui damos por inteiramente reproduzidos, o que levou à declaração de caducidade da adjudicação e à consequente determinação de perda da caução a favor do Estado. Ora, da factualidade provada não emerge que o recorrido tivesse aceitado a alteração da proposta que a autora apresentou e que com essa aceitação tivesse desistido de praticar o ato impugnado, pelo contrário toda a atuação do recorrente foi no sentido da prolação do ato impugnado, tendo de resto, solicitado, à recorrida que informasse através da plataforma ANCP/V... “que essa empresa não vem assinar o contrato”, que não deu qualquer resposta a esta comunicação. Em face de todo o exposto que se pode concluir que estamos perante uma situação de violação do princípio da boa fé, na denominada vertente da tutela da confiança – cfr. artigo 6.º-A do CPA`91. Por outro lado, a perda da caução é uma consequência que resulta diretamente da lei nas situações em que por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, sem que tenha apresentado justificação para a ausência, como sucedeu neste caso. Tendo a entidade adjudicante decidido declarar a caducidade da adjudicação, com os fundamentos acima analisados – sem que a autora tenha reagido contra este ato, seja mediante impugnação administrativa, seja judicial – não há lugar à aplicação do princípio da proporcionalidade para efeitos de redução da caução. Pois, o princípio da proporcionalidade deve ser observado no exercício da atividade discricionária da Administração, na qual esta detenha liberdade para escolha de alternativas comportamentais, funcionando como limite interno dessa atividade, não relevando, pois, no domínio da sua atividade vinculada, consistente esta na subsunção à previsão normativa dos comandos legais vigentes de um dado caso concreto. Com efeito, verificados que sejam os pressupostos para a declaração da caducidade da adjudicação e declarada que seja a caducidade, a perda da caução resulta diretamente da lei – cfr. artigo 105.º, n.º 2, do CCP -, não havendo que atender, designadamente, à gravidade do incumprimento e/ou culpa do adjudicatário ou aos prejuízos gerados à Administração pela caducidade da adjudicação, dado a caução, nesta situação, ter um efeito de garantia da celebração do contrato, ou seja uma função compulsória e não indemnizatória. Termos em que não pode manter-se, nesta parte, a sentença recorrida. * 3.2.4. Da ampliação do objeto do recurso A autora, ora recorrida requereu, nos termos do artigo 636.º n.º l do CPC a ampliação do objeto do recurso à questão da consequência da preterição do direito de audiência prévia da S..., dizendo que a perda da caução é a penalidade prevista para o incumprimento da obrigação de assinatura do contrato imputável ao adjudicatário (artigo 105.º n.º 2 do CCP) pelo que está em causa um procedimento de natureza sancionatória. E que nos procedimentos administrativos de natureza sancionatória a audiência do interessado constitui um direito fundamental, já que se consubstancia na concretização, no plano ordinário, do princípio exarado no artigo 32.° n.º 10 da CRP (Acórdãos do STA de 02 de Maio de 2006, processo 01244/05, de 12 de Maio de 1999, processo 032880 e do TCA Sul de 27 de Maio de 2010, processo 06142/10) e pelo que a consequência da preterição dessa fase procedimental é a nulidade (artigos 32.º, n.º 10 e 267.º, n.º 5 da CRP e artigo 133.° n.° 2 al. d) do CPA 1991) e não a anulabilidade como decidido na sentença recorrida. O ato de aplicação da perda de caução é nulo pelo que não pode ser aplicado o princípio do aproveitamento do ato administrativo. O artigo 32.º, da CRP, sob a epígrafe “Garantias de processo criminal”, prevê no n.º 10, que “[n]os processos de contraordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa.”. Estabelecendo o artigo 267.º, n.º 5 da CRP que “[o] processamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.”. E em observância deste preceito constitucional o artigo 133.º do CPA`91 previa no seu n.º 1, que “[sã]o nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade.”. e exemplificava no seu n.º 2, alguns tipos de ato nulos, prevendo “[s]ão, designadamente, actos nulos: (…) d) Os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental;”. Ora, no caso dos autos não estamos perante ato enquadrável no n.º 1, deste artigo, sendo que o ato impugnado que determinou a perda da caução prestada pela recorrida não ofende o conteúdo essencial de um direito fundamental, pois estamos perante uma situação em que a autora apresenta voluntariamente uma proposta a um procedimento pré-contratual, no exercício da sua autonomia contratual, estando as regras do procedimento previamente definidas nos documentos conformadores do concurso, e legalmente previstas, designadamente no Código dos Contratos Públicos, foi proferida decisão de adjudicação, apresentados os documentos de habilitação e prestada caução tendente à celebração do contrato, tendo a entidade adjudicante desenvolvido os subsequentes atos destinados à outorga do contrato, como se referiu, ao qual a recorrida não compareceu, nem justificou a ausência, o que determinou a prática do ato de declaração da caducidade da adjudicação e subsequentemente do ato impugnado, que como se concluiu não preteriu o direito de audição prévia, mas ainda que tal tivesse sucedido, dado não se estar perante um processo de natureza penal, contra-ordenacional ou sancionatório, não é aplicável à situação em apreciação no presente recurso o previsto no artigo 32.º, n.º 10 da CRP. Por outro lado, também não está em causa a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental (artigo 267.º, n.º 5 da CRP e artigo 133.° n.° 2 al. d) do CPA`91). Assim, a preterição dessa formalidade não seria sancionada com a nulidade, mas com a anulabilidade do ato. Analisando o direito de audição que decorre do artigo 267.º, n.º 5, da CRP considerou-se no Acórdão do Tribunal Constitucional, de 10 de dezembro de 2008, proferido no processo n.º 1111/07, o seguinte: “Resulta, claramente, do referido preceito que a Constituição não prevê a participação dos interessados, no procedimento administrativo, como uma garantia individual cuja concreta operacionalidade prático-jurídica, relativamente a determinado sujeito, derive, directa e imediatamente, da norma constitucional. A Constituição limita-se a afirmar a existência da garantia como um instrumento jurídico-procedimental que o legislador especial deve prever, ou seja, como garantia dependente de intermediação e densificação legislativas. A audição do interessado tem, assim, a natureza de princípio constitucional cuja efectivação como regra se impõe que seja adoptada pelo legislador ordinário, não podendo a sua dispensa deixar de estar sujeita aos princípios da necessidade e da proporcionalidade, ínsitos no princípio do Estado de direito democrático (cf. art.º 2.º da CRP). Nesta perspectiva, o direito de audição corresponde a uma formalidade essencial do procedimento administrativo, funcionalizado para a formação das decisões e deliberações administrativas, com a participação dos interessados. Mas, atribuir-se ao direito de audição, na conformação do procedimento a que o legislador ordinário se encontra obrigado, uma função essencial, e, até, quando previsto, a natureza de uma formalidade essencial, não consequencia, necessariamente, que o preceito constitucional o tenha como elemento essencial do acto, até, porque o acto é evento posterior do procedimento a que respeita a audição, ou, sequer, que o mesmo artigo obrigue o legislador ordinário a atribuir-lhe tal natureza cuja falta haja de ser sancionada com a nulidade, nos termos do art.º 133.º, n.º 1, do CPA, em vez de o ser, apenas, mediante a sanção regra que o legislador ordinário adoptou para sancionar a ilegalidade dos actos administrativos – a anulabilidade (art.º 135.º do CPA). O que vem de dizer-se não impede que, em certos casos, se reconheça ao direito de participação, sob a forma de direito de audição, uma natureza especial tal que demande que a sua violação seja sancionada com o estigma da nulidade própria da afectação do núcleo essencial dos direitos fundamentais (cf. art.º 133.º, n.º 2, alínea d), do CPA). Será o caso do direito de audiência e de defesa, nos procedimentos contra-ordenacionais e quaisquer processos sancionatórios (art.º 32.º, n.º 10, da CRP) e nos processos disciplinares (art.º 269.º, n.º 3, da CRP). Mas, aqui, a configuração como verdadeiro direito subjectivo fundamental não se funda, directamente, no referido art.º 267.º, n.º 5, da Constituição, mas em outros preceitos constitucionais, prendendo-se, directamente, não com o interesse da comparticipação dos interessados na formação das decisões ou deliberações administrativas, no processamento da actividade administrativa, compaginante da melhor realização do interesse público e dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, mas com a fixação das condições, necessárias e indispensáveis, à garantia ou à realização “dos direitos fundamentais”, impondo-se, então, como um postulado da dignidade da pessoa humana ou por um direito fundamental material em que ela se concretize (cf. José Carlos Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação Expressa de Actos Administrativos, 1991, pp. 197 e segs.).”. Termos em que se conclui que o sancionamento da falta do direito de audição, a que se refere o art.º 100.º do Código de Procedimento Administrativo, na situação dos presentes autos, seria com a anulabilidade, nos termos do art.º 135.º, do mesmo código e não com a nulidade, pelo que improcede o recurso subordinado interposto pela autora. * Em face do exposto, deve ser concedido provimento ao recurso interposto pelo réu e recorrente e revogada a sentença recorrida e negado provimento ao recurso subordinado apresentado pela autora.* As custas, em ambas as instâncias, serão suportadas pela autora e recorrida – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, todos do Regulamento das Custas Processuais. * IV. Decisão:Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Subsecção de Contratos Públicos, da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso interposto pelo réu e recorrente e revogar a sentença recorrida e negar provimento ao recurso subordinado apresentado pela autora; e, consequentemente julgar a ação improcedente. Custas, em ambas instâncias, pela autora/recorrida. Lisboa, 6 de novembro de 2025. (Helena Telo Afonso – relatora) (Ana Carla Teles Duarte Palma) (Jorge Martins Pelicano) |