Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:283/10.8 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/11/2024
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:PAGAMENTOS A ENTIDADES NÃO RESIDENTES SUJEITAS A UM REGIME FISCAL PRIVILEGIADO
NORMA ESPECIAL ANTI ABUSO
INVERSÃO ÓNUS DA PROVA
DEDUTIBILIDADE DOS CUSTOS
Sumário:I- Decorre do artigo 59.º, nº1, do CIRC que os pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável, exceto se for feita prova, por um lado, que tais encargos correspondem a operações efetivamente e realizadas e, por outro lado, que não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.
II- Nas situações identificadas em I), verifica-se uma inversão do ónus da prova, beneficiando a AT de uma presunção a seu favor.
III- O legislador consagrou uma norma especial anti abuso, no sentido de não dedução, à partida, para efeitos de determinação do lucro tributável dessas despesas, tendo, por conseguinte, o sujeito passivo de demonstrar a importância concreta e efetiva das vantagens conferidas pelo contrato e provar que tais custos constituem a justa remuneração dessas vantagens, corporizando, designadamente, uma real comparação com os custos de serviços análogos no mercado, ainda que não seja exigível qualquer formalismo específico na prova a produzir.
IV- Se mediante conjugação da prova documental com a testemunhal, é possível atestar a importância real das vantagens conferidas pelo contrato e provar que os encargos estabelecidos constituem a justa remuneração dessas vantagens, não traduzindo qualquer comportamento caráter anormal ou exagerado, a mesma é suficiente para justificar e fundar a dedutibilidade dos custos, donde subsunção no citado artigo 59.º, nº1 do CIRC.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais: Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul:


ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO

O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por O……., SA, tendo por objeto o indeferimento da reclamação graciosa relativa à liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e à dos respetivos juros compensatórios, concernentes ao exercício de 2005.


***

A Recorrente veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem:

I - Visa o presente recurso reagir contra a sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade supra mencionada, contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas no exercício anual de 2005.

II - O presente recurso é apresentado, como não poderia deixar de ser, contra a parte em que a Administração Tributaria decaiu, ou seja, contra a decisão que impôs que se anulem “...os actos impugnados, na parte relativa à correcção concernente à factura emitida pela sociedade G………., Ltd."

IV - O tribunal a quo assim decidiu porquanto entendeu que “No quo respeita aos serviços subjacentes à factura emitida pela sociedade G………., desde já se adiante que a impugnante logrou fazer a prova que lhe era exigida pelo então n.° 1 do art.° 59. do CIRC.

Com efeito, da prova documental e testemunhal produzidas, decorreu que, desde 2003 e abrangendo o exercício em analise, a actuação da impugnante no K….. foi intermediada pela G…….., que funcionou como agente entre a impugnante e o Estado do K….., designadamente em termos de negociação e angariação de contractos, abrangendo todas as diligências tendentes a tais resultados finais (efectivação de contactos, marcação de reuniões, apoio nas próprias reuniões, orientação em termos de definição de contados a fazer e das próprias regras sociais a seguir) (.. .),

Ou seja, a prova produzida foi suficiente para demonstrar a efectividade dos serviços subjacentes à factura emitida pela G………..

Por outro lado, e quanto a prova de a comissão em causa não ser exagerada ou anormal, da prova documental produzida já decorria que no caso dos autos a comissão não apresenta, prima facie, um caráter anormal ou exagerado. (...)

Face ao exposto, procede a pretensão da impugnante nesta parte.".

V - Com tal entendimento não nos podemos conformar porquanto consideramos que a douta decisão do Tribunal a quo foi baseada numa errónea interpretação dos factos constantes dos autos e da prova efectivamente produzida nos mesmos.

VI - E isto porque, o Tribunal a quo afirma que a sua convicção se firmou quer pela prova testemunhal quer pela prova documental junta aos autos pela impugnante.

VII - Quanto a prova testemunhal importa ter presente que a mesma foi efectivada pela inquirição de três testemunhas, sendo que todas elas são actuais funcionários da impugnante, não intervenientes no negócio de que, alegadamente, emergem as comissões referidas na factura cujo custo foi desconsiderado pelos serviços de inspecção tributária.

VIII - Ora pese embora assim seja, i.e o seu conhecimento dos factos seja indirecto, e o interesse na decisão da causa se nos afigure evidente, porquanto nenhum funcionário, com o nível hierárquico dos inquiridos, pode afirmar conscientemente que não lhe interessa os destinos duma acção intentada pela sua entidade patronal, entendeu o tribunal a quo que tais depoimentos se afiguravam suficientes e adequados para a formação da convicção do decisor.

IX - Ora como já vimos, e ora reiteramos, nenhum dos inquiridos referiu ter estado presente nas negociações alegadamente existentes entre a putativa sociedade agente e a impugnante.

X - De igual forma nenhum dos inquiridos referiram qualquer facto quo permita levar a conclusão de que a sociedade G……… contribuiu, decisivamente, para que o Estado do K……... fosse cliente da impugnante, porquanto todos os factos, e contactos, efectuados pelas testemunhas com tal sociedade foram muito posteriores a celebração do contrato de onde alegadamente emergem a obrigatoriedade de pagamento das comissões aqui em causa, ou seja, das comissões referidas na factura em análise.

XI - Ora assim sendo, é nossa convicção que tais depoimentos não se afiguram suficientes, por si só, para fundamentarem, ou sequer influenciarem a decisão tomada, razão pela qual, e salvo o muito respeito pela livre apreciação da prova, se impunha conclusão diversa a tomada.

XII - Já no que a prova documental constante nos autos diz respeito, e que de acordo com o teor da decisão tomada, igualmente serviu para firmar a convicção do tribunal a quo, temos que referir desde logo que inexiste nos autos qualquer prova documental anterior aos contractos firmados pela impugnante e o Estado do K…….. de onde seja possível concluir que a sociedade G……….. contribuiu na obtenção do negocio para a sociedade O………., SA.

XIII - Assim, atento aos ensinamentos de Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, revista Ciência e Técnica Fiscal n.° 409-410. 2005, pags 125 e ss, consideramos que “Para essa prova da veracidade das operações não bastará a exibição de documentos escritos, nomeadamente contractos celebrados entre as parles, nem a demonstração do pagamento do preço. O que deve ser demonstrado a efetiva prestação de serviços...” razão pela qual, é nossa convicção, que deveria o tribunal a quo ter tomado decisão diversa da assumida.

XIV - Acresce ainda referir que somente se poderia concluir que 6% da facturação da impugnante realizada no Estado do K……., seria um pagamento normal e não exagerado se se assumisse que este valor dizia respeito a comissões pela obtenção de negócios.

XV - Ora, resulta do contrato celebrado entre a impugnante e o M…..do Estado do K………, nomeadamente da cláusula n.° 15 desse contrato junto aos autos, que a O………., SA esta vinculada a divulgar as comissões pagas a outras entidades que tivessem origem na celebração do contrato com o Estado do K…….. (tudo isto nos termos da Lei n.° 25 do Estado do K………, de 1996. devendo para o cumprimento de tal obrigação proceder-se ao envio de uma declaração devidamente assinada e carimbada, tudo conforme modelo Anexo 3 do referido contrato de nome “Annex 3 - The Declaration Forms of Receipt and Paymente of a Comission”).

XVI - Ora, verifica-se que tal comunicação, obrigatória por contrato, não foi feita.

XVII - No entanto, o tribunal a quo optou por não atribuir qualquer relevância a esse incumprimento, mas optou por valorar positivamente no interesse da impugnante outra prova documental que mais não é do que cópia de algumas mensagens de correio electrónico, poucas referentes ao ano em causa e todas elas posteriores a data da celebração do contrato de onde emerge as alegadas comissões, que somente referiam trabalhos tipicamente administrativos, ou de secretariado, para concluir que à sociedade G………. eram devidas comissões pela obtenção de clientes para a impugnante, ou seja, e como é referido na sentença, por ser agente da impugnante no k……...

XVIII - Ademais, como base na prova produzida nos autos, que como já referimos, não refere nem comprova qualquer diligência para a obtenção do negócio, conclui o tribunal a quo que tais pagamentos, que foram no montante equivalente a 6% do facturado em todo os negócios celebrado em tal território. se mostravam normais e não exagerados face aos serviços prestados

XIX - Ora, em nossa opinião, para que o tribunal a quo pudesse concluir pelo caracter não anormal ou exagerado do pagamento efectuado à entidades não residente em território nacional e sujeita a um regime fiscal pnvilegiado. ou seja ã sociedade G………. teria que primeiramente constar nos autos que tal sociedade teria produzido trabalhos adequados aos pagamentos efectuados.

XX - Assim, para que 6% do volume de negócios celebrados pela impugnante no Estado do K……… se afigurasse como pagamento normal e não exagerado, tena que previamente se demonstrasse nos autos que a sociedade tena efectivamente contnbuido decisivamente para a obtenção dos negócios realizados nesse Estado, ou seja deveria ter sido essa sociedade a apresentar a oportunidade de negocio a impugnante.

XXI - O que em nossa opinião, a impugnante não se logrou demonstrar.

XXII - Não só porque as testemunhas arroladas nada referem, com razão de ciência firme, quanto a obtenção dos contractos celebrados entre a impugnante e o Estado do K……...

XXIII - como também, do teor dos emails trocados entre a O………… e a G……….., em data posterior a de tal negócio que, alegadamente, legitima o pagamento de comissões pela obtenção de negócios com recurso a agente, nada mais resulta do que, reiteramos trabalho de acessória administrativa (como sejam diligências para marcação de reuniões, para a inclusão de mais um nome numa listagem de pessoas a atribuir presentes e diligencias para saber o estado da situação relativa a pagamentos devidos a impugnante,) quando o que, em nossa opinião, se impunha era a prova do quo a sociedade agente havia efectuado trabalhos cuja relevância justificassem os montantes que lhe foram pagos.

XXIV - Ora assim sendo, e face aos factos efectivamente provadas nos presentes autos, o valor pago, afigura-se anormal e exagerado, pelo que, em nossa opinião, se impunha decisão diversa da tomada

XXV - Assim, e atento a tudo quanto se deixa dito, consideramos que na sentença recorrida não foi obtido o melhor julgamento, pelo que aqui se pugna pela substituição daquela decisão por uma outra que, com as legais consequências, considere totalmente correcta, legal e devidamente fundamentada a posição da Administração Fiscal que originou a liquidação em análise.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão recorrida ser revogada e a impugnação judicial declarada totalmente improcedente. PORÉM V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.”


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O Recorrido, devidamente notificado contra-alegou, tendo concluído da seguinte forma:

“1.ª A recorrida logrou provar que as suas relações contratuais com a sociedade G………. e os encargos por si suportados preenchem os três requisitos constantes do então n.º 1 do art. 59.º do CIRC (atual art. 65.º n.º 1 do CIRC).

2.ª A recorrida demonstrou a efetividade dos serviços prestados pela Sociedade “G………….”, mediante a apresentação dos contratos, faturas e documentos equivalentes, passados em formal legal.

3.ª A recorrida demonstrou igualmente a efetividade dos serviços prestados pelos depoimentos das testemunhas arroladas que, não obstante serem trabalhadores da aqui recorrida, depuseram com absoluta isenção e imparcialidade, e cujos depoimentos foram consistentes, claros e inequívocos.

4.ª A efetiva prestação de serviços de intermediação pela Sociedade G………… foi essencial para que fosse adjudicada à Recorrida a prestação de serviços aeronáuticos pelo Estado do K……., sendo que, sem essa intermediação, esses negócios não se teriam realizado.

5.ª A recorrida procedeu ao pagamento da comissão contratada com a G…………… nos termos convencionados nos respetivos contratos facultados à recorrente e após ter faturado e recebido o preço dos serviços prestados ao Estado do K……….

6.ª As comissões pagas pela aqui recorrida não têm caráter anormal nem representam um montante exagerado, considerando os contextos comerciais em que foram convencionadas e pagas, e conforme ficou bem claro dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas, todos eles com longa experiência na matéria, atentas as funções que ocupam na recorrida, cuja atividade de manutenção aeronáutica é prosseguida em mais de 45 países e se traduz em mais de 95% de exportações.

7.ª A decisão da recorrida de contratar a Sociedade G…………. (assim como a de arrolar as testemunhas que julga convenientes) não está sujeita à apreciação discricionária da Autoridade Tributária, nem esta Autoridade fez qualquer prova de eventuais factos impeditivos à usufruição desse direito da recorrida.

8.ª No juízo sobre a indispensabilidade ou não de determinados custos basta atentar que, sem eles, não se podiam ter concretizado determinadas vendas ou prestações de serviços, como sucedeu na contratação em apreço.

9.ª A recorrida não procedeu a nenhuma “transferência de rendimentos” mas sim a um pagamento efetivo a terceira entidade que não tinha nem tem qualquer outra relação com a recorrida.

10.ª Sempre se deverão presumir verdadeiras e de boa-fé as declarações da recorrida apresentadas nos termos previstos na Lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade.

11.ª A recorrida contabilizou corretamente, a importância de €34.009,13, referente a custos com a comissão devida e paga ao prestador de serviços, “G……….”, não obstante a referida Sociedade ter sede fora do território português e em País com um regime fiscal mais favorável, não lhe sendo aplicável o regime constante do então art. 81.º do CIRC, não estando a aludida verba sujeita à tributação autónoma à taxa de 35% (ou a qualquer outra).

12.ª A Meritíssima Juiz do Tribunal a quo decidiu pois corretamente e no estrito cumprimento da Lei, ao julgar parcialmente procedente a impugnação deduzida pela aqui recorrida, com a concomitante anulação dos atos impugnados na parte relativa à correção concernente à fatura emitida pela Sociedade G…………...

Nestes termos e nos mais doutamente supridos, Deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado e ser confirmada a Douta Sentença recorrida, com as legais consequências, com o que se fará a costumada JUSTIÇA.”


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O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Com interesse para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

1) A impugnante dedica-se, designadamente, à manutenção, reparação e modificação de aeronaves.

2) A impugnante desenvolve parte da sua atividade em diversos países.

3) Através de documento escrito, designado de “Agreement nº …../……./…/02”, datado de 28.02.2002, no qual surgem identificadas, como partes contratantes, a impugnante e a sociedade G………., Ltd (doravante G………), com sede no K…….., a impugnante declarou confirmar que a G…….. é a sua representante exclusiva e parceira de equipa de marketing no Estado do K……., mediante pagamento de comissão, constando da respetiva tradução designadamente o seguinte:

“…

[Imagem; Texto na íntegra no original]

…” (cfr. documento junto de fls. 74 a 76 e 180 a 182, e respetiva tradução, constante de fls. 186 a 188).

4) Através de documento escrito, designado de “Amendment No. 1”, por referência ao documento mencionado em 3), datado de 28.02.2002, no qual surgem identificadas, como partes contratantes, a impugnante e a sociedade G…………., ambas declararam que, pelos serviços prestados em relação ao “Programa de Inspecção de 18 anos” K……. L…., a comissão a ser paga pela impugnante à G………. é de 6% (cfr. documento junto a fls. 77 e 183, e respetiva tradução, constante de fls. 189).

5) Através de documento escrito, designado de “Amendment No. 2”, por referência ao documento mencionado em 3), datado de 28.02.2002, no qual surgem identificadas, como partes contratantes, a impugnante e a sociedade G………, ambas declararam que pelos serviços prestados em relação à opção de revisão e reparação de motor e hélice por parte do K…. a comissão a ser paga pela impugnante à G…….. é de 10% sobre todos os serviços prestados, excluindo a porção de peças de reposição do motor / hélice, sobre a qual incide uma comissão de 5% (cfr. documento junto a fls. 79 e 185, e respetiva tradução, constante de fls. 191).

6) Através de documento escrito, designado de “Amendment No. 3”, por referência ao documento mencionado em 3), datado de 09.12.2003, no qual surgem identificadas, como partes contratantes, a impugnante e a sociedade G……….., ambas declararam que pelos serviços prestados em relação ao “Programa T……” K….. L……… a comissão a ser paga pela impugnante à G………… é de 10% do valor da mão-de-obra e 5% dos materiais (cfr. documento junto a fls. 78 e 184, e respetiva tradução, constante de fls. 190).

7) Na sequência do mencionado entre 2) e 6), a impugnante recorreu aos serviços da G……………., para efeitos de efetivação de contactos com o M…… do Estado do K…… e sua representação naquele país.

8) Através de documento escrito, designado de contrato n.º ../…/03/….., datado de 24.02.2003, no qual surgem identificados como outorgantes a impugnante e o M…… do Estado do K…. , a impugnante declarou ir fornecer serviços ao M……do Estado do K……… relativamente à manutenção / revisão (inspeção de 18 anos) de C-130, constando da respetiva tradução designadamente o seguinte:

“…

(…)

[Imagem; Texto na íntegra no original]

…” (cfr. documento constante de fls. 80 a 102, 109, 110 e 193 a 217, e respetiva tradução, constante de fls. 223 a 247).

9) Através de documento escrito, designado de alteração n.º 1 ao contrato n.º …./…/03/…., datado de 06.06.2005, no qual surgem identificados como outorgantes a impugnante e o M…. do Estado do K…. , foi descrito o procedimento relativo à liquidação de trabalhos adicionais no âmbito do contrato mencionado em 8) (cfr. documento constante de fls. 103 a 108 e 218 a 222, e respetiva tradução, constante de fls. 248 a 252).

10) Para a outorga do contrato mencionado em 8) e da alteração mencionada em 9), designadamente para efeitos de preparação de propostas, realização de reuniões e negociações e efetivação de contactos, a impugnante recorreu a serviços prestados pela sociedade G………...

11) Muitos dos contactos entre a impugnante e o M…. do Estado do K……., designadamente entre 2003 e 2005, para efeitos, nomeadamente, de marcação, preparação e realização de negociações e reuniões, foram feitos através da G………, por ser uma entidade local que conhecia a língua árabe, o modo de funcionamento das instituições governamentais, o mercado e as oportunidades, as normas de trato social e costumes ético-comerciais e que tinha os contactos necessários para efeitos de dar a conhecer a impugnante e o seu trabalho aos decisores.

12) No âmbito da execução do contrato mencionado em 8), a impugnante procedeu a trabalhos de manutenção e inspeção de aeronaves da F….. do K…..

13) Na sequência do mencionado em 12), foi emitida, pela impugnante, em nome do M………. do Estado do K……, fatura, datada de 17.10.2004, relativa ao contrato mencionado em 8), no valor de US $738.849,00 (cfr. fls. 112, 113, 257 e 258, e respetiva tradução, constante de fls. 259 e 260).

14) Na sequência do mencionado em 13), foi emitida pela G……….., em nome da impugnante, a 27.01.2005, fatura n.º ../2005/../…., no valor de US $ 44.330,94, de cuja tradução consta designadamente o seguinte:

“…

…” (cfr. tradução constante de fls. 255, do documento constante de fls. 111 e 254).

15) As comissões praticadas à época no mercado, relativas a contratos como o existente entre a impugnante e a G……., situavam-se entre os 2% e os 12%.

16) Através de documento escrito, designado de “Contract between O………. and M…….”, datado de 30.04.2003, no qual surgem identificadas, como partes contratantes, a impugnante e a sociedade M………, Lda (doravante M……… Portugal), com sede no Estoril, Portugal, foi declarado ser a impugnante contratada para proceder à regeneração de quatro motores (cfr. documento constante de fls. 114 a 132 e fls. 262 a 280, e respetiva tradução, constante de fls. 282 a 300, bem como a certidão permanente da M……… Portugal, constante de fls. 330 e 331).

17) Foi emitida pela sociedade M…….. (doravante M………), sociedade com sede nos E…., em nome da impugnante, a 07.03.2005, fatura n.º ……, no valor de US $ 15.001,11, de cuja tradução consta designadamente o seguinte:

“…

[Imagem; Texto na íntegra no original]

” (cfr. tradução constante de fls. 304, do documento constante de fls. 134 e 303).

18) Para efeitos de celebração do contrato mencionado em 16), foi exigida a intermediação formal da sociedade mencionada em 17).

19) A pessoa que surgia e se apresentava perante o exterior como representante das sociedades M………. Portugal e M………. era T………….

20) A impugnante foi objeto de ação inspetiva, em cumprimento da Ordem de Serviço n.º …………1, pela Direção de Serviços da Inspeção Tributária (cfr. fls. 19, dos autos, e fls. 160, do processo administrativo).

21) Da ação de fiscalização referida em 20) resultou um Relatório de Inspeção Tributária (RIT), datado de 10 de novembro de 2008, do qual consta designadamente o seguinte:

“…

(…)

[Imagem; Texto na íntegra no original]

[Imagem; Texto na íntegra no original]

[Imagem; Texto na íntegra no original]

[Imagem; Texto na íntegra no original]

[Imagem; Texto na íntegra no original]

[Imagem; Texto na íntegra no original]

(…)

[Imagem; Texto na íntegra no original]

(…)

[Imagem; Texto na íntegra no original]

[Imagem; Texto na íntegra no original]

(cfr. documentos juntos de fls. 19 a 42, dos autos, e fls. 160 a 183, do processo administrativo).

22) Na sequência do RIT mencionado em 21) foi emitida, a 24.11.2008, pela Administração Tributária (AT), em nome da impugnante, a liquidação adicional de IRC n.º 2008 8310038121 e a dos respetivos juros compensatórios, relativas ao exercício de 2005, no valor de 17.417,86 Eur. (cfr. documentos juntos a fls. 43, dos autos, e fls. 148 e 149, do processo administrativo).

23) Através de documento que deu entrada nos serviços da AT a 24.03.2009, a impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação referida em 22) (cfr. documentos juntos de fls. 44 a 48, dos autos, e fls. 4 a 8, do processo administrativo – reclamação graciosa).

24) Na sequência do mencionado em 23), foi autuado, a 15.05.2009, o procedimento de reclamação graciosa n.º…… (cfr. fls. 1, do processo administrativo – reclamação graciosa).

25) No âmbito do procedimento mencionado em 24), foi elaborada informação n.º ….-AJT/09, na direção de serviços de inspeção tributária, datada de 21.10.2009, da qual consta designadamente o seguinte:

“…

[Imagem; Texto na íntegra no original]

” (cfr. fls. 53 a 58, dos autos, e fls. 28 a 33, do processo administrativo – reclamação graciosa).

26) No âmbito do procedimento mencionado em 24), após elaboração de proposta de indeferimento, notificação da impugnante, para efeitos de exercício do direito de audição, e exercício desse direito, foi elaborada informação, na divisão de justiça administrativa da direção de finanças de Lisboa, datada de 12.01.2010, da qual consta designadamente o seguinte:

“…

[Imagem; Texto na íntegra no original]

…” (cfr. fls. 49 a 73, dos autos, e fls. 34 a 47, do processo administrativo –

reclamação graciosa)

27) Sobre a informação mencionada em 26) e após parecer de concordância, foi proferido despacho, pelo chefe de divisão de justiça administrativa da Direção de Finanças de Lisboa, a 18.01.2010, de indeferimento da reclamação graciosa mencionada em 23) (cfr. fls. 64 a 67, dos autos, e fls. 44 a 47, do processo administrativo – reclamação graciosa).


***

A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:

A) A M………. realizou diligências efetivas, com vista à celebração do e/ou execução do contrato mencionado em 16).

Não existem outros factos não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.


***

A decisão da matéria de facto assentou no seguinte:

A convicção do tribunal, no que respeita aos factos provados, assentou, desde logo, na prova documental junta aos autos, conforme indicado em cada um desses factos.

Quanto aos factos 1) e 2), a convicção do tribunal fundou-se no depoimento das testemunhas A…………., diretor financeiro da impugnante desde 2003, e J……………, que trabalha para a impugnante desde 1997, sendo em 2005 responsável pela área de desenvolvimento de negócios de manutenção de aeronaves, que demonstraram ambos conhecimento direto dos factos e se revelaram convincentes, ilustrando os seus depoimentos com diversos exemplos, e que explicaram globalmente a forma de atuação da impugnante, referindo o primeiro que as exportações ascendem a mais de 95% da atividade, designadamente em 2005, e o segundo que a sua atuação foi em mais de 45 países.

Quanto aos factos 7), 10) e 11), a convicção do tribunal fundou-se, por um lado, na prova documental junta aos autos, designadamente as mensagens de correio eletrónico constantes de fls. 342 a 361, e respetivas traduções, constantes de fls. 370 a 388, trocadas entre a G………..e e a impugnante, entre 2003 e 2006, que revelam os contactos de intermediação efetuados por aquela sociedade entre a impugnante e as entidades governamentais do Estado do K……., relativos aos trabalhos e seu desenvolvimento e à forma de contactar com os próprios responsáveis, junto daquele Estado. Por outro lado, dos depoimentos das testemunhas J………, com a razão de ciência já mencionada, e P………., que trabalha para a impugnante desde 2000, sendo à época engenheiro de planeamento e gestor de contrato, e que contactava direta e sistematicamente com a G………, entre 2003 e 2005, resultou que, para a impugnante poder atuar no K……., a intermediação da G……… se revelou imprescindível. Com efeito, do depoimento de J………., que inclusivamente participou na redação do contrato com a G……….. e que, apesar de nunca ter ido ao K…….., teve contactos telefónicos com colaboradores da mencionada sociedade e esteve com os seus responsáveis, em feiras e quando os mesmos vieram a Portugal, depoimento muito claro e convincente, resultou que esta sociedade lhes foi recomendada por uma outra, a L………(veja-se, aliás, o “Amendment No. 1” mencionado em 4), do probatório, no qual é feita referência a esta sociedade), fabricante das aeronaves que iriam ser objeto do contrato com o M… do Estado do K…….. Referiu a testemunha que tal intervenção e contactos desenvolvidos no K……… através da G……… permitiram identificar os decisores, conhecer as necessidades do cliente, considerando ainda a própria questão da língua, que implica a necessidade de apoio nas negociações, o que ele notava designadamente nas alterações e adaptações que tinha de fazer em propostas, face às recomendações da G………. Referiu igualmente que, se não houvesse nenhuma empresa que os recomendasse às entidades estatais, não conseguiam sequer agendar reuniões, dado o peso conferido ao relacionamento de confiança. Por outro lado, o depoimento da testemunha P……………, também ele muito convincente e coerente, testemunha que chegou a deslocar-se ao K……. e aí tendo sido acompanhado pelos colaboradores da G………., confirmou o já referido, descrevendo a intervenção da G…………..e como sendo de agente facilitador na assinatura dos contratos – designadamente os adicionais (dado que não acompanhou a negociação do contrato inicial), descrevendo a sua importância em termos de reuniões, para efeitos, designadamente, de ultrapassagem de dificuldades relacionadas com a língua, de problemas logísticos ao nível da comunicação e da marcação de reuniões e acompanhamento nas mesmas.

A convicção do tribunal fundou-se, quanto ao facto 12), no depoimento das testemunhas A……….. e P……….., com a razão de ciência já mencionada, que explicaram de forma clara que as aeronaves do Estado do K……… foram intervencionadas, explicando o primeiro que tal era feito em Portugal. Por outro lado, documentalmente, tal resulta, designadamente, quer do contrato e do respetivo adicional, mencionados em 8) e 9) do probatório, quer da fatura constante de fls. 112, 113, 257 e 258, e respetiva tradução, constante de fls. 259 e 260, quer das mensagens de correio eletrónico constantes de fls. 342 a 361, e respetivas traduções, constantes de fls. 370 a 388, trocadas entre a G………. e a impugnante, entre 2003 e 2006.

No que respeita ao facto 15), a convicção do tribunal fundou-se no depoimento das testemunhas A…………. e J…………., com a razão de ciência já mencionada, que se revelaram muito convincentes em termos definição das comissões praticadas em contratos com agentes, como a G………, referindo um intervalo entre os 2 e os 12% (dependendo da maior ou menor componente relacionada com mão-de-obra e da maior ou menor capacidade de negociação), tendo mesmo a testemunha J………… referido que geralmente pedem entre 10 e 12%, sendo 5 a 10% normalíssimos em mercados como o K…….. A testemunha P………, com a razão de ciência mencionada, confirmou igualmente, de forma clara e convincente, o caráter normal da comissão praticada, designadamente pela experiência que teve com outros agentes.

A convicção do Tribunal, no que respeita ao facto 18), fundou-se no depoimento da testemunha J………., com a razão de ciência já mencionada, que referiu que foi imposta, designadamente por T………, a intervenção da M…………., como condição para celebração do contrato com a M…………Portugal.

Quanto ao facto 19), a convicção do tribunal fundou-se, desde logo, nos documentos constantes de fls. 114 a 133 e fls. 262 a 281, dos autos, e respetivas traduções, constantes de fls. 282 a 301, e nos documentos constantes de fls. 135 a 138 e de fls. 306, 307, 311 e 312, e respetiva tradução, constante de fls. 308, 309, 313 e 314, nos quais T………., apesar de não assinar o contrato, surge identificado como representante da M……….. Portugal, sendo identificado igualmente nas faturas emitidas pela impugnante a esta sociedade. Por outro lado, do depoimento das testemunhas A………… e J…………., com a razão de ciência já mencionada, resultou que T……….. se apresentava perante quem com ele lidava como representante das referidas sociedades (não obstante, em termos formais, tal nome não surgir como gerente na certidão permanente da M………… Portugal – cfr. fls. 330 e 331).

Quanto ao facto A) não provado, a convicção do tribunal fundou-se na ausência de qualquer prova, designadamente documental, que evidencie a efetiva realização de diligências (não obstante a notificação para o efeito – cfr. fls. 327, 340, 341 e 369). Por outro lado, da prova testemunhal produzida resultaram elementos em sentido contrário, na medida em que, designadamente do depoimento da testemunha J…………., resultou que a intervenção da M……….. foi imposta, para efeitos de efetiva realização do negócio com a M…………. Portugal. Adicionalmente, há que sublinhar que, perante as pessoas com quem contactava, era a mesma pessoa que se apresentava como representante de ambas as sociedades, o que reflete uma ausência de divisão evidente entre as responsabilidades de cada uma das sociedades.


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III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO


In casu, a Recorrente, DRFP, não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação de IRC, e respetivos JC, do exercício de 2005.

Ab initio, e em termos de delimitação da lide cumpre, desde logo, relevar que só a D….. interpôs recurso jurisdicional quanto à parte em que, naturalmente, decaiu, ou seja, referente à correção respeitante aos custos constantes da fatura respeitante à sociedade G……….,Ltd. Logo, relativamente à legalidade e inerente manutenção da correção respeitante à fatura emitida pela sociedade M…………….., a aludida improcedência encontra-se consolidada na ordem jurídica, revestindo, assim, caso julgado.

Mais importa ter presente que, em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se:

- O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto, na medida em que valorou, erroneamente, a prova produzida nos autos, mormente, a prova testemunhal competindo, nessa medida, aferir do preenchimento dos requisitos consignados no artigo 640.º do CPC;

A decisão recorrida padece de erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, por ter decidido pela ilegalidade das correções referentes aos encargos relativos à fatura emitida pela sociedade G……….., sociedade não residente em território nacional e sujeita a regime fiscal privilegiado, na medida em que ajuizou que, por um lado, foi feita prova de que correspondem a operações efetivamente realizadas e, por outro lado, não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

Apreciando.

Comecemos, então, por aquilatar do erro de julgamento de facto.

A Recorrente alega que existiu errónea valoração da prova testemunhal, porquanto os depoimentos prestados não se afiguram suficientes para efeitos da prova relevante nos autos, não só porque o conhecimento dos factos é indireto, como existe evidente interesse na decisão da causa, na medida em que nenhum funcionário com o nível hierárquico dos inquiridos, pode afirmar, conscientemente, que não lhe interessa os destinos duma ação intentada pela sua entidade patronal.

Vejamos.

Para o efeito, importa, então, começar por aferir se a Recorrente cumpriu os requisitos consignados no artigo 640.º do CPC.

Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida 1

.

Sendo que quanto à prova testemunhal tem de existir uma indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, porquanto além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova.

In casu, conforme se extrai do teor das alegações recursivas e suas conclusões, dimana inequívoco que a Recorrente não cumpriu o ónus a que estava adstrita.

Com efeito, verifica-se que, in casu, a Recorrente não impugna a matéria de facto decorrente da prova testemunhal, não procede, conforme legalmente se impõe, à transcrição de qualquer depoimento ou excerto do mesmo, nem, tão-pouco, indica, com exatidão, as passagens de gravação dos depoimentos que pretende ver analisados, não requerendo, por conseguinte, qualquer aditamento por complementação ou substituição, e bem assim qualquer supressão do acervo probatório. Pelo que, não impugna a matéria de facto de acordo com os requisitos supra evidenciados.

Mais importa ter presente que, quando é colocada em causa a credibilidade do depoimento das testemunhas, não basta a mera alegação que o depoimento não é crível. E isto porque, se a convicção formada pela Recorrente sobre a credibilidade do depoimento da testemunha, não coincide com a convicção do julgador, tem de objetivar-se a ausência de credibilidade ponto da discordância, impondo-se ao Recorrente que indique as razões de ciência em que se firma, e bem assim as passagens da gravação demonstrativas da desconformidade.

Aduza-se, em abono da verdade, que não são permitidos, recursos genéricos contra a matéria de facto assente pelo tribunal recorrido: o recurso não pode ser genérico atacando a matéria de facto no seu conjunto sem precisar os pontos concretos, nem pode ser genérico apontando para a prova em geral produzida no processo Vide Acórdão do TCA Norte, proferido no processo nº 02324/04.9 BEPRT, datado de 31.05.2012 e bem assim Aresto do TCA Sul, proferido no processo nº 618/10.3 BELRS de 07.06.2018. .

Não podendo, nessa medida, a Recorrente limitar-se a evidenciar, de forma genérica, que os depoimentos das testemunhas não podem servir para fixar a factualidade em contenda, carecendo da convocação de ulterior prova documental e bem assim que os visados depoimentos assentam em conhecimento indireto e adveniente de conhecimento posterior, quando, ademais, tais premissas não se afiguram corretas.

Com efeito, e conforme resulta da, clara e bem fundamentada, motivação da matéria de facto, a prova testemunhal que foi valorada respeita ao Diretor Financeiro da Impugnante, ora Recorrida, desde 2003, e ao responsável pela área de desenvolvimento de negócios de manutenção de aeronaves, que trabalha para a mesma desde 1997, referindo-se, de forma inequívoca, que ambos demonstraram conhecimento direto dos factos, mais sublinhando que os visados depoimentos se revelaram convincentes, pormenorizados porquanto ilustrados com diversos exemplos, e mediante explicação devidamente substanciada dos meandros e forma de atuação da Impugnante.

De resto, como é consabido os depoimentos das testemunhas quando, críveis, com razões de ciência perfeitamente evidenciados e devidamente ponderados, podem e devem ser valorados na exata medida da convicção do julgador e de acordo com o princípio da livre apreciação da prova.

Acresce que, da arrazoada motivação da matéria de facto não se retira, de todo, que a prova testemunhal tenha sido genérica, insuficiente e parcial, não podendo, como é bom de ver, a circunstância das testemunhas inquiridas serem trabalhadores da Impugnante, ora, Recorrida, ser entendido como um interesse direto no desfecho da lide, donde sem a devida isenção. Inversamente ao evidenciado pela Recorrente tal vínculo laboral cimenta e alicerça a credibilidade e o conhecimento direto sobre a realidade vertente.

In casu, o Tribunal a quo enunciou as razões pelas quais entendeu credibilizar os depoimentos, quais as razões de ciência atinentes ao efeito, evidenciando, outrossim, as particularidades dos depoimentos reputados de relevo para a decisão, não tendo a Recorrente sindicado os mesmos com os devidos trechos que poderiam acarretar uma valoração distinta e inclusive díspar redação, nem, tão-pouco, contraditado e refutado com a devida substanciação, donde o acervo fático tem de permanecer inalterado, votando, assim, ao insucesso o aludido erro de julgamento de facto.

De relevar, in fine, que atentando no recorte fático dos autos, não se vislumbra que os factos fixados tendo por base a produção de prova testemunhal não pudessem fundar-se na mesma. Noutra formulação, dir-se-á que não nos encontramos no domínio da prova vinculada, decorrente da aplicação de normas imperativas de direito probatório material e sem qualquer margem de apreciação de liberdade por parte do julgador.

E por assim ser, face a todo o expendido anteriormente, conclui-se que inexiste qualquer erro de julgamento de facto, mantendo-se a matéria de facto inalterada.


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Assim, face ao exposto, encontrando-se a matéria de facto devidamente estabilizada, importa, então, aferir se a decisão recorrida cometeu erro de julgamento de facto por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

A Recorrente advoga erro de julgamento, porquanto foi, erradamente, valorada a prova testemunhal, e a mesma conjugada com a prova documental é insuficiente para efeitos de assunção da dedutibilidade dos custos.

Com efeito, e no concreto domínio da prova documental atesta que a mesma deveria assentar, outrossim, em prova anterior à celebração dos contratos, sendo insuficientes, para o efeito, as mensagens de correio eletrónico constantes no probatório e no respeitante à prova de que a comissão de 6% da faturação da Recorrida seria um pagamento normal e não exagerado, a mesma teria de atestar, de forma inequívoca, que este valor dizia respeito a comissões pela obtenção de negócios.

Adensa, para o efeito, que a prova que se impunha era que a sociedade agente havia efetuado trabalhos cuja relevância justificassem os montantes que lhe foram pagos.

Dissente a Recorrida, propugnando pela manutenção da decisão recorrida, na medida em que estão demonstrados os requisitos para se concretizar a sua dedutibilidade fiscal.

Com efeito, atesta que a Recorrida demonstrou a efetividade dos serviços prestados pela sociedade visada, mediante a apresentação dos contratos, faturas e documentos equivalentes, passados em formal legal, e bem assim pela produção de prova testemunhal que resultou idónea e isenta, que atestou que a efetiva prestação de serviços de intermediação pela Sociedade G………. foi essencial para que fosse adjudicada à Recorrida a prestação de serviços aeronáuticos pelo Estado do K…….., sendo que, sem essa intermediação, esses negócios não se teriam realizado.

Concluindo, outrossim, que nenhum erro pode ser apontado quanto à interpretação das comissões pagas pela Recorrida as quais não assumem caráter anormal nem representam um montante exagerado, considerando os contextos comerciais em que foram convencionadas e pagas.

Vejamos, então.

Comecemos por convocar a fundamentação em que se esteou a procedência da visada correção.

A decisão recorrida após traçar o devido enquadramento jurídico da questão estabelece a concreta ponderação da prova produzida e mediante cotejo da prova documental com a prova testemunhal conclui que a mesma foi suficiente para demonstrar a efetividade dos serviços subjacentes à fatura emitida pela sociedade G……… na medida em que resultou provado que “[d]esde 2003 e abrangendo o exercício em análise, a atuação da impugnante e no K….. foi intermediada pela G……….., que funcionou como agente entre a impugnante e o Estado do K……., designadamente em termos de negociação e angariação de contratos, abrangendo todas as diligências tendentes a tais resultados finais (efetivação de contactos, marcação de reuniões, apoio nas próprias reuniões, orientação em termos de definição de contactos a fazer e das próprias regras sociais a seguir). Não assume aqui a relevância que é retirada pela FP o facto de a impugnante não ter apresentado o elemento mencionado na cláusula 15 do contrato celebrado com o M…….. do Estado do K…., porquanto não se trata de qualquer formalidade ad substanciam, sendo que, como já mencionado, a demais prova produzida foi esclarecedora em termos de intervenção da G………….”

No atinente à prova de que a realidade de facto se atém nas condições normais de mercado, é sublinhado que “[q]uanto à prova de a comissão de 6% em causa não ser exagerada ou anormal, da prova documental produzida já decorria que no caso dos autos a comissão não apresentava, prima facie, um caráter anormal ou exagerado.”

Concluindo, assim, que “trata-se de uma comissão de 6% que, de per si, não se revela como tal. Acresce, por outro lado, que da própria prova produzida decorreu que esta percentagem praticada se encontrava dentro dos limites normalmente exigidos no mercado pelos agentes, pelo que, também nesta parte, a impugnante logrou demonstrar o que lhe competia.”

E a verdade é que, atentando na aludida fundamentação jurídica e cotejando-a com o recorte probatório dos autos, entende-se que não se verifica o arguido erro de julgamento na medida em que o Tribunal a quo analisou acertadamente o quadro jurídico aplicável, com adequada abordagem da fundamentação contemporânea do ato, e a devida transposição para o caso vertente.

Senão vejamos.

Atentando na fundamentação contemporânea do ato, verifica-se que a mesma radica, essencialmente, na circunstância da prova realizada pela, ora, Recorrida ser insuficiente porquanto a prova documental carreada deveria ser mais abrangente não quedando-se apenas pela junção de faturas, contratos e acordos, devendo, designadamente, proceder à junção de troca de correspondência e declaração com divulgação de pagamento de comissões a outras entidades, que atestassem o nexo causal entre a G…………. e os contratos adjudicados no K…….. Sendo que, no concernente ao montante das operações é convocada a falta de apresentação de esquema comparativo dos preços de serviços.

Concluindo, assim, que os custos em contenda não podem ser dedutíveis fiscalmente em ordem ao consignado nos artigos 59.º do CIRC e 73.º da LGT.

Atentemos, então, no quadro normativo que releva para o caso dos autos, estabelecendo os devidos considerandos de direito atinentes ao efeito.

Importa, evidenciar, ab initio, que, em regra, todos os custos contraídos por um sujeito passivo serão relevados negativamente na determinação do seu lucro tributável, conforme dimana, expressamente, do artigo 17.º, nº1, do CIRC. De resto, por imperativo constitucional, estatuído no artigo 104.º, n.º 2 da CRP, a tributação das empresas deve incidir sobre o rendimento real.

Contudo, conforme dimana da letra do artigo 23.º do CIRC, o legislador não estabeleceu uma correspondência absoluta entre os custos contabilísticos e os custos fiscais, porquanto só devem relevar negativamente no apuramento do lucro tributável os custos ou perdas que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

De relevar, neste concreto particular, que no âmbito dos pagamentos a entidades não residentes e submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável há que chamar à colação o preceituado, à data, no artigo 59.º, n.º 1, do CIRC o qual sob a epígrafe de “Pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado” dispunha o seguinte:

“1 - Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

2 - Considera-se que uma pessoa singular ou coletiva está submetida a um regime fiscal claramente mais favorável quando o território de residência da mesma constar da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando aquela aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC, ou quando, relativamente às importâncias pagas ou devidas mencionadas no número anterior, o montante de imposto pago for igual ou inferior a 60% do imposto que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português.”

Resulta, assim, do citado normativo que os pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado -considerando, para o efeito a lista constante da Portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro- não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável, exceto se for feita prova, por um lado, que tais encargos correspondem a operações efetivamente e realizadas e, por outro lado, que não têm um carácter anormal ou um montante exagerado, prova essa que se circunscreve na esfera jurídico do sujeito passivo.

Com efeito, nestas situações verifica-se inversão do ónus da prova, beneficiando a AT de uma presunção a seu favor, onerando-se, por conseguinte, o sujeito passivo com a aludida prova.

Dir-se-á, portanto, que o legislador consagrou uma norma especial anti abuso, no sentido de não dedução, à partida, para efeitos de determinação do lucro tributável, das importâncias pagas ou devidas a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável.

Neste particular, vide o Aresto do TCAS, prolatado no processo nº 08126/14, de 19 de fevereiro de 2015, do qual se extrata, designadamente, o seguinte:

“Estamos perante norma anti-abuso específica, criada com o objectivo de combater a fraude e evasão fiscal, dada a sua cada vez maior dimensão internacional, resultante da crescente internacionalização das empresas, da maior mobilidade das pessoas e dos capitais e do próprio desenvolvimento das técnicas utilizadas para o efeito, tudo conforme se retira do exame do preâmbulo do citado dec.lei 37/95, de 14/2, para o efeito se invertendo o ónus da prova que passa a onerar o sujeito passivo nos termos do nº.1 do preceito.

No seu nº.2, o preceito consagra índices ou pressupostos que à Administração Fiscal cumpre demonstrar querendo acionar a norma (cfr.artº.74, nº.1, da L.G.T.): quando o território de residência da pessoa singular ou coletiva constar da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando aquela aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC, ou quando, relativamente às importâncias pagas ou devidas mencionadas no número anterior, o montante de imposto pago for igual ou inferior a 60% do imposto que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português.

A introdução da solução da inversão do ónus da prova ora em exame foi adoptada por inspiração do artº.238-A, do Côde Géneral des Impôts francês. Trata-se da aplicação da regra de não aceitação de encargos dedutíveis quando em causa estão pagamentos efetuados a pessoas singulares ou sociedades instaladas em paraísos fiscais, a menos que o sujeito passivo faça prova dos vetores supra identificados:

a-Estarmos perante operações efetivamente realizadas;

b-Que não têm um carácter anormal ou que o montante em causa não é exagerado.

Mais se deverá referir que não exige a lei qualquer formalismo nestas provas, assim vigorando quanto às mesmas o sistema da prova livre e podendo socorrer-se o sujeito passivo de todos os meios de prova permitidos pela lei (cfr.v.g.artº.352 e seg. do C.Civil).”

De convocar, outrossim, o doutrinado por Luís Manuel Teles de Menezes Leitão In O controlo e combate às práticas tributárias nocivas, CTF, 409-410, 2003, pp. 125 e ss.: do qual se extrata, designadamente, o seguinte:

“Trata-se apenas da não-aceitação, em princípio, como encargos dedutíveis de certos pagamentos efectuados a sociedades em paraísos fiscais, a menos que o contribuinte efectue a prova de dois factos: que as despesas correspondem a operações verdadeiras e que elas não apresentam um carácter anormal ou exagerado.

Posteriormente acrescentou-se a esta disposição a previsão do art.º 81º, n.º 8 do CIRC que estabelece que os pagamentos a estas entidades são sujeitos a uma taxa de tributação autónoma (…).

Para essa prova da veracidade da operação não bastará a exibição de documentos escritos, nomeadamente contratos celebrados entre as partes (…), nem a demonstração do pagamento preço (pois tal não é posto em causa). O que deve ser demonstrado é efetiva prestação dos serviços (…). Já quanto à prova da inexistência de carácter anormal ou exagerado nas despesas esta deve estabelecer-se demonstrando que o contrato, cuja veracidade se provou, se apresenta equilibrado.

Para esse efeito, o contribuinte deverá demonstrar qual a importância real das vantagens conferidas pelo contrato e provar que os encargos estabelecidos constituem a justa remuneração dessas vantagens, nomeadamente por comparação com os custos de serviços análogos no mercado. Não se exige, por outro lado, qualquer formalismo nestas provas, vigorando aqui também o sistema da prova livre”.

Apreciando.

No caso vertente, é inequívoco que a fatura em contenda foi emitida por uma sociedade residente em país elencado como possuindo regime de tributação privilegiada concretamente K…., conforme resulta do ponto 36), da Portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro, sendo que, como visto, o erro de julgamento centra-se na errónea valoração da prova produzida, entendendo a Recorrente que a mesma não permite aceitar a dedutibilidade fiscal dos custos em contenda.

No entanto, face ao quadro normativo exposto e aos considerandos de direito supra expendidos, alocando-os à luz do recorte probatório dos autos, ter-se-á de concluir que nenhuma censura merece a decisão recorrida, porquanto a prova realizada, não se cingiu a mera prova documental tendo sido valorada, e bem, a produção de prova testemunhal. Sendo que, da conjugação da aludida prova a mesma permitiu atestar a importância real das vantagens conferidas pelo contrato e provar que os encargos estabelecidos constituem a justa remuneração dessas vantagens, nomeadamente por comparação com os custos de serviços análogos no mercado.

Senão vejamos.

Do acervo fático dos autos, resulta que a Recorrida se dedica, designadamente, à manutenção, reparação e modificação de aeronaves, desenvolvendo a mesma em diversos países.

Nessa conformidade, a 28 de fevereiro de 2002, foi celebrado um escrito denominado de “Agreement nº ../…./../02”, entre a Recorrida e a sociedade G……., com sede no K…., no âmbito do qual a Recorrida declarou confirmar que a G………. é a sua representante exclusiva e parceira de equipa de marketing no Estado do K……., mediante pagamento de comissão.

Tendo ulteriormente, sido outorgados escritos denominados de “Amendment No. 1, 2 e 3”, do qual se retira que, por mútuo acordo, as partes visadas declararam que pelos serviços prestados em relação:

ao “Programa de Inspecção…….” K….. L………., a comissão a ser paga pela Recorrida à G……….e cifrava-se em 6%

à opção de revisão e reparação de motor e hélice por parte do K……… a comissão a ser paga pela Recorrida à G………. ascenderia a 10% sobre todos os serviços prestados, excluindo a porção de peças de reposição do motor / hélice, sobre a qual incidiria uma comissão de 5%

ao “Programa T……” K……. L…… a comissão a ser paga pela Recorrida à G………… cifrar-se-ia em 10% do valor da mão-de-obra e 5% dos materiais

E que face ao convencionado e clausulado, a Recorrida recorreu aos serviços da sociedade G……….., para efeitos de efetivação de contatos com o M………. do Estado do K……. e sua representação naquele país, tendo, para o efeito, outorgado contrato n.º …/…./03/…., datado de 24 de fevereiro de 2003, para fornecimento de serviços ao M……. do Estado do K……… relativamente à manutenção / revisão (inspeção de 18 anos) de C-130.

Mais dimanando uma ulterior outorga de documento escrito, relativamente ao contrato celebrado entre a Recorrida e o M…….. do Estado do K……., com pormenorizada descrição do procedimento relativo à liquidação de trabalhos adicionais no âmbito do visado contrato.

Resultando, outrossim, atestado que para a concretização desse mesmo contrato designadamente para efeitos de preparação de propostas, realização de reuniões e negociações e efetivação de contactos, a Recorrida recorreu a serviços prestados pela sociedade G………, por ser uma entidade local que conhecia a língua árabe, o modo de funcionamento das instituições governamentais, o mercado e as oportunidades, as normas de trato social e costumes ético-comerciais e que tinha os contactos necessários para efeitos de dar a conhecer a Impugnante e o seu trabalho aos decisores.

E bem assim que, no âmbito da execução desse contrato a Recorrida procedeu a trabalhos de manutenção e inspeção de aeronaves da F………do K……, tendo, para o efeito, emitido em nome do M…….. do Estado do K……., fatura, datada de 17 de outubro de 2004, no valor de US $738.849,00.

E nessa conformidade, foi emitida pela sociedade G………., em nome da Recorrida, a fatura n.º ../2005/../….., datada de 27 de janeiro de 2005, no valor de US $ 44.330,94, com expressa alusão ao contrato, ao ponto de contacto comercial, à comissão, ao valor da mesma e à forma específica de pagamento.

Promanando, a final, que as comissões praticadas à época no mercado, relativas a contratos similares com os estabelecidos entre a Recorrida e a G………., as mesmas cifravam-se entre os 2% e os 12%.

Ora, face ao supra expendido, ter-se-á de concluir que a prova produzida é suficiente e idónea para efeitos de subsunção no citado artigo 59.º, nº1 do CIRC, porquanto, desde 2003 e especificamente no exercício visado, resultou atestado que a atuação da Recorrida no K……. foi, efetivamente, intermediada pela G……….., e que a mesma se afigurou vital para efeitos de concretização de ulteriores contratos, tendo, para o efeito, funcionado como agente, designadamente em termos de negociação e angariação de contratos.

Sendo que, inversamente ao propugnado pela Recorrente, resultou atestado que tal abrangia todas as diligências mormente, efetivação de contactos, marcação de reuniões, apoio nas próprias reuniões, orientação em diretrizes e meandros nos contactos e bem assim nas regras a adotar, para o efeito.

Donde, como é bom de ver, resulta atestada de forma inequívoca a efetividade das operações, a sua razão, e o concreto nexo negocial, carecendo do relevo que é conferido pela Recorrente a questão atinente à declaração evidenciada em XV) a XVII) das suas conclusões, porquanto, como evidenciado na decisão recorrida a mesma não assume, nem pode assumir o relevo ad substanciam, secundando-se, assim, o aduzido na decisão recorrida de que “[n]ão assume aqui a relevância que é retirada pela FP o facto de a impugnante não ter apresentado o elemento mencionado na cláusula 15 do contrato celebrado com o M……. do Estado do K………., porquanto não se trata de qualquer formalidade ad substanciam, sendo que, como já mencionado, a demais prova produzida foi esclarecedora em termos de intervenção da G……... Ou seja, a prova produzida foi suficiente para demonstrar a efetividade dos serviços subjacentes à fatura emitida pela G……….”

No atinente à prova de que a comissão de 6% se atém dentro dos valores normais de mercado, basta atentar no teor do ponto 15 do probatório, dela dimanando, de forma clara e inequívoca, que a aludida percentagem se encontra dentro dos limites normalmente exigidos no mercado pelos agentes, não sendo exigível que a prova se tenha de ater à existência específica e vinculada de um plano que ateste as condições praticadas no mercado com os demais intermediários.

E por assim ser, e sem necessidade de quaisquer considerandos adicionais ajuíza-se que resultou atestada a efetiva prestação dos serviços e a inexistência de carácter anormal ou exagerado nas despesas demonstrando-se, assim, que o contrato, cuja veracidade se provou, se apresenta equilibrado.

No mesmo sentido, vide o expendido no Aresto do TCAN, proferido no processo nº
00098/06.8BEBRG, de 23 de junho de 2021, do qual se extrata, designadamente, o seguinte:

“[a]tenta a prova colhida nos autos, de natureza documental e testemunhal, podemos concluir que a mesma não se quedou pela aferição da regularidade formal e do suporte documental em causa, antes se expandido para a prova testemunhal que, com suporte nos intervenientes dos negócios em questão, deram conta da veracidade e efetiva realização das operações aqui em causa e dos custos em que a Recorrida com eles incorreu com a sua agente. Por outro lado, os termos contratuais acordados no citado contrato de intermediação de vendas ou se preferirmos, de agência, apelam para um montante da comissão cobrada que se não nos afigura como exagerado(…).” (no mesmo sentido vide, Acórdão do TCAS, Processo: 05082/11, de 03.07.2012).

Pelo exposto, sem necessidade de quaisquer considerandos adicionais, improcede, na íntegra, o presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida na ordem jurídica.


***
IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
Registe. Notifique.

Lisboa, 11 de janeiro de 2024

(Patrícia Manuel Pires)

(Susana Barreto)

(Maria Cardoso)


1 António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.