Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 3824/15.0 BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 02/02/2023 |
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Relator: | CATARINA ALMEIDA E SOUSA |
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Descritores: | EMBARGOS CÔNJUGE/ EX-CÔNJUGE RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA FALTA DE CITAÇÃO/ NULIDADE INSANÁVEL |
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Sumário: | I - Não sendo a Embargante executada no processo e embora a penhora pudesse incidir sobre bens comuns, impor-se-ia, contudo, que aquando da penhora do bem aqui em causa (a qual teve lugar na constância do casamento, para garantia de dívidas com origem em momento em que se mantinha o vínculo matrimonial) aquela fosse citada para os termos do disposto no artigo 220º do CPPT e, mesmo, para os termos do disposto no artigo 239º do mesmo diploma, uma vez que se tratava da penhora de um bem imóvel.
II - Apesar de o CPPT permitir que na execução fiscal possam ser imediatamente penhorados bens comuns do casal, exige que, nesse caso, dada a natureza do bem penhorado, seja citado o cônjuge do executado; e caso não se proceda a esta citação há uma indevida apreensão de bens comuns, podendo o cônjuge reagir em defesa do seu direito. III - Sendo a falta de citação, nestas situações, suscetível de prejudicar a defesa do citando, ela constituirá uma nulidade insanável de conhecimento oficioso a todo o tempo [art. 165.º, n.º 1, alínea a), e 3, do CPPT IV - Este Tribunal, confrontado com a demonstração da falta de citação legalmente imposta, não pode deixar de julgar verificada tal nulidade insanável no processo de execução fiscal, o que importa a consequente anulação dos termos posteriores do processo que dela dependem absolutamente, incluindo a penhora efetuada nos autos e a sentença aqui objeto de recurso. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 1.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL
M ………………………………, deduziu no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa incidente de embargos de terceiro reagindo contra a penhora da fracção autónoma, designada pela letra “I”, descrita na Conservatório do Registo Predial de Lisboa sob o nº …….. e inscrita na matriz predial urbana da freguesia de ………, concelho de Lisboa, sob o artigo ……º, efectuada pelo Serviço de Finanças de Lisboa-9, no âmbito do processo de execução fiscal nº ……………….634 e apenso que este serviço moveu contra o executado P ……………, por reversão de dívidas da devedora originária, a sociedade Representações Z…………, Lda. O TT de Lisboa julgou “procedentes os presentes embargos”. Inconformada, a Fazenda Pública recorreu para este TCA concluindo as suas alegações nos seguintes termos: «I) De acordo com a douta sentença recorrida, o ato de penhora aqui em conflito é um ato ofensivo do direito da Embargante relativamente ao bem penhorado. II) Por outro lado entendeu a douta sentença recorrida que se encontravam reunidos os requisitos legais cumulativos, nomeadamente, a tempestividade e a qualidade de terceiro da embargante. III) Primeiro de acordo com a certidão predial ínsita nos autos, e com os registos averbados no documento, nomeadamente, hipotecas voluntárias ao Banco Comercial Português, sobre a garantia do empréstimo, no dia 15/01/2008, consta uma hipoteca voluntária para garantia do pagamento das responsabilidades assumidas ou a assumir pela sociedade S…………….-Sinalização ……………… Limitada, note-se que se trata de uma hipoteca voluntária averbada por ambos os titulares do imóvel, neste caso, o Executado e a Embargante, em que ambos se vinculam a garantir pagamentos, provenientes de atos de comércio; IV) Pelo que é passível presumir que a Embargante estaria inteirada das necessidades a cobrir de tesouraria, no âmbito da responsabilidade por ambos os cônjuges nos atos de comércio; V) Continuando em 26/02/2014, consta uma hipoteca legal ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social IP, no âmbito dos processos de execução, melhor identificados no documento e referentes aos anos de 2009, 2010, 2011 e 2012, contando também com o aval de ambos os titulares; VI) Em 28/04/2014, consta a penhora aqui contestada, referindo-se ao processo de execução fiscal ………………….634 e apensos, instaurado pelo serviço de finanças de Lisboa 9; VII) Onde diga-se já que foi devidamente citado o Executado na mesma morada da Embargante, pelo que nunca poderia ocorrer o conhecimento da penhora apenas em 03/11/2015, conforme estipulado na sentença e articulado pela Embargante; VIII) Não obstante em 23/09/2014, consta uma penhora realizada pelo serviço de finanças de Lisboa 2, à Embargante, com referência ao processo de execução fiscal n.º ………………831, no valor de €4.846,05; IX) Outro registo em 11/12/2014, consta de penhora realizada pelo serviço de finanças de Lisboa 2, ao Sr. P ……………………, com referência ao processo de execução fiscal nº …………….979 e apensos, no valor de €7.746,03. X) Terminando com o registo de uma penhora em 09/04/2015 realizada pelo Banco ……………. no valor de €169.510,30, a ambos os titulares. XI) Neste sentido reiteramos o facto da ação ser intempestiva, pelos motivos de que cada registo realizado foi efetuada uma notificação/informação ou para ambos ou para um dos titulares, mas sempre para a mesma morada, pelo que neste sentido só com a justificação de uma longa ausência ou alteração de residência temporária, seria possível justificar a falta de conhecimento da penhora. XII) Salientamos ainda que no auto de penhora ao ser constituído o Executado como fiel depositário, o mesmo é sempre notificado, tal como é citado para se opor à execução fiscal, o que neste caso veio a acontecer, pelo que não se compreende como é possível a Embargante alegar tal conhecimento da penhora, apenas em 03/11/2015. É inexequível. XIII) Face aos factos descritos presume-se que a Embargante tem conhecimento das relações comerciais constituídas pelo Executado, visto que também tomou parte delas. XIV) E sobre este aspeto devemos considerar que tratando-se dívidas contraídas no exercício do comércio, dispõe o artigo 1691º, n.º 1, al. d), do CC, que são da responsabilidade de ambos os cônjuges, bastando para tanto que o devedor seja comerciante e que as dívidas em causa surjam do circuito desse comércio (artigo 15.º do Código Comercial); XV) Ora os processos de execução fiscal em causa, foram instaurados contra a Sociedade …………… Z……….. Lda. e revertidas contra o ora Executado como responsável subsidiário, consubstanciando-se em dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado do período de 2002 e 2003 e de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas de 2003, altura em que os titulares do bem penhorado, já estavam casados sob o regime de Comunhão de adquiridos; XVI) Acresce que a responsabilização de ambos os cônjuges pelas dívidas comerciais contraídas por um deles no exercício do comércio assenta na premissa de que “o sacrifício imposto ao cônjuge e família do comerciante não é arbitrário, por se entender que, em princípio, a dívida terá sido contraída no interesse do casal, com vista a granjear proveitos a aplicar em benefício da família ou em benefício comum.” (cfr. Ac. do TRL de 17.11.2005, proc. 10271/2005-6, in www.dgsi.pt) XVII) Claro que neste âmbito se poderá dizer que a Embargante não deverá ser considerada terceira, visto que apesar de não constar na Execução, não ter ilidido que as dívidas contraídas não contribuíram para a existência de um proveito comum do casal, podendo, neste caso ser chamada à execução. XVIII) Não tendo qualquer interesse para decisão, a dissolução do casamento, considerando que não foram realizadas ainda quaisquer partilhas dos bens comuns do casal, pelo que sempre se poderia considerar penhorado o imóvel na parte pertencente ao Executado; XIX) Acresce que o meio processual adequado para conhecer das questões que a Recorrente suscita nos embargos deduzidos, e que se reconduzem à ofensa da posse e levantamento da penhora realizada pelo órgão da execução fiscal é a reclamação (artigos 276.º a 278.º do CPPT). XX) Mantendo-se contudo, a questão da intempestividade, pelo que não seria útil. XXI) Não é aplicável o caso transcrito na douta sentença (cfr. ac. do STA proferido em 18/05/2011 no processo n.º 0973/09) porque os contornos são totalmente diversos, as dívidas foram contraídas durante o matrimónio, a Embargante pode ser chamada à execução nos termos dos artigos 220.º e 239.º do CPPT; XXII) O direito do penhorante, devido à inerente situação de indisponibilidade em que o bem se encontra – e cujo fim é o de conservar e afetar na ação executiva a garantia patrimonial da Exequente, poderá contrastar com direito à posse do bem, no entanto, não significa que seja ilegal, significa apenas, que existe um conflito de interesses e direitos. XXIII) No entanto, dado que Administração Tributária deve resguardar o erário público e as dívidas fiscais contraídas refletem medidas necessárias para garantir a solvência das mesmas, o que só por si justifica o registo realizado em 28/04/2014, conforme consta no registo da certidão predial, e nos autos de penhora, servirá para garantir os processos de execução fiscal devidamente identificados, no montante de €236.418,60, pelo que sempre se dirá que não existe qualquer ilegalidade no ato da penhora. XXIV) A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por ter procedido a uma incorrecta apreciação da prova produzida e por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada. Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.» * A Embargante apresentou as suas contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: «1- O ónus da prova da caducidade do direito de deduzir embargos de terceiro, como facto extintivo do direito, competia à recorrente. 2- A prova depende sempre da alegação do facto respetivo. 3- A recorrente não invocou qualquer facto relativo á caducidade do direito da recorrida de deduzir embargos de terceiro. 4- A recorrente não cumpriu o ónus da alegação e da prova da caducidade do direito da recorrida de deduzir embargos de terceiro. 5- Os presentes embargos de terceiro foram deduzidos tempestivamente. 6- Os factos provados não permitem concluir pela caducidade do direito da recorrida de deduzir embargos de terceiro. 7- Pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um cônjuge respondem os bens próprios do cônjuge devedor e subsidiariamente a sua meação nos bens comuns. 8- A divida exequenda respeita a IVA e IRC devidos por Sociedade …………… Z…………... 9- A divida exequenda constitui divida fiscal do executado P ………………., considerando a reversão contra ele operada na execução fiscal. 10- Não constitui divida comercial do executado P ……………………….. 11-Não se verifica a comunicabilidade à recorrida da divida exequenda. 12- A recorrida é legítima proprietária e possuidora da fração autónoma penhorada na execução fiscal. 13-A manutenção da penhora da referida fração autónoma causa prejuízo à recorrida que se encontra impossibilitada de a alienar ou de a partilhar. 14- A penhora da referida fração autónoma ofende o direito de propriedade e a posse da recorrida relativamente á mesma. 15- Os embargos de terceiro são admissíveis e constituem o meio processual adequado á defesa do direito de propriedade da recorrida perante a ofensa que a penhora constitui. 16- Na sentença recorrida ao decidir-se pela procedência dos embargos de terceiro aplicou-se e interpretou-se corretamente o disposto nos artigos 342°, n° 2, 1259°, 1260°, 1261°, 1262°, e 1316°, 1691°, no 1, alínea d), 1696°, n° 1, 1717°, 1724°, alínea b), e 1725° todos do Código Civil, 342°, 343° e 344° do Código de Processo Civil. 17- Termos em que, deve negar-se inteiramente provimento ao presente recurso de apelação, e em consequência, manter-se e confirmar-se a sentença recorrida e a procedência dos embargos de terceiro com o consequente levantamento da penhora, como é de inteira JUSTIÇA.» * A Exma. Magistrada do Ministério Público, junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso. * Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso. * II - FUNDAMENTAÇÃO - De facto É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida: «A. O processo de execução fiscal n.º …………….634 e apenso n.º ……….925, foram instaurados no Serviço de Finanças de Lisboa 9, contra Sociedade ………. Z………. Lda., por dívidas de IVA e IRC - Cfr. fls. 1 do documento n.º 009535711 do SITAF; B. No âmbito do mesmo processo de execução fiscal, foi realizada a reversão das dívidas contra P ……………… - cfr. fls. 1 do documento n.º 009535711 do SITAF; C. Encontra-se registado na Conservatória do Registo Civil de A………, o casamento da Embargante com P ………………….celebrado em 08/07/2000 - cfr. Averbamento n.º 1, de 13/06/2013 constante do assento de nascimento n.º ……… - Cfr. fls. 17 do documento n.º 005935711 do SITAF; D. Encontra-se registada na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, com data de 27/12/2004, a aquisição por P ……………, casada com M ………….……………….., no regime de comunhão de adquiridos, a aquisição da fração autónoma designada pela letra I, correspondente ao terceiro andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua ………, n.º18, freguesia de …………, descrito na mesma Conservatória sob o n.º ……….. e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ……… – Cfr. Ap. 7, de 27/12/2004 da certidão permanente do registo predial disponibilizada em 14/05/2014 constante dos autos; E. Foi registada pela Ap. 2931, de 06/05/2014, a penhora, datada de 28/04/2014 sobre o imóvel descrito em D) a favor da Fazenda Nacional, relativamente ao processo de execução fiscal identificado em A) - Cfr. documento n.º1 junto com a petição inicial aos autos; F. Em 27/08/2015, o casamento referido em A) foi dissolvido por divórcio por mútuo consentimento – cfr. Ata de conferência relativo ao processo de divórcio por mútuo consentimento n.º35085/2015, da Conservatória de Registo Civil de Lisboa constante do documento n.º 3 junto com a petição inicial aos autos; G. Na mesma data foi homologado o acordo de atribuição da casa de morada da família na, sita na Av. ………., n.º 18, 3.º Esq. Em Lisboa e o direito ao uso da mesma, atribuído à aqui, Embargante atá à partilha - cfr. Acordo sobre atribuição da casa de morada de família, constante do documento n.º 3 junto com a petição inicial aos autos; H. Com data de 27/10/2015 foi enviada à Embargante, por correio registado, com o n.º RN…………..PT, o documento com o título “Notificação Processo: ………../15.4T8LBS/ Comarca de Lisboa/ Lisboa – Inst. Central – 1ª Secção de Execução – J7”, por meio do qual lhe foi dado conhecimento de ter sido sustada a execução, relativamente ao bem penhorado em 09/04/2015 – Cfr. documento n.º 4 junto com a petição ao autos; I. Os presentes autos de embargos foram deduzidos em 30/11/2015 - cfr. fls. 37 do documento n.º 005935711 do SITAF. FACTOS NÃO PROVADOS Com relevo para a decisão a tomar na presente ação, não resultou provado que a ora Embargante: - tenha sido chamada à execução para reclamar créditos e /ou requer a separação judicial de bens, conforme resulta da resposta do Serviço de Finanças de Lisboa 9 (documento n.º 006284653 do SITAF). -tivesse tomado conhecimento da data da penhora em data diferente daquela que referiu (03/11/2015). MOTIVAÇÃO A convicção do Tribunal sobre os factos dado como provados resultou da análise crítica da prova documental junta aos autos e ao processo administrativo e nos factos alegados e não contestados, conforme se foi fazendo referência relativamente a cada uma das alíneas do probatório. Quanto aos factos não provados, resultam ambos da falta de elementos/documentos que, positivamente os atestem.» * - De direito
Os embargos de terceiro são o meio processual adequado para fazer a defesa dos direitos de quem for ofendido - na sua posse ou em qualquer direito cuja manutenção seja incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial - por um ato de arresto, penhora ou outro judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens (artigo 237º, nº 1, do CPPT). Os requisitos para a dedução dos embargos são dois de natureza processual – (i) tempestividade da petição e a (ii) qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência – e um de natureza substancial – que a (iii) ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial constitua ato de agressão patrimonial. Nos presentes autos, e como ficou dito, os embargos foram julgados procedentes, decisão esta que merece a firme discordância da Fazenda Pública. Vejamos, por partes, atendendo ao teor das conclusões extraídas pela Recorrente a partir da motivação do recurso, as quais, como se sabe, operam a fixação e delimitação do objeto dos recursos que aos Tribunais são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. A primeira questão que foi tratada na sentença, e que aqui é retomada pela Recorrente, prende-se com a tempestividade dos embargos de terceiro deduzidos pela Recorrida, M …………... Para a Fazenda Pública, os embargos foram deduzidos para além do prazo de 30 dias previsto na lei - artigo 237º, nº 3 do CPPT. Nos termos desta disposição legal, o prazo para dedução de embargos de terceiro é de 30 dias contados desde o dia em que foi praticado o ato ofensivo da posse ou direito ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respetivos bens terem sido vendidos. Vejamos, antes do mais, em que termos a sentença se pronunciou sobre esta primeira questão. Ali se lê: “– Da tempestividade No que respeita ao primeiro dos requisitos, a tempestividade, esta encontra-se prevista no n.º3 do artigo 237.º do CPPT, devendo a dedução dos embargos ser deduzida dentro dos 30 dias subsequentes à prática do ato ofensivo ou do momento em que o embargante teve dele conhecimento, mas nunca depois dos respectivos bens terem sido vendidos. O ónus da alegação e prova de que tal conhecimento por banda do embargante ocorreu em data anterior aos trinta dias que antecederam a da apresentação da petição de embargos ato ofensivo da posse é da Fazenda Publica, conforme entendimento jurisprudencial há muito pacificado, que acompanhamos. [Vide neste sentido e por todos, o sumário do Ac. do STA proferido em 08/05/2002 no processo n.º 017/02, em que foi Relator o Sr Conselheiro Mendes Pimentel, do qual se transcreve o sumário: “I - Já à face da redacção original do n.º 3 do artigo 237° do CPPT era de entender que o prazo para a dedução de embargos de terceiro era de contar, também, a partir da data do conhecimento da ofensa. II - Nos embargos de terceiro a penhora levada a cabo em execução fiscal, recai sobre a embargada Fazenda Pública o ónus da alegação e prova de que tal conhecimento por banda do embargante ocorreu em data anterior aos trinta dias que antecederam a da apresentação da petição de embargos - artigo 343°, 2, do Código Civil. III - Não tendo, fora de qualquer dúvida, correspondido a FP a tal ónus, de concluir é pela tempestividade dos embargos.] Ora na situação em apreço, a Embargante alega que teve conhecimento da penhora em 03/11/2015 e não obstante a Fazenda Pública tenha vindo contestar esta situação, o que resultou dos autos é que, efetivamente, não logrou apresentar a prova capaz de contrariar o facto invocado pela Embargante. Assim, forçoso se torna concluir pela tempestividade da ação”. Contra o assim decidido, insurge-se a Fazenda Pública dizendo, no essencial, que: - de acordo com a certidão do registo predial e respetivos registos, daí constam hipotecas voluntárias ao B……… destinadas a garantir um empréstimo e responsabilidades assumidas ou a assumir pela sociedade S ……………, hipoteca esta averbada por ambos os titulares do imóvel, Executado (marido) e Embargante; presumir-se-á, assim, que a Embargante estaria inteirada das necessidades a cobrir de tesouraria, no âmbito da responsabilidade por ambos os cônjuges nos atos de comércio; - em 26/02/2014, consta uma hipoteca legal ao IGFSS, no âmbito dos processos de execução referentes aos anos de 2009, 2010, 2011 e 2012, contando também com o aval de ambos os titulares; - em 28/04/2014, consta a penhora aqui contestada; - na mesma data, o Executado foi citado na mesma morada da Embargante, pelo que nunca poderia ocorrer o conhecimento da penhora apenas em 03/11/15; - em 23/09/14, consta uma penhora realizada pelo serviço de finanças de Lisboa 2, à Embargante, com referência ao processo de execução fiscal n.º ………….831, no valor de €4.846,05; - em 11/12/14, consta de penhora realizada pelo serviço de finanças de Lisboa 2, ao Sr. P ……………., com referência ao processo de execução fiscal nº ………..979 e apensos, no valor de €7.746,03; - em 09/04/2015, foi registada uma penhora realizada pelo B…….., no valor de €169.510,30, a ambos os titulares; Assim sendo, para a Recorrente, considerando que para cada registo realizado foi efetuada uma notificação/informação ou para ambos ou para um dos titulares, mas sempre para a mesma morada, só com a justificação de uma longa ausência ou alteração de residência temporária, seria possível justificar a falta de conhecimento da penhora. Em suma, no entendimento da Fazenda Pública, “não se compreende como é possível a Embargante alegar tal conhecimento da penhora, apenas em 03/11/2015.”. Importa ter presente que a Mma. Juíza deixou expressamente consignado nos factos não provados que a Embargante “tivesse tomado conhecimento da data da penhora em data diferente daquela que referiu (03/11/2015)”, conclusão que o Tribunal extraiu da circunstância de “falta de elementos/documentos que, positivamente o ateste”. Como está bem de ver, a argumentação avançada pela Recorrente sobre os vários registos de penhoras e hipotecas relativos ao bem imóvel em causa não põem em causa, de forma positiva e concludente, o facto não provado transcrito. Com efeito, a existência de outros ónus incidentes sobre a fração objeto destes embargos não demonstra (nem faz presumir, como refere a Fazenda Pública) que a Embargante tivesse conhecimento da concreta penhora aqui em causa, incidente sobre a fração autónoma, designada pela letra “I”, descrita na CRP de Lisboa sob o nº…….. e inscrita na matriz predial urbana da freguesia de ……………, concelho de Lisboa, sob o artigo ……º, no âmbito do processo de execução fiscal nº ………………634 e apenso, em data anterior a 03/11/15, muito menos em abril ou maio de 2014. Recorde-se, como bem sublinhou a sentença, que cabia à Fazenda Pública o ónus da prova de que a Embargante tivera conhecimento efetivo da penhora em data anterior aos trinta dias para dedução dos embargos, demonstrando a intempestividade da dedução dos mesmos. Perante o facto que foi dado como não provado, relativamente à data do conhecimento da penhora pela embargante, impunha-se como consequência a tempestividade dos embargos, uma vez que nos termos do artigo 342º, nº 2 do Código Civil, nas ações que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe àquele contra quem a invocação é feita, a prova de o prazo já ter decorrido. A falta de tal prova por parte da Fazenda Pública não pode deixar de ser valorada contra a Embargada, já que é sobre ela que recai, efetivamente, tal ónus probatório. Neste sentido, entre muitos outros, veja-se o acórdão do TCA Norte, de 13/11/14, no processo nº 363/08.0BEPNF, no qual se lê: “ (…)No entanto, não é ao embargante que cabe a prova da tempestividade dos embargos, mas antes ao embargado a alegação e prova da sua intempestividade, dado que o decurso de tal prazo configura uma causa extintiva do direito potestativo de acção, sendo esta excepção de caducidade de conhecimento oficioso pelo Tribunal, desde que o processo contenha elementos de facto que a tal permitam (cfr. art. 343º, nº.2, do C. Civil; ac. S.T.J., 13/7/88, B.M.J.379, pág.561; ac.S.TA-2ª Secção, 10/5/95, rec. 18207, ap.D.R., 14/8/97, pág.1221 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3a. edição, 1997, pág.683). Acresce dizer que o prazo de dedução dos embargos de terceiro reveste a natureza de prazo processual, peremptório e passível de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo (cfr.ac.S.TA-23.Secção, 14/6/95, rec.19056, Ap. D.R., 14/8/97, pág.1725 e seg.). Como tem vindo a ser jurisprudência maioritária (cf. ac. da RP de 16.06.971 (BMJ n.° 209, pág. 199), de 28.04.987 (CJ, XII, 2°, 237), de 28.05.987 (CJ, XII, 3°, 175), ac. da RC de 07.03.989 (CJ, 1989, 2°, 38), ac. do STJ de 13.07.988 (BMJ n.° 379, pág. 561), o ónus da prova sobre a (in)tempestividade da dedução dos embargos incumbe ao embargado, no caso, a Fazenda. É que, tratando-se de uma causa extintiva do direito do embargante, o ónus da prova incumbe ao demandado, de acordo com o art. 342° n.º 2 do Código Civil (CC) e, mais especificamente ainda, do art. 343° n.º 2 do CC: Nas acções que devam ser propostas dentro de certo prazo a contar da data em que o autor teve conhecimento de determinado facto, cabe ao réu a prova de o prazo ter já decorrido, salvo se outra for a solução especialmente consignada na lei. Do que vem dito resulta que, nos termos do art°. 237º, n°.3, do CPPT, os embargos de terceiro devem ser deduzidos no prazo de trinta dias contados do dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa, embora nunca depois dos respectivos bens terem sido vendidos. O decurso de tal prazo configura uma causa extintiva do direito potestativo de acção, sendo esta excepção de caducidade de conhecimento oficioso pelo Tribunal, desde que o processo contenha elementos de facto que tal permitam (cfr. art. 333º, n°.1, do C. Civil; ac. S.T.J, 13/7/88, B.M.J.379, pág.561; ac.S.T.A.-2a.Secção, 10/5/95, rec.18207, ap.D.R., 14/8/97, pág.1221 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.683)”. Temos assim, e em conclusão, que o Tribunal a quo decidiu em conformidade com a lei e seguindo a orientação jurisprudencial constante sobre a matéria, pelo que a consideração quanto à tempestividade dos embargos não é passível de censura. Improcedem, como tal, as primeiras conclusões que vimos de analisar. * Prosseguindo para as conclusões seguintes, aí defende a Recorrente que a Embargante não é terceiro face ao processo de execução fiscal no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse, visto que “apesar de não constar na Execução, não ter ilidido que as dívidas contraídas não contribuíram para a existência de um proveito comum do casal, podendo, neste caso ser chamada à execução”. Sobre esta questão, a apreciação do TT de Lisboa foi a seguinte: “– Da qualidade de terceiro Quanto a este requisito, o CPPT não nos apresenta um conceito legal próprio do processo de execução fiscal, termos em que recorrendo à legislação subsidiária se faz uso do artigo 351.º do CPC que define como terceiros quem não for parte na causa [Vide a este respeito refere-nos Jorge Lopes de Sousa in “Código do Procedimento e Processo Tributário Anotado e Comentado”, III Volume, Áreas Editora, 6ª ed., 2011, pág. 159)], isto é, quem não for exequente nem executado no processo de execução em que foi realizada a penhora, nem de qualquer outra forma seja considerado como parte naquele processo. No caso concreto, é de concluir que a Embargante possui a qualidade de terceiro, porquanto nos autos de execução onde foi efetuada a penhora figuram como partes a Fazenda Pública (exequente) e P …………………, por reversão da Sociedade ………………. Z……………….. Lda. (executado), não sendo feita qualquer referência à aqui Embargante. Com efeito, não resulta dos autos, nem vem alegado que esta seja responsável, originária ou subsidiariamente, pelas dívidas, exigidas na sobredita execução, o que resulta é que teve conhecimento da penhora ao imóvel em apreço. [Poto H) do probatório] Acresce referir que não olvidamos o entendimento jurisprudencial de que o cônjuge do executado perde a qualidade de terceiro, para efeitos de acesso a este meio processual quando citado, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 239.º do CPPT [Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STA, de 23/04/2013, proferido no Processo n.º 010/13 de que se transcreve parte do sumário: “I - O cônjuge do executado, em execução fiscal em que foi penhorado um imóvel, e nesta citado nos termos do artigo 239º, nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que lhe confere os direitos de defesa do executado, está impedido de defender a sua posse mediante a dedução de embargos de terceiro. II – (…)” Em idêntico sentido, também do STA, o Acórdão, de 09/11/2016, proferido no Processo n.º 0972/16, de que se transcreve o sumário: “Face ao disposto no art. 1795º-A do CCivil, nos termos do qual, relativamente aos bens, a separação de pessoas e bens produz os efeitos que produziria a dissolução do casamento (extinguindo-se, consequentemente, qualquer regime de bens existente), ficará afastada a obrigatoriedade legal de citação do cônjuge do executado à luz do disposto no art. 239º do CPPT, podendo ser admitido a deduzir embargos de terceiro, em caso de posterior penhora sobre bem imóvel de que é proprietário.”, Ambos consultáveis na internet na página da dgsi.], situação que aqui não se verifica já que dos autos não consta que a referida citação tenha ocorrido na constância do casamento, ou seja, à data em que a Embargante teve conhecimento da penhora (03/11/2015) já o casamento havia sido dissolvido (27/08/2015) [Ponto F) do probatório] Em suma, resulta comprovada a qualidade de terceiro da Embargante”. Vejamos o que se nos oferece dizer a este propósito, lembrando que, na execução fiscal de que estes embargos são incidente, estão em causa dívidas de IVA (2002 e 2003) e IRC (2003) da sociedade …………. Z…………. As dívidas reverteram, com fundamento em responsabilidade subsidiária, contra P …………….., casado com a ora Embargante, desde julho de 2000 e até à dissolução do casamento, por divórcio, em 27/08/15. A penhora da fração em causa teve lugar em abril de 2014. Para o enquadramento da questão, chamamos à colação jurisprudência do STA, nos termos da qual: “O Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT - na falta de qualquer menção especifica, os preceitos citados reportar-se-ão à redacção que dispunham antes da entrada em vigor da última reforma processual), onde os embargos de terceiro se encontram regulados apenas quanto às especialidades que se colocam quando deduzidos contra actos praticados numa execução fiscal, não nos faculta um conceito de terceiro, mas, tão só, os fundamentos admissíveis para a sua dedução (artigo 237.º do CPPT). Na verdade, aí se dispõe que: «Quando o arresto, a penhora ou qualquer outro acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência de que seja titular um terceiro, pode este fazê-lo valer por meio de embargos de terceiro». Todavia, recorrendo ao Código de Processo Civil [(CPC) - na sua actual redacção, uma vez que os presentes embargos foram deduzidos após a entrada em vigor da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, cuja aplicabilidade subsidiária se mostra imposta pelo artigo 2.º do CPPT), onde o presente incidente se encontra amplamente regulado, encontramos os elementos necessários ao preenchimento do conceito de terceiro, já que aí se prescreve que “Se a penhora, ou qualquer outro ato judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa, pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro. Em suma, face à lei, é terceiro quem não é parte na causa; quem não é parte na causa pode deduzir embargos de terceiro e estes são o meio processual próprio para quem não é parte na causa reagir contra a penhora ou outro ato de apreensão de bens, alegando ofensa da sua posse ou a titularidade de outro direito real incompatível com a diligência realizada ou com o seu âmbito (Neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo tributário, vol. III, pag., anotação ao artigo António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pereira de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Almedina, 2018, volume I, anotação 1. ao artigo 342)” – fim de citação do acórdão do STA, de 18/11/20, no processo nº 185/16.4BESNT 01352/16. No caso, considerando que as dívidas exequendas se reportam a valores relativamente aos quais era devedora originária a sociedade R ……………. Z………… e cuja execução foi revertida (antes do divórcio) contra o ex-cônjuge, P ……………………, não têm as mesmas a natureza de dívidas comunicáveis. Na verdade, é entendimento aceite pela jurisprudência que a responsabilidade subsidiária dos gerentes tem natureza extracontratual, pelo que as respetivas dívidas são da exclusiva responsabilidade do gerente – neste sentido, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. III, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 16 ao art. 204º, p. 456, bem como o ac. do Pleno do STA, de 5/12/2001, rec. nº 021438, in Ap. DR, de 14/3/2003, pp. 212 a 217 e o ac. da 2ª Secção do STA, de 31/1/2001, rec. nº 023428, entre outros. E, assim sendo, no caso, estando em causa a responsabilidade subsidiária do executado P …………….. e, portanto, dívidas que são unicamente da responsabilidade deste, que não do seu ex-cônjuge, ou seja, dívidas próprias daquele, que não dívidas comuns (Cfr. o citado ac. do Pleno do STA, de 5/12/01) só contra ele pode ser instaurada a execução (artigo 1692º, al. b) do CC). Isto mesmo se verificou, de resto. Ora, por tais dívidas – da responsabilidade de um dos cônjuges – respondem os bens próprios do cônjuge devedor (ou seja, do executado revertido, P……….) e, subsidiariamente, sendo caso disso, a sua meação nos bens comuns (artigo 1696º do CC). Não sendo a M ………… executada no processo e embora a penhora pudesse incidir sobre bens comuns, impor-se-ia, contudo, que aquando da penhora do bem aqui em causa (a qual teve lugar na constância do casamento, para garantia de dívidas com origem em momento em que se mantinha o vínculo matrimonial) aquela fosse citada para os termos do disposto no artigo 220º do CPPT e, mesmo, para os termos do disposto no artigo 239º do mesmo diploma, uma vez que se tratava da penhora de um bem imóvel (apesar de o CPPT permitir que na execução fiscal possam ser imediatamente penhorados bens comuns do casal, exige que, nesse caso, dada a natureza do bem penhorado, seja citado o cônjuge do executado; e caso não se proceda a esta citação há uma indevida apreensão de bens comuns, podendo o cônjuge reagir em defesa do seu direito). Tenhamos presente os termos dos artigos 220º e 239º, nº1 do CPPT: Artigo 220.º Coima fiscal e responsabilidade de um dos cônjuges. Penhora de bens comuns do casal Na execução para cobrança de coima fiscal ou com fundamento em responsabilidade tributária exclusiva de um dos cônjuges, podem ser imediatamente penhorados bens comuns, devendo, neste caso, citar-se o outro cônjuge para requerer a separação judicial de bens, prosseguindo a execução sobre os bens penhorados se a separação não for requerida no prazo de 30 dias ou se se suspender a instância por inércia ou negligência do requerente em promover os seus termos processuais. Artigo 239.º Citação dos credores preferentes e do cônjuge 1 - Feita a penhora e junta a certidão de ónus, serão citados os credores com garantia real, relativamente aos bens penhorados, e o cônjuge do executado no caso previsto no artigo 220.º ou quando a penhora incida sobre bens imóveis ou bens móveis sujeitos a registo, sem o que a execução não prosseguirá. Temos, pois, que a ora Recorrida devia ter sido citada e, de acordo com o julgamento da matéria de facto, não foi. Aliás, isto mesmo foi confirmado pelo SF na sequência de pedido de informação formulado pelo Tribunal, ao esclarecer que, quer nos documentos em papel, quer em suporte digital associado ao PEF, não é possível localizar qualquer citação que tenha sido feita à M ……………. Trata-se de matéria de facto, aliás, que nunca foi, ao longo do processo, contrariada pela Fazenda Pública. Como refere J. Lopes de Sousa, “…no processo de execução fiscal a citação do cônjuge como co-executado ocorre em maior número de casos do que na execução comum, designadamente em todos em que a penhora incide sobre imóveis ou móveis sujeitos a registo (art. 239.º, n.º 1, do CPPT). Com esta citação, o cônjuge passa a ter no processo todos os direitos conferidos ao executado, como se infere do preceituado no art. 864.º-A do CPC. Nestes casos, não podendo o processo prosseguir sem a citação do cônjuge (art. 239º, n.º 1, do CPPT), seria incompreensível que se admitisse o cônjuge a deduzir embargos de terceiro, por ter a qualidade de terceiro (por não ter sido ainda citado), para, depois de constatada a falta da sua obrigatória citação, ter de a efectuar, retirando-lhe a qualidade de terceiro, com a consequente ilegitimidade superveniente, mas atribuindo-lhe os muito mais vastos poderes de intervenção processual que são concedidos ao próprio executado originário. Sendo a falta de citação, nestas situações, susceptível de prejudicar a defesa do citando, ela constituirá uma nulidade insanável de conhecimento oficioso a todo o tempo [art. 165.º, n.º 1, alínea a), e 3, do CPPT], pelo que o meio processual mais adequado para o cônjuge indevidamente não citado defender os seus direitos processuais será a arguição da correspondente nulidade, para, na sequência da citação obrigatória, exercer todos os poderes que a lei lhe confere. Por isso, no processo de execução fiscal, em todos os casos em que tem de ser efectuada a citação referida no artigo 239.º, nº 1, do CPPT (isto é, sempre que forem penhorados bens imóveis ou móveis sujeitos a registo), aquela regra do n.º 2 do art.97.e da LGT, impõe a conclusão de que não será permitido ao cônjuge a dedução de embargos de terceiro, mesmo enquanto não tiver sido citado, devendo a defesa dos seus direitos ser efectuada através da arguição da nulidade por falta de citação, com a consequente possibilidade de exercício de todos os direitos processuais em que se inclui o de oposição a penhora, nos termos dos arts. 276.º e278.º do CPPT.” – vide, J. Lopes de Sousa, obra citada, Vol. III, páginas 173 e 174. Cremos, pois, que será neste plano que se encontrará a melhor decisão para o caso sub judice, pois a nenhum título podem ser coartados direitos à Recorrida pela falta de citação que cumpria à AT assegurar e que, comprovadamente, não assegurou. Vejamos, então. Dispõe o artigo 165º, nº 1, alínea a) do CPPT que “São nulidades insanáveis em processo de execução fiscal: a) A falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado”. Por seu turno, o nº 2 do mesmo preceito estipula que “As nulidades dos actos têm por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente, aproveitando-se as peças úteis ao apuramento dos factos”. Releva, ainda, o nº4, nos termos do qual “As nulidades mencionadas são de conhecimento oficioso e podem ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final”. Ora, aqui chegados, e face à prova já feita, estamos em condições de lançar mão, oficiosamente, do transcrito nº 4 do artigo 165º do CPPT, o que equivale a dizer que este Tribunal, confrontado com a demonstração da falta de citação legalmente imposta, não pode deixar de julgar verificada tal nulidade insanável no processo de execução fiscal (de que estes embargos constituem incidente). O julgamento da verificação da apontada nulidade insanável do processo de execução, por falta de citação da Recorrida M……………., importa a consequente anulação dos termos posteriores do processo que dela dependem absolutamente, incluindo a penhora efetuada nos autos e a sentença aqui objeto de recurso (pois que proferida no processo de embargos deduzidos contra a penhora que não subsiste). Isto mesmo aqui se determinará. Nesta conformidade, devem os autos ser remetidos ao processo de execução e ali incorporados a fim de a falta da citação ser regularmente suprida, seguindo-se os ulteriores termos. A este propósito, deve lembrar-se que a qualificação desta nulidade como insanável não significa que tal nulidade não seja passível de sanação; o emprego da palavra “insanável” tem o único alcance de transmitir que tal nulidade não se sana com o decurso do tempo sem arguição, podendo, até ao trânsito em julgado da decisão, ser arguidas ou oficiosamente conhecidas – vide, Lopes de Sousa, obra e volume citados, pág. 135. * III – DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em: - julgar verificada a nulidade insanável do processo de execução fiscal, por falta de citação da Recorrida Maria João; - anular os termos subsequentes do processo de execução que dela dependem absolutamente, incluindo a penhora efetuada nos autos; - em consequência, anular a sentença aqui objeto de recurso (pois que proferida no processo de embargos deduzidos contra a penhora que não subsiste); - ordenar a remessa dos autos ao processo de execução fiscal, nos quais devem ser incorporados, a fim de a falta da citação ser regularmente suprida, seguindo-se os demais termos do processo. Sem custas. Registe e notifique. Lisboa,02/02/23 (Catarina Almeida e Sousa) (Isabel Fernandes) (Lurdes Toscano) |