Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 95/20.0BCLSB |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 12/05/2024 |
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Relator: | PATRÍCIA MANUEL PIRES |
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Descritores: | DECISÃO ARBITRAL OMISSÃO DE PRONÚNCIA CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO |
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Sumário: | I - Na impugnação da decisão arbitral junto do TCA, nos termos do art.º 27.º, n.º 1, do RJAT, tal decisão pode ser anulada, sendo que a impugnação pode ser apresentada considerando um dos fundamentos taxativamente elencados no n.º 1 do artigo 28.º do mesmo diploma, não podendo abranger qualquer erro de julgamento. II - Se a fundamentação jurídica é ou não acertada, e se o Tribunal Arbitral analisou com a devida propriedade e com acerto o litígio, mormente quanto à concreta possibilidade de invocação superveniente de novos vícios e ao próprio alcance e extensão da alteração da causa de pedir, sua conformação com o artigo 5.º, nº3 do CPC, e com a própria estabilidade da instância, tal não integra nulidade da decisão, mas, tão-só, erro de julgamento o qual não pode ser analisado por este TCAS. III - Apenas se verifica contradição real entre os fundamentos e a decisão proferida quando o discurso argumentativo constante da decisão arbitral impugnada conduza a uma decisão distinta da que foi proferida, não se confundindo a mesma com o erro de julgamento. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO I-RELATÓRIO
BANCO S…, SA., doravante abreviadamente designado por “Impugnante”, deduziu impugnação de decisão arbitral ao abrigo do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, contra a decisão proferida pelo Tribunal Arbitral no âmbito do processo n.º 887/2019-T, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral, apresentado contra os atos tributários de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) referentes ao ano de 2005, no montante de €824.257,25. *** O Impugnante termina a sua impugnação formulando as seguintes conclusões: “A. A presente impugnação da decisão arbitral proferida no n.º 887/2019-T é instaurada com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, i.e., por se constar uma oposição dos fundamentos com a decisão, e, subsidiariamente, com fundamento na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, i.e., por omissão de pronúncia. B. Foi entendimento de dois Árbitros do Colectivo nomeado (já que, como se acabou de referir, a Exma. Prof. Doutora Clotilde Celorico Palma votou vencida) que “na linha da jurisprudência do STA, há que reconhecer que a norma do artigo 23.º, n.º 2 do CIVA procedeu à transposição para o direito interno do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva, pelo que os actos de liquidação impugnados não enfermam da ilegalidade que lhes é imputada” (cfr. p. 24 do acórdão arbitral impugnado). C. No entanto, como se explanou, o tribunal arbitral recorrido, ao decidir como decidiu, incorreu, desde logo e com o devido respeito, em manifesta oposição dos fundamentos com a decisão, o que consubstancia uma causa de nulidade da decisão arbitral impugnável junto deste Venerando Tribunal ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT. D. Foi, pois, dado como provado que os factos tributários aqui em causa respeitam (exclusivamente) ao ano de 2005 e as liquidações adicionais do IVA daquele ano resultaram de uma acção inspectiva realizada em 2006 (vide factos II e JJ dados como provados no acórdão arbitral – p. 11). E. Por outro lado, dúvidas não existem que o Ofício Circulado n.º 30108 é datado de 30.01.2009 e serviu de base ao despacho de indeferimento da reclamação graciosa (vide facto PP dado como provado no acórdão arbitral – p. 16). F. Já quanto ao direito, exarou-se no acórdão arbitral que: “Por outro lado, o coeficiente específico de dedução que permite calcular a percentagem de dedução apenas com base no montante anual de juros foi somente introduzido pelo Ofício Circulado n.º 30108, de 30 de janeiro de 2009, pelo qual a Administração Fiscal, tendo concluído, relativamente às instituições de crédito que desenvolvam simultaneamente as actividades de Leasing ou de ALD, que o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do pro rata geral estabelelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA pode conduzir a “distorções significativas na tributação”, determinou, no uso da faculdade prevista no artigo 23.º, n.º 3, que esses sujeitos passivos passassem a utilizar a afectação real”. G. Por fim, o tribunal arbitral aderiu ao entendimento do STA que as normas referidas do artigo 23.º do Código do IVA reproduzem, em substância, o artigo 17.º, n.º 5, 3.º parágrafo, al. c), da Sexta Directiva e que, por conseguinte, é permitido estabelecer condições para o cálculo do pro rata do imposto. H. Captado o iter cognoscitivo trilhado pelo tribunal impugnado, constata-se que a conclusão de que são legais as liquidações impugnadas referentes ao ano de 2005, anteriores ao Ofício-Circulado de 2009 através do qual e somente aqui a AT usou da faculdade conferida pelo legislador (devidamente transposta para o direito interno no artigo 23.º, n.º 2 e 3 do Código do IVA) para criar um coeficiente de imputação especifica para os sujeitos passivos mistos (como a Impugnante), rompe totalmente com a inferência que lógica e necessariamente decorre dos factos provados e das próprias premissas de direito adoptadas pelo tribunal, I. porquanto uma decisão arbitral que deu como provado que: (i) os factos tributários dizem respeito ao ano de 2005, (ii) o Ofício-Circulado 30108 é de 30 de Janeiro de 2009, (iii) que foi somente por este Ofício-Circulado, de 2009, que foi introduzido o coeficiente específico de dedução que permite calcular a percentagem de dedução apenas com base no montante anual de juros no uso da faculdade do n.º 3 do artigo 23.º do Código do IVA, (iv) como lhe é permitido pelo direito comunitário, mais precisamente, pelo artigo 17.º º 5, terceiro parágrafo, alínea c), Sexta Directiva, transposto correctamente para ordem jurídica interna, na linha da jurisprudência do STA, não pode jamais desaguar na conclusão de que os actos tributários (de 2005) anteriores ao Ofício-Circulado (de 2009) estão legitimados à luz do direito (e do Ofício que lhes é posterior)! J. Desdobrando o silogismo, as premissas enunciadas não concedem qualquer margem para outra conclusão que não seja a de que as liquidações impugnados nos autos, porque anteriores ao Ofício-Circulado, são ilegais, uma vez que até este ter sido emitido havia um vazio legal dado que o Estado Português (leia-se, outra vez, a AT) não havia usado a faculdade conferida pela lei para introduzir um coeficiente de imputação específico no que diz respeito ao cálculo do pro rata do IVA dedutível dos custos comuns quando entendesse (como entendeu no Ofício-Circulado), que a aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA causaria distorções significativas de tributação. K. A resposta parece, salvo o devido respeito, evidente: aquela conclusão só foi extraída no acórdão arbitral por causa de uma manifesta oposição dos fundamentos com a decisão, L. Com efeito, só um acórdão arbitral em que seja concluído que, com base naqueles fundamentos, os actos tributários (de 2005) impugnados são ilegais, porque proferidos em momento anterior ao do uso da faculdade (que só ocorreu em 2009 com o Ofício-Circulado 30108) é que não pecará por nulidade por vício de oposição dos fundamentos com a decisão. M. Acresce que, a Impugnante alertou, nas alegações escritas apresentadas em 28.09.2020, que ao se entender que foi através do Ofício-Circulado 30108 que a AT se legitimou, ao abrigo do n.º 2 e 3 do artigo 23.º do Código do IVA, e usou a faculdade de mitigar o pro rata dos sujeitos passivos mistos (como é o caso da Impugnante), então deveria atender-se que na situação sub judice estamos perante factos tributários anteriores àquele ofício. N. Em primeiro lugar, a Impugnante esclarece que a invocação do vício de nulidade que inquina o acórdão arbitral impugnado - oposição dos fundamentos com a decisão - desprende-se, totalmente, do excerto decisório da p. 24 e 25 do acórdão impugnado. O. Não visa a presente impugnação da decisão arbitral discutir o mérito do dictum pelo tribunal arbitral, em especial quando se entendeu não dever conhecer a questão supra. P. Resulta, pois, das normas processuais aplicáveis que “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito” (cfr. n.º 3 do artigo 5.º do CPC, ex vi artigo 2.º do CPPT, e alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT). Este princípio há muito que se encontra estabelecido na ordem jurídica, e correspondia ao artigo 664.º do CPC na redacção anterior à reforma de 2013. Q. Em suma: (i) o tribunal não está confinado à alegação do direito convocada pelas partes, (ii) e deverá, ao abrigo do princípio da oficiosidade do conhecimento e aplicação do direito aos factos trazidos pelas partes, fazer, pois, a sua correcta aplicação. R. LOGO: a nulidade que se assaca (oposição dos fundamentos com a decisão) inscreve-se precisamente aqui e é independente do excerto decisório que se transcreveu (não tomada de conhecimento da questão suscitada). Porquanto, os factos carreados nos autos são que as liquidações respeitam ao ano de 2005 (é indiscutível e não controvertido) e ao aplicar o direito como foi aplicado aplicou (tendo presente que os factos são de 2005 mas que foi apenas com o Ofício-Circulado de 2009 que foi usada a faculdade de mitigar o pro rata dos sujeitos passivos mistos como é o caso da Impugnante), a contradição dos fundamentos com a decisão (ao julgar improcedente, ainda assim, o pedido) localizada no plano da expressão formal da decisão verifica-se, redundando num vício insanável do chamado “silogismo judiciário”, tudo como foi explanado supra. S. Sem prescindir, e por mero dever de patrocínio, caso se entenda que o acórdão arbitral impugnado não padece da nulidade de oposição dos fundamentos com a decisão, invoca-se, subsidiariamente, que então é nulo por omissão de pronúncia nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT quando, a pp. 24 e 25, concluiu que “não é possível conhecer, por conseguinte, do novo vício de ilegalidade aduzido nas alegações”, ou seja, da ilegalidade consubstanciada por o Ofício-Circulado 30108 ser posterior (2009) aos factos tributários (2005). T. Como foi explicado, o n.º 3 do artigo 5.º do CPC acolhe o princípio jura novit curia ou princípio do conhecimento oficioso do direito, de acordo com o qual o tribunal não está vinculado à interpretação e aplicação do direito invocada pelas partes na petição, e, desde que os factos assim o permitam, deverá oficiosamente aplicar e interpretar o direito. U. Nas páginas 2 a 4 das alegações escritas que apresentou (em 28.09.2020), a Impugnante invocou e alegou a ilegalidade dos actos tributários por respeitarem a um período de tributação anterior à da emissão do ofício circulado n.º 30108. O tribunal arbitral não conheceu, pois, esta questão e, não o tendo feito, incorre em nulidade por omissão de pronúncia que subsidiariamente se invoca para todos os efeitos legais. V. Ponderando a matéria em causa e a conduta exemplar das partes, e o facto de os articulados sempre se terem centrado no essencial, é forçoso concluir que se verificam todos os pressupostos para o Tribunal decidir no sentido da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos e para os efeitos n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, o que expressamente se requer. NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO, DEVE A PRESENTE IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO ARBITRAL SER JULGADA TOTALMENTE PROCEDENTE, POR PROVADA, E, EM CONSEQUÊNCIA, DEVE SER DECLARADA NULA A DECISÃO ARBITRAL, POR OPOSIÇÃO DOS FUNDAMENTOS COM A DECISÃO, NOS TERMOS PREVISTOS NA ALÍNEA B) DO N.º 1 ARTIGO 28.º DO RJAT, E SUBSIDIARIAMENTE, NULA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA NOS TERMOS DA ALÍNEA C) DO N.º 1 DO ARTIGO 28.º DO RJAT, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS. MAIS SE REQUER SEJA CONCEDIDA A DISPENSA DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA, NOS TERMOS DO N.º 7 DO ARTIGO 6.º DO RCP.” *** A Recorrida, devidamente notificada optou por não apresentar contra-alegações. *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA. *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir. *** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A decisão arbitral impugnada apresenta o teor que infra se transcreve: “ I – Relatório (…)Clotilde Celorico Palma (vencida nos termos da declaração de voto em anexo) Voto de Vencida 1. Matéria de direito em apreciação Está em causa aferir se a norma constante do artigo 23.º, n.º 2, do CIVA, ao permitir que Administração Tributária imponha condições especiais no caso de se verificarem distorções significativas na tributação, reproduz, em substância, a regra de determinação do direito à dedução enunciada no artigo 173.º, n.º 2, alínea c), da Directiva 2006/112/CE, correspondendo à sua transposição para o direito interno. Salvo o devido respeito não poderemos concordar com as conclusões da presente decisão, pese o facto de o STA ter proferido jurisprudência uniformizadora neste contexto no seu Acórdão para uniformização de jurisprudência de 4 de Março de 2020 (Processo n.º 7/19), fundado na contradição existente, quanto à mesma questão fundamental de direito, entre decisão arbitral (decisão recorrida) e o Acórdão do STA de 15 de Novembro de 2017 (Processo n.º 0485/17 - acórdão fundamento). 2. A jurisprudência uniformizadora Como é sabido, no nosso ordenamento jurídico a jurisprudência não é fonte imediata de direito, contudo, importa reconhecer a sua enorme relevância na medida em que o trabalho desenvolvido na aplicação do direito, e materializado na jurisprudência, consubstancia uma fonte de conhecimento do direito. A jurisprudência uniformizada é admissível no âmbito do Contencioso Tributário (artigos 148.º e 152.º do CPTA e artigos 284.º e 289.º do CPPT), em ordem a evitar ou a resolver decisões contraditórias sobre a mesma questão jurídica. Destarte, importa assinalar que os acórdãos de uniformização de jurisprudência, embora não tenham a força obrigatória geral que era atribuída aos assentos pelo revogado artigo 2.º do Código Civil, têm um valor reforçado que deriva não apenas do facto de emanarem do Pleno das Secções do Supremo Tribunal, como ainda de o seu não acatamento pelos tribunais hierarquicamente inferiores constituir motivo para a admissibilidade especial de recurso, nos termos do artigo 629º, n.º 2, alínea c), do CPC. Há, portanto, que reconhecer à jurisprudência uniformizada um valor persuasivo ou um valor legal específico, embora não possa ser considerada uma fonte de direito. A jurisprudência constante ou uniforme incrementa confiança no sistema jurídico, na medida em que em que o sentido das decisões dos tribunais se torna previsível e expectável, podendo os tribunais limitar-se a reproduzir ou a seguir as decisões proferidas por outros tribunais na apreciação de casos semelhantes. Embora, naturalmente, não possamos deixar de reconhecer, num plano doutrinário, que existam alguns mecanismos vantajosos destinados a salvaguardar a expectativa das partes no proferimento de uma decisão baseada na jurisprudência uniforme ou uniformizada, há que sublinhar que os tribunais, na apreciação de qualquer caso concreto, são livres de alterar a jurisprudência firmada ou seguida até então. Com efeito, não obstante a jurisprudência uniformizada vise evitar que se verifiquem decisões contraditórias, com prejuízo para a interpretação e aplicação uniforme do direito e dos princípios da confiança e da igualdade, razão pela qual o sistema admite que existam mecanismos que permitam uniformizar a jurisprudência, num Estado de direito tais mecanismos não podem ter um valor absoluto. De facto, nos sistemas de Direito de inspiração romano-germânico o princípio que vigora neste domínio é o de que as decisões dos tribunais não constituem precedente vinculativo na apreciação de casos idênticos. Esta não vinculatividade permite que o juiz de uma acção possa decidir diferentemente do que foi decidido antes numa outra causa ou do que foi decidido, quanto a casos semelhantes, por outros juízes. Importa neste contexto salientar que os interessados que recorrem a juízo não podem contar com a aplicação da lei nos termos definidos pela jurisprudência uniformizada, uma vez que, se o tribunal a tal se tivesse obrigado, ao arrepio da Constituição, estar-se-ia perante um limite à liberdade de decisão do tribunal, que, nos termos do estatuído no artigo 203.º da Constituição, apenas está sujeito à lei. Isto é, a jurisprudência uniformizada não se configura como regra obrigatória, mas apenas, atendendo ao seu escopo, como um caminho tendencialmente predominante de acordo com o qual os tribunais entendem dever-se aplicar a lei, suprindo, inclusive, eventuais lacunas desta última, ou seja, a jurisprudência não cria o direito, interpreta-o. Doutrinariamente, entende-se que os tribunais só devem divergir da jurisprudência uniformizada quando haja razões para crer que se encontra ultrapassada em função da evolução doutrinária ou jurisprudencial provocada pelas dinâmicas sociais, económicas e sociológicas, ou caso existam fortes fundamentos para crer que não representa, ou já não consubstancia, a melhor hermenêutica jurídica e não traduz a melhor e mais adequada aplicação do direito. No tocante ao caso sub judice, a nossa discordância com jurisprudência uniformizada assenta na convicção de que não consubstancia a melhor solução legal, sendo que, em nosso entendimento, atentos os elementos gerais de interpretação da lei, a melhor solução jurídica, salvo o devido respeito, não é a advogada na presente decisão. Vejamos. 1. Regras em causa a) Do direito à dedução O direito à dedução é um elemento essencial do funcionamento do imposto, devendo garantir a sua principal característica – a neutralidade. Consubstancia-se como o elemento essencial do funcionamento do imposto, a “trave-mestra do sistema do imposto sobre o valor acrescentado”, assentando no método da dedução do imposto, método do crédito de imposto, método subtractivo indirecto ou ainda método das facturas. Como determina o 2.º parágrafo, do n.º 2, do artigo 1.º, da Directiva IVA (DIVA), “Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço bem o serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.” O mecanismo do exercício do direito à dedução permite ao sujeito passivo expurgar do seu encargo o IVA suportado a montante, não o reflectindo assim como custo operacional da sua actividade, retirando, desta forma, o efeito cumulativo ou de cascata, propiciando, tal como referimos, a neutralidade económica do imposto. As situações expressas de exclusão do direito à dedução são excepcionais e reportam-se a casos específicos enunciados pelo legislador nacional em termos taxativos, de acordo com o estatuído na DIVA, em função do tipo de despesas em causa. Decorre dos artigos 168.º e 169.º da Directiva IVA que o sujeito passivo apenas pode deduzir o imposto suportado na medida em que os bens e serviços sejam utilizados para efeitos das próprias operações tributadas, ou isentas que concedam tal direito. Por sua vez, o imposto suportado em inputs destinados à realização de operações não sujeitas não é susceptível de vir a ser deduzido, salvaguardando-se, contudo, as operações localizadas no estrangeiro (não sujeitas no território nacional), mas que seriam tributáveis concedendo direito a dedução se localizadas no território nacional. De acordo com o disposto no artigo 168.º da Directiva IVA, transposto, em parte, pelo artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do CIVA, o sujeito passivo pode deduzir no Estado-membro em que se encontra estabelecido o IVA suportado nas transmissões de bens e prestações de serviços, assim como nas operações assimiladas nas aquisições intracomunitárias de bens e nas importações ali localizadas, “Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas (…) ”. Conforme o estatuído no artigo 179.º da Directiva IVA, “[o] sujeito passivo efectua a dedução subtraindo do montante total do imposto devido relativamente ao período de tributação o montante do IVA em relação ao qual, durante o mesmo período, surgiu e é exercido o direito à dedução por força do disposto no artigo 178.º (…).” Em conformidade com a jurisprudência do TJUE, o direito à dedução não pode ser limitado e pode ser exercido imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efectuadas a montante. Assim, só são permitidas derrogações à regra fundamental do direito à dedução integral do IVA nos casos expressamente previstos pela Directiva, conforme o TJUE salientou, nomeadamente, nos Casos Ampafrance e Sanofi e na jurisprudência aí citada. Ora, a este propósito, a Directiva IVA prevê duas excepções. A primeira visa a legislação existente: a cláusula de standstill do artigo 176.º da Directiva IVA. A segunda excepção, prevista no artigo 177.º da Directiva IVA, visa a nova legislação. Importará ainda mencionar a cláusula geral constante do artigo 395.º, n.º 1, da Directiva, que permite introduzir medidas especiais derrogatórias para simplificar a cobrança do imposto ou para evitar certas fraudes ou evasões fiscais. Em conformidade com o previsto na Directiva IVA, o Código do IVA determina, como regra geral, a dedutibilidade do imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos. Igualmente de acordo com o estatuído na Directiva IVA, o legislador nacional vem determinar algumas situações excepcionais de exclusão do direito à dedução em função do tipo de despesas em causa. As regras do exercício do direito à dedução do imposto contemplam requisitos objectivos, mais ligados ao tipo de despesas, subjectivos, relativos ao sujeito passivo, e temporais, atinentes ao período em que é possível exercer o direito à dedução do IVA, os quais se devem verificar em simultâneo para se exercer o direito à dedução . De acordo com o disposto nos artigos 173.º e 174.º da Directiva IVA, para efeitos do exercício do direito à dedução do IVA suportado os sujeitos passivos mistos, como é caso, isto é,, aqueles que em simultâneo praticam operações que conferem direito à dedução de IVA e operações que não conferem tal direito e utilizam bens e serviços em ambas as operações, podem optar pela aplicação do designado método do pro rata ou pelo método da afectação real. Assim, o n.º 1 do artigo 173.º Directiva IVA vem determinar que: “No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efetuar tanto operações com direito à dedução, referidas nos artigos 168.º, 169.º e 170.º, como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações (…)” O pro rata de dedução é determinado, em conformidade com os artigos 174.º e 175.º, para o conjunto das operações efectuadas pelo sujeito passivo”. Por sua vez, estatui o n.º 1 do citado artigo 174.º (a que correspondia o artigo 19.°, n.º 1, da Sexta Directiva) que “O pro rata de dedução resulta de uma fracção que inclui os seguintes montantes: - no numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido do imposto sobre o valor acrescentado, relativo às operações que conferem direito à dedução em conformidade com os artigos 168.º e 169.º; - no denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido IVA, relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não conferem esse direito à dedução.” Por um lado, a Directiva permite aferir sobre aquela proporção em função do método de percentagem de dedução ou pro rata, tendo por referência o peso do volume de negócios referente às operações que conferem direito a dedução em relação à globalidade das operações. Por outro lado, de acordo com o n.º 2 daquele preceito, determina-se que os Estados membros podem autorizar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade, se possuir contabilidades distintas para cada um desses sectores, obrigar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade e a manter contabilidades distintas para cada um desses sectores, autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na utilização da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços, autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução, em conformidade com a regra estabelecida no n.º 1, relativamente a todos os bens e serviços utilizados nas operações aí referidas, e estabelecer que não se tome em consideração o imposto sobre o valor acrescentado que não pode ser deduzido pelo su- jeito passivo, quando o montante respectivo for insignificante. O pro rata de dedução conforme refere a epígrafe do capítulo 2 da Directiva IVA poderá, em síntese, ser aferida em função do método da percentagem de dedução, o denominado pro rata (que poderá ser geral ou sectorizado), determinado em função do volume de negócios e o regime alternativo, denominado entre nós por afectação real, que terá por base a utilização efectiva dos inputs. Concluindo pela primazia na aplicação do método da afectação real, Xavier de Basto e Odete Oliveira referem que “(…) a leitura correta destas normas obriga a considerar esses procedimentos previstos na diretiva por ordem crescente de “finura” em termos de resultado a obter, constituindo a regra do pro rata, portanto, segundo esta leitura, a que conduz ao resultado menos rigoroso – e por isso ela é a regra aplicável sempre que não seja possível outro procedimento com resultado mais adequado.” Como adequadamente notam os autores, a Directiva IVA “(…) deixa aos Estados membros a possibilidade de aceitar ou mesmo impor os procedimentos mais rigorosos, reservando o pro rata como sistema residual e supletivo”. O artigo 23.º do CIVA vem, nomeadamente. determinar o seguinte: “1 - Quando o sujeito passivo, no exercício da sua actividade, efectuar operações que conferem direito a dedução e operações que não conferem esse direito, nos termos do artigo 20.º, a dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços que sejam utilizados na realização de ambos os tipos de operações é determinada do seguinte modo: a) Tratando-se de um bem ou serviço parcialmente afecto à realização de operações não decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, o imposto não dedutível em resultado dessa afectação parcial é determinado nos termos do n.º 2; b) Sem prejuízo do disposto na alínea anterior, tratando-se de um bem ou serviço afecto à realização de operações decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto é dedutível na percentagem correspondente ao montante anual das operações que dêem lugar a dedução. 2 - Não obstante o disposto da alínea b) do número anterior, pode o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificar que provocam ou que podem provocar distorções significativas na tributação. 3 - A administração fiscal pode obrigar o sujeito passivo a proceder de acordo com o disposto no número anterior: a) Quando o sujeito passivo exerça actividades económicas distintas; b) Quando a aplicação do processo referido no n.º 1 conduza a distorções significativas na tributação. 4 - A percentagem de dedução referida na alínea b) do n.º 1 resulta de uma fracção que comporta, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das operações que dão lugar a dedução nos termos do n.º 1 do artigo 20.º e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, bem como as subvenções não tributadas que não sejam subsídios ao equipamento.” Se atentarmos ao parágrafo 6.º do ponto 98 relativo às conclusões do Relatório do Grupo de Trabalho que entre nós se debruçou sobre esta questão, é-nos referido que a condição de sujeito passivo misto em sede de IVA, abrangida pelo disposto no artigo 23.º do CIVA, não resulta propriamente do exercício simultâneo de operações que conferem o direito à dedução e de operações que não conferem esse direito, mas sim, da utilização “mista” dos seus inputs, isto é, pela afectação simultânea dos inputs em que foi suportado IVA aos dois tipos de operações . Neste sentido, o TJUE, em reiterada jurisprudência, tem entendido que, antes do mais, para efeitos do exercício do direito à dedução, deverá atender-se ao tipo de operações praticadas pelo sujeito passivo em que os bens ou serviços são utilizados. Se tais bens e serviços são afectos exclusivamente à prática de operações que permitem a dedução do imposto, apresentando uma relação directa e imediata com essas operações e incorporando-se, em princípio, no custo das mesmas, o respectivo IVA pode ser deduzido integralmente. Diversamente, caso os bens ou serviços adquiridos sejam afectos exclusivamente à prossecução de operações que não possibilitam a dedução do IVA suportado, tendo uma relação directa e imediata com essas operações e incorporando-se, em princípio, no custo das mesmas, então o respectivo imposto não pode ser objecto de dedução. Assim, tal como a Administração Fiscal esclarece, a aplicação do método do pro rata restringe-se à determinação do imposto dedutível relativo aos bens e/ou serviços de utilização mista, isto é, aos bens e serviços utilizados conjuntamente em actividades que conferem o direito à dedução e em actividades que não conferem esse direito. Por outro lado, caso os bens ou serviços se encontrem exclusivamente afectos a operações sujeitas a imposto mas isentas sem direito à dedução ou a operações que, embora abrangidas pelo conceito de actividade económica, estejam fora das regras de incidência do imposto ou de operações não decorrentes do exercício de uma actividade económica, o IVA suportado não pode ser objecto de dedução. Caso se constate não ser possível estabelecer um nexo objectivo entre a operação a montante e a operação a jusante “(…) por respeitar a bens e serviços que são ou serão usados tanto em operações do primeiro como do segundo tipo, esse qualificar-se-á como “residual” e será então objeto de “repartição”(apportionment)(…)”. O método de percentagem de dedução (pro rata), poderá ser afastado por aplicação, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do mesmo artigo 23.º, do método de afectação real, que consistirá na possibilidade de deduzir a totalidade do imposto suportado na aquisição de bens e serviços destinados a actividades que dêem lugar à dedução, mas impedindo, ao mesmo tempo, a dedução do imposto suportado em operações que não conferem esse direito. Não se pode falar de um método de repartição mais apropriado para a dedução de inputs mistos, até porque tal deverá assentar numa análise casuística. No entanto, qualquer que seja o método de custos seguido, a aplicação prática da afectação real pressupõe a existência de uma relação entre as aquisições de bens e serviços efectuadas pelo sujeito passivo e as operações activas correspondentes. No Caso Securenta o TJUE foi chamado pronunciar-se sobre o critério de repartição adequado quando os inputs são simultaneamente afectos a uma actividade económica e a uma actividade não económica, tendo salientado que “a Sexta Diretiva não contêm qualquer disposição relativa aos métodos ou aos critérios que os Estados Membros devem utilizar na separação dos montantes de imposto a montante relativos à actividade económica dos relativos à actividade não económica.” No entanto, alerta que os Estados membros no exercício desse poder devem assegurar os objectivos prosseguidos pela Directiva, não podendo contrariar o princípio da neutralidade fiscal. A Autoridade Tributária entendeu sempre a aplicação prioritária do pro rata em detrimento da afectação real, contudo, esta posição foi invertida na sequência da alteração introduzida no artigo 23.º do CIVA. Efectivamente, pro rata e afectação real são agora percepcionados pela Administração Fiscal, no âmbito do exercício de uma actividade económica, num plano de igualdade, de utilização facultativa, ambos norteados pelo magnum princípio da neutralidade económica do imposto e da tradução da objectiva afectação de cada input. b) O método de percentagem de dedução (pro rata) e as operações de locação financeira Como vimos, no contexto da separação ex post, em conformidade com o método da percentagem de dedução ou pro rata, previsto na alínea b), do n.º 1, do artigo 23.º do CIVA, toma-se como referência, no seu numerador, o montante anual das operações que conferem direito a dedução, ponderado em função da totalidade das operações que se insiram no conceito de actividade económica. A consideração, no denominador da fracção, de operações que se insiram no âmbito do conceito de actividade económica, constitui uma evidente clarificação ocorrida por via da alteração legislativa incutida ao artigo 23.º do CIVA por parte da Lei do Orçamento do Estado para 2008, conduzindo, necessariamente, à alteração das orientações administrativas da AT e das posições entretanto assumidos pelos tribunais nacionais. Na determinação da percentagem de dedução por esta via, deverá salvaguardar-se o facto de que apenas as operações inseridas no âmbito da actividade económica, conforme é delimitada pela Directiva IVA e pela jurisprudência divulgada pelo TJUE, é que poderão influenciar o direito à dedução, por esta via, dos sujeitos passivos mistos. A aplicação do método do pro rata suscita algumas questões fundamentais, tais como as que nos por ora nos ocupam. 4. O caso concreto No presente processo está precisamente em causa aferir se na determinação do pro rata a Requerente procedeu correctamente ao ter considerado, quer no numerador quer no denominador, as amortizações financeiras relativas aos contratos de locação financeira e os valores de alienação/abate por destruição de bens locados. Vejamos. De acordo com o entendimento da AT não deverá ser incluído no numerador e no denominador da fracção a componente de amortização de capital nas rendas dos contratos de locação financeira mobiliária (e, bem assim o valor de alienação/indemnização/abate de bens locados), mas apenas a componente de juros. Assim, no Ofício Circulado n.º 30108, de 30 de Janeiro de 2009, veio a AT estabelecer, designadamente, o seguinte: “Na aplicação do método da afectação real, nos termos do número anterior sempre que não seja possível a aplicação de critérios objectivos de imputação dos custos comuns, deve ser utilizado um coeficiente de imputação específico, tendo em conta os valores envolvidos, devendo ser considerado no cálculo da percentagem de dedução apenas o montante anual correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de Leasing ou de ALD”. No tocante à amortização financeira, tem defendido a AT que “a componente financeira correspondente à amortização do financiamento subjacente à aquisição do bem locado”, não sendo uma contrapartida de uma transmissão de bens ou prestação de serviços, “não tem a natureza de proveito e não pode, por isso, integrar o volume de negócios” (cfr. Relatório de Inspecção relativo ao ano de 2008, junto como documento n.º 9). No mesmo sentido, no respeitante à alienação/indemnização de bens abatidos por destruição, a AT defende que “o valor da indemnização não constitui proveito do locador” nem “integra[m] o volume de negócios” (Cfr. Relatório de Inspecção relativo ao ano de 2008, junto como documento n.º 9). Isto é, de acordo com o entendimento veiculado pela AT, nenhuma das situações supra referidas se consubstancia como um verdadeiro proveito, não podendo, por isso, integrar o volume de negócios e, consequentemente, fazer parte do cálculo do pro rata. Neste contexto, a AT invoca, para efeitos de determinação do conceito de volume de negócios a que alude o n.º 1 do artigo 174.º da Directiva IVA, o conceito de volume de negócios definido pelo Regulamento (CE) n.º 139/2004 do Conselho, de 20 de Janeiro – relativo ao controlo das concentrações de empresas –,aplicável às instituições financeiras, segundo tem alegado a AT, por força da Comunicação constante do Jornal Oficial das Comunidades n.º C 66 de 02.03.1998. Nestes termos, a AT conclui que o capital (correspondente à amortização financeira da operação) não constitui a remuneração de um qualquer serviço prestado, i.e., não consubstancia um proveito que possa influenciar o resultado do exercício e, assim sendo, não é passível de integrar o volume de negócios para efeitos de determinação da percentagem de dedução (i.e., para apuramento do pro rata). Neste contexto, na Informação n.º 1763, da Direcção de Serviços de IVA, de 8 de Setembro de 2008 e no citado Ofício Circulado n.º 30108, conclui-se que apenas os juros e outros encargos é que constituem remuneração pelo serviço prestado, pelo que apenas estes podem ser considerados para efeitos do cálculo do pro rata, pelo que, do numerador, deverão ser excluídos os montantes correspondentes ao capital das rendas dos contratos de locação financeira e ao capital da alienação/indemnização de bens abatidos por destruição. Ora, como bem salientam os Professores Doutores José Guilherme Xavier de Basto e António Martins , deve ser sobre a totalidade da renda, sem distinção entre juro e capital, que se deve liquidar IVA, pois o valor tributável do imposto, nas operações de locação financeira é, segundo a alínea h) do n.º 2 do artigo 16.º do CIVA, “o valor da renda recebida ou a receber do locatário”; sendo igualmente claro que o numerador da fracção que exprime a percentagem a dedução é constituído pelo “montante anual, imposto excluído, das operações que dão lugar à dedução”, ou seja pelo valor das operações que foram tributadas, e que o respectivo denominador é o “montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo…”, o que obviamente inclui as primeiras. Com efeito, o entendimento da AT de tributar toda a renda, como determina o disposto na alínea h) do n.º 2 do artigo 16.º, do CIVA, e de expurgar, para efeitos de apuramento da percentagem de dedução, do numerador e do denominador da fracção a parte da renda correspondente à amortização não tem apoio directo nos textos legais. Não se encontra prevista na legislação nacional a possibilidade de a AT poder alterar / modelar a componente do pro rata, não tendo o legislador nacional feito uso da faculdade que o TJUE entende estar à disposição dos Estados membros de limitar os valores a inserir no numerador e no denominador da aludida fracção. As distorções de tributação que o legislador nacional previu que poderiam existir na modulação do direito à dedução são, no nosso ordenamento jurídico, resolvidas através da imposição ao sujeito passivo do método da afectação real (n.º 3, alínea b) do artigo 23.º do CIVA), ou, quando resultam do facto de o sujeito passivo ter optado por este método, da imposição de o abandonar (parte final do n.º 2 do mesmo artigo). É certo que a lei consente que, no caso de opção pelo método da afectação real, a Administração possa impor ao sujeito passivo “condições especiais”, que a lei não define, mas tais condições não podem consistir em alterações ao pro rata de dedução nos termos ora pretendidos pela AT. De facto, as regras acolhidas na Directiva do IVA, não obstante a margem concedida aos Estados membros no âmbito do exercício do direito à dedução de bens e serviços de utilização mista, não atribuem à AT poderes para alterar o modo de cálculo da percentagem de dedução do IVA autorizada para os bens de utilização mista, ou seja, relativamente aos custos comuns que não puderam ser atribuídos por critérios objectivos aos dois grupos de operações, tributadas e isentas, do sujeito passivo. Na realidade, a acolher-se o entendimento da AT, existiria manifestamente uma contradição entre o algoritmo de cálculo da percentagem de dedução e o princípio base que orienta esse cálculo, que é, como temos estado a analisar, o da dedução parcial em proporção do montante das operações que conferem direito à dedução. Adite-se ainda que a jurisprudência do TJUE no denominado Caso Banco Mais, não poderá colher no sentido invocado pela AT. Com efeito, neste Caso o TJUE considerou que a Sexta Directiva do IVA não se opõe a que os Estados membros apliquem, numa determinada operação, um método ou um critério diferente do método baseado no volume de negócios, desde que esse método garanta uma determinação do pro rata de dedução mais precisa do que a resultante daqueloutro método. 131.º Ora, analisado o Acórdão do TJUE proferido no Caso Banco Mais, conclui-se que parte de uma premissa que não está correcta, dado assumir uma interpretação, sem na realidade verificar se a lei portuguesa (o disposto no artigo 23.º do Código do IVA) prevê ou não mecanismos que permitam à AT impor outros métodos de dedução de IVA para bens e serviços de utilização mista. De facto, não se nos afigura que o normativo constante do n.º 2 do artigo 23.º do Código do IVA (conjugado com o n.º 3) represente uma transposição para o direito interno da regra da determinação do direito à dedução acolhida no artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva, que se configura como uma disposição derrogatória da regra prevista nos artigos 17.º, n.º 5, primeiro parágrafo, e 19.º, n.º 1, de tal Directiva. No mesmo sentido, já se pronunciou o Tribunal Arbitral nas suas decisões proferidas nos Processos Arbitrais números 309/2017-T, 311/2017-T 312/2017-T, 335/2018-T, 339/2018-T, 498/2018-T, e 581/2018-T14, a cujas conclusões aderimos. Termos em que se conclui que o disposto no artigo 23.º, n.º 2, do CIVA, não confere a possibilidade à AT de, no âmbito da aplicação do método do pro rata a um sujeito passivo que exerce, nomeadamente, actividades de locação financeira, apenas considerar os juros na fracção do pro rata de dedução, pelo que a imposição de utilização do “coeficiente de imputação específico” indicado no ponto 9. do Ofício Circulado n.º 30108 enferma de violação de lei, por ofensa do princípio da legalidade ao qual a AT se encontra subordinada em toda a sua actuação (artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55º da LGT), devidamente explicitado no artigo 3.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, devendo assim proceder o pedido de pronúncia arbitral.” *** III) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
In casu, a Impugnante não se conforma com a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 887/2019-T, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral, apresentado contra os atos tributários de liquidação de IVA, referentes ao ano de 2005, no montante de €824.257,25. Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto, no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações da impugnação definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões da impugnação cumpre apreciar se a decisão arbitral padece de: - Nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão, porquanto os factos tributários respeitam ao ano de 2005, as liquidações dimanam de uma ação inspetiva ocorrida em 2006, e fundam-se, em rigor, num Ofício Circulado datado de 2009; - Subsidiariamente, se incorreu em nulidade por omissão de pronúncia, na medida em que entendeu não conhecer da ilegalidade consubstanciada na irretroatividade da lei fiscal, quando, ademais, vigora o princípio jura novit curia. Apreciando. Comecemos, então, pela nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão. Alega a Impugnante que, o Tribunal Arbitral incorreu em manifesta oposição dos fundamentos com a decisão, na medida em que deu como provado que os factos tributários respeitam, exclusivamente, ao ano de 2005, resultando as liquidações adicionais de uma ação inspetiva realizada em 2006, quando, em rigor, o Ofício Circulado n.º 30108 que fundou o indeferimento da pretensão data de 30 de janeiro de 2009. Densifica, adicionalmente, que uma decisão arbitral que deu como provada a realidade evidenciada, necessariamente que tem de decretar a ilegalidade das liquidações impugnadas, porquanto até à data do evidenciado Ofício-Circulado havia um vazio legal, uma vez que o Estado Português não havia usado a faculdade conferida pela lei para introduzir um coeficiente de imputação específico no que diz respeito ao cálculo do pro rata do IVA dedutível dos custos comuns quando entendesse que a aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA causaria distorções significativas de tributação. Vejamos. Em termos de regime da arbitragem voluntária em direito tributário, introduzido pelo Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT) o expediente processual de reação à decisão dos Tribunais Arbitrais para os Tribunais Centrais Administrativos, consiste na dedução de impugnação, consagrada no artigo 27.º, com os fundamentos enunciados, taxativamente, no artigo 28.º, nº 1 e que infra se enumeram: a-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; b-Oposição dos fundamentos com a decisão; c-Pronúncia indevida ou omissão de pronúncia; d-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16.º, nº 2 . Ora, subsumindo-se a arguida nulidade, no citado normativo, concretamente, na alínea b), vejamos, então, se a mesma procede. No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125, nº.1, do CPPT (1-cfr.Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.361 e seg.; Ac.S.T.A-2ª.Secção, 18/2/2010, processo nº 1158/09; Ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/4/2014, processo nº 7435/14.) e no RJAT, está, como visto, expressamente regulado no artigo 28.º, nº1, alínea b). Sendo que, o artigo 615.º nº.1, alínea c), do CPC, preceitua, igualmente, que é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Concatena-se, assim, com a necessidade de um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artigo 154.º, nº 1, do CPC. Com efeito, o vício em análise, tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adotada (2-vide Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985.). No caso sub judice, não vislumbra este Tribunal que a decisão recorrida padeça da nulidade em análise, uma vez que atentando no seu teor conclui-se que a mesma não comporta nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que tendo decidido pela improcedência do pedido, a fundamentação jurídica de tal peça processual vai no mesmo sentido. Note-se que são realidades díspares e não confundíveis a nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão e a mera discordância com a fundamentação jurídica. In casu, cotejando a fundamentação da decisão supra expendida, resulta que o decisor enuncia a factualidade que reputa de relevante, estabelecendo uma concreta delimitação da lide, convocando o regime normativo, e depois mediante transposição para o caso vertente conclui no sentido de que a norma do artigo 23.º, n.º 2, do CIVA procedeu à transposição para o direito interno do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Diretiva, assim afastando a ilegalidade que era imputada aos atos de liquidação impugnados. Com efeito, mediante análise aturada do visado Acórdão, verifica-se que o mesmo começa por definir a questão decidenda, enunciando-a da seguinte forma: se na aplicação do método pro rata de dedução de imposto suportado nos bens e serviços de utilização mista, devem ser considerados no numerador e no denominador da fração de cálculo o valor total da renda e não apenas a parte correspondente aos juros que constitui o proveito ou rendimento do locador. Após definir o quadro legal, e enquadramento do direito à dedução e correspondentes métodos de cálculo , tece os competentes considerandos de direito quanto ao pro rata, faz alusão à Jurisprudência do CAAD e conclui mediante adesão à Jurisprudência do STA, mormente, Uniformização de Jurisprudência, no sentido de que “[a] questão de direito que vem colocada obteve já resposta do acórdão de uniformização de jurisprudência do STA, em termos a que o tribunal arbitral não pode deixar de aderir, ao consignar que a norma do artigo 23.º, n.º 2, do CIVA efectuou a transposição para o direito interno do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva.” Enfrenta, depois, a questão do Ofício Circulado num item autónomo epigrafado de “Ilegalidade dos actos tributários impugnados por respeitarem a um período de tributação anterior ao ofício-circulado n.º 30108”, no qual conclui que essa questão só foi convocada, inovatoriamente, em sede de alegações sendo, portanto, insuscetível de conhecimento. In fine, quanto à arguida inconstitucionalidade das normas dos n.ºs 2 e 3 do artigo 23.º do CIVA, entendeu não a conhecer na medida em que o Tribunal não adotou a interpretação normativa reputada como sendo inconstitucional. Termina julgando prejudicado o conhecimento do pedido de pagamento de juros indemnizatórios, atenta a improcedência da impugnação. Ora, face ao exposto há que concluir que os fundamentos expressos pelo Tribunal Arbitral não conduziriam a uma solução de sentido antagónico, o mesmo é dizer que a proposição final (conclusão) revela-se compatível com as proposições logicamente antecedentes (fundamentos), inexistindo, assim, vício de raciocínio, donde nulidade. Destarte, perceciona-se que a Impugnante, sob a “veste” de nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão arguiu um erro de julgamento, visto que, rigorosamente, não assaca uma concreta oposição, mas apenas uma desconformidade com o sentido jurídico adotado na decisão impugnada, na medida em que interpretou, errada e ilegalmente, uma realidade basilar coadunada com um Ofício Circulado emanado posteriormente. Aliás, tal erro de julgamento resulta patente do teor das alegações da impugnação, mormente, do seu artigo 51.º na qual a Impugnante aduz que não se pode concluir “pela legalidade das liquidações adicionais de IVA referentes ao ano de 2005 quando as mesmas respeitam a 2005, ou seja, a uma data muito anterior à da emissão do Ofício-Circulado 30108 (de Janeiro de 2009) que legitimou a AT a introduzir o coeficiente específico do pro rata.” Do supra expendido resulta que a Impugnante entende que o Tribunal Arbitral incorreu em erro de julgamento por errónea apreciação dos pressupostos de facto e de direito, porquanto desconsiderou premissas de facto e de direito que, se interpretadas de acordo com a lei e com o princípio basilar da irretroatividade da lei fiscal -em conformidade, ademais, com o princípio do conhecimento oficioso do direito- cominariam os atos de vício de violação de lei. Resulta, assim, que tais asserções em nada redundam em nulidade quando muito em erro de julgamento, o qual está cerceado aos poderes de cognição deste Tribunal. Com efeito, a propositura da impugnação da decisão arbitral não confere a este órgão jurisdicional o poder de se pronunciar sobre o objeto do litígio, e isto porque a ação de anulação tem efeitos puramente cassatórios ou rescisórios, não atribuindo competência substitutiva ao tribunal, dado que o objeto da ação é, tão-só, a decisão arbitral e não a situação material litigada, ela mesma. Nessa medida, caso se verifique um fundamento de anulação, este Tribunal deve limitar-se a anular ou a cassar a decisão arbitral, não podendo substituí-la por outra (3-cfr. artigo 25.º, do RJAT; Acórdão T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2015, processo nº 8224/14; Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, pág.237 e seguintes.). E por assim ser, face a todo o exposto improcede a arguida nulidade. Atentemos, ora, na omissão de pronúncia. Alega a Impugnante que a decisão é, igualmente, nula por omissão de pronúncia porquanto concluiu que “não é possível conhecer, por conseguinte, do novo vício de ilegalidade aduzido nas alegações”, ou seja, da ilegalidade consubstanciada por o Ofício-Circulado 30108 ser posterior (2009) aos factos tributários (2005), quando, em rigor, vigora o princípio jura novit curia ou princípio do conhecimento oficioso do direito. Ora, não tendo o Tribunal Arbitral conhecido de tal questão incorre em nulidade por omissão de pronúncia. Apreciando. A nulidade da decisão por omissão de pronúncia sucede apenas quando a mesma deixe de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal. Dir-se-á, neste particular e em abono da verdade que, as questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. De notar para o efeito que, as questões não são passíveis de qualquer confusão conceptual com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa preceituada no citado normativo 615.º, nº 1, alínea d), do CPC. Conforme doutrinado por ALBERTO DOS REIS (4-Código de Processo Civil anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143) “[s]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”. Ora, transpondo os aludidos ensinamentos ao caso vertente, ter-se-á de concluir pela improcedência da aludida arguição, na medida em que mediante uma leitura atenta da Decisão Arbitral se retira, de forma inequívoca, que existiu expressa pronúncia sobre a aludida questão ainda que sem apreciação do mérito, atenta a extemporaneidade da sua alegação. Note-se que, a omissão de pronúncia apenas sucede quando ocorre uma ausência de posição ou de decisão do Tribunal sobre questões que lhe sejam submetidas, o que, de todo, se verifica no caso vertente. Mas atentemos, então, o que, neste particular, é, expressamente, evidenciado no Acórdão visado: “Ilegalidade dos actos tributários impugnados por respeitarem a um período de tributação anterior ao ofício-circulado n.º 30108 Em alegações, a Requerente invoca inovatoriamente a ilegalidade dos actos tributários impugnados por respeitarem a um período de tributação anterior ao ofício-circulado n.º 30108, considerando assim verificar-se a violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal. A este propósito, cabe referir que o presente pedido arbitral foi deduzido ao abrigo do regime de migração de processos previsto no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de Outubro, pelo qual os sujeitos passivos poderiam, até 31 de dezembro de 2019, submeter aos tribunais arbitrais tributários, dentro das respetivas competências, as pretensões que tenham formulado em processos de impugnação judicial que se encontrem pendentes de decisão em primeira instância nos tribunais tributários, e que nestes tenham dado entrada até 31 de dezembro de 2016 (n.º 1). Resulta ainda do n.º 2 desse artigo que “as pretensões a submeter aos tribunais arbitrais devem coincidir com o pedido e a causa de pedir do processo a extinguir, apenas se admitindo a redução do pedido”. Ora, a impugnação judicial deduzida no Tribunal Tributário de Lisboa contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa e os actos de liquidação adicional de IVA – que constitui o documento n.º 1 junto ao pedido arbitral - não contém qualquer referência à falada violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal, pelo que a invocação desse novo fundamento representa uma ampliação da causa de pedir que não é admitida nos processos de impugnação judicial cometidos aos tribunais arbitrais. Não é possível conhecer, por conseguinte, do novo vício de ilegalidade aduzido nas alegações.” Ora, face ao supra expendido é, por demais evidente, que existiu uma apreciação da questão, ajuizando o Tribunal Arbitral, de forma fundamentada -e independentemente da bondade e do seu acerto que, ora, como visto, não compete analisar- quais as razões que estavam na génese da adoção desse juízo de entendimento. Infere-se, é certo, que a Impugnante discorda da interpretação adotada pelo Tribunal Arbitral quanto à concreta possibilidade de invocação superveniente de novos vícios e ao próprio alcance e extensão da alteração da causa de pedir, sua conformação com o artigo 5.º, nº3 do CPC, e com a própria estabilidade da instância, mas a verdade é que tais realidades em nada se coadunam com a arguida nulidade, mas sim com o erro de julgamento, porquanto representam, tão-só, discordância com o sentido decisório. E por assim ser, e sem necessidade de quaisquer considerações adicionais, improcede, igualmente, a arguida nulidade por omissão de pronúncia. Aqui chegados, subsiste apenas por analisar a questão da dispensa do remanescente do pagamento da taxa de justiça, relevando, desde já, que a decisão de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça somente tem aplicação no âmbito da presente instância de impugnação da decisão arbitral junto deste TCAS, que não na instância arbitral (5Vide Acórdãos do TCA Sul, proferidos nos processos 9420/16 e 31/17, de 29 de junho de 2016 e 22 de março de 2018, respetivamente.). Apreciando. No Aresto do STA, proferido no processo nº 01953/13, de 07 de maio de 2014, doutrina-se que: “A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade”. No caso sub judice, considera-se que o valor de taxa de justiça devida a final, calculado nos termos do tabela I.B., do RCP, é excessivo. Porquanto, ponderadas as circunstâncias do caso vertente à luz dos critérios escolhidos pelo legislador, em especial, o comportamento processual das partes litigantes, sem qualquer reparo negativo a apontar, a complexidade do processo – atendendo a que as questões decidendas, não exigiram do julgador especiais e diversos conhecimentos técnicos e jurídicos, antes se mantiveram dentro de parâmetros normais e comuns – encontra-se preenchido o circunstancialismo do n.º 7, do artigo 6.º do RCP, decretando-se, assim, a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça. *** IV. DECISÃO Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO, SUBSECÇÃO COMUM, deste Tribunal Central Administrativo Sul em JULGAR IMPROCEDENTE A PRESENTE IMPUGNAÇÃO. Condena-se a Impugnante em custas, com dispensa, na presente instância de impugnação de decisão arbitral, de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que excede os €275.000,00. Registe. Notifique. Lisboa, 05 de dezembro de 2024 (Patrícia Manuel Pires) (Tânia Meireles da Cunha) (Cristina Coelho da Silva) |