Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 60/08.6BEALM |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 12/19/2024 |
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Relator: | ISABEL SILVA |
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Descritores: | IMPUGNAÇÃO DE NORMAS FUNDAMENTAÇÃO ECONÓMICO FINANCEIRA DAS TAXAS REGIME TRANSITÓRIO-RGTAL |
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Sumário: | I- A entrada em vigor da Lei 53-E/2006 de 29.12 (RGTAL), em 01.01.2007, implicou que, sob pena de nulidade, os regulamentos que criassem taxas das autarquias locais, passassem a conter um conjunto de elementos, entre os quais, a fundamentação económico financeira relativa ao valor desses tributos (Cf. artigo 8º do RGTAL); II- Por sua vez, o artigo 17º do mesmo diploma, estabelecia que, até 01.01.2009, os regulamentos já aprovados deviam ser adequados às novas exigências contidas no RGTAL, sob pena de serem revogados. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tibutária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subseção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada (ora recorrente) veio recorrer da sentença proferida em 22.03.2019, por aquele Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, na qual foi julgada improcedente a ação administrativa especial, em que era pedida a declaração de ilegalidade de normas com força obrigatória geral, mais precisamente dos artigos 7º e 8º do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal, aprovado pela Assembleia Municipal e publicado por aviso, no Diário da República, II série, de 13.04.2007, através dos quais foi criada a taxa de utilização da rede de Efluentes. * A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso tem por objeto a sentença proferida nos autos à margem referenciados que, no entender do Ministério Público, padece de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação da lei ao caso concreto. 2. Erro este evidenciado numa incorreta subsunção da matéria de facto tida por provada ao disposto no artigo 17.° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de dezembro, numa desacertada articulação entre o artigo 8.° da Lei n.° 53-E/2006 e o artigo 17.° do mesmo diploma legal e ainda numa equivocada desaplicação daquele artigo 8º 3. Tendo a aplicação do artigo 17.° da Lei n.° 53-E/2006 sido determinante para o desfecho da presente ação, como se extrai da fundamentação jurídica da sentença sob recurso. 4. Dispõe tal preceito na versão inicial, aqui aplicável (face às datas de toda a factualidade tida por provada na sentença recorrida e uma vez que a versão seguinte foi já atribuída ao mesmo pela Lei n.° 64-A/2008 de 31 de dezembro), sob a epígrafe "Regime transitório": "As taxas para as autarquias locais atualmente existentes são revogadas no início do segundo ano financeiro subsequente à entrada em vigor da presente lei, salvo se, até esta data: a. Os regulamentos vigentes forem conformes ao regime jurídico aqui disposto; b. Os regulamentos vigentes forem alterados de acordo com o regime jurídico aqui previsto" (destaque e sublinhado nosso). 5. A destacada expressão "atualmente existentes" do citado artigo 17.° é indubitavelmente, afigura-se-nos, referente às "taxas para as autarquias locais". 6. A atualidade à qual este segmento da norma se reporta na palavra "atualmente" corresponde, a nosso ver - e no que respeita à versão originária do dispositivo em questão, única que aqui importa como supra mencionado -, à data de entrada em vigor da Lei n.° 53-E/2006, ou seja, a 1 de janeiro de 2007. 7. Esta correspondência dimana dos elementos da interpretação literal ("letra da lei") e sistemático ("unidade do sistema jurídico"), bem como da respetiva ratio legis ("pensamento legislativo"). Elementos da interpretação e ratio legis estes a cuja importância se refere o artigo 9.° do Código Civil, sob a epígrafe "Interpretação da lei". 8. Como preconiza Baptista Machado, extrai-se deste preceito constituir a letra da lei “o ponto de partida da interpretação” e, no que concerne à letra da lei na situação em apreço, à expressão "atualmente existentes" empregue no artigo 17.° da Lei n.° 53-E/2006 atinente às "taxas para as autarquias locais" como ponto de começo da interpretação é de atribuir o significado, por tal letra comportado, de a respetiva criação ser anterior ao ou pelo menos contemporânea do momento presente. 9. Que o início da existência das taxas para as autarquias locais coincide com a criação das mesmas resulta também da interpretação sistemática a efetuar, com apelo à "unidade do sistema jurídico" - cfr. o artigo 9.°, n.° 1 do Código Civil -, especificamente ao artigo 8.°, n.° 1 da Lei n.° 53-E/2006, que sob a epígrafe "Criação de taxas" preceitua: "1 - As taxas das autarquias locais são criadas por regulamento aprovado pelo órgão deliberativo respetivo". 10. Sendo também mediante o recurso ao elemento sistemático da interpretação que, a nosso ver, se há de definir a que momento atual, momento presente, se reporta o artigo 17º da Lei n.° 53-E/2006 em apreço. Encontrando-se assim tal momento na ponderação conjunta deste artigo 17.° e do preceito imediatamente subsequente ao mesmo: o artigo 18º do mesmo diploma legal, que determina a data de entrada em vigor seja do diploma em geral seja do artigo 17º, no que ora releva, em particular: a data de 1 de janeiro de 2007. 11. No sentido do sustentado aponta também a correspondente ratio legis, o pensamento legislativo. Elemento este que, aliás, surge mencionado de modo acertado no seguinte trecho da sentença recorrida: “O legislador decidiu facultar aos municípios um período transitório para adaptação ao RGTAL dos seus Regulamentos 12. Período de adaptação ou adequação dos regulamentos concedido pelo legislador aos municípios ao qual se reporta igualmente o Acórdão do STA proferido no Processo n.° 0479/16 e datado de 27/09/2017, tendo por Relator o Exm.° Senhor Juiz Conselheiro António Pimpão. 13. Ora, a adequação pressupõe uma pré-existência, como resulta dos significados atribuídos ao correspondente verbo: “Modificar ou modificarse para determinado uso o que estava feito para outro uso”; “Fazer ou sofrer adaptação ou ajustamento consoante a situação” (destaques e sublinhados nosso). 14. Assim, a focada intenção legislativa carece de sentido em relação a regulamentos que não existiam ainda aquando da entrada em vigor da Lei em questão e que não tinham, portanto, de se conformar com uma alteração que lhes foi superveniente. Se esta alteração já se tinha verificado antes da aprovação de tais regulamentos, inexistia qualquer mudança a que os mesmos se tivessem de adaptar. 15. Portanto, também pelo prisma da ratio legis da norma em causa e em relação a regulamentos de criação das taxas autárquicas que foram precedidos pelo regime jurídico em causa, desde o início que aqueles deveriam ter observado este. 16. Transpondo o enunciado raciocínio para a situação em análise, é de considerar desde logo que a aprovação pela Assembleia Geral do Município do Seixal do “Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal" em causa sucedeu “Em 21/2/2007” (destaque e sublinhado nosso), como consta do ponto 3 da matéria de facto assente na decisão judicial. 17. O que significa designadamente que, quando a Lei n.° 53-E/2006 entrou em vigor, em 1 de janeiro de 2007, ainda aquele Regulamento não tinha sido aprovado (pois apenas o foi em 21/02/2017), não tendo em consequência ainda sido criada a taxa de utilização da rede de afluentes à qual se reportam os respetivos artigos 7.° e 8.°. Não existindo, portanto, ainda esta taxa para a autarquia local do Seixal aquando da entrada em vigor da Lei n.° 53-E/2006. 18. Conclusão esta que retira o caso concreto da alçada de aplicação do artigo 17.° da Lei n.° 53-E/2006, impede que aquele caso possa ser subsumido a este preceito por não se verificar o respetivo pressuposto da existência da taxa em 1 de janeiro de 2007. Contrariamente ao entendimento firmado na sentença sob recurso e que foi decisivo para o desfecho da mesma. 19. Pelo que, subjacente a esta errada subsunção da matéria de facto esteve uma desacertada articulação efetuada pela Mm.a Juíza a quo entre o artigo 8.° da Lei n.° 53- E/2006 de 29 de dezembro e o artigo 17.° do mesmo diploma legal. 20. Isto porque, quando as taxas não são pré-existentes relativamente a 1 de janeiro de 2007 tendo sido criadas após esta data (como ocorre no caso), deixa de ser aplicável o artigo 17.° da Lei n.° 53-E/2006 e, consequente e diversamente do decidido nos presentes autos, a obrigação legal de exposição da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas é imposta pelo artigo 8.°, n.° 2, alínea c) desse diploma legal desde o momento da criação de tais taxas. 21. Assim, não se impondo na situação em apreço o deferimento de aplicação a que respeita o artigo 17.° da Lei n.° 53-E/2006, é de ter por imediatamente aplicável à mesma - para além do mais e no que aqui releva - a exigência de fundamentação económico- financeira contida no artigo 8.°, n.° 2, alínea c) da Lei n.° 53-E/2006. 22. Ora, ponderando o teor do “Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal" em causa, constante do ponto 1 da factualidade tida por provada na sentença sub judice, à luz do transcrito artigo 8.°, nº 2, alínea c) da Lei nº 53-E/2006, concluímos que aquele não contém - nomeadamente na respetiva nota justificativa - "A fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local". 23. Não é assim permitido aos destinatários do “Regulamento" em questão aferir da adequação do mesmo à atividade pública local desenvolvida ou a desenvolver, assim como da sua proporcionalidade. 24. Sendo esta possibilidade de aferição o objetivo da legalmente exigida "fundamentação económico-financeira" como decorre designadamente de uma interpretação sistemática do reproduzido artigo 8.°, quando pensado em conjunto com o artigo 4.°, n.° 1 da Lei n.° 53- E/2006, no qual, sob a epígrafe "Princípio da equivalência jurídica” se lê: "1 - O valor das taxas das autarquias locais é fixado de acordo com o princípio da proporcionalidade e não deve ultrapassar o custo da atividade pública local ou o benefício auferido pelo particular”. 25. Deste modo, o “Regulamento" em apreço padece do vício de ilegalidade, sendo nulo por falta de requisitos legais e, nessa medida, a taxa nele prevista é ilegal por violação do disposto no artigo 8.°, n.° 2, alínea c) da Lei n.° 53-E/2006. 26. Deveria, pois, a presente ação administrativa especial instaurada pelo Ministério Público ter sido julgada procedente e, em consequência, como peticionado, ter sido declarada a ilegalidade, com força obrigatória geral, do “Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal", aprovado pela Assembleia Municipal e publicado por aviso no Diário da República, II Série, de 13 de abril de 2007, designadamente das normas constantes dos seus artigos 7.° e 8.°, que criam a taxa de utilização da rede de efluentes. 27. Ao decidir diversamente, incorreu a sentença objeto do presente recurso em violação de lei, concretamente do consignado quer no artigo 17.° da Lei n.° 53-E/2006 quer no artigo 8.°, n.° 2, alínea c) do mesmo diploma legal. Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá o presente recurso jurisdicional ser julgado procedente e, em consequência, ser a sentença recorrida revogada e substituída por outra que decida como peticionado”. * A Recorrida apresentou contra-alegações, nos termos que se seguem: 1ª- A D. sentença recorrida encontra-se devidamente fundamentada e procede a correcta interpretação e aplicação do direito aos factos assentes nos presentes autos, pelo que não merece censura, devendo ser integralmente confirmada, com as legais consequências. 2ª- Nos presentes autos, o A. veio apresentar pedido de declaração de ilegalidade, com força obrigatória geral, dos arts. 7° e 8° do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal, aprovado pela Assembleia Municipal do Seixal e publicado na 2a série do DR de 13 de Abril de 2007, através dos quais foi criada a Taxa de utilização da rede de Efluentes. 3ª- O argumento com que o A. fundamentou a acção é a alegada insuficiência da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, supostamente em violação da alínea c) do n.° 2 do art. 8° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que veio estabelecer novas exigências em sede de fundamentação económico-financeira do valor das taxas previstas nos Regulamentos das Autarquias Locais. 4ª-O argumento do A. não procede, pois o Regulamento aprovado pela Assembleia Municipal conformou-se com a legislação em vigor, não padecendo da ilegalidade que lhe é imputada. 5ª- A produção de efeitos da obrigação da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas das autarquias locais, prevista na alínea c) do n.° 2 do art. 8° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, sob pena de nulidade das taxas municipais, estava inicialmente prevista para o início do segundo ano financeiro subsequente à entrada em vigor da Lei (1 de Janeiro de 2009) e foi sucessivamente prorrogada até 30 de Abril de 2010. 6ª-A produção de efeitos da obrigação da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas das autarquias locais, prevista na alínea c) do n.° 2 do art. 8° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, foi diferida (inicialmente para 1 de Janeiro de 2009 e, a final, para 30 de Abril de 2010). 7ª- Não pode aplicar-se às taxas previstas no Regulamento Municipal em apreço a nulidade prevista no art. 8° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, antes de 30 de Abril de 2010. 8ª- O recorrente procura contestar a fundamentação da D. sentença recorrida com um novo argumento, que, salvo o devido respeito, também não pode merecer provimento. 9ª-O recorrente vem referir que o regime transitório estabelecido no citado art. 17° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, pressupõe a pré-existência das taxas em vigor à data da entrada em vigor da lei. Conclui, assim, que a norma não tem aplicação à situação destes autos, porquanto o Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal só foi aprovado pela Assembleia Municipal do Seixal, em 21 de Fevereiro de 2007. 10ª- Este novo argumento não afecta nem põe em causa a questão de fundo que fundamenta a D. decisão recorrida: a não aplicação retroactiva da lei a um procedimento de aprovação de um regulamento municipal iniciado em data anterior à da entrada em vigor dessa lei. 11ª- Conforme se encontra comprovado nos autos, o procedimento administrativo de aprovação do Regulamento Municipal em questão iniciou-se com a aprovação do Projecto de Regulamento na reunião da Câmara Municipal do Seixal de 29 de Novembro de 2006. O Projecto de Regulamento foi publicado em 4 de Dezembro de 2006, começando a correr o prazo de discussão pública obrigatório e prévio à aprovação do Regulamento pela Assembleia Municipal. 12ª-Tudo isto ocorreu antes da publicação da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro e o que se seguiu à publicação da lei em termos de tramitação do procedimento administrativo de aprovação do Regulamento foi a conclusão do processo com a apresentação ao órgão competente para deliberar a sua aprovação e a subsequente publicação. 13ª- Ao contrário do que agora é perfilhado na alegação de recurso do recorrente, o procedimento regulamentar pré-existiu à Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro. Em termos semânticos, não pode merecer acolhimento a tese do recorrente de a pré-existência se reportar apenas a processos regulamentares concluídos à data da entrada em vigor da lei. Se fosse essa a intenção do legislador, expressamente o diria, pois a segurança jurídica assim o impunha, uma vez que estaria a pretender uma aplicação retroactiva da lei a procedimentos administrativos pré-existentes, contra o princípio geral da aplicação da lei nova para futuro. 14ª-Não há nenhuma justificação para o legislador ter mantido em vigor, por um período transitório, sucessivamente alargado, as taxas aprovadas antes da entrada em vigor da lei se o espírito do novo regime legal das taxas das autarquias locais fosse o de impor retroactivamente as novas obrigações em sede de criação de taxas, designadamente no que respeita à fundamentação económico-financeira dos seus valores. 15ª-Se assim fosse, como defende o recorrente, o legislador teria criado um regime excepcional de suspensão dos procedimentos regulamentares pendentes e em curso de criação de taxas municipais, o que não fez. 16ª- A nova exigência substantiva introduzida pela alínea c) do n.° 2 do art. 8° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, no que respeita à fundamentação económico-financeira das taxas, impõe-se logo no início do procedimento regulamentar aos Projectos de Regulamentos Municipais que as Câmara Municipais têm de submeter a discussão pública antes de os apresentarem à Assembleia Municipal para aprovação. 17ª-Resulta, assim, demonstrado que a interpretação do direito perfilhada na alegação de recurso do recorrente não pode proceder pela violência das consequências jurídicas que acarreta, nomeadamente, a total desvalorização e aniquilação dos efeitos dos procedimentos regulamentares em curso através de uma aplicação retroactiva da lei que afecta o princípio da segurança jurídica. Como bem decidiu o Tribunal a quo, o regime transitório previsto no art. 17° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, tanto se aplica às taxas criadas em regulamentos municipais vigentes como às taxas criadas em procedimentos regulamentares pendentes e em curso, porque em ambas as situações estão em causa taxas pré-existentes, as primeiras em vigor e as segundas a aguardar a conclusão do processo para produzirem plenos efeitos jurídicos 19ª- A interpretação redutora do recorrente de a pré-existência referida no art. 17o da Lei n.° 53-E/2006, de 29 de Dezembro, apenas se reportar a taxas em vigor viola as normas previstas no art. 9° do Código Civil. As regras de interpretação da norma, de harmonia com os elementos literal e sistemático e o pensamento legislativo, presumindo-se que o legislador consagrou a solução mais acertada, impõem que se entenda que o regime transitório do art. 17° da Lei n.° 53- E/2006, de 29 de Dezembro, se aplica às taxas criadas, quer estejam em vigor, quer estejam na iminência de entrar em vigor, face à pendência de procedimento regulamentar em curso, obviando a solução violenta e atentatória do princípio da segurança jurídica, perfilhada pelo recorrente, da desvalorização e aniquilação dos efeitos dos procedimentos regulamentares em curso através de uma aplicação retroactiva da lei, não expressamente evidenciada pelo legislador. Nestes termos e nos mais de direito, com o D. suprimento de Vossas Excelências, deve ser negado provimento ao presente recurso e ser confirmada a decisão recorrida que julgou totalmente improcedente a acção, tudo com as legais consequências, por ser de Direito e de JUSTIÇA!” * O Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, foi notificado nos termos e para os efeitos do artigo 146º nº 1 do CPTA, tendo emitido pronúncia no sentido de que a presente ação administrativa visa defender a legalidade e o interesse público, renovando integralmente o pedido do recorrente. * * Colhidos os vistos legais, nos termos do art. 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, vem o processo à Conferência para julgamento. * * II -QUESTÕES A DECIDIR: Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do CPPT]. Nesta conformidade, cabe a este Tribunal apreciar e decidir se: - a decisão recorrida padece de erro de julgamento na subsunção aos factos provados da interpretação e aplicação que faz do artigo 17º da Lei 53-E/2006, de 29.12 (RGTAL) e bem assim ao desaplicar, aos factos, o artigo 8º nº 2, al. c) do mesmo diploma, no que tange à apreciação da legalidade dos artigos 7º e 8º do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal, aprovado pela Assembleia Municipal e publicado no DR, II série, de 13.04.2007, através dos quais foi criada a taxa de utilização da rede de Efluentes. * * III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO: A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade: 1. Em 29/11/2006, em reunião da Camara Municipal do Seixal, foi apresentada e aprovada a proposta de “Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal”, nos termos da acta constante de fls. 6 a 16 dos autos em suporte de papel, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual consta em síntese o seguinte: “ (…) 5.Deliberação n.º 421/2006 - CMS - PROJECTO DE REGULAMENTO DE TRATAMENTO DE EFLUENTES DOMÉSTICOS, COMERCIAIS E INDUSTRIAIS DO MUNICÍPIO DO SEIXAL. - APROVAÇÃO. Proposta: Pelouro do Desporto e Infra-estruturas Municipais e Acessibilidades As águas residuais devem ser tratadas para preservar os ecossistemas e os recursos naturais (solo, águas superficiais, águas subterrâneas, atmosfera), salvaguardar a saúde pública, a ^alidade de vida e o bem estar das populações. È neste quadro necessário implementar um sistema onde estas sejam recolhidas, transportadas, tratadas e rejeitadas no meio ambiente, sem prejudicar. Com este objectivo, a Câmara Municipal do seixal (CMS) em 1987, aprovou o Plano Geral de Saneamento do Município, onde foram definidas as soluções para a intercepção, tratamento e destino final das águas residuais domésticas, comerciais e industriais. Em 2004, cerca de 60% das obras previstas tinham sido realizadas pela CMS, correspondendo a uma cobertura de 98% da recolha de efluentes domésticos, e a mais de 40% do tratamento e rejeição do total desses efluentes. Em 2004 a Câmara Municipal do Seixal integrou o Sistema Multimunicipal criado para a Recolha, Tratamento e Rejeição de Efluentes da Península de Setúbal cuja Sociedade se denomina de .... Trata-se de um sistema público, cabendo 51% do capital social à ... e 49% aos Municípios aderentes. A participação da Câmara Municipal do Seixal no capital social é no montante de € 2.819.950. Aquando da integração do Município do Seixal na ..., este já dispunha de 29 interceptores/emissários, 7 Estações Elevatórias, 7 Condutas Elevatórias, 4 Estações de tratamento de Águas Residuais (ETARs) (sendo uma a de Pinhal de Frades, apenas com tratamento primário, e outra a ETAR da Quinta da Bomba, com gestão em parceria com o Município de Almada). Serão construídos pela ... 20 interceptores/emissários (sendo 4 deles apenas prolongamentos de alguns já existentes), 10 Estações Elevatórias, 10 Condutas Elevatórias, e uma ETAR. A solução proposta pela ... para o Concelho do Seixal segue a linha original do Plano Geral de Saneamento de 1987, consubstanciado no objectivo de atingir 100% da recolha e tratamento dos efluentes gerados no Concelho, embora apresente algumas diferenças em função das necessidades actuais do Município, e inerentes ao facto do sistema ser Multimunicipal. Desta forma o sistema encontra-se estruturado não numa base municipal, mas sim atendendo à melhor solução integrada para a gestão das águas residuais dos Municípios envolvidos (Seixal, Almada e Sesimbra). A empresa Multimunicipal......, irá investir 40 milhões de euros, ate 2009, na remodelação e ampliação do sistema de saneamento e tratamento do concelho do Seixal, encontrando-se diversos investimentos em concretização, estando a ser cumprida a programação definida. No contrato de Recolhas foram determinados os causais que serão drenados pela rede em baixa para os sistemas de saneamento geridos pela .... Neste contexto, para o ano de 2007, os valores são de 12.976.445 m3/ano de causais recolhidos, que significarão um encargo da Câmara Municipal do seixal perante Multimunicipal de cerca de 6.200.000. A Câmara Municipal do Seixal em 20 anos assumiu sempre, no seu orçamento, todos os encargos com a prestação destes serviços. Em 2007 e no quadro das restrições impostas pelo Poder Central, consubstanciadas na aplicação da nova Lei das Finanças Locais, que põe em causa a autonomia do Poder Local e devido ao elevado investimento que é necessário realizar, que permitirá os 100% de tratamento de esgotos, é indispensável assegurar a comparticipação dos utentes em parte dos encargos com este serviço público, traduzido na aplicação da Taxa de Tratamento de Efluentes. Esta incidirá sobre o consumo de água, visto existir uma relação directa entre a água consumida e a água rejeitada nos sistemas prediais e posteriormente sujeitas a tratamento nas ETARs. Trata-se de um quadro da necessidade de equilíbrio das receitas municipais, garantindo, a eficiência e qualidade do sistema no que se refere aos investimentos necessários e à sua gestão. A taxa de Tratamento de Efluentes proposta, respeita aos encargos relativos à recolha, tratamento e rejeição das águas residuais produzidas e incide sobre a valia dos serviços prestados aos utilizadores que disponham de ligação dos respectivos sistemas prediais à rede pública de drenagem ou que, em qualquer caso, subscrevam contrato com a entidade gestora. Pelo que proponho: a) A aprovação do Projecto de Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais 6 Industriais do Município do Seixal, nos termos da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais) e art. 53°, n.º 2, al. a) e 64°, n.º 6 da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, com as iterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro (Lei Quadro de Competências e Regime Jurídico de Funcionamento dos Órgãos dos Municípios e das Freguesias), devendo o mesmo ser, após apreciação publica, objecto de aprovação por parte da Assembleia Municipal, nos termos do art. 53°, n.º 2, al. a) do mesmo diploma legal, na redacção lhe foi dada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro; b) Seja submetido o presente projecto de regulamento à apreciação publica pelo prazo de 30 dias, com Publicação no Diário da Republica II Série, afixado nos locais de estilo e publicado nos jornais a que se reporta o n.º 2 do art. 91 da Lei n.º 169/99 de 18 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro. REGULAMENTO DO TRATAMENTO DE EFLUENTES DOMÉSTICOS, COMERCIAIS E INDUSTRIAIS DO MUNICÍPIO DO SEIXAL NOTA JUSTIFICATIVA O sistema de tratamento de efluentes domésticos, comerciais e industriais a jusante do sistema de captação tratamento e armazenamento de água potável, tem vindo a ser implementado de acordo com os projectos de infra estruturas necessárias e tendo em conta as capacidades de investimento municipal. O investimento efectuado, traduzido numa crescente qualidade do serviço prestado aos utentes, que utilizam as redes municipais para o consumo de água, implica a ponderação da relação sinalagmática derivada do uso, com o custo/benefício da melhoria de tais serviços. Importa salientar que tal melhoria só foi possível graças aos elevados investimentos efectuados que conduziram, como se disse, à evolução qualitativa deste serviço público do município do Seixal. O dispêndio orçamental efectuado no sistema de tratamento de efluentes, sem comparticipação dos utentes, secundarizou outras áreas de necessário investimento municipal que importa compensar. Assim, a razão do presente regulamento deve-se essencialmente ao equilíbrio das receitas municipais, bem como à garantia de eficiência do sistema entretanto instituído. O presente regulamento, inclui-se numa tendência geral dos municípios limítrofes, embora obedeça a uma taxação que se quer equilibrada e correspondente à continuidade da qualidade do serviço prestado. Constitui-se, assim, um regulamento específico para o tratamento de efluentes domésticos, comerciais e industriais do município do Seixal, no âmbito do que dispõe os artigos 112.°, n.º 7 e 241.° da Constituição da Republica Portuguesa, dos artigos 16.°. al. d) e 19.°, al. I) da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais) e dos artigos 53.°, n.º 2, al. a) e 64.°, n.º 6 da Lei 69/99, de 18 de Setembro, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro (Lei Quadro de Competências e Regime Jurídico de Funcionamento dos Órgãos os Municípios e Freguesias). Nestes termos, a Assembleia municipal do Seixal, sob a proposta da Câmara Municipal, aprova o Regulamento do tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal. O presente Regulamento foi sujeito a apreciação pública, nos termos do disposto no artigo 118° do Código de Procedimento Administrativo. Artigo 1º Competência para o tratamento da rede de efluentes Compete à Câmara Municipal assegurar a recolha, tratamento e rejeição de efluentes domésticos, Comerciais e industriais nas áreas servidas por rede de drenagem de efluentes, de acordo com as disposições legais e regulamentares aplicáveis. Artigo 2o Obrigatoriedade de ligação à rede de efluentes Nas zonas servidas pelas redes municipais de drenagem de efluentes, é obrigatória a ligação à rede dos imóveis destinados a habitação, comercio e indústria, constituindo a mesma encargo dos respectivos proprietários. (…) Artigo 7o Taxa de utilização da rede de efluentes A utilização da rede de efluentes está sujeita ao pagamento da taxa prevista no presente Regulamento. Artigo 8o Montante da taxa A taxa referida no artigo anterior, corresponde a 50% do valor cobrado pelo consumo de água. Artigo 9º Utilizadores Para efeitos do artigo anterior, presumem-se utilizadores os prédios, ou suas fracções geradores de efluentes, titulares de contratos do serviço de abastecimento de água. Artigo 10° Incidência subjectiva À delimitação negativa da incidência subjectiva e à redução e dispensa do pagamento de taxa, aplicam-se as disposições do Regulamento Municipal de Taxas de Edificação e Urbanização (RMTEU). Artigo 11° Delimitação negativa de incidência subjectiva Ficam isentos de incidência da taxa prevista no artigo 7o , os consumidores de água que não beneficiem da ligação às redes de efluentes. Artigo 12° Momento da liquidação da taxa de pagamento A taxa prevista no presente regulamento é liquidada mensalmente, no momento da facturação ao sujeito passivo do consumo de água verificado no período a que respeite, devendo ser paga conjuntamente com aquele serviço. Artigo 13° Actualização O valor de montante da taxa prevista no presente regulamento será actualizado sempre que ocorra alteração ao tarifário do consumo de água na área do Município. (…) Artigo 15° Entrada em vigor 1 - O presente regulamento entra em vigor 15 dias após a sua publicação. 2- O presente regulamento aplica-se às liquidações ocorridas no mês seguinte ao da sua entrada em vigor. (…)” 2. Em 4/12/2006, o Município do Seixal enviou à............., SA, o oficio n.º ............., com o assunto “Publicação do Projecto de Regulamento do Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal” (cf. oficio a fls. 80 dos autos). 3. Em 21/2/2007, em Reunião da Assembleia Municipal do Seixal, após publicação da proposta foi aprovado em Assembleia Geral a versão final do “Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal” (cf. fls. 24 a fls. 49 dos autos). 4. Em 13/4/2007, foi publicado em Diário da República, 2.ª Série – n.º ......, através do Aviso n.º ......../2007, o Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal. 5. Em 17/1/2008, a presente acção deu entrada no TAF de Almada (cf. fls. 1 dos autos). * Na decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal recorrido, consignou, ainda, o seguinte: “Inexistem factos não provados com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir” * Quanto à motivação da decisão de facto, o Tribunal a quo, disse o seguinte: “A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada.” * IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO: Tal como avançamos, a este Tribunal cabe analisar e decidir se a decisão recorrida padece de erro de julgamento na subsunção aos factos provados da interpretação e aplicação que faz do artigo 17º da Lei 53-E/2006, de 29.12 (RGTAL) e bem assim ao desaplicar, aqueles factos, o artigo 8º nº 2, al. c) do mesmo diploma, no que tange à apreciação da legalidade dos artigos 7º e 8º do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal, aprovado pela Assembleia Municipal e publicado no DR, II série, de 13.04.2007, através dos quais foi criada a taxa de utilização da rede de Efluentes. Importa desde já dar conta que não foi questionada a matéria de facto considerada provada, encontrando-se, por isso, estabilizada. Na situação que nos é colocada, o Autor, ora recorrente, intentou uma ação com vista à declaração de ilegalidade, com força obrigatória geral, dos artigos 7º e 8º do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal, que criou a taxa de utilização da rede de Efluentes (“Regulamento de Efluentes do Seixal”), na medida em que aqueles normativos regulamentares afrontam o artigo 8º nº 2, al. c) da Lei 53-E/2006, de 29.12, em vigor desde 01.01.2007, por inexistir fundamentação económico financeira relativa ao valor das taxas. Para o Tribunal a quo, a obrigação legal de exposição da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, a cobrar no Regulamento, aprovado pelo órgão deliberativo só veio a ser instituída com o artigo 8.º da Lei 53-E/2006, de 29/12, cuja aplicação se encontrava deferida para 1/1/2009, por vontade expressa do legislador no artigo 17.º do respetivo diploma, improcedendo, desse modo a pretensão da recorrente. É contra este entendimento que se insurge a recorrente, advogando que, contrariamente ao sentenciado, era de aplicar o artigo 8º nº 2 al. c) do RGTAL na medida em que o Regulamento posto em crise foi aprovado em abril de 2007, data em que se encontrava já em vigor o citado artigo 8º nº 2 al. c) do RGTAL que impunha a obrigatoriedade de fundamentação económico financeira das taxas criadas pelo artigo 7º e 8º do “Regulamento de Efluentes do Seixal” questionado. Assim, para a recorrente o Tribunal recorrido fez uma incorreta subsunção da matéria de facto provada ao regime transitório do RGTAL, ditado pelo seu artigo 17º, numa desacertada articulação que fez com o artigo 8º nº 2 al. c) do mesmo diploma e desadequada desaplicação daquele artigo 8º nº 2 al. c) que estava já em vigor e era aplicável ao caso concreto. Para a recorrida inexiste qualquer ilegalidade nas normas controvertidas (artigos 7º e 8º do “Regulamento de Efluentes do Seixal”), na medida em que não era aplicável o artigo 8º nº 2 al. c) do RGTAL, mas as disposições transitórias vertidas no artigo 17º do mesmo diploma legal, uma vez que, aquele artigo não se encontrava ainda em vigor e não era suscetível de aplicação. Concluindo pelo acerto do ajuizado pela decisão recorrida. Vejamos mais de perto. O Tribunal recorrido, como se adiantou, concluiu pela improcedência da ação, com o seguinte discurso fundamentador: “ O Autor vem pedir que se declare a ilegalidade, com força obrigatória geral, do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal, designadamente das normas constantes do artigo 7.º e 8.º, que criam a taxa de utilização da rede de efluentes, com fundamento na violação da alínea c) do n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, porque no entender do Autor, o Regulamento aprovado pela Assembleia Municipal do Seixal não contém qualquer fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas. Cumpre decidir, Antes de mais, se dirá que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina e jurisprudência designadamente o disposto no artº.9, do Código Civil (CC) e artigo artº.11, da Lei Geral Tributária (LGT). O Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (RGTAL), provado pela Lei n.º 53- E/2006, de 20 de Dezembro, veio regular as regulações jurídico-tributárias geradoras da obrigação de pagamento de taxas às autarquias locais. Efectivamente, o ora invocado artigo 8.º do RGTAL, encerra uma das suas disposições legais mais importantes, ao estabelecer os requisitos e pressupostos para a edição dos regulamentos locais das taxas. Contudo e não obstante no artigo 18.º do RGTAL, se estabelecer a sua entrada em vigor para dia 1 de Janeiro de 2007, as suas disposições não ganharam aplicação todas nesse momento. Precisamente, o seu artigo 8.º que se previa exigir das autarquias locais um maior esforço de adaptação, só ganhou aplicação efectiva a partir de 1/1/2009, por força do disposto no artigo 17.º O legislador decidiu facultar aos municípios um período transitório para adaptação ao RGTAL dos seus Regulamentos. Da articulação deste artigo 17.º com o artigo 8.º resulta portanto, que as disposições dos regulamentos de taxas locais em vigor a 1/1/2009 que violem o disposto neste diploma se considerem automaticamente revogadas a partir desta data e que as disposições dos regulamentos de taxas locais entrados em vigor após 1 de Janeiro de 2009 que violem as concretas exigências do artigo 8.º se consideram nulas. Veja-se no sentido ora exposto, o “Regime das Taxas Locais” Introdução e Comentário”, por Sérgio Vasques, in cadernos IDFF, n.º 8, pag. 131 e seguintes, anotações ao artigo 8.º e 17.º. Assim, a obrigação legal de exposição da fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, a cobrar no regulamento da sua criação aprovado pelo órgão deliberativo respectivo só veio a ser instituída com o artigo 8.º da Lei 53-E/2006, de 29/12, cuja aplicação se encontra deferida para 1/1/2009, por vontade expressa do legislador no artigo 17.º do respectivo diploma. No quadro legal ora exposto, a presente acção não pode proceder face ao facto de que a disposição legal ao abrigo da qual é invocada a ilegalidade do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos Comerciais e Industriais do Município do Seixal, à data da propositura da presente acção ainda não se encontrar em vigor e não ser susceptível de aplicação. Face ao exposto, improcede a presente acção. Vencido o Ministério Público seria o mesmo responsável pelas custas (cf. art. 527.º do Código de Processo Civil ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT) sem prejuízo da isenção legal aplicável”. (o sublinhado é nosso). Para aferir se bem ou mal andou o Tribunal a quo, importa convocar o quadro normativo aplicável e em questão nestes autos. Antes disso, consultando os factos provados, os mesmos informam que: • Em 29.11.2006, em reunião da Câmara Municipal do Seixal, foi apresentada e aprovada a Proposta de Regulamento aqui em questão (Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal, que criou a taxa de utilização da rede de Efluentes); • Em 4.12.2006 foi enviado para publicação a Proposta/Projeto de Regulamento de Efluentes referido no ponto anterior; • Em 21.02.2007 a Assembleia Municipal do Seixal aprovou a versão final da Proposta de Regulamento de Efluentes atrás referida; • Em 13.04.2007 foi publicado em DR o Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal (“Regulamento de Efluentes do Seixal”); • O artigo 7º do Regulamento estabelece que a utilização da rede de efluentes está sujeita ao pagamento de uma taxa, fixando o artigo 8º que o montante da taxa corresponde a 50% do valor cobrado pelo consumo de água; • O Regulamento de Efluentes atrás referido é composto de uma nota justificativa donde decorre que o sistema de efluentes tem vindo a ser implementado “de acordo com os projectos de infra estruturas necessárias e tendo em conta as capacidades de investimento municipal. O investimento efectuado, traduzido numa crescente qualidade do serviço prestado aos utentes, que utilizam as redes municipais para o consumo de água, implica a ponderação da relação sinalagmática derivada do uso, com o custo/benefício da melhoria de tais serviços …”. Isto posto, importa agora então consultar o quadro legal aplicável, norteador da criação de Regulamentos Municipais sobre taxas, como o Regulamento e taxas aqui em causa, cujo procedimento administrativo para a sua criação se iniciou em 2006 (com a Proposta de Regulamento de Efluentes) e que veio a ser aprovado, definitivamente (versão final do “Regulamento de Efluentes do Seixal”), em fevereiro de 2007, vendo a sua publicação na II série do DR, em 13.04.2007. Analisando. Com a Lei 53-E/2006 de 29.12.2006 foi criado o Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (RGTAL), que entrou em vigor em 01.01.2007. De acordo com aquele diploma legal, é obrigatório que os Regulamentos que criem taxas municipais, como acontece com o Regulamento do Seixal aqui em causa, contenham, sob pena de nulidade, a fundamentação económico-financeira relativamente ao valor das taxas neles consagradas (Cf. artigo 8º nº 2 al. c) do RGTAL). Com efeito, o artigo 8°, n.° 2, alínea c), do RGTAL, impõe que: “2 - O regulamento que crie taxas municipais ou taxas das freguesias contém obrigatoriamente, sob pena de nulidade: (….) c) A fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos directos e indirectos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local" É verdade que aquela Lei, na sua versão original, consagrou um regime transitório (artigo 17º do RGTAL), que permitia aos municípios a adequação dos regulamentos até ao início do segundo ano financeiro subsequente à sua entrada em vigor (ou seja, até 01.01.2009), períodos de adequação que foram sendo alargados, nomeadamente, com as versões introduzidas pela Lei nº 64-A/2008, de 31.12 e Lei nº 117/2009, de 29/12. Rezava assim o artigo 17º do RGTAL, que instituía o regime transitório: “As taxas para as autarquias locais atualmente existentes são revogadas no início do segundo ano financeiro subsequente à entrada em vigor da presente lei, salvo se, até esta data: a. Os regulamentos vigentes forem conformes ao regime jurídico aqui disposto; b. Os regulamentos vigentes forem alterados de acordo com o regime jurídico aqui previsto.”. A pomo da discórdia reside em saber se, na criação do Regulamento de taxas de Efluentes do Seixal, aprovado definitivamente em fevereiro 2007 e publicado em DR em abril de 2007, ou seja, após a entrada em vigor da Lei 53-E/2006 de 29.12 (RGTAL), deveria aquele “Regulamento de Taxas de Efluentes do Seixal” ter observado as regras nele consagradas, designadamente, “a fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local”, prevista na alínea c) do n° 2 do artigo 8° da Lei nº 53-E/2006 de 29.12.2006. Ou, se pelo contrário, estava o mesmo coberto pela disposição transitória do artigo 17º do RGTAL. É incontroverso que a fundamentação económico-financeira, relativamente às taxas de efluentes aqui em causa (vertidas nos artigos 7º e 8º do Regulamento de Taxas de Efluentes do Seixal), não existia, existindo unicamente uma nota justificativa e fazer referência genérica a investimentos de infraestruturas realizados e a realizar, sem qualquer referência a custos diretos e indiretos, encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia, tal como se vê do ponto 01) dos factos provados. Para o Tribunal a quo as normas aqui em causa não são ilegais na medida em que, de acordo com a norma transitória – artigo 17º do RGTAL-, a obrigação de fundamentação económico-financeira foi alargada até 01.01.2009 para os regulamentos de taxas já existentes. Porém, como se vê do probatório, à data de entrada em vigor da Lei 53-E/2006, de 29.12, em 01.01.2007, o Regulamento de Taxas do Município do Seixal aqui em causa ainda não existia, existindo apenas um Projeto ou Proposta daquele Regulamento que havia sido aprovado em novembro de 2006, mas cujo versão final apenas existiu já após a entrada em vigor do RGTAL. Por isso, apesar de, a data da entrada em vigor do RGTAL em 01.01.2007 estar em curso um procedimento com vista à emissão do Regulamento (final) daquelas taxas de Efluentes, o Regulamento só é emitido, válido e eficaz no final do procedimento que o culminou com a aprovação em fevereiro de 2007 e sua publicação em DR em 13.04.2007. Porque assim é, não faz sentido algum falar-se em aplicação retroativa do RGTAL ao Regulamento aqui em causa, como o apregoa a recorrida, na medida em que o Regulamento questionado ainda não existia, existindo unicamente uma Proposta de Regulamento à data da entrada em vigor do RGTAL, o qual apenas veio a conhecer a sua versão final em plena vigência do RGTAL. Deste modo, não faz sentido convocar a norma transitória vertida no artigo 17º do RGTAL, a qual se aplica aos Regulamentos de Taxas já existentes e que, por essa razão, dando expressão à vontade do legislador se proporcionou que, nos dois anos após a entrada em vigor do RGTAL (até 01.01.2009) as autarquias adequassem as taxas existentes ao mesmo, no que tange à exigência de fundamentação económico financeira das taxas, caso contrário seriam revogadas (a não ser que até aquela data – 01.01.2009, os Regulamentos fossem conformes com o regime jurídico do RGTAL e/ou se fossem alterados de acordo com o RGTAL). Ora, na situação vertente, o Regulamento de Taxas de Efluentes do Seixal apenas conheceu a sua versão final em 2007 (aprovada a versão final em fevereiro de 2007 e publicado em DR em 13.04.2007), após a entrada em vigor da Lei 53-E/2006 de 29.12.2006, sendo o mesmo operativo, nenhuma razão existia para que, diante a plena vigência do RGTAL, não tivesse o Município observado as regras nele consagradas, designadamente, “a fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local”, prevista na alínea c) do n° 2 do artigo 8° da Lei no 53-E/2006 de 29.12.2006, incorrendo em erro de julgamento a decisão recorrida que assim não entendeu. Nesta conformidade, contrariamente ao discorrido na decisão recorrida, tendo o Regulamento em conta que o Regulamento ainda não existia na versão final, havendo apenas uma proposta de Regulamento aquando da entrada em vigor do RGTAL, nenhum sentido faria que se lhe aplicasse um regime transitório consagrado para os Regulamentos existentes e que se teriam de adequar às novas exigências até 01.01.2009. A este respeito, embora estivesse em causa uma taxa de um Regulamento Municipal, mas perfeitamente transponível, com as necessárias adaptações para a situação que nos é colocada, discorreu-se de modo cristalino no acórdão do STA de 06.11.2009, tirado do processo nº 01014/08.8BEALM 090/18, que: “(…) como decorre das normas transcritas, a publicação do RGTAL, em 29/12/2006, com entrada em vigor 1/01/2007, implicou que, sob pena de nulidade, os regulamentos de aprovação de regulamentos prevendo taxas das autarquias locais passassem a conter um conjunto de elementos, entre os quais, a fundamentação económico financeira relativa ao valor das taxas. Por sua vez, o artigo 17.° do mesmo corpo de normas, dava até 30/04/2010 para que os regulamentos já aprovados viessem a pôr-se conforme as novas exigências contidas no RGTAL, sob pena de serem revogados (…) Assim sendo e na senda do Acórdão do TCA Sul, de 17/04/2012, tirado no Processo n.° 04796/11 e relatado pelo ora 1º adjunto desta formação, “(...) 3. Consagra o art°.8, n° 2, da Lei 53-E/2006, de 29/12 (diploma que prevê o Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais) exigências precisas para a edição dos regulamentos locais de taxas. A norma em causa obriga as autarquias à enunciação clara da base de incidência, da base de cálculo, das isenções e modo de pagamento das taxas locais, mais exigindo, a par destes elementos, que se explicite a fundamentação económica e financeira das taxas criadas, tudo sob pena de nulidade do diploma em causa. // 4. Especificamente, no que respeita à fundamentação económica e financeira das taxas criadas refere a norma (cfr. art°. 8, nº. 2, al. c), do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais), que o valor dos tributos deve levar em consideração, designadamente, os custos diretos e indiretos, os encargos financeiros, as amortizações e os investimentos realizados, ou a realizar, pela autarquia local. Na estruturação da fundamentação económico-financeira da taxa criada a autarquia deve levar em consideração, desde logo, o princípio da equivalência jurídica consagrado no art.º 4, do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais”.(…)” (O sublinhado é nosso). Porque assim é, tendo em conta que inexiste, também in casu qualquer fundamentação económico-financeira nos termos enunciados quanto às taxas criadas pelo Regulamento posto em causa, e a que aludem os artigos 7º e 8º, é evidente a ilegalidade (nulidade) que fulmina aqueles normativos, contrariamente ao entendimento tido pelo Tribunal a quo. Aqui chegados, sem necessidade de mais considerações, assuma a conclusão de que o recurso terá de proceder. * No que respeita a custas, considerando o princípio da causalidade vertido no artigo 122º nº 2 do CPPT e bem assim no 527º nº 1 e 2 do CPC, as custas ficam a cargo da recorrida, por ser parte vencida. * V- DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Contencioso Tributário Comum deste Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em: - Conceder provimento ao recurso; - Revogar a decisão recorrida; - Julgar a ação procedente, declarando, consequentemente a ilegalidade, com força obrigatória geral, dos artigos 7º e 8º do Regulamento de Tratamento de Efluentes Domésticos, Comerciais e Industriais do Município do Seixal, aprovado pela Assembleia Municipal e publicado por aviso, no Diário da República, II série, de 13.04.2007. Custas a cargo da recorrida. * Lisboa, 19 de dezembro de 2024 Isabel Silva (Relatora) ___________________ Margarida Reis (1ª adjunta) ______________ Ângela Cerdeira (2ª adjunta) ________________ |