Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 97/19.0BELRA |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 11/07/2024 |
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Relator: | RUI A.S.FERREIRA |
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Descritores: | FATURAS FALSAS ÓNUS DA PROVA FUNDADA DÚVIDA |
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Sumário: | I- O dever de fundamentação expressa e acessível do ato tributário fica cumprido se o Relatório de inspeção contiver um texto claro, suficiente e congruente, apto a esclarecer o seu destinatário dos motivos de facto e de direito que fundaram a concreta qualificação e a quantificação efetuadas na decisão. II- Se, relativamente ao fornecedor, a AT reuniu indícios suficientes de que as transações tituladas por faturas não correspondem a operações reais, revelando tais indícios que há uma probabilidade séria de não terem sido feitos os fornecimentos em causa, o ónus da prova da efetividade de tais transações é do sujeito passivo. III- A demonstração da efetividade das operações em causa exige alegação e prova concreta e circunstanciada das mesmas. IV- Nestes casos, a prova, consubstanciada na mera existência formal dessas faturas, é necessariamente insuficiente, sendo imprescindível que o contribuinte demonstre, por recurso a outros meios de prova, que os fluxos materiais e financeiros inerentes ao fornecimento titulado pela fatura ocorreram realmente nos termos descritos na mencionada fatura., designadamente que não houve “retorno” total ou parcial do pagamento. V- A “fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário”, a que se refere o art.º 100.º, nº 1, do CPPT, não se confunde com inércia probatória do administrado/impugnante de que subsista “dúvida sobre a veracidade da fatura”. VI- Subsistindo alguma dúvida sobre a veracidade da fatura reputada falsa, por inércia do contribuinte sujeito ao ónus da prova, essa dúvida resolve-se contra este, não sendo de aplicar o regime da “fundada dúvida” previsto no artigo 100º do CPPT porque tal norma visa resolver apenas os casos em que cabe à administração tributária o ónus de afastar a dúvida sobre a existência e quantificação do “facto tributário” (descrito na regra de incidência). |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tibutária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 2ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul
l – RELATÓRIO V..........., S.A (doravante “Recorrente”), veio interpor recurso jurisdicional contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado [IVA] e respetivos juros compensatórios, relativas ao período de 2014.12, no total de € 18.100,76, resultantes da desconsideração do IVA deduzido com base em faturas reputadas falsas. Na sentença, o Tribunal a quo conheceu as seguintes questões, que julgou totalmente improcedentes: I – Do alegado erro nos pressupostos de facto e de direito e violação do ónus da prova; II – Da alegada insuficiente/incongruente fundamentação; III – Da alegada violação dos princípios constitucionais integrantes do processo judicial tributário: legalidade; justiça; proporcionalidade; capacidade contributiva; IV – Da alegada fundada dúvida. Nas suas alegações, a Recorrente formulou conclusões nas quais alega, em suma, que a sentença recorrida padece de: a) - erro de julgamento sobre a matéria de facto [conclusões a) a i) e o) das alegações]; b) - erro de julgamento, uma vez que a administração tributária (AT) não reuniu indícios suscetíveis de abalar a presunção de veracidade de que gozam as declarações da Recorrente [conclusões j) a n) das alegações]; c) - erro de julgamento, dado que ocorreram transações comerciais entre a Recorrente e a sociedade P........... – Unipessoal Lda. (doravante, P...........) [conclusões o) a u) das alegações]; d) - erro de julgamento, dado tratar-se de situação de fundada dúvida sobre a ocorrência do facto tributário [conclusões v) a ee) das alegações]; e) - erro de julgamento, uma vez que o relatório de inspeção tributária (RIT) não está cabalmente fundamentado [conclusão ff) das alegações]; * O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. * Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso. * Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência. * 2. QUESTÕES A DECIDIR: Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil (CPC), o objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pela Recorrente no âmbito das respetivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso. Assim, todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões e devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso. Para este efeito, “questões” são os problemas de facto ou de Direito cuja resolução é pedida ao tribunal, os quais não se confundem com os “argumentos” invocados pelas partes e que, na sua perspetiva, servem de fundamento para a solução pedida por elas. Questão tributária, ou de natureza tributária, é aquela cuja apreciação e resolução exige a interpretação e aplicação de normas de direito tributário, inscritas no domínio da atividade tributária da administração (Acórdãos do STA, Plenário, de 29/1/2014, proc. nº 01771/13, de 21/3/2012, proc. nº 0189/11; de 27/5/2009, proc. nº 0119/08; de 2/4/2009, proc. nº 0987/08). No que se refere ao recurso interposto pela Impugnante são as seguintes as questões a decidir: a) Há erro na decisão proferida sobre a matéria de facto? b) Verifica-se erro de julgamento, uma vez que a administração tributária (AT) não reuniu indícios suscetíveis de abalar a presunção de veracidade de que gozam as declarações da Recorrente? c) Verifica-se erro de julgamento, dado que ocorreram transações comerciais entre a Recorrente e a sociedade P........... – Unipessoal Lda. (doravante, P...........)? d) Verifica-se erro de julgamento, dado tratar-se de situação de fundada dúvida sobre a ocorrência do facto tributário? e) Há erro de julgamento, uma vez que o relatório de inspeção tributária (RIT) não está cabalmente fundamentado? * 3 – FUNDAMENTAÇÃO 3.A. - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: « 1) A Impugnante é uma sociedade comercial anónima, coletada para o exercício da atividade com o CAE 046240 – “comércio por grosso de peles e couro” e no ano de 2014, encontrava-se enquadrada, para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado, no regime normal com periodicidade mensal (págs. 7 e 8 do relatório de inspeção tributária a fls. 106 e 107 do processo administrativo instrutor, doravante p. a.). 2) Em 4/12/2014, a sociedade comercial “P..........., Lda.”, emitiu em nome da Impugnante a fatura n.º ............, no montante de 80.977,00€ acrescida de Imposto sobre o Valor Acrescentado à taxa de 23% no montante de 18.624,71€, na qual consta como local de carga “Rua......” e de descarga “Felgueiras” (fls. 172 do p. a.). 3) A Impugnante foi submetida a ação inspetiva a coberto da ordem de serviço nº OI201..........., de 23/5/2016, de natureza externa, de âmbito parcial em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e Imposto sobre o Valor Acrescentado e que incidiu sobre o exercício de 2014 (fls. 24 do p. a.). 4) O procedimento inspetivo à Impugnante foi desencadeado pelo facto da Impugnante, no ano de 2014, ter contabilizado a fatura n.º ............, no montante de 80.977,00€ acrescida de Imposto sobre o Valor Acrescentado à taxa de 23% no montante de 18.624,71€, emitida pela sociedade comercial “P..........., Lda.” (pág. 6 do relatório de inspeção tributária a fls. 105 do p. a.). 5) Em 6/12/2017, foi elaborado o relatório de inspeção tributária que consta a fls. 100 a 172 do p. a., de cuja fundamentação se extrata, com relevo para os presentes autos: “(…) Em resultado da ação inspetiva efetuada, ao Sujeito Passivo V........... – , S.A., NIPC ............, ao exercício de 2014, foram detetadas as seguintes correções meramente aritméticas: (…) I.2 – Em sede de IVA – Ano de 2014
II.1 – CREDENCIAL E PERÍODO EM QUE DECORREU A AÇÃO O procedimento de inspeção externo à sociedade V........... – , S.A. (doravante designada por V...........), NIPC ............, foi efetuado ao abrigo da Ordem de Serviço nº OI201..........., datada de 2016-05-23, referente ao exercício de 2014. (…) Início do procedimento de inspeção O procedimento externo de inspeção teve início em 2017-04-28, sendo a Ordem de Serviço assinada pela administradora Srª S............, NIF ............Todas as diligências, nomeadamente, o inicio do procedimento inspetivo, as notificações efetuadas ao longo do procedimento inspetivo, as reuniões com a administradora da V..........., Srª S............, foram efetuadas na fábrica sita no Lugar ............, em ............ – Alcanena, instalações exploradas pela sociedade ... (…) II. 2. Motivo, âmbito e incidência temporal O procedimento de inspeção, ao exercício de 2014, foi proposto pelos Serviços de Inspeção Tributária, em face do sujeito passivo ser utilizador de faturas emitidas pela sociedade P........... - UNIPESSOAL LDA, sobre a qual existem fortes indícios de ser emitente de faturação falsa. O procedimento inspetivo tem natureza externa de âmbito parcial para o exercício de 2014 (OI201...........), nos termos da alínea b) do artigo 13.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 14.º, ambos do RCPITA. II. 3. Outras situações II.3.1. Caracterização do sujeito passivo A sociedade V........... – , S.A, é uma sociedade anónima, tendo iniciado a sua atividade em 2011-01-18. Tem sede na Rua ........... – Amiais de Baixo. Na consulta à Certidão Permanente a V........... tem por objeto social Indústria e comercialização de curtumes, couros e peles para fins industriais. Comércio, importação e exportação de mercadorias”. O capital social é de € 50.000,00, sendo à data dos factos (ano 2014) o Administrador Único a Srª A............, NIF ........... e o Fiscal Único o Sr. C..........., NIF ............ Embora conste na Certidão Permanente que no mandato do ano de 2011 a 2014 o Fiscal Único é o Sr. C..........., nas declarações IES referentes aos exercícios de 2011, 2012, 2013 e 2014 a entidade que consta como ter emitido a Certificação Legal de Contas é L........... SROC, NIPC ............ (…) II.3.3. Enquadramento fiscal O sujeito passivo encontra-se registado no .... (…) Em matéria de IVA, a empresa é um sujeito passivo deste imposto, conforme alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, por praticar operações qualificadas como transmissão de bens e prestações de serviços tal como vêm definidas no n.º 1 do artigo 3.º e n.º 1 do artigo 4.º, ambos do CIVA, sujeitas a imposto por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do CIVA e dele não isentas, conferindo o direito à dedução integral do imposto suportado a montante nos termos definidos nos artigos 19.º e 20.º do CIVA. Encontra-se enquadrado no regime normal com periodicidade mensal, de acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIVA. (…) II.3.6. Inexistência da Contabilidade/ notificações efetuadas ao sujeito passivo Após contacto prévio com a Administradora da V..........., Srª S............, no dia 2017- 04-28, deslocámo-nos à fábrica sita no Lugar ............, em ............ – Alcanena, tendo nesse mesmo dia iniciado o procedimento inspetivo, contudo, os elementos da contabilidade não foram apresentados. Uma vez que, não foi apresentada a contabilidade, foi notificada a sociedade V........... – , S.A, na pessoa da administradora, Srª S............, para no dia 16 de Maio de 2017, pelas 10h00, apresentar, no ... (instalações onde é desenvolvida a atividade da sociedade V...........), a contabilidade da sociedade e dos documentos com ela relacionados, referentes ao exercício de 2014. No entanto, no dia 16 de Maio de 2017, apenas foram apresentadas algumas pastas, sendo que existiam pastas de impossível manuseamento por se encontrarem bastante danificadas e não foi apresentado qualquer balancete, extrato de conta corrente ou diário da contabilidade referente ao exercício de 2014. Foi ouvida em Auto de Declarações a Administradora da sociedade, Srª S............. Passamos de seguida à transcrição do Auto de Declarações. “Inquirida sobre: Apresentação da contabilidade da sociedade, relativamente ao exercício de 2014, conforme notificação efetuada em 28 de abril de 2017. Declarou/ apresentou: No âmbito da notificação efetuada em 28/04/2017 para apresentar a contabilidade no dia 16 de maio de 2017, foram apresentadas 10 pastas relativamente a documentos da contabilidade. Declarou que no âmbito do assalto que as instalações sitas no ... (local onde se encontrava a contabilidade da sociedade), sofreram no dia 14 de janeiro para 15 de janeiro de 2017, as instalações foram vandalizadas, foram deixadas torneiras abertas e as pastas da contabilidade deitadas ao chão, facto pelo qual algumas foram molhadas e encontrando-se danificadas. Foram no assalto furtados diversos bens, entre os quais servidores e computadores, onde se encontrava o programa de contabilidade da sociedade, razão pelo qual não tem forma de apresentar os balancetes e extratos que não seja os que se encontram nas pastas. Analisadas as pastas apresentadas, constatou-se o seguinte: - 4 pastas referentes ao diário “Bancos”, 1 pasta referente a “Letras”, 2 pastas de diário “Vendas”, 1 pasta do diário “Serviços e Pagamentos” e 1 pasta do diário “Diversos”. Três dessas pastas (duas de bancos de janeiro a março e abril a julho e uma pasta de vendas de janeiro a outubro) de impossível manuseamento, por se encontrarem muito danificados os documentos. - Nas pastas apresentadas não constam balancetes e extractos de conta corrente da contabilidade. - Não consta qualquer pasta relativa a compras”. No mesmo dia, foi notificada a sociedade, nos termos do nº2 do artigo 120º do Regime Geral das Infrações Tributárias, na pessoa da sua administradora, Srª S............, para no dia 30 de maio de 2017, às 10h30, proceder à apresentação da contabilidade da sociedade devidamente organizada e dos documentos com ela relacionados relativo ao exercício de 2014. Contudo, no dia 30 de Maio de 2017, não foi cumprido o teor da notificação, não tendo sido apresentada a contabilidade. Foi ouvida em Auto de Declarações a Administradora da sociedade, Srª S............, o qual se transcreve de seguida: “Inquirido sobre 1) A Apresentação da contabilidade da sociedade devidamente organizada, conforme notificação datada de 16 e maio de 2017; 2) As diligências e respetivas provas efetuadas para a recuperação da contabilidade, nomeadamente, contatos com clientes, fornecedores, banco, contabilista certificado e terceiros com quem a empresa teve relações comerciais. Declarou relativamente ao ponto 1) apenas possui os elementos já apresentados no dia 16 de maio de 2017. Atendendo ao acontecimento já conhecido pela AT (furto às instalações ocorrido em janeiro de 2017), não foi possível ainda proceder à reorganização da contabilidade. Relativamente ao ponto 2) declarou estar a diligenciar junto de fornecedores, clientes, bancos, terceiros e contabilista certificado no sentido de reunir os elementos necessários à reorganização da contabilidade do exercício de 2014. Os pedidos dos elementos foram solicitados por telefone ou pessoalmente, pelo que não possuí provas das diligências efetuadas”. Embora as instalações tenham sido assaltadas/ vandalizadas em janeiro de 2017, o procedimento inspetivo só tenha sido iniciado no final de abril de 2017, tenha sito notificado o sujeito passivo para reorganizar a contabilidade, a Administradora da V........... tenha declarado que estava a diligenciar para reunir os elementos necessários para reorganizar a contabilidade, porém, até à data do presente relatório o sujeito passivo nunca apresentou a contabilidade. II.3.7. Contabilização da fatura emitida pela P........... – Unipessoal, Lda Como já referido anteriormente, o procedimento de inspeção, ao exercício 2014, foi proposto pelos Serviços de Inspeção Tributária, em face da V........... ser utilizadora de fatura emitida pela sociedade P........... – Unipessoal, Lda, sobre a qual existem fortes indícios de ser emitente de faturação falsa. Não obstante não ter sido apresentada a contabilidade, não existem quaisquer dúvidas que a fatura emitida pela P........... – Unipessoal, Lda se encontrava lançada na contabilidade, ou seja, que foi considerada como gasto do exercício de 2014 e o IVA constante da mesma foi deduzido na declaração periódica de 201412M. Passamos de seguida à análise: Processo-crime nº .../2016 IDSTR No âmbito do processo-crime nº .../2016 IDSTR, instaurado à P........... – Unipessoal, Lda, os Serviços de Investigação Criminal Fiscal desta Direção de Finanças, no dia 17/10/2016, deslocaram-se às instalações sitas no ..., e apreenderam das pastas da contabilidade da V..........., a fatura nº ............, emitida em 2014-12-04, pela P........... –Unipessoal, Lda, no valor de € 99.601,71 (€80.977,00 de base tributável e €18.624,71 de IVA). Não existe qualquer dúvida que a fatura constava na contabilidade da V............ Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal – IES do exercício de 2014 Na análise efetuada à IES do exercício de 2014 submetida pelo sujeito passivo, verifica-se que no anexo P, a V........... declarou ter relações comerciais com a P........... – Unipessoal, Lda, conforme consta no quadro infra: [imagem; na íntegra no original] É o próprio sujeito passivo que declara ter relações económicas com a P........... – Unipessoal, Lda. Declaração Periódica de IVA 201412M / Versus E-fatura Visto que a fatura da P........... foi emitida em dezembro de 2014, passamos de seguida à análise/comparação da declaração periódica de IVA do período 201412M e das faturas comunicadas por terceiros, em dezembro de 2014, em que a V........... consta como adquirente. Na observação da declaração periódica de IVA do mês de dezembro de 2014, verificámos que o sujeito passivo deduziu a importância de € 44.596,67, sendo € 39.860,17 relativo a existências e € 4.736,50 referente a outros bens e serviços.
Consultando as faturas comunicadas por diversos operadores económicos, relativamente a dezembro de 2014, em que a V........... – , S.A., consta como adquirente, o IVA mencionado ascende ao montante de € 26.826,53, conforme a seguir se demonstra: [imagem; na íntegra no original]
[imagem; na íntegra no original]
[imagem; na íntegra no original]
De referir que, desde 1 de janeiro de 2013, todos os operadores económicos se encontram obrigados a comunicar à Autoridade tributária, todas as faturas emitidas. Consultando o ..., constata-se que V........... não efetuou aquisições intracomunitárias em 2014. Ou seja, o IVA deduzido pelo sujeito passivo na declaração periódica de IVA do mês de dezembro é superior ao IVA comunicado por terceiros no mesmo período. Elementos remetidos pelo Revisor Oficial de Contas No âmbito do procedimento inspetivo foi notificado o Revisor Oficial de Contas (ROC) - L........... SROC, pelo ofício nº 3701, datado de 03/10/2017, a solicitar alguns elementos, entre os quais o balancete analítico. Na análise ao balancete analítico remetido, verifica-se que nas contas de “fornecedores” está refletido o fornecedor ... (conta 221111494), o qual em dezembro de 2014 apresenta um saldo credor de 99.601,71€, valor coincidente com a fatura nº ............, emitida em 2014-12-04, pela P........... – Unipessoal, Lda. Conforme anexo II. Em face da análise efetuada, não existem dúvidas que a fatura nº ............, emitida em 2014-12-04, pela P........... – Unipessoal, Lda, no valor de € 99.601,71 (€80.977,00 de base tributável e €18.624,71 de IVA) estava refletida na contabilidade da V..........., e que o IVA constante da mesma foi objeto de dedução. II.3.8. Notificação efetuada à V........... relativamente ao “fornecedor” P........... – Unipessoal, Lda Por existirem fortes indícios, objetivos e credíveis que as faturas emitidas pela P........... – Unipessoal, Lda, não titulavam operações reais, foi a V........... notificada, no dia 30 de maio de 2017, para apresentar no dia 20 de junho de 2017, pelas 10h00 os seguintes elementos: “Relativamente ao vosso fornecedor P........... - UNIPESSOAL LDA, NIPC ............, apresentar os seguintes documentos: - Guias de transporte relativas às faturas contabilizadas durante o exercício de 2014; - Identificação da entidade que efetuava os transportes; -Troca de correspondência entre a V..........., S.A. e o fornecedor P........... - UNIPESSOAL LDA, bem como indicação/identificação das pessoas contatadas; - Meios de pagamento utilizados (Cheque, transferência bancária, etc), juntando fotocópia autenticadas dos respetivos documentos de suporte, nomeadamente cheques (frente e verso), extratos, ordem de transferência, etc.”. Todavia, no dia 20 de junho de 2017, não foi apresentado qualquer elemento solicitado na notificação. A Administradora da V........... – , S.A, Srª S............, foi ouvida em Auto de Declarações, em que a mesma declarou: “Na presente data não possui quaisquer elementos para apresentar relativamente ao fornecedor P........... – Unipessoal, Lda. Os contactos com a P........... eram efetuados com um Sr chamado R........, desconhece o seu nome completo. Sabe também que a P........... – Unipessoal, Lda, tinha escritório em Lisboa, desconhecendo a morada. Tem conhecimento que o Sr R........ não se encontra em Portugal. Relativamente aos transportes das peles, desconhece quem procedia à realização dos mesmos, uma vez que, as peles eram sempre colocadas na fábrica pela P........... – Unipessoal, Lda,. Não sabe onde é que a P........... – Unipessoal, Lda, adquiria as peles que forneceu à V..........., no entanto, sabe pelo tipo de pele, que muitas delas tinham proveniência do Brasil. Relativamente aos pagamentos atendendo ao furto que ocorreu nas instalações em janeiro deste ano (já do conhecimento da AT), não possui a informação referente aos pagamentos, para apresentar hoje. Mais declarou que já contactou o Sr R........ há cerca de 3 semanas, no sentido de este a poder ajudar na localização de alguma documentação solicitada na notificação efetuada pela AT. Contudo, até à presente data, o Sr R........ ainda não lhe remeteu quaisquer documentos/ elementos. Hoje vai novamente contacta-lo/ insistir para ele remeter/ ajudar na localização de alguns documentos/ elementos solicitados na notificação, não o fez antes porque, na semana passada esteve numa feira de sapatos em Itália. Logo que tenha alguns documentos/elementos irá remete-los via email ou por correio, para a Direção de Finanças de Santarém”. No anexo III juntamos cópia das notificações efetuadas ao longo do procedimento inspetivo e autos de declarações efetuados à administradora, Srª. S............. III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL (…) III.1.1 – Indícios de operações simuladas – Faturas emitidas pela P........... - Unipessoal, Lda 1 - Análise do “alegado fornecedor” P........... Como já referido anteriormente (ponto II.2), o procedimento de inspeção, ao exercício de 2014, foi aberto em virtude da V........... ser utilizadora de faturas emitidas pela sociedade P........... – Unipessoal, Lda, com o NIPC ............, sobre a qual existem fortes indícios, objetivos e credíveis, de ser emitente de faturação falsa. No âmbito do procedimento inspetivo efetuado à sociedade P........... – Unipessoal, Lda, ao abrigo das Ordens de Serviço nº ............5, ............8 e ............9, verificou-se que o gerente de direito acumula ou acumulou alegadamente várias funções (gerente, sócio – gerente, representante da Cessação, membro de Conselho de Administração…) em diversas sociedades em incumprimento fiscal e comercial, a morada da sede é inexistente, não se conseguiu encontrar qualquer instalação relacionada com a sociedade e qualquer funcionário ligada diretamente a uma suposta estrutura empresarial. Atividade inscrita A P........... iniciou a atividade de “Comércio por Grosso de Peles e Couro” (CAE046240) em 18- 12-2009, contudo a atividade foi cessada em sede de IVA (artigo 34º, nº1, aliena b) do Código do IVA) e de IRC (encerramento da liquidação, com efeitos a partir de 07-11-2016. Gerência Na consulta ao portal do Ministério da Justiça (https://publicacoes.mj.pt/Pesquisa.aspx) constatou-se que em Junho de 2013 as quotas foram adquiridas pelo Sr. J........, NIF ............ O anterior gerente, Sr. G....... que também era sócio, rescindiu à gerência, em 20 de junho de 2013, passando a ser gerente de direito o Sr. J......... Consultando a base de dados da Autoridade Tributária, constatamos que o Sr. J........ acumula ou acumulou várias funções (gerente, sócio – gerente, representante da Cessação, membro de Conselho de Administração…) em diversas sociedades. Da consulta ao portal do Ministério da Justiça (https://publicacoes.mj.pt/Pesquisa.aspx e https://www.citius.mj.pt/portal/consultas/consultascire.aspx) e ao sistema informático da Autoridade Tributária, concluiu-se que quando a gerência das sociedades, passa para o Sr. J........, as mesmas entram em incumprimento fiscal e comercial. O anterior sócio e gerente, Sr. G......., à data que alienou as quotas e rescindiu à gerência era trabalhador da sociedade E....... – Industria e Comércio de Curtumes, Unipessoal, Lda, sociedade detentora do imóvel (fábrica sita no Lugar ............) onde é desenvolvida a atividade da V........... - Comércio de Couros, Unipessoal Lda, sociedade com relações especiais com a V........... (gerente / administradora é a Srª S............ e também maior fornecedor da V...........). O anterior sócio e gerente, Sr. G......., continua a ser trabalhador da E....... – Industria e Comércio de Curtumes, Unipessoal, Lda. Sede inexistente A fim de verificar a existência da sociedade P..........., deslocamo-nos à sede da sociedade – Rua ....., ..... – ............, concelho de Alcanena. Constatámos que na Rua ....., o número ..... é inexistente. Ou seja, a morada indicada como sede (Certidão Permanente e na base de dados da Autoridade Tribuária) e a morada indicada nas faturas emitidas pelo sujeito passivo como local de carga - Rua ....., ..... – ............, não existe e na rua ..... em ............ não se vislumbra qualquer edifício/ pavilhão onde seja desenvolvida atividade da P............ Existência de trabalhadores/colaboradores Consultando a base de dados da Autoridade Tributária, apuramos que a P........... apenas apresentou a declaração referente a rendimentos pagos ou colocados à disposição, nos termos da alínea c) do nº1 do artigo 119º do CIRS, relativamente ao ano de 2011. Constatou-se ainda, da consulta às aplicações da AT, que a P........... – Unipessoal, Lda não é mencionada em qualquer declaração como entidade pagadora de rendimentos, nos períodos de 2013 a 2015; Nas declarações IES submetidas pelo sujeito passivo P..........., referentes aos exercícios de 2013 e 2014, não consta qualquer gasto com o pessoal (não apresentou IES relativa ao exercício de 2015); Verifica-se assim que a empresa não possui quaisquer trabalhadores ao seu serviço, nem prestador de serviço, no período em análise. Existência de ativos fixos tangíveis sujeito a registo Da consulta ao cadastro da AT, em nome da P..........., apenas se verificou a existência de um veiculo ligeiro de mercadorias com a matricula do ano de 1992, não possui quaisquer imóveis registados em seu nome. Contabilista Certificado De acordo com a informação recolhida no sistema informático da Autoridade Tributária, o Contabilista Certificado (CC), vigente no período em análise é o Sr. J.........., NIF ............. Declarações periódicas de Imposto sobre o Valor Acrescentado As declarações periódicas de IVA dos anos de 2013, 2014 e 2015, submetidas pela P........... à AT, têm valores relevantes, tanto no IVA liquidado como no IVA deduzido. Em algumas declarações periódicas de IVA, o imposto deduzido (existências e outros bens e serviços) é ligeiramente superior ao IVA liquidado, fazendo com que haja reporte de IVA para o período seguinte. No período seguinte, o IVA liquidado é levemente superior ao IVA deduzido, mas inferior ao somatório do IVA deduzido e ao reporte de IVA do período anterior, fazendo com que nunca seja apurado IVA a entregar ao Estado e, simultaneamente, o crédito de imposto seja sempre de montante reduzido. Confrontando as diversas informações recolhidas, verificamos que, se por um lado, nas declarações periódicas de IVA existem valores muito relevantes de IVA deduzido com aquisições de existências e outros bens e serviços, por outro lado, nos anos em causa, as faturas comunicadas por terceiros no EFatura em que conste a P........... como adquirente, são de valor insignificante e não estão relacionadas com a atividade de peles, conforme quadro infra:
Em 2013, existe uma outra fatura comunicada por terceiros em que conste a P........... como adquirente, porém sobre esse emitente recaem fortes indícios objetivos e credíveis, de ser emitente de faturação falsa. Note-se que desde 1 de janeiro de 2013, os operadores económicos encontram-se obrigados a comunicar à Autoridade Tributária todas as faturas emitidas. A fim de validar se a P........... era adquirente intracomunitária de bens ou de serviços, foi efetuada consulta no ..., tendo-se verificado que a mesma só em 2014 (4º Trimestre de 2014) consta como adquirente a um país da comunidade (Espanha), contudo nas declarações de IVA apresentadas pela P........... não é efetuada referência a qualquer aquisição intracomunitária. Importa ainda referir que, o sujeito passivo que declarou no ... ter efetuado transmissões intracomunitárias de bens à P........... é a sociedade, B..... COMERCIO E INDUSTRIA S.L.U, relativamente à qual existem indícios de ser um operador fictício. Pelo N/ Oficio nº ............, datado de 2016.12.12, foi solicitado aos Serviços Aduaneiros se a sociedade P........... - UNIPESSOAL LDA, NIPC ............, relativamente aos exercícios de 2013, 2014 e 2015, efetuou alguma importação de bens. A ..., em 22 de Dezembro de 2016, respondeu por email o seguinte “Em resposta ao solicitado no v/ ofício nº ............, de 12-12-2016, informa-se que, consultado o sistema nacional de processamento electrónico de Declarações Aduaneiras de Importação, entre 2013 e 2015, não se verifica a existência de qualquer registo de declarações processadas pela sociedade P........... – UNIPESSOAL LDA, NIPC ............”. (sublinhado nosso) De realçar ainda, que mesmo que os bens provenientes de países terceiros fossem desalfandegados num outro país da União Europeia, a importação ai efetuada gozaria de uma isenção, nos termos do nº1 do artigo 16º do RITI “Estão isentas do imposto as importações de bens efetuadas por um sujeito passivo, agindo como tal, quando esses bens tenham como destino um outro Estado membro e a respetiva transmissão, efetuada pelo importador, seja isenta do imposto nos termos do artigo 14.º”. Ou seja, em 2013, 2014 e 2015, a P........... não aparece como adquirente de peles no mercado nacional, nem no mercado intracomunitário e nem consta nas Declarações Aduaneiras de Importação como adquirente a países terceiros, exceto no 4º trimestre 2014 em que existe uma empresa espanhola a declarar no ... ter efetuado transmissões de bens para a P..........., porém nas declarações de IVA apresentadas, a P........... não faz qualquer referencia a aquisição intracomunitária e o sujeito passivo que declarou no ... ter efetuado transmissões intracomunitárias de bens à P........... é a sociedade, B..... COMERCIO E INDUSTRIA S.L.U, sobre a qual existem indícios de ser um operador fictício. Em face da análise efetuada à P........... no âmbito do respetivo procedimento inspetivo, concluiu-se pela existência de fortes indícios de que as deduções declaradas, nos campos 22 e 24, das respetivas declarações periódicas de IVA não correspondem a deduções reais, ou seja, não correspondem a efetivas aquisições de bens e serviços. Das diligências efetuadas, no decurso do procedimento inspetivo à sociedade P........... foi o gerente da mesma, o Sr. J........, ouvido na Direção de Finanças de Setúbal, no dia 27 de Abril de 2016, onde compareceu, acompanhado de advogado, porém não quis prestar declarações, contudo informou que: - Desconhecia onde se encontrava a contabilidade da sociedade P........... – Unipessoal, Lda; - Passou uma procuração a terceiros para efetuarem os atos de gestão, da sociedade, porém, não apresentou cópia da procuração, nem indicou a quem tinha emitido a procuração. - Alegou ainda que, iria diligenciar no sentido de saber onde se encontrava a contabilidade. Embora a P........... tenha sido notificada para apresentar a contabilidade da sociedade, a mesma nunca foi apresentada. Em síntese, foram emitidas faturas pelo sujeito passivo P........... – Unipessoal, Lda, cuja estrutura empresarial se afigura como inexistente, dado que: Não foi possível localizar a sua sede ou qualquer outro local relacionado com a sociedade; Não possuía qualquer funcionário ou prestador de serviços; As faturas comunicadas no E-Fatura em que a P........... – Unipessoal, Lda figura como adquirente, a informação recolhida no ... e nos Serviços aduaneiros não são compatíveis com as deduções declaradas nas respetivas declarações periódicas de IVA, nem com o valor das vendas/prestações de serviço declaradas pelo sujeito passivo. Por conseguinte, se não existem vendas comunicadas por terceiros à P..........., nem lhe foi detetada uma estrutura empresarial adequada, também não existirão as respetivas vendas/prestações de serviço, logo, concluímos pela existência de fortes indícios objetivos e credíveis de que as faturas emitidas pelo sujeito passivo P........... – Unipessoal, Lda para diferentes operadores económicos, não titulam operações reais, tratando-se de operações simuladas. Estas conclusões encontram-se evidenciadas no relatório de inspeção tributária, relativo ao procedimento inspetivo levado a cabo à P........... – Unipessoal, Lda, relativamente aos anos de 2013, 2014 e 2015 (Ordens de Serviço nº ............5, ............8 e ............9). A V........... contabilizou a seguinte fatura emitida pela P..........., com o NIPC ............:
A cópia da fatura consta do Anexo IV. Conforme explanado no Capítulo II, embora a V........... tenha sido notificada para regularizar a contabilidade, até à data do presente relatório não apresentou a contabilidade, contudo pela análise efetuada e exposta no ponto II.3.7 do capítulo II e pelas declarações efetuadas pela gerente da sociedade, Srª AA, não existem dúvidas que a fatura foi contabilizada pela V..........., até porque a mesma foi apreendida da contabilidade no âmbito do processo de inquérito nº .../2016 IDSTR. Conforme já descrito no Capitulo II, a V........... foi notificada, para apresentar alguns documentos relacionados com as “supostas aquisições”, efetuadas à P..........., nomeadamente: “Relativamente ao vosso fornecedor P........... - UNIPESSOAL LDA, NIPC ............, apresentar os seguintes documentos: - Guias de transporte relativas à(s) fatura(s) contabilizada(s) durante o exercício de 2014 e 2015; - Identificação da entidade que efetuava os transportes; -Troca de correspondência entre a V........... – , S.A e o fornecedor P........... - UNIPESSOAL LDA, bem como indicação/identificação das pessoas contatadas; - Meios de pagamento utilizados (Cheque, transferência bancária, etc), juntando fotocópia autenticadas dos respetivos documentos de suporte, nomeadamente cheques (frente e verso), extratos, ordem de transferência, etc.” Em síntese, a gerente da V..........., em resposta à notificação declarou o seguinte: Não possui nesta data quaisquer elementos para apresentar; Os contactos eram efetuados com um Sr R........, desconhece o nome completo; O escritório era em Lisboa, porém não sabe a morada; Tem conhecimento que o Sr R........ não se encontra em Portugal; Os transportes das peles adquiridas eram efetuados por conta da P..........., era esta que colocava as peles na fábrica; Não sabe onde a P........... adquiria as peles, mas sabe que muitas delas tinham proveniência do Brasil; Devido ao furto das instalações em janeiro não possui a informação relativamente aos pagamentos; Já contatou o Sr R........ no sentido de este a poder ajudar na localização dos documentos solicitados pela AT. A administradora da V..........., Srª S............, declara que as peles eram colocadas pela P........... na fábrica, contudo a fatura menciona o local de descarga – Felgueiras. ???? A fábrica fica no Lugar ............, em ............ – Alcanena. O local de carga constante na fatura menciona Rua ....., nº ....., mas conforme explanado anteriormente o local é inexistente. A informação dada pela administradora, Srª S............, sobre a P........... é sempre vaga, como por exemplo “R........ de Lisboa”, “escritório em Lisboa”, “já contatou o Sr R........ para este ajudar na localização dos documentos”, “irá remete-los para a Direção de Finanças”. Não obstante a Srª administradora ter informado, em 20 de junho de 2017, que estava a diligenciar no sentido de obter os documentos, os quais remeteria à DF de Santarém, até à presente data não foram rececionadas nestes serviços quaisquer elementos. EM CONCLUSÃO: Todos os factos descritos ao longo deste ponto (III.1.1 – Indícios de operações simuladas – Faturas emitidas pela P........... - Unipessoal, Lda), constituem fortes indícios de que as matérias primas/ mercadorias, relacionadas na fatura emitida pela P........... no exercício de 2014, não consubstanciam operações reais. Deste modo, os gastos associados a estas operações não poderão ser aceites fiscalmente, uma vez que um dos requisitos essenciais à dedutibilidade dos gastos prende-se com a efetividade dos gastos incorridos, para além de terem de cumprir a condição de estarem devidamente documentados. Um gasto só pode ser fiscalmente relevante se tiver sido realmente suportado pelo sujeito passivo, isto é, se o gasto contabilizado corresponder a uma operação efetivamente realizada e para obter ou garantir rendimentos sujeitos a imposto. O montante da fatura em causa influenciou o apuramento do custo das mercadorias vendidas, e como tal encontram-se refletido como um gasto na contabilidade do sujeito passivo. Em face do exposto, o gasto associado à fatura emitida pela P........... – Unipessoal, Lda não pode ser aceite fiscalmente.
(…) III.2. – EM SEDE DE Imposto sobre o Valor Acrescentado III.2.1 – Indícios de operações simuladas – Faturas emitidas pela P........... - Unipessoal, Lda – Dedução Indevida de IVA Como já anteriormente se expôs, existem indícios fundados de que a fatura emitida pelo suposto “fornecedor” - P........... - Unipessoal, Lda - não titulam operações reais, e por conseguinte o IVA deduzido pela V........... relativamente às mesmas faturas, não é dedutível, uma vez que o Código do IVA, explicita no nº 3 do seu artigo 19º, que “não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente”. Este entendimento tem sido expresso na abundante jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, quando afirma que “o direito à dedução do IVA pago a montante apenas poderá existir, segundo a própria natureza das coisas, relativamente a imposto efectivamente suportado em operações efectivamente acontecidas...”. (Cfr. Acórdão de 17/04/2002, no processo 026635) Ou seja, para que haja direito à dedução do IVA mencionado nas faturas, além de ser necessário que estas estejam passadas em forma legal (art.º 19.º n.º 3 CIVA), é também fundamental que as operações constantes das faturas se tenham realizado, tenham sido realizadas pelos operadores ai mencionados e pelo preço aí referido, não podendo deduzir-se imposto que resulte de operações simuladas ou em que seja simulado o preço constante da fatura. No que respeita aos ónus da prova, salienta-se que inclusivamente à Administração Fiscal basta a recolha de indícios, embora fundados, objetivos e seguros, de que a matéria coletável declarada pelo sujeito passivo não é a real, para cessar a presunção de veracidade da sua contabilidade e dos elementos de suporte sobre os quais recaiam tais indícios, invertendo-se, deste modo, o ónus de prova, competindo ao sujeito passivo, a prova de que a sua contabilidade e respetivos elementos respeitam a operações efetivamente realizadas. Esta é, de facto, a posição dominante da jurisprudência portuguesa, da qual se apresenta, como exemplo, o seguinte excerto extraído do ponto 6.3.2 do Acórdão do Tribunal Central administrativo Sul, datado de 2002-04-06, no âmbito do Processo 6573/02: “ (…) Quanto ao facto de as faturas se apresentarem formalmente corretas, isso, só por si, não significa que traduzam a realidade das operações que titulam, cessando a presunção da veracidade da escrita no caso da existência de indícios sérios de que aquelas operações se não realizaram. Nesse caso - e aqui entramos já na questão do ónus da prova também invocado pela recorrente – provando a Administração a existência de indícios sérios e credíveis de que aquelas operações não são verdadeiras, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade das mesmas. (…) Daí que seja curial rejeitar como custo uma quantia titulada por faturas quando, após averiguações, a Administração Fiscal conclui haver sérios indícios de que aquelas operações são simuladas e, consequentemente, que tais custos não são reais. Na verdade, pretendendo-se, em sede de IRC, tributar o lucro real, não pode, obviamente, consentir-se a dedução de impostos que resulte de operação simulada, sob pena de aceitação de fraude fiscal. E perante esses indícios, cessa a presunção de veracidade das operações constantes das faturas, passando a competir ao contribuinte o ónus de provar que as operações se realizaram efetivamente (…)” Perante os factos descritos no ponto III.1.1. do presente relatório, para o qual se remete, concluiu-se pela existência de fortes indícios de que os bens/ prestações de serviços descritos na fatura emitida pela P........... - Unipessoal, Lda no período de 2014, não correspondem a operações reais. Tendo por base essa fatura, o sujeito passivo efetuou a dedução de IVA que a seguir se identifica:
Nos termos do artigo 19º nº 3 do Código do IVA, “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada …”. O Código do IVA não refere o que se entende por operação simulada, pelo que esse conceito deve ser interpretado à luz do Direito Civil, por via do disposto no artigo 11º nº 2 da Lei Geral Tributária, o qual prevê que “Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer diretamente da lei”. Neste sentido, “se por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz se simulado”, nos termos do disposto no artigo 240º do Código Civil, conceito que se enquadra na íntegra à situação em análise. Conforme já foi referido no ponto III.1.1. do relatório, estamos perante uma simulação absoluta, uma vez que todos os factos apontam para que não tenha existido qualquer negócio com este operador económico, P........... – Unipessoal, Lda. Pelos factos descritos neste ponto do relatório, do qual resulta o apuramento de IVA em falta no valor de €18.624,71 em 201412M o sujeito passivo infringiu o disposto no artigo 19º nº 3 e 27º do Código do IVA, sendo punível pelo artigo 104º nº 2 do RGIT. III.3 – Resumo dos acréscimos ao Resultado líquido (IRC) e IVA em falta (…) B – IVA Ano de 2014
O montante do imposto exigível, conjuntamente com a respetiva declaração periódica, deve ser entregue até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele a que respeitam as operações, conforme previsto no número 1 do artigo 27.º, conjugado com a alínea c) do número 1 do artigo 29.º e alínea a) do número 1 do artigo 41.º, todos os artigos do Código do IVA. (…) IX – DIREITO DE AUDIÇÃO Foi enviado o Projeto de Relatório da Inspeção Tributária, ao Sujeito Passivo, pelo ofício n.º 4109, datado de 2017-11-10, registo dos CTT RF316109729PT, para no prazo de 15 dias exercerem o direito de audição, nos termos do art. 60º da Lei Geral Tributária (LGT) e art. 60º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA). Em 2017-11-30, deu entrada nesta Divisão de Inspeção Tributária II, com registo de entrada 2017E003529690, o direito de audição, cujo conteúdo se transcreve: (…) Análise do direito de audição Articulado 1.º e 2.º Argumentos Apresentados Vem o sujeito passivo alegar na sua petição, no articulado 2º que a “(…) administração não é exercida por A............ e sim por S............ conforme resulta de certidão comercial permanente de que se junta cópia” Análise Da análise à Certidão Permanente constata-se que a sociedade foi constituída em 2011, tendo sido designado como Administrador Único, a Sr ª A............, com o NIF ..........., com um mandato de 4 anos, ou seja, de 2011 a 2014. Em 9 de janeiro de 2015, foi designada, como Administradora Única a Srª S............, para o mandato de 2015 a 2018. Em suma, pela observação da Certidão Permanente, no exercício de 2014 a Administração de Direito era exercida pela Srª A............. No entanto, tal como se encontra descrito no item II.3.2 do relatório, não obstante a gerência de direito da sociedade pertencer à Sr.ª A............, foram recolhidos, no decurso do procedimento inspectivo, documentos comprovativos de que a gerência de facto era exercida pela Sr.ª S............. Articulado 3º a 6º Argumentos Apresentados No articulado 3.º e 4.º informa o sujeito passivo que a contabilidade e o seu suporte documental, foi seriamente afetada pelo roubo e atos de vandalismos que as instalações sofreram entre o dia 14/01/2017 e o dia 15/01/2017, razão pela qual, se verificaram dificuldades em facultar a documentação necessária à realização da ação inspetiva, alegando não ter existido qualquer intencionalidade de ocultar a mesma. Refere ainda no ponto 6º que, tal facto lhe está a provocar dificuldades para o exercício de audição prévia. Análise Conforme exposto no capítulo II.3.6 - Inexistência da Contabilidade/ notificações efetuadas ao sujeito passivo, a V........... durante o procedimento inspetivo deu conhecimento à Autoridade Tributária, do assalto das instalações onde se encontrava a contabilidade. Também no capítulo II.3.6, se encontra descrito que a Administradora da sociedade, Srª S............, foi ouvida, em auto de declarações, sobre as diligências efetuadas para a recuperação da contabilidade, conforme se transcreve de seguida: “Inquirido sobre (…) 2) As diligências e respetivas provas efetuadas para a recuperação da contabilidade, nomeadamente, contatos com clientes, fornecedores, banco, contabilista certificado e terceiros com quem a empresa teve relações comerciais. Declarou (…) Relativamente ao ponto 2) declarou estar a diligenciar junto de fornecedores, clientes, bancos, terceiros e contabilista certificado no sentido de reunir os elementos necessários à reorganização da contabilidade do exercício de 2014. Os pedidos dos elementos foram solicitados por telefone ou pessoalmente, pelo que não possuí provas das diligências efetuadas”. Não obstante as instalações terem sido assaltadas/ vandalizadas em janeiro de 2017, o procedimento inspetivo só ter sido iniciado no final de abril de 2017, ter sido notificado o sujeito passivo para reorganizar a contabilidade, a Administradora da V........... ter declarado que estava a diligenciar para reunir os elementos necessários para reorganizar a contabilidade, até à presente data, o sujeito passivo nunca apresentou a contabilidade nem fez prova que estava a proceder à sua recuperação/ reorganização. Articulado 7º a 13º Argumentos Apresentados Neste articulado vem o sujeito passivo referir que não aceita as correções propostas no projecto de relatório, em sede de IVA (Euros 18.624,71) e IRC (Euros 80.977,00). Alega o contribuinte que a AT tinha o ónus de demonstrar os factos que a levaram a desconsiderar a fatura contabilizada, referente à sociedade P..........., sendo que, só tal demonstração é susceptível de abalar a presunção de veracidade da operação constante da escrita do contribuinte atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito conforme prescreve o art. 75º da LGT. Mais refere que, não existe nem base nem fundamento para a desconsideração da fatura emitida pela P..........., quer em sede de IRC, quer em sede de IVA, uma vez que uma parte substancial dos produtos foram vendidos e transformados, porque se não tivesse havido compras, também não haveria vendas. Análise Conforme explanado no capítulo III.1.1.1 - Análise do “alegado fornecedor” P..........., encontram-se devidamente demonstrados os factos que levaram a AT a desconsiderar o gasto em sede de IRC e a dedução do IVA, relativamente à fatura emitida pela P............ Conforme consta do referido ponto, em procedimento inspectivo à P..........., levado a cabo por estes Serviços foram apurados fortes indícios objetivos e credíveis de que as operações constantes das faturas emitidas pela empresa em causa não correspondem a operações reais. De salientar que, no decurso do procedimento inspetivo à V..........., conforme descrito no ponto II.3.8, foi a sociedade na pessoa da sua administradora, Srª S............, notificada para apresentar alguns documentos/elementos relacionados com as “supostas aquisições”, efetuadas à P..........., não tendo os mesmos sido apresentados. Não obstante a Srª administradora ter informado, em 20 de junho de 2017, que estava a diligenciar no sentido de obter os documentos, os quais remeteria à DF de Santarém, até à presente data não foram rececionadas nestes serviços quaisquer elementos. De salientar que a informação dada pela administradora, Srª S............, sobre a P........... é sempre vaga, como por exemplo “R........ de Lisboa”, “escritório em Lisboa”, “já contatou o Sr R........ para este ajudar na localização dos documentos”, “irá remete-los para a Direção de Finanças”. Conforme já se encontra descrito no capítulo III, importa referir que, no que respeita aos ónus da prova, à Administração Fiscal basta a recolha de indícios, embora fundados, objetivos e seguros, de que a matéria coletável declarada pelo sujeito passivo não é a real, para cessar a presunção de veracidade da sua contabilidade e dos elementos de suporte sobre os quais recaiam tais indícios, invertendo-se, deste modo, o ónus de prova, competindo ao sujeito passivo, a prova de que a sua contabilidade e respetivos elementos respeitam a operações efetivamente realizadas. A administração fiscal demonstrou claramente, no capítulo III, os indícios objetivos e seguros de que as operações constantes da fatura emitida pela P........... não correspondiam a operações efetivamente ocorridas, não tendo o sujeito passivo apresentado, além da própria fatura, qualquer outro elemento suscetível de provar a realidade da operação. No Direito de Audição, alega que os bens foram entregues com as especificações próprias da encomenda, contudo não faz qualquer prova da entrega dos bens, nem qualquer prova da encomenda. Refere ainda, o sujeito passivo, que não lhe competia a fiscalização da forma e do modo como a P........... procedia, alegando também que a desconsideração do custo, implicaria a desconsideração de vendas. Não existindo indícios de que as vendas efetuadas pela V........... sejam simuladas, não serão as mesmas de deixar de ser consideradas nos termos do artigo 20º do Código do IRC. Quanto aos gastos relativos a estas compras, concluindo-se pela existência de fortes indícios de que se trata de operações simuladas, não poderão ser aceites fiscalmente nos termos do artigo 23º do Código do IRC, nem o IVA deduzido nos termos do nº3 do artigo 19º do Código do IVA. Conclusão: Assim, em face da análise efetuada ao conteúdo do direito de audição referente às correções propostas no ponto III do projeto de relatório, conclui-se que, não veio o sujeito passivo apresentar elementos suscetíveis de proceder à sua alteração, pelo que são as mesmas de manter. (…)” 6) A Impugnante não apresentou a contabilidade devidamente organizada aos serviços de inspeção tributária (págs. 8 a 10 do relatório de inspeção tributária a fls. 107 a 109 do p. a.). 7) No âmbito do procedimento inspetivo à Impugnante foi a mesma notificada pelos serviços de inspeção tributária para, relativamente ao fornecedor “P..........., Lda.”, apresentar as guias de transporte relativas à fatura contabilizada no ano de 2014, identificar a entidade que efetuava os transportes, a correspondência existente entre as duas sociedades, bem como a identificação das pessoas contactadas e os meios de pagamento utilizados (fls. 167 a 170 do p. a.). 8) A administradora da Impugnante, S............, ouvida em auto de declarações pelos serviços de inspeção tributária declarou o que se extrata por relevante para os presentes autos: “(…) Na presente data não possui quaisquer elementos para apresentar relativamente ao fornecedor P........... – Unipessoal, Lda. Os contactos com a P........... eram efetuados com um Sr chamado R........, desconhece o seu nome completo. Sabe também que a P........... – Unipessoal, Lda, tinha escritório em Lisboa, desconhecendo a morada. Tem conhecimento que o Sr R........ não se encontra em Portugal. Relativamente aos transportes das peles, desconhece quem procedia à realização dos mesmos, uma vez que, as peles eram sempre colocadas na fábrica pela P........... – Unipessoal, Lda,. Não sabe onde é que a P........... – Unipessoal, Lda, adquiria as peles que forneceu à V..........., no entanto, sabe pelo tipo de pele, que muitas delas tinham proveniência do Brasil. Relativamente aos pagamentos atendendo ao furto que ocorreu nas instalações em janeiro deste ano (já do conhecimento da AT), não possui a informação referente aos pagamentos, para apresentar hoje. Mais declarou que já contactou o Sr R........ à cerca de 3 semanas, no sentido de este a poder ajudar na localização de alguma documentação solicitada na notificação efetuada pela AT. Contudo, até à presente data, o Sr R........ ainda não lhe remeteu quaisquer documentos/ elementos. Hoje vai novamente contacta-lo/ insistir para ele remeter/ ajudar na localização de alguns documentos/ elementos solicitados na notificação, não o fez antes porque, na semana passada esteve numa feira de sapatos em Itália. Logo que tenha alguns documentos/elementos irá remete-los via email ou por correio, para a Direção de Finanças de Santarém”. (fls. 167 a 170 do p. a.). 9) A sociedade comercial “P..........., Lda.” foi submetida a procedimento inspetivo credenciado pelas ordens de serviço n.ºs ............5, ............8 e ............9, no âmbito do qual a Autoridade Tributária constatou que: o respetivo sócio gerente J........, acumulou várias funções em sociedades comerciais que se encontram em incumprimento fiscal e comercial, a morada da sede é inexistente, não lograram localizar qualquer morada relacionada com aquela sociedade comercial ou bem assim qualquer funcionário (págs. 16 e 17 do relatório de inspeção tributária a fls. 115 e 116 do p. a.). 10) A sociedade comercial “P..........., Lda.” iniciou a atividade de “comércio por grosso de peles e couro” (CAE 046240) em 18/12/2009, tendo a atividade cessada em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado com efeitos a 7/11/2016 por inexistência de ativo (pág. 16 do relatório de inspeção tributária a fls. 115 do p. a.). 11) Em 20/6/2013, o, à data, sócio gerente da sociedade comercial “P..........., Lda.” G......., era (e continuava a ser em 2017) trabalhador da sociedade comercial “E....... – Indústria e Comércio de Curtumes, Unipessoal, Lda.” (pág. 17 do relatório de inspeção tributária a fls. 116 do p. a.). 12) A sociedade comercial “E....... – Indústria e Comércio de Curtumes, Unipessoal, Lda.” era detentora do imóvel onde exercia a atividade a sociedade comercial “V........... – Comércio de Couros, Unipessoal, Lda.” (pág. 17 do relatório de inspeção tributária a fls. 116 do p. a.). 13) S............ era gerente da sociedade comercial “V........... – Comércio de Couros, Unipessoal, Lda.” (pág. 17 do relatório de inspeção tributária a fls. 116 do p. a.). 14) A sociedade comercial “P..........., Lda.” não possuía quaisquer imóveis registados em seu nome e possuía apenas um veículo ligeiro de mercadorias com matrícula do ano de 1992 (pág. 18 do relatório de inspeção tributária a fls. 117 do p. a.). 15) Nas declarações periódicas de Imposto sobre o Valor Acrescentado dos anos de 2013 a 2015, a sociedade comercial “P..........., Lda.” nunca apurou Imposto sobre o Valor Acrescentado a entregar ao Estado e o valor do crédito de imposto apurado foi sempre reduzido (pág. 18 do relatório de inspeção tributária a fls. 117 do p. a.). 16) As faturas comunicadas por terceiros no E-fatura em que a sociedade comercial “P..........., Lda.” consta como adquirente, relativamente ao ano de 2014, são as que se discriminam:
(pág. 18 do relatório de inspeção tributária a fls. 117 do p. a.). 17) No quarto trimestre de 2014, a sociedade comercial “P..........., Lda.” declarou ter efetuada uma aquisição intracomunitária à sociedade comercial de direito espanhol “B..... Comercio e Industria S.L.U.” relativamente à qual existem fortes indícios de ser um operador fictício (pág. 19 do relatório de inspeção tributária a fls. 118 do p. a.). 18) Nos anos de 2013 a 2015, a sociedade comercial “P..........., Lda.” não emitiu qualquer declaração de importação (pág. 19 do relatório de inspeção tributária a fls. 118 do p. a.). 19) Na sequência das correções propostas no relatório de inspeção identificado em 5), foi emitida, em nome da Impugnante, a liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado do período de tributação 201412M, com o n.º 2018 ..........., com imposto a pagar no valor de 18.100,76€ (fls. 179 do p. a.). 20) Em 31/7/2018, deu entrada no Serviço de Finanças de Santarém, a reclamação graciosa apresentada pela Impugnante contra o ato de liquidação descrito no ponto antecedente, com a fundamentação que consta a fls. 175 a 177 do p. a.. 21) Por despacho da Chefe do Serviço de Finanças de Santarém, datado de 15/10/2018, a reclamação graciosa deduzida pela Impugnante foi indeferida (fls. 184 a 187 do p. a.). 22) A Impugnante foi notificada da decisão de indeferimento que recaiu sobre a reclamação graciosa por si apresentada, através do ofício n.º 5458 de 15/10/2018, na pessoa do seu mandatário constituído, enviado sob registo RF394801479PT, cujo aviso de receção se mostra assinado em 18/10/2018 (fls. 188 e 189 do p. a.). 23) A presente impugnação judicial foi remetida ao Serviço de Finanças de Santarém por correio sob registo ...............PT de 17/1/2019 (fls. 114 do processo físico). * Refere-se ainda na sentença recorrida: « Nada mais se provou com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir e o pedido, designadamente, não ficou provado que: A. A Impugnante manteve relações comerciais com a sociedade comercial “P..........., Lda.”; B. A Impugnante recebeu, por conta e risco da sociedade comercial “P..........., Lda.”, a mercadoria que foi entregue nas instalações fabris de que faz uso, tendo tal operação sido titulada pela fatura nº ............ de 4/12/2014 que veio a pagar; C. Após transformação das peles fornecidas pela sociedade comercial “P..........., Lda.”, a Impugnante transformou-as e alienou-as.». * Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto: « Quanto aos factos elencados na factualidade assente, a convicção do Tribunal baseou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nas informações oficiais, documentos constantes dos autos, do processo administrativo apenso e do procedimento de reclamação graciosa apenso, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada número do probatório, sendo indicado expressamente em cada número o(s) documento(s) que contribuíram para a extração de tal facto, através da indicação do documento e das folhas do processo físico ou do processo administrativo em que o mesmo se encontra junto a cada número do probatório assente. A valoração dos documentos atendeu ao seu valor probatório, ao seu teor e aos factos que os mesmos comprovam, em si mesmos ou em conjugação com os demais, sendo de salientar que as informações oficiais, em que se integra o relatório de inspeção tributária e respetivos anexos, fazem fé, quando devidamente fundamentadas, como sucede nos presentes autos (cfr. artigos 76.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária e 115.º, n.º 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário). A prova testemunhal produzida foi devidamente ponderada e valorada nos termos que se passam a descrever. A testemunha AA...., técnico oficial de contas da Impugnante, prestou um depoimento isento e credível, tendo declarado que, tal como decorre das funções que desempenha, apenas conhece o circuito documental dos atos aqui em causa desconhecendo as operações materiais que lhes estão subjacentes. Pelo declarado, o seu depoimento não foi valorado para efeitos de demonstração de que a fatura emitida pela sociedade comercial “P..........., Lda.” corresponde ao efetivo fornecimento dos bens aí descritos. Quanto ao depoimento da testemunha O......, o mesmo revelou-se confuso e incongruente. A testemunha declarou que no mesmo espaço onde operava a Impugnante exerciam a sua atividade diversas outras sociedades comerciais e que a testemunha apesar de no papel trabalhar para outra sociedade comercial, na prática prestava serviços a todas elas. A testemunha afirmou que tratava as peles para todas as sociedades comerciais que operavam no mesmo espaço e que os trabalhadores que se encontravam nas instalações também trabalhavam para todas as sociedades comerciais indistintamente, tendo visualizado paletes com o autocolante da “P...........” e que quando rececionava as peles abria um lote para o fornecedor. Ora, do depoimento desta testemunha também não é possível extrair que os fornecimentos descritos na fatura desconsiderada pela Autoridade Tributária correspondam à realidade e tenham sido efetivamente prestados, pelo que não pode ser valorado para esse efeito. Por fim, foi valorado o depoimento de BB, Inspetora Tributária responsável pelo procedimento inspetivo à Impugnante que reforçou todas as conclusões ínsitas no relatório de inspeção tributária. Quanto aos factos não provados, os mesmos resultam da ponderação de toda a prova produzida nos autos, nomeadamente da prova documental e da prova testemunhal, conforme infra se descreve. Efetivamente, de toda a prova produzida não é possível concluir que a fatura desconsiderada pela Autoridade Tributária identificada no ponto 2) da factualidade assente corresponda a fornecimentos realmente prestados pela sociedade comercial “P..........., Lda.” à Impugnante. Com efeito, nem da prova documental, nem da prova testemunhal produzidas, foi possível extrair que a fatura em causa corresponda a fornecimentos efetivamente prestados à Impugnante. Do depoimento das testemunhas não é possível extrair qualquer facto que permita concluir pela veracidade das operações em causa, na medida em que na identificação concreta dos bens faturados, os depoimentos foram demasiados genéricos, não sendo referidos quaisquer factos concretos quanto ao conteúdo da fatura e à prova de que houve transação de mercadorias entre as sociedades que correspondesse a essa fatura, não relevando, assim, para a prova de qualquer factualidade, mormente dos factos dados como não assentes. De facto, apesar da testemunha O...... ter referido que a pele da “P...........” era de fraca qualidade, que era pele da Argentina, como o próprio referiu, no espaço onde eram rececionadas as peles e onde desempenhava funções, operavam diversas empresas para as quais prestava serviços, pelo que tal depoimento não revelou a coerência e concretização necessárias para dar como provados os factos não provados. Importa também salientar que, pese embora os factos possam ser comprovados por prova testemunhal (cfr. artigo 393.º do Código Civil), os depoimentos devem revelar-se coerentes, contextualizados, assertivos, credíveis e detalhados ao ponto de corroborarem os factos alegados pelas Partes, in casu destinados a contrariar os indícios de operações simuladas em que assentaram as correções efetuadas pela Autoridade Tributária e a demonstrar que as relações materiais subjacentes, tituladas por tal documento, correspondiam efetivamente a transações reais. Sendo que, o nível de exigibilidade da verosimilhança dos depoimentos das testemunhas nestes casos tem de ser mais exigente e detalhado porque têm de substituir a força probatória de um documento cuja validade foi colocada em causa pela Autoridade Tributária no quadro de legalidade das suas competências. E, no caso concreto, não se considera que a coerência, detalhe e assertividade dos depoimentos tenha sido suficiente para o Tribunal poder julgar provada a matéria de facto alegada pela Impugnante, designadamente os factos assentes como não provados, ou seja, que os fornecimentos descritos na fatura foram de facto efetuados. Cumpre também frisar que a coerência e assertividade dos depoimentos não foi suficiente para o Tribunal poder julgar provada a matéria de facto alegada pela Impugnante, designadamente os factos dados como não provados, como se referiu, sendo certo que aqui não está em causa o circuito documental, mas sim que a venda de pele tenha sido efetuada pelo fornecedor “P..........., Lda.” em concreto, de acordo com o descritivo na fatura emitida e colocadas em causa pela Autoridade Tributária. Em suma, não houve qualquer elemento trazido pela Impugnante aos autos, resultante quer da prova documental, quer da prova testemunhal, que lograsse abalar os indícios apurados pela Autoridade Tributária, de forma a convencer o Tribunal que as operações descritas na fatura emitida pela sociedade comercial “P..........., Lda.” à Impugnante, tenham sido efetivamente realizadas». * 3.B. - De Direito Antes do mais, importa apurar a ordem pela qual as questões decidir hão de ser apreciadas pelo Tribunal. Assim, uma vez que o Código do Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) apenas regula, no seu artigo 124.º, a ordem de conhecimento, na sentença, dos vícios imputados aos atos impugnados, mas não a ordem do conhecimento das questões a resolver pelo Tribunal, há que recorrer ao Código de Processo Civil – cfr. o artigo 2.º, alínea e), do CPPT -, que, no n.º 1 do seu artigo 608.º, determina que “a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua procedência lógica”. Quanto às questões de fundo, impõe o n.º 2 daquele artigo 124.º do CPPT que se comece pelos “vícios cuja procedência lógica determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos”. Nesses termos, este Tribunal fixa a seguinte ordem de conhecimentos das questões a decidir acima sintetizadas: a. Do erro na decisão proferida sobre a matéria de facto [conclusões a) a i) e o) das alegações]; b. Do erro de julgamento, uma vez que a administração tributária (AT) não reuniu indícios suscetíveis de abalar a presunção de veracidade de que gozam as declarações da Recorrente [conclusões j) a n) das alegações]; c. Do erro de julgamento, dado que ocorreram transações comerciais entre a Recorrente e a sociedade P........... – Unipessoal Lda. (doravante, P...........) [conclusões o) a u) das alegações]; d. Do erro de julgamento, dado tratar-se de situação de fundada dúvida sobre a ocorrência do facto tributário [conclusões v) a ee) das alegações]; e. Do erro de julgamento, uma vez que o relatório de inspeção tributária (RIT) não está cabalmente fundamentado [conclusão ff) das alegações]; A. - Do erro na decisão proferida sobre a matéria de facto [conclusões a) a i) e o) das alegações] Sobre essa questão, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: «a) A matéria de facto dada como provada na sentença, acolhe, quase in totum, a que se encontra reproduzida no relatório de inspeção tributária, documentos e as conclusões que do mesmo decorrem, desconsiderando a prova apresentada pela Recorrente de modo algo "radical", quer de natureza documental, quer, de modo relevante, testemunhal; b) Recorre-se assim, primeiramente, da matéria de facto dada como provada constante da decisão recorrida, no particular a que consta no ponto 5, impugnando-se a mesma com fundamento nos depoimentos de testemunhas que se encontram gravados e daí se impondo decisão diversa a proferir por este Venerando Tribunal, no pressuposto da reapreciação destes meios de prova e consequente provimento do pedido de anulação da liquidação. c) Com fundamento nos depoimentos das testemunhas, a decisão recorrida deve ser revogada com o pressuposto na referida reapreciação desses meios de prova, provando-se que se verificaram relações comerciais entre a P........... e a Recorrente, no ano de 2014, ao contrário do que se decidiu; d) O depoimento das testemunhas necessariamente conjugado com os documentos juntos à PI, importa decisão diversa para que se faça JUSTIÇA; e) E para os efeitos referidos no ponto anterior, importa, pela reapreciação da prova gravada, que se faça julgamento diferente do que foi realizado, sobre os factos que são dados como provados. f) E a matéria controvertida, refletida no ponto 5 da matéria de facto, é a de saber se, no ano de 2014, ocorreu, ou não, uma transação comercial entre a P........... e a Recorrente; g) Ora dos segmentos dos depoimentos das testemunhas que se transcreveram resulta que ocorreram transações comerciais reais; h) Atente-se que, do segmento dos depoimentos fidedignos, independentes e isentos, gravação da audiência do dia 22-09-2023 10-26-06 - 01:04:25 i) Do recurso da matéria de facto, visando a reapreciação da prova gravada, a decisão deveria ter sido de considerar o depoimento das testemunhas que presenciaram factos ocorridos no ano de 2014, atento o seu teor, devendo ficar prejudicados os factos dados como provados, resultantes de meros indícios e de um relatório de inspeção tributaria executado no ano de 2017: (…) o) Por outro lado, e atento os mesmos depoimentos e documentos juntos aos autos, deveria dar-se como provados factos o que não aconteceu na sentença, a saber: A. A Impugnante manteve relações comerciais com a sociedade comercial “P..........., Lda.”; B. A Impugnante recebeu, por conta e risco da sociedade comercial “P..........., Lda.”, a mercadoria que foi entregue nas instalações fabris de que faz uso, tendo tal operação sido titulada pela fatura n° ............ de 4/12/2014 que veio a pagar; C. Após transformação das peles fornecidas pela sociedade comercial “P..........., Lda.”, a Impugnante transformou-as e alienou-as» Em suma, a Recorrente considera que a sentença padece de erro de julgamento sobre a matéria de facto numa dupla vertente: por um lado errou ao julgar provado o facto 5 do probatório e, por outro, ao julgar não provados os factos A, B e C do probatório. Sobre a modificabilidade da matéria de facto impugnada, preceitua o artigo 662º do CPC que o tribunal de recurso pode-deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Porém, nas situações em que essa modificação esteja dependente da reapreciação de meios de prova sujeitos a livre apreciação, como é o caso das declarações de parte e dos depoimentos testemunhais, o tribunal recorrido apenas intervém se o recorrente tiver cumprido o triplo ónus de impugnação, nos termos do artigo 640º, nº 1, do CPC, caso em que deverão ser levados em conta todas as provas que constem do processo. O citado artigo 640.º do CPC refere que: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.” Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida. Para efeitos de cumprimento da impugnação da matéria de facto no concreto domínio da prova testemunhal, sujeita à livre apreciação do juiz que presidiu à diligência da sua produção, tem de existir uma indicação exata das passagens de gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, porquanto além de constituírem uma condição essencial para o exercício esclarecido do contraditório, servem sobretudo de parâmetro da amplitude com que o tribunal de recurso deve reapreciar a prova. Sem prejuízo do que ficou dito, realça-se que a jurisprudência tem sido uniforme no sentido de que se devem moderar as exigências formais de acordo com os princípios da proporcionalidade e do acesso à tutela jurisdicional efetiva. Além disso, a dúvida subsistente no conhecimento dos factos sujeitos à livre apreciação deve resolver-se dando prevalência ao princípio da imediação. Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus foram suficientemente cumpridos. De facto, atentando nas suas alegações de recurso e respetivas conclusões, bem como nas respetivas alegações, verifica-se que a Recorrente convoca a alteração de factos que pretende ver julgados provados e de um facto que considera não provado, tendo em vista que esses factos sejam levados em conta na ponderação do Direito a aplicar quanto às questões essenciais que invocou. Vejamos, então: O tribunal a quo julgou provado facto 5, no qual se refere que: «5) Em 6/12/2017, foi elaborado o relatório de inspeção tributária que consta a fls. 100 a 172 do p. a., de cuja fundamentação se extrata, com relevo para os presentes autos: “(…)» Portanto, este facto respeita à elaboração de um relatório de inspeção com um determinado teor, sendo certo que esse teor não é posto em causa. Na verdade, aquilo que a que a Recorrente pretende atacar é a validade das conclusões extraídas pela AT e manifestadas naquele relatório. No entanto, tal trata-se de matéria a apreciar em sede de aferição do erro de julgamento quanto à existência de indícios da falsidade ali invocada. Sento assim, conclui-se que a pretensão da Recorrente não pode proceder nesta parte porque o Tribunal não pode alterar o teor do relatório a que alude o facto 5 do probatório. Quanto ao alegado erro de julgamento na matéria de facto julgada não provada, verifica-se que o Tribunal a quo deu como não provados os seguintes factos: «A. A Impugnante manteve relações comerciais com a sociedade comercial “P..........., Lda.”; B. A Impugnante recebeu, por conta e risco da sociedade comercial “P..........., Lda.”, a mercadoria que foi entregue nas instalações fabris de que faz uso, tendo tal operação sido titulada pela fatura nº ............ de 4/12/2014 que veio a pagar; C. Após transformação das peles fornecidas pela sociedade comercial “P..........., Lda.”, a Impugnante transformou-as e alienou-as.». A Recorrente considera que a prova produzida, designadamente a prova testemunhal, permite concluir que esses factos se encontram devidamente comprovados. Quanto ao facto A: A Recorrente defende, tal como nos restantes factos não provados, a efetividade de relações comerciais reais com a sociedade emitente das faturas reputadas falsas. Ora, esse efetividade das relações comerciais é um facto essencial principal, que constitui a própria causa de pedir, pelo que não pode deixar de ser invocado (artigo 5º, nº 1, do CPC), mas, para ser provado, carece da invocação e prova de outros factos instrumentais ou complementares que sustentem esse facto principal. Por isso, a prova do facto A depende da prova dos factos B e C, ou outros com significado idêntico. Quanto ao facto B: Está em causa a compra, efetiva e direta à sociedade P..........., dos bens referidos na fatura nº ............ de 4/12/2014, operação que a AT reputa como falsa. Ora, em situações como esta, em que, como melhor veremos infra, é posta em causa a presunção de veracidade das faturas emitidas pelos alegados fornecedores, a prova, consubstanciada na mera existência dessas mesmas faturas, é necessariamente insuficiente. Por isso, é imprescindível que o contribuinte demonstre, por recurso a outros meios de prova, designadamente testemunhal, que o fornecimento titulado pela fatura ocorreu de facto nos termos em que ali vem descrito, ou seja, que a sociedade que surge como fornecedora vendeu os artigos ou prestou os serviços descritos na fatura. Ora, atenta a prova produzida, resulta que, desde logo, a mesma não foi suficientemente esclarecedora, não ocorrendo violação do princípio da livre apreciação da prova. O Tribunal a quo apreciou criticamente a prova, como explicou em sede de motivação, e, tal como este TCAS, não considerou a prova testemunhal suficientemente convincente. Explanemos, então. Sobre esta questão foram inquiridas a testemunhas CC, contabilista responsável pela escrita desde o ano 2013 (aproximadamente), e DD, trabalhador de uma empresa que labora nas mesmas instalações da impugnante. A primeira testemunha, embora contabilista da empresa, não é o contabilista “residente” e apenas se desloca às instalações ocasionalmente, embora refira que isso sucede “com frequência”, sendo impossível saber-se exatamente o que isso significa. O que se sabe é que toda a documentação da contabilidade se encontra nas instalações da impugnante e a testemunha só lá vai ocasionalmente, pelo que, quando tal sucede toda a sua atenção terá como objeto exclusivo a própria documentação sob sua responsabilidade. Tal situação enfraquece muito a credibilidade do depoimento da testemunha, na medida em que faz duvidar seriamente da sua razão de ciência quanto aos factos materiais subjacentes aos documentos a que pode aceder na qualidade de “contabilista não residente”. Nesse sentido, inquirido se sabe, direta ou indiretamente, se houve ou não lugar a transações comerciais entre a V........... e a sociedade ..., ele afirmou elucidativamente que “o que eu sei é que a ... emitiu esse documento, foi contabilizado, e que foi também pago. Contabilisticamente, havia muitas relações com a ...”. Isso significa que reconhece que só sabe aquilo que resulta formalmente dos documentos da contabilidade. Inquirido acerca do procedimento habitual disse saber que normalmente as mercadorias vêm em camião, nada dizendo especificamente quanto ao caso das mercadorias faturadas pela P............ Do mesmo modo, inquirido se sabe se as mercadorias referidas nas faturas em causa foram transformadas e vendidas pela impugnante respondeu que é esse o objeto da atividade da empresa impugnante, ou seja, que apenas sabe que ela se dedica à transformação de bens daquela natureza, mas não sabe se transformou efetivamente mercadorias adquiridas à sociedade P............ Essa testemunha acrescentou que “em termos documentais” tudo passou por ele e, portanto, só conhece a forma documental dessas operações. Perante a insistência em saber se para ele, “como contabilista, em função do que estava na contabilidade da empresa” os documentos representam uma operação real ele respondeu que acredita que “sim”. Porém, dessa resposta não se pode legitimamente concluir que a testemunha afirmou saber que os documentos contabilísticos a que se refere correspondem, efetivamente, a uma operação real. A única coisa que se pode concluir é que a testemunha afirma acreditar que não foi enganado pelo aspeto formal dos documentos que lhe foram apresentados para registar na contabilidade. Quanto ao depoimento da testemunha DD é absolutamente inócuo, por absoluta falta de razão de ciência do seu autor. A afirmação de que “no ano de 2014 havia peles da P........... na fábrica” é meramente conclusiva. Para ser credível seria necessário circunstanciar o modo e o tempo dessa ocorrência. Designadamente, uma vez que nas mesmas instalações da impugnante funcionavam diversas empresas, as peles a que se refere a testemunha estavam em qual dessas empresas? Como sabe esse trabalhador que as peles que se encontravam na empresa eram da sociedade P...........? Por haver alguma etiqueta com tal indicação? Como sabe que a etiqueta corresponde à verdade do facto que pretende indicar? O facto de trabalhar nas mesmas instalações da impugnante, mas ao serviço de outra empresa, necessariamente segregada nas funções, meios e, ao menos parcialmente, no espaço físico ocupado, não é suficiente para a atribuição de razão de ciência adequada para uma tal afirmação. Assim, sendo certo que as testemunhas fazem referência à sociedade P..........., trata-se de referências vagas, sem qualquer grau de densificação, no tocante a cada um dos fornecimentos, e em grande medida conclusivas, desprovidas de razão de ciência adequada e, em rigor, com o significado oposto ao defendido pela Recorrente. Ora aquilo que resulta desta prova é que não há demonstração de que os concretos fornecimentos tenham ocorrido nos termos titulados pelas faturas, dado o seu carater extremamente vago e conclusivo. Ademais, da prova documental produzida não resulta conclusão inversa. A alegada existência de cheques e a confirmação pelo contabilista de que isso passou na contabilidade não é suficiente para comprovar o efetivo fluxo financeiro no sentido da impugnante para o alegado fornecedor P............ Isto é, não se prova o pagamento efetivo, tanto mais que a AT solicitou os documentos comprovativos disso e a impugnante não os exibiu. Não tendo provado a emissão dos referidos cheques também ficou por provar que não houve “retorno” do pagamento para a esfera jurídica da empresa, dos seus sócios ou gerentes ou para entidades relacionadas com essas pessoas. A mesma conclusão se extrai quanto ao facto C não provado. Com efeito, a primeira testemunha afirmou saber “apenas” que o objeto social da impugnante é a transformação de peles adquiridas para esse efeito, mas evitando responder diretamente à pergunta relativa à efetiva transformação das peles alegadamente adquiridas à sociedade P..........., denunciando que não tinha resposta objetivamente fundada ou que não se quis comprometer dando uma resposta contrária à verdade ou contrária ao interesse do seu “patrão”. Como se disse, o depoimento da testemunha DD foi inócua. Portanto, a prova testemunhal insuficiente, desacompanhada de meios de prova documentais que atestem o que vem alegado, não permite diferente decisão. Cumpre, a este respeito, sublinhar ainda que o facto de ter sido participado um furto (e ainda que se conceda a existência de tal situação) não configura uma situação de justo impedimento, em termos de obtenção de prova, dado que poderia ter a Recorrente diligenciado no sentido de obter a documentação, junto de terceiros – designadamente instituições bancárias – , essencial para a prova exigida nos autos. O que não fez, não porque isso fosse impossível, mas, certamente, porque essa prova não existe. Como tal, também aqui se indefere o requerido. * B. Do erro de julgamento, uma vez que a administração tributária (AT) não reuniu indícios suscetíveis de abalar a presunção de veracidade de que gozam as declarações da Recorrente [conclusões j) a n) das alegações] A recorrente formulou as seguintes conclusões: « j) Por outro lado, em face os factos dados como provados, coincidentes, quase totalmente, com os do RIT executado em 2017, constata-se estarem os mesmos em contradição com o teor dos depoimentos prestados que se revelam mais fidedignos por se reportarem ao testemunho direto de ocorrências do ano de 2014. k) Daí terem sido identificados factos e terem sido recolhidos diversos elementos demonstrativos de que não se verificou simulação da transação comercial, relacionadas com fatura emitida pela sociedade ..., verificando- se erro de julgamento na manutenção das liquidações; l) Com efeito, os alegados indícios de faturação falsa recolhidos pela Administração Tributária não podem, ao contrário do que se entendeu na sentença recorrida, abalar a presunção de verdade de que gozam as declarações da Recorrente nos termos do artigo 75° da LGT; m) Só a demonstração cabal de tal factualidade é suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte (atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito - art.75° da LGT). n) Assim, haveria que concluir, ao contrário do que aconteceu na sentença recorrida, que as correções que deram origem às liquidações impugnadas não poderiam manter-se, uma vez que a Administração Tributária não logrou fazer a prova, que lhe era exigida, das suas presunções de existência de faturação falsa.» Na sentença recorrida consta, além do mais, o seguinte com pertinência para a questão que agora nos ocupa: « Descendo agora ao caso sub iudice, conforme resulta da factualidade vertida no probatório, nomeadamente do relatório de inspeção tributária, a Autoridade Tributária observou o ónus de prova das correções em causa. Relativamente à sociedade comercial “P..........., Lda.” constam do relatório de inspeção tributária os seguintes elementos e indícios recolhidos pela Autoridade Tributária: O gerente de direito acumula ou acumulou várias funções (gerente, sócio – gerente, representante da Cessação, membro de Conselho de Administração…) em diversas sociedades em incumprimento fiscal e comercial, a morada da sede é inexistente, não se conseguiu encontrar qualquer instalação relacionada com a sociedade e qualquer funcionário ligada diretamente a uma suposta estrutura empresarial. O anterior sócio e gerente, G......., à data que alienou as quotas e rescindiu à gerência era trabalhador da sociedade E....... – Industria e Comércio de Curtumes, Unipessoal, Lda, sociedade detentora do imóvel (fábrica sita no Lugar ............) onde é desenvolvida a atividade da V........... - Comércio de Couros, Unipessoal Lda, sociedade com relações especiais com a V........... (gerente / administradora é a Srª S............ e também maior fornecedor da V...........). O anterior sócio e gerente, G......., continua a ser trabalhador da E....... –Industria e Comércio de Curtumes, Unipessoal, Lda.; Na Rua ....., o número ..... é inexistente. Ou seja, a morada indicada como sede (Certidão Permanente e na base de dados da Autoridade Tribuária) e a morada indicada nas faturas emitidas pelo sujeito passivo como local de carga - Rua ....., ..... – ............, não existe e na rua ..... em ............ não se vislumbra qualquer edifício/pavilhão onde seja desenvolvida atividade da P...........; A P........... apenas apresentou a declaração referente a rendimentos pagos ou colocados à disposição, nos termos da alínea c) do nº1 do artigo 119º do CIRS, relativamente ao ano de 2011. A P........... – Unipessoal, Lda não é mencionada em qualquer declaração como entidade pagadora de rendimentos, nos períodos de 2013 a 2015; Nas declarações IES submetidas pelo sujeito passivo P..........., referentes aos exercícios de 2013 e 2014, não consta qualquer gasto com o pessoal (não apresentou IES relativa ao exercício de 2015); Verifica-se assim que a dita sociedade comercial não possui quaisquer trabalhadores ao seu serviço, nem prestador de serviço, no período em análise; Em nome da P..........., apenas existe um veiculo ligeiro de mercadorias com a matricula do ano de 1992, não possui quaisquer imóveis registados em seu nome; As declarações periódicas de Imposto sobre o Valor Acrescentado dos anos de 2013, 2014 e 2015, submetidas pela P........... à Autoridade Tributária, têm valores relevantes, tanto no imposto liquidado como no deduzido. Em algumas declarações periódicas de Imposto sobre o Valor Acrescentado, o imposto deduzido (existências e outros bens e serviços) é ligeiramente superior ao Imposto sobre o Valor Acrescentado liquidado, fazendo com que haja reporte de Imposto sobre o Valor Acrescentado para o período seguinte. No período seguinte, o Imposto sobre o Valor Acrescentado liquidado é levemente superior ao Imposto sobre o Valor Acrescentado deduzido, mas inferior ao somatório do Imposto sobre o Valor Acrescentado deduzido e ao reporte de Imposto sobre o Valor Acrescentado do período anterior, fazendo com que nunca seja apurado Imposto sobre o Valor Acrescentado a entregar ao Estado e, simultaneamente, o crédito de imposto seja sempre de montante reduzido. Por um lado, nas declarações periódicas de Imposto sobre o Valor Acrescentado existem valores muito relevantes de Imposto sobre o Valor Acrescentado deduzido com aquisições de existências e outros bens e serviços, por outro lado, nos anos em causa, as faturas comunicadas por terceiros no E-Fatura em que conste a P........... como adquirente, são de valor insignificante e não estão relacionadas com a atividade de peles, conforme quadro infra:
Só em 2014 (4º Trimestre de 2014), a P........... consta como adquirente a um país da comunidade (Espanha), contudo nas declarações de Imposto sobre o Valor Acrescentado apresentadas pela P........... não é efetuada referência a qualquer aquisição intracomunitária. O sujeito passivo que declarou no ... ter efetuado transmissões intracomunitárias de bens à P........... é a sociedade, B..... COMERCIO E INDUSTRIA S.L.U, relativamente à qual existem indícios de ser um operador fictício; A ..., em 22 de Dezembro de 2016, respondeu por email o seguinte “Em resposta ao solicitado no v/ ofício nº ............, de 12-12-2016, informa-se que, consultado o sistema nacional de processamento electrónico de Declarações Aduaneiras de Importação, entre 2013 e 2015, não se verifica a existência de qualquer registo de declarações processadas pela sociedade P........... – UNIPESSOAL LDA, NIPC ............”; Em síntese, foram emitidas faturas pelo sujeito passivo “P........... – Unipessoal, Lda.”, cuja estrutura empresarial se afigura como inexistente, dado que: Não foi possível localizar a sua sede ou qualquer outro local relacionado com a sociedade; Não possuía qualquer funcionário ou prestador de serviços; As faturas comunicadas no E-Fatura em que a P........... – Unipessoal, Lda figura como adquirente, a informação recolhida no ... e nos Serviços aduaneiros não são compatíveis com as deduções declaradas nas respetivas declarações periódicas de Imposto sobre o Valor Acrescentado, nem com o valor das vendas/prestações de serviço declaradas pelo sujeito passivo. Por seu turno, do lado da Impugnante a Autoridade Tributária, confrontada com a inexistência de contabilidade organizada, notificou-a a fim de regularizar a contabilidade. Contudo, até à data da elaboração do relatório de inspeção tributária, a Impugnante não apresentou a contabilidade, não existindo dúvidas que a fatura emitida pela sociedade comercial “P..........., Lda.” foi efetivamente contabilizada pela Impugnante, que não contesta tal realidade. Conforme resulta do relatório de inspeção tributária, a Impugnante foi notificada, para apresentar alguns documentos relacionados com as “supostas aquisições”, efetuadas à P..........., nomeadamente: “Relativamente ao vosso fornecedor P........... - UNIPESSOAL LDA, NIPC ............, apresentar os seguintes documentos: - Guias de transporte relativas à(s) fatura(s) contabilizada(s) durante o exercício de 2014 e 2015; - Identificação da entidade que efetuava os transportes; -Troca de correspondência entre a V........... – , S.A e o fornecedor P........... - UNIPESSOAL LDA, bem como indicação/identificação das pessoas contatadas; - Meios de pagamento utilizados (Cheque, transferência bancária, etc), juntando fotocópia autenticadas dos respetivos documentos de suporte, nomeadamente cheques (frente e verso), extratos, ordem de transferência, etc. Em síntese, a administradora da Impugnante, em resposta à notificação declarou o seguinte: Não possui nesta data quaisquer elementos para apresentar; Os contactos eram efetuados com um Sr R........, desconhece o nome completo; O escritório era em Lisboa, porém não sabe a morada; Tem conhecimento que o Sr R........ não se encontra em Portugal; Os transportes das peles adquiridas eram efetuados por conta da P..........., era esta que colocava as peles na fábrica; Não sabe onde a P........... adquiria as peles, mas sabe que muitas delas tinham proveniência do Brasil; Devido ao furto das instalações em janeiro não possui a informação relativamente aos pagamentos; Já contatou o Sr R........ no sentido de este a poder ajudar na localização dos documentos solicitados pela Autoridade Tributária. A administradora da V..........., Srª S............, declara que as peles eram colocadas pela P........... na fábrica, contudo a fatura menciona o local de descarga – Felgueiras, mas a fábrica fica no Lugar ............, em ............ – Alcanena. O local de carga constante na fatura menciona Rua ....., nº ....., mas conforme explanado anteriormente o local é inexistente. Não obstante a administradora da Impugnante ter informado, em 20 de junho de 2017, que estava a diligenciar no sentido de obter os documentos, os quais remeteria à Direção de Finanças de Santarém, até à data da elaboração do relatório de inspeção tributária não foram rececionados quaisquer elementos. Conclui-se do exposto, que a Autoridade Tributária fez prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, isto é, de que existem indícios credíveis e sérios de que as operações constantes da fatura emitida pela sociedade comercial “P..........., Lda.” à Impugnante não correspondem à realidade.» Nos termos do art.º 75.º da LGT: “1 - Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal. 2 - A presunção referida no número anterior não se verifica quando: a. As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo…”. Além disso, o artigo 74º, nº 1, da LGT dispõe que “1. O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”. Portanto, num primeiro momento, a contabilidade e as declarações dos contribuintes gozam de uma presunção legal de verdade, mas esta fica concionada ao respeito pelas leis contabilísticas e fiscais. Por isso, cabe à AT o ónus de provar os factos constitutivos do direito de tributar (artigo 74º, nº 1, da LGT) e, para isso, cumpre-lhe comprovar alguma das irregularidades previstas no artigo 75º, nº 2, do mesmo diploma. É pacífico o entendimento de que, em situações como a dos autos, para efeitos designadamente do art.º 74.º, n.º 1, da LGT, a AT não tem de provar, em sede de ação inspetiva, a efetiva simulação nos termos constantes do art.º 240.º do Código Civil. É, assim, bastante a demonstração da existência de indícios sérios e objetivos que impliquem uma probabilidade elevada de que as operações descritas nas faturas não correspondem a operações reais. Vejam-se, exemplificativamente, os Acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 01.02.2016 (Processo: 0591/15), de 16.03.2016 (Processos 0400/15, 0587/15), de 19.10.2016 (Processo: 0511/15), de 16.11.2016 (Processo: 0600/15) e de 27.02.2019 (Processo: 01424/05.2BEVIS 0292/18). Reunidos tais indícios e demonstrada a ilegalidade da atuação do contribuinte, inicia-se uma segunda fase, em que cessa a presunção de veracidade prevista no art.º 75.º, nº 1, da LGT, passando a caber-lhe o ónus de alegar e provar a efetividade das operações; isto é, os factos que fundam o direito que invoca, que é o direito à dedução do IVA mencionado nas faturas reputadas falsas. Esta conclusão vale tanto para efeitos de IRC como de IVA (cfr., a este respeito, os art.ºs 23.º do Código do IRC e 19.º do Código do IVA). Sendo assim, cumpre verificar se a AT cumpriu adequadamente o seu ónus probatório, ou seja, aferir se foi pela mesma alegada e demonstrada (fundamentadamente) a existência de indícios que, de forma séria, abalam a presunção de veracidade dos documentos em causa. Relembre-se, a situação controvertida reporta-se a fatura emitida pela sociedade P........... com data de dezembro de 2014. Compulsado o Relatório de inspeção, verifica-se que a AT fundou a sua atuação no seguinte: a) A Recorrente foi notificada, em maio e depois de outras notificações prévias, para junção de documentos, no sentido de juntar os elementos concretos relativos às mencionadas entidades emitentes das faturas (guias de transporte, identificação da transportadora, troca de correspondência e meios de pagamento), nada tendo sido apresentado, referindo não ter contactos com nenhuma das pessoas que representariam tais sociedades, que desconhecia quem procedia aos transportes, que não possuía documentos de pagamento, em função do furto que tinha havido em janeiro desse mesmo ano; b) Até ao momento da elaboração do Relatório de inspeção (novembro de 2017), nada tinha sido junto; c) A fatura em causa foi contabilizada e o respetivo IVA foi deduzido; e) Especificamente quanto à P..........., a AT verificou que: - O seu gerente é gerente de várias sociedades em situação de incumprimento fiscal e comercial; - A morada da sede é inexistente; - Não foi localizada qualquer instalação relacionada com a sociedade - Não foi identificado qualquer funcionário nem gastos com pessoal, designadamente em 2014; - Apenas tem um veículo ligeiro de mercadorias no seu ativo; - Foi declarante de IVA, designadamente em 2014, com valores liquidados e deduzidos altos, não se conseguindo referências no e-fatura que expliquem tais valores; - Em 2014 não constava como adquirente nacional ou intracomunitária de bens ou serviços; - Em 2014, não havia qualquer registo de declarações aduaneiras de importação; - O gerente, J........, informou ter passado procuração a terceiros para efetuarem atos de gestão e referiu não saber onde estava a contabilidade; - O local da carga referido na fatura emitida inexiste; - O local da descarga referido na fatura não corresponde ao local de descarga referido pela gerente da Recorrente; - Não existe qualquer despachante espanhol a declarar transações com a P...........; - No mês de dezembro a V........... deduziu IVA de montante superior ao mencionado nas faturas comunicadas à AT pelos respetivos fornecedores; - Notificada para exibir a sua contabilidade, e documentos de suporte, a V........... não cumpriu esse dever, limitando-se a apresentar umas caixa com documentos bastante danificados, que não incluem compras, e a declarar que as instalações foram vandalizadas e os servidores dos computadores foram furtados; - Notificada para apresentar documentos (guias de transporte, identificação da entidade transportadora, correspondência trocada com a sociedade P...........), relativos à operação mencionada na fatura em causa nos autos, a V........... não apresentou qualquer desses elementos; - a V........... declarou que mantém contacto com o Sr. R........, cujo nome completo, morada e paradeiro desconhece ou não quis fornecer à AT; Ora, atento do exposto, considera-se, na linha do que foi decidido pelo Tribunal a quo, que foram reunidos indícios suficientes para pôr em causa a presunção de veracidade de que gozavam as faturas referidas. Com efeito, os requisitos reunidos permitem, com segurança, concluir que há fortes indícios de que a sociedade P........... não tinha atividade efetiva em 2014, sendo que, concretamente quanto à relação com a Recorrente, a efetividade da mesma não resultava minimamente provada, dado que nem sequer foi exibida a contabilidade, nem os documentos de compras da mercadoria àquele fornecedor nem documentos comprovativos do respetivo pagamento A este propósito, cumpre sublinhar que não altera a nossa conclusão o facto de, em janeiro de 2017, em momento paralelo ao do início dos trabalhos de inspeção, ter sido aberto o processo de inquérito referido em Q), na sequência de ocorrência de furto que foi participada [cfr. auto a que respeita o facto P)] e ter sido com base no mencionado furto que foi justificada a não apresentação à AT dos elementos solicitados. Ora, ainda que se admita a efetiva ocorrência de uma situação como a participada às autoridades, tal não invalida a obrigação de o contribuinte diligenciar no sentido de reconstituir a sua contabilidade e de juntar os elementos que lhe são solicitados pela AT Veja-se que, entre o início e o fim da inspeção, decorreu quase um ano, sem que a Impugnante tenha obtido qualquer documento que pudesse exibir com vista a afastar as conclusões da AT. Aliás, sublinha-se que não foram juntos quaisquer comprovativos do pagamento ao fornecedor em causa, quando se afigura que, em abstrato, seria muito fácil obter essa informação junto das instituições bancárias. Em suma, este Tribunal julga improcedente o fundamento agora sob análise. * C. Do erro de julgamento, dado que ocorreram transações comerciais entre a Recorrente e a sociedade P........... – Unipessoal Lda. (doravante, P...........) [conclusões o) a u) das alegações] As conclusões formuladas pela Recorrente, relativamente a esta questão, são as seguintes: «o) Por outro lado, e atento os mesmos depoimentos e documentos juntos aos autos, deveria dar-se como provados factos o que não aconteceu na sentença, a saber: A. A Impugnante manteve relações comerciais com a sociedade comercial “P..........., Lda.”; B. A Impugnante recebeu, por conta e risco da sociedade comercial “P..........., Lda.”, a mercadoria que foi entregue nas instalações fabris de que faz uso, tendo tal operação sido titulada pela fatura n° ............ de 4/12/2014 que veio a pagar; C. Após transformação das peles fornecidas pela sociedade comercial “P..........., Lda.”, a Impugnante transformou-as e alienou-as. p) Com efeito, considerando que não existiu simulação nas relações comerciais entre a Recorrente e aquelas duas sociedades, a decisão recorrida deveria ser a do acolhimento da tese da anulação das liquidações adicionais q) Por outro lado, foi junto aos autos, Relatório da Inspeção Tributária da sociedade ..., que considerou para efeitos de tributação, a fatura emitida por esta última sociedade à ora Recorrente, em causa nos presentes autos; r) Ora, por um lado a AT considerou, na contabilidade da P..........., para efeitos de tributação, a fatura que a sociedade em causa, emitiu e por outro lado, desconsiderou a mesma na contabilidade da Recorrente; s) Ora, se a fatura foi dada como titulando uma operação real na contabilidade da P..........., não poderia considerá-la como simulada na contabilidade da Recorrente; t) O facto referido na conclusão precedente, não foi considerado na douta sentença recorrida como devia ter acontecido, servindo para infirmar a tese de simulação; u) Sem prejuízo da reapreciação da prova gravada que leva à impugnação referida nos artigos anteriores, importará referir e reiterar que, dos factos dados como provados, resulta entendimento conclusivo, plasmado na sentença, que, no decurso do procedimento inspetivo, foram identificados factos e recolhidos diversos elementos demonstrativos da simulação de transações comerciais, relacionadas com uma fatura emitida pela sociedade P............». Portanto, a Recorrente entende que ficou demonstrada a efetividade das operações realizadas com a sociedade P........... e que a sentença errou ao não entender isso. Ora, o erro de julgamento agora invocado está diretamente conexionado com o erro de julgamento imputado à decisão proferida sobre a matéria de facto, já apreciado supra e julgado improcedente. Salienta-se que, em situações como a dos autos, não está em causa a efetiva emissão das faturas, que ocorreu, nem a sua efetiva contabilização, que também foi feita. Nos casos de “faturação falsa” apenas se discute a materialidade da operação comercial tal como ela se encontra descrita na fatura sob suspeita de falsidade, designadamente quanto aos sujeitos, às mercadorias, data e valor. Como já referimos supra, a partir do momento em que é afastada a presunção de verdade das faturas, o que aconteceu, nos termos já explanados, a prova da efetividade das operações, ónus do contribuinte, exige a produção de provas de factos relativos à operação, para além da mera forma da fatura e da sua contabilização. Nestes casos, a prova a produzir reporta-se aos factos comprovativos dos fluxos reais da mercadoria, no sentido do fornecedor/emitente da fatura para o comprador/utilizador da fatura, e, de meios financeiros para o respetivo pagamento, em sentido contrário, do cliente para o fornecedor. Para isso, impõe-se a comprovação da idoneidade desse fornecedor para vender as mercadorias que faturou, o efetivo transporte das mercadorias com início em concretas instalações sob controlo do fornecedor para as instalações sob controlo do cliente e o efetivo pagamento ao emitente da fatura, por meio de cheque, transferência bancária ou outro meio válido. Como é evidente, estando sob suspeita a veracidade da operação descrita na fatura reputada falsa, a prova da existência de uma fatura com todos os requisitos legais de forma e da sua contabilização tecnicamente exemplar não bastam para comprovar a realidade da operação comercial subjacente. Como já ficou dito, no caso concreto foram reunidos indícios variados, pertinentes e convergentes no sentido de que as operações descritas nas faturas não correspondem à realidade. Esses indícios não foram afastados através da prova da efetividade das operações, que é a prova exigível em casos como o dos autos. E, nos termos que já referimos supra, a ocorrência da participação do furto não desonera a Recorrente do ónus da prova que sobre si impende – designadamente, por via do contacto com as instituições bancárias através das quais teria realizado os pagamentos, o que não ocorreu, como já se referiu. Sublinhe-se, por outro lado, que a questão subjacente aos presentes autos tem a ver com a demonstração de concretos fornecimentos nos termos titulados pelas faturas reputadas falsas, o que não tem relação direta com as vendas efetuadas pela utilizadora dessas faturas. Não se põe em causa as existências da Recorrente nem as vendas, põe-se em causa, sim, que parte das existências tenham sido adquiridas à concreta sociedade emitente das faturas já referidas e nos termos titulados nessas mesmas faturas. Assim, desconhecendo-se a identidade do verdadeiro fornecedor, tanto mais que o utilizador admite que as peles terão sido produzidas no Brasil, bem como as quantidades e valores, é impossível saber se a Recorrente suportou efetivamente o IVA que consta da fatura falsa. Razão pela qual o artigo 19º do CIVA obsta ao direito à dedução desse imposto. Logo, também aqui não assiste razão à Recorrente. * D. Do erro de julgamento, dado tratar-se de situação de fundada dúvida sobre a ocorrência do facto tributário [conclusões v) a ee) das alegações] A este respeito, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: «v) Por último entende a Recorrente, por tudo o que foi supra, referido, nomeadamente quanto à impugnação da matéria de facto dada como provada à luz da reapreciação da prova gravada, que para além de não ter fundamento legal, a liquidações de IVA com base nas correções meramente aritméticas, acaba por gerar fundada dúvida, tese que devia ser acolhida na sentença recorrida w) Com efeito, dispõe o artigo 100°, n° 1, do CPPT que "Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado." x) A norma presente destrói claramente essa presunção legal a favor da AT e estabelece uma verdadeira repartição do ónus da prova - que se coloca apenas em relação a questões de facto - de acordo com os princípios da legalidade e da igualdade, e em termos de que a incerteza sobre a realidade dos factos tributários reverte, em regra, contra a AT. y) Não devendo a AT efetuar a liquidação se não existirem indícios consistentes da existência daqueles, isto é, se o conhecimento desses factos for baseado em meras aparências desacompanhadas da expressão factual de verdadeiros elementos probatórios z) In casu, a prova produzida pela Recorrente, nomeadamente considerando depoimentos das testemunhas (vide reapreciação da prova gravada), ao contrário do que se entendeu na sentença recorrida, é suscetível de infirmar os factos em que assentou o juízo da AT ou, pelo menos, de sobre ele criar uma fundada dúvida sobre a sua existência. aa) No artigo 100° do CPPT acolhe-se claramente o princípio da verdade material, vinculante para a própria AT que só deverá praticar o acto tributário quando «formar convicção da existência e conteúdo do facto tributável»; bb) Em suma, é a indubitável consagração do princípio de que a dúvida reverte a favor do contribuinte, em substituição do princípio «in dubio pro fisco» que vigorou anteriormente à Reforma Fiscal. cc) Tudo isto para se concluir que, quer no procedimento administrativo, quer no presente processo judicial, o que há a relevar é o princípio da verdade material do facto tributário que gera o direito à arrecadação do imposto, provado diretamente pela declaração e (ou) a contabilidade do contribuinte ou pela administração fiscal, nos casos tipificados na lei, através dos meios gerais e especiais de prova legalmente admissíveis. dd) Assim, a dúvida fundada sobre a existência e quantificação do facto tributário, estabelecida no processo judicial (ou administrativo), equivalerá à conclusão pela sua inexistência e consequente anulação (ou abstenção da prática) do acto tributário que o tenha por base. ee) Perante o exposto, devia o Julgador recorrer à regra do artigo 100° do CPPT pois, ainda que se considere que, com base em matéria de prova produzida pela Recorrente, existe fundada dúvida sobre a existência dos pressupostos do acto tributário impugnado relativamente à verba em causa, terá a mesma de beneficiar o contribuinte, anulando-se a liquidação de IRC impugnada.». Está em causa o erro de julgamento, por alegadamente se estar perante uma situação de fundada dúvida, prevista no artigo 100º do CPPT, segundo o qual "Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado." Ora, por um lado, a aplicação do disposto no art.º 100.º do CPPT não se compadece com situações de inércia probatória por parte do contribuinte, quando o ónus da prova seja seu [cfr., v.g., os Acórdãos deste TCAS de 13.09.2023 (Processo: 1630/11.0BELRS), de 22.06.2023 (Processo: 1380/10.5BELRS) e de 05.11.2020 (Processo: 98/11.6BEALM)]. E, como já se disse, a AT cumpriu, para além de qualquer dúvida, o ónus da prova a seu cargo, pelo que cabia ao sujeito passivo o ónus de provar (artigos 74º, nº 1, da LGT) os factos em que assenta o direito à dedução que invoca. Por outro lado, a prova a cargo do sujeito passivo também tem de estar para além de qualquer dúvida razoável, não sendo de aplicar-lhe o regime da dúvida fundada previsto no artigo 100º do CPPT. Com efeito, este regime surge desenhado sobretudo para situações em que o ónus probatório está a cargo da AT, quando a parte lograr abalar a prova ou os elementos em que se fundou a administração para prática do ato tributário. Como referido por Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. II, 6.ª Ed., Áreas Editoria, Lisboa, 2011, pp. 132 e 133. “… [T]ambém será de impor ao contribuinte, no processo judicial, o ónus da prova de factos quando ele lhe é imposto no procedimento tributário (…). Sendo de aplicar esta regra também no processo judicial (…) será de concluir que, nos casos em que se verificar uma destas situações em que no procedimento tributário é atribuído o ónus da prova ao contribuinte, as dúvidas que no processo judicial subsistam sobre a matéria de facto, não podem considerar-se dúvidas fundadas para efeitos de, nos termos daquele n.º 1, justificarem a anulação do ato impugnado. Na verdade, o n.º 1 do art.º 100.° do CPPT consubstancia uma norma de carácter geral de que resulta recair sobre a administração tributária o ónus da prova dos factos que relevem para quantificação da matéria tributável. Por isso, nas situações em que a lei, em normas especiais, impõe esse ónus ao contribuinte, fica afastada a aplicação daquela regra de carácter geral”. Ora, como vimos, no caso dos autos, a Recorrente não logrou, ao contrário do que era seu ónus, demonstrar a efetividade das operações tituladas pelas faturas em causa. E esta inércia probatória não se confunde com a fundada dúvida. Como tal, não assiste razão à Recorrente. * E. Do erro de julgamento, uma vez que o relatório de inspeção tributária (RIT) não está cabalmente fundamentado [conclusão ff) das alegações] A recorrente afirma o seguinte: « ff) Por tudo o que foi expendido, não se aceita a sentença recorrida que acolhe a tese da AT quanto às correções técnicas efetuadas à matéria coletável de que resultou liquidações em sede de IVA mais juros compensatórios do exercício de 2014, padecem de invalidade, por vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, insuficiência/incongruência de fundamentação, além da fundada dúvida o que torna ilegais as liquidações impugnadas, devendo ser anuladas;» Portanto, a Recorrente entende que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento porque as correções técnicas efetuadas pela AT, em sede de IVA, padecem de insuficiência/incongruência de fundamentação. Ora, o dever de fundamentação dos atos administrativos pode ser entendido em sentido formal, cuja violação gera um vicio de forma imputado ao ato, ou em sentido material, cuja violação gera um vicio de substância ou mérito, por erro sobre os pressupostos de facto e ou de Direito. O dever de fundamentação dos atos administrativos em geral insere-se no princípio constitucionalmente consagrado, no art.º 268.º, n.º 3, da CRP, nos termos do qual “os atos administrativos (…) carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos”. Do CPA resulta que a fundamentação formal deve consistir num discurso escrito, contemporâneo ao ato, que indique expressa e sucintamente os motivos que levaram o decisor a decidir como decidiu, de maneira a habilitar o destinatário natural do ato a reconstituir o percurso cognitivo do decisor e a avaliar a racionalidade e correção da decisão, convencendo-o de que foi feita justiça e de que se deve conformar, ou, em caso contrário, permitindo-lhe organizar informadamente a sua defesa contra tal decisão e, em consequência. Para isso, a fundamentação – expressa e acessível – para além de ter as características acima referidas, deve ser clara, suficiente e congruente. Especificamente quanto aos atos tributários, o dever de fundamentação formal encontra-se especificamente previsto no art.º 77.º da LGT, cujos n.ºs 1 e 2 determinam que: “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária. 2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”. É pacifico que a fundamentação formal visa tanto um controlo interno, estimulando o decidente à autocritica ao conteúdo formal e material das afirmações por si emitidas e sua vinculação aos princípios constitucionais da atuação administrativa, impostos pelo artigo 266º da CRP, como um controlo externo, pelo destinatário natural ou pelas autoridades que, posteriormente, devam emitir algum juízo acerca da conformidade legal do ato. Aplicando o que acima se disse ao caso concreto, verifica-se que, conforme decorre da mera leitura do Relatório de inspeção, a AT produziu um texto escrito que indica clara, suficiente e congruentemente os motivos que a levaram a qualificar as faturas emitidas pela sociedade P........... como sendo falsas e, portanto, a levaram a negar o direito à dedução do IVA e a proceder á liquidação impugnada. Em suma, este Tribunal não reconhece o invocado vicio de forma, tanto mais que não se percebe qual é o concreto segmento da decisão a que se imputa a alegada insuficiência/incongruência de fundamentação. Acresce que a causa da imputação do referido vicio de forma é: “por tudo o que foi expendido”. Ou seja: subjacente ao invocado vicio está o entendimento de que a qualificação feita pela AT está errada, dado que, ao contrário do decidido, a Recorrente entende que a fatura descreve uma operação comercial real. Portanto, aquilo que verdadeiramente queria dizer, ao invocar falta de fundamentação da qualificação da fatura como falsa, era que tal qualificação está materialmente errada por falta de “fundamento” substancial. Ora, quanto a esse suposto erros sobre os pressupostos de facto e ou de direito, já acima se disse, a propósito dos indícios de falsidade, que a AT cumpriu o ónus da prova de factos suscetíveis de afastar a presunção de veracidade prevista no art.º 75.º da LGT, conforme está cabalmente explanado, de facto e de direito no Relatório de inspeção, o percurso cognitivo da AT, com indicação precisa dos elementos factuais tidos em conta, estando igualmente identificadas as normas legais em que sustentou a atuação administrativa; e, ao contrário, o sujeito passivo não provou quaisquer factos que pudessem justificar o direito que invoca de deduzir o IVA liquidado na fatura em causa nos autos. Logo, não assiste razão à Recorrente nesta parte. * 4 - DECISÃO Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida. Custas pela Recorrente, por ter decaído Valor do recurso: € 18.100,76 Registe e Notifique. Comunique ao DIAP – 2ª secção Santarém o inquérito n.º 3.....DSTR – o presente acórdão, com a informação sobre trânsito em julgado. Lisboa, em 7 de novembro de 2024 – Rui. A. S. Ferreira (Relator), Tiago Brandão de Pinho, Sara Diegas Loureiro (Adjuntos) |