Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:286/23.2BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:04/03/2025
Relator:ISABEL VAZ FERNANDES
Descritores:NULIDADE DO ACÓRDÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
Sumário:
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul

J... , melhor identificado nos autos, interpôs recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal Administrativo – Secção de Contencioso Tributário, do Acórdão proferido por este Tribunal Central Administrativo Sul, em 29 de maio de 2024, que concedeu provimento ao recurso interposto pela Representante da Fazenda Pública, revogando a Sentença Recorrida proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que tinha julgado verificada a prescrição da dívida exequenda e julgou a reclamação judicial dos mandados de penhora do direito ao quinhão hereditário, relativo a três imóveis, na sequência de reversão de dívidas da Sociedade C... , S.A., improcedente.

O aqui Recorrido, nas alegações do Recurso de Revista Excepcional que dirigiu ao STA, invocou a nulidade do Acórdão proferido pelo TCAS por omissão de pronúncia, nos seguintes termos:
«XX. Por mera cautela de patrocínio, o ora Recorrente entende que o Douto Acórdão do TCAS de que se recorre, não se pronunciou sobre os vícios dos mandatos de Penhora do direito ao quinhão hereditário invocados pelo ora Recorrente, na reclamação apresentada referente ao atos do órgão de execução fiscal.

YY. Relembramos que na Reclamação dos atos do órgão de execução fiscal, que correspondem a mandatos de penhora do direito ao quinhão hereditário, o ora Recorrente alegou e peticionou que fosse reconhecida a ilegalidade da penhora dos mesmos, por incidir sobre três imóveis, que integram uma universalidade maior; que fosse ainda reconhecida a preterição de formalidade essenciais, no âmbito das referidas penhoras; e por fim que fosse verificada o decurso do prazo de prescrição, uma vez que a data de citação é do ano de 2009 e as dívidas se reportarem a impostos dos anos 2000 e 2001, com a consequente extinção do processo.

ZZ. Assim, a Sentença da Primeira Instância, tendo concluído, por verificada, pela prescrição das dívidas em causa relativamente ao Reclamante, e a procedência da Reclamação com este fundamento, entendeu que ficou prejudicado o conhecimento das demais questões dos autos, nos termos do art.608º, nº 2 do CPC (crf. segundo parágrafo da Pág.38 do documento da Sentença do TAF Loulé, que corresponde a fls.755 dos autos do Sitaf).

AAA. Neste âmbito, somos do entendimento que tendo o douto acórdão do TCAS de que se recorre, tendo alterado o sentido da sentença da primeira instância, considerando as dívidas exequendas como não prescritas, concedendo provimento ao recurso, e revogado a sentença recorrida, deveria ter conhecido dos vícios dos mandatos de Penhora do direito ao quinhão hereditário invocados pelo ora Recorrente, na reclamação apresentada referente ao atos do órgão de execução fiscal.

BBB. De facto, o douto acórdão do TCAS, apenas se pronunciou quanto ao facto de considerar que as dívidas exequendas não estarem prescritas, não se tendo pronunciado quanto aos dos vícios dos mandatos de Penhora do direito ao quinhão hereditário invocados pelo ora Recorrente na Reclamação.

CCC. O Douto Acórdão do TCAS de que se recorre, não justificou de nenhuma forma, o facto de não se ter pronunciado quanto aos vícios dos mandatos de Penhora do direito ao quinhão hereditário invocados pelo ora Recorrente na Reclamação.

DDD. Assim, estamos perante a situação caricata de que se encontram num limbo jurídico, os mandatos de penhora que atualmente impendem sobre o direito ao quinhão hereditário de três imóveis.

EEE. O ora Recorrente considera que esta situação não se pode aceitar, e que deveria ter existido uma pronúncia sobre os vícios dos mandatos de penhora.

FFF. A pronúncia sobre os vícios dos mandatos de penhora do direito ao quinhão hereditários sobre os três imóveis, é especialmente importante, porque o Tribunal de Primeira Instância, ficou o valor da causa num valor bastante inferior ao valor que foi contabilizado pela Fazenda Pública, e esta não impugnou este facto, considerando-se o mesmo como facto assente.

GGG. Pelo que o ora Recorrente que é fulcral seja feita a pronúncia sobre os vícios dos mandatos de penhora do direito ao quinhão hereditários sobre os três imóveis supra mencionados e dos quais se mantém a fundamentação apresentada aquando da P.I.

HHH. Assim, deve ser emitida pronuncia sobre os vícios dos mandatos de penhora do direito ao quinhão hereditários sobre os três imóveis, devendo verificar-se a ilegalidade dos mesmos, e em consequência anulados ou nulos os mandatos de penhora efetuados, com todas as consequências legais, devendo designadamente: a) Ser reconhecida a ilegalidade dos mandatos de penhora emitidos pelo Serviço de Finanças de Vila Real de St. António, por manifesta e notória impossibilidade de se penhorar os bens concretos compreendidos do património comum que é o quinhão hereditário, nem mesmo uma parte especificada do bem indiviso, pois os direitos dos contitulares não se referem a qualquer parte especificada da coisa comum mas a toda ela, globalmente considerada, como resulta do disposto nos artigos 1403º, nº 2, e 1408º, nºs 1 e 2, do Código Civil. b) Ser reconhecida a preterição de formalidades essenciais do disposto do art.232 do CPPT do supra.

III. Termos em que, o ora Recorrente que considera que o douto acórdão do TCAS de que se recorre padece do vício de nulidade por omissão de pronúncia que se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artigo 608º, nº 2 do CPC, que impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

JJJ. Assim, ocorre nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões a que esteja obrigado a pronunciar-se.

KKK. Assim, ocorre nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões a que esteja obrigado a pronunciar-se.

LLL. Por outro lado, decorre da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPPC e bem assim do artigo 125.º do CPPT que a sentença é nula “sempre que o tribunal não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer e que se não mostre prejudicada pelo conhecimento e decisão porventura dado a outras, nomeadamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento” - (Ac. do STA proferido em 21/02/2018 no processo n.º 01193/17).(…)»


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Os autos foram com vista ao DMMP, que emitiu parecer no sentido de não se verificarem as alegadas ilegalidades da penhora.
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Cumpre, pois, conhecer da nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia, invocada pelo Recorrido em sede de alegações apresentadas no âmbito do Recurso de Revista que apresentou perante o STA do Acórdão proferido neste TCAS em 29/05/2024.

Alega que o Acórdão proferido nos autos não emitiu pronúncia quanto às questões invocadas relativas à legalidade da penhora e preterição de formalidades legais, padecendo, por essa razão, de nulidade por omissão de pronúncia.

A nulidade da sentença/acórdão por omissão de pronúncia verifica-se quando o Tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devia conhecer – cfr. artigo 615º do CPC.

Consideremos as seguintes ocorrências processuais:

· O Reclamante invocou, na p.i., para além da prescrição, a ilegalidade da penhora e a preterição de formalidades legais;

· A sentença recorrida considerou verificada a prescrição da dívida exequenda, julgou procedente a reclamação e considerou prejudicado o conhecimento do demais invocado;

· A FP recorreu da sentença para este TCAS;

· O Acórdão prolatado concedeu provimento ao recurso da FP, por entender não estarem prescritas as dívidas, revogou a sentença recorrida e julgou a reclamação improcedente.

Adiante-se que tem razão o Recorrido.

Efectivamente, não foi, em nenhuma das instâncias, conhecida a matéria invocada relativa à legalidade da penhora e à preterição de formalidades legais.

A sentença recorrida não a tinha que apreciar, por ter o respectivo conhecimento ficado prejudicado pela solução dada ao caso, a saber, a verificação da prescrição da dívida.

Já o Acórdão ora em análise, por ter invertido o sentido da decisão – entendeu não ocorrer a prescrição da dívida exequenda – ao invés de julgar improcedente a reclamação, deveria ter conhecido das demais questões invocadas pelo Reclamante, na p.i., o que não aconteceu.

Verifica-se, assim, o vício de nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia, já que, ao conceder provimento ao recurso interposto pela FP e julgar improcedente a reclamação, ficaram por decidir questões cujo conhecimento tinha sido considerado prejudicado em função da decisão da primeira instância que veio a revogar.

Assim sendo, julga-se verificada a ocorrência do vício de nulidade por omissão de pronúncia.

Encontrando-se o Acórdão de 29/05/2024 ferido de nulidade, por omissão de pronúncia, deverão os autos prosseguir os seus trâmites, neste TCAS, para que seja proferido novo Acórdão que supra a nulidade em causa.

Decisão

Termos em que, acordam os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar verificada a nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia, devendo os autos prosseguir os seus termos, neste TCAS, e proferido novo Acórdão que proceda ao suprimento da nulidade.

Sem custas.

Registe e Notifique.

Lisboa, 3 de Abril de 2025

(Isabel Vaz Fernandes)

(Luísa Soares)

(Lurdes Toscano)