Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1831/14.0BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 01/16/2020 |
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Relator: | PEDRO MARCHÃO MARQUES |
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Descritores: | NACIONALIDADE; NATURALIZAÇÃO; PORTUGUESES DE ORIGEM |
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Sumário: | i) São portugueses de origem, os filhos de mãe portuguesa ou de pai português nascidos no estrangeiro se tiverem o seu nascimento inscrito no registo civil português ou se declararem que querem ser portugueses. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I. Relatório Ministério da Justiça (Recorrente), inconformado com a decisão do TAC de Lisboa que julgou procedente a acção administrativa especial contra si intentada por Andre .......... (Recorrido) e anulou o acto que indeferiu o pedido de aquisição de nacionalidade portuguesa por naturalização formulado, mais tendo condenando a Demandada na prática de acto que a conceda. As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: 1.º A sentença recorrida fez uma interpretação que não tem qualquer correspondência na letra da lei, desrespeitando o disposto no artigo 9º do Código Civil, preconizando uma tarefa interpretativa legalmente não admissível ao considerar em vigor a Lei Orgânica n.º 9/2015, de 29 de junho, que a própria estipula no artigo 6.º o início de vigência. 2.ª O artigo 6.º da Lei Orgânica n.º 9/2015, de 29 de junho, determina: “A presente lei entra em vigor na data do início de vigência do diploma referido no artigo 4.º”. Por seu turno, o citado artigo 4.º da mesma Lei Orgânica, dispõe que: “O Governo procede às necessárias alterações do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de dezembro (..)”. Ora, considerando que regulamentação ainda não existe publicada, a Lei Orgânica cuja vigência a sentença antecipa, não é, ainda, aplicável. 3.ª O Estado Português (Conservatória dos Registos Centrais do IRN, IP e Ministério da Justiça), à data em que o pedido de nacionalidade foi feito pelo Recorrido e à data da decisão, apreciaram e decidiram o pedido em conformidade com o regime jurídico vigente, sendo certo que: a. Não podiam aplicar legislação inexistente; b. Não pode o Tribunal determinar a aplicação retroativa de lei nova que ainda não se encontra em vigor e que não prevê os efeitos retroativos que a sentença recorrida lhe confere; c. Não pode o Tribunal substituir-se ao legislador e/ou à Administração condenando a Administração a aplicar regime jurídico não vigente. 4.ª Mesmo que estivesse em vigor a norma invocada (como se viu, não está), nunca se poderia aplicar a mesma ao caso em concreto, já decidido pela entidade demandada, ainda que em fase “contenciosa”, precisamente porque esse diploma não prevê a retroatividade que a sentença recorrida lhe conferiu. 5.ª Mesmo que a Lei Orgânica em questão já se encontrasse em vigor, não podia ser interpretada como a sentença recorrida o faz, que erra na interpretação que faz do artigo 2.º da Lei Orgânica n.º 9/2015, de 29 de julho. Com efeito, atento o artigo 12.º do Código Civil, é bom de ver que, no artigo 2.º da Lei Orgânica n.º 9/2015, de 29 de julho, o legislador, com intenção interpretativa, se refere apenas à abrangência da natureza dos sujeitos a serem visados pela norma e não quanto a efeitos retroativos. 6.ª O que o legislador quis estabelecer nessa norma foi, desde logo, que a eficácia retroativa da lei se estendesse “aos netos de portugueses nascidos no estrangeiro em data anterior à sua entrada em vigor”, intenção que, de certeza que vai abranger um número de pessoas muito vasto, mas os seus efeitos serão os previstos no artigo 11.º da Lei da Nacionalidade, que dita praticamente o mesmo que o artigo 12.º, n.º 1 do código Civil: “A atribuição da nacionalidade portuguesa produz efeitos desde o nascimento, sem prejuízo da validade das relações jurídicas anteriormente estabelecidas com base noutra nacionalidade”. 7.º O pai do A., que tem nacionalidade derivada, por naturalização, não passaria a ter nacionalidade originária, por atribuição, como parece resultar da posição do Meritíssimo Juiz. 8.ª Segundo a sentença recorrida o Recorrido poderia passar a beneficiar da norma artigo 1.º n.º 1, alínea c) da Lei da Nacionalidade, por ser filho de pai português, com nacionalidade de origem. Porém, tal interpretação é incorreta, uma vez que a norma não pretendeu ampliar os efeitos a esse nível, mas sim alargar o número de pretendentes à nacionalidade portuguesa, que ainda não o são, e não àqueles que a adquiriram, por via doutras normas e com outros efeitos. A ser assim, estaríamos perante a destruição de um sistema jurídico unitário que as normas legais que regem a interpretação não permitem. 9.ª Mesmo que a Lei nova já estivesse em vigor, também não estariam preenchidos todos os requisitos legais aí previstos pois não resulta do processo administrativo que o primeiro requisito da projetada norma – alínea d), do artigo 1.º, n.º 1 (ou seja que o Recorrido tenha um ascendente de nacionalidade portuguesa do 2.º grau na linha reta) – esteja verificado, uma vez que o Recorrido será “bisneto” (e “não neto”) de português que não perdeu a nacionalidade portuguesa, terá, portanto, um ascendente do 3.º grau da linha reta. 10.ª O Requerente, aqui Recorrido, foi tratado pelo Estado Português como todos os cidadãos que formularam pedidos idênticos, sem qualquer distinção, sem favor nem desfavor, de forma isenta, equidistante e imparcial, tendo a Administração fundamentando porque decidiu num sentido e não de outro modo, inexistindo no procedimento qualquer caso de impedimento, escusa e suspeição, tendo sido aplicada a da Lei da Nacionalidade nos termos em que tem sido aplicada pela Conservatória dos Registos Centrais (CRC), cujas posições colhe quer na lei, quer na doutrina e na jurisprudência, introduzindo a sentença recorrida um tratamento desigual e contrário à lei aplicável. 11.ª O artigo 6.º da Lei da Nacionalidade (LN) aplicável (e não a norma não vigente que a sentença recorrida aplicou) contempla casos em que há vinculação da Administração e casos em que há discricionariedade e o Governo pode ou não conceder a nacionalidade. 12.ª Os casos previstos nos n.ºs 1 a 4 do artigo 6.º da LN, determinam que “o Governo concede” a nacionalidade, ou seja, impõem, de forma vinculada, a concessão da nacionalidade a quem comprove reunir os respetivos requisitos. Por outro lado, nas situações previstas nos n.ºs 5 a 7, o legislador expressa que “O Governo pode conceder a nacionalidade…”, já não se tratando, portanto, de uma imposição, em domínio vinculado, mas sim de situações em que a concessão da nacionalidade é apenas uma possibilidade, dependente de valorações, juízos e ponderações próprios do exercício da função administrativa, situados no domínio da designada discricionariedade administrativa. 13.ª O artigo 6.º, n.º 6, da LN e o artigo 24.º do RN reportam-se a casos em que, verificados que estejam determinados pressupostos enunciados na lei, o Ministro da Justiça, em função das particularidades de certas situações concretas que entenda justificarem-no, pode conceder - é a terminologia legal - a nacionalidade portuguesa, por naturalização. Trata-se, pois, de um poder discricionário. 14.ª O Recorrido requereu a nacionalidade ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 6, da Lei da Nacionalidade, portanto, não era detentor de um direito subjetivo à concessão da nacionalidade portuguesa, mas apenas de uma expetativa. 15.ª Na apreciação do pedido de concessão da nacionalidade apresentado pelo Recorrido, a Administração mais não fez do que formular as valorações, juízos e ponderações que lhe competem, tendo concluído não existirem razões que permitissem a dispensa do requisito da residência legal no território português há pelo menos seis anos, aspetos estes que a sentença recorrida nem sequer aflora, mas condena a Administração à concessão da nacionalidade. 16.ª A Administração tratou o Requerente exatamente do mesmo modo como tratou os demais cidadãos nas mesmas circunstâncias e a decisão encontra-se amplamente fundamentada no parecer emitido pela Conservatória dos Registos Centrais, de 27 de dezembro de 2013, e na Nota Interna do Gabinete de Sua Excelência a Ministra da Justiça, fundamentos esses que o ato final de indeferimento acolheu e que refutam tudo quanto o Recorrido invocou em sede contenciosa. A sentença recorrida além dos erros apontados, trata o Recorrido de forma diferente, aplicando-lhe um regime jurídico não vigente, que não foi aplicado a todos quantos fizeram pedidos idênticos no mesmo período de tempo. 17.º Nenhuma violação existiu do direito do Recorrido à cidadania, pois o Recorrido tem nacionalidade Brasileira, pelo que o seu direito fundamental (subjetivo e absoluto) a ter uma nacionalidade não está em causa e nenhum ato administrativo se ingeriu no seu direito à cidadania. 18.ª Ponderados todos os aspetos que o Recorrido invocou, entendeu a Administração não existirem condições para que fosse dispensado o requisito da residência legal no território português há pelo menos seis anos, requisito que apenas a vontade do Recorrido pode preencher. 19.ª Quanto à alegada “descendência de portugueses”, apenas se vem relevando a descendência de portugueses originários, conforme o elucida e sanciona a jurisprudência fixada (citada na contestação e na sentença recorrida) onde se entendeu que a distinção entre portugueses desde o nascimento e portugueses desde a data do registo tem fundamento legal nos artigos 11.º e 12.º da LN. 20.ª A Lei da Nacionalidade, nos seus artigos 11º e 12º, distingue os portugueses originários daqueles que o não são, sendo certo que a dispensa dos requisitos vertidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei da Nacionalidade apenas tem aplicação aos descendentes dos que detenham originariamente a nacionalidade portuguesa e não já aos descendentes que a adquiram posteriormente. A nacionalidade portuguesa obtida por naturalização não é transmissível aos filhos já nascidos. 21.ª O parentesco do Recorrido com um português originário só existirá ao nível do seu bisavô, ascendente no 3.º grau da linha reta, o que configura um hiato geracional muito considerável e que tem vindo a ser considerado insuscetível de constituir fundamento demonstrativo de uma proximidade a Portugal ou à respetiva comunidade. 22.ª O Recorrido não tem forte ligação a Portugal nem é membro de comunidade de ascendência portuguesa, pois uma “comunidade de ascendência portuguesa” é o grupo ou núcleo de indivíduos que se autoidentificam e são pelos demais identificados como tendo a característica comum da ascendência portuguesa, formando, assim, uma “comunidade de sentido”, suscetível de ser reconhecida como tal, designadamente mediante recurso ao contributo de historiadores, antropólogos e sociólogos. Trata-se de um conceito bem mais complexo e bem menos abrangente do que o simples facto de se ser oriundo e viver em país outrora sob administração portuguesa. 23.ª O facto de se viver e ser cidadão de países que estiveram sob administração portuguesa, por muito óbvios, fortes e naturais que sejam os laços culturais e outros mantidos entre Portugal e os países em questão, não transforma o conjunto dos cidadãos desses países numa “comunidade de ascendência portuguesa”. 24.ª A aceitar-se, como pretendeu o Recorrido, tal argumento, teríamos de entender que todos os nascidos no Brasil, bem como todos os naturais das outras ex-colónias portuguesas e seus descendentes, pertenceriam a “comunidades de ascendência portuguesa” e, por conseguinte, poderiam também vir a adquirir a nacionalidade portuguesa por esta via, conclusão que é inaceitável e teria, aliás, como consequência, a completa neutralização do Decreto-Lei n.º 308-A/75. 25.ª Os restantes factos alegados pelo requerente (…) se bem que demonstrem algum interesse por Portugal e pela sua história e cultura, bem como uma intenção de desenvolver os laços profissionais e sociais com este país, não constituem índices relevantes de uma especial ligação, já existente e duradoura, ao território português ou à comunidade nacional, nem demonstram a integração em qualquer comunidade de ascendência portuguesa situada fora de Portugal, designadamente, no Brasil. 26.ª A “ligação efetiva à comunidade nacional” deriva da “verificação de elos consistentes de natureza económica, profissional, social, e cultural, de modo a corporizarem um sentimento de pertença efetiva à comunidade portuguesa, manifestados de forma mais ou menos prolongada e não através de atos isolados ou escassos”. A “comunidade portuguesa” não pode ser entendida como “o círculo restrito de familiares e amigos do requerente estrangeiro…”. 27.ª A ligação efetiva à comunidade nacional “tem a ver com a identificação, por parte do interessado, com a comunidade nacional, como realidade complexa em que se incluem fatores objetivos de coesão social. (…) a ligação efetiva à comunidade nacional portuguesa envolve, naturalmente, fatores vários, designadamente o domicílio, a língua falada e escrita, os aspetos culturais, sociais, familiares, económicos, profissionais e outros reveladores de um sentimento de pertença à comunidade portuguesa, em Portugal ou no estrangeiro”. 28.ª O Recorrido enunciou fatores de que pretende que se extraia a conclusão de ligação à comunidade, mas o facto de os seus “descendentes” terem uma quinta em Portugal e aqui terem construído um cemitério, não significa que a eventual ligação daí decorrente seja apanágio de outrem que não os próprios. 29.ª O Recorrido não provou, nem prova, pertencer a uma “comunidade de ascendência portuguesa” ou ter uma “ligação efetiva a Portugal” e não reside, nem trabalha, nem prossegue a sua vida quotidiana em Portugal. 30.ª A lei só permite que o tribunal se substitua à Administração nas condições previstas no n.º 2 do artigo 71.º do CPTA, isto é, quando o poder a exercer seja estritamente vinculado, discricionariedade de grau zero. Se houver discricionariedade e for possível mais do que uma solução, o tribunal não pode determinar o conteúdo do ato a praticar, podendo apenas explicitar as vinculações a observar pela Administração. In casu, sendo um domínio em que o legislador concedeu uma considerável margem de livre apreciação à administração – discricionariedade - a intervenção do Tribunal deve confinar-se apenas às hipóteses de erro grosseiro ou manifesto, como sejam as de raciocínios materialmente errados, o que não sucedeu. 31.ª Ao Recorrido não assistem razões suficientemente ponderosas para que se justifique a preclusão dos requisitos normalmente exigidos a quem pretenda naturalizar-se e que constam dos vigentes artigo 6.º, n.º 1, da LN e do artigo 19.º, n.º 1, do RN. 32.ª O Estado Português (CRC e MJ), ao indeferir o pedido de naturalização do ora Recorrido, interpretou corretamente o n.º 6 do artigo 6º da LN, pois o Recorrido não fez prova suficiente da sua integração na comunidade nacional ou em comunidade de ascendência portuguesa no Brasil e a comprovação do seu parentesco (afastado) em relação a cidadão originariamente português não é suficiente para que se possam considerar como verificadas, em relação a ele, circunstâncias que especialmente justifiquem a sua naturalização como cidadão português. 33.ª Não se verifica, qualquer vício de violação de lei que afete a validade da decisão impugnada, devendo a mesma, por conseguinte, manter-se. 34.ª Deve ser revogada a sentença recorrida, por ter incorrido em erros de interpretação e julgamento e deve o caso ser apreciado e julgado à luz do regime jurídico vigente, do qual decorre, nos termos do processo administrativo, contestação e alegações apresentados – que aqui se dão por integralmente reproduzidos – dever manter-se o indeferimento do pedido de nacionalidade realizado pelo Recorrido, atento o tempo e os termos e fundamentos em que foi feito. O Recorrido apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido e formulando as seguintes conclusões: I- O Réu Ministério da Justiça, de forma paradoxal e inusitada, interpôs recurso da douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz. II- Não assiste qualquer razão à Recorrente, quando afirma que o tribunal a quo aplicou lei que não se encontrava vigente. III- Na verdade, o diploma referido no artigo 4.º da Lei Orgânica n.º 9/2015, de 29/07 é o Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 237-A/2006, de 14/12, IV- Diploma esse que se encontra a vigorar desde 15 de Dezembro de 2016. V- Não pode, por isso, atender-se aos argumentos expendidos pelo Recorrente Ministério da Justiça, VI- Note-se que a parte aplicável ao caso sub judice, na lei com a redação atual, é o artigo 1.º da Lei da Nacionalidade. VII- O aqui Recorrido é efetivamente descendente de portugueses, cujos ascendentes detêm uma nacionalidade originária, conforme bem provam os documentos e certidões juntas ao processo relativamente ao pai e bisavô deste. VIII- Reside e integra uma comunidade de ascendência portuguesa, dado ter nascido num seio familiar cujas tradições se fundam na cultura portuguesa. IX- O país de residência atual do Recorrido possui naturalmente uma efetiva proximidade de culturas, identidade da língua e da religião com a comunidade portuguesa. X- Ingressou e estudou numa Universidade Portuguesa, no Brasil, com o propósito de fixar a sua residência em Portugal. XI- Pese embora não resida, atualmente, em Portugal, certo é que o Recorrido tem pleno conhecimento da história, cultura e realidade política portuguesas. XII- Desloca-se inúmeras vezes a Portugal, até porque possui uma quinta, sita na freguesia de Souto, concelho de Guimarães, a fim de se reencontrar e conviver com os seus familiares portugueses. XIII- Os seus antepassados foram responsáveis pela construção de um cemitério na freguesia de Souto, concelho de Guimarães, tendo dado, por isso, um contributo importante ao nível económico e cultural para Portugal. XIV- Frequentou escolas portuguesas no brasil, pautando o seu ensino pelo estudo da história, cultura e tradições portuguesas, de forma a exercer a sua profissão de médico em Portugal. XV- E prova de tal facto é que o Recorrido se licenciou em Medicina numa Universidade com protocolo na Ordem dos Médicos Portuguesa. XVI- Demonstrando, tudo isto, a intenção do Recorrido em contribuir, como os seus ascendentes ancestrais, para o desenvolvimento e enriquecimento económico e cultural do nosso país. XVII- Tudo isto a significar que, existe uma efetiva ligação à comunidade portuguesa, que foi ignorada pela Recorrente, e que com mérito o tribunal a quo, procedeu à justiça material do caso concreto, XVIII- Não obstante, e na senda da sentença proferida pelo tribunal a quo, o facto de o pai do aqui Recorrido ter obtido a nacionalidade portuguesa por naturalização não impede que seja português originário, nos termos da al. d) do n.º1 do artigo 1.º da Lei da Nacionalidade. XIX- Pelo que, a nacionalidade adquirida pelo Pai do aqui Recorrido não pode deixar de se considerar originária, XX- Até porque, é a própria Lei Orgânica 9/2015 que afirma no artigo 2.º, aplicarem-se as disposições por ela introduzidas, ao nível da qualificação da aquisição da nacionalidade originária, no artigo 1.º da Lei da Nacionalidade, aos netos de portugueses nascidos no estrangeiro em data anterior à sua entrada em vigor. XXI- Tudo isto a significar, em coerência com tudo o supra alegado pelo aqui Recorrido André, que deve ser atribuído a este a nacionalidade portuguesa, XXII- Corroborando-se, assim, o que foi decidido, e bem, pelo Meritíssimo Juiz a quo. XXIII- O que, em suma e em conclusão, significa que nenhuma censura merece a decisão recorrida e, muito menos, a simplória e ofensiva censura que lhe faz o Recorrente. • Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso. • Com dispensa dos vistos legais, cumpre apreciar e decidir. • I. 1. Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento ao ter concluído pela invalidade do acto que indeferiu o pedido de aquisição de nacionalidade por naturalização, formulado, também, ao abrigo do disposto no art. 1.º, n.º 1, al. c), da Lei da Nacionalidade (por ser filho de pai português). • II. Fundamentação II.1. De facto A matéria de facto pertinente é a constante da sentença recorrida, a qual se dá aqui por reproduzida, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 663.º, n.º 6, do Código de Processo Civil. • II.2. De direito O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou procedente o pedido formulado pelo Autor e ora Recorrido, anulando o acto de indeferimento do seu pedido de naturalização. Entendeu o tribunal a quo, julgando prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos do peticionado, o seguinte: “(…)
(…).” Vejamos. Desde logo importa deixar estabelecido que, face ao concretamente decidido pelo tribunal a quo, o que vem alegado no recurso a propósito do uso do poder discricionário de conceder a naturalização como previsto no nº 6 do art. 6º da Lei da Nacionalidade, não é pertinente. Com efeito o tribunal a quo expressamente afirmou não ser esse o fundamento determinante da concessão da nacionalidade por naturalização. A sentença recorrida julgou procedente o pedido condenatório, por o A. ter direito à nacionalidade portuguesa de origem, ao abrigo do art. 1.º, al. c), da Lei da Nacionalidade na sua redacção actual. Constitui, portanto, objecto do recurso o erro de julgamento sobre a aplicação daquele preceito legal ao caso concreto, defendendo o Recorrente que a norma aplicada pelo tribunal a quo não é susceptível de aplicação. Neste capítulo, concluiu-se na sentença recorrida, o que é também o entendimento do Ministério Público, que a situação do pai do A. passou a ser considerada expressamente pelo legislador como um dos fundamentos da nacionalidade de origem, sendo que o nº 2 da Lei Orgânica n.º 9/2015, de 29 de Julho, prevê expressamente também a sua aplicação retroactiva ao dispor que “[a]s alterações introduzidas pela presente lei em matéria de aquisição originária da nacionalidade aplicam-se também aos netos de portugueses nascidos no estrangeiro em data anterior à sua entrada em vigor”. Sendo que, como vem provado, o pai do A. e ora Recorrido adquiriu a nacionalidade portuguesa, por naturalização, por decisão de 27.12.2010. Insiste o Recorrente que dessa retroactividade legal não decorre e que a norma não pretendeu ampliar os efeitos a esse nível, sendo que o pai do A. tem nacionalidade derivada, por naturalização, e não passaria a ter nacionalidade originária por atribuição. Na verdade, o ponto em que se baseia o Recorrente – perpassando todo o corpo alegatório - é o de que a descendência relevante neste âmbito é somente a de portugueses originários. Ora, certo é que o STA teve recentemente oportunidade de concluir no acórdão de 14.02.2019, proc. nº 219/10.6BEPRT, que: “A Administração não pode determinar que os “portugueses” mencionados no n.º 6 do artigo 6.º da Lei da Nacionalidade são apenas os ‘portugueses de origem’ e não também os portugueses que adquiriram a nacionalidade por naturalização, pois isso equivaleria a estabelecer uma condição de aquisição da nacionalidade que não está prevista na lei e que só o legislador - Assembleia da República (AR) pode estabelecer - tal como decorre da al. f) do artigo 164.º (Reserva absoluta de competência legislativa) da Constituição da República Portuguesa (CRP)”. Donde, afinal a premissa essencial de que parte o Recorrente é errada, como demonstrado pelo acórdão do STA citado e que aqui nos dispensamos de transcrever. Assim sendo, razão tem o Ministério Público quando afirma que a interpretação sufragada pelos serviços do Recorrente, e no recurso reiterada, é (ilegalmente) restritiva. O facto de o pai do aqui Recorrido ter obtido a nacionalidade portuguesa por naturalização não impede que seja português originário, nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 1.º da Lei da Nacionalidade. Até porque é a própria Lei Orgânica 9/2015 que afirma no artigo 2.º, aplicarem-se as disposições por ela introduzidas, ao nível da qualificação da aquisição da nacionalidade originária no artigo 1.º da Lei da Nacionalidade, aos netos de portugueses nascidos no estrangeiro em data anterior à sua entrada em vigor. Acresce que o objecto do processo impugnatório centra-se, não nas concretas ilegalidades que são imputadas ao acto, mas no próprio acto, devendo a pronúncia do tribunal envolver, não apenas a eliminação do acto impugnado da ordem jurídica, mas a definição da situação jurídica em causa. Essa maior eficiência do processo impugnatório é ditada pelo prevalência do princípio da tutela jurisdicional efectiva. Razões estas que determinam a improcedência do recurso, devendo assim a sentença recorrida ser mantida. • III. Conclusões i) São portugueses de origem, os filhos de mãe portuguesa ou de pai português nascidos no estrangeiro se tiverem o seu nascimento inscrito no registo civil português ou se declararem que querem ser portugueses. • IV. Decisão Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida. Custas pelo Recorrido. Lisboa, 16 de Janeiro de 2020 ____________________________ Pedro Marchão Marques ____________________________ ____________________________ |