Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1840/23.8BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/30/2025
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
FALTA DE CONCLUSÕES
Sumário:A falta de conclusões impõe a rejeição imediata do recurso, sem que se admita despacho de aperfeiçoamento, tendo em conta o que se encontra previsto no artigo 641º, nº 2, al. b) do Código de Processo Civil.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - Relatório

A…, inconformado com a decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que absolveu a Fazenda Pública da instância, por procedência da exceção dilatória inominada de inimpugnabilidade do ato reclamado, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Nas alegações de recurso apresentadas, todavia, não formulou conclusões.

A Recorrida não contra-alegou.

Por despacho de 2025.06.09, o recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

O Ministério Público, ao abrigo do disposto no artigo 288/1 CPPT, emitiu parecer no sentido da rejeição do recurso interposto por não terem sido formuladas de conclusões.

Posteriormente as partes foram ouvidas sobre a possibilidade de rejeição do recurso.

Na resposta o Recorrente e ora Reclamante veio solicitar que fosse proferido despacho de aperfeiçoamento e concedido prazo para apresentar as conclusões em falta.

Foi proferida nos presentes autos decisão sumária pela Juíza Relatora ao abrigo do disposto no artigo 656.º do CPC.

Contudo, o Recorrente veio reclamar para a conferência, nos termos do disposto nos artigos 641/6 e 652/3 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi da alínea e) do artigo 2º CPPT, pretendendo que sobre a decisão recaia um acórdão,

Na reclamação apresentada alega:

1. «De acordo com o Princípio do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva (art. 20.º CRP), a rejeição liminar do recurso por vício meramente formal (falta de conclusões) impede a apreciação do mérito e constitui obstáculo desproporcionado.
2. Defende o Art. 639.º, n.º 3, CPC que embora as conclusões delimitem o objeto do recurso, a lei admite que, em casos de insuficiência, obscuridade ou irregularidade, o tribunal convide ao aperfeiçoamento.
3. O mesmo raciocínio deve aplicar-se quando o recorrente, ainda que sem conclusões formais, apresentou alegações completas onde resulta claramente o objeto do recurso.
4. Como é o caso concreto.
5. Por outro lado, a Jurisprudência constitucional e o Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado que o formalismo processual não pode anular o direito de recurso quando o recorrente expôs de forma inteligível as razões da impugnação (cfr. Acs. TC n.º 199/2010, 188/2015, entre outros).
6. Ademais, cfr. Art. 652.º, n.º 3, CPC, cabe ao coletivo conhecer das nulidades e da admissibilidade do recurso;
7. Não podendo o relator, por decisão sumária, esgotar o direito de recurso quando estão em causa princípios estruturantes.
8. Assim e na verdade, a decisão recorrida rejeitou o recurso jurisdicional exclusivamente por falta de conclusões,
9. Não obstante o Recorrente ter apresentado alegações onde expôs, de forma clara, os fundamentos da impugnação.
10. Na verdade, a rejeição imediata do recurso por esse motivo viola o art. 20.º da Constituição da República Portuguesa, ao constituir um formalismo excessivo que restringe de forma desproporcionada o direito fundamental de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva.
11. Reitere-se que o art. 639.º, n.º 3, do CPC impõe que, perante insuficiência ou irregularidade das conclusões, o tribunal convide ao respetivo aperfeiçoamento, solução que deve aplicar-se também em situações de omissão, quando das alegações constam todos os elementos necessários para delimitar o objeto do recurso.
12. O que é corroborado com a própria jurisprudência do Tribunal Constitucional, que tem reiterado que a exigência de conclusões não pode conduzir, de forma automática, à perda do direito de recurso quando a impugnação é inteligível e a decisão de mérito pode ser proferida sem prejuízo da defesa da parte contrária.
13. Nestes termos, afigura-se que o recurso deveria ter sido admitido e conhecido, pelo que se requer a reapreciação da decisão sumária em acórdão do coletivo de juízes, nos termos do art. 652.º, n.º 3, do CPC, com a consequente revogação da decisão de rejeição e prosseguimento da instância de recurso.

Termos em que com os mais de Direito doutamente supridos por V.ªs. Ex.ªs., deverá a presente decisão singular ser objecto de decisão colegial que determine a ulterior tramitação do recurso interposto, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais, assim se dignificando a tão douta e costumada JUSTIÇA!»

A Reclamada nada disse.

Os autos foram com vista ao Ministério Público que emitiu parecer no sentido do indeferimento da reclamação.

Com dispensa dos vistos, por se tratar de processo urgente, vêm os autos à conferência:


II- Fundamentação

II. 1 Pertinente, releva dos autos o seguinte:

A) Em 2023.11.13, no Serviço de Finanças de Lisboa-11, deu entrada a reclamação constante de fls. 4 dos autos (doc. nº 005700432 registado em 2023.12.06) que aqui se dá por integralmente reproduzida;
B) Em 2025.01.27, foi proferida a sentença recorrida, constante de fls. 867 dos autos (doc. nº 005700586), que aqui se dá como integralmente reproduzida;
C) A sentença identificada na alínea que antecede foi notificada por via eletrónica em 2025.02.03 (cf. fls. 902 dos autos);
D) Em 2025.02.26, deu entrada requerimento de interposição de recurso, acompanhado das respetivas alegações, constante de fls. 909 dos autos (doc. nº 005700594), do qual se transcreve:

«(…)





(…)»

E) Em 2025.09.05, foi proferida decisão sumária a indeferir o requerimento de interposição de recurso por falta de conclusões.


II.b) De Direito

Veio o ora Reclamante requerer que recaia acórdão sobre o despacho por que o Relator não admitiu o recurso que interpôs ao abrigo do disposto no artigo 284º do CPPT.

Nas alegações, o Reclamante não trás novos argumentos, mas apenas razões de discordância com o decidido.

Desde já adiantaremos que não vislumbramos razões para alterar a decisão sumária anteriormente proferida.

A decisão de não admissão do recurso apresentado foi proferida nos seguintes termos e fundamentos:

«(…)
II.2 - Antes do mais, há que aferir da admissibilidade do presente recurso, por nas alegações de recurso apresentadas não terem sido expressa ou implicitamente, formuladas conclusões.
Vejamos então.
Veio o Reclamante através de requerimento interpor recurso da sentença que julgou absolveu a Fazenda Pública da instância.
Com o requerimento, porém, juntou alegações de recurso sem conclusões.
Todavia, apesar de ter sido proferido pelo Tribunal a quo despacho de admissão de recurso, visto o nº 5 do artigo 641º Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 281º CPPT, esta decisão que admitiu e fixou os efeitos do recurso não vincula o tribunal superior.
Prosseguindo:
Como é consabido, nos termos do disposto no artigo 639º CPC aplicável, atualmente é obrigatória a formulação de conclusões de recurso, que têm por função delimitar o objeto do recurso, devendo indicar de forma assertiva e sintética os fundamentos por que se pede a alteração ou anulação da decisão recorrida, podendo o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objeto inicial do recurso (artigo 635/4 do CPC).
Ouvido o Reclamante e ora Recorrente este veio defender a prolação de um despacho de aperfeiçoamento.
Todavia, citando António Santos Abrantes Geraldes (1-Aut. Cit. RECURSOS EM PROCESSO CIVIL, Almedina, 6ª Ed., pág. 215), a falta de alegações e/ou de conclusões impõe a rejeição imediata do recurso, sem que se admita despacho de aperfeiçoamento, tendo em conta o que se encontra previsto no artigo 641º, nº 2, al. b).
Com efeito, diz o artigo 641/2.b) do CPC:
“2 - O requerimento é indeferido quando:
(…)
b) Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões”.
Neste sentido, a título meramente exemplificativo, citamos os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 2022.10.19, proferido no processo nº 635/09.6BEPRT, de 2022.09.29, no proc. nº 0981/10.6BESNT e de 2021.12.09, proc. nº 0362/19.6BEMDL, todos no sentido de que sempre que nas alegações que acompanham o requerimento de interposição não forem formuladas conclusões deve o recurso ser rejeitado.
Jurisprudência que com a qual concordamos e que com a devida vénia acolhemos.
No caso não estão, pois, reunidos os requisitos formais de que depende a admissão do presente recurso.
(…)»

No caso em apreço, dúvidas não há que no requerimento de interposição do recurso não foram formuladas conclusões, não estando, assim, reunidos os requisitos formais de que depende a admissão do presente recurso.

Não sendo caso de convite ao aperfeiçoamento precisamente por não terem sido formulada sequer uma aparência de conclusões. Nesse sentido v.g. os já supracitados acórdãos.

Em todo o caso ainda diremos que a decisão proferida em nada fere o princípio constitucional de acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no artigo 20.º, da Constituição (CRP), dado que aqui o que está em causa não é o acesso, mas antes a obrigação imposta legalmente de se formular conclusões, em sede de recurso, sem que se possa afirmar estar-se a violar tal princípio.

Consideramos, pois, ser de manter o decidido.


Sumário:

A falta de conclusões impõe a rejeição imediata do recurso, sem que se admita despacho de aperfeiçoamento, tendo em conta o que se encontra previsto no artigo 641º, nº 2, al. b) do Código de Processo Civil.


III - Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais deste Tribunal Central Administrativo Sul, em indeferir a reclamação para a conferência, mantendo a decisão sumária da Relatora de não admissão do recurso.

Custas a cargo do Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em duas (2) U.C.

Lisboa, 30 de outubro de 2025

Susana Barreto

Lurdes Toscano

Luísa Soares