Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:3450/23.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:06/06/2024
Relator:MARA DE MAGALHÃES SILVEIRA
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL;
DISPENSA AUDIÊNCIA PRÉVIA;
TRADUÇÃO DE DOCUMENTO DA PROPOSTA.
Sumário:I - Mostrando-se prevista no art. 87.º-B n.º 2 do CPTA a dispensa de audiência prévia quando esta apenas se destine a facultar às partes a discussão de facto e de direito, por o Tribunal pretender conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa, a sua não realização não configura nulidade processual;
II - Não tendo o autor, em sede de petição inicial, requerido outras diligências probatórias para além dos documentos que juntou à petição inicial, designadamente arrolando prova testemunhal, o princípio do inquisitório não se destina a que o Tribunal se substitua às partes no cumprimento dos seus ónus probatórios;
III - Verificando-se que (i) a matéria factual objeto de prova se reporta à tramitação do procedimento pré-contratual e aos atos nele praticados, contendo o processo administrativo a prova documental necessária, (ii) quanto ao único facto invocado pelo autor apenas foi indicada prova documental, e (iii) as partes já discutiram nos articulados todas as questões subjacentes à ação, mostra-se possível conhecer imediatamente o mérito da causa (nos termos do art. 88.º, n.º 1 al. b) do CPTA), pelo que, dado que a audiência prévia, apenas se destinaria à discussão de facto e de direito, encontram-se reunidos os pressupostos para a sua dispensa ao abrigo do n.º 2 do art. 87.º-B n.º 2 do CPTA;
IV - A nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão não se confunde com a eventual insuficiência do probatório para sustentar a decisão alcançada pelo Tribunal e que corresponde a um erro de julgamento de direito;
V - Configura erro de julgamento de facto, que não nulidade da sentença por omissão de pronúncia, a circunstância de o Tribunal não ter considerado um facto que seria comprovado pelo documento junto à petição inicial;
VI - Vindo impugnadas a letra e assinatura do documento que se destinaria à prova da matéria factual alegada pelo autor, sem que o autor, devidamente notificado, tenha requerido e produzido prova destinada a atestar a sua genuinidade, não se mostra estabelecida a autoria do documento e, nesse sentido, não pode ser dado como provado que o alegado autor da declaração a emitiu;
VII - Não se subsume à causa de exclusão da proposta tipificada na al. e) do n.º 2 do art. 146.º do CCP a apresentação de documento – ficha técnica - redigido em português, relativamente ao qual a entidade adjudicante, por ter dúvidas que o mesmo corresponda ao original da ficha técnica, considera tratar-se de uma tradução não legalizada;
VIII - A existência de meros indícios, que não prova cabal, da falta de genuinidade do documento junto à proposta é insuficiente para concluir pela exclusão da proposta nos termos da al. m) do n.º 2 do art. 146.º do CCP;
IX - Não litiga de má-fé o R. que, no exercício do seu direito de defesa, se limita a sustentar a validade do ato impugnado e a exercer os direitos processuais que a lei lhe confere.
VIII - A existência de meros indícios, que não prova cabal, da falta de genuinidade do documento junto à proposta é insuficiente para concluir pela exclusão da proposta nos termos da al. m) do n.º 2 do art. 146.º do CCP;
IX - Não litiga de má-fé o R. que, no exercício do seu direito de defesa, se limita a sustentar a validade do ato impugnado e a exercer os direitos processuais que a lei lhe confere.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de CONTRATOS PÚBLICOS
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

M........, S.A., (doravante Recorrente ou A.) instaurou, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a presente ação de contencioso pré-contratual contra o Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E. (doravante Recorrido, R., ou ED), indicando como contra-interessada a S........ Lda. (doravante Recorrida ou CI), na qual, por referência ao concurso público com o n.º 27/2187/2023 que tem por objeto a “Aquisição de um Equipamento de Rx para a Unidade Hospitalar de Portimão, no Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE” peticionou,
“a. Seja anulado o ato de exclusão da proposta apresentada pela autora, ou seja, a decisão da Ré que homologa o relatório final e decide a adjudicação à contrainteressada, porque inquinado pelo vício de violação de lei;
b. Seja anulado o ato de adjudicação e o contrato celebrado entre a ré e o contrainteressado, se já tiver sido celebrado;
E consequentemente, por inerência:
c. Seja a Ré condenada a reconstituir a situação que existiria se fosse admitida a proposta da autora, reconstituição que passa pela reformulação dos atos procedimentais subsequentes designadamente pela condenação na adjudicação à autora, por ter sido esta a melhor proposta.”

Em 29.1.2024 o Juízo de Contratos Públicos do Tribunal Administrativo de Círculo proferiu despacho dispensando a realização de audiência prévia por esta se destinar “apenas ao fim previsto na al. b), do nº 1, do artº 87º-A, do CPTA”. Seguidamente, na mesma data, proferiu saneador-sentença julgando a presente ação de contencioso pré-contratual improcedente e, em consequência, absolveu o R. do pedido.

Inconformada, a A./Recorrente, M........, S.A., interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo Sul dessa decisão, concluindo nos seguintes termos:

“I. O Tribunal a quo, sem produção de prova, decide que um documento é falsificado porque algumas das suas características levantam “dúvidas” ao júri do procedimento e a si – isto é, não existe um juízo de certeza ou convicção quanto à sua falsidade – o que determina, por insuficiência (falta de convicção) e contradição (a dúvida obrigaria à produção de prova) entre os fundamentos (dúvida) e a decisão (decisão sem mais), a nulidade da sentença nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, ex vi do 1.º do CPTA;
II. Mais: considerar que o artigo 87.º-B, n.º 2 do CPTA estabelece um poder discricionário e ilimitado ao juiz, designadamente permitindo que, perante dúvidas de um júri num procedimento de concurso público, é permitido ao juiz partilhar dessas dúvidas e negar a realização de audiência prévia, designadamente para efeitos de enunciação de temas da prova e direito de alteração do requerimento probatório, negando o direito de prova a este particular, permitindo consolidar uma decisão em que este não participou devidamente, viola não apenas o Princípio do Contraditório, previsto no artigo 3.º, n.º 3 do CPC, mas corresponde a norma ad hoc retirada por interpretação daquela disposição do 87.º-B, n.º 2 CPTA, norma essa que a Recorrente considera e invoca, para todos os efeitos, como inconstitucional por violação do direito fundamental de acesso aos direito e tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
III. Nessa linha, decidiu dispensar a realização de audiência prévia, quando deveria antes ter proferido despacho destinado a identificar o objeto do litígio e enunciar os temas da prova, e decidir as reclamações deduzidas pelas partes (87.º-A/1/f) CPTA) – configurando, também nesta dimensão, ato processual nulo, determinando consequentemente a nulidade do referido Despacho-saneador, nos termos do art.º 195.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi art.º 1 CPTA;
IV. Por outro lado, como decide que, sendo legítimas as dúvidas do júri, é legítima a exclusão, o Tribunal a quo, ignora por completo uma declaração que foi junta aos autos, a informação publicamente acessível (até por obrigação) no domínio da autoridade portuguesa na matéria (INFARMED), apreciando erradamente a prova, e desconsiderando o poder-dever que neste caso resultava do artigo 72.º, n.º 1 do CCP.
V. Mais: considerar que o artigo 88.º, n.º 1, al. b) do CPTA permite ao Juiz decidir que uma dúvida levantada pelo júri de um procedimento de contratação pública pode permanecer por resolver em sede de impugnação judicial de decisão de exclusão que tenha fundamento a desconsideração de documento atingido por essa mesma dúvida, permitindo consolidar uma dúvida nascida do procedimento administrativo e homologada judicialmente, viola não apenas o Princípio do Inquisitório, previsto no artigo 411.º do CPC, mas corresponde a norma ad hoc retirada por interpretação daquela disposição do 88.º, n.º 1, al. b) CPTA, norma essa que a Recorrente considera e invoca, para todos os efeitos, como inconstitucional por violação do direito fundamental de acesso aos direito e tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
VI. Finalmente, o Tribunal omite a sua pronúncia sobre um facto essencial – a declaração do fornecedor que demonstra o erro das duas dúvidas e, bem assim, o erro destas duas decisões – o que configura nulidade da sentença ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC.
VII. Acrescente-se ainda que ao julgar improcedente o pedido de condenação da Recorrida em litigância de má-fé, o Tribunal a quo, não apenas erra perante comportamento manifestamente reprovável, como demonstra ter sido condicionado, no seu juízo, por esse mesmo comportamento que visava exclusivamente retirar credibilidade à Recorrente e à prova por si apresentada.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V/ Exas. doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, nessa sequência:
a) Ser revogada a decisão judicial recorrida;
b) Determinar, porque resulta já suficientemente documentado, adjudicar a proposta da Recorrente, por ser a que melhor satisfaz os critérios de adjudicação ou, não entendendo nestes termos, ordenar a repetição da fase de avaliação e ordenação de propostas considerando como válidos os documentos apresentados pela Recorrente.
c) E, ainda e em qualquer caso, condenar a Recorrida entidade adjudicante em litigância de má-fé nos termos da réplica apresentada pela Recorrente.”

O Recorrido, Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E., apresentou contra-alegações formulando as seguintes conclusões:

“1ª- Os vícios da sentença invocados pela recorrente não existem.
2ª- A recorrente não apresentou com a sua p.i. prova além da documental pelo que não existia nos autos qualquer prova a produzir em sede de audiência de julgamento.
3ª- A decisão do Tribunal teve por base a prova documental carreada para os autos tendo resultado provado que o documento apresentado pela recorrente e que esta denominou Ficha Técnica Perform-X C400-PT REV.pdf não cumpria os requisitos exigidos pela cláusula nona, ponto 1.3 do Programa do Concurso.
4ª- Cada concorrente, na sua proposta, tem em conta as exigências do programa do procedimento e do caderno de encargos, mas tal não permite que modifique a ficha técnica que informa sobre as características técnicas da máquina/equipamento e que, de acordo com as peças do procedimento, deve ser elaborada pelo fabricante de modo a poderem ser identificadas de forma inequívoca as características daquela máquina ou equipamento.
5ª- A ficha técnica do equipamento/máquina não deve destinar-se a nenhum concurso em especial, antes se destina a dar a conhecer características técnicas, sem destinatário específico.
6ª- O documento denominado Ficha Técnica junto pela recorrente com a sua proposta deixou no júri dúvidas quanto às efetivas características do equipamento e fez com que este não aceitasse um documento em português que não era a tradução legalizada da ficha técnica elaborada pelo fabricante, em língua inglesa, que se encontrava disponível no site daquela empresa.
7ª- O tribunal decidiu bem ao entender não merecer censura a decisão do júri de excluir a proposta da recorrente por falta de apresentação do documento previsto no ponto 1.3 da cláusula nona do programa do procedimento.
8ª- A Ficha Técnica de uma máquina/equipamento ao identificar as suas características, componentes e materiais, capacidades e limitações de desempenho, exigências de energia e recursos, os procedimentos de instalação e de manutenção, recomendações de segurança no manuseamento e informação sobre o processo de fabrico confirma aspetos da proposta submetidos à concorrência pelo que a sua falta conduz à exclusão da proposta nos termos do disposto nos artigos 57º nº 1, 70º, 72º e 146º, todos do CCP.
9ª- Ao Tribunal cabe julgar se o Júri procedeu de acordo com as peças do procedimento, com as propostas apresentadas pelos concorrentes e com a lei não podendo tomar em consideração nessa avaliação com base em documentos de que aquele não dispunha quando decidiu.
10ª- A dispensa de audiência prévia com o fundamento na al. b) do nº1 do art. 87-A do CPTA constitui ato sujeito a livre apreciação do juiz.
11ª- A reclamação daquele ato deveria ter tido lugar nos termos e prazo previsto no art. 102º do CPTA, o que não foi feito, pelo que se extinguiu o direito a invocar tal fundamento no recurso.
12ª- A recorrida não teve qualquer conduta reprovável com dolo ou negligência grave com o objetivo de impedir ou dificultar a ação da justiça nem deduziu qualquer pretensão cuja falta de fundamento não pudesse ou devesse ignorar pelo que não agiu com má-fé.
Termos em que, deve o recurso ser julgado improcedente e ser mantida a sentença para que se faça JUSTIÇA.”

De igual modo, a CI/Recorrida, S........ Lda. contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:

“1. O Tribunal a quo não teve dúvidas de que o documento apresentado pela Recorrente na sua proposta não corresponde ao original da ficha técnica do equipamento proposto pelo Recorrente.
2. Não teve dúvidas o Tribunal a quo que o documento apresentado pela Recorrente na sua proposta apresentava discrepâncias com a ficha técnica disponível no site do fabricante.
3. A ficha técnica é um documento elaborado pelo fabricante do equipamento, sem destinatário específico e que tem de conter as especificações e características técnicas do equipamento.
4. A Recorrente apresentou um documento onde se limitou a transcrever os requisitos mínimos exigidos pela cláusula 39.ª do caderno de encargos, não tendo identificado devidamente e de forma inequívoca as características técnicas dos equipamentos propostos.
5. A apresentação do rol de testemunhas e a requisição de outros meios de prova tem de ser feita no final da petição inicial (C.P.T.A., art.º 78.º, n.º 4), o que a Recorrente não fez.
6. A Recorrente não requereu a prestação de depoimento de parte, não requereu quaisquer exibições, não requereu qualquer perícia, nem arrolou quaisquer testemunhas (C.P.C., art.º 604.º, n.º 3, alíneas a) a d)).
7. A Recorrente não requereu que fosse produzida qualquer prova que tivesse de ser feita em sede de audiência de julgamento.
8. Ao pretender que o Tribunal consulte documentação registada no Infarmed, a Recorrente pretende que o Tribunal a quo faça aquilo que competia à Recorrente fazer e não fez, e nem sequer requereu.
9. A responsabilidade probatória é da Recorrente e a Recorrente podia ter requerido certas diligências probatórias e não o fez, tendo ocorrido a preclusão do seu direito processual probatório.
10. Do princípio da auto-responsabilidade das partes decorre que a Recorrente sofre as consequências jurídicas prejudiciais da sua negligência ou inépcia na condução do processo.
11. Resultou provado que o documento Ficha Técnica Perform-X C400-PT_REV.pdf apresentado pela Recorrente na sua proposta não cumpre o exigido no ponto 1.3 da cláusula 9.ª do programa do concurso.
12. Resultou provado que do referido documento constam transcritos os requisitos mínimos indicados na cláusula 39.ª do caderno de encargos e que o mesmo se encontra destinado especificamente ao procedimento sub judice e foi feito à medida das exigências do procedimento.
13. Resultou provado que o referido documento apresenta discrepâncias com a ficha técnica disponível no site do fabricante.
14. Resultou provado que em outro procedimento de contratação pública a Recorrente propôs o fornecimento do exacto mesmo equipamento (marca Control X, modelo Perform X C-400), sendo que as fichas técnicas (docs. n.ºs 3 e 4 juntos com a contestação da Recorrida) apresentam divergências.
15. Não se entende – nem sequer a Recorrente, em momento algum, o clarifica – como é que o mesmo equipamento – marca Control X, modelo Perform X C-400 – pode ter diferentes “fichas técnicas” e diferentes características e especificações técnicas.
16. A Recorrente apresenta um documento diferente por cada procedimento de contratação a que concorre.
17. Tendo a Recorrente sido notificada em 1 de Fevereiro de 2024 do douto despacho que determinou a dispensa de realização da audiência prévia, o prazo para arguir a pretensa nulidade terminou em 6 de Fevereiro de 2024 (C.P.C., art.º 138.º, n.º 1).
18. O prazo para reclamar do despacho que determinou a dispensa de realização da audiência prévia terminou em 6 de Fevereiro de 2024 (C.P.T.A., art.º 87.º-B, n.º 4 e art.º 102.º, n.º 5, alínea c)).
19. O decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto (C.P.C., art.º 139.º, n.º 3).
20. A dispensa da realização de audiência prévia constitui acto sujeito à livre apreciação do julgador (C.P.T.A., art.º 87.º-B, n.º 2).
21. O Tribunal o quo fundamentou o motivo justificado de tal decisão, ao considerar que a audiência prévia apenas se destinaria ao fim previsto na alínea b), do n.º 1 do art.º 87.º-A do C.P.T.A.
22. O Tribunal a quo não teve quaisquer dúvidas que o documento apresentado pela Recorrente não constitui o original da Ficha Técnica do equipamento elaborada pelo fabricante C..., Ltd. e que esse documento não cumpre a exigência constante do ponto 1.3 da cláusula 9.ª do programa do concurso.
23. Não é admitida prova por testemunhas quando o facto estiver plenamente provado por documento (Cod. Civil, art.º 393.º, n.º 2).
24. A análise e valoração probatória dos documentos compete exclusivamente ao Tribunal e não às testemunhas.
25. Tendo o Tribunal a quo decidido que os autos continham todos os elementos necessários ao conhecimento do mérito, é desnecessária prova adicional e inexiste qualquer razão para não ser proferida sentença.
26. Em todo o caso, sempre se diz que a Recorrente nunca requereu a produção de prova adicional, quando o poderia e, assim querendo, o deveria ter feito, em devido tempo.
27. Ainda que se admita que era possível à Recorrente, na audiência prévia, apresentar o rol de testemunhas que não apresentou na petição inicial (C.P.T.A., art.º 78.º, n.º 4), essa possibilidade apenas existiria se a audiência prévia não fosse dispensada, o que nos presentes autos, muito correctamente, não aconteceu.
28. Uma proposta que não cumpre o exigido no procedimento tem de ser excluída (C.C.P., art.º 70.º, n.º 2 e 146.º, n.º 2), apenas assim se assegurando o princípio da concorrência.
29. No art.º 39.º das suas alegações, a Recorrente confessa que o documento por si apresentado não corresponde a um documento elaborada pelo fabricante, mas sim a um documento por si feito e que agora podia “refazer”.
30. A pretensa declaração do fornecedor, além de ter sido impugnada, encontra-se redigida em língua inglesa e, portanto, em violação do n.º 1 do art.º 133.º e do n.º 1 do art.º 134.º do C.P.C., pelo que não pode a mesma ser considerada e não produz qualquer prova.
31. Esse documento não explica nem justifica as discrepâncias existentes entre o documento apresentado pela Recorrente e a ficha técnica que o fabricante exibe no seu site, relativamente ao mesmo equipamento (marca Control X, modelo Perform X C-400).
32. Nem explica ou justifica as discrepâncias existentes entre o documento apresentado pela Recorrente e o documento apresentado em outro procedimento de contratação pública relativamente ao mesmo equipamento (marca Control X, modelo Perform X C-400 (docs. n.ºs 3 e 4 juntos com a contestação da Recorrida).
33. A questão que tinha de ser apreciada pelo Tribunal a quo era única e exclusivamente uma – a de saber se o acto de exclusão da proposta da Recorrente foi ou não legal.
34. Resulta claro e inequívoco que o Tribunal a quo se pronunciou sobre a questão que devia apreciar.
35. Não é necessário que o tribunal tome posição sobre todos os argumentos aduzidos pelas partes, mas que conheça todas as questões relevantes para a decisão de direito.
36. As questões sobre as quais o Tribunal tem de se pronunciar não se confundem com os argumentos, as razões e motivações produzidas pelas partes para fazer valer as suas pretensões.
37. A prova documental na qual a douta Sentença se socorreu para formar a sua convicção quanto à única questão formulada – a de saber se a exclusão da proposta da Recorrente é ilegal – não demonstra o pretendido pela Recorrente, mas antes demonstra o alegado pelas Recorridas.
Termos em que, e nos mais que Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deve o recurso interposto pela Autora ser julgado totalmente improcedente e, consequentemente, ser mantida a sentença proferida com o que, uma vez mais, se fará a costumada
JUSTIÇA”

O Tribunal a quo admitiu o recurso como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo, tendo proferido despacho de sustentação concluindo pela não verificação da nulidade de sentença apontada pela Recorrente.

O Ministério Público junto deste TCA Sul, notificado nos termos e para efeitos do disposto no n.º 1, do artigo 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Na sequência de despacho do Tribunal foi junto documento e veio o Recorrido informar que o contrato se encontrava integralmente executado.

Notificados, a CI emitiu pronúncia quanto ao documento junto e a A. veio requerer a modificação do objeto do processo nos termos do art. 45.º do CPTA. Também o R./Recorrido se pronunciou.

Prescindindo-se dos vistos legais, atento o carácter urgente do processo, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II. Delimitação do objeto do recurso

Conforme jurisprudência firmada, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPTA).
Considerando o exposto, cumpre a este Tribunal apreciar se,
(a) Se verifica nulidade (processual) decorrente da preterição de audiência prévia;
(b) O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto à dispensa de audiência prévia;
(c) A sentença recorrida padece de,
(i) Nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão;
(ii) Nulidade por omissão de pronúncia;
(iii) Erro de julgamento por omissão de facto;
(iv) Erro de julgamento quanto ao erro nos pressupostos no que respeita à exclusão da proposta da A./Recorrente;
(v) Erro de julgamento quanto à não condenação da Recorrida como litigante de má fé.


III. Fundamentação de facto

III.1. Na decisão recorrida foi julgada provada a seguinte factualidade:

“Tendo em atenção as posições expressas pelas partes, os documentos juntos aos autos e constantes do processo administrativo, considero, com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, provada a seguinte matéria de facto:

A) O aqui R. CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DO ALGARVE, E.P.E. lançou o concurso público nº 27/2187/2023 para Aquisição de RX para a Unidade Hospitalar de Portimão, através do anúncio de procedimento nº 6595/2023, publicado no DR de 26 de abril de 2023, II série, Parte L cfr. doc. nº 1, junto com a p.i..

B) Consta do Programa do Procedimento, o seguinte:




(…)

(…)

(…)

(…)

(…)

(…)

(…)




- cfr. PA/fls. 245 e 303, do SITAF.

C) Consta do Caderno de Encargos, o seguinte:

“(…)



(…)” – cfr. PA/fls. 303, do SITAF.

D) Em 05/05/2023, o júri prestou os seguintes esclarecimentos:


“(texto integral no original; imagem)”


(…)” – cfr. PA/fls. 379, do SITAF.

E) Em 14/06/2023 foram os concorrentes notificados da retificação às peças do procedimento, decorrente de erros e omissões detetados, onde constava, entre o mais, o seguinte:

“(…)

- cfr. PA/fls. 245, do SITAF.

F) Consta da proposta apresentada pela aqui A. M........, LDA. o documento Ficha Técnica Perform-X C400-PT_REV.pdf, com o seguinte teor:


“(texto integral no original; imagem)”

“(texto integral no original; imagem)”

“(texto integral no original; imagem)”


cfr. PA/fls. 1340, do SITAF e doc. nº 2, junto com a contestação da R..

G) Em 26/07/2023 o júri solicitou ao Serviço de Contencioso e Apoio Jurídico à Contratação do R. a emissão de parecer relativo à proposta apresentada pela A. M........ aí referindo que, “O concorrente em questão apresentou uma ficha técnica em português, após analisada e comparada com a original que se encontra disponível no site do fabricante, foram detectadas algumas discrepâncias pelo júri do procedimento.

Tendo em conta o acima exposto e o facto de não haver uma tradução legal do documento em questão, gostaríamos de saber se existe fundamentação legal para a exclusão do concorrente.” – cfr. PA/fls. 1495 do SITAF.

H) Em 29/08/2023, o júri elaborou o Relatório Preliminar, onde consta o seguinte:

“(…)


“(texto integral no original; imagem)”

(…)

“(texto integral no original; imagem)”


(…)” – cfr. doc. nº 2, junto com a contestação da Contrainteressada.

I) Em 31/08/2023 foram os concorrentes notificados para, querendo, exercerem o direito de audiência prévia – cfr. doc. nº 2, junto com a contestação da Contrainteressada.

J) Em 08/09/2023, o júri elaborou o Relatório Final, onde consta o seguinte:

“(…)


“(texto integral no original; imagem)”


(…)” - cfr. doc. nº 3, junto com a p.i..

K) Em 22/09/2023 foram os concorrentes notificados da decisão de adjudicação cfr. doc. nº 3, junto com a p.i..

L) Em 10/10/2023 foi entre o R. e a Contrainteressada S... celebrado o respetivo contrato – cfr. PA/fls. 157, do SITAF.”


III.2. Quanto aos factos não provados consignou-se na sentença recorrida:

“Não existem factos relevantes para a decisão, em face das possíveis soluções de direito, que importe referir como não provados.”

III.3. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A matéria dada como provada resulta da análise dos documentos constantes dos presentes autos e do processo administrativo e das posições assumidas pelas partes nos respetivos articulados, expressamente indicados em cada um dos pontos do probatório.
Quanto à restante matéria alegada, por se tratarem de meros juízos conclusivos, de valor ou considerações de direito não são os mesmos suscetíveis de ser objeto de juízo probatório (pese embora a sua pertinência nos respetivos articulados).”

III.4. Constatando-se a insuficiência do probatório para, face à causa de pedir alegada pela Recorrente, se conhecer do objeto do recurso, nos termos do n.º 1 do art.º 662 do CPC ex vi art. 140.º, n.º 3 do CPTA, procede-se ao aditamento da seguinte factualidade:

M) A ficha técnica do equipamento Perform-X C400 constante do site da C... tem o seguinte teor,




“(texto integral no original; imagem)”

“(texto integral no original; imagem)”


- cf. doc. de fls. 1734.

N) O equipamento objeto do contrato referido em L) foi entregue e instalado pela CI, encontrando-se em pleno funcionamento na unidade hospitalar do R. – facto admitido por acordo, fls. 1733 e 1749 dos autos.

IV. Fundamentação de direito

1. Da nulidade (processual) decorrente da preterição de audiência prévia

A primeira questão que se levanta no presente recurso é a de saber se ao dispensar a audiência prévia o Tribunal a quo incorreu numa nulidade processual.
Estamos perante a invocação de uma irregularidade processual (omissão de um ato que a lei prescreve), que, em abstrato, nos termos do art. 195.º, n.º 1, do CPC, é passível de ser considerada nulidade processual secundária.
Atento o disposto no art. 196.º do mesmo código, tal nulidade tem de ser arguida, como foi o caso. Sendo certo que, em regra, as nulidades processuais secundárias devem ser arguidas nos termos previstos no art. 199.º do CPC, considerando ainda o prazo geral de cinco dias previsto no art. 102.º, n.º 5 al. c) do CPTA, in casu, uma vez que se trata de omissão – preterição de audiência prévia - do qual a Recorrente só teve conhecimento em simultâneo com a notificação da sentença, é admissível a sua arguição nas alegações de recurso(1).
Não assiste, pois, razão às Recorridas quando alegam que se extinguiu o direito da Recorrente a invocar tal nulidade processual como fundamento no recurso.
Dispõe-se no art. 195.º, n.º 1 do CPC que “[…] a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”.
Como se infere deste dispositivo a omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreve configura uma irregularidade que só determina a nulidade do processado subsequente àquela omissão se influir no exame e decisão da causa, recordando-se que “ [o]legislador em parte alguma esclarece quando é que se deve entender que a irregularidade cometida influiu no exame ou na decisão da causa, pelo que “só caso por caso a prudência e a ponderação dos juízes poderão resolver”– vide Artur Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Volume III, Almedina, 1982, pág. 109” (Ac. do TCA Norte, P. 00545/08.4BEBRG, de 30 de novembro de 2011).
Decorre do art. 87.º-B n.º 2 do CPTA ex vi art. 102.º, n.º 2 do mesmo diploma, “[o] juiz pode dispensar a realização de audiência prévia quando esta se destine apenas ao fim previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo anterior”, prevendo-se no n.º 1 al. b) do art. 87.º - A do CPTA que “[c]oncluídas as diligências resultantes do preceituado no artigo anterior, se a elas houver lugar, e sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, é convocada audiência prévia, a realizar num dos 30 dias subsequentes, destinada a algum ou alguns dos fins seguintes:
(…)
b) Facultar às partes a discussão de facto ou de direito, quando o juiz tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa; (…)”.
O n.º 2 deste artigo 87.º-B do CPTA, alterado pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, redação aplicável aos autos, habilita o juiz da causa a dispensar a realização de audiência preliminar (apenas) destinada a facultar às partes a discussão de facto e de direito, quando pretenda conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa.
No caso, a Sra. Juíza quo proferiu despacho a dispensar a realização da audiência, compreendendo-se que, atentos os requerimentos probatórios apresentados e a matéria em discussão, considerou que a prova (documental) oferecida era suficiente para a apreciação do pedido e que, tendo sido as questões de fundo debatidas nos articulados, estavam reunidos os pressupostos e, consequentemente, proferiu decisão de mérito.
Ora, a não realização da audiência prévia nestas concretas circunstâncias não constitui nulidade processual, não implicando como consequência a revogação do saneador-sentença.
Com efeito, em face da redação do n.º 2 do artigo 87.º-B do CPTA, o Tribunal a quo, ao não convocar as partes para a realização da audiência prévia, quando pretendia conhecer do mérito da causa, não incumpriu com nenhuma formalidade obrigatória na tramitação da ação. Prevendo a lei a possibilidade de dispensa de audiência prévia, a sua não realização não constitui uma nulidade processual.
Questão diversa é a de saber se, no juízo realizado relativamente à verificação dos pressupostos para essa dispensa, o Tribunal a quo errou, mas tal questão redunda, não na nulidade processual, mas sim no erro de julgamento.
Em face do exposto, sem necessidade de outros considerandos, resulta manifesta a improcedência do invocado fundamento de recurso.

2. Do erro de julgamento quanto à dispensa de audiência prévia

Pese embora reconduzindo à nulidade processual – o que não obsta ao seu correto enquadramento pelo Tribunal (art. 5.º, n.º 3 do CPC) - a Recorrente aduz, no essencial, que a produção de prova – designadamente pela consulta da documentação registada junto do Infarmed - permitiria provar a veracidade e autenticidade do documento - ficha técnica -, sendo que a preterição da audiência prévia impediu a alteração ao requerimento probatório da Recorrente a fim de apresentar prova distinta (v.g. testemunhal ou outra).
Invoca, ainda, que a dispensa de audiência prévia, designadamente para efeitos de enunciação de temas da prova e direito de alteração do requerimento probatório, conhecendo de imediato o mérito da causa, negando o direito de prova, representa uma errada interpretação do artigo 88.º, n.º 1, al. b) do CPTA, a violação do direito ao contraditório (art. 3.º, n.º 3 do CPC) e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva (art. 20.º da CRP).
A questão reside, pois, em saber se se encontravam, pois, reunidos os pressupostos para a apreciação imediata do mérito da causa - nos termos do art. 88.º, n.º 1 al. b) do CPTA - que permitiria a dispensa da audiência prévia ou se, como alega a Recorrente, esta se mostrava necessária para o efeito previsto na al. f) do n.º 1 do art. 87.º-A e, consequentemente, para a alteração dos requerimentos probatórios.
Como resulta da petição inicial a A./Recorrente invocou, como fundamento da ação, o erro nos pressupostos de facto imputado à decisão de exclusão da sua proposta por entender que, opostamente ao que resulta do ato impugnado, o documento que apresentou não corresponde a uma tradução (não legalizada) da ficha técnica mas sim ao original da ficha técnica (elaborado pelo fornecedor da A.).
Para o efeito de demonstração do por si alegado a A., de forma expressa, nos pontos 14 e 15 da petição inicial afirma que tal facto “se comprova pela declaração que se junta como DOC 4” e que esta “declaração comprova que a Ficha Técnica apresentada é a Ficha Técnica do Equipamento”. A final, na petição inicial, apresenta requerimento probatório no qual indica apenas prova documental, concretamente 5 documentos, incluindo a declaração que referenciou em sede de causa de pedir.
Importa considerar que é do autor o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito (art. 342.º n.º 1 do CC), impondo-se, nos termos do art. 78.º, n.º 4 do CPTA, a apresentação do rol de testemunhas e a requisição de outros meios de prova no final da petição inicial.
Quando (e se) se realize a audiência prévia, para algum ou alguns dos efeitos previstos no art. 87.º-A n.º 1 do CPTA, as partes podem aí alterar os requerimentos probatórios e, havendo lugar à realização da audiência final, o rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que esta se realize (art. 598.º, n.º 2 do CPC ex vi art. 1.º do CPTA).
Dispõe-se, ainda, no artigo 411º do CPC, sob a epígrafe “Princípio do inquisitório” que “[i]ncumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.”
Se é certo que o juiz tem o dever de realizar ou ordenar oficiosamente as diligências necessárias ao apuramento da verdade, cumpre recordar que “o princípio do inquisitório não concede ao juiz o poder de se substituir às partes, colmatando os seus lapsos ou esquecimentos no que respeita ao ónus de arrolar ou de aditar determinada testemunha ao rol apresentado” (Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 30.1.2019 no processo 639/18.8T8FNC-A.L1-4).
É que, como escreve José Lebre de Freitas (“Introdução ao Processo Civil Conceito e Princípios Gerais à Luz do Novo Código”, 4ª Edição, págs.184 e 185) sobre o princípio da preclusão e da autorresponsabilidade das partes, “[ó]nus, preclusões e cominações ligam-se entre si ao longo de todo o processo, com referência aos atos que as partes, considerada a tramitação aplicável, nele têm de praticar dentro de prazos perentórios. (…).
As partes têm assim o ónus de praticar os atos que devam ter lugar em prazo perentório, sob pena de preclusão e, nos casos indicados na lei, de cominações. A autorresponsabilidade da parte exprime-se na consequência negativa (desvantagem ou perda de vantagem) decorrente da omissão do ato.”
Perante o exposto, resultando da petição inicial que foi a própria Autora/Recorrente quem entendeu que o meio de prova suficiente, necessário e adequado à comprovação do facto por si alegado – o de que a ficha técnica por si apresentada com a proposta correspondia ao original e não a uma tradução (não legalizada) da ficha técnica – era a declaração que juntou como documento número 4, não tendo requerido a produção de prova adicional, nem dando ao Tribunal qualquer indicação quanto à existência de outros meios de prova, naturalmente que estavam reunidos os pressupostos para a dispensa da audiência prévia, como assim decidiu o Tribunal a quo.
Com efeito, o princípio do inquisitório não se destina a que o juiz se substitua às partes no cumprimento dos seus ónus probatórios, pelo que se foi a própria Autora/Recorrente quem reputou suficiente, como meio de prova, o documento que juntou à p.i., não pode, agora (apenas em sede de recurso), sustentar que afinal existiam outros meios de prova, designadamente alegada documentação registada junto do Infarmed, exigindo que o Tribunal – ao abrigo do princípio do inquisitório – adivinhe a sua existência ou de outros meios de prova que nem a própria Autora, atempadamente, juntou ou indicou.
Recorda-se, aliás, que a A./Recorrente, após a notificação das contestações, tomando conhecimento da posição das contrapartes, nas quais era ademais questionado o valor probatório do documento e impugnada a sua genuinidade, tendo apresentado réplica, nem aí requereu a produção de outros meios de prova. Quedando-se, novamente, naquela prova documental que ab initio tinha junto à petição inicial.
Assim, porque no caso a matéria factual objeto de prova se reportava à tramitação do procedimento pré-contratual e aos atos nele praticados, contendo o processo administrativo a prova documental necessária, e, bem assim, quanto ao único facto invocado pela A. esta apenas indicou prova documental, não havendo que produzir outros meios de prova, tendo já sido discutidas nos articulados todas as questões, naturalmente, que não havia que proferir despacho de identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova e, consequentemente, poderia, como foi, nos termos do art. 87.º-B n.º 2 do CPTA, ser dispensada a audiência prévia dado que, era possível conhecer imediatamente o mérito da causa (nos termos do art. 88.º, n.º 1 al. b) do CPTA), esta, a realizar-se, apenas se destinaria à discussão de facto e de direito.
Neste sentido, reunidos que estavam os pressupostos para a dispensa da audiência prévia, e não havendo lugar a audiência prévia, naturalmente que à A./Recorrente não assistia o direito a alterar o requerimento probatório à luz do n.º 6 do art. 87.º-A do CPTA.
O Tribunal, poderia, pois, como fez, avançar de imediato para o conhecimento do mérito da causa em sede de saneador, sem que aqui tenha ocorrido qualquer errónea interpretação do disposto no art. 88.º, n.º 1 al. b) do CPTA.
Note-se que não foi negado o direito de prova à A., o que sucede é que esta não o terá exercido como devia, indicando logo na petição inicial todos os meios de prova necessários à demonstração dos pressupostos constitutivos do seu direito e, nessa medida, não cumpriu com o seu próprio ónus probatório. Perante tal incumprimento deficiente do seu ónus probatório, a A. acarreta, consequentemente, com as desvantagens do mesmo, traduzidas na não realização de outras diligências probatórias. Há que considerar, de resto, que a A. continua a não cumprir com tal ónus de prova, pois que, mesmo neste recurso, limita-se a referenciar alegada documentação registada junto do Infarmed que, em momento algum, identificou cabalmente, nem tão pouco indica qualquer outro meio de prova (não documental) que levasse este Tribunal a concluir que, efetivamente, existia prova a produzir que reclamasse a realização de instrução - e, consequentemente, a elaboração de despacho de prova nos termos do art. 89.º-A n.º 1 do CPTA - a impossibilitar a dispensa da audiência prévia.
Acresce que tal dispensa de audiência prévia não comporta a violação do direito ao contraditório (art. 3.º, n.º 3 do CPC) e do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva (art. 20.º da CRP).
Começando pelo alegado princípio do contraditório, o artigo 3.º nº 3 do CPC dispõe que o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
O princípio do contraditório, ali consagrado, é, como se sabe, um dos princípios basilares estruturantes que enformam o nosso processo civil e assume-se como corolário ou consequência do princípio do dispositivo, destinando-se a proteger o exercício do direito de ação e de defesa.
Sobre este princípio escreve José Lebre de Freitas (ob. cit, pp.126 e 127) que deve ser entendido “como garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todo os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.”.
Ora, não se vislumbra onde tenha sido postergado o direito ao contraditório da A./Recorrente no que respeita ao seu direito à prova. Reitera-se, recaía sobre a A. – e não sobre o Tribunal - o ónus da prova e o dever de, na petição inicial, indicar todos os elementos probatórios dos factos constitutivos do seu direito. Se não o fez sibi imputet. E porque os elementos de prova que apresentou, de natureza documental, determinavam a desnecessidade de mais instrução, naturalmente que não desconhecia que, por esse motivo, o Tribunal poderia dispensar a realização de audiência prévia nos termos do art. 87.º-B n.º 2 do CPTA. Não foi, pois, o Tribunal a negar-lhe qualquer direito à prova ou a violar o seu direito ao contraditório.
No que respeita ao direito à tutela jurisdicional efetiva, recorda-se, no seguimento do Ac. do STA de 11.7.2019, proferido no processo 01403/18.9BELSB, que
“29. Com efeito, importa ter presente, como primeira nota, que se é certo que a CRP consagra nos seus arts. 20.º e 268.º, n.º 4, os direitos à tutela jurisdicional efetiva e a um processo justo, imparcial e equitativo, o qual postula, designadamente, que «[a] todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos», temos que a definição dos meios de tutela jurisdicional desses direitos e interesses, daquilo que são as suas regras de tramitação, os poderes e os ónus que recaem sobre as partes e poderes do julgador, carecem de consagração e concretização legal, não resultando dos direitos em referência a atribuição aos cidadãos de um direito a livremente poderem socorrer-se de todo e qualquer meio processual que considerem adequado para a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, nem que estejam isentos ou desonerados do respeito de regras contendo deveres e ónus/faculdades processuais e/ou das consequências que derivem do seu incumprimento ou da sujeição às decorrências resultantes dos comportamentos desenvolvidos no ou fazendo uso de ónus/faculdades.
30. Na verdade, o legislador, atendendo a outros bens e valores jurídicos que importa que sejam igualmente considerados, procede à definição dos meios ao dispor dos cidadãos para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, disciplina as suas regras e pressupostos, institui deveres, poderes e ónus para as partes, cientes de que o direito a um processo equitativo só se considera violado quando for impossível o estabelecimento de uma relação mínima de equilíbrio ou proporção entre a justificação da exigência processual em causa e a gravidade das consequências ligadas ao incumprimento de tal exigência.”
No caso vertente inexiste uma qualquer ofensa à tutela jurisdicional efetiva, porquanto a A. pôde exercer o seu direito à prova e fê-lo na medida em que o considerou necessário e adequado, assegurando-lhe a lei nesses moldes o direito à tutela jurisdicional efetiva, não sendo tal conclusão infirmada pelas consequências que derivaram do facto de a A. não haver feito uso, em sede e momento próprios, concretamente na sua petição inicial, dos seus poderes e faculdades em matéria de prova.
Cumpre concluir que não incorreu o Tribunal a quo em qualquer erro ao dispensar a audiência prévia, nem tão pouco violou o direito ao contraditório e à tutela jurisdicional efetiva, improcedendo quanto a este fundamento o recurso.

3. Das nulidades da sentença

3.1. Contradição entre os fundamentos e a decisão

A Recorrente imputa nulidade à sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, ex vi do 1.º do CPTA, por considerar que ao decidir, sem produzir prova, que um documento é falsificado porque algumas das suas características levantam “dúvidas”, ou seja, sem formular um juízo de certeza ou convicção quanto à sua falsidade, tal corresponde à insuficiência e contradição entre os fundamentos e a decisão.
O artigo 615.º, n.º 1, do CPC, sob a epígrafe, “Causas de nulidade da sentença”, preceitua que a sentença é nula quando: “c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.
A nulidade da sentença a que se refere este normativo verifica-se quando se constate que os fundamentos de facto e/ou de direito da sentença não podiam logicamente conduzir à decisão que veio a ser tomada no segmento decisório da sentença ou quando neste se verifica uma obscuridade ou ambiguidade que torna a própria decisão ininteligível. Ou seja, a explicação que está subjacente à decisão conduz, logicamente, a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou ocorra alguma ambiguidade, que permite duas ou mais interpretações (ambiguidade), ou não é possível saber com certeza, qual o pensamento exposto na sentença (obscuridade).
Ora, a Recorrente não só não alega, como não demonstra a existência na sentença de fundamentação, seja no âmbito da matéria de facto, seja na de direito, que conduzisse a uma decisão distinta da que foi tomada pelo Tribunal a quo.
E, na realidade, nenhuma contradição se deteta na sentença recorrida.
Com efeito, o Tribunal a quo depois de no ponto F) da fundamentação de facto reproduzir o teor do documento Ficha Técnica Perform-X C400PT_REV.pdf integrante da proposta da A./Recorrente, na decisão de direito dá conta do enquadramento jurídico relativo aos documentos da proposta e às causas de exclusão das propostas, incluindo o ponto 1.3. da cláusula 9.º do PC que determina a exclusão das propostas que não apresentem ficha técnica, e, após analisar o documento, conclui que este não constitui o original da Ficha Técnica do equipamento elaborada pelo fabricante C..., Ltd. e, neste sentido, entende que a proposta foi legalmente excluída nos termos do ponto 1.3. da cláusula 9.º do PC e artº 58º, nº 1, conjugado com o artº 146º, nº 2, al. e) do CCP.
Não se pode confundir, como faz a Recorrente, a nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão, com a eventual insuficiência do probatório – por a prova recolhida não ser suficiente para comprovar a (falta de) correspondência entre o documento apresentado pela A. na sua proposta com o original da ficha técnica – para sustentar a decisão alcançada pelo Tribunal e que corresponde a um erro de julgamento de direito.
Impõe-se, pois, concluir que a sentença não padece da nulidade que lhe é imputada.

3.2. Da nulidade por omissão de pronúncia

A Recorrente alega que o Tribunal omite pronúncia sobre um facto essencial – a declaração do fornecedor – que demonstra o erro na decisão, o que configuraria nulidade da sentença ao abrigo do artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC.
Novamente a Recorrente confunde o erro de julgamento, neste caso de facto, por não ter sido considerado pelo Tribunal o documento 4 junto à sua p.i. correspondente a uma declaração do fabricante do equipamento, com a nulidade da sentença.
Com efeito, o artigo 615.º, n.º 1, do CPC, sob a epígrafe, “Causas de nulidade da sentença”, preceitua que a sentença é nula quando: “d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões que não devia conhecer;”.
A nulidade da sentença a que se refere este normativo verifica-se quando ocorre o incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito nos artigos 95.º, n.º 1 e 3 do CPTA e 608, n.º 2 do CPC, e que se traduz em decidir todas as questões submetidas à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras. No âmbito dos processos impugnatórios esse dever comporta a pronúncia sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o ato (art. 95.º, n.º 3 do CPTA).
Esclarece-se que, como é jurisprudência pacífica, a causa de pedir, ou melhor, as questões a decidir, não se confundem com as razões ou argumentos de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. Pelo que apenas integra a nulidade prevista no citado normativo, a omissão de conhecimento das “questões”, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões.
Ora, considerando a petição inicial, a questão a decidir era se a decisão de exclusão da proposta da A., com fundamento no disposto no art. 146.º, n.º 2 al. e) do CCP) por a ficha técnica por esta corresponder a tradução (não legalizada) da ficha técnica, padecia de erro nos pressupostos, alegando a A. para esse efeito que o documento (redigido em português) que integrava a sua proposta constituía a ficha técnica original do equipamento.
Esta questão foi, como resulta da sentença recorrida, decidida pelo Tribunal, embora em sentido diverso do defendido pela A.. Se no julgamento que fez o Tribunal errou, por não ter considerado um facto que seria atestado pelo documento que a Recorrente juntou à sua p.i., do que se trata é de um erro de julgamento de facto e que, seguidamente, se apreciará.
Não se verifica, pois, qualquer nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

4. Do erro de julgamento de facto

A Recorrente imputa à sentença o erro de julgamento de facto aduzindo que o Tribunal a quo ao ignorar a declaração junta aos autos com documento 4, omite um facto relevante à decisão, concretamente que o próprio fornecedor que atesta que a ficha técnica é verdadeira, foi produzida por si e que corresponde, assim, a documento original.
Decorre do preceituado no n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil (por remissão do n.º 3 do art. 140.º do CPTA) que o Tribunal de recurso deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Importa, todavia, sublinhar que, para que o Tribunal de recurso aprecie a impugnação do julgamento da matéria de facto, demanda-se o cumprimento pelo recorrente de um conjunto de ónus, sob pena de se impor a rejeição do recurso quanto ao julgamento da matéria de facto. Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].
Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que foram cumpridos os referidos ónus, pelo que se irá proceder à apreciação do requerido, isto é, saber se deve ser aditada ao probatório a factualidade alegada pela Recorrente, concretamente que: O próprio fornecedor atesta que a ficha técnica é verdadeira, foi produzida por si e que corresponde, assim, a documento original.
Como resulta dos autos o que estava em causa saber era se o documento com que a Recorrente instruiu a sua proposta, constante do ponto F) dos factos provados e designado Ficha Técnica Perform-X C400PT_REV.pdf correspondia, como alegava a A., ao original da ficha técnica do equipamento ou, como entendeu a entidade adjudicante, a uma tradução (não legalizada) da ficha técnica original e sem correspondência a esta. Para o efeito de comprovar a sua versão a A. juntou à p.i. o documento 4.
Em primeiro lugar, cumpre dar nota que atento o disposto no art. 94.º, n.º 2 e 3 do CPTA e art. 607.º, n.ºs 3 e 4 do CPC, o que está em causa na fundamentação de facto é, sem prejuízo do pleonasmo, a seleção da matéria de facto, entendendo-se como facto “tudo o que se reporta ao apuramento de ocorrências da vida real e de quaisquer mudanças ocorridas no mundo exterior, bem como à averiguação do estado, qualidade ou situação real das pessoas ou das coisas” , sendo que “(..) além dos factos reais e dos factos externos, a doutrina também considera matéria de facto os factos internos, isto é, aqueles que respeitam à vida psíquica e sensorial do indivíduo, e os factos hipotéticos, ou seja, os que se referem a ocorrências virtuais” (Henrique Araújo, A matéria de facto no processo civil, disponível em https://carlospintodeabreu.com/public/files/materia_facto_processo_civil.pdf, consult. Março 2024).
Ora, “[d]evem distinguir-se os factos dos juízos de facto, ou seja, juízos de valor sobre a matéria de facto. Os factos (matéria de facto) abrangem principalmente as ocorrências concretas da vida real. Os juízos de facto situam-se na meia encosta entre os puros factos (que ocorrem na planície terrena da vida) e as questões de direito (situadas nas cumeadas das normas jurídicas)” (Jorge Augusto Pais de Amaral, Direito Processual Civil, 4.ª edição, Almedina, p. 229).
Ademais, a matéria de facto “deve incidir apenas sobre matéria de facto e não conter questões de direito, [d]eve cingir-se às ocorrências da vida real e evitar conceitos jurídicos” (Jorge Augusto Pais de Amaral, ob. cit., p. 219).
Pelo que, “[a]s afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado.” (Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 11 de julho de 2018, proferido no processo nº 1193/16.1T8PRT.P1).
Ora, dizer que “O próprio fornecedor atesta que a ficha técnica é verdadeira, foi produzida por si e que corresponde, assim, a documento original.” corresponde a um juízo conclusivo, isto é, a uma asserção que seria extraída da leitura do documento.
Neste sentido, nunca poderia ser tal facto, ser levado ao probatório nos termos defendidos pela Recorrente.
Na realidade, a existir facto probando este seria que:
Com data de 10 de outubro de 2023, K...s, membro da Direção da C..., com sede em Budapeste, Hungria, emitiu declaração, na qual foi aposta carimbo da C..., com o seguinte teor:
“( texto integral no original; imagem)”
Sucede que, como resulta dos autos, foi impugnada pela Entidade Demandada a genuinidade do referido documento nos termos do art. 444.º do CPC, isto é, a Recorrida questionou a sua autoria por via da impugnação da letra e assinatura (ponto 26.º da contestação), não se limitando a questionar o seu valor probatório como fez a CI.
Notificada a A./Recorrente das contestações, e resultando da réplica que não desconhecia a impugnação da genuinidade do documento (ponto 33), esta nada fez ou requereu para o efeito de convencer da sua genuinidade nos termos do n.º 2 do art. 445.º do CPC.
Emergindo do art. 374.º, n.º 2 do CC que no caso da impugnação da veracidade da letra ou assinatura do documento, incumbe ao apresentante do documento o ónus de prova da sua veracidade, naturalmente que se mostrava afastada a presunção de veracidade do mesmo (n.º 1 do art. 374.º do CC). E, consequentemente, não poderia o Tribunal a quo atender ao mesmo para o efeito probatório pretendido pela A..
Assim, atenta a impugnação da letra ou assinatura do documento número 4, sem que a Recorrente tenha produzido prova destinada a atestar a sua genuinidade, não se mostra estabelecida a autoria do documento, de tal forma que a declaração nele contida não pode ser atribuída ao seu alegado emissor membro da Direção da C....
Assim, sendo, não podia o Tribunal a quo, como não pode este Tribunal, considerar provada tal factualidade seja por conclusivo, que o fornecedor ateste que o documento junto com a proposta corresponde ao original da ficha técnica, seja porque impugnada a sua genuinidade sem que a A./Recorrente tenha provado a autoria, que pelo membro da Direção da C... tenha sido emitida aquela declaração com o referido teor.
Impõe-se, pois, concluir que não enferma a sentença recorrida do erro de julgamento de facto.

5. Dos erros de julgamento de direito

5.1. O erro nos pressupostos no que respeita à exclusão da proposta da A./Recorrente

A Recorrente insurge-se contra a sentença aduzindo, no essencial, que inexiste prova suficiente para se concluir que o documento com que instruiu a proposta não correspondia à ficha técnica original, assentando a exclusão em meras dúvidas, que a declaração do fornecedor permitiria concluir no sentido por si pugnado e que foi desconsiderado o dever de pedir esclarecimentos nos termos do artigo 72.º, n.º 1 do CCP.
A sentença recorrida julgou não verificado o erro nos pressupostos imputado ao ato que excluiu a proposta da A. do procedimento concursal por considerar, em síntese, que o documento Ficha Técnica Perform-X C400-PT_REV.pdf que integrava a proposta da A. não constituía o original da ficha técnica do equipamento elaborado pelo fabricante Control-X Medical, mas antes um “documento feito à medida das exigências do procedimento” porque nele “vêm transcritas as características técnicas indicadas na cláusula 39ª do caderno de encargos relativas ao equipamento de RX” e, nesse sentido, acompanhando o ato impugnado, e as dúvidas resultantes de “a ficha técnica disponível no site do fabricante (em inglês) apresenta[r] discrepâncias com aquela outra em português”, “[f]ace à falta de apresentação de uma ficha técnica original, a apresentação de uma tradução legalizada é fundamental para a confirmação da veracidade dos atributos apresentados e, por conseguinte, a verificação das especificações técnicas do equipamento proposto”, entendeu ser legal a exclusão da proposta da A. que, nos termos do ato impugnado, encontrava o seu fundamento de direito no disposto no artigo 58.º, n.º 1 do CPTA, conjugado com o artigo 146.º, n.º 2, al. e), do CCP.
Como se deu nota na sentença recorrida o critério de adjudicação correspondia, nos termos da cláusula 12.ª do CE, ao da “proposta economicamente mais vantajosa” na modalidade “multifator”, sendo avaliada, além do mais, a valia técnica da proposta, concretamente um conjunto de caraterísticas/especificações técnicas do equipamento de radiologia respeitantes a estação de controlo e imagem, ampola de RX, mesa de exames, suporte vertical, detetor digital do potter vertical, detetor digital sem fios para a mesa e exposições livres, aquisição de extralongos, elencadas no Anexo II. Tais caraterísticas, enunciadas na tabela do Anexo II, constituindo subfactores ao abrigo dos quais é avaliado o fator valia técnica, correspondem a aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência (atributos da proposta).
Prevendo-se, ainda, na cláusula 39.ª do CE as especificações técnicas mínimas exigidas para o equipamento, estas traduzem-se em parâmetros base quando respeitem às caraterísticas que são objeto de avaliação (nos termos do Anexo II) em sede de valia técnica da proposta – vg. quanto à ampola de RX a capacidade térmica do ânodo -, e quando assim não seja estamos perante aspetos da execução do contrato regulados pelo Caderno de Encargos que, não sendo objeto de avaliação, configuram termos ou condições da proposta (art. 42.º, n.º 3 a 5 do CCP) – vg. na ampola de RX a colimação com luz e laser.
Exigiam-se na cláusula 9.ª do PC como documentos integrantes da proposta, além do mais, um documento que contivesse os atributos da proposta, nos termos do art. 57.º, n.º 1 al. b) do CCP, incluindo, por isso, a especificação dos atributos conforme o Anexo II do PC e a Parte II das Clausulas Específicas do CE (ponto 1.2.1 da cláusula 9.ª do PC), mas também, e com expressa previsão de exclusão em caso de não apresentação, de “Ficha/Informação Técnica onde se encontrem devidamente identificados e de forma inequívoca as caraterísticas dos equipamentos propostos” (ponto 1.3. da cláusula 9.ª do PC).
Entenda-se que a “Ficha/Informação Técnica” exigida pelo ponto 1.3. da cláusula 9.ª do PC, devendo conter as caraterísticas dos equipamentos propostos que constituíam aspetos da execução do contrato submetidos e outros não submetidos à concorrência, trata-se de um documento constitutivo da proposta que se enquadra nas als. b) e c) do art. 57.º, n.º 1 do CCP.
Refira-se que, em conformidade com o art. 58.º, n.º 1 do CCP, no n.º 1 da cláusula 8.ª do PC e na cláusula 11.ª do PC exigia-se que todos os documentos que constituem a proposta fossem obrigatoriamente redigidos em português, mas admitindo-se nas referenciadas normas do programa de concurso que, podendo a proposta ser constituída por documentos em língua estrangeira, esta deveria ser acompanhada de “tradução devidamente legalizada e em relação à qual o concorrente declara aceitar a prevalência para todos os efeitos, sobre todos os originais”.
Importa dar nota que, opostamente ao que parece resultar das alegações de recurso do Recorrido (CHUA), o ato impugnado não excluiu “a proposta da recorrente por falta de apresentação do documento previsto no ponto 1.3 da cláusula nona do programa do procedimento”.
Na realidade, o que dele resulta (concretamente do relatório preliminar que foi mantido pelo relatório final e adotadas as propostas estes pelo ato de adjudicação) é que a proposta da A. “contraria a exigência do n.º 1 do art. 58.º do CCP, ficando, assim, preenchida a hipótese prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 146,º do mesmo diploma legal”, porquanto apresenta o documento ficha técnica redigido em português, sem tradução legalizada, verificando-se que esta ficha técnica em português apresenta algumas discrepâncias quando “analisada e comparada com a original que se encontra disponível no site do fabricante”.
Importa, em primeiro lugar, considerar o fundamento ao abrigo do qual foi excluída a proposta da A.
Nos termos do art. 146.º, n.º 2 al. e) do CCP são excluídas as propostas que “não cumpram o disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 57.º ou nos n.ºs 1 e 2 do artigo 58.º”, ou seja, para o que releva a estes autos, é causa de exclusão das propostas a apresentação de documentos não redigidos em língua portuguesa, salvo nos casos em que o programa de procedimento expressamente autorize a redação em língua estrangeira nos estritos termos previstos no n.º 2 do art. 58.º do CCP.
Recorda-se, ainda, que por forma a salvaguardar a concorrência, as causas de exclusão das propostas são consideradas taxativas e devem ser interpretadas restritivamente, não se admitindo a interpretação extensiva e muito menos a analógica (entre outros, Ac. TCA Norte de 19.2.2021, P. 00731/20.9BELSB).
Ora, a circunstância de a A. ter junto um documento que designou de Ficha Técnica, redigido em português, mas relativamente ao qual, no essencial, a entidade adjudicante - por ter dúvidas quanto a corresponder ao original da ficha técnica do equipamento elaborada pelo fabricante, dado que, como resulta do ponto G) do probatório, teria consultado o site do fabricante e verificado que a ficha técnica (redigida em português) constante da proposta da A. apresentava discrepâncias com aquela - considerou estarmos perante uma tradução não legalizada, não integra a causa de exclusão tipificada na al. e) do n.º 2 do art. 146.º do CCP.
Com efeito, à causa de exclusão prevista neste normativo subsumir-se-ia a apresentação de um documento da proposta redigido em língua estrangeira sem ser acompanhado da respetiva tradução legalizada como era exigido pelo Programa de Concurso.
Mas a situação dos autos é diversa, o concorrente apresenta o documento – ficha técnica - redigido em português, mas a entidade adjudicante, por ter dúvidas que o mesmo corresponda ao original da ficha técnica, reputa estarmos perante uma tradução que, porque não legalizada, não permitiria atestar a veracidade dos atributos e, consequentemente, o cumprimento das especificações técnicas previstas no CE.
Sucede que tal hipótese não integra a causa de exclusão tipificada no art. 146.º, n.º 2 al. e) do CCP e, nessa medida, não poderia a proposta da Recorrente ser excluída com tal fundamento.
Note-se que, de igual modo, não está em causa – como parece agora defender o Recorrido – a falta de apresentação de documento, nos termos do art. 146.º, n.º 2 do al. d) do CCP.
Este normativo prevê que são excluídas as propostas que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 57.º. Ou seja, tipifica-se o efeito da exclusão pelo facto de a proposta ser apresentada sem todos os documentos que a devam constituir, o que abrange os documentos que contenham os atributos e os documentos que contenham os termos ou condições (irregularidade formal).
Assim, esclarece Pedro Fernández Sánchez (Direito da Contratação Publica, Vol II, p. 230 e 231) que o que está em causa é a falta de cumprimento de uma exigência de tipo documental, ou seja, quando essencialmente se verifica, de forma imediata, que um dos documentos obrigatoriamente constitutivos da proposta e exigidos no programa do procedimento – desde que incidente sobre atributos ou termos e condições da proposta – está em falta.
Sucede que o concorrente apresenta, efetivamente, o documento exigido pelo ponto 1.3. da cláusula 9.ª do PC, redigido em português (como demandam as cláusulas 8.ª e 11.ª do PC e o art. 58.º, n.º 1 do CCP). E, por isso, também não estamos perante tal causa de exclusão.
Na realidade, a hipótese dos autos reconduzir-se-ia à causa de exclusão tipificada na al. m) do n.º 2 do art. 146.º do CCP, ou seja, a proposta ser constituída por documentos falsos. Com efeito, o que está em causa é a apresentação pelo concorrente de um documento que afinal não corresponderia à ficha técnica, mas sim a um documento (ficha técnica) adulterado ou, no sentido que emerge da sentença recorrida um “documento feito à medida das exigências do procedimento”.
A respeito desta causa de exclusão escreve Pedro Fernández Sanchéz (Direito da Contratação Pública, vol. II, 2020, p. 237) “trata-se de um ato (em princípio enquadrável num ilícito criminal) de falsificação de documentos que foram ou deveriam ser emitidos por terceiros. Devido à sua gravidade, a lei não exige neste ponto, sequer, a demonstração de qualquer censurabilidade (“culpa”) pelo concorrente. A simples verificação desse facto importa a exclusão a proposta.”
Importa considerar que a falsidade no documento particular consiste em nele se mostrar exarada uma declaração que o seu autor não fez, entendendo-se que há falsificação de documento quando o agente vicia um documento preexistente, alterando em parte o seu conteúdo, inserindo-lhe novos factos ou suprindo dizeres (Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 7.12.2012, proc. 506/05.5JAFAR.E1).
Da comparação entre a ficha técnica constante do site do fabricante (facto M)) com o documento junto à proposta da A./Recorrente (facto F)) verifica-se que, efetivamente, não existe total identidade entre os mesmos, desde logo, o primeiro encontra-se redigido em inglês e o segundo em português e, no que respeita ao conteúdo, a ficha técnica constante da proposta da A. contém elementos adicionais. Com relevância, a sua terceira página não só não consta da ficha técnica constante do site do fabricante como se verifica que configura uma reprodução literal das especificações técnicas constantes da cláusula 39.ª do Caderno de Encargos.
Mas estes elementos podendo indiciar a falta de genuinidade do documento que a Recorrente juntou à sua proposta como correspondendo à ficha técnica (exigido pelo ponto 1.3. da cláusula 9.ª do PC), não são por si só suficientes a que se possa concluir que o documento é falso.
Com efeito, para tanto importava que existissem elementos probatórios mais consistentes, designadamente recolhidos juntos do fabricante, que atestassem que a ficha técnica junta pela Recorrente à sua proposta havia sido adulterada. Com efeito, é que nada obsta a que o fabricante disponha de fichas técnicas elaboradas nas várias línguas dos clientes que fornece, nem tão pouco que faça ajustamentos a estas de forma a refletir com maior acuidade as caraterísticas dos equipamentos, designadamente por referência às especificações técnicas exigidas num determinado procedimento concursal.
Reconhece-se que, efetivamente, surge como estranho o decalque das especificações técnicas constantes do CE, sabido que, por regra, as fichas técnicas destinando-se a fornecer informações detalhadas e específicas sobre um produto, descrevendo as características, especificações, usos e outras informações relevantes, consubstanciam documentos genéricos, não específicos a determinado procedimento. Contudo, nem sempre assim o será, nada obstando a que o fabricante – ainda que a pedido do fornecedor - emita um documento – que também corresponderá a ficha técnica – com maior aproximação a determinado procedimento concursal.
Neste sentido, ainda que estivéssemos, nas palavras do Tribunal a quo, perante um “documento feito à medida das exigências do procedimento” daí não resulta, à míngua de prova cabal e não apenas de alguns indícios, que o mesmo seja um documento falso.
Pelo que, no caso, nem sequer ao abrigo da al. m) do n.º 2 do art. 146.º do CCP poderia a proposta da Recorrente ser excluída.
Face ao exposto, impõe-se concluir que a sentença recorrida, ao reputar não verificado o vício de erro nos pressupostos mantendo o ato que excluiu a proposta da Recorrente e, consequentemente, julgando a ação improcedente, enferma do erro de julgamento que lhe é imputado.

5.2. A litigância de má fé

A Recorrente aduz, ainda, que a decisão recorrida enferma de erro de julgamento no que respeita à não condenação do Recorrido como litigante de má fé.
Recorda-se que, em sede de réplica, a A./Recorrente pugnava pela condenação do Recorrido em multa e indemnização por litigância de má-fé, avançando que na contestação o R. insinua que a A. manipulou a proposta do fornecedor para produzir uma ficha técnica falsa e que pretendia burlar a R. ao vender um equipamento que não corresponde ao que declarava, considerando que constituem “afirmações gravíssimas, insultuosas, difamatórias e que excedem todos os limites de uma defesa legítima”.
Dispõe o art. 542.º do Código de Processo Civil que “Tendo litigado de má-fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.”
E, nos termos do n.º 2 do citado preceito legal:
“Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.”
Refira-se que se consideram princípios estruturantes do processo civil e do processo administrativo, os princípios da cooperação e da boa-fé processual consagrados no art. 8.º do CPTA e 7.º, n.º 1 do CPC. Correspondendo a cooperação à responsabilidade conjunta dos intervenientes processuais para colaborarem, entre si, para que o processo alcance, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio e a boa-fé a norma de conduta que estabelece as balizas de atuação imputando-lhes uma conduta proba leal (sentido objetivo) e que, em sentido subjetivo, pode ser a convicção errónea e não culposa da existência de um facto, direito ou validade de negócio.
A violação do dever de cooperação a que se encontram legalmente adstritas as partes e os seus mandatários, quando essa infração decorra de uma quebra da boa-fé processual em sentido objetivo ou subjetivo, é suscetível de os fazer incorrer em litigância de má-fé.
As situações de litigância de má-fé elencadas no n.º 2 do art. 542.º do CCP correspondem a hipóteses de má-fé substantiva ou material, relacionadas com o mérito da causa (als. a) e b)) ou má fé instrumental em que se qualifica o comportamento processual das partes (als. c) e d)).
Condena-se a parte como litigante de má-fé porque ao exercer o direito de ação ou defesa ou ao utilizar os meios que a lei adjetiva coloca ao seu dispor, a parte incorre num ilícito processual.
Adiante-se que se considera sancionável a título de má-fé, a lide dolosa e, ainda, a lide temerária baseada em situações de erro grosseiro ou culpa grave.
No dolo substancial deduz-se pretensão ou oposição cuja improcedência não poderia ser desconhecida – dolo direto – ou altera-se a verdade dos factos, ou omite-se um elemento essencial – dolo indireto; no dolo instrumental faz-se dos meios e poderes processuais um uso manifestamente reprovável.
Verifica-se a negligência grave naquelas situações resultantes da falta de precauções exigidas pela mais elementar prudência ou das desaconselhadas pela previsão mais elementar que devem ser observadas nos usos correntes da vida (Maia Gonçalves, C.Penal, anotado, pg.48). O parâmetro de aferição do dever de diligência a ser considerado é o da generalidade das pessoas ou de todas as pessoas, pertencentes à mesma categoria social e intelectual da parte real, colocada naquela situação em concreto.
Tem-se entendido, por isso, que a sustentação de teses controvertidas na doutrina e/ou jurisprudência e a interpretação de regras de direito, ainda que especiosamente feitas, ou a dedução de pretensão ou oposição cujo decaimento sobreveio por fragilidade de prova, não integram litigância de má-fé.
Em qualquer caso, a conclusão pela atuação da parte como litigante de má-fé será sempre casuística, não se deduzindo mecanicamente da previsibilidade legal das alíneas do art. 456.º do Código de Processo Civil e a responsabilização e condenação da parte como litigante de má-fé só deverá ocorrer quando se demonstre nos autos, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu, conscientemente, de forma manifestamente reprovável, com vista a impedir ou a entorpecer a ação da justiça.
Em face do exposto, como se deu nota na sentença recorrida, na sua contestação “limitou-se o R. a apresentar a sua versão dos factos e do regime legal concretamente aplicável, com vista a sustentar a legalidade do ato de exclusão da proposta da A..”.
Efetivamente, lida essa contestação verifica-se que o Recorrido, prosseguindo na linha que decorria do ato impugnado, sustenta que “analisada e comparada com a ficha técnica disponibilizada no site do fabricante” o júri detetou discrepância com a ficha técnica apresentada pela A. que deixou dúvidas quanto às reais caraterísticas técnicas, considerando que “o documento apresentada pelo autora não é um original, mas sim uma tradução feita por si” e, nessa medida, não cumpriu os requisitos impostos pelo CE e pelo PC. E, no exercício dos seus direitos processuais previstos no art. 444.º do CPC, o R. impugna a genuinidade do documento que a A. junta aos autos para demonstração do facto por si alegado de que a ficha técnica por si apresentada correspondia à original.
Ora, como é patente, o Recorrido não litiga de má-fé. Na realidade limita-se a, no exercício do seu direito de defesa, sustentar a validade do ato impugnado em termos que não revelam que a dedução de oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, a alteração da verdade dos factos ou omissão de factos relevantes para a decisão da causa, a prática de omissão grave do dever de cooperação, ou um uso manifestamente reprovável processo ou dos meios processuais, que, ademais, há que dar conta que a A./Recorrente nem sequer enquadra normativamente.
Não estamos, pois, perante qualquer atuação dolosa ou negligente do Recorrido que coubesse nas previsões do art. 542.º do CPC, não assistindo à A./Recorrente qualquer direito a ser indemnizada, nem se impondo, como decidiu o Tribunal a quo a aplicação de qualquer multa.
Nesta medida, o Tribunal a quo não incorreu a esse respeito em qualquer erro de julgamento.

6. Do conhecimento em substituição e da modificação do objeto do processo

Face à verificação do erro de julgamento no que respeita à apreciação feita pelo Tribunal a quo quanto ao erro nos pressupostos imputado ao ato impugnado, cumpre a este Tribunal de recurso, em substituição, conhecer das pretensões de anulação do ato de exclusão da proposta da A., adjudicação à CI, anulação do contrato celebrado e de condenação do R. a reformular os atos procedimentais subsequentes e adjudicar à proposta da A.
Como resulta do exposto supra, o Tribunal considerou verificado o erro nos pressupostos quanto à decisão de exclusão da proposta da A. o que, consequentemente, determina a anulação do ato de exclusão da proposta da A. e adjudicação à CI nos termos do art, 163.º do CPA.
Impõe-se, contudo, aferir se a A. tem direito à adjudicação.
Nos termos do art. 100.º, n.º 1 do CPTA, é admissível no âmbito dos processos urgentes do contencioso pré-contratual a cumulação de pedidos de anulação de um ato de conteúdo positivo em favor de terceiro, com a condenação à sua substituição por outro que dê satisfação ao interesse pretensivo da parte na adjudicação.
Ponto é que a situação de facto emergente dos autos seja subsumível no quadro determinado pelos arts. 66.º e 67.º do CPTA do “ato legalmente devido”, no sentido de ato “(..) cuja prática é imposta à Administração por lei, por regulamento ou, até, por contrato ou acto administrativo anteriores, imposta, em suma, por um qualquer antecedente jurídico que disponha vinculadamente sobre um acto administrativo a praticar pela Administração – independentemente de ele vir aí total ou só parcialmente conformado -, não dando, nessa medida, margem para avaliações próprias (discricionárias ou similares) suas.
Por outras palavras: a conformação normativa do acto administrativo ilegalmente omitido ou recusado não respeita necessariamente a todos os seus elementos, nomeadamente ao seu quid (conteúdo), podendo cingir-se, até, apenas ao an ou quando da sua actuação, isto é, ao dever de se pronunciar, de tomar uma qualquer decisão sobre uma situação administrativa - caso em que a condenação judicial à prática do acto devido poderá limitar-se (esquecendo por ora a existência de outros limites da discricionariedade administrativa) à imposição de a Administração decidir expressamente sobre tal situação. Em tudo o mais, a determinação do acto em causa pode depender de juízos de avaliação discricionária próprios (e exclusivos) da Administração, pelo que, nestas circunstâncias, ela só será condenada a observar as vinculações a que está submetida na prática desse acto. (..)” (Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, CPTA / ETAF – Anotados, Vol. I, Almedina/2004, págs. 413 e 441).
Deste modo, “(..) será devido o acto que seja exigido por uma previsão normativa, ditando esta o seu carácter vinculado quanto à sua prática/realização (quanto ao “se”) e quanto ao momento (quanto ao “quando”) da sua verificação – dois elementos essenciais para ser possível a condenação da Administração a agir. A isto acresce que esteja a ser reclamado por quem efectivamente o possa exigir.
Quanto ao conteúdo, o ser um acto vinculado não é imprescindível para ser possível a procedência da acção de condenação, sendo que, nesse caso, a sentença condenatória será proferida com um conteúdo mais limitado. (..)” (Paula Barbosa, A acção de condenação no acto administrativo legalmente devido, aafdl/Lisboa/2007, pág. 90).
Assim, o art. 71.º do CPTA sob a epígrafe “Poderes de pronúncia do Tribunal” dispõe que,
1 - Ainda que o requerimento apresentado não tenha obtido resposta ou a sua apreciação tenha sido recusada, o tribunal não se limita a devolver a questão ao órgão administrativo competente, anulando ou declarando nulo ou inexistente o eventual ato de indeferimento, mas pronuncia-se sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do ato devido.
2 - Quando a emissão do ato pretendido envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permita identificar apenas uma solução como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do ato a praticar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do ato devido.
3 - Quando tenha sido pedida a condenação à prática de um ato com um conteúdo determinado, mas se verifique que, embora seja devida a prática de um ato administrativo, não é possível determinar o seu conteúdo, o tribunal não absolve do pedido, mas condena a entidade demandada à emissão do ato em questão, de acordo com os parâmetros estabelecidos no número anterior.
Também o art. 95.º do CPTA estabelece no número 5 que “[q]uando no processo tenha sido deduzido pedido de condenação da Administração à adoção de atos jurídicos ou comportamentos que envolvam a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa, sem que a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma atuação como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do ato jurídico ou do comportamento a adotar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração.”
Daqui resulta que na medida do critério de adjudicação escolhido pela entidade adjudicante e desde que não se apresentem espaços próprios de discricionariedade administrativa ou de margem de livre apreciação sobre as qualidades da proposta, é admissível, em via de cumulação de pedidos de anulação do ato ambivalente (positivo) e de condenação na sua substituição por outro a favor da parte peticionante, condenar a entidade administrativa no ato de adjudicação devido.
Como decorre dos arts. 70.º e ss., 139.º, 146.º e ss. do CCP, apresentadas as propostas, são estas abertas pelo júri que procede à sua análise e avaliação para posterior ordenação. A fase da análise das propostas corresponde, em síntese, ao exame de todos os documentos que as constituem e tudo o que contêm quanto aos atributos, termos e condições, documentação e informação que o Programa do Procedimento exigem e confrontação com os parâmetros de que depende a admissão das propostas. A avaliação das propostas consiste na subsunção dos atributos nos fatores que densificam o critério de adjudicação, sendo seguida da ordenação das propostas em função dos resultados obtidos na fase de avaliação.
No caso em apreço, constata-se que o critério de adjudicação correspondeu no Concurso em causa ao da proposta economicamente mais vantajosa, na modalidade multifactor, sendo objeto de avaliação o preço, a valia técnica da proposta e a garantia/assistência técnica e prazo de entrega. Mais se constata que, além da proposta da A., foi ainda apresentada proposta pelos concorrentes S........, Lda. e P........S.A..
Ora, por força da decisão de exclusão da proposta da A., o júri não desenvolveu atividade procedimental que envolve a formulação de juízos valorativos a respeito da análise e avaliação da proposta da A., que se integram na margem de livre apreciação da Administração, e à qual este Tribunal não se poderia substituir.
Não estamos, pois, perante uma situação em que, seja por força do critério de adjudicação, seja por força da exclusão de todas as demais propostas, o caso concreto apenas permita identificar como solução como legalmente possível a adjudicação do contrato objeto do procedimento concursal à A.. E, nesse sentido, não é também patente que os vícios de que enferma o ato de adjudicação seriam causa adequada e suficiente para a anulação do contrato celebrado entre as Recorridas, CI e a Entidade Demandada (art. 283.º, n.º 2 do CCP).
Na realidade, apenas haveria lugar à anulação do ato de exclusão da proposta da A. e adjudicação à proposta da CI e, considerando o vício de que o mesmo padece, tal determinaria que o procedimento pré-contratual fosse retomado, procedendo o júri a nova análise e avaliação das propostas, elaborando relatório preliminar, submetendo-o a audiência prévia, elaborando um novo relatório final fundamentado e, se do mesmo resultasse a alteração das propostas que emergem do relatório preliminar, submetê-lo a audiência prévia e elaborar um novo relatório final fundamentado, no qual fossem ponderadas as observações dos concorrentes, seguindo-se a aprovação e tomada de decisão de adjudicação ou não adjudicação pelo órgão competente.
Sucede que como resulta do probatório o contrato entre a CI e o Recorrido foi celebrado e o equipamento objeto do contrato referido em L) foi entregue e instalado pela CI, encontrando-se em pleno funcionamento na unidade hospitalar do R. (facto L)).
De acordo com o artigo 102.º do CPTA, atinente à tramitação do contencioso pré-contratual, “(…) 8 - No âmbito do contencioso pré-contratual, há lugar à aplicação do disposto nos artigos 45.º e 45-A.º, quando se preencham os respetivos pressupostos. (…)”.
Prevê o artigo 45.º do CPTA, relativo à modificação do objeto do processo, que
“1 - Quando se verifique que a pretensão do autor é fundada, mas que à satisfação dos seus interesses obsta, no todo ou em parte, a existência de uma situação de impossibilidade absoluta, ou a entidade demandada demonstre que o cumprimento dos deveres a que seria condenada originaria um excecional prejuízo para o interesse público, o tribunal profere decisão na qual:
a) Reconhece o bem fundado da pretensão do autor;
b) Reconhece a existência da circunstância que obsta, no todo ou em parte, à emissão da pronúncia solicitada;
c) Reconhece o direito do autor a ser indemnizado por esse facto; e
d) Convida as partes a acordarem no montante da indemnização devida no prazo de 30 dias, que pode ser prorrogado até 60 dias, caso seja previsível que o acordo venha a concretizar-se dentro daquele prazo.
2 - Na falta do acordo a que se refere a alínea d) do número anterior, o autor pode requerer, no prazo de um mês, a fixação judicial da indemnização devida, mediante a apresentação de articulado devidamente fundamentado, devendo o tribunal, nesse caso, ouvir a outra parte pelo prazo de 10 dias e ordenar as diligências instrutórias que considere necessárias.
3 - Na hipótese prevista no número anterior, o autor pode optar por pedir a reparação de todos os danos resultantes da atuação ilegítima da entidade demandada, hipótese na qual esta é notificada para contestar o novo pedido no prazo de 30 dias, findo o que a ação segue os subsequentes termos da ação administrativa.
4 - O disposto na alínea d) do n.º 1 e nos n.ºs 2 e 3 não é aplicável quando o autor já tinha cumulado na ação o pedido de reparação de todos os danos resultantes da atuação ilegítima da entidade demandada, hipótese na qual o tribunal dá ao autor a possibilidade de ampliar o pedido indemnizatório já deduzido, de modo a nele incluir o montante da indemnização adicional que possa ser devida pela ocorrência das situações previstas no n.º 1. 5 - [Revogado].”.
Refere o artigo 45.º-A do CPTA, em relação à extensão do regime, que
“1 - O disposto no artigo anterior é aplicável quando, tendo sido deduzido pedido respeitante à invalidade de contrato por violação das regras relativas ao respetivo procedimento de formação, o tribunal:
a) Verifique que já não é possível reinstruir o procedimento pré-contratual, por entretanto ter sido celebrado e executado o contrato;
b) Proceda, segundo o disposto na lei substantiva, ao afastamento da invalidade do contrato, em resultado da ponderação dos interesses públicos e privados em presença. (…)”.
Donde, por remissão para os artigos 45.º e 45.º-A do CPTA, o n.º 8 do artigo 102.º do mesmo Código proporciona ao autor, através de uma modificação objetiva da instância no âmbito do processo declarativo, a reparação dos danos que ele possa ter sofrido pelo facto de já não ser possível obter a satisfação integral do seu interesse primário, limitando-se o Tribunal, deste modo, a antecipar um juízo sobre a existência de uma situação que seria geradora de uma causa legítima de inexecução da sentença.
Assim, a indemnização a atribuir por efeito da modificação objetiva da instância, nos termos do artigo 45.º do CPTA, visa reparar o prejuízo resultante para o autor do facto de não poder obter a sentença que seria proferida se não operasse uma situação de impossibilidade absoluta ou de excecional prejuízo para o interesse público, correspondendo à indemnização devida, ao abrigo do artigo 166.º do CPTA, no âmbito do processo executivo, por causa legítima de inexecução.
Pelo que, quando se verifique que a pretensão do autor é fundada, mas que à satisfação dos seus interesses obsta, no todo ou em parte, a existência de uma situação de impossibilidade absoluta, ou a entidade demandada demonstre que o cumprimento dos deveres a que seria condenada originaria um excecional prejuízo para o interesse público, o Tribunal profere decisão na qual reconhece o bem fundado da pretensão do autor, reconhece a existência da circunstância que obsta, no todo ou em parte, à emissão da pronúncia solicitada, reconhece o direito do autor a ser indemnizado por esse facto e convida as partes a acordarem no montante da indemnização devida no prazo de 30 dias, prorrogável até 60 dias, caso seja previsível que o acordo se concretize em tal prazo.
Ora, como se extrai do n.º 1 al. a) do artigo 45.º-A do CPTA a aplicabilidade do regime da modificação objetiva da instância disciplinado no artigo 45.º do CPTA ocorre, designadamente, quando o Tribunal verifique que já não é possível reinstruir o procedimento pré-contratual, por entretanto ter sido celebrado e executado o contrato.
Como dissemos, do probatório resulta que o contrato entre a CI e o Recorrido foi celebrado e executado, pelo que há que reconhecer a existência de circunstância que obsta, no todo, à emissão da pronúncia solicitada pela A./Recorrente. Concretamente a impossibilidade de reinstruir o procedimento concursal e, consequentemente, tem a A. direito a ser indemnizada pelo facto da inexecução.
Impondo-se, pois, a baixa dos autos à 1.ª Instância para que se proceda ao convite a que se reporta o art. 45.º, n.º 1 al. d) do CPTA, seguindo-se, sendo caso disso, a tramitação prevista no art. 45.º n.ºs 2 e 3, ex vi art. 102.º n.º 6, ambos do CPTA.

Da condenação em custas

As custas do presente recurso ficam a cargo da Recorrente e dos Recorridos, Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE e S........, Lda. responsáveis pelas custas, na proporção, respetivamente, de 20% e 80% (arts. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).
Em 1.ª instância, as custas da ação são a suportar pela ED, ficando a cargo da A. as custas relativas ao incidente de litigância de má-fé (arts. 527.º n.ºs 1 e 2 e 539.º, n.º 1 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).

V. Decisão

Nestes termos, acordam os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul, em,
a. Conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida na parte em que julgou a ação improcedente, mantendo-se esta na parte correspondente à improcedência do pedido de condenação do R./Recorrido como litigante de má-fé;
b. Em substituição,
(i) Reconhece-se o bem fundado das pretensões de anulação da deliberação do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve, EPE de 21.9.2023 que determinou a exclusão da proposta da A. e adjudicação do contrato tendo por objeto a “Aquisição de um Equipamento de Rx para a Unidade Hospitalar de Portimão, no Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE” à CI, S........, Lda. e de condenação do R./Recorrido, Centro Hospitalar do Algarve, EPE, a retomar o procedimento concursal, procedendo o júri a nova análise e avaliação das propostas, sem reincidir na ilegalidade praticada, prosseguindo com a sua normal tramitação;
(ii) Reconhece-se que à anulação da deliberação do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve, EPE de 21.9.2023 que determinou a exclusão da proposta da A. e adjudicação do contrato tendo por objeto a “Aquisição de um Equipamento de Rx para a Unidade Hospitalar de Portimão, no Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE” à CI, S........, Lda. e de condenação do R./Recorrido, Centro Hospitalar do Algarve, EPE, a retomar o procedimento concursal, procedendo o júri a nova análise e avaliação das propostas, sem reincidir na ilegalidade praticada, prosseguindo com a sua normal tramitação, obsta, em todo, a impossibilidade de reinstruir o procedimento pré-contratual, por entretanto ter sido celebrado e executado o contrato;
(iii) Reconhece-se que pelo facto referido em (ii) a A. tem direito a ser indemnizada;
E, em consequência,
(iv) Determina-se a baixa dos autos ao TAC de Lisboa, a fim de ser proferido despacho a convidar a autora e os réus para, no prazo de 30 (trinta) dias - sem prejuízo da sua prorrogação até 60 dias, caso seja previsível que o acordo venha a concretizar-se em momento próximo -, acordarem no montante da indemnização devida à autora, seguindo a tramitação prevista no art. 45.º n.ºs 2 e 3, ex vi art. 102.º n.º 6, ambos do CPTA.
c. Condena-se a Recorrente e os Recorridos, Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE e S........, Lda., nas custas do recurso, na proporção, respetivamente, de 20% e 80%;
d. Condena-se a ED nas custas da ação em 1.ª instância e a A. nas custas relativas ao incidente de litigância de má-fé.
Mara de Magalhães Silveira (relatora)
Catarina Gonçalves Jarmela (1.ª adjunta)
Ana Cristina Lameira (2.ª adjunta)

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(1)V. o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo de 15.09.2011 (Processo: 0505/10). V. igualmente os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 25.11.2015 (Processo: 0839/15), de 12.02.2015 (Processo: 0373/14), de 29.01.2015 (Processo: 01311/13), de 29.01.2014 (Processo: 0663/13), do Tribunal Central Administrativo Norte, de 28.09.2017 (Processos: 00203/14.0BEMDL e 00193/14.0BEMDL), de 12.07.2013 (Processo: 00127/07.8BEBRG) e de 30.11.2016 (Processo: 00109/14.3BEMDL) e o do Tribunal Central Administrativo Sul de 12.05.2016 (Processo: 09475/16).