Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 52/24.8BCLSB |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 10/16/2024 |
| Relator: | RUI PEREIRA |
| Descritores: | JUSTIÇA DESPORTIVA SUBSTÂNCIAS DOPANTES NULIDADE DO PROCESSO DISCIPLINAR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO PUNITIVA AUSÊNCIA DE PROVA ERRO NA APLICAÇÃO DA MEDIDA DA PENA |
| Sumário: | I– Na ausência de prazo de caducidade para o procedimento disciplinar a cargo das obrigações internacionais, do ponto de vista doméstico – e a jurisprudência nacional está pacificada nesse sentido –, os prazos dos procedimentos disciplinares são tidos como meramente ordenantes e não peremptórios. II– Nos termos do artigo 72º, nº 1 da Lei nº 81/2021, o processo disciplinar é secreto, pelo que o infractor não pode ter acesso ao mesmo. III– O relatório final não é o mesmo que decisão final, não estando em causa o direito ao contraditório, já que o arguido tem a oportunidade de ser ouvido em sede de audiência preliminar, nos termos do artigo 72º, nº 5 da Lei nº 81/2021. IV– A falta de notificação do relatório final ao arguido, previamente ao seu envio ao órgão decisor, não coloca em causa a possibilidade do exercício do contraditório ou o exercício do direito de defesa do mesmo, uma vez que tal notificação prévia não se encontra prevista na lei, nem do quadro legal resulta que aquela notificação prévia seja devida. V– Nos termos do artigo 13º da Lei nº 81/2021, “à concessão de uma autorização de utilização terapêutica, bem como à revisão ou ao recurso de uma decisão de autorização de utilização terapêutica, aplicam-se os critérios e regras definidos no Código Mundial Antidopagem e na Norma Internacional de Autorizações de Utilização Terapêutica, cabendo à ADoP, através da CAUT, proceder à recepção, análise e aprovação das solicitações de autorização de utilização terapêutica de substâncias e métodos proibidos, relativamente a praticante desportivo nacional, e à respectiva federação desportiva internacional, relativamente a praticante desportivo internacional”. VI– A condenação do arguido em processo disciplinar não exige uma certeza absoluta, férrea ou apodíctica da sua responsabilidade, bastando que os elementos probatórios coligidos a demonstrem segundo as normais circunstâncias práticas da vida e para além de uma dúvida razoável. VII– Nos juízos de facto a emitir num processo disciplinar, é lícito à Administração usar das presunções naturais que se mostrem adequadas. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Indicações Eventuais: | Subsecção SOCIAL |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL – SUBSECÇÃO SOCIAL I. RELATÓRIO 1. J.......... com os sinais dos autos, impugnou junto do Tribunal Arbitral do Desporto a decisão disciplinar proferida pela Subcomissão do Colégio Disciplinar Antidopagem da Autoridade Nacional Antidopagem de Portugal que, no âmbito do processo disciplinar nº ..../2022/CDA, lhe aplicou a pena de suspensão da prática da actividade desportiva por um período de quatro anos, por violação de norma antidopagem, constante do artigo 5º, nº 2, alínea g) da Lei Antidopagem no Desporto (Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro). 2. O Tribunal Arbitral do Desporto, por acórdão arbitral datado de 26-2-2024, decidiu por unanimidade julgar a impugnação improcedente e absolveu a entidade demandada do pedido. 3. Inconformado com tal decisão, o impugnante interpôs recurso de apelação da mesma para este TCA Sul, no qual formulou as seguintes conclusões: “1. Vem o presente recurso interposto da douta decisão final proferida no âmbito dos presentes autos, a qual julgou, por unanimidade, manter a decisão recorrida e, em consequência, absolver a recorrida, do pedido, na firme convicção que a decisão aqui recorrida tem por base uma errada e insuficiente apreciação da prova testemunhal produzida, bem como da prova documental junta aos autos, a qual vai em sentido bem diferente daquele que Vossas Excelências elegerão, certamente, como mais acertada, depois da necessária reponderação dos pertinentes pontos da matéria de facto e de direito, e à luz do meios probatórios disponíveis. 2. Com efeito, o objecto do presente recurso é a impugnação da decisão final proferida pelo Tribunal recorrido (doravante também designado por TAD e Tribunal Arbitral do Desporto), designadamente quanto à manutenção da decisão disciplinar proferida pela Subcomissão do Colégio Disciplinar Antidopagem da Autoridade Nacional Antidopagem de Portugal, no âmbito do Processo Disciplinar nº ..../2022/CDA. 3. Pois bem, com todo o respeito, que é muito e bem devido, o tribunal recorrido decidiu mal, mediante a prolação da decisão ora posta em crise, por via da qual manteve a decisão então recorrida e, em consequência, absolveu a demandada do pedido. 4. Sucede que, por via da Impugnação apresentada junto do TAD, pretendeu o demandante, aqui recorrente, demonstrar o desacerto da Decisão Disciplinar proferida pela Subcomissão do Colégio Disciplinar Antidopagem da Autoridade Nacional Antidopagem de Portugal (doravante designado pela sigla CDA), no âmbito do processo disciplinar nº ..../2022/CDA. 5. Por via da decisão disciplinar proferida, ao recorrente foi aplicada uma sanção de suspensão da prática da actividade desportiva por um período de quatro anos, por ser entendimento do CDA ter ocorrido a violação de norma antidopagem, constante no artigo 5º, nº 2, alínea g) da Lei Antidopagem no Desporto (Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro), na forma dolosa, a qual é punida, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 77º e artigo 1º, ex vi artigos 2.6, 2.6.1, 10.2, 10.2.1 e 10.2.1.1, do Anexo II, todos da Lei Antidopagem, tendo sido tal decisão mantida pelo TAD, no âmbito dos presentes autos, e de que ora se recorre. 6. Porém, salvo o devido respeito, não pode o recorrente, compreender em que elementos concretos e idóneos se baseou o tribunal recorrido para proferir a decisão aqui recorrida. 7. Na realidade, o recorrente, naquelas circunstâncias de tempo e lugar, não praticou qualquer infracção disciplinar, negando veementemente a posse do material médico e métodos proibidos referidos na decisão recorrida, pelo que jamais se poderá considerar que o recorrente violou as normas antidopagem constantes da Lei Antidopagem, por não corresponder à verdade, sendo que o recorrente manifesta, habitualmente, um respeito acentuado pelo ordenamento jurídico, em geral, encontrando-se, ainda, familiar e socialmente integrado. 8. Efectivamente, é firme convicção do recorrente que a decisão recorrida é baseada numa errada apreciação da prova, aplicação das regras de direito e da fundamentação que lhe foi subjacente. I. DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO: 9. No nosso modesto entendimento, o Tribunal Central Administrativo Sul deverá alterar a decisão recorrida em relação à decisão sobre a matéria de facto, designadamente nos pontos 7. a 11. e 15. dos factos provados da fundamentação de facto da decisão, uma vez que, em relação aos factos tidos como assentes, por um lado, a ausência de prova, em relação a alguns factos, e por outro lado, a prova produzida, quer testemunhal, quer documental, em relação aos demais factos, impunham decisão diversa, impugnando-se todos os demais factos vertidos na decisão recorrida que estejam em perfeita contradição com a matéria ora alegada pelo recorrente no presente recurso. 10. Desde logo, no que concerne ao item 7. dos factos provados, não pode o recorrente conformar-se com tal factualidade, pois que, de acordo com a prova documental junta aos autos, nomeadamente da análise dos docs. nºs 1, 2 e 3 juntos à Impugnação, para onde se remete por uma questão de economia processual, foi produzida prova de que o recorrente, no ano de 2021, foi vítima de atropelamento, na sequência do que teve necessidade de recorrer a diversa medicação regular. 11. Na realidade, ao recorrente foi prescrito, designadamente, a administração de F......., tendo o recorrente junto à impugnação a fotografia da receita médica sob o doc. nº 6, facto que, à data, foi dado ao conhecimento, de imediato, do director desportivo, razão pela qual foi encontrado no quarto utilizado pelo aqui recorrente uma embalagem de F......., contendo no seu interior uma ampola aberta/partida, sem conteúdo, conforme é mencionado no Relatório da PJ, junto sob o doc. nº 4 à impugnação, para onde se remete por uma questão de economia processual. 12. Como tal, não pode o aqui recorrente conformar-se com o teor do item 7., pois, da prova documental que se encontra junta aos autos, resultou provado que o demandante, ora recorrente, dispunha de autorização para utilizar ou ter na sua posse a referida medicação, mediante prescrição médica, após a ocorrência do atropelamento de que foi vítima, bem como, obviamente, os respectivos material médico e métodos necessários para o efeito. 13. Por seu turno, no que concerne aos itens 8, 9, 10, 11 e 15 dos factos provados, desde logo, cumpre destacar que, no item 3. dos factos provados, são mencionados os objectos alegadamente apreendidos ao recorrente, sendo que, após o decurso do processo disciplinar, da decisão proferida pelo CDA, e de que se recorreu para o TAD, resulta APENAS que, no que respeita recorrente, da busca exaustiva realizada na sua residência, sita na Rua ............, onde se encontravam o recorrente e os seus pais, apenas foram apreendidos os seguintes objectos, sendo manifesta a inexistência de qualquer substância ou mecanismo ilícito aí existentes: um saco de papel contendo no seu interior 4 seringas, 3 borboletas e uma agulha tipo «borboleta» e um telemóvel da marca ............, não relevando para os autos o demais material apreendido, mas apenas o que resultou da decisão impugnada para o TAD. 14. Por seu turno, cumpre referir que o recorrente reside com os seus pais e irmã, e pontualmente os avós do mesmo, conforme, aliás, resultou provado na decisão recorrida no item 12. dos factos provados, sendo que, quando o recorrente estava em estágio ou dormia em casa da sua namorada, os seus avós dormiam no quarto do recorrente, dado a residência dos seus pais apenas ter 3 quartos. 15. Como tal, considerar, como é considerado que «o local é de acesso reservado, só sendo o acesso possível com a sua autorização [do demandante, ora recorrente], exercendo o mesmo um controlo exclusivo sobre a mesma, ou seja, o demandante exercia controlo exclusivo sobre o local onde se encontravam os métodos proibidos» apresenta-se, desde logo, em clara contradição com o facto provado no item 12., tendo sido tal factualidade também comprovada pelas testemunhas arroladas e inquiridas em sede de processo disciplinar pelo, então, arguido, aqui recorrente, não obstante, inexplicavelmente, não ter sido atribuída qualquer relevância aos depoimentos prestados pelas mesmas. 16. Assim, não constitui de forma alguma verdade que somente o recorrente tenha acesso ao seu quarto e que muito menos tenha o mesmo qualquer tipo de autoridade para impedir que quem quer que seja lá entre, uma vez que a casa onde reside é dos seus pais, sendo que os avós do recorrente pernoitam com frequência em casa do mesmo, mais especificamente no seu quarto dado o frágil estado de saúde da sua avó, carecendo a mesma de acompanhamento mais próximo pela sua família. 17. Quanto à agulha do tipo borboleta com sangue encontrada na residência do recorrente, tal borboleta foi encontrada no rés do chão da casa, um local, por natureza, de utilização comum por todo o agregado familiar, e o sangue que se encontrava na referida borboleta foi objecto de análise laboratorial, de onde não resultou identificado o perfil genético do recorrente como possível match, conforme aliás resulta dos docs. nºs 8 e 9 juntos com a impugnação apresentada nos autos junto do TAD. 18. A este respeito, não é despiciendo reiterar que os avós do recorrente pernoitam com frequência na casa do mesmo, padecendo a avó do recorrente de doença oncológica, em estado avançado, e que, por isso mesmo, carece de tratamentos de saúde específicos, muitas vezes levados a cabo em casa, atenta a sua fragilidade e em razão de minorar o seu esforço físico, através de fármacos como a própria morfina, os quais podem ser administrados, em casa, através de agulhas tipo borboleta, por um cuidador informal, como era aliás o caso do avô do recorrente, atento o contacto que este havia já tido com este género de práticas médicas, materiais médicos e métodos clínicos, nos seus tempos de ultramar. 19. Com efeito, as seringas eram utilizadas pela sua avó, uma vez que a mesma padece de doença oncológica (cfr. doc. nº 7, junto com a impugnação) e faz quimioterapia, com regularidade, bem como reforço de sangue em casa. 20. Posto isto, o motivo pelo qual surgem agulhas com aletas e seringas no quarto do aqui recorrente está por demais evidente, pelo que, atenta a utilização plural da residência do recorrente, obviamente que o material médico apreendido na sua residência podia pertencer a qualquer pessoa aí residente, assim como qualquer pessoa aí residente poderia aceder aos materiais apreendidos, não sendo compreensível por que motivo foi considerado, sem mais, que tal material se encontrava na posse do recorrente. 21. Como tal, é desprovida de qualquer sentido a imputação que é feita ao recorrente do crime previsto na alínea g) do nº 2 do artigo 5º da Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro, não resultando provado, de modo algum que o material médico apreendido, e em apreço nos presentes autos, pertencia ao recorrente, o que é absolutamente falso, insultuoso e desprovido de qualquer elemento probatório e grau de veracidade. 22. Não obstante, cumpre ainda ressaltar que as seringas e borboletas referenciadas não integram a lista de métodos proibidos, aprovada pela Portaria nº 312/2021, de 21 de Dezembro, feita a análise do ponto Ml da Portaria supra-referida, e sabendo que onde o legislador não distingue, não cabe ao intérprete distinguir. 23. Com efeito, o recorrente negou e nega, veementemente, a utilização de tal alegado material médico, não podendo da existência do mesmo se concluir pela existência de indícios de utilização, pelo mesmo, de métodos proibidos, ao que cumpre acrescentar o resultado do estudo comparativo entre os resultados obtidos no Exame Pericial nº ............ (cujo pedido de realização de exame às zaragatoas com as colheitas de amostra do recorrente se mostra junto à impugnação sob o doc. nº 8, para onde se remete por uma questão de economia processual) e o perfil genético das amostras recebidas no Exame Pericial nº ............, no qual consta uma amostra de referência do recorrente, sob o item nº 22, tendo sido realizada a extracção de ADN com SwabSolution™ Reagent, e retirada a conclusão de que não foi identificado o perfil do recorrente nos itens recebidos para análise. 24. Em face dessa conclusão, foi entendimento da investigação que deveria ser excluído o recorrente de ser o dador dos vestígios analisados (cfr. fls. 3347 do processo-crime pendente, que corre os seus termos sob o Proc. nº ......./20.5JFLSB, no Juiz 2 do Juízo de Instrução Criminal de Penafiel do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este (cfr. doc. nº 9 junto à Impugnação para onde se remete por uma questão de economia processual). 25. Em conclusão, nenhuma prova credível existe nos autos que permita, com segurança e rigor, imputar, ou indiciar suficientemente, a prática dos factos dados como provados na decisão que aqui se recorre ao recorrente. 26. Somente estaremos perante uma acção praticada com dolo, quando haja conhecimento e vontade efectiva de realização do facto, dada a exigência cumulativa de um elemento intelectual em que existe uma correcta representação da factualidade, i.e., que o agente conheça os elementos que fazem parte do tipo objectivo e de um elemento volitivo, que implica que o agente conheça e queira realizar a acção, movido por uma vontade, o que, no presente caso, não se verifica. 27. Na realidade, seria sempre absolutamente impossível imputar, comprovadamente, e sem qualquer margem para dúvidas, e com o grau de certeza exigível, a prática de tais factos ao recorrente, designadamente a posse de tais materiais. 28. É sempre de privilegiar, in casu, se dúvidas existissem no espírito do decisor, a aplicabilidade dos princípios «in dúbio pro reo» e de presunção de inocência, o que, apesar de não ser necessário, se requereu, em sede de defesa escrita, no âmbito do processo disciplinar, apresentada pelo recorrente, verificando-se que, quando à presunção da inocência é a sua dupla dimensão desrespeitada, enquanto: regra de tratamento (impedindo o abuso do poder estatal) e de juízo (impõe à acusação o encargo de provar a culpabilidade do arguido, proibindo a imposição desse ónus ao arguido que se presume inocente, não lhe cabendo prova dessa inocência), violando-se assim, ao nível interno, os princípios previstos no Código de Processo Penal e no artigo 32º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, e também, a nível internacional, os princípios previstos nos artigos 6º, nº 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e 14º, nº 2 Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. 29. Importa salientar que reconheceram logo os Inspectores da Polícia Judiciária que participaram nas buscas à residência do recorrente, a existência de diversos medicamentos na mesma, tal como em qualquer casa, cumprindo esclarecer, a este respeito que o recorrente, no ano de 2021, foi vítima de atropelamento, na sequência do qual teve necessidade de recorrer a diversa medicação regular. 30. Não é por demais ressaltar também que, no Relatório Final da Polícia Judiciária, constante de fls. 3487 a 3572 do Proc. nº ......./20.5JFLSB, que corre termos no Juiz 4 do Juízo Central Criminal de Penafiel do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, relativamente ao recorrente é mencionado que a única substância que se apurou ser detida e/ou ter sido administrada por este, foi BETAMETASONA, em período fora de competição, pelo que conclui que a sua administração não é ilegal, salientando-se que o aqui recorrente não foi condenado, nem punido, por estes factos, mas apenas por ter na sua posse, alegadamente, material médico proibido, pelo que não se percebe o teor do relatório final do instrutor do processo, no tocante à proposta de agravamento da pena a aplicar ao arguido, ora recorrente, bem como a decisão disciplinar impugnada perante o tribunal recorrido. 31. Ora, não foi apreendida qualquer substância ilícita na residência do recorrente, atenta a sua manifesta inexistência, e negou sempre, e nega, veementemente, o recorrente a posse e utilização do alegado material médico apreendido, pelo que, jamais se poderá considerar, desde logo por falta de prova, fundamentos factuais e legais, que o aqui recorrente violou as normas antidopagem, designadamente a utilização de método proibido não específico previsto no nº 1 do ponto Ml da Lista de Substâncias e Métodos Proibidos, aprovada pela Portaria nº 312/2021, de 21 de Dezembro – administração ou reintrodução de qualquer quantidade de sangue autólogo. 32. Acresce ainda que, tais «materiais» elencados não se encontram, no nosso entendimento, discriminados na Lista de Substâncias e Métodos Proibidos em vigor, não se considerando, de todo, consubstanciar o método proibido do nº 1 do ponto Ml da referida Lista, não se descriminando em que condições foram encontrados os materiais apreendidos e presentes no quarto, nem o eventual proprietário da bolsa que se encontrava em cima da cómoda e na qual se encontrava o saco de papel. 33. Na ausência de qualquer outro meio de prova, e atenta a inexistência de vestígios de dopagem no histórico clínico do recorrente, não há dúvidas de que não foi possível apurar com algum grau de certeza, que, naquelas circunstâncias de tempo, modo e lugar, o recorrente J.......... cometeu as infracções de que vem condenado nos presentes autos, não sendo despiciendo salientar que, no dia em que foram realizadas as referidas apreensões e buscas, isto é, a 24-4-2022, o recorrente encontrava-se, precisamente, na sua residência, com os seus pais, uma vez que não se encontrava em competição. 34. Cumpre ainda salientar que, no esquema junto à impugnação sob o doc. nº 20, para onde se remete por uma questão de economia processual, o recorrente não aparece aí inserido, pela investigação, na alegada cadeia ou estrutura, nem sequer mencionado como ciclista consumidor. A) DA NULIDADE DO PROCESSO DISCIPLINAR POR EXTEMPORANEIDADE DA DECISÃO: 35. No nosso modesto entendimento, a decisão disciplinar impugnada e mantida pela decisão recorrida, não pode produzir os seus devidos e legais efeitos, uma vez que a mesma foi proferida, sem dúvida, extemporaneamente. 36. O recorrente foi notificado, no dia 16 de Agosto de 2022, para se pronunciar no prazo de 10 dias, relativamente à intenção da ADoP de lhe aplicar a suspensão preventiva, no âmbito do procedimento disciplinar instaurado pela recorrida contra o recorrente, tendo o recorrente respondido, mediante a apresentação da sua defesa, em 30 de Agosto de 2022. 37. Face ao ocorrido, decidiu a recorrida, em 7 de Setembro de 2022, aplicar a medida de suspensão preventiva ao recorrente e, em 4 de Outubro de 2022, foi remetida para o mesmo a competente acusação. 38. Nessa sequência, confrontado com a suspensão preventiva aplicada pela recorrida, o recorrente apresentou a sua defesa escrita e requerimento probatório, no dia 19 de Outubro de 2022, tendo sido produzida a prova requerida pelo recorrente, em sede de instrução do procedimento disciplinar, em 14 de Dezembro de 2022. 39. O processo disciplinar culminou com a Decisão Disciplinar deliberada pela Subcomissão do Colégio Disciplinar Antidopagem, a qual foi notificada ao recorrente, em 19 de Setembro de 2023. 40. Como tal, o prazo legal de 120 dias para a prolação da decisão disciplinar, que decorre entre a comunicação da violação da norma antidopagem e a aplicação da correspondente sanção disciplinar, foi claramente ultrapassado, mesmo compreendendo uma eventual prorrogação legalmente prevista por períodos de 30 dias, até ao máximo de 120 dias adicionais. 41. Com efeito, entre a notificação da violação de norma antidopagem, em 16 de Agosto de 2022 e a notificação da decisão disciplinar, recepcionada por via postal em 19 de Setembro de 2023, decorreram 276 dias úteis, prazo muito superior ao legalmente permitido, e mesmo até consensualmente admissível. 42. Do teor do nº 3 do artigo 74º da Lei Antidopagem extrai-se que o prazo máximo entre a comunicação da violação de uma norma antidopagem e a aplicação da sanção disciplinar não pode ser superior a, no limite, 240 dias (isto é, prazo de 120 dias + prorrogação por períodos de 30 dias, até ao máximo de 120 dias adicionais). 43. No presente caso, não foi o mesmo considerado um caso de especial complexidade, não tendo sido objecto de qualquer requerimento de prorrogação de prazo, nem do subsequente despacho de deferimento proferido pelo órgão competente, não tendo sido o recorrente notificado para se pronunciar acerca da especial complexidade do processo, assim como da declaração de especial complexidade ou de qualquer despacho de prorrogação do prazo. 44. Como tal, entende o recorrente que o prazo a observar entre a comunicação da violação de norma antidopagem e a aplicação da correspondente sanção disciplinar deveria ter sido o prazo, em singelo, de 120 dias, sem qualquer prorrogação. 45. Não obstante a divergência jurisprudencial verificada quanto à natureza deste prazo, o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão datado de 16 de Janeiro de 2020, no âmbito do processo nº 051/19.1BCLSB, veio pronunciar-se, e muito bem, no nosso entendimento, no sentido de que tal prazo não pode assumir a natureza meramente ordenadora, mas antes cominatória, sendo que, não obstante tal acórdão datar de 16 de Janeiro de 2020, isto é, data anterior à última alteração legislativa à Lei Antidopagem, deverá aplicar-se o entendimento vertido pelo Digno Tribunal, pois que o actual artigo 74º, em causa, mantém a redacção "não pode mediar um prazo superior a 120 dias” na redacção actual. 46. Não se pode deixar de mencionar que o elemento gramatical "não pode”, seguido de "até ao máximo”, desde logo indicam, e à luz daquele que será o entendimento do Homem Médio, que estamos aqui perante um prazo limite e, portanto, peremptório, que nunca poderia ser superior, em abstracto, a um prazo máximo de 240 dias. 47. Na realidade, conformar a natureza deste prazo como meramente ordenadora, ao invés de assegurar o almejado desiderato da instrução célere dos processos disciplinares decorrentes de alegada infracção de normas de antidopagem no desporto, conforme pretendido aquando da alteração legislativa, conduziria a uma conclusão claramente desajustada e validaria a interpretação de que o órgão decisor poderia eternizar a decisão disciplinar a proferir, sem que, por um lado, nenhuma consequência se extraísse deste incumprimento que o legislador quis sancionar, eternizando, por outro lado, a incerteza e insegurança jurídicas daí resultantes, designadamente para o recorrente e para a sociedade em geral, perigando os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança dos cidadãos que integram e concretizam o princípio do Estado de Direito Democrático, plasmado no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa. 48. Caso não se entenda ser esse o entendimento que resulta directa e literalmente da aplicação dos elementos mencionados, não se poderá deixar de compreender que à luz de uma interpretação extensiva é este, e não outro, o espírito da lei. 49. Assim, é forçoso concluir que a restrição temporal efectuada pelo legislador no estabelecimento do prazo máximo de 120 dias, prorrogável, em casos de especial complexidade, por períodos de 30 dias, até ao máximo de 120 dias consecutivos, entre a comunicação da violação da norma antidopagem e a aplicação da norma correspondente tem carácter obrigatório tem que ser interpretada enquanto resultante de uma norma imperativa como prazo absolutamente peremptório. 50. Pelo que, tendo sido ultrapassado o prazo peremptório dos 120 dias entre a comunicação da violação da norma antidopagem e a aplicação da correspondente sanção disciplinar, deve entender-se que o referido procedimento disciplinar deveria ter sido arquivado, por inegável incapacidade, quer da ADoP, quer posteriormente do CDA, em cumprir os prazos legalmente estipulados para o efeito. 51. Cumpre ainda referir que o prazo legal previsto no artigo 75º, nº 4 da LADoP foi inobservado, uma vez que, entre o envio do processo pela ADoP ao CDA e a prolação da decisão de aplicação de sanção de suspensão pelo período de 4 anos, decorreu muito mais do que o prazo legalmente estabelecido, que é de 30 dias. 52. No presente caso, não obstante entre o relatório final da ADoP e a notificação de designação de data para a audição prevista no artigo 82º da Lei Antidopagem, não constar a remessa do processo para o CDA, lendo-se, outrossim, a fls. 294 “Concordo com o proposto. Ao CDA para os devidos efeitos. Assinatura. 14/02/2023”, entre a remessa do processo disciplinar para o CDA e a prolação da decisão disciplinar decorreram, claramente, mais de 30 dias. 53. Acresce que, mesmo que não se entenda a natureza do prazo legal estabelecido no artigo 74º da Lei Antidopagem como um prazo peremptório, mas apenas orientador, o que apenas se admite enquanto mera hipótese académica, a verdade é que sempre terão de se atender aos princípios basilares do Direito, mormente, ao princípio da celeridade processual e princípio da proporcionalidade. 54. Por tudo quanto exposto, manifestamente, não pode o recorrente conformar-se com tamanha extemporaneidade na prolação da decisão disciplinar que se demonstra, em toda a linha, desde logo por ofender critérios normais de razoabilidade, claramente abusiva e contrária aos ditames da lei, uma vez que a longa delonga processual além de não ter qualquer justificação possível, nem sequer se abriga na complexidade do processo ou na eventual necessidade de produção de diligências ou prova adicional, uma vez que a acusação limitou a sua prova à já existente nos autos, isto é, ao auto de busca e reportagem fotográfica com que se iniciou o processo disciplinar. B) DO VÍCIO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO E DA POSTERGAÇÃO DOS DIREITOS DE DEFESA DO RECORRENTE: 55. Até à junção do processo disciplinar, nos presentes autos, pela recorrida, na sequência da notificação para o efeito, em 26 de Outubro de 2023, o relatório final elaborado pela ADoP era absolutamente desconhecido do recorrente, porquanto nunca o mesmo lhe foi notificado, referindo-se a decisão disciplinar a esse relatório, para cujo teor remete, não obstante o recorrente desconhecer, em absoluto, a sua existência e o seu conteúdo. 56. Com efeito, não se poderá deixar de verificar, aqui, o vício de falta de fundamentação da decisão aqui impugnada, uma vez que, só mediante a concretização e conhecimento dos elementos em que se sustentou o CDA para proferir a decisão disciplinar nos termos em que a proferiu é que o recorrente poderá conhecer o teor da sua condenação e consequente punição, bem como identificar devidamente o objecto de uma eventual impugnação, contraditando os meios de prova produzidos e oferecendo outros que, no seu entendimento, possam vir a abalar a decisão disciplinar proferida. 57. Além disso, a acta da audiência do arguido, aqui recorrente, a que se reposta o artigo 82º da LADoP, realizada a 23 de Junho de 2023, não foi de imediato remetida a fim de ser assinada pelo recorrente e pela sua mandatária, tendo sido remetida apenas em 14 de Julho de 2023, após solicitação da mandatária do recorrente. 58. Porém, analisado o teor da acta remetida, o mesmo não estava conforme com as declarações prestadas pelo recorrente, motivo pelo qual a mandatária do recorrente remeteu, por correio electrónico, as alterações que entendia serem necessárias, não obstante, a tal correspondência electrónica enviada não foi apresentada qualquer resposta pelo CDA, motivo pelo qual, nunca foi a acta da diligência realizada no dia 23 de Junho de 2023 assinada pelo recorrente e pela sua mandatária, nem pelos membros da Subcomissão do Colégio Disciplinar Antidopagem, pelo que é de arguir a nulidade da mesma, por inobservância dos formalismos legais, o que, desde logo, inquina o cumprimento do disposto no artigo 82º da LADop e os princípios que lhe subjazem. 59. Por seu turno, mediante a consulta do processo disciplinar, constata-se a inexistência da designação de data para a realização da diligência de audiência do arguido, aqui recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 82º da Lei Antidopagem, bem como do comprovativo de realização de tal diligência em 23-6-2023, via zoom, assim como da referida acta enviada pelo CDA em 14-6-2023, tal como a ausência de toda a correspondência electrónica trocada a este respeito, entre a mandatária do recorrente e o CDA. 60. Posto isto, somos levados a concluir pela violação pelo CDA do disposto nos artigos 82º e 83º, nºs 1 a 5 da Lei Antidopagem, bem como pela ocultação de documentos no processo disciplinar do recorrente, e em face disso, pela manifesta postergação dos direitos de defesa do arguido, naqueles autos, aqui recorrente. C) DA INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS DA PRÁTICA DOS FACTOS ILÍCITOS POR AUSÊNCIA DE PROVA: 61. Por tudo quando exposto, não resulta do processo disciplinar qualquer elemento probatório susceptível de imputar recorrente, os factos dados como provados na decisão proferida pelo CDA que se impugnou, bem como na decisão ora recorrida, susceptíveis de conduzir à aplicação de uma pena de suspensão da prática da actividade desportiva por um período de 4 anos, não existindo nos autos nenhuma prova credível que permita, com segurança e rigor, imputar a prática de tais factos alegados ao aqui recorrente, revelando-se absolutamente impossível à ADoP e ao CDA, imputar, comprovadamente, e sem qualquer margem para dúvidas, e com o grau de certeza exigível, a prática de tais factos ao recorrente, designadamente a posse de tais materiais, sendo sempre de privilegiar, in casu, se dúvidas existissem no espírito do decisor, a aplicabilidade dos princípios «in dubio pro reo» e de presunção de inocência. 62. Acresce que, aquando da inquirição das testemunhas indicadas pelo arguido, e aqui recorrente, na sua defesa escrita, no âmbito do processo disciplinar, todas elas depuseram no sentido da defesa apresentada pelo recorrente, não tendo o CDA atribuído qualquer relevância aos depoimentos prestados pelas testemunhas no âmbito do processo. 63. Por seu turno, resulta do processo-crime pendente, a correr termos no Juiz 4 do Juízo Central Criminal de Penafiel, da Comarca do Porto Este, sob o Proc. nº ......./20.5JFLSB, no Relatório Final da Polícia Judiciária, constante de fls. 3487 a 3572, e datado de 13-12-2022, designadamente a fls. 3568, relativamente ao arguido J.........., aqui recorrente, alega que a única substância que se apurou ser detida e/ou ter sido administrada por este, foi BETAMETASONA, em período fora de competição, pelo que conclui que a sua administração não é ilegal. 64. Assim, na ausência de qualquer outro meio de prova, e atenta a inexistência de vestígios de dopagem no histórico clínico do recorrente, não há dúvidas se que não foi possível apurar com qualquer grau de certeza, que, naquelas circunstâncias de tempo, modo e lugar, o arguido, aqui recorrente, cometeu as infracções pelas quais foi condenado na decisão disciplinar proferida pelo CDA, impugnada para o tribunal recorrido e mantida na decisão aqui recorrida. 65. Saliente-se que, no dia em que foram realizadas as referidas apreensões e buscas, isto é, a 24-4-2022, o arguido, aqui recorrente, J.......... encontrava-se, precisamente, na residência, com os seus pais, uma vez que não se encontrava em competição. 66. Além disso, a incerteza sobre a pertença do material médico, assim como da sua utilização, terá necessariamente de resolver-se a favor do recorrente, sendo de mencionar, a este respeito, os princípios processuais penais do «in dubio pro reo» e da presunção da inocência, que, permita-se ao recorrente dizer, em desabafo, parecem viver à margem deste processo disciplinar. 67. Ora, do que resulta alegado na pág. 30 da decisão recorrida, é possível ao recorrente concluir que não existe qualquer certeza daquilo que é decidido pelo tribunal recorrido, tratando-se de meras especulações traduzidas na condenação do recorrente com base, precisamente, em meras suposições ou probabilidades, não valorizando, sequer, a recolha laboratorial de saliva pelo aqui recorrente, de modo a apurar se existia o ADN do aqui recorrente nas amostras recolhidas, e o seu resultado científico, conforme a isso se encontraria vinculado. 68. Por seu turno, no esquema junto à Impugnação sob o doc. nº 20, o recorrente não aparece aí inserido, pela investigação, na alegada cadeia ou estrutura, nem sequer mencionado como ciclista consumidor. 69. Acresce que, ao ter sido proferida a decisão disciplinar de suspensão do recorrente por um período de 4 anos, violou o CDA os princípios da tipicidade, da ilicitude e da culpa. 70. Na verdade, perante os elementos probatórios constantes do processo disciplinar, denota-se que a decisão disciplinar proferida pelo CDA se encontra desprovida de qualquer fundamento, fáctico e jurídico, pelo que, não se pode concordar e carece de razão a decisão aqui recorrida, por manter a mesma a referida decisão disciplinar proferida pelo CDA, em relação ao aqui recorrente. 71. Conforme decorre da LADoP, o ónus da prova de dopagem, para efeitos disciplinares, recai sobre a ADoP, cabendo-lhe determinar a existência da violação de uma norma antidopagem, sendo que o praticante desportivo, no âmbito do processo disciplinar em que é arguido, não tem de provar, com um grau de certeza absoluta, a sua ausência de culpa, bastar-lhe-á alegar e provar factos que impeçam a entidade sancionadora de concluir, com um grau de certeza superior a um justo equilíbrio de probabilidades, pela existência de culpa sua, pelo que, estando perante uma presunção natural, é suficiente ao atleta criar dúvidas no processo sobre o facto presumido de forma a não ser sancionado disciplinarmente. 72. Como tal, sempre será de dizer que dos elementos probatórios existentes, nunca se poderá retirar a ilação da prática das infracções de que foi acusado e punido e muito menos sob a forma dolosa, porquanto, na verdade, não existem sequer indícios, quanto mais prova suficiente da prática das referidas infracções disciplinares pelo recorrente. E) DA MEDIDA DA PENA E DA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE DA PROIBIÇÃO DO EXCESSO 73. A protecção dos bens jurídicos apontada como finalidade das penas no artigo 40º do Código Penal, implica que a pena, sem ultrapassar a medida da culpa seja adequada e suficiente para dissuadir a prática de crimes pelos outros cidadãos, incentivar a convicção que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte da comunidade. 74. Com efeito, justificar nos presentes autos uma sanção máxima, pelo facto de à luz da prevenção especial o arguido, ora recorrente, parecer tender para a prática de crimes, apenas porque não demonstrou arrependimento parece-nos, desde logo, duvidoso, porquanto, desde logo, não cremos ser possível demonstrar arrependimento face a algo que não se fez, sendo, outrossim, de ressaltar o comportamento do recorrente de colaboração na descoberta da verdade, o que sempre fez, desde o primeiro momento. 75. Como tal, é inequivocamente falso que resulte provado, e por isso que, fundadamente conste ou resulte dos factos dados como provados em sede disciplinar, que o recorrente agiu de forma consciente, livre e voluntária, como se lê na pág. 30 da decisão recorrida. 76. Todavia, resulta da decisão recorrida, nas págs. 34 e 35, que: «No caso dos autos, o demandante não logrou provar que os materiais apreendidos não eram seus, nem que desconhecia da sua existência na sua habitação. Igualmente, nem o demandante, nem qualquer outra pessoa lograram demonstrar que a culpa não foi significativa». 77. Em face do exposto, não assiste, também, neste segmento, qualquer razão ao tribunal recorrido porquanto cabia à ADoP, aqui recorrida, o ónus da prova em relação à atribuição da propriedade dos materiais apreendidos e da culpa ao aqui recorrente, a qual não logrou apurar e alcançar, não cabendo ao aqui recorrente a prova desses factos negativos, que seria diabólica. 78. Por outro lado, o agravamento da punição de um indivíduo, apenas pelo simples facto de pertencer a uma equipa reconhecidamente mais badalada no panorama nacional, se nos afigura também altamente questionável e mesmo censurável. 79. Nestes termos, e face aos elementos probatórios em que o CDA se baseia para aplicação da sanção ao arguido, aqui recorrente, no caso concreto, que frise-se, são somente o Auto de Busca e Apreensão e a reportagem fotográfica de fls. 5 a 12, auto de exame directo de fls. 13 e 14 e respectiva reportagem fotográfica de fls. 15 e relatório emitido pela secção regional do Centro – Ordem dos Enfermeiros, de fls. 22 a 26, não se afigura de todo adequada a aplicação de uma sanção ao recorrente apenas com base na prova constante dos autos e na «fundamentação» usada. 80. Ao que acresce a circunstância de toda a prova produzida pelo arguido, aqui recorrente, em sede de processo disciplinar, nomeadamente os depoimentos das testemunhas arroladas e a audiência do arguido, ir no sentido contrário à posição tomada pelo CDA. 81. Em face do exposto, punir exclusivamente porque a comunidade assim o “exige”, MESMO SEM PROVA, conduz, sem dúvida, ao sobejamente conhecido direito penal do terror, em que, até a condutas lícitas se podem aplicar sanções pesadas, transformando qualquer cidadão num mero instrumento da necessidade de prevenção, pondo mesmo em causa a dignidade humana. 82. Todo o circunstancialismo descrito, não podia deixar de ser considerado, no seu conjunto, como factor de ponderação quanto à decisão disciplinar a proferir, tendo em consideração também os fins de prevenção geral e especial que com as normas punitivas se pretenderia alcançar. 83. Quer isto dizer que, no caso como o dos autos, em que não são evidentes (e mesmo inexistentes) os riscos à modalidade desportiva em questão, a infracção, a ilicitude, o grau de culpa do agente, não se poderá permitir a condenação do aqui recorrente, na senda da decisão disciplinar proferida, por forma a evitar qualquer violação da proporcionalidade e da proibição do excesso. 84. Na realidade, foi com grande espanto, revolta e perplexidade que o recorrente que, além do mais, não estava verdadeiramente integrado na equipa da A...., não sendo convocado para várias provas, viu o seu nome associado à prática das alegadas infracções disciplinares pelas quais foi efectivamente acusado e punido. 85. Inexiste qualquer registo de sanção disciplinar aplicada ao recorrente que, antes do mais, e enquanto ciclista, sempre teve um cadastro disciplinar impoluto, sempre duplamente controlado dado se tratar também de um atleta nacional. 86. O recorrente sempre teve controlos negativos e nunca fez nada que pudesse colocar em causa a sua integridade no ciclismo, sendo, ainda, de salientar os resultados negativos do histórico das análises laboratoriais efectuadas no sangue e urina do recorrente, bem como no passaporte biológico. 87. O recorrente reafirma que não cometeu qualquer infracção, nem a título de dolo, nem de negligência, tendo um histórico impoluto. 88. Com efeito, o recorrente, jamais se pode conformar com a Decisão Final proferida, por a mesma padecer, como acaba de se deixar plenamente comprovado, de grosseira e dantesca falsidade, acrescida da circunstância prévia de ter sido proferida, amplamente, fora do prazo legalmente consagrado. 89. De facto, reafirma, novamente, o recorrente, incansavelmente, que não cometeu qualquer infracção, nem a título de dolo, nem de negligência. 90. Assim, por todo o supra exposto, e atenta a inexistência de qualquer infracção praticada pelo recorrente, deverá ser revogada a decisão recorrida mediante a prolação de competente e douto acórdão que se digne declarar a nulidade do processo disciplinar instaurado contra o aqui recorrente e, consequentemente, da decisão disciplinar proferida, pelas razões processuais supra expostas, bem como, não procedendo, mas sem prescindir, deverá ser revogada a decisão disciplinar proferida, e, em consequência, ser proferida a competente decisão de arquivamento do processo disciplinar e a consequente absolvição do arguido, aqui recorrente, da sanção que lhe foi aplicada pela decisão disciplinar proferida pelo CDA, no âmbito do processo disciplinar instaurado contra o aqui recorrente”. 4. A recorrida AdOP apresentou contra-alegação, tendo para o efeito formulado as seguintes conclusões: “I. O apelado adere integralmente ao teor da, aliás, mui douta, sentença proferida pelo Tribunal Arbitral do Desporto, entendendo que o conteúdo da tal decisão é, por si só, suficiente para se considerar improcedente o presente recurso, mantendo-se a sentença prolatada; II. Quanto ao facto dado como não provado no Ponto 7, sublinhe-se a sua total e absoluta irrelevância para a boa decisão da causa, na exacta medida em que o tribunal a quo, ao decidir como decidiu mais não fez do que "(...) a. Manter a decisão recorrida, e. em consequência, absolve-se a demandada do pedido...)"; III. O apelante foi condenado numa pena disciplinar – e bem –, não pela posse de substâncias proibidas, mas sim pela posse de métodos proibidos. IV. Quanto aos pontos 8 a 11 e 15 da sentença recorrida, ao contrário do propugnado pelo apelante e salvo o devido respeito, o Tribunal a quo fez a correcta interpretação dos mesmos, no sentido, aliás, defendido pela apelada, na sua contestação, bem como da prova documental junta aos autos, designadamente o auto de busca e apreensão junto com a contestação sob doc. 3, documento este assinado pelo aqui apelante e não impugnado. V. Atente-se, com efeito, ao material apreendido na habitação do apelante: "Na sala do rés-do-chão Num recipiente com o descritivo D.... L- ......., contendo no seu interior uma seringa, uma agulha tipo "borboleta”, um frasco partido, sem conteúdo, com a inscrição c.... e uma embalagem aberta de flv set No quarto utilizado pelo arguido: No interior de uma bolsa que se encontrava em cima da cómoda, um saco de papel contendo: 4 seringas 3 borboletas.” VI. Para fundamentar a detenção dos métodos proibidos apreendidos, o apelante utiliza uma narrativa completamente inverosímil, segundo a qual tudo o que consta do indicado Auto de Busca e Apreensão seria pertença da sua avó, doente oncológica, que pontualmente pernoitava em sua casa, ficando a dormir no seu, dele apelante, quarto, e que seria o seu avô, com os conhecimentos de primeiros socorros adquiridos há mais de cinquenta anos na Guerra do Ultramar (!), quem assistiria a senhora em tratamentos médicos domésticos, os quais incluiriam transfusões de sangue! VII. Como muito bem enfatizado na decisão proferida pelo CDA, esta “história” não é merecedora de qualquer credibilidade, designadamente quando afirma: Em primeiro lugar, porque seria necessário obter o sangue para transfundir, o que, diga-se, carecia de uma deslocação a um banco de sangue. Naturalmente que nunca o banco de sangue disponibilizaria uma bolsa de sangue ou qualquer outra quantidade de sangue, pois tal constituiria uma violação da legislação vigente. Contudo, ainda que conseguisse uma bolsa de sangue (o que nem sequer se concebe), porque motivo iria realizar a transfusão sanguínea em sua casa, com todos os constrangimentos no que respeita ao transporte e respectiva conservação, quando na realidade poderia facilmente realizar a transfusão no hospital, em respeito pela legislação vigente? (...); VIII. Ainda quanto aos métodos proibidos na posse do apelante, impõe-se a remissão para o que fica dito na contestação, e particularmente para o Relatório Secção Regional do Centro – Ordem dos Enfermeiros – Operação Prova Limpa – Equipa A....-B.... (doc. nº 4 junto com a contestação), fls. 22 a 26 do processo disciplinar: - Relativamente à agulha tipo "borboleta” apreendida na sala do rés-do-chão, a fotografia da mesma encontra-se a fls. 9 do processo disciplinar, e corresponde à foto nº 7, a mesma encontra-se utilizada, contendo vestígios de sangue; - Tal agulha é utilizada para infusões na veia pela utilização parenteral e colheita (dispositivo invasivo, cirúrgico, de uso temporâneo); - Por sua vez, no que concerne às três "borboletas” que foram apreendidas num saco de papel que se encontrava no interior de uma bolsa que estava em cima da cómoda do quarto utilizado pelo arguido, e cuja fotografia se encontra identificada como foto nº 14, constante a fls. 11 do processo disciplinar, a descrição técnica das mesmas encontra-se vertida no Relatório Secção Regional do Centro — Ordem dos Enfermeiros — Operação Prova Limpa — Equipa A.... – B.... (doc. nº 4), constante do presente processo a fls. 22 a 26 do processo disciplinar; - "3 agulhas com aletas (l aparentemente já usada), cuja marca não é possível identificar, de 25G (laranja), constituída por um tubo transparente, resistente a dobras, de 30 cm com conectar Luer Lock e cone de fecho que permite flexibilidade durante a utilização e na extremidade tem uma agulha biselada siliconizada de corte frontal em aço cromo níquel. Este dispositivo serve para perfusão de curto prazo, injecção e colheita de sangue"; 4. três agulhas com aletas destinam-se a "perfusão de curto prazo, injecção e colheita de sangue", o que â perfeitamente compatível e adequado á realização das sobejamente conhecidas no mundo do ciclismo "autotransfusões de sangue - Js seringas, a agulha tipo "borboleta " apreendida na sala do rés-do-chão. que serve para colheita (e se encontrava utilizada) e. em especial, as três agulhas com aletas. (que servem para injecção e colheita de sangue, sendo que uma delas se encontrava utilizada) são meios idóneos e adequados para proceder à recolha e introdução de sangue no organismo, sendo normalmente utilizadas para concretizar o método proibido não específico, proibido em competição e fora de competição, referido no nº 1 do ponto Ml, da Lista de Substâncias e Métodos Proibidos, aprovada pela Portaria nº 312/2021, de 21 de Dezembro – administração ou reintrodução de qualquer quantidade de sangue autólogo". IX. Importa, neste passo, chamar a atenção para o facto de o apelante não ter arrolado qualquer testemunha que pudesse, com seriedade e credibilidade, testemunhar em sede de audiência de julgamento que o avô do apelante realizava transfusões sanguíneas à esposa, designadamente que tivessem sido arrolados médicos, enfermeiros, técnicos de saúde, enfim pessoas aptas e idóneas a atestar as capacidades do senhor avô do apelante bem como a adequação do procedimento de transfusões sanguíneas domésticas. X. Inexiste qualquer contradição entre o Ponto 8 e o Ponto 12 da matéria de facto dada como provada, uma vez que o facto de viverem outras pessoas na mesma casa, assim como a circunstância de os avós do apelante ali pernoitarem pontualmente, está muito longe de evidenciar que o mesmo não tinha o controlo exclusivo sobre o local onde se encontravam os métodos proibidos. XI. Quanto ao facto de a conduta do apelante ter sido praticada a título de dolo, tal resulta inclusivamente do despacho de pronúncia proferido no âmbito do processo-crime que corre termos no Proc. nº ......./20.5JFLSB, no Juiz 4 do Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este e que se encontra já em fase de julgamento, e no qual o apelante é arguido: "9 – O arguido detinha na sita posse os métodos proibidos mencionados na acusação; "10 – O arguido agiu de forma livre, voluntária, deliberada e consciente, bem sabendo que não podia ter na sua posse os referidos métodos proibidos, pois tais materiais são meios idóneos e adequados à realização do método proibido “administração ou reintrodução de qualquer quantidade de sangue autólogo”, sendo que os mesmos são proibidos em competição e fora de competição; 11 – O arguido agiu assim com dolo, tendo a intenção de praticar a infracção disciplinar em causa, mesmo sabendo que a sua conduta era proibida por lei, agindo de acordo com tal intenção"; XII. Foi bem o tribunal a quo ao considerar como meramente ordenador o prazo previsto no artigo 74º, nº 3 da Lei Antidopagem, considerando, em consequência, a decisão proferida como tendo-o sido validamente. XIII. Vem o apelante invocar a alegada nulidade do processo disciplinar por motivo de extemporaneidade da decisão do CDA, fundamentando tal alegação no entendimento de que o prazo de 120 dias previsto no nº 3 do artigo 74º da Lei Antidopagem, o qual pode ser prorrogado por períodos de 30 dias, até ao máximo de 120 dias, foi ultrapassado, pelo que a decisão seria extemporânea, citando o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do Processo nº 51/19.1BCLSB. XIV. Fazendo, contudo, tábua rasa da circunstância de o acórdão em causa, que é de 4 de Julho de 2019, haver sido prolatado na vigência da anterior Lei, tendo sido ali aplicada Lei nº 38/2012, de 28 de Agosto, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 93/2015, de 13 de Agosto, a qual foi, entretanto, revogada. XV. De acordo com o alegado pelo apelante, o acórdão em causa refere que o prazo previsto no nº 5 do artigo 59º da Lei Antidopagem. que actualmente corresponde ao artigo 74º da Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro, não pode assumir a natureza meramente ordenadora. mas antes cominatória. XVI. Ora, em 28 de Agosto de 2012 foi publicada a Lei nº 38/2012, a qual aprovou a lei antidopagem no desporto, adoptando na ordem jurídica interna as regras estabelecidas no Código Mundial Antidopagem. XVII. Nos termos do nº 1 do artigo 59º da Lei nº 38/2012, a instrução dos processos disciplinares e a aplicação das sanções disciplinares previstas nessa lei competiam à ADoP e encontravam-se delegadas nas federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva. XVIII. Dispunha o nº 5 do mesmo artigo que entre a comunicação da violação de uma norma antidopagem e a aplicação da correspondente sanção disciplinar não podia mediar um prazo superior a 120 dias. XIX. Sob a cominação prevista no nº 7 do artigo 59º, ou seja, ultrapassado que fosse tal prazo, a federação desportiva em causa teria o dever de remeter, no prazo máximo de 5 dias, o processo disciplinar à ADoP que, no prazo máximo de 60 dias. devia proceder à sua instrução e decisão. XX. Ocorre que o regime jurídico actualmente em vigor é radicalmente diferente do que se encontrava em vigor aquando da prolação do citado acórdão, uma vez que com a entrada em vigor da Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro (Lei Antidopagem), a qual aprova a lei antidopagem no desporto, foram adoptadas na ordem jurídica interna as regras estabelecidas no Código Mundial Antidopagem, assim se revogando a Lei nº 38/2012, de 28 de Agosto. XXI. Sendo que, nos termos do nº 1 do artigo 74º da Lei Antidopagem, a instrução dos processos disciplinares pertence à ADoP, e já não às Federações Desportivas, como vinha sendo até à entrada em vigor da Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro, tendo assim deixado de existir a delegação de poderes nas Federações. XXII. Importará, contudo, deixar claro que as conclusões retiradas pelo apelante não assentam nem na letra nem no espírito do citado acórdão, uma vez que este afirma que o prazo de 120 dias era o prazo fixado para que a Federação Desportiva em causa, e a quem se encontravam delegados os poderes disciplinares, os pudesse exercer, prazo esse findo o qual sem que o tivesse sido, tal poder transferir-se-ia para a ADoP, a qual poderia emitir a decisão. XXIII. Sim, os 120 dias eram um prazo peremptório, mas para a Federação decidir, sob pena de a decisão vir a ser proferida pela ADoP, o que é muito diferente de ser um prazo para um processo disciplinar ser decidido, sob pena de prescrição. XXIV. Não era, nunca foi esse o espírito nem a letra da Lei entretanto revogada. Atente-se no que o acórdão em causa dispõe: “Na verdade, a violação do prazo de 120 dias por parte da Federação Desportiva, não gera a perda definitiva da possibilidade de exercício do poder disciplinar; a consequência da violação deste prazo traduz-se apenas e só na cessação da delegação de competências, legalmente prevista no nº 1 do referido artigo 59º. Ou seja, o exercício do poder disciplinar em matéria de dopagem é exercido pelos órgãos disciplinares das federações desportivas, por delegação de competências, que originariamente, são atribuídas à ADoP. Só que, o legislador limitou no tempo a duração desta delegação de competências, impondo-lhes agora um prazo de 120 dias para a conclusão de uma decisão [no caso de ilícitos disciplinares relacionados com a dopagem]. Este prazo de 120 dias é necessariamente peremptório, pelo que, a violação do mesmo gera a extinção do direito do CDFPF de praticar o acto, máxime de aplicar a sansão disciplinar. Naturalmente que o legislador não quis com esta redacção que se esgotasse, sem mais, o poder punitivo, mas tão só que este poder punitivo atribuído em sede de delegação de competências ao CDFPF se esgotasse e se extinguisse neste órgão; e de tal forma, assim é que findo este prazo, estabeleceu no nº 7 do artigo 59º que a partir do términus dos 120 dias a competência para instruir e aplicar a respectiva sanção em matéria de dopagem passasse a pertencer à ADoP”. XXV. Vai bem pois o tribunal a quo quando na sua douta sentença afirma que, a não ser entendido que o prazo de 120 dias (com as prorrogações de 30 dias) seria um prazo meramente ordenador, revestindo uma natureza cominatória, sempre se dirá que se poderia considerar tal prazo como um prazo de prescrição. Pois é precisamente esse o entendimento da apelada, a qual se fundamenta no seguinte conjunto de ordem de razões: Desde logo, porque, conforme refere o artigo 1º da Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro, a Lei Antidopagem destina-se a adoptar na ordem jurídica interna as regras estabelecidas no Código Mundial Antidopagem (publicado em Anexo à Lei Antidopagem). Nas quais não se incluem quaisquer normas que fixem um prazo para a conclusão dos processos disciplinares, ou que determinem qualquer cominação para a ausência de prolação de decisão num determinado período de tempo. Sendo, pois vedada ao Estado Português a possibilidade de legislar contrariamente ao Código Mundial Antidopagem, uma vez que reveste carácter obrigatório para Portugal, decorrente da adesão de Portugal à Convenção Internacional contra a Dopagem no Desporto da UNESCO, através do Decreto nº 4-A/2007. de 20 de Março, sob pena de ao fazê-lo, a ADoP perder a sua conformidade, com as consequências decorrentes da Norma Internacional da Conformidade com o Código pelos Signatários. É. pois, para o apelado – e para o tribunal a quo – certo, que o único prazo referente ao exercício do poder disciplinar com carácter cominatório que decorre, quer do Código, quer da Lei Antidopagem. é o prazo de prescrição de 10 anos, previsto no nº 3 do artigo 56º da Lei Antidopagem, ficando reservada para todos os outros prazos a natureza meramente ordenadora, uma vez que Portugal, enquanto signatário do Código Mundial Antidopagem. se encontra, por ele, impedido de fixar prazos peremptórios para a promoção de procedimentos disciplinares. Por outro lado, e ainda a este respeito sempre se dirá que tem vindo a ser entendimento do Supremo Tribunal Administrativo que os prazos previstos na legislação para o exercício do poder disciplinar são prazos meramente ordenadores, sendo certo que a não ser assim entendido, os mesmos corresponderiam a verdadeiros prazos de prescrição, o que não é, nem pode ser intenção do legislador. XXXI. Face ao exposto, e atendendo aos princípios da ética, segurança desportiva, proporcionalidade, boa governança, bem como ao interesse em excluir os batoteiros, praticantes desportivos dopados, traficantes de substâncias e métodos desportivos, do âmbito do desporto, outra conclusão não se pode retirar que o prazo em apreço é um prazo de natureza meramente ordenadora. XXXII. Aliás, este entendimento seguido pelo Colégio Disciplinar Antidopagem encontra-se vertido no Despacho nº 1, proferido no âmbito do processo nº ................, e que tem o seguinte teor: "Vem a Ilustre Mandatária do Arguido N......... requerer a "cessação da medida da suspensão preventiva" aplicada a este. bem como o consequente "arquivamento do procedimento disciplinar", uma vez que, argumenta, "se encontra ultrapassado o prazo de 120 dias que deverá mediar entre a comunicação da violação da norma antidopagem e a aplicação da correspondente sanção disciplinar". Decidindo, o prazo constante do nº 4 do artigo 74º da Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro, é meramente ordenador. Com efeito, o legislador limitou-se a estabelecer um limite temporal para a prolação de uma decisão, sendo que o seu incumprimento não determina a invalidade dessa mesma decisão, nem a nulidade do processo. Tais prazos, cujos destinatários directos são absolutamente alheios ou indiferentes à sorte da relação material administrativa que lhes subjaz, e cuja acção se desenvolve por imperativo do interesse público, na colaboração com os órgãos instituídos para a defesa da legalidade, não assumem natureza peremptória preclusiva ou resolutiva, integrando antes a categoria dos prazos meramente dilatórios ou retardatários. Por outro lado, não cabe a esta Subcomissão fazer cessar a medida de suspensão preventiva, a qual foi aplicada pela ADoP, como decorre do nº 1 do artigo 37º, conjugado com o nº 4 do artigo 47º, todos da Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro. Termos em que se indefere o requerido”. XXXIII. Muito bem vai o tribunal a quo ao decidir como decidiu quanto ao alegado vício de falta de fundamentação e da postergação dos direitos de defesa do arguido, aderindo a apelada na íntegra aos fundamentos de facto e de Direito com que o faz! XXXIV. Ao decidir como decidiu, o CDA fê-lo de forma devidamente fundamentada, apresentando os motivos de facto e de direito pelos quais condenou o arguido, aqui apelante, limitando-se a aludir à existência de um relatório final emitido pelo instrutor do processo, transcrevendo partes de tal relatório, assim identificando diligências realizadas pelo instrutor. O relatório final elaborado pelo Instrutor apenas serve como uma súmula da actividade processual desenvolvida ao longo do procedimento de instrução, culminando com uma proposta, não sendo, no final, vinculativo para o CDA. Sendo certo que o CDA decide com base na sua estrita convicção, não seguindo o relatório final emitido pela ADoP, conforme se verifica do teor da decisão e na qual veio a ser aplicada uma sanção com um período de suspensão mais favorável para o demandante do que a que constava no relatório final. É, pois, falso que a decisão disciplinar tenha sido proferida com base num relatório final que se desconhece, tendo-se o direito de conhecer, como também que a decisão final careça de fundamentação. Quanto à alegada falta de notificação da acta da audição prévia realizada nos termos do artigo 82º da Lei Antidopagem, devidamente rectificada, circunstância que o entender do apelante importa violação do disposto no artigo 82º da Lei Antidopagem. Dois aspectos há a considerar, como muito bem fez o tribunal a quo: desde logo e atento o disposto no artigo 82º da Lei Antidopagem inexiste obrigação de elaboração de qualquer acta da audição prévia, outro, sendo a mesma elaborada, nada na Lei impõe que a mesma tenha de ser notificada ao arguido para que este se pronuncie. E ainda que se entenda que a acta da audiência prévia é um formalismo que devesse ser cumprido, sempre se dirá que a sua não rectificação corresponde a uma mera irregularidade, a qual não foi atempadamente invocada releva, isso sim, e como o próprio apelante alega, ter sido realizada a audiência prévia prevista no artigo 82º da Lei Antidopagem, tendo o mesmo comparecido, tendo assim sido dado cumprimento ao previsto no citado preceito legal. Quanto à alegada inexistência de elementos probatórios da prática dos factos ilícitos por ausência de prova, o apelante adere integralmente ao decidido pelo XLIII. Tribunal a quo, considerando ser abundante a prova dos factos que vieram a suportar a decisão do CDA. Dúvidas não restam, depois de analisada a prova documental junta ao processo disciplinar, que o apelante tinha na sua posse, ou sob o seu controlo, métodos proibidos. XLIV. Sendo, como já abundantemente dito, absolutamente inverosímil que os métodos proibidos que foram apreendidos no seu quarto não lhe pertenciam, podendo pertencer a qualquer outra pessoa de entre pai, mãe, irmã avó, avô, eventualmente empregada doméstica... XLV. Foi, pois, bem o tribunal a quo, na análise critica e conjugada da prova existente nos autos, suportada nas regras da experiência, ao considerar como provada a matéria de facto que veio a suportar a decisão, não considerando como verosímil a tese rocambolesca do apelante no que à posse e detenção dos métodos proibidos encontrados no seu quarto diz respeito. XLVI. Igualmente quanto à medida da pena e à alegada violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso, entende a apelada que, em face da prova produzida em sede de processo disciplinar, a aplicação de uma sanção de suspensão pelo período de quatro anos é justa e adequada, estando, também aqui, a apelada em absoluto acordo com o tribunal a quo quando este decide pela manutenção da decisão recorrida. XLVII. A conduta do apelante foi sempre no sentido de obstaculizar a descoberta da verdade, não se eximindo de recorrer a argumentos absurdos e “histórias de encantar’' na prossecução de tal desiderato, não sendo, por conseguinte merecedor de qualquer atenuação especial, como muito bem entendeu o CAD na decisão que veio a proferir. XLVIII. Em face do exposto, constata-se que inexistem na sentença recorrida os alegados erros que lhe são imputados pelo apelante, pelo que a apelação não pode deixar de improceder, mantendo-se a sentença prolatada pelo douto tribunal «a quo»”. 5. Remetidos os autos a este TCA Sul, foi cumprido o disposto no artigo 146º do CPTA, mas o Digno Procurador-Geral Adjunto junto deste TCA Sul não emitiu parecer. 6. Sem vistos aos Exmºs Juízes Adjuntos, atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência para julgamento. II. OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A DECIDIR 7. Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nºs 1, 2 e 3, todos do CPCivil, “ex vi” artigo 140º do CPTA, não sendo lícito a este TCA Sul conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso. 8. E, tendo em conta o teor das conclusões da alegação do recorrente, impõe-se apreciar no presente recurso as seguintes questões: a. Alteração da decisão recorrida em relação à decisão sobre a matéria de facto, designadamente nos pontos 7. a 11. e 15. dos factos provados da fundamentação de facto da decisão, uma vez que, em relação aos factos tidos como assentes, por um lado, a ausência de prova, em relação a alguns factos, e por outro lado, a prova produzida, quer testemunhal, quer documental, em relação aos demais factos, impunham decisão diversa, impugnando-se todos os demais factos vertidos na decisão recorrida que estejam em perfeita contradição com a matéria ora alegada pelo recorrente no presente recurso (cfr. conclusões 10. a 34. da alegação do recorrente); b. A nulidade do processo disciplinar, por extemporaneidade da decisão (cfr. conclusões 35. a 54. da alegação do recorrente); c. A falta de fundamentação e a postergação dos direitos de defesa (cfr. conclusões 55. a 60. da alegação do recorrente); d. A inexistência de elementos probatórios da prática dos factos ilícitos, por ausência de prova (cfr. conclusões 61. a 72. da alegação do recorrente); e, finalmente, e. Erro na aplicação da medida da pena e a violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso (cfr. conclusões 73. a 90. da alegação do recorrente). III. FUNDAMENTAÇÃO A – DE FACTO 9. O acórdão arbitral recorrido considerou assente a seguinte factualidade: i. Na época desportiva de 2022 o demandante encontrava-se inscrito na Federação Portuguesa de Ciclismo, na equipa A.... B...., assumindo a qualidade de praticante desportivo, nos termos e para os efeitos da Lei Antidopagem. ii. No dia 24-4-2022, pelas 07:00, a Polícia Judiciária desencadeou a operação designada por "Operação Prova Limpa", no âmbito da qual se realizou uma busca à residência do demandante. iii. No âmbito dessa busca foi apreendido ao demandante: na sala do rés-do-chão – um recipiente com o descritivo "D.... L - .......", contendo no seu interior uma seringa, uma "borboleta", um frasco partido sem conteúdo, com a inscrição "c...." e uma embalagem aberta de "fly set"; no quarto utilizado pelo demandante – um saco de papel contendo no interior quatro seringas, três borboletas e um frasco aberto/partido, sem qualquer conteúdo, com as inscrições "E.......", uma caixa de cor azul contendo uma embalagem de "F.......", contendo no seu interior uma ampola aberta/partida, sem conteúdo e duas carteiras de "G.......", de oito comprimidos cada, encontrando-se uma delas completa e a outra com cinco comprimidos, uma embalagem de comprimidos efervescentes de "G.......", contendo dez pastilhas, dois frascos de comprimidos, um dos quais com a inscrição "I.......", contendo quinze comprimidos inteiros e um partido e o outro frasco com a inscrição 'M.........", contendo dois comprimidos inteiros e três comprimidos partidos, e ainda duas saquetas contendo dez comprimidos cada do fármaco "K........." e uma saqueta de dez comprimidos do fármaco "L.........", contendo sete comprimidos. iv. A agulha tipo "borboleta", apreendida na sala do rés-do-chão, que continha vestígios de sangue, é utilizada para infusões na veia pela utilização parenteral e colheita (dispositivo invasivo, cirúrgico, de uso temporâneo). v. As três agulhas com aletas destinam-se a "perfusão de curto prazo, injecção e colheita de sangue", o que é perfeitamente compatível e adequado à realização das sobejamente conhecidas no mundo do ciclismo "autotransfusões de sangue". vi. As seringas, a agulha tipo "borboleta" (que serve para colheita e se encontrava utilizada) e as três agulhas com aletas (que servem para injecção e colheita de sangue, sendo que uma delas se encontrava utilizada), são meios idóneos e adequados para proceder à recolha e introdução de sangue no organismo, sendo normalmente utilizadas para concretizar o método proibido não específico, proibido em competição e fora de competição, referido no nº 1 do ponto Ml da Lista de Substâncias e Métodos Proibidos, aprovada pela Portaria nº 312/2021, de 21 de Dezembro – administração ou reintrodução de qualquer quantidade de sangue autólogo, homólogo ou heterólogo ou de produtos eritrocitários de qualquer origem no sistema circulatório. vii. O demandante não é titular de Autorização de Utilização Terapêutica que lhe permita utilizar ou ter na sua posse os métodos constantes dos pontos anteriores. viii. O material apreendido encontrava-se na residência do demandante, concretamente na sala e no seu quarto, cujo local é de acesso reservado, só sendo o acesso possível com a sua autorização, exercendo o mesmo um controlo exclusivo sobre a mesma, ou seja, o demandante exercia controlo exclusivo sobre o local onde se encontravam os métodos proibidos. ix. O demandante detinha na sua posse os métodos proibidos mencionados na acusação. x. O demandante agiu de forma livre, voluntária, deliberada e consciente, sabendo que não pode ter na sua posse os referidos métodos proibidos, uma vez que tais materiais são meios idóneos e adequados à realização do método proibido "administração ou reintrodução de qualquer quantidade de sangue autólogo", sendo que os mesmos são proibidos em competição e fora de competição. xi. O demandante agiu com dolo, tendo a intenção de praticar a infracção disciplinar em causa, mesmo sabendo que a sua conduta era proibida por lei, agindo de acordo com tal intenção. xii. O demandante vivia, à data dos factos, com os seus pais e irmã, e os seus avós por vezes pernoitam na sua residência. xiii. O demandante não tem antecedentes. xiv. Em sede de processo-crime foi aplicada ao demandante a medida de coacção "termo de identidade e residência". xv. Dos itens recolhidos não se recolheu qualquer amostra do ADN do demandante. B – DE DIREITO 10. Como decorre dos autos, o recorrente invoca uma excepção dilatória que, a verificar-se, obstaria a conhecer o remanescente, nos termos do artigo 89º, nº 2 do CPTA, “ex vi” artigo 576º, nº 2 do CPCivil, levando à absolvição da instância por nulidade da sentença ao abrigo do artigo 574º do CPCivil, ou seja, a nulidade da sentença por extemporaneidade da decisão disciplinar. 11. Para fundamentar, o recorrente percorre uma linha do tempo dos trâmites do processo disciplinar concluindo que: “entre a notificação da violação de norma antidopagem, em 16 de Agosto de 2022 e a notificação da decisão disciplinar, recepcionada por via postal em 19 de Setembro de 2023, decorreram 276 dias úteis, prazo muito superior ao legalmente permitido, e mesmo até consensualmente admissível.; 42. Do teor do nº 3 do artigo 74º da Lei Antidopagem extrai-se que o prazo máximo entre a comunicação da violação de uma norma antidopagem e a aplicação da sanção disciplinar não pode ser superior a, no limite, 240 dias (isto é, prazo de 120 dias + prorrogação por períodos de 30 dias, até ao máximo de 120 dias adicionais)”, socorrendo-se, como argumento, do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 16 de Janeiro de 2020, proferido no âmbito do processo nº 051/19.1BCLSB”. 12. Em causa está, pois, saber a natureza do prazo do artigo 74º, nº 3 da Lei Anti-dopagem, ou seja, se é meramente ordenadora ou peremptória. Vejamos o que diz o artigo 74º da Lei Anti-dopagem, no seu nº 3: “Entre a comunicação da violação de uma norma antidopagem e a aplicação da correspondente sanção disciplinar não pode mediar um prazo superior a 120 dias, o qual, em casos de especial complexidade, pode ser prorrogado por períodos de 30 dias, até ao máximo de 120 dias adicionais, por despacho do órgão competente”. 13. A Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro, vulgo Lei Anti-dopagem, esclarece no artigo 1º que este diploma: “Aprova a lei antidopagem no desporto, adoptando na ordem jurídica interna as regras estabelecidas no Código Mundial Antidopagem”, entrando em vigor, nos termos do seu artigo 102º, “15 dias após a data da sua publicação”, ou seja, em meados de Dezembro de 2021. 14. A Lei Anti-Dopagem tem, pois, de ser lida em estreita articulação com o Código Mundial Anti-Dopagem (doravante CMA), anexo II da Lei nº 81/2021, ex vi artigo 99º do mesmo diploma, importando para o caso em crise a data da sua entrada em vigor como veremos adiante. Assim, o CMA - World Anti-Doping Code, nome original em língua inglesa, entrou em vigor a 01-01-2021. [https://www.adop.pt/media/23281/World%20Anti-Doping%20Code%20-%202021.pdf] 15. Portugal é signatário deste CMA por força das convenções internacionais de que é subscritor: i) Decreto nº 4-A/2007, de 20 de Março: “Considerando a importância de harmonizar os esforços colocados na luta contra a dopagem, bem como de estabelecer um quadro jurídico que permita aos Estados dispor dos meios e medidas para erradicar a dopagem do desporto; Considerando que a Convenção Internacional contra a Dopagem no Desporto e os seus anexos foram adoptados por unanimidade: Assim: Nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 197º da Constituição, o Governo aprova a Convenção Internacional contra a Dopagem no Desporto e seus anexos I e II, adoptados pela 33ª sessão da Conferência Geral da UNESCO em 19 de Outubro de 2005, cujo texto na versão autenticada na língua inglesa bem como a respectiva tradução para a língua portuguesa se publicam em anexo.(...)”. [https://www.adop.pt/media/1713/Conven%C3%A7%C3%A3o%20UNESCO.pdf]; ii) Decreto nº 2/94, de 20 de Janeiro: “Nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 200º da Constituição, o Governo decreta o seguinte: Artigo único É aprovada, para ratificação, a Convenção contra o Doping, aberta à assinatura dos Estados membros do Conselho da Europa a 16 de Novembro de 1989, cuja versão autêntica em língua francesa e respectiva tradução em língua portuguesa seguem em anexo ao presente decreto”. [https://www.adop.pt/media/1710/Conven%C3%A7%C3%A3o%20Europeia.pdf]; iii) transmutando para o âmbito de aplicação do CMA, nos termos do seu artigo 23º: “23.1 Subscrição do Código: 23.1.1 As seguintes entidades podem ser Signatárias do Código: o Comité Olímpico Internacional, as Federações Internacionais, o Comité Paralímpico Internacional, os Comités Olímpicos Nacionais, os Comités Paralímpicos Nacionais, as Organizações de Grandes Eventos, as Organizações Nacionais Antidopagem e outras organizações com relevância significativa no desporto. - 23.1.2 O Comité Olímpico Internacional; as Federações Internacionais reconhecidas pelo Comité Olímpico Internacional; o Comité Paralímpico Internacional; os Comités Olímpicos Nacionais; os Comités Paralímpicos Nacionais; as Organizações Nacionais Antidopagem; e as Organizações de Grandes Eventos reconhecidas por uma ou mais das entidades supramencionadas devem tornar-se Signatárias mediante a assinatura de uma declaração de aceitação ou por outra forma de aceitação considerada aceitável pela AMA” [tradução nossa]. 16. Neste encalce, a Lei nº 81/2021 aplica-se aos Comités Olímpico e Paralímpico, Ligas Profissionais e Federações Desportivas, nos termos dos artigos 96º a 98º deste mesmo diploma. 17. De volta à questão em particular aqui trazida pelo recorrente, concluímos que não se encontra no CMA referência a prazos para a tramitação de um processo disciplinar. Destaque, todavia, para o artigo 13.3 do CMA, segundo a versão do traduzida no anexo II da Lei nº 81/2021: “Falha de uma organização antidopagem em proferir uma decisão num prazo oportuno (título): Quando, num determinado caso, uma organização antidopagem não proferir uma decisão relacionada com uma violação, ou não, de norma antidopagem num prazo oportuno fixado pela AMA, a AMA pode optar por recorrer directamente para o CAS (...)”, mostrando, uma vez mais, que a demora do processo disciplinar não é conditio sine qua non para a prescrição de uma infracção. 18. A Lei nº 81/2021 é categórica na afirmação de que a lei anterior é revogada. Pode ler-se, desde logo, no sumário do diploma: “(...) e revogando a Lei nº 38/2012, de 28 de Agosto”, bem como o seu artigo 101º, sob epígrafe “Norma revogatória (título): É revogada a Lei nº 38/2012, de 28 de Agosto. A Portaria nº 436/2022, de 1 de Abril, que regulamenta a Lei nº 81/2021, “ex vi” artigo 100º da Lei nº 81/2021 (“A Lei nº 81/2021, de 30 de Novembro, aprovou a lei antidopagem no desporto, adoptando na ordem jurídica interna as regras estabelecidas no Código Mundial Antidopagem, e revogou a Lei nº 38/2012, de 28 de Agosto. A referida lei determina que as normas de execução regulamentar são estabelecidas por portaria do membro do Governo responsável pela área do desporto”), não faz menção ao processo disciplinar ou prazos a que este esteja sujeito [sublinhados nossos]. [https://files.dre.pt/2s/2022/04/065000000/0019700209.pdf]. 19. A Lei nº 81/2021, no seu artigo 56º, nºs 2 e 3, estabelece apenas prazos para o início do procedimento e, porquanto, a extinção da responsabilidade e prescrição da infracção: “Extinção da responsabilidade 1 – A prescrição do procedimento criminal rege-se pelo disposto no Código Penal. 2 – O procedimento contraordenacional extingue-se, por efeito de prescrição, quando tenha decorrido o prazo de 10 anos sobre a data em que ocorreu a violação de norma antidopagem. 3 – O procedimento disciplinar não pode ser iniciado quando tenham decorrido 10 anos sobre a prática da violação de norma antidopagem”. 20. O artigo em causa, adapta e respeita o previsto no artigo 17º do CMA, conforme com a publicação do anexo II da Lei nº 81/2021: “Prazo de prescrição (título): Nenhum processo de violação de norma antidopagem poderá ser iniciado contra um praticante desportivo ou outra pessoa sem que os mesmos tenham sido notificados da violação de norma antidopagem conforme previsto no artigo 7º, ou sem uma tentativa razoável de notificação, no prazo de 10 anos a contar da data em que foi alegadamente cometida a violação” [sublinhados nossos]. 21. O recorrente alega no sentido da natureza peremptória do prazo: “45. Não obstante a divergência jurisprudencial verificada quanto à natureza deste prazo, o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão datado de 16 de Janeiro de 2020, no âmbito do processo nº 051/19.1BCLSB, veio pronunciar-se, e muito bem, no nosso entendimento, no sentido de que tal prazo não pode assumir a natureza meramente ordenadora, mas antes cominatória, sendo que, não obstante tal acórdão datar de 16 de Janeiro de 2020, isto é, data anterior à última alteração legislativa à Lei Antidopagem, deverá aplicar-se o entendimento vertido pelo Digno Tribunal, pois que o actual artigo 74º, em causa, mantém a redacção "não pode mediar um prazo superior a 120 dias” na redacção actual”. 22. Ao contrário daquele que foi o entendimento do TAD, que considera o prazo meramente ordenatório: “refere o artigo 1º da Lei Antidopagem, esta destina-se a adoptar na ordem jurídica interna as regras estabelecidas no CMA. Por sua vez, o CMA não contém qualquer norma que fixe um prazo para a conclusão dos processos disciplinares, ou que determine qualquer cominação para a ausência de prolação de decisão num determinado prazo de tempo. E uma vez que a aplicação do CMA reveste carácter obrigatório para Portugal, decorrente da adesão de Portugal à Convenção Internacional contra a Dopagem no Desporto da UNESCO, nunca podia o legislador aprovar qualquer disposição legal que contrariasse o vertido no referido Código. Assim, à excepção do prazo de prescrição de 10 anos, todos os restantes têm a natureza meramente ordenadora, pois Portugal, enquanto signatário do CMA (...)”, tese que é subscrita pela entidade recorrida em sede de contra-alegações. 23. Adiantamos, desde já, que concordamos com a pronúncia do TAD. Indo à fonte primária, ou seja, o CMA, percebe-se que a versão de 2021 não consiste numa mera alteração do já existente, mas algo novo: “O CMA foi adoptado pela primeira vez em 2003 e entrou em vigor em 2004. Foi posteriormente alterado quatro vezes: a 1 de Janeiro de 2009, a 1 de Janeiro de 2015, a 1 de Abril de 2018 (...) e a 1 de Junho de 2019 (...). O CMA revisto entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2021”. 24. Consultados os trabalhos preparatórios da Lei nº 81/2021, é perceptível a cisão com a lei anterior. É o que se depreende da exposição dos motivos da Proposta de Lei nº 110/XIV: “em Novembro de 2019, e após um período de dois anos de revisão e consultas, a AMA aprovou a revisão do CMA, que introduziu alterações significativas face ao regime do código anterior, e que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2021. Neste contexto, impõe-se agora adoptar na ordem jurídica interna as disposições do CMA revisto, em conformidade com o estabelecido na Convenção Internacional contra a Dopagem no Desporto, da UNESCO, aprovada pelo Governo português através do Decreto nº 4-A/2007, de 20 de Março. Assim, em conformidade com o Código Mundial Antidopagem revisto, é definido o âmbito de aplicação da lei, por forma a clarificar o universo de pessoas e entidades a que a mesma se aplica, procedendo-se ainda à actualização das definições constantes da lei”; e mais reforça o artigo 4º da mesma proposta que: “Artigo 4º - Norma internacional (título): 1 - São normas internacionais para efeitos da presente lei as normas adoptadas pela AMA como elemento de apoio ao CMA, incluindo todos os documentos técnicos publicados de acordo com a respectiva norma internacional. 2 - O respeito pelo prescrito na norma internacional, por oposição a qualquer outra norma, prática ou procedimento alternativo, é suficiente para determinar que os procedimentos foram executados de forma correcta”, mostrando o quanto o legislador está vinculado à norma internacional. [https://app.parlamento.pt/webutils/docs/doc.pdf?path=6148523063484d364c793968636d356c6443397a6158526c6379395953565a4d5a5763765247396a6457316c626e527663306c7561574e7059585270646d45764d7a45324f4441314d6a41745a54466b5a5330304f5749344c5749344e574974596a4e6a4d5749304e47526a4f4463314c6d52765933673d&fich=31680520-e1de-49b8-b85b-b3c1b44dc875.docx&Inline=true] 25. Na ausência de prazo de caducidade para o procedimento disciplinar a cargo das obrigações internacionais, do ponto de vista doméstico – e a jurisprudência nacional está pacificada nesse sentido –, os prazos dos procedimentos disciplinares são tidos como meramente ordenantes e não peremptórios. Ou seja, “os prazos estabelecidos na lei para conclusão de processos de natureza disciplinar são de qualificar como meramente ordenadores ou disciplinadores, não derivando da sua violação a extinção da responsabilidade disciplinar” e “não derivando da sua violação a extinção da responsabilidade disciplinar”, pode ler-se nos Acórdãos do TCA Sul, de 4-7-2019, relativo ao Processo nº 51/19.1BCLSB, e de 29-10-2020, respeitante ao Processo nº 225/20.2BECTB. 26. Veja-se, ainda, a explicação dada pelo STA, no âmbito do Processo nº 033221: “Tais prazos, cujos destinatários directos são absolutamente alheios ou indiferentes à sorte da relação material administrativa que lhes subjaz, e cuja acção se desenvolve por imperativo do interesse público, na colaboração com os órgãos instituídos para a defesa da legalidade, não assumem natureza peremptória preclusiva ou resolutiva, integrando antes a categoria dos prazos meramente dilatórios ou retardatórios. IV - A doutrina e a jurisprudência administrativas costumam qualificar tais prazos como meramente ordenadores, indicativos ou disciplinadores (vulgo disciplinares), porque destinados a ordenar, balizar ou regular a tramitação procedimental, e cujo incumprimento não extingue o direito de praticar os respectivos actos, apenas podendo acarretar ao agente ou oficial público infractor consequências do foro disciplinar ou outras, quiçá por violação do dever de zelo no desempenho das suas tarefas, não gerando assim qualquer ilegalidade susceptível de inquinar o acto punitivo final”. 27. Ainda que o Acórdão do TCA Sul tenha sido alvo de recurso procedente por parte do STA, em 16 de Janeiro de 2020, não é possível atender aos argumentos do recorrente, uma vez que as conclusões do STA foram tomadas com base na Lei nº 38/2002, inteiramente revogada pela Lei nº 81/2021 e proferida praticamente um ano antes do novo CMA entrar em vigor, não sendo possível aqui o recurso a uma interpretação sistemática ou extensiva, nem preenchidos os pressupostos da analogia. Mais se diga que o Acórdão citado pelo recorrente não confirma a extinção da infracção, e explicamos por que foi aquele o entendimento do STA na altura e que não traduz a realidade presente. 28. Conforme se pode ler no citado acórdão: “Na verdade, a violação do prazo de 120 dias por parte da Federação Desportiva, não gera a perda definitiva da possibilidade de exercício do poder disciplinar; a consequência da violação deste prazo traduz-se apenas e só na cessação da delegação de competências, legalmente prevista no nº 1 do referido artigo 59º. Ou seja, o exercício do poder disciplinar em matéria de dopagem é exercido pelos órgãos disciplinares das federações desportivas, por delegação de competências, que originariamente, são atribuídas à ADoP. Só que, o legislador limitou no tempo a duração desta delegação de competências, impondo-lhes agora um prazo de 120 dias para a conclusão de uma decisão [no caso de ilícitos disciplinares relacionados com a dopagem]. Este prazo de 120 dias é necessariamente peremptório, pelo que, a violação do mesmo gera a extinção do direito do CDFPF de praticar o acto, máxime de aplicar a sanção disciplinar. Naturalmente que o legislador, não quis com esta redacção que se esgotasse, sem mais, o poder punitivo, mas tão só que este poder punitivo atribuído em sede de delegação de competências ao CDFPF se esgotasse e se extinguisse neste órgão (...) A não se entender desta forma, ficariam em perigo os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança dos cidadãos que integram e concretizam o princípio do Estado de Direito Democrático [artigo 2º da CRP]”. 29. Ora, à luz da actual Lei Anti-dopagem, compete a ADoP, nos termos do artigo 20º, nº 1: “m) Instaurar e instruir os procedimentos disciplinares;”, competência que antes eram exercidas pelas federações, nos termos do artigo 59º da Lei nº 38/2002 (revogada): “1 - A instrução dos processos disciplinares e a aplicação das sanções disciplinares previstas na presente lei competem à ADoP e encontram-se delegadas nas federações desportivas”. Contextualizando o mencionado Acórdão do STA, o objectivo era que os procedimentos não se eternizassem nas federações sem decisão e, por isso, justificou-se, com o devido respeito, essa leitura, de molde que o processo passasse para as mãos da ADOP, não se coadunando com a leitura feita pelo recorrente de que, assim sendo, a infracção prescrevia. 30. Improcede, assim, o argumento invocado pelo recorrente, pelo que se impõe conhecer das demais questões objecto de recurso. 31. O recorrente alega que houve falta de fundamentação na decisão do tribunal arbitral e que os seus direitos de defesa não foram acautelados. Vejamos. 32. O recorrente sustenta que: “55. Até à junção do processo disciplinar, nos presentes autos, pela recorrida, na sequência da notificação para o efeito, em 26 de Outubro de 2023, o relatório final elaborado pela ADoP era absolutamente desconhecido do recorrente, porquanto nunca o mesmo lhe foi notificado”. 33. Para o TAD esta questão é estéril porquanto: “Sucede, no entanto, que o artigo 72º, nº 5 da Lei Antidopagem nada refere acerca da notificação do relatório final elaborado pela ADoP, apenas prevendo que após a sua emissão, o mesmo seja remetido à CDA. E não nos parece que tivesse de ser de outra forma, uma vez que o relatório final da ADoP não coloca termo ao processo”, não prejudicando o curso normal do processo. 34. A entidade recorrida adere à tese do tribunal arbitral e acrescenta: “O relatório final elaborado pelo Instrutor apenas serve como uma súmula da actividade processual desenvolvida ao longo do procedimento de instrução, culminando com uma proposta, não sendo, no final, vinculativo para o CDA”. 35. Importa, pois, perceber se há aqui algum vício, ou, simplificando, saber se o recorrente tinha de ser notificado do relatório final da ADoP e, de modo consequente, se viu o seu direito de defesa posto em causa. A resposta à questão surge através da análise dos artigos 72º e 75º da Lei nº 81/2021. Nos termos do artigo 72º, que aborda as “Regras da tramitação processual”, diz o nº 1 que “(...) o procedimento disciplinar tem forma escrita e natureza secreta” e, conforme com o seu nº 9, adianta que “[f]inda a fase de defesa, o instrutor elabora um relatório final, devendo a ADoP remetê-lo ao CDA para decisão”; este nº 9 do artigo 72º deve ser lido em conjunto com o artigo 75º, nº 1, que dispõe: “O CDA recebe o processo instruído pela ADoP, o qual é remetido, de forma confidencial, ao presidente”, continuando, nos números seguintes, a explicar como se desenrola a restante tramitação. 36. Da leitura destes artigos podemos tirar várias conclusões: i) Nos termos do artigo 72º, nº 1 da Lei nº 81/2021, o processo é secreto, logo, o alegado infractor não pode ter acesso ao mesmo; ii) nos termos do artigo 75º, nº 1, acrescenta-se ainda que o processo é remetido ao presidente de forma confidencial, o que reforça que, para além do alegado infractor não poder ter acesso, o grupo de pessoas que o conhece até este momento é, de facto, muito restrito; iii) se, nos termos do nº 9 do artigo 72º, a ADoP remete o relatório final para o CDA e o artigo 75º enuncia as várias etapas que se seguem depois do CDA lançar mão do processo, significa que relatório final não é o mesmo que decisão final, não estando em causa o direito ao contraditório, já que o arguido teve a oportunidade de ser ouvido em sede de audiência preliminar, nos termos do artigo 72º, nº 5, para que remetemos demais fundamentação infra neste acórdão. 37. Improcede, pois, o argumento do recorrente na exigência de ser notificado do relatório final da ADoP antes deste ser enviado ao CDA, escudando-nos na letra da lei, que é clara. Para mais remetemos para o prolatado no Acórdão do TCAS, de 11 de Julho de 2024, Processo nº 63/24, cujo sumário transcrevemos excerto: “I – O cotejo dos factos, enquadrados pelas disposições aplicáveis, revela que durante a fase de defesa do procedimento disciplinar, o recorrido não só teve oportunidade de contraditar e de se defender, como, sobretudo, exercitou efectiva e plenamente o seu direito ao contraditório e o seu direito de defesa por reporte a factos acusatórios notificados de forma clara, coerente e concreta e também por expressa referência a devidamente identificadas circunstâncias de tempo, modo e espaço: cfr. artigo 72º, nºs 1 a 8; artigo 73º; artigo 74º, nº 1 da LADop; artigos 110º a 114º; artigo 160º; artigo 153º e artigo 154º, todos do Código de Processo Administrativo, ex vi artigo 2º, nº 4, alínea c) e nº 5 do CPA, ex vi artigo 18º, nº 4 e artigo 37º, ambos da LADop. II – A falta de notificação do relatório final ao recorrido, previamente ao seu envio ao órgão decisor, não colocou em causa a possibilidade do exercício do contraditório ou o exercício do direito de defesa do recorrido, posto que, (…), tal notificação prévia não se encontra prevista na lei, nem do quadro legal resulta que, tal notificação prévia é devida: cfr. artigo 75º, nº 1, artigo 76º, nº 1 e artigo 90º, nº 1, todos da LADop; artigos 110º a 114º, todos do CPA, ex vi artigo 2º, nº 4, alínea c) e nº 5 do CPA, ex vi artigo 18º, nº 4 e artigo 37º, ambos da LADop; III – Aliás à semelhança do que se passa nas regras gerais do processo disciplinar contidas na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas – LGTFP (v.g. artigo 219º; artigo 220º; artigo 222º; artigo 214º e artigo 223º) e do que se passava já à luz do DL nº 24/84, de 16 de Janeiro (v.g. artigo 65º, artigo 69º e artigo 59º)”. 38. E também, de antemão, dizemos que não se consideram postos em causa os direitos à defesa e ao contraditório por parte do recorrente, que invoca, para tanto, o artigo 82º da Lei nº 81/2021: “57. Além disso, a acta da audiência do arguido, aqui recorrente, a que se reposta o artigo 82º da LADoP, realizada a 23 de Junho de 2023, não foi de imediato remetida a fim de ser assinada pelo recorrente e pela sua mandatária, tendo sido remetida apenas em 14 de Julho de 2023, após solicitação da mandatária do recorrente.; 58. Porém, analisado o teor da acta remetida, o mesmo não estava conforme com as declarações prestadas pelo recorrente, motivo pelo qual a mandatária do recorrente remeteu, por correio electrónico, as alterações que entendia serem necessárias, não obstante, a tal correspondência electrónica enviada não foi apresentada qualquer resposta pelo CDA, motivo pelo qual, nunca foi a acta da diligência realizada no dia 23 de Junho de 2023 assinada pelo recorrente e pela sua mandatária, nem pelos membros da Subcomissão do Colégio Disciplinar Antidopagem, pelo que é de arguir a nulidade da mesma, por inobservância dos formalismos legais, o que, desde logo, inquina o cumprimento do disposto no artigo 82º da LADoP e os princípios que lhe subjazem”. 39. Por partes, pretende-se saber i) se a elaboração da acta é obrigatória; ii) se há obrigação de notificar o arguido da mesma; iii) em caso afirmativo, se havia um prazo para notificar o arguido da acta da audiência; iv) se a acta com as rectificações requeridas pelo arguido tem de ser notificada a este; v) se a acta tem de ser assinada pelo arguido; e concluindo, vi) se a falta de algum destes momentos constitui um postergamento dos direitos do arguido. 40. O TAD não encontrou qualquer vício na situação descrita, manifestando na decisão que: “Sucede, porém, que do artigo 82º da Lei Antidopagem não consta que tenha de ser elaborada qualquer acta da audição prévia, nem que esta tenha de ser notificada ao arguido. (...) No caso dos autos, dúvidas não subsistem que a audiência prévia se realizou. Quanto à questão da Acta da diligência, não resulta do normativo supracitado que tal formalismo tivesse sequer de ocorrer”. 41. A entidade recorrida fere, igualmente, de morte os argumentos sustentados pelo recorrente, ao contra-alegar nos seguintes termos: “do artigo 82º da Lei Antidopagem não consta que tenha de ser elaborada qualquer acta da audição prévia, nem que esta tenha de ser notificada ao arguido. O que prescreve é que ‘o praticante desportivo ou outra pessoa tem o direito, em qualquer dos casos, antes de ser aplicada qualquer sanção, a ser ouvido com vista a apresentar os seus argumentos de forma a tentar eliminar ou reduzir a sanção a aplicar, nos termos do artigo seguinte’. No caso dos autos, dúvidas não subsistem que a audiência prévia se realizou. Quanto à questão da acta da diligência, não resulta do normativo supracitado que tal formalismo tivesse sequer de ocorrer”. 42. Em causa está o artigo 82º da Lei nº 81/2021, cujo o texto impõe o direito de audiência prévia: “O praticante desportivo ou outra pessoa tem o direito, em qualquer dos casos, antes de ser aplicada qualquer sanção, a ser ouvido com vista a apresentar os seus argumentos de forma a tentar eliminar ou reduzir a sanção a aplicar, nos termos do artigo seguinte”, conjugado com o artigo 72º, nº 5, já aqui mencionado, onde se pode ler que “A audiência preliminar prevista no número anterior deve ser breve e célere, garantindo ao agente uma oportunidade de ser ouvido, de forma escrita ou verbal”. São exemplos dos princípios de defesa e contraditório, de que releva, ainda, para a sua dignidade constitucional, nos termos do artigo 32º, nº 10 da CRP: “Nos processos de contra-ordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa”. 43. O recorrente não contesta que este direito ao contraditório lhe foi facultado, crítica sim a morosidade na notificação da decisão e de não ter sido notificado das rectificações que a sua mandatária solicitou, bem como defende uma nulidade formal com base na falta de assinatura do documento. Recorde-se o excerto das alegações de recurso: “a acta da audiência do arguido, aqui recorrente, a que se reposta o artigo 82º da LADoP, realizada a 23 de Junho de 2023, não foi de imediato remetida”, extraindo-se daqui que o arguido foi ouvido em sede de audiência preliminar e, com tal, exerceu o seu direito ao contraditório. Quanto à morosidade, refere o artigo 114º, nº 5, que “Quando não exista prazo fixado na lei, os actos administrativos devem ser notificados no prazo de cinco dias”, mas este prazo só seria invocável caso fosse obrigatória a notificação da acta, pelo que, não havendo norma que o obrigue, esta questão do prazo não se coloca. Mais se diga que, em caso de ser sindicável, também não levaria à nulidade do processo, mas à sua ineficácia, nos termos do artigo 160º do CPA: “Independentemente da sua forma, os actos que imponham deveres, encargos, ónus, sujeições ou sanções, que causem prejuízos ou restrinjam direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afectem as condições do seu exercício, só são oponíveis aos destinatários a partir da respectiva notificação”. 44. Aliás, o acima descrito vem dar robustez à nossa conclusão anterior, ou seja, realizou audiência e foi notificado da acta da mesma. Ou seja, ser notificado da acta não é o mesmo que ser notificado do relatório final, que é secreto e remetido de forma confidencial. 45. Do mesmo modo, não colhe o argumento da falta de assinatura, pois, para além de se tornar irrelevante perante a ausência de obrigatoriedade da acta. Nos termos do Acórdão do TR de Lisboa, de 12 de Julho de 2012, sobre o Processo nº 1001/07.3TYLSB.L1-2, diz o seguinte: “V – Apesar de os actos administrativos nulos ou inexistentes não serem passíveis de ratificação, reforma ou conversão, a aposição da assinatura para suprir o vício não visa ratificar o acto, reformá-lo ou convertê-lo, já que nada acrescenta ou retira ao seu conteúdo; aliás, a aposição de assinatura em termos de economia de meios e esforços com igual salvaguarda dos direitos das partes, será a via mais aconselhável, salientando-se que no âmbito do processo civil constituindo a inexistência de assinatura do juiz a falta de um requisito de forma essencial, a aposição posterior de assinatura elimina aquela falta, não se tratando rigorosamente de suprimento ou sanação da nulidade, mas da verificação ulterior do próprio requisito em falta”. Comparável, a falta de assinatura numa sentença de um tribunal, embora constitua uma nulidade, é suprida oficiosamente, nos termos do artigo 615º, nº 2 do CPCivil, concretizando assim, o princípio do aproveitamento dos actos. 46. Regressando à questão B), destarte ter realizado a audiência preliminar, o ora recorrente queixa-se da omissão de documentos no processo disciplinar. “59. Por seu turno, mediante a consulta do processo disciplinar, constata-se a inexistência da designação de data para a realização da diligência de audiência do arguido, aqui recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 82º da Lei Antidopagem, bem como do comprovativo de realização de tal diligência em 23-6-2023, via zoom, assim como da referida acta enviada pelo CDA em 14-6-2023, tal como a ausência de toda a correspondência electrónica trocada a este respeito, entre a mandatária do recorrente e o CDA. 60. Posto isto, somos levados a concluir pela violação pelo CDA do disposto nos artigos 82º e 83º, nºs 1 a 5 da Lei Antidopagem, bem como pela ocultação de documentos no processo disciplinar do recorrente, e em face disso, pela manifesta postergação dos direitos de defesa do arguido, naqueles autos, aqui recorrente”. 47. O TAD refutou estes argumentos, nos seguintes termos: “No caso dos autos, existe uma decisão fundamentada por parte do CDA, na qual este apresenta os motivos de facto e de direito pelos quais condenou o Demandante. Com efeito, a fundamentação de uma decisão traduz-se no carrear argumentos de facto e de direito constitutivos da premissa menor do silogismo judiciário. Para que ocorra a nulidade de falta de fundamentação não basta que tenha havido uma justificação deficiente, ou menos convincente, antes se exigindo uma ausência total de motivação que impossibilite o conhecimento das razões que levaram à opção final”. 48. A entidade recorrida, em concordância com o entendimento do TAD, afirma que: “XXXIV. Ao decidir como decidiu, o CDA fê-lo de forma devidamente fundamentada, apresentando os motivos de facto e de direito pelos quais condenou o arguido, aqui apelante, limitando-se a aludir à existência de um relatório final emitido pelo instrutor do processo, transcrevendo partes de tal relatório, assim identificando diligências realizadas pelo instrutor. O relatório final elaborado pelo Instrutor apenas serve como uma súmula da actividade processual desenvolvida ao longo do procedimento de instrução, culminando com uma proposta, não sendo, no final, vinculativo para o CDA. Sendo certo que o CDA decide com base na sua estrita convicção, não seguindo o relatório final emitido pela ADoP, conforme se verifica do teor da decisão e na qual veio a ser aplicada uma sanção com um período de suspensão mais favorável para o demandante do que a que constava no relatório final”. 49. Vejamos o que dizem as normas invocadas pelo recorrente. No artigo 82º da Lei nº 81/2021 pode ler-se: “tem o direito (...) antes de ser aplicada qualquer sanção, a ser ouvido com vista a apresentar os seus argumentos (...)” e do teor do artigo 83º da Lei nº 81/2021, sob epígrafe: “Eliminação ou redução do período de suspensão”, invoca os nºs 1 a 5, que transcrevemos: “1 – O praticante desportivo ou outra pessoa pode eliminar o seu período de suspensão se provar que não teve culpa ou não foi negligente face a uma violação de norma antidopagem. 2 – Caso a violação da norma antidopagem envolva uma substância específica, que não seja uma substância de uso recreativo, ou um método específico, e o praticante desportivo ou outra pessoa possam demonstrar que a culpa ou negligência não são significativas, a sanção a aplicar é, no mínimo, uma advertência, sem período de suspensão, e, no máximo, uma suspensão, por um período de 2 anos, consoante o grau de culpa do praticante desportivo ou da outra pessoa. 3 – Nos casos em que o praticante desportivo ou outra pessoa possam demonstrar que a culpa ou negligência não são significativas e que a substância proibida detectada tem origem num produto contaminado, a sanção aplicada é, no mínimo, uma advertência, sem período de suspensão, e, no máximo, uma suspensão, por um período de 2 anos, consoante o grau de culpa do praticante desportivo ou da outra pessoa. 4 – Nos casos em que a violação da norma antidopagem seja praticada por praticante desportivo recreativo ou por praticante desportivo protegido, e tal violação não esteja relacionada com substâncias de uso recreativo, se os mesmos demonstrarem que a existência de culpa ou negligência não é significativa, a sanção aplicada é, no mínimo, uma advertência, sem período de suspensão, e, no máximo, uma suspensão, por um período de 2 anos, consoante o grau de culpa. 5 – Nos casos em que o praticante desportivo ou outra pessoa demonstrem que, fora das situações previstas no nº 3, a existência de culpa ou negligência não é significativa, o período de suspensão aplicável pode ser reduzido com base no grau de culpa, não podendo, contudo, ser inferior a metade do período de suspensão que de outra forma seria aplicável e, nos casos em que o período de suspensão aplicável em condições normais corresponderia a 25 anos, o período de suspensão a aplicar nunca pode ser inferior a 8 anos”. 50. Cabe saber se a falta destes documentos consubstancia uma falta de fundamentação da decisão, produzindo a sua nulidade. Com efeito, o direito ao contraditório, já o vimos, é incontornável e está alicerçado nos artigos 82º da Lei nº 81/2021 e pelo artigo 7º do CMA, ex vi artigo 99º da Lei nº 81/2021. Porém, o facto é que o arguido – e aqui recorrente – exerceu o seu direito ao contraditório antes e, a razão por que acta e as comunicações com a mandatária não surgem na decisão do CDA não pode ser lido como omissão e, antes, resultado da livre apreciação da prova por parte do CDA. Recorde-se que o CDA não está cingido ao relatório final da ADoP, já que este funciona como uma súmula do processo, pelo que a sua preterição não constitui falta de fundamentação. 51. Analisemos agora a questão C) levantada pelo recorrente: inexistência de elementos probatórios da prática dos factos ilícitos, por ausência de prova, e invoca o princípio da inocência do réu: “61. Por tudo quando exposto, não resulta do processo disciplinar qualquer elemento probatório susceptível de imputar recorrente, os factos dados como provados na decisão proferida pelo CDA que se impugnou, bem como na decisão ora recorrida, susceptíveis de conduzir à aplicação de uma pena de suspensão da prática da actividade desportiva por um período de 4 anos, não existindo nos autos nenhuma prova credível que permita, com segurança e rigor, imputar a prática de tais factos alegados ao aqui recorrente, revelando-se absolutamente impossível à ADoP e ao CDA, imputar, comprovadamente, e sem qualquer margem para dúvidas, e com o grau de certeza exigível, a prática de tais factos ao recorrente, designadamente a posse de tais materiais, sendo sempre de privilegiar, in casu, se dúvidas existissem no espírito do decisor, a aplicabilidade dos princípios «in dubio pro reo» e de presunção de inocência. 62. Acresce que, aquando da inquirição das testemunhas indicadas pelo arguido, e aqui recorrente, na sua defesa escrita, no âmbito do processo disciplinar, todas elas depuseram no sentido da defesa apresentada pelo recorrente, não tendo o CDA atribuído qualquer relevância aos depoimentos prestados pelas testemunhas no âmbito do processo. 63. Por seu turno, resulta do processo-crime pendente, a correr termos no Juiz 4 do Juízo Central Criminal de Penafiel, da Comarca do Porto Este, sob o Proc. nº ......./20.5JFLSB, no Relatório Final da Polícia Judiciária, constante de fls. 3487 a 3572, e datado de 13-12-2022, designadamente a fls. 3568, relativamente ao arguido J.........., aqui recorrente, alega que a única substância que se apurou ser detida e/ou ter sido administrada por este, foi BETAMETASONA, em período fora de competição, pelo que conclui que a sua administração não é ilegal. 64. Assim, na ausência de qualquer outro meio de prova, e atenta a inexistência de vestígios de dopagem no histórico clínico do recorrente, não há dúvidas se que não foi possível apurar com qualquer grau de certeza, que, naquelas circunstâncias de tempo, modo e lugar, o arguido, aqui recorrente, cometeu as infracções pelas quais foi condenado na decisão disciplinar proferida pelo CDA, impugnada para o tribunal recorrido e mantida na decisão aqui recorrida. 65. Saliente-se que, no dia em que foram realizadas as referidas apreensões e buscas, isto é, a 24-4-2022, o arguido, aqui recorrente, J.......... encontrava-se, precisamente, na residência, com os seus pais, uma vez que não se encontrava em competição. 66. Além disso, a incerteza sobre a pertença do material médico, assim como da sua utilização, terá necessariamente de resolver-se a favor do recorrente, sendo de mencionar, a este respeito, os princípios processuais penais do «in dubio pro reo» e da presunção da inocência, que, permita-se ao recorrente dizer, em desabafo, parecem viver à margem deste processo disciplinar. 67. Ora, do que resulta alegado na pág. 30 da decisão recorrida, é possível ao recorrente concluir que não existe qualquer certeza daquilo que é decidido pelo tribunal recorrido, tratando-se de meras especulações traduzidas na condenação do recorrente com base, precisamente, em meras suposições ou probabilidades, não valorizando, sequer, a recolha laboratorial de saliva pelo aqui recorrente, de modo a apurar se existia o ADN do aqui recorrente nas amostras recolhidas, e o seu resultado científico, conforme a isso se encontraria vinculado. 68. Por seu turno, no esquema junto à Impugnação sob o doc. nº 20, o recorrente não aparece aí inserido, pela investigação, na alegada cadeia ou estrutura, nem sequer mencionado como ciclista consumidor. 69. Acresce que, ao ter sido proferida a decisão disciplinar de suspensão do recorrente por um período de 4 anos, violou o CDA os princípios da tipicidade, da ilicitude e da culpa. 70. Na verdade, perante os elementos probatórios constantes do processo disciplinar, denota-se que a decisão disciplinar proferida pelo CDA se encontra desprovida de qualquer fundamento, fáctico e jurídico, pelo que, não se pode concordar e carece de razão a decisão aqui recorrida, por manter a mesma a referida decisão disciplinar proferida pelo CDA, em relação ao aqui recorrente. 71. Conforme decorre da LADoP, o ónus da prova de dopagem, para efeitos disciplinares, recai sobre a ADoP, cabendo-lhe determinar a existência da violação de uma norma antidopagem, sendo que o praticante desportivo, no âmbito do processo disciplinar em que é arguido, não tem de provar, com um grau de certeza absoluta, a sua ausência de culpa, bastar-lhe-á alegar e provar factos que impeçam a entidade sancionadora de concluir, com um grau de certeza superior a um justo equilíbrio de probabilidades, pela existência de culpa sua, pelo que, estando perante uma presunção natural, é suficiente ao atleta criar dúvidas no processo sobre o facto presumido de forma a não ser sancionado disciplinarmente. 72. Como tal, sempre será de dizer que dos elementos probatórios existentes, nunca se poderá retirar a ilação da prática das infracções de que foi acusado e punido e muito menos sob a forma dolosa, porquanto, na verdade, não existem sequer indícios, quanto mais prova suficiente da prática das referidas infracções disciplinares pelo recorrente”. 52. A decisão do TAD contraria o alegado pelo recorrente, nos seguintes termos: “(...) a verdade é que consta dos autos, nomeadamente, da prova documental produzida, que foram apreendidos materiais proibidos no quarto do Demandante. Tal é bastante para concluir que nos encontramos perante uma infracção, independentemente de existir ou não ADN do Demandante nas amostras recolhidas. Em suma, dos elementos constantes do processo, conforme decorre do teor da decisão proferida pelo CDA, o Demandante tinha na sua posse métodos proibidos, os quais poderia utilizar no sentido de adulterar resultados desportivos, pelo que foi condenado”. 53. A entidade recorrida considera que esteve bem o tribunal arbitral, na análise que prolatou, “ao considerar como provada a matéria de facto que veio a suportar a decisão, não considerando como verosímil a tese rocambolesca do apelante no que à posse e detenção dos métodos proibidos encontrados no seu quarto diz respeito”. 54. O recorrente apela à presunção do princípio “in dubio pro reo”, segundo o qual, na dúvida, o réu não pode ser condenado. O preenchimento dos pressupostos deste princípio colocam-se, sobretudo, quando o decisor está perante prova testemunhal. A este propósito recorremos ao acórdão do TCA Sul, de 26 de Setembro de 2019, Processo nº 2447/14.6BESNT, no qual é sumariado que “i) A prova, designadamente por testemunho, é apreciada segundo o princípio da livre apreciação do julgador. ii) Não havendo elementos objectivos na acusação e na decisão que permitam inferir, com segurança, a existência de premeditação do facto ilícito imputado, nem sequer, de acordo com as regras da experiência, que tenha havido a prestação efectiva de falsas declarações, sempre ficaria uma dúvida séria quanto ao seu cometimento, pelo que, por imposição do princípio do in dubio pro reo teria de absolver-se o arguido, com o consequente arquivamento do processo disciplinar”. 55. Leia-se ainda no acórdão do TCA Sul, de 11 de Abril de 2024, relativo ao Processo nº 34/24.0BCLSB, que confronta o princípio da veracidade com a presunção ‘in dubio pro reo’: “I – A presunção de veracidade dos elementos reportados pela equipa de arbitragem e delegados da Liga prevista no artigo 13º, alínea f), do Regulamento Disciplinar das competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional (RDLPFP), não contende com os princípios da presunção de inocência e do “in dubio pro reo”, posto que se permite ao arguido a contraprova dos factos presumidos. II – A norma em causa limita-se a atribuir um valor probatório aos factos presenciados pelas autoridades desportivas e estabelece a base fáctica que pode eventualmente consubstanciar a prática da infracção, passando a caber ao arguido colocar fundadamente em causa o que dali consta. III – Competirá então ao julgador analisar os elementos que forem carreados para os autos pelo arguido e decidir se colocam em causa a prova já existente e ilidem a presunção de veracidade daqueles elementos”. 56. Não é o caso aqui. O tribunal arbitral sustenta a sua decisão na prova documental. Por economia, remetemos para a matéria de facto dada como provada na decisão do TAD, mas lembrando que foi dado como provado que “1. Na época desportiva de 2022 o Demandante encontrava-se inscrito na Federação Portuguesa de Ciclismo, na equipa A.... B...., assumindo a qualidade de praticante desportivo, nos termos e para os efeitos da Lei Antidopagem. 2. No dia 24-4-2022, pelas 07:00, a Polícia Judiciária desencadeou a operação designada por "Operação Prova Limpa", no âmbito da qual se realizou uma busca à residência do Demandante”. 57. No curso destes factos, transcrevemos o Comunicado da Polícia Judiciária referente a esta operação: “A Polícia Judiciária, através da Directoria do Norte, no âmbito de inquérito titulado pelo Ministério Público – DIAP Regional do Porto, procedeu à realização de uma operação destinada à detecção de métodos proibidos e substâncias ilícitas susceptíveis de adulterar a verdade desportiva em provas do ciclismo profissional. Nesta acção, acompanhada por magistrados do Ministério Público, foram efectuadas duas detenções e realizadas várias dezenas de buscas domiciliárias e não domiciliárias em diversas regiões do território nacional, visando dirigentes, atletas e instalações de uma das equipas em competição. No decurso das diligências foram apreendidas diversas substâncias e instrumentos clínicos, usados no treino dos atletas e com impacto no seu rendimento desportivo. A operação policial, envolvendo um total de cerca de 120 elementos provenientes da Directoria do Norte e ainda das Directorias do Centro e do Sul, da Unidade Nacional de Combate à Corrupção e dos Departamentos de Investigação Criminal de Braga, Guarda e Vila Real, contou ainda com a colaboração da Autoridade Antidopagem de Portugal”. 58. Não foi dado como provado o uso de qualquer substância proibida pelo atleta, mas sim a posse de medicamentos e instrumentos proibidos ao abrigo da Portaria nº 312/2021, de 21 de Dezembro, que aprovou a lista de substâncias e métodos proibidos a partir de 1 de Janeiro de 2022, em vigor à data e, entretanto, já revogada. 59. O recorrente, à luz do homem médio, enquanto atleta profissional, não pode alegar inocência e desconhecimento sobre os materiais e produtos proibidos para a prática da actividade desportiva. Atenhamo-nos na explicação vazada no acórdão do TRL, de 30-4-2013, Processo nº 292/10.7TBPTS-A.L1-7: “Como refere Almeida Costa, na ob. cit., pág. 584, “serve, assim, de paradigma a conduta que teria uma pessoa medianamente cuidadosa, atendendo à especificidade das diversas situações. Esclareça-se que, por homem médio, não se entende o puro cidadão comum, mas o modelo de homem que resulta do meio social, cultural e profissional daquele indivíduo concreto. Dito de forma mais explícita: o homem médio que interfere como critério da culpa é determinado a partir do círculo de relações em que está inserido o agente”. 60. Era, pois, sua obrigação saber, não lhe soçobrando espaço para alegar a inocência, de que não bastava, para agir em conformidade na sua actividade, ter avisado o director desportivo de que tomava certos medicamentos – mesmo que por força de um acidente – sem que tivesse autorização legal para o fazer. A letra da lei é clara. Nos termos do artigo 13º da Lei nº 81/2021, “1 – À concessão de uma autorização de utilização terapêutica, bem como à revisão ou ao recurso de uma decisão de autorização de utilização terapêutica, aplicam-se os critérios e regras definidos no Código Mundial Antidopagem e na Norma Internacional de Autorizações de Utilização Terapêutica, cabendo à ADoP, através da CAUT, proceder à recepção, análise e aprovação das solicitações de autorização de utilização terapêutica de substâncias e métodos proibidos, relativamente a praticante desportivo nacional, e à respectiva federação desportiva internacional, relativamente a praticante desportivo internacional”. 61. Apreciemos a última questão: D) Erro na aplicação da medida da pena e a violação dos princípios da proporcionalidade e da proibição do excesso, que o recorrente combate com as seguintes conclusões que aqui recordamos (reproduzimos excerto por economia): “81. Em face do exposto, punir exclusivamente porque a comunidade assim o “exige”, MESMO SEM PROVA, conduz, sem dúvida, ao sobejamente conhecido direito penal do terror, em que, até a condutas lícitas se podem aplicar sanções pesadas, transformando qualquer cidadão num mero instrumento da necessidade de prevenção, pondo mesmo em causa a dignidade humana. 82. Todo o circunstancialismo descrito, não podia deixar de ser considerado, no seu conjunto, como factor de ponderação quanto à decisão disciplinar a proferir, tendo em consideração também os fins de prevenção geral e especial que com as normas punitivas se pretenderia alcançar. 83. Quer isto dizer que, no caso como o dos autos, em que não são evidentes (e mesmo inexistentes) os riscos à modalidade desportiva em questão, a infracção, a ilicitude, o grau de culpa do agente, não se poderá permitir a condenação do aqui recorrente, na senda da decisão disciplinar proferida, por forma a evitar qualquer violação da proporcionalidade e da proibição do excesso. 84. Na realidade, foi com grande espanto, revolta e perplexidade que o recorrente que, além do mais, não estava verdadeiramente integrado na equipa da A...., não sendo convocado para várias provas, viu o seu nome associado à prática das alegadas infracções disciplinares pelas quais foi efectivamente acusado e punido. 85. Inexiste qualquer registo de sanção disciplinar aplicada ao recorrente que, antes do mais, e enquanto ciclista, sempre teve um cadastro disciplinar impoluto, sempre duplamente controlado dado se tratar também de um atleta nacional”, apelando a que está inocente e não agiu com dolo ou negligência. 62. O tribunal arbitral entendeu que os argumentos do ora recorrente não preenchiam as alíneas do artigo 83º da Lei nº 81/2021, sob a título “Eliminação ou redução do período de suspensão”, porquanto, “No caso dos autos, o demandante não logrou provar que os materiais apreendidos não eram seus, nem que desconhecia da sua existência na sua habitação. Igualmente, nem o demandante nem qualquer outra pessoa lograram demonstrar que a culpa não foi significativa”. 63. Nas contra-alegações, a entidade recorrida conclui que o demandante não tem razão em apontar falta de proporcionalidade na medida da pena suspensão, uma vez que “Sendo certo que o CDA decide com base na sua estrita convicção, não seguindo o relatório final emitido pela ADoP, conforme se verifica do teor da decisão e na qual veio a ser aplicada uma sanção com um período de suspensão mais favorável para o demandante do que a que constava no relatório final”. 64. Quanto ao princípio da proporcionalidade e adequação da pena, nos termos do artigo 5º, nº 2, alínea g) da Lei nº 81/2021, “A posse em competição, por parte do praticante desportivo, de qualquer substância ou método proibido, bem como a posse fora da competição de qualquer substância ou método proibido que não seja consentido fora de competição, excepto se for demonstrado que decorre de uma autorização de utilização terapêutica ou de outra justificação aceitável”, conjugado com nº 3 do mesmo artigo, que dispõe que, “Para efeitos das alíneas g) e h) do número anterior: a) A posse é determinada apenas se o indivíduo exerce ou pretende exercer um controlo exclusivo sobre a substância ou o método proibido, ou sobre o local onde se encontra a substância ou o método proibido”; junto com o nº 9, cujo teor é “Para efeitos da presente lei, entende-se por: a) «Consequências de violação de normas antidopagem» a desqualificação, a suspensão, a suspensão provisória, a penalização financeira ou a divulgação pública, em resultado da violação de normas antidopagem por praticante desportivo ou outra pessoa; b) «Em competição» o período que se inicia às 23:59 horas do dia que antecede uma competição em que o praticante desportivo vai participar, e que termina com o final da mesma e do processo de colheita de amostras, sendo que qualquer período que não seja em competição é entendido como «fora de competição»; c) «Posse» a detenção actual, física ou de facto de qualquer substância ou método proibido”. 65. No seguimento, de acordo com o artigo 77º da Lei nº 81/2021, onde se refere que “Presença, uso ou posse de substâncias ou métodos proibidos (título): 1 - No caso de violação das normas antidopagem previstas nas alíneas a) a c) e h) do nº 2 do artigo 5º, tratando-se de primeira infracção, o praticante desportivo é punido com pena de suspensão por um período de: a) 4 anos, se a conduta for praticada a título doloso; b) 2 anos, se a conduta for praticada a título de negligência. 2 - No caso de violação das normas antidopagem previstas nas alíneas a) a c), g) e h) do nº 2 do artigo 5º, relativas a substâncias não específicas proibidas, presume-se que aquela foi praticada com dolo, salvo se o praticante desportivo demonstrar o contrário, sem prejuízo da possibilidade de eliminação ou redução do período de suspensão nos termos do disposto no artigo 83º”. 66. Da matéria de facto dada como assente na primeira instância consta que “7. O demandante não é titular de Autorização de Utilização Terapêutica que lhe permita utilizar ou ter na sua posse os métodos constantes dos pontos anteriores. 8. O material apreendido encontrava-se na residência do demandante, concretamente na sala e no seu quarto, cujo local é de acesso reservado, só sendo o acesso possível com a sua autorização, exercendo o mesmo um controlo exclusivo sobre a mesma, ou seja, o demandante exercia controlo exclusivo sobre o local onde se encontravam os métodos proibidos. 9. O demandante detinha na sua posse os métodos proibidos mencionados na acusação. 10. O demandante agiu de forma livre, voluntária, deliberada e consciente, sabendo que não pode ter na sua posse os referidos métodos proibidos, uma vez que tais materiais são meios idóneos e adequados à realização do método proibido "administração ou reintrodução de qualquer quantidade de sangue autólogo", sendo que os mesmos são proibidos em competição e fora de competição. 11. O demandante agiu com dolo, tendo a intenção de praticar a infracção disciplinar em causa, mesmo sabendo que a sua conduta era proibida por lei, agindo de acordo com tal intenção”. 67. Para estes efeitos, o tribunal a quo formou a sua convicção nas seguintes provas: “7. Resulta da análise conjugada de todos os elementos probatórios. 8. Resulta da análise do Auto de Busca e Apreensão e reportagem fotográfica, a fls. 5 a 12 do PD e do Auto de Exame Directo a fls. 13 a 15 do PD. 9. Resulta da análise do Auto de Busca e Apreensão e reportagem fotográfica, a fls. 5 a 12 do PD e do Auto de Exame Directo a fls. 13 a 15 do PD. 10. Resulta da análise conjugada de todos os elementos probatórios. 11. Resulta da análise conjugada de todos os elementos probatórios”. 68. Avaliando por partes: Relativamente ao ponto 7 da matéria de facto provada, o recorrente alega que “10. Desde logo, no que concerne ao item 7. dos factos provados, não pode o recorrente conformar-se com tal factualidade, pois que, de acordo com a prova documental junta aos autos, nomeadamente da análise dos docs. nºs 1, 2 e 3 juntos à Impugnação, para onde se remete por uma questão de economia processual, foi produzida prova de que o recorrente, no ano de 2021, foi vítima de atropelamento, na sequência do que teve necessidade de recorrer a diversa medicação regular. 11. Na realidade, ao recorrente foi prescrito, designadamente, a administração de F......., tendo o recorrente junto à impugnação a fotografia da receita médica sob o doc. nº 6, facto que, à data, foi dado ao conhecimento, de imediato, do director desportivo, razão pela qual foi encontrado no quarto utilizado pelo aqui recorrente uma embalagem de F......., contendo no seu interior uma ampola aberta/partida, sem conteúdo, conforme é mencionado no Relatório da PJ, junto sob o doc. nº 4 à impugnação, para onde se remete por uma questão de economia processual. 12. Como tal, não pode o aqui recorrente conformar-se com o teor do item 7., pois, da prova documental que se encontra junta aos autos, resultou provado que o demandante, ora recorrente, dispunha de autorização para utilizar ou ter na sua posse a referida medicação, mediante prescrição médica, após a ocorrência do atropelamento de que foi vítima, bem como, obviamente, os respectivos material médico e métodos necessários para o efeito”. Ora, como visto atrás, essa autorização não se cinge a uma mera prescrição médica, mas tem de seguir os trâmites do artigo 13º da Lei nº 81/2021. 69. Sobre o ponto 8 da matéria de facto, recorde-se que o recorrente alega que “apresenta-se, desde logo, em clara contradição com o facto provado no item 12., tendo sido tal factualidade também comprovada pelas testemunhas arroladas e inquiridas em sede de processo disciplinar pelo, então, arguido, aqui recorrente, não obstante, inexplicavelmente, não ter sido atribuída qualquer relevância aos depoimentos prestados pelas mesmas. 16. Assim, não constitui de forma alguma verdade que somente o recorrente tenha acesso ao seu quarto e que muito menos tenha o mesmo qualquer tipo de autoridade para impedir que quem quer que seja lá entre, uma vez que a casa onde reside é dos seus pais, sendo que os avós do recorrente pernoitam com frequência em casa do mesmo, mais especificamente no seu quarto dado o frágil estado de saúde da sua avó, carecendo a mesma de acompanhamento mais próximo pela sua família”. E a este propósito contesta a entidade recorrida nos seguintes termos “X. Inexiste qualquer contradição entre o Ponto 8 e o Ponto 12 da matéria de facto dada como provada, uma vez que o facto de viverem outras pessoas na mesma casa, assim como a circunstância de os avós do apelante ali pernoitarem pontualmente, está muito longe de evidenciar que o mesmo não tinha o controlo exclusivo sobre o local onde se encontravam os métodos proibidos”. 70. Para o item 11, o recorrente alega que “Somente estaremos perante uma acção praticada com dolo, quando haja conhecimento e vontade efectiva de realização do facto, dada a exigência cumulativa de um elemento intelectual em que existe uma correcta representação da factualidade, i.e., que o agente conheça os elementos que fazem parte do tipo objectivo e de um elemento volitivo, que implica que o agente conheça e queira realizar a acção, movido por uma vontade, o que, no presente caso, não se verifica. 28. É sempre de privilegiar, in casu, se dúvidas existissem no espírito do decisor, a aplicabilidade dos princípios «in dúbio pro reo» e de presunção de inocência, o que, apesar de não ser necessário, se requereu, em sede de defesa escrita, no âmbito do processo disciplinar, apresentada pelo recorrente, verificando-se que, quando à presunção da inocência é a sua dupla dimensão desrespeitada, enquanto: regra de tratamento (impedindo o abuso do poder estatal) e de juízo (impõe à acusação o encargo de provar a culpabilidade do arguido, proibindo a imposição desse ónus ao arguido que se presume inocente, não lhe cabendo prova dessa inocência), violando-se assim, ao nível interno, os princípios previstos no Código de Processo Penal e no artigo 32º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, e também, a nível internacional, os princípios previstos nos artigos 6º, nº 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e 14º, nº 2 Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos”. 71. O artigo 77º, nº 2 da Lei nº 81/2021, que aqui recordamos, tem a seguinte redacção: “No caso de violação das normas antidopagem previstas nas alíneas a) a c), g) e h) do nº 2 do artigo 5º, relativas a substâncias não específicas proibidas, presume-se que aquela foi praticada com dolo, salvo se o praticante desportivo demonstrar o contrário, sem prejuízo da possibilidade de eliminação ou redução do período de suspensão nos termos do disposto no artigo 83º”, estabelecendo uma presunção de veracidade, cabendo ao arguido o ónus da prova para efeitos de redução do período de suspensão. Ora, esta só é posta em causa enquanto a veracidade do seu conteúdo não for fundadamente posto em causa, o que não terá acontecido com a prova testemunhal, suficiente para ilidir a prova documental. 72. A jurisprudência do STA sustenta esta posição: “E não se vê que o estabelecimento desta presunção seja inconstitucional, quando o Tribunal Constitucional, no acórdão nº 391/2015, de 12/8 (publicado no DR, II Série, de 16-11-2015), considerou que, mesmo em matéria penal, são admissíveis presunções legais, desde que seja conferida ao arguido a possibilidade de abalar os fundamentos em que a presunção se sustente e desde que para tal baste a contraprova dos factos presumidos, não se exigindo a prova do contrário. Aliás, tal como o Tribunal Constitucional entendeu para a situação idêntica da do juízo dos autos de notícia (cfr., entre muitos, o acórdão de 6-5-87, in BMJ 367, 2-224; o acórdão de 9-3-88, in DR, II Série, de 16-8-88; o acórdão de 30-11-88, in DR, II Série, de 23-2-89; o acórdão de 25-1-89, in DR, II Série, de 6-5-89; o acórdão de 9-2-89, in DR, II Série, de 16-5-89; e o acórdão de 23-2-89, in DR, II Série, de 8-6-89), cremos que a presunção de veracidade em causa – que incide sobre um puro facto e que pode ser ilidida mediante a criação, pelo arguido, de uma mera situação de incerteza – não acarreta qualquer presunção de culpabilidade susceptível de violar o principio da presunção de inocência ou de colidir com as garantias de defesa do arguido constitucionalmente protegidas (cfr. artigo 32º, nºs 2 e 10 da CRP)”; (acórdão do STA nº 297/18 e nº 08/18.0BCLSB, de 20-12-2018”; e mais se acrescenta: A prova por meio de presunção judicial não implica a imposição de uma verdade processual, independentemente e, se necessário, em detrimento da verdade material, mas antes constitui um meio de chegar à verdade material, diferente da prova directa, não constituindo uma derrogação ou sequer um afrouxamento da regra «in dubio pro reo». Como igualmente sumariado no acórdão do STA nº 0607/10, de 21-10-2010, “A condenação do arguido em processo disciplinar não exige uma certeza absoluta, férrea ou apodíctica da sua responsabilidade, bastando que os elementos probatórios coligidos a demonstrem segundo as normais circunstâncias práticas da vida e para além de uma dúvida razoável. Nos juízos de facto a emitir num processo disciplinar, é lícito à Administração, e até obrigatório, usar das presunções naturais que se mostrem adequadas” (todos citados no Acórdão deste TCA Sul, de 28 de Agosto de 2024, proferido no âmbito do Processo nº 101/24.0BCLSB). 73. Por conseguinte, improcedem também aqui estas alegações do recorrente, o que conduz ao improvimento “in totum” do presente recurso jurisdicional. IV. DECISÃO 74. Nestes termos, e pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo – Subsecção Social deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao presente recurso jurisdicional. 75. Custas a cargo do recorrente. Lisboa, 16 de Outubro de 2024 (Rui Fernando Belfo Pereira – relator) (Frederico Macedo Branco – 1º adjunto) (Maria Teresa Caiado – 2ª adjunta) |