Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 446/11.9BELLE |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 07/14/2022 |
| Relator: | FREDERICO MACEDO BRANCO |
| Descritores: | CONTRATO DE EMPREITADA TRABALHOS A MAIS |
| Sumário: | Nestes autos são reclamados pelo A. montantes devidos a título de trabalhos a mais, decorrentes da execução de uma empreitada, causa de pedir que é impugnada pelo R., Município, na sua contestação. Em qualquer caso, na PI o A. e Recorrente é muito falho na alegação de factos. Não diz o A. quando realizou os trabalhos cujo pagamento reclama, não diz que tais trabalhos não estavam previstos ou incluídos no contrato, nomeadamente no respetivo projeto, se destinavam à realização da mesma empreitada e se tornaram necessários na sequência de uma circunstância imprevista, que não podiam ser técnica ou economicamente separados do contrato, sem inconveniente grave para o dono da obra ou que ainda que separáveis da execução do contrato, sejam estritamente necessários ao seu acabamento. Também não diz o A. que tais trabalhos lhe foram ordenados por escrito pelo dono da obra e o fiscal da obra lhe forneceu os planos, desenhos, perfis, mapa da natureza e volume dos trabalhos e demais elementos técnicos indispensáveis para a sua perfeita execução e para a realização das medições. Não invoca o A. que o projeto de alteração foi entregue ao empreiteiro com a ordem escrita de execução. Também não diz o A. que a execução dos trabalhos a mais foi formalizada como contrato adicional ao contrato de empreitada. Assim, não tendo sido alegados factos suscetíveis de suportar a inclusão dos trabalhos que diz que realizou nos pressupostos dos trabalhos a mais, exigidos no artigo 26° do Decreto-Lei n.° 59/99, de 02.03, sempre o correspondente pagamento teria de ser julgado indevido. Deste modo, sendo incontornável que a Recorrente não logrou fazer prova que se mostrem por pagar quaisquer trabalhos a mais, tal sempre determinaria a improcedência da Ação, a qual assenta predominantemente nessa circunstância. |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório Massa insolvente de S....., S.A., no âmbito da Ação Administrativa Comum intentada contra o Município de Vila Real de Santo António, na qual peticionou a condenação do réu a pagar “a quantia de 105.320,72€ acrescida de juros de mora vincendos contados à taxa legal até efetivo e integral pagamento” referentes a trabalhos a mais no âmbito de contrato de empreitada adjudicado no concurso para execução de “Empreitada de Requalificação Urbana da Ex-Estrada Nacional 125, entre Aldeia Nova e Vila Real de Santo António”, inconformada com Sentença proferida em 17 de julho de 2012, através da qual foi julgada improcedente a ação, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé. Formula a aqui Recorrente/Massa Insolvente nas suas alegações de recurso, apresentadas em 19 de outubro de 2012, as seguintes conclusões: “A) A sentença recorrida enferma de vício por omissão de fundamentação e motivação; B) O Tribunal “a quo” decidiu sem apreciar ou analisar concretamente, ainda que de forma superficial, a questão concreta da caducidade do contrato de empreitada que vinculava Autora e Réu, o que se revelava de toda a pertinência para a boa decisão da causa e, mais concretamente, para decisão contrária no que respeita à suposta caducidade do contrato de empreitada dos autos; C) Não dando, por conseguinte, cumprimento a princípios basilares de direito administrativo que impõem o esclarecimento das razões da decisão do tribunal no intuito de se aferir da sua determinabilidade, fundamentação e respetiva motivação. D) E que, dessa forma, culminam com a nulidade da decisão que aqui se invoca. E) A sentença recorrida enferma, ainda, de erro na apreciação da matéria de facto e na aplicação do direito; F) A Recorrente foi declarada insolvente, a pedido seu, na data de 10 de outubro de 2006, por sentença judicial transitada em julgado na data de 20/11/2006; G) A Recorrente nunca cessou a sua atividade, tendo mantido a sua normal laboração, a qual envolveu a continuação da execução da obra do Réu, com o consentimento deste; H) Posteriormente, veio ser homologado, pelos credores, plano de insolvência tendo em vista a recuperação da empresa e a manutenção do seu normal funcionamento; I) Nessa senda, a Recorrente, na pessoa do seu Administrador de insolvência, comunicou ao Réu o cenário factual sobredito, mais tendo requerido autorização para continuação da execução da obra por ele adjudicada, J) Situação essa autorizada; K) Nesse seguimento, a Recorrente executou e concluiu a empreitada em questão - incluindo os trabalhos a mais cujo valor foi peticionado nos presentes autos - a qual foi recebida pelo Réu em toda a sua extensão; L) Ora, o circunstancialismo factual envolvente à situação de insolvência da Recorrente enquadra-se com a previsão da alínea b) do n.° 2 do artigo 147.° do RJEOP; M) Ou seja, a conduta assumida pela Recorrente preencheu todos os pressupostos definidos por aquele normativo; N) Pelo que, detinha o Município Réu o poder discricionário de fazer caducar o contrato ou não; O) O que não fez! Pelo contrário, o Recorrido quis e permitiu a continuação da execução da obra por parte da Recorrente; P) Situação essa que facilmente se afere uma vez que a Recorrente cumpriu integralmente o contrato de empreitada, pelo que, até tacitamente se poderá verificar essa autorização do dono da obra; Q) Posto isto, a conclusão é só uma: o contrato de empreitada que unia Autora e Réu jamais caducou; R) Nem, tão-pouco, se entenderia, atentas todas as circunstâncias factuais supra vertidas, como poderia agora o Recorrido beneficiar de tal caducidade quando o contrato em causa foi integralmente cumprido pela Recorrente e com a sua autorização. S) Por conseguinte, a douta sentença recorrida não só omite factos carreados para os autos pela Recorrente, determinantes para a boa decisão da causa, bem como, faz incorreta interpretação dos remanescentes e, consequentemente, errada aplicação do direito, uma vez que, o contrato em causa nos autos não caducou. Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, requer-se, respeitosamente, que seja dado provimento ao presente recurso e, em consequência, seja revogada a decisão recorrida, substituindo-a por outra que, contemplando as conclusões atrás aduzidas, determine a não caducidade do contrato do contrato de empreitada em causa nos autos, por erro na apreciação dos factos e aplicação do direito ou, em alternativa, julgue procedente as nulidades de sentença supra invocadas Decidindo deste modo, farão V. Exas., aliás, como sempre, um ato de inteira e sã Justiça” O aqui Recorrido/Município veio apresentar contra-alegações de Recurso em 8 de janeiro de 2013, concluindo. “1. A sentença recorrida não enferma de qualquer vício por omissão de fundamentação e motivação; Porquanto 2. Nos termos do artigo 147º nº 1 “se assinado o contrato o empreiteiro ... por sentença judicial, for declarado em estado de falência (insolvência) o contrato caduca”; 3. Foi dada como a matéria de facto provada que a recorrente foi declarada insolvente por sentença judicial transitada em julgado em 20 de novembro de 2006; 4. Os trabalhos de empreitada já tinham terminado e o último pagamento da fatura apresentada ao dono da obra foi efetuado em 28 de setembro de 2006 à empresa C..... SA; 5. No decurso da obra e até essa data não houve qualquer informação da Autora à Ré sobre a existência do plano de recuperação ou manutenção do seu normal funcionamento, nem sequer requereu qualquer autorização para continuação da execução da obra; 6. Os trabalhos já tinham terminado; 7. Dos factos trazidos à presente ação pela Autora não se verifica qualquer enquadramento na alínea b) do nº 2 do artigo 147º do RJEOP; 8. Da conduta assumida pela recorrente e dos factos trazidos à ação não se verifica qualquer enquadramento no normativo supra citado; 9. Ao contrário do que o A. conclui o Município não detinha o poder discricionário de fazer caducar o contrato; 10.Não existiu qualquer manifestação de vontade por parte do Réu Município de permitir a continuação do contrato por parte da recorrente; 11.Pelo que tal como se conclui na douta sentença verifica-se que o contrato caducou; 12.Não se verificando na sentença ora recorrida qualquer omissão de pronúncia ou sequer incorreta interpretação dos factos alegados, ou incorreta aplicação do direito a tais factos. Nestes termos e nos melhores de direito requer-se a Vossas Excelências que se negue provimento ao recurso e em consequência seja mantida a sentença recorrida, assim se fazendo a vossa costumada Justiça” O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 12 de novembro de 2012. O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 18 de janeiro de 2013, nada veio dizer requerer ou promover. Por Acórdão deste TCAS de 25 de setembro de 2014, foi julgada verificada a exceção dilatória inominada, por preterição da tentativa de conciliação nos termos do art.º 260.º, n.º1 do Decreto-Lei 59/99, de 2 de março, o que culminou na absolvição do Réu Município do pedido. Deste acórdão, foi interposto recurso de Revista para o STA, tendo o mesmo sido admitido em 12 de março de 2015, obtendo provimento em 20 de outubro do mesmo ano, tendo sido decidido que “tendo a ação aqui em causa deixado de estar sujeita à tentativa de conciliação a que alude o art. 260.° do Dec. Lei 59/99, impõe-se determinar a baixa dos autos ao Tribunal Central Sul para prosseguimento do conhecimento das restantes questões objeto do recurso.” Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento. II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, a nulidade da sentença recorrida por “vicio de omissão de fundamentação e motivação” ao julgar provada a “caducidade do contrato de empreitada” celebrado, mais se invocando a existência de erro na apreciação da matéria de facto. III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade com provada. 1. Em 22 de Fevereiro de 2005, foi aberto concurso para execução de “Empreitada de Requalificação Urbana da Ex Estrada Nacional 125, entre Aldeia Nova e Vila Real de Santo António” - Documento n° 1 junto com a Contestação 2. Em 21 de Abril de 2005, foram abertas as propostas dos concorrentes tendo as mesmas sido apreciadas pelo juri do concurso conforme consta da ata da sua reunião - Doc. nº 2 junto com a Contestação. 3. Após a apreciação das propostas, a Câmara Municipal, na sua reunião de 14 de Junho de 2005, deliberou aprovar a adjudicação da obra à empresa “C.....Ldª” pelo valor de 347.896,00 € com fundamento no teor do Relatório da Comissão de Análise das Propostas - Doc. 3 e 4 juntos com a Contestação. 4. O contrato de empreitada, entre o Município de VRSA e a adjudicatária “C.....– Empreiteiros de Construção Civil e Obras Públicas, Sociedade Anónima” foi assinado em 20 de Outubro de 2005 - Docs. nº 3 junto com a p.i. 5. O Auto de Consignação foi assinado em 21 de outubro de 2005 – Doc. 4 junto com a pi. 6. A “S....., S.A”, Autora nestes autos, corresponde à anterior matrícula nº …..511 na Conservatória do Registo Comercial de Oliveira de Azeméis, não constando dos autos, nem mesmo do Contrato de Empreitada, se esta matrícula era o da adjudicatária. 7. A “S....., S.A” foi declarada insolvente por sentença judicial proferida pelo Tribunal Judicial de S. João da Madeira, 3º Juízo, e transitada em 20/11/2006 – fls. 4 do doc. nº 2 junto com a p.i. Nos termos dos artigos 662°, n.° 1 e 665°, n.°s 1 e 2, do (novo) CPC, foram no precedente Acórdão do TCAS acrescentados os seguintes factos provados, o que aqui se mantém: 8 — Em 25.09.2006 a firma C....., SA alterou a denominação para S....., SA, conforme doc. de fls. 10 a 15, que aqui se dá por reproduzido. 9 — Em 19.12.2005 a empresa E....., Empresa de Engenharia e Arquitetura, elaborou o auto de medições n.° 1, de fls. 154 a 156, na Empreitada para a Requalificação Urbana da ex- EN 125, entre a Aldeia Nova e Vila Real de Santo António, que aqui se dá por reproduzido. 10 - Em 28.12.2005 a empresa E....., Empresa de Engenharia e Arquitetura, elaborou o auto de medições n.° 2, de fls. 162 a 163, na Empreitada para a Requalificação Urbana da ex- EN 125, entre a Aldeia Nova e Vila Real de Santo António, que aqui se dá por reproduzido. 11 -Em 30.03.2006 a empresa E....., Empresa de Engenharia e Arquitetura, elaborou o auto de medições n.° 3, de fls. 190 a 191, na Empreitada para a Requalificação Urbana da ex- EN 125, entre a Aldeia Nova e Vila Real de Santo António, que aqui se dá por reproduzido. 12- A fls. 1 indica-se que apresente P1 foi enviada por correio para o TAL de Loulé, ostentando esta um carimbo de entrada naquele tribunal em 20.07.2011. IV – Do Direito Infra se transcreve o essencial do discurso fundamentador da decisão de 1ª Instância: “A causa de pedir nos presentes autos, nos termos alegados pela Autora é o Contrato de Empreitada referido em 4 - O contrato de empreitada estabelecido entre o Município de VRSA e a adjudicatária “C.....– Empreiteiros de Construção Civil e Obras Públicas, Sociedade Anónima”, assinado em 20 de outubro de 2005. Alegadamente, a empresa insolvente representada pela Autora – Massa Insolvente – terá sucedido à adjudicatária “C.....– Empreiteiros de Construção Civil e Obras Públicas, Sociedade Anónima”, e daí o pedido e a causa de pedir nos presentes autos se consubstanciar no Contrato de Empreitada referido no nº 4 do probatório. Atendendo, assim, à data da assinatura do Contrato, a Empreitada dos autos seguiu o regime jurídico do DL nº 59/99, de 2 de março (RJEOP). Ora, Dispõe o art.º 147º nº 1 do RJEOP (DL nº 59/99, de 2 de março): Se, assinado o contrato, o empreiteiro falecer ou, por sentença judicial, for interdito, inabilitado ou declarado em estado de falência, o contrato caduca. Assim, dúvida não sofre que o contrato dos autos caducou em 20/11/2006 (cf. nº 7 do probatório). Caducado o Contrato, era forçoso passar-se à medição dos trabalhos efetuados e à sua liquidação, nos termos do nº 3 do mesmo artº 147º RJEOP: Verificada a caducidade do contrato, proceder-se-á à medição dos trabalhos efetuados e à sua liquidação pelos preços unitários respetivos se existirem, ou, no caso contrário, pelos que forem fixados por acordo, por arbitragem ou judicialmente, observando-se, na parte aplicável, as disposições relativas à receção e liquidação da obra, precedendo inquérito administrativo. Tal disposição conjuga-se com o disposto no art.º 241º do mesmo RJEOP, o qual dispõe: 1- Em todos os casos de rescisão, resolução convencional ou caducidade do contrato se procederá à liquidação final, reportada à data em que se verifiquem. No caso dos autos, ainda que não se tivesse procedido a tal inquérito, por ser a sua utilidade duvidosa no caso de insolvência do empreiteiro, como é o caso dos autos, teria de se ter procedido à medição dos trabalhos e à liquidação. Se a Autora não promoveu tais diligências, sibi imputet. O que não pode agora é prevalecer-se, em juízo, do regime legal das empreitadas de obras públicas para que o Município lhe pague o que, alegadamente, lhe deve. Se a empreiteira insolvente estabeleceu com algum funcionário do Município algum compromisso de pagamento de trabalhos alegadamente efetuados, é matéria que não se insere na causa de pedir e no pedido dos autos, pelo menos da forma como a Autora configurou a presente ação. Provavelmente, até se poderia tratar de matéria do foro criminal que não cabe, de todo, no âmbito deste Tribunal e desta Jurisdição. Assim sendo, Não resta senão julgar improcedente a presente ação, o que se declara.” Correspondentemente, decidiu-se em 1ª Instância: “Julgo a presente ação improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo o Município de Vila Real de Santo António do pedido.” Como se disse já, por acórdão deste TCAS de 25 de setembro de 2014, foi julgada verificada a exceção dilatória inominada, por preterição da tentativa de conciliação nos termos do art.º 260.º, n.º1 do Decreto-Lei 59/99, de 2 de março, o que culminou na absolvição do Réu Município do pedido. Correspondentemente, decidiu-se então no TCAS, o seguinte: “(…) conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida; Em substituição, julgar verificada a exceção dilatória de falta de tentativa de conciliação e absolver o R. do pedido”. Tendo a referida decisão do TCAS sido recorrida, veio o STA a revogar a mesma, com base no seguinte discurso fundamentador: “A questão que importa conhecer é a da aplicação ou não à situação dos autos do Decreto-Lei n.° 18/2008, de 29 de Janeiro, que aprovou o "Código dos Contratos Públicos", e que expressamente revogou, pelo n.º 1 do artigo 18.° a norma constante do artigo 260.° do Decreto-Lei n.° 59/99, de 2 de Março. E, se esta não obtiver provimento, aferir se a consequência da falta de tentativa de conciliação é a absolvição da instância ou do pedido. Está em causa nos presentes autos a reclamação pela A. e aqui recorrente de montantes devidos a título de trabalhos a mais, decorrentes da execução de um contrato de empreitada celebrada com o Município de Vila Real de Santo António, em outubro de 2005. Face à causa de pedir tal como vem configurada pelo A. e Recorrente na p.i., estamos perante uma ação sobre a execução do contrato, na qual se requer o pagamento por trabalhos a mais. Entendeu-se na decisão recorrida que era aplicável à situação dos autos o DL 59/99 de 2/3 e enquadrou-se juridicamente os factos na previsão dos artigos 255° e 260° e seguintes deste diploma. E que, constituindo a tentativa de conciliação um pressuposto processual, ou seja, uma exceção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do pedido e não tendo sido alegado nos autos que a mesma tenha ocorrido e se tenha frustrado, porque incumbia ao autor o respetivo ónus de alegação e prova, absolveu-se o R. do pedido. Então vejamos. Desde logo, cumpre referir que tendo a decisão recorrida absolvido do pedido o réu quando estamos perante uma exceção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do pedido e cuja consequência é obrigatoriamente absolvição da instância tal constitui um erro que sempre seria de corrigir. Neste sentido ver os artigos 493.° n.° 2, 495.° e 288.° n.° 1 al. e) todos do antigo Código de Processo Civil e atuais artigos 576.° n.° 2, 578.° e 278.°, n.° 1 al. e) do atual CPC. Mas atenhamo-nos à questão fundamental objeto do recurso. Suscitou-se oficiosamente na decisão recorrida, ainda que sem audição das partes, a falta da tentativa de conciliação, prevista no art.° 260° do DL 59/99 que, por se tratar de um pressuposto processual de que depende a introdução em juízo das ações que versem questões sobre interpretação, validade e execução dos contratos, se trata de uma exceção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do pedido, nos termos dos arts. 493.º, n.° 2, 495.° e al. e) do n.° 1 do art.° 288.°, todos do Cód. Proc. Civil. Efetivamente, nos termos do art.° 260.°, n.° 1 do Dec. Lei 59/99 “as ações que versem sobre questões submetidas ao julgamento dos tribunais administrativos sobre interpretação, validade ou execução do contrato deverão ser precedidas de tentativa de conciliação extrajudicial perante uma comissão composta por um representante de cada uma das partes e presidida pelo presidente do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes ou pelo membro qualificado do mesmo Conselho que aquele para o efeito designar". No caso dos autos está em causa o pagamento de quantia pecuniária, resultante da execução de "trabalhos a mais" no âmbito do contrato de empreitada pelo que a questão tem necessariamente a ver com a boa execução do mesmo. Pelo que, à partida, seria aqui aplicável o referido preceito. Contudo, com a entrada em vigor do Dec. Lei 18/2008, de 29 de janeiro ocorrida em setembro de 2008, foi revogado o DL 59/99 de 2/3 (art. 14° n°1 al. d) do mesmo) sendo que os arts. 260.° a 264.° do referido Dec. Lei 59/99 foram revogados com produção de efeitos ao dia seguinte ao da publicação do diploma, ou seja, 30 de Janeiro, deixando de ser aplicados aos contratos já celebrados sem prejuízo dos processos de conciliação pendentes àquela data. Como resulta do art. 18° deste diploma: "1 - O presente decreto-lei entra em vigor seis meses após a data da sua publicação. 2 - A revogação dos artigos 260.°, 261.°, 262.°, 263.° e 264.° do Decreto-Lei n.° 59/99, de 2 de Março, produz efeitos no dia seguinte ao da publicação do presente decreto-lei, não sendo os mesmos aplicáveis aos contratos já celebrados, sem prejuízo dos processos de conciliação pendentes àquela data. " Assim, a partir de 30 de janeiro de 2008 deixou de ser aplicável aos contratos já celebrados o referido procedimento da tentativa de conciliação. No caso sub judice como não estava pendente a fase dessa conciliação extra judicial deixou de ser aqui aplicável a referida tentativa prévia de conciliação prevista no art.° 260.° do RJEOP . A tal não obsta o facto de estas normas estarem em vigor na data de entrada da p.i. em tribunal e se terem mantido em vigor até 30 de janeiro de 2008 sendo que na data da prolação da decisão recorrida já havia ocorrido a publicação do referido DL 18/2008 de 29/1. Em suma, tendo a ação aqui em causa deixado de estar sujeita à tentativa de conciliação a que alude o art. 260.° do Dec. Lei 59/99, impõe-se determinar a baixa dos autos ao Tribunal Central Sul para prosseguimento do conhecimento das restantes questões objeto do recurso.” Aqui chegados, importa retomar a análise da controvertida situação, atenta a referida circunstância do STA haver concluído ter “(…) a ação aqui em causa deixado de estar sujeita à tentativa de conciliação a que alude o art. 260.° do Dec. Lei 59/99”, o que havia suportado a anterior decisão deste TCAS. Vejamos: Alega o Recorrente que a decisão recorrida é nula por omissão de fundamentação e motivação. Mais invoca o Recorrente, um erro na fixação da matéria de facto. Em sede de alegações diz o Recorrente que existe esse erro porque na decisão recorrida deveria constar que «veio a ser aprovado à Recorrente, no âmbito do processo de insolvência, plano de insolvência tendo em vista a sua recuperação». «conforme flui dos autos (nomeadamente em sede de resposta da Recorrente a despacho datado de 18/04/2012 e cuja conclusão data de 26/03/2013». Em alegações diz o Recorrente, também, que «ainda que não resulte diretamente dos autos ...a Recorrente, na pessoa do seu Administrador de Insolvência, comunicou e requereu a continuação da obra do Recorrido», «situação essa que nunca foi recusada pelo Recorrido». Invoca igualmente o Recorrente um erro de direito, porque o contrato de empreitada não caducou com a declaração da sua insolvência, pois a situação em apreço enquadra-se no artigo 147°, alínea h) do Decreto-Lei n.° 59/99, de 02.03, tendo prosseguido com a execução dos trabalhos. Razão, porque no entender do Recorrente, não havia que se proceder à medição dos trabalhos e à sua liquidação. Quanto à invocada nulidade da decisão sindicada, é jurisprudência pacífica que só ocorre a nulidade da decisão por omissão de pronúncia quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, que são todas as que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (cf. artigos 660°, n° 2, 668°, n.° 1, alínea d), do antigo CPC, 607° e 615°. n.° 1, alíneas b) a d) do novo CPC). Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Mas só a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade da decisão. Também a nulidade da sentença por oposição entre os fundamentos e decisão, terá de ser grave, patente, implicando uma incongruência absoluta. Ora, no caso em apreço, o Tribunal ponderou as questões em litígio e decidiu-as. Para tanto, indicou o Tribunal as razões de facto e de direito que levavam à sua decisão. Na decisão recorrida explicou o Tribunal de forma compreensível o seu raciocínio. A decisão sindicada, igualmente, não padece de falta absoluta de fundamentação. Nela foi considerado existir uma sucessão da empreiteira original, a C.....- Empreiteiros de Construção Civil e Obras Públicas, SA, relativamente à Recorrente, na execução do contrato de empreitada e que este teria de se considerar caducado com a declaração de insolvência. Assim, apreciou a decisão os termos do litígio e por entender estar caducado aquele contrato, fez improceder a ação. Ou seja, independentemente da bondade do decidido, não há aqui absoluta falta de fundamentação, falecendo assim a invocada nulidade da decisão. Nos termos dos artigos 684°-A, n.° 2, e 685°-B, do antigo CPC (aplicáveis ex vi do art.° 1.° do CPTA e correspondentes aos artigos 636°, n.° 2 e 640° do novo CPC), podem as partes, nas respetivas alegações, impugnar a decisão proferida sobre determinados pontos da matéria de facto. O artigo 685.°-B, do CPC (e 640° do novo CPC) estabelece como ónus a cargo da parte que impugne a decisão relativa à matéria de facto, a necessidade de especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. Ora, apesar de impugnar a matéria de facto, o Recorrente é totalmente falho no cumprimento dos seus ónus, pois não indica de forma clara e explicita os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. A remissão para o que «flui dos autos (nomeadamente em sede de resposta da Recorrente a despacho datado de 18/04/2012 e cuja conclusão data de 26/03/2013», não pode ser entendida como respeitando a obrigação de se indicar os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida. Relativamente a tal despacho, será o prolatado a fls. 135 a 137, de 13.04.2012, no qual se notificou as partes para virem «informar o que tiverem por conveniente» quanto à «caducidade do contrato) da liquidação da empreitada». Vem então o A. e Recorrente apresentar o requerimento de fls. 142 a 145, ao qual não fez juntar qualquer documento. Ou seja, apreciando o requerimento da A. e Recorrente para o qual remete nas suas alegações de recurso, não foi junto a este nenhum documento que atestasse que «veio a ser aprovado à Recorrente, no âmbito do processo de insolvência, plano de insolvência tendo em vista a sua recuperação». Igualmente, a alegação de que existe um erro de facto ao não se dar por assente que «a Recorrente, na pessoa do seu Administrador de Insolvência, comunicou e requereu a continuação da obra do Recorrido», «situação essa que nunca foi recusada pelo Recorrido», é algo que não é invocado como cumprindo o ónus do artigo 685.°-B, do CPC (e 640° do novo CPC), mas antes é assumido pelo Recorrente como não "resultando" «diretamente dos autos». Ou seja, claramente não pode haver um erro na fixação da matéria de facto, quando esta não é assumidamente alegada pelas partes. Falece, por isso, o imputado erro na fixação da matéria de facto. Verifiquemos, por fim, o invocado erro de direito. Nesta ação o A. e Recorrente na PI pede para que o Município seja condenado a pagar o valor de €71.405, a título de trabalhos a mais, mais juros, de €33.915,72, decorrentes de diversos trabalhos preparatórios e de pavimentação executados na empreitada de obras públicas para a Requalificação Urbana da ex- EN 125, entre a Aldeia Nova e Vila Real de Santo António. Invoca o Recorrente que o contrato foi celebrado entre o Município e a Sociedade C....., SA, mas que esta em 25.09.2006 alterou a denominação para S....., SA. Juntou o A. à PI o documento de fls. 24, que foi elaborado pela empresa E....., Empresa de Engenharia e Arquitectura, Lda, relativamente à fiscalização da obra face à empreitada de Requalificação Urbana da ex- EN 125, entre a Aldeia Nova e Vila Real de Santo António, no qual se indica terem sido feitos trabalhos a mais por erros de medição. Tal documento foi impugnado pelo R. nos artigos 12° a 19° da contestação. Nesta contestação diz também o Município que não foram executados trabalhos a mais, não foram formalizados estes com um contrato adicional e não tem deles conhecimento. Ou seja, nestes autos são reclamados pelo A. montantes devidos a título de trabalhos a mais, decorrentes da execução de uma empreitada, causa de pedir que é impugnada pelo R., Município, na sua contestação. Na PI o A. e Recorrente é muito falho na alegação de factos. Não diz o A. quando realizou os trabalhos cujo pagamento reclama, não diz que tais trabalhos não estavam previstos ou incluídos no contrato, nomeadamente no respetivo projeto, se destinavam à realização da mesma empreitada e se tornaram necessários na sequência de uma circunstância imprevista, que não podiam ser técnica ou economicamente separados do contrato, sem inconveniente grave para o dono da obra ou que ainda que separáveis da execução do contrato, sejam estritamente necessários ao seu acabamento. Também não diz o A. que tais trabalhos lhe foram ordenados por escrito pelo dono da obra e o fiscal da obra lhe forneceu os planos, desenhos, perfis, mapa da natureza e volume dos trabalhos e demais elementos técnicos indispensáveis para a sua perfeita execução e para a realização das medições. Não invoca o A. que o projeto de alteração foi entregue ao empreiteiro com a ordem escrita de execução. Também não diz o A. que a execução dos trabalhos a mais foi formalizada como contrato adicional ao contrato de empreitada. Ou seja, o A. não alega minimamente na PI os factos que podiam suportar a inclusão dos trabalhos que diz que realizou nos pressupostos dos trabalhos a mais, exigidos no artigo 26° do Decreto-Lei n.° 59/99, de 02.03. É assim incontornável que a Recorrente não logrou fazer prova que se mostrem por pagar quaisquer trabalhos a mais, o que só por si, sempre determinaria a improcedência da Ação, a qual assenta predominantemente nessa circunstância. Porque a instância se constitui com a propositura da ação e em processo civil vigoram os princípios da igualdade e da estabilidade da instância, princípios aplicáveis ao processo administrativo, após a citação do R. a Instância deve manter-se na causa de pedir e no pedido. Só havendo uma contestação em que se invocassem exceções, é que por via de réplica poderia ocorrer uma alteração da causa de pedir por acordo. Ora, no caso em apreço, o R. na contestação apenas impugnou, pelo que a réplica nunca poderia ser considerada um articulado admissível. Depois, a R. Município também não deu o seu acordo a uma qualquer alteração da causa de pedir (cf. artigos 268° e 273° do antigo CPC, aqui aplicável). Tal significa, que a causa de pedir e o pedido a atender nesta ação só podem ser aqueles que foram formulados na PI. Nestes termos, após ter sido suscitada oficiosamente a questão da caducidade do direito de ação do A. e Recorrente (por despacho de fls. 119 a 121), na decisão recorrida, entendeu-se que em 20.11.2006 o contrato de empreitada celebrado caducou, por o A. e Recorrente ter sido declarado insolvente, conforme artigo 147°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 59/99, de 02.03. Mais se imputa a falta de razões ao A., por este não ter procedido à medição e liquidação final, exigida pelos artigos 147°, n.°3 e 241° do mesmo diploma. Com esta fundamentação, julgou-se a ação improcedente. Conforme decorre dos pontos 5.1, 5.2 e 10 do contrato de empreitada, esta seria realizada em regime de série de preços, a pagar mensalmente, com base em autos de medição e o prazo para a sua execução era de 3 meses a contar da data da consignação. Tendo sido o auto de consignação assinado em 21.10.2005, haveria a empreitada de estar executada até 21.01.2006. Desconhece-se nos autos em que data terão sido feitos os trabalhos a mais que ora se reclama. Mas atendendo a que o prazo para a execução da empreitada terminava em 21.01.2006, teremos de aceitar como certo que em 20.11.2006, a data em que a S..... SA foi declarada insolvente, já estaria totalmente executada aquela empreitada. Assim, não faz sentido invocar o artigo 147°, n.° 3, do Decreto-Lei n.° 59/99, de 02.03 e considerar a caducidade do contrato nessa data, quando, pelos factos provados, em 20.11.2006, tal contrato já tinha de estar executado. Aliás, conforme os factos provados acrescentados no primeiro acórdão proferido por este TCAS, que aqui se mantêm e ratificam, foram elaborados 3 autos de medição em 19.12.2005, em 28.12.2005 e em 30.03.2006, portanto, na sequência da execução da empreitada. Assim, é certo que a decisão de 1ª instancia não poderia ter julgado improcedente a Ação em decorrência da caducidade do contrato de empreitada, resultante de em 20.11.2006 a S..... SA ter sido declarada insolvente, pois que na referida data haveria a empreitada de estar já executada, uma vez que o prazo de execução era de 3 meses e nenhuma das partes alega que o mesmo foi prorrogado. Com efeito, naquela data já haviam sido elaborados os referidos 3 autos de medição e o Município alegou que pagou todos os valores indicados nos autos, incluindo os trabalhos a mais ali indicados, não tendo a Sociedade logrado demonstrar o contrário, pelo que sempre improcederia a Ação. Efetivamente, por falta de prova em contrário, uma vez que as obras da empreitada estariam concluídas e o valor devido ao empreiteiro estaria pago na totalidade e não se tendo descortinado a invocada nulidade da sentença decorrente de qualquer omissão da motivação ou fundamentação, ou qualquer outro vicio, ainda que com justificação não coincidente com aquela que se discorreu em 1ª instância, confirmar-se-á o sentido da decisão recorrida, julgando-se improcedente a ação. * * * Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, ainda que com base em fundamentação não coincidente, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se o sentido da decisão recorrida, julgando-se improcedente a Ação. Custas pela Recorrente, sem prejuízo de eventual isenção Lisboa, 14 de julho de 2022 Frederico de Frias Macedo Branco Alda Nunes Lina Costa |