Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 446/10.6BECTB |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 10/10/2024 |
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Relator: | MARIA DA LUZ CARDOSO |
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Descritores: | AVALIAÇÃO INDIRETA OMISSÃO DE DILIGÊNCIA NECESSÁRIA À DESCOBERTA DA REALIDADE DO RENDIMENTO ÓNUS DA PROVA NA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO |
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Sumário: | I - O preenchimento dos pressupostos do recurso à avaliação indireta da matéria coletável não dispensa a Administração Tributária do dever de esclarecer e precisar os factos que relevam para a quantificação da matéria coletável em causa. II - Para o efeito, é admissível o recurso a todos os meios de prova, bem como a todas as providências de prova, admitidos em Direito. III - Quando impugna a matéria de facto, o Recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição do recurso nesta parte (cfr. artigo 640º do CPC). |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Indicações Eventuais: | Subsecção Tibutária Comum |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | I. Relatório L............, Lda., deduziu impugnação judicial peticionando a anulação do ato liquidação adicional de IRC com o n.º 2010 8310001815, emitido na sequência do ato inceptivo a que foi sujeita, por referência ao exercício de 2008, após a Administração Tributária (AT) ter feito correções à matéria coletável com recurso a métodos indiretos, do qual resultou a pagar a quantia de € 21.353,68. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, por sentença proferida em 15.03.2021, julgou a impugnação procedente e, em consequência, anulou a liquidação sindicada. Desta sentença foi interposto o presente recurso, apenas quanto ao último segmento da decisão sob recurso, mais concretamente o segmento que surge identificado como “iv) preterição de diligências necessárias à descoberta da verdade material”, no âmbito do qual o Tribunal a quo concluiu “que nas circunstâncias do caso concreto, seria exigível à AT realizar as diligências necessárias com vista à descoberta da verdade material, pelo que, não o tendo feito, o ato de liquidação incorre em vício de forma por preterição de formalidade essencial, com fundamento na violação do princípio do inquisitório e da verdade material, determinante da sua anulação. (…)”, em cuja alegação, inserta a fls. 375 e ss. (sitaf), a Recorrente, Fazenda Pública, formulou as conclusões seguintes: “CONCLUSÕES - Através do presente recurso, a Fazenda Pública visa reagir contra a douta decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou procedente a presente impugnação deduzida contra o ato tributário consubstanciado na liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2008, no montante de 21.353,68 €, tendo, em consequência, decidido anular o mesmo. - A discordância da Fazenda Pública centraliza-se no último segmento da douta decisão sob recurso, mais concretamente o segmento que surge identificado como iv) preterição de diligências necessárias à descoberta da verdade material”, no âmbito do qual o Tribunal “ a quo” concluiu “ que nas circunstâncias do caso concreto, seria exigível à AT realizar as diligências necessárias com vista à descoberta da verdade material, pelo que, não o tendo feito, o ato de liquidação incorre em vício de forma por preterição de formalidade essencial, com fundamento na violação do princípio do inquisitório e da verdade material, determinante da sua anulação. (…)” (nosso destacado). - Pese embora o respeito, que é muito, pela douta decisão recorrida, a Fazenda Púbica não se pode conformar com a mesma, por entender que padece de vícios que impedem a sua manutenção no ordenamento jurídico, como sejam: erro de julgamento, resultante de incongruências patentes na decisão sob recurso, da incorreta apreciação da factualidade controvertida e valoração da prova produzida e também da errónea interpretação e aplicação da lei; violação de lei, consubstanciado na inversão das regras do ónus da prova do nº 3 do artigo art. 74º da LGT e violação do principio da igualdade de armas/igualdade das partes, a que se reporta o artigo 20º da CRP; - A factualidade que permitiu ao Tribunal “a quo” concluir pela legalidade da aplicação de métodos indiretos para apuramento da matéria tributável da impugnante, repercutiu-se diretamente na adoção do critério de quantificação, motivo pelo qual, a mesma não poderia ter sido ignorada pelo Tribunal “a quo”, sob pena de a douta decisão sob recurso revelar incoerências que comprometem a sua manutenção na ordem jurídica. - Alegou a impugnante que a AT não poderia ter recorrido aos métodos indiretos, uma vez que não demonstrou quais as razões da existência dos referidos prejuízos fiscais, tendo o Tribunal “a quo” entendido, e bem, que tal demonstração era da responsabilidade da impugnante a quem caberia alegar e demonstrar factualidade que permitisse concluir que os prejuízos fiscais declarados na contabilidade correspondiam à realidade. - Mais entendeu o Tribunal “a quo” que no caso concreto dos autos, a impugnante não alegou, nem demonstrou, qualquer factualidade concreta que, em termos de causalidade adequada, permitisse justificar a acumulação de prejuízos fiscais consecutivos em período superior a 3 anos, sendo de salientar que a existência de queijo deteriorado produzido entre os anos de 2000 a 2003 [cf. alíneas S), T) U) e X) do probatório] não é idónea a justificar os prejuízos declarados nos exercícios de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008. - Pugnando a impugnante pela existência de uma relação direta e causal entre a existência dos prejuízos fiscais que declarou ao longo dos exercícios de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 e as 40 toneladas de queijo deteriorado que refere ter acumulando desde, pelo menos o exercício de 2000 ( data em que a impugnante alega que o leite que lhe era fornecido pela empresa R........... começou a perder qualidade e conduziu à produção de queijo impróprio para consumo que não vendeu) que segundo a impugnante provocaram a inflação do inventário de existências, então, tendo o Tribunal “a quo” decidido - e bem- que era sobre a impugnante que recaia a apresentação de provas concretas que justificassem os referidos prejuízos, por coerência de raciocínio, o Tribunal “ a quo” teria de concluir que era sobre a impugnante que recaia o ónus probatório de demonstrar o eventual excesso de quantificação da matéria tributável. - Se a impugnante alega que existe uma relação de causalidade entre os prejuízos declarados e o queijo deteriorado que terá inflacionado o inventário de existências, não faz qualquer sentido afirmar que a recorrente deve fazer prova dos prejuízos, mas não lhe cabe fazer prova do excesso de quantificação da matéria tributável. - Ao ter desvalorizado os factos que levou ao probatório - e dos quais se socorreu para fundamentar a decisão da improcedência do alegado vicio de erro nos pressupostos para a aplicação dos métodos indiretos - o Tribunal “a quo” revela um raciocínio contraditório que inevitavelmente o impediu de decidir em sentido diferente daquele que decidiu, inquinando a douta decisão de erro de julgamento por errada apreciação dos factos controvertidos e das provas produzidas. - A realidade dos presentes autos, bem patente na factualidade assente no probatório, é reveladora de que a impugnante nunca trouxe aos autos quaisquer evidências probatórias que demonstrassem de forma clara e objetiva, de que forma é que aquelas 40 toneladas de queijo deteriorado, se repercutiram no inventário de 2008, bem como nunca demonstrou quais os reias custos que teve de suportar para conservar em armazém refrigerado para o efeito, as alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado em adiantado estado de putrefação - ( vide pedido de revisão, a que alude a alínea K) do probatório). - Veja-se que estamos perante elementos probatórios na disponibilidade total da impugnante, que apenas teriam de ser por ela reunidos e entregues perante a AT ou perante o Tribunal “ a quo” para que assim se pudesse concluir pela veracidade e credibilidade da tese apresentada pela impugnante, ou seja, para que assim se pudesse apurar quais as verdadeiras existências que a impugnante possuía no exercício de 2008 e o seu real valor, e subsequentemente verificar se o critério adotado pela AT era ou não adequado e se conduziu ou não a uma quantificação errada ou excessiva. - Todavia, nem em sede de procedimento inspetivo, nem no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, nem em sede de produção de prova testemunhal, a impugnante logrou demonstrar qual era a valorização das referidas 40 toneladas de queijo deteriorado. - E não se diga que tal prova se afigurava de difícil concretização para impugnante, como é defendido pelo Tribunal “ a quo” pois a impugnante, melhor do que ninguém conhece os meandros da sua atividade, detendo o conhecimento integral de todas as eventuais vicissitudes que possam ocorrer no desenrolar da mesma, possuindo, melhor do que ninguém, a capacidade de provar e quantificar o impacto das mesmas quer ao nível das suas existências, quer ao nível dos resultados de cada exercício. - A propósito da alegada influência das 40 toneladas de queijo deteriorado no valor do inventário de 2008 e sua repercussão na quantificação a que chegou a AT, assume particular relevância probatória– que foi totalmente ignorada pelo Tribunal “a quo” - o depoimento da testemunha L............que, entre o mais, referiu que “um dos pontos de análise foram as existências dos produtos acabados que existiam e nada na contabilidade permitia verificar se os produtos estavam deteriorados. Não estava refletido na contabilidade a eventual existência de queijo deteriorado” – vide gravação da prova testemunhal do minuto 1:28:53 ao minuto 1:30:18. - Mais referiu esta testemunha que “se houvesse queijo deteriorado, se houvesse uma quebra, teria de haver uma regularização aos inventários, ou seja, esse valor teria de ser retirado dos inventários: contabilisticamente tinha de ser tratado como uma perda que existiu em anos anteriores; nos exercícios de 2007/2008 já não seria possível” - – vide gravação da prova testemunhal do minuto 1:30:51 ao minuto 1:31:22. - Continuou esta testemunha a referir que “na descrição dos inventários o que aparecia era a identificação de queijo de vaca, queijo de ovelha …se dos inventários constasse algum queijo deteriorado, deveria dizer pelo menos queijo deteriorado de vaca, ou então separadamente, primeiro aparecia os inventários com o queijo bom e depois poderia aparecer com outro código, com outra referência o queijo que existiria deteriorado (…) as perdas de anos anteriores podem refletir-se nos anos seguintes mas não se refletem nos resultados, pois estes são fechados, dizem respeito a cada ano e a análise que estava a ser feita era de dois anos fechados, tendo a inspeção partido com os dados que estavam na contabilidade”. vide gravação da prova testemunhal do minuto 1:31:09 ao minuto 1:33:59 - A impugnante quer em sede de procedimento de revisão da matéria tributável – vide alíneas L), M), N), O) e P) do probatório - quer em sede de produção de prova testemunhal- vide alínea Y do probatório - procurou defender a tese segundo a qual manteve as 40 toneladas de queijo armazenadas para poder fazer prova no âmbito de um processo judicial que tinha pendente com a empresa R........... (da qual fazia também parte). - Todavia, esta tese é destituída de credibilidade, porquanto, as evidências probatórias constantes dos autos, designadamente, a sentença que foi junta pelo perito da impugnante no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, revela que a mesma foi proferida em 18.05.2007, motivo pelo qual a partir desta data deixou de se verificar a causa impeditiva da destruição do queijo deteriorado e do respetivo tratamento contabilístico, designadamente, ao nível dos inventários de 2007 e 2008 e da quantificação dos custos inerentes a esta situação – vide alíneas M), N), O) e P) relativas às reuniões da Comissão de peritos no âmbito do procedimento de revisão e onde são efetuadas referencias à sentença em apreço. - Apesar de já não necessitar de conservar o queijo deteriorado para efeitos probatórios no referido processo judicial, a verdade é que a impugnante manteve armazenado o queijo deteriorado, pelo menos até abril de 2010, sem, no entanto, refletir tal realidade na sua contabilidade e sem apresentar quaisquer explicações plausíveis para esse facto - vide alíneas S), T), e U) do probatório. - E quanto aos factos constantes das alíneas S), T), e U) do probatório, os mesmos evidenciam que durante o mês de março e abril de 2010, a impugnante terá enviado para o aterro de resíduos não perigosos de Castrelo Branco, 26.940 Kgs. de queijo impróprio para consumo, ficando sem se saber o que aconteceu aos restantes 13060 Kgs do alegado queijo deteriorado (40000 Kgs (que a impugnante referiu que tinha em armazém) – 26940 Kgs (que terá enviado para o aterro) = 13060 Kgs). - Significa isto, que aquando da realização do procedimento inspetivo, que se verificou em 23.07.2009, a alegada necessidade de armazenamento para efeitos probatórios naquele processo judicial já não subsistia. No entanto, a impugnante continuou a alegar que o armazenamento do queijo deteriorado visava a produção de prova no referido processo judicial…teoria que manifestamente falta à verdade dos factos. - Tal como resulta das alíneas L), M), N), O) e P), no âmbito do pedido de revisão da matéria tributável, a impugnante alegou, entre o mais, que as 40 toneladas de queijo deteriorado que foi acumulando, e que no seu entendimento, influenciaram o inventário de existências, foi devido à necessidade de proceder à realização de uma peritagem destinada a apresentar em Tribunal. - Todavia, cumpre referir que a impugnante nunca apresentou nos presentes autos quaisquer evidências probatórias que demonstrassem a existência da referida peritagem, nem a sentença que foi proferida em 18.05.2007 e foi junta pelo perito da impugnante ao procedimento de revisão faz qualquer referência a qualquer peritagem e aos resultados da mesma – vide alíneas L), M), N), O) e P) do probatório. - De forma plenamente consciente a impugnante tomou a decisão de não refletir na sua contabilidade os custos decorrentes da manutenção do queijo deteriorado nas suas instalações, pois não queria agravar prejuízos que poderiam colocá-la em dificuldades na obtenção de financiamentos, todavia, arroga-se o direito de exigir da AT, a realização de diligências que demonstrem a existência das 40 toneladas de queijo deteriorado que vinha acumulando desde 2000 e que a AT quantifique os custos associados a este facto, fazendo repercutir tais evidências nos seus inventários e a seguir efetuando a quantificação da matéria tributável. - Em bom rigor, a AT iria substituir a impugnante no cumprimento das suas obrigações tributárias, designadamente, fazendo constar da contabilidade todos os factos fiscalmente relevantes, in casu, as alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado e os custos associados às mesmas, mas note-se só para efeitos do procedimento de inspeção tributária, uma vez que, conforme foi referido pelo perito da impugnante na reunião de 12.02.2010, a impugnante, por opção não quis refletir na sua contabilidade as 40 toneladas de queijo deteriorado para não dificultar o seu financiamento – vide alínea L) do probatório. - Ora, esta atuação da impugnante, porque intencional e consciente tem necessariamente de acarretar consequências para a sua esfera jurídica, não podendo o julgador premiar tais condutas, sob pena de incentivar a sua continuidade por parte da impugnante e constitui ruma verdadeira injustiça para todos os contribuintes que são cumpridores das suas obrigações contabilísticas e fiscais. - Conforme resulta das alíneas N) e O) do probatório, na reunião de 18.02.2020, o perito da impugnante juntou ao procedimento de revisão da matéria tributável uma cópia da sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Pinhel e em 22.02.2010, voltaram os peritos a reunir-se, tendo ficado consignado em ata o seguinte: “(…) Questionado pela apresentação ou não da proposta que demonstre o excesso de quantificação, o perito do contribuinte informa que não o pretende fazer, uma vez que pretende discutir esta matéria em Tribunal. - Pese embora as diversas oportunidades que teve, quer durante o procedimento inspetivo, quer durante o procedimento de revisão da matéria tributável, para apresentar elementos probatórios que demonstrassem, de forma inequívoca a existência das 40 toneladas de queijo deteriorado, a valorização/quantificação das mesmas, o impacto dessa quantificação no inventário de 2008 e os custos associados à manutenção daquela quantidade de queijo deteriorado nos seus armazéns ( em arcas/camaras de refrigeração) a verdade é que a impugnante a única prova que logrou apresentar foi a cópia de uma sentença, proferida no âmbito de um processo judicial que tinha com a empresa R..........., datada de 18.05.2007, sendo certo que tal sentença nada provou quanto à existência das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado e nada provou quanto à valorização que tal quantidade de queijo teria, qual o impacto de tal valorização no valor do inventário de 2008 e quais os custos associados à manutenção de tal quantidade de queijo deteriorado nas suas instalações durante tantos anos ( pelo menos desde 2000, data em que a impugnante alega que começou a acumular queijo deteriorado até pelo menos 23.07.2009, data em que decorreu o procedimento inspetivo) - vide alíneas L), M), N), O), e P) do probatório. - A impugnante limitou-se a apresentar uma sentença cujo teor sobejamente conhecia - pois a mesma era datada de maio de 2007 e o procedimento inspetivo realizou-se em 23.07.2009 – estando por isso consciente que a mesma não teria qualquer impacto na apreciação da quantificação da matéria tributável efetuada pela AT, uma vez que era totalmente omissa quanto à alegada existência das 40 toneladas de queijo deteriorado e bem assim quanto à valorização desta quantidade de queijo, seu impacto no inventário de 2008 e respetivos custos de manutenção nas instalações da impugnante durante tantos anos. - Note-se que o perito da impugnante no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, mais concretamente na reunião que se realizou em 22.02.2010, quando questionado pela apresentação ou não da proposta que demonstrasse o excesso de quantificação, referiu que não o faria, uma vez que pretende discutir esta matéria em Tribunal – vide alínea O) do probatório. - Sucede que no âmbito da PI que apresentou, a impugnante também não logrou demonstrar o eventual excesso da quantificação da matéria tributável, porquanto, mais uma vez a impugnante não trouxe aos autos quaisquer evidências probatórias que demonstrassem de forma clara e objetiva, qual a valorização das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado, qual o impacto que essa valorização teria no inventário de 2008 e quais os custos que a impugnante teve de suportar para manter nas suas instalações aquela quantidade de queijo deteriorado. - Note-se que das alíneas S), T) e U) do probatório, resultou provado que a impugnante entre março e abril de 2010, remeteu para o aterro de resíduos não perigosos de Castelo Branco, 26.940 Kgs de queijo impróprio para consumo, sendo certo que os restantes 13060 Kgs. que faltam para perfazer as alegadas 40 toneladas, não se sabe qual foi o destino das mesmas ou se sequer existiriam, uma vez que nada resultou provado - vide alíneas S), T), U), X) e Y) do probatório. - No caso concreto dos presentes autos, o Tribunal “ a quo” sob a égide do principio do inquisitório e da verdade material inverteu o ónus da prova previsto no nº 3 do artigo 74º da LGT e concluiu que no caso concreto dos presentes autos era exigível que a AT realizasse as diligências necessárias com vista à descoberta da verdade material e que não o tendo feito, o ato de liquidação incorre em vício de forma por preterição de formalidade essencial, com fundamento na violação do principio do inquisitório e da verdade material, tendo determinada a sua anulação. - Salvo o devido respeito, a decisão sob recurso padece de vicio de violação de lei, por inversão das regras do ónus da prova do nº 3 do artigo art. 74º da LGT. - Com efeito, dispõe o nº 3 do artigo 74º da LGT que “Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indiretos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação” (nosso destacado). - Atento o disposto nesta norma, entende a Fazenda Pública que nas circunstâncias concretas dos presentes autos, face à globalidade da prova que foi produzida e que foi levada ao probatório, a impugnante não logrou apresentar provas que fossem adequadas e suficientes para abalar ou pôr em causa o racionalmente justificado critério de quantificação da matéria coletável aplicado pela AT. - Com efeito, “de acordo com as regras de distribuição do ónus da prova, para pôr em causa a quantificação da matéria tributável a que a AT chegou com recurso a métodos indiretos não basta ao sujeito passivo suscitar dúvidas quanto ao resultado obtido, antes se lhe impondo que demonstre a inadequação ou errada aplicação dos critérios de quantificação utilizados (cfr. art. 74°, n.° 3, da LGT)”, vide Acórdão do STA de 16-11- 2011, recurso 0247/11. - Ora, a prova que foi produzida nos presentes autos, que se encontra evidenciada nas diversas alíneas do probatório, não demonstram, em concreto a inadequação ou errada aplicação do critério utilizado pela AT, porquanto, nunca a impugnante demonstrou qual a valorização que seria atribuída às alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado, qual seria o impacto dessa valorização no inventário de 2008, quais os custos que suportou com o armazenamento dessa quantidade de queijo deteriorado nas suas instalações. - Sublinhe-se que no caso concreto dos presentes autos, bastou à impugnante alegar que a inspeção se recusou a verificar a existência de queijo deteriorado para que o Tribunal “a quo” entendesse que a AT, se escudou nas regras do ónus da prova, não realizou as diligências necessárias ao apuramento da verdade material, que violou o principio do inquisitório e da descoberta da verdade material. - O Tribunal “a quo” mercê de uma errónea interpretação e valorização da factualidade que fez constar do probatório, acabou por efetuar uma errónea interpretação e aplicação do nº 3 do artigo 74º da LGT, que culminou numa verdadeira inversão do ónus da prova, repercutindo-se de forma decisiva no sentido da decisão sob recurso. - Nos termos do art. 344.º, n.º 2, do CC e art. 417.º, n.º 2 do CPC, a inversão do ónus da prova apresenta-se como uma sanção à violação do princípio da cooperação das partes para a descoberta da verdade material, consagrado no n.º 1 do citado art. 417.º, quando essa falta de colaboração vai ao ponto de tornar impossível ou particularmente difícil a produção de prova ao sujeito processual onerado com o ónus da prova nos termos gerais e seja culposa, no sentido de que a parte recusante podia e devia agir de outro modo. - Sucede que no caso concreto dos autos, contrariamente ao entendimento que foi preconizado pelo Tribunal “a quo” a impugnante tinha na sua total disponibilidade os meios para poder fazer prova em Tribunal do eventual excesso de quantificação da matéria tributável. Vejamos: - Conforme consta das alíneas H), K), L), M), N), O) e P) a impugnante nunca refletiu na sua contabilidade, nem nos seus inventários a existência das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado que segundo a mesma, vinha acumulando desde 2000, altura em que a empresa R........... terá fornecido leite cuja qualidade se foi degradando até ao ano de 2003 (vide também alíneas W) e X) do probatório). - No pedido de revisão da matéria tributável que a impugnante apresentou perante a AT, referiu que as 40 toneladas de queijo impróprio para consumo que foi acumulando, foram armazenadas e conservadas em armazém especialmente refrigerado para o efeito, até que se efetuasse uma peritagem destinada a apresentar no âmbito de um processo judicial que tinha intentado contra a empresa R........... – vide alínea K) do probatório. - Note-se que quando a impugnante apresentou o pedido de revisão, já tinha sido proferida a sentença no processo judicial que tinha com a empresa R..........., a qual foi junta pelo perito da impugnante em 18.02.2020, sendo certo que a sentença foi proferida em 18.05.2007 – vide alínea L), M), N), O) e P) do probatório. - Posteriormente, o perito da impugnante no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, referiu que “a não revelação contabilística do queijo deteriorado foi uma opção da empresa, isto porque o registo na contabilidade iria agravar os prejuízos e colocaria a empresa em dificuldades adicionais na obtenção de financiamento” – vide alínea L) do probatório. - Quer no âmbito do procedimento inspetivo, quer no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, a impugnante limitou-se a apresentar justificações que para além de se revelarem inócuas para a prova do eventual excesso de quantificação da matéria tributável, demonstraram, à saciedade, que a impugnante faltou descaradamente à verdade dos factos, porquanto, a alegada necessidade de armazenamento do queijo deteriorado para efeitos probatórios fica completamente descredibilizada pela sentença proferida em 18.05.2007, a qual não evidência qualquer peritagem, nem tampouco ali é feita qualquer referência à existência das referidas 40 toneladas de queijo deteriorado, nem ao impacto da valorização deste facto nos inventários da impugnante, nem aos custos associados ao armazenamento das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado durante tantos anos ( pelo menos durante 2000 a 18.05.2007, data da referida sentença). - Mas para além da impugnante no âmbito do procedimento inspetivo e no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável não ter efetuado qualquer esforço probatório no sentido de demonstrar o eventual excesso de quantificação da matéria tributável, ficando-se pelas meras alegações e “empurrando” para a AT o ónus probatório que sobre ela recaia, também no âmbito da PI, a impugnante seguiu a mesma estratégia: limitou-se a discordar do critério e da quantificação da matéria tributável efetuada pela AT, sem nunca ter apresentado qualquer alternativa de quantificação que se revelasse, de forma clara e inequívoca mais adequada e próxima à sua verdadeira situação tributária. - O Tribunal “a quo” efetuou uma errada interpretação e valoração da prova produzida nos presentes autos, refletida nas várias alíneas do probatório, que conduziu a uma errónea aplicação da lei, com inevitáveis repercussões no sentido da decisão sob recurso. - A impugnante, melhor do que ninguém estava em condições de fornecer à AT ou ao Tribunal “a quo” os elementos que evidenciassem a valorização das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado e o impacto de tal valorização no seu inventário de existências, assim como os custos que teve de suportar para conservar em armazém especialmente refrigerado para o efeito ( conforme é referido pela impugnante no pedido de revisão e consta da alínea K) do probatório) as referidas 40 toneladas de queijo deteriorado. Todavia, a impugnante não apresentou quaisquer elementos concretos que demonstrassem de forma inequívoca o eventual excesso de quantificação. - Mas as diligências probatórias que estavam ao total alcance e disponibilidade da impugnante para provar o eventual excesso de quantificação não ficam por ali, porquanto, estando legalmente vinculada ao cumprimento do ónus probatório previsto no nº 3 do artigo 74º da LGT, poderia ter acionado os mecanismos que o quadro legal lhe faculta, como seja, a realização de uma perícia singular ou colegial, para assim, provar, não apenas o eventual excesso de quantificação da matéria tributável, mas também demonstrar a sua real situação tributária – vide artigos 116º do CPPT e artigos 467 e segs. do CPC. - sucede, que no caso concreto, a impugnante não apresentou evidências concretas que fossem suscetíveis de descredibilizar o critério adotado pela AT e provar o eventual excesso de quantificação, ficando-se pela lacónica e cómoda alegação de que a AT não realizou as necessárias diligências de prova para a descoberta da verdade material, que no seu entendimento passariam por uma vistoria aos armazéns onde tinha o queijo deteriorado. - Mas ainda que por hipótese se equacionasse a realização da referida vistoria, continuava a AT sem saber qual era a valorização das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado, qual era o impacto dessa valorização no inventário da impugnante e quais os custos associados à conservação/manutenção de tais quantidades de queijo durante tantos anos. Ou seja, a realização da vistoria não teria qualquer utilidade ou impacto nas conclusões constantes do RIT, mormente no que se reporta ao critério adotado para a quantificação da matéria tributável. - Pese embora a AT deva nortear a sua atuação pela observância do princípio do inquisitório e da descoberta da verdade material, a verdade é que não pode nem deve substituir-se à impugnante realizando a prova que legalmente lhe cabia produzir, tanto mais, quando os meios probatórios estão ao total alcance da impugnante. - Face à diversidade de meios probatórios que estavam ao total alcance da impugnante para provar o eventual excesso de quantificação, não poderia o Tribunal “a quo” sob a égide do princípio do inquisitório e da descoberta da verdade material, inverter o ónus da prova previsto no nº 3 do artigo 74º da LGT, pois ao seguir este raciocínio acabou por desvirtuar a ratio legis desta norma e decidir em sentido diverso daquele que resulta efetivamente da prova produzida e do quadro legal aplicável. - A inversão do ónus da prova, a que alude o nº 3 do artigo 74º da LGT, sem que no caso concreto estivessem reunidas as condições legais que a justifiquem (vide nº 2 do artigo 344.ºdo CC) inquina a decisão sob recurso de vicio de violação de lei, que impede a sua manutenção na ordem jurídica e impõe a sua necessária revogação. - A descoberta da verdade material é transversal a todos os intervenientes processuais, não sendo um dever exclusivo da AT. Quer isto dizer, que não é apenas sobre a AT que recai o dever de efetuar todas as diligências para chegar à verdade material, mas sim sobre todas as partes processuais, in casu, sobre a impugnante. - Impondo o nº 3 do artigo 74º da LGT que é sobre o sujeito passivo que recai o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação e não tendo a impugnante efetuado tal prova, sendo certo que tinha ao seu total alcance, as condições e os meios para a poder produzir, impõe-se concluir que a impugnante violou o principio da descoberta da verdade material, porquanto, o ónus probatório a que se reporta o nº 3 do artigo 74º da LGT, tem também ínsito na sua ratio a descoberta da verdade material. - Ora, no caso concreto e tal como decorre dos pontos iii) e iv) da decisão sob recurso, o Tribunal “a quo”, a AT cumpriu o ónus a que se reporta a primeira parte do nº 3 do artigo 74º da LGT, tendo, para tanto, apresentado provas irrefutáveis da verificação dos pressupostos da aplicação dos métodos indiretos – vide pontos iii) e iv) da decisão sob recurso. - Tendo a AT no caso em apreço, apresentado provas irrefutáveis da necessidade de aplicação de métodos indiretos para o apuramento da matéria tributável da impugnante e tendo demonstrado a adequação do critério de quantificação, para além do cumprimento do ónus probatório que sobre si recaía, observou, em toda a sua atuação o principio do inquisitório e da descoberta da verdade material. - O Tribunal “a quo” ao inverter o ónus da prova a que alude o nº 3 do artigo 74º da LGT, violou o princípio da igualdade de armas, porquanto, fez recair sobre a AT a produção de prova que estava na total disponibilidade da impugnante e que a mesma poderia ter produzido sem qualquer dificuldade na sua concretização, uma vez que detinha o conhecimento e a capacidade de apresentar em Tribunal não apenas as evidências da existência das 40 toneladas de queijo deteriorado ( veja-se a realização de uma reportagem fotográfica ou de imagem) como também conhecia melhor do que ninguém a valorização daquela quantidade de queijo deteriorado e o impacto da mesma nas existências do inventário de 2008 e bem assim os custos que teve de suportar para conservar em armazém refrigerado para o efeito, durante vários anos, as alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado. - O princípio da igualdade de armas, impõe o equilíbrio entre as partes ao longo de todo o processo, na perspetiva dos meios processuais de que dispõem para apresentar e fazer vingar as respetivas teses. Ora, o que se verificou nos presentes autos foi que o Tribunal “ a quo” fez recair sobre a AT o ónus probatório que recaía sobre a impugnante, acabando, desta forma por “beneficiar” a impugnante que para além de não possuir organizada a sua contabilidade em conformidade com as regras e princípios contabilísticos e fiscais que devem nortear o desenvolvimento da sua atividade, de forma a possibilitar uma avaliação direta da sua matéria tributável, não efetuou qualquer esforço probatório no sentido de apresentar uma alternativa ao critério de quantificação que foi apresentado pela AT e bem assim não apresentou factos concretos que de forma clara e inequívoca demonstrassem que no caso em apreço ocorreu um eventual excesso de quantificação. - Ao decidir, como decidiu o Tribunal “a quo”, violou o princípio da igualdade das partes, na medida em que para além de inverter o ónus da prova constante da parte final do nº 3 do artigo 74º da LGT, decidiu apenas com base na versão dos factos aportada aos autos pela impugnante, sem levar em consideração a globalidade da prova produzida, as contradições que a impugnante foi deixando transparecer ao longo de todo o percurso que efetua desde o procedimento inspetivo, passando pelo pedido de revisão da matéria tributável até à fase de produção de prova testemunhal. - Por outro lado, a impugnante nunca apresentou qualquer outro critério porventura mais ajustado à sua realidade e ainda que o fizesse, não é fundamento para se concluir pela inadequação do critério escolhido pela AT na medida em que represente também ele um esforço de aproximação à realidade, não se podendo perder de vista que a situação real apenas se pode apreender com base nos dados da contabilidade, que o próprio contribuinte tratou de descredibilizar. - Em suma, contrariamente ao entendimento que foi preconizado pelo Tribunal “a quo” cabia à impugnante alegar e provar que ocorreu excesso na quantificação da matéria tributável, o que não foi efetuado.- Acresce referir que, tendo em consideração a factualidade que consta do probatório, especialmente a constante da alínea H), K) L), M), N), O) e P), nem sequer se vislumbra como possível que o eventual excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou seja manifesto, notório ou ostensivo em face dos factos alegados pela impugnante. - Por outro lado e como se escreveu no Ac. do STA de 17/03/2010, no âmbito do proc.º01211/09, «Persistindo a situação de "non liquet" quanto ao excesso na quantificação a que chegou a Administração tributária, a dúvida terá de ser decidida em desfavor da recorrente, que não logrou provar a existência de tal excesso, nem se afigura evidente para este Tribunal que o alegado excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou que seja manifesto, notório ou ostensivo». - O Tribunal “a quo” deu como provado o facto constante da alínea Y) do probatório, o qual apresenta o seguinte teor: “A Impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R........... [cf. depoimentos das testemunhas V............e M............]. - Sucede que em conformidade com a prova que resultou assente no âmbito das alíneas H), K), L), M), N), O) e P) a impugnante terá conservado e armazenado o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R..........., no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH, em que a impugnante tinha a qualidade processual de Ré e R........... de Autora. - Ora, a prova que resultou dos depoimentos das testemunhas V............e M............, tem necessariamente de ser articulada com as demais evidências probatórias constantes das referidas alíneas H), K), L), M), N), O) e P), impondo-se assim, ao abrigo do preceituado no artigo 662º do CPC, aplicável ex vi, alínea e) do artigo 2º do CPPT e a fim de evitar interpretações dúbias ( pois parece evidenciar que a impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para quaisquer fins probatórios) a sua alteração nos seguintes termos: Y) A Impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R..........., no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH, em que a impugnante tinha a qualidade processual de Ré e R........... de Autora. [cf. depoimentos das testemunhas V............e M............e alíneas H), K), L), M), N), O) e P) do probatório. - Também ao abrigo do referido artigo 662º do CPC, porque se revela essencial à apreciação da matéria controvertida, com repercussões no sentido da decisão, requer-se a ampliação da matéria de facto, nos seguintes termos: “A sentença proferida no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH, não faz referência à existência das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado, nem se pronuncia sobre a valorização destas e respetivo impacto no inventário de existências da impugnante.” Termos em que - atentos os vícios que ora foram imputados à decisão sob recurso - com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso, devendo, em consequência, ser revogada a decisão proferida pelo Tribunal “a quo” e substituída por outra, que mantenha na ordem jurídica o ato tributário impugnado.” * Não foram apresentadas contra-alegações * O Exmo. Procurador-Geral Adjunto do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificado para o efeito, ofereceu aos autos o seu douto parecer no sentido da procedência do recurso, com a consequente revogação da sentença e sua substituição por decisão que julgue improcedente a impugnação, acompanhando para tanto os argumentos utilizados pela recorrente Fazenda Pública. * Delimitação do objeto do recurso Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (artigo 639º do Código de Processo Civil (CPC)) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal. Assim, atentas as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que, no caso concreto, as questões fundamentais a decidir são as de saber se: i)Se verifica erro de julgamento quanto à determinação da matéria de facto. ii) Se verifica erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto, porquanto «a impugnante nunca trouxe aos autos quaisquer evidências probatórias que demonstrassem de forma clara e objetiva, de que forma é que aquelas 40 toneladas de queijo deteriorado, se repercutiram no inventário de 2008, bem como nunca demonstrou quais os reais custos que teve de suportar para conservar em armazém refrigerado para o efeito, as alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado em adiantado estado de putrefação» . iii) Se verifica erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa, consubstanciado na inversão das regras do ónus da prova. iv) Se verifica erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa, caracterizado pela falta de demonstração do excesso na quantificação da matéria coletável por métodos indiretos e na violação do princípio da igualdade de armas. * Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta. * II. Fundamentação II.1. De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: “Com interesse para a decisão, considera-se provada a seguinte factualidade constante dos autos: A) A Impugnante é uma sociedade comercial por quotas, registada na conservatória do registo comercial desde 20/04/1979, cujo objeto de atividade consiste na «Indústria e comércio de lacticínios» [cf. fls. 220 a 226 dos autos]. B) Em 28/08/2009, os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças da Guarda remeteram à Impugnante, por correio registado, «Carta Aviso» referente à Ordem de Serviço n.º OI200900473, cujo teor aqui se dá como reproduzido [cf. fls. 5 e 6 do processo administrativo (PA) apenso]. C) Em 14/10/2009 o representante legal da Impugnante assinou a Ordem de Serviço n.º OI200900473, emitida 23/07/2009, cujo teor aqui se dá como reproduzido, da qual consta que a ação inspetiva é de âmbito parcial e incide sobre o IRC e IVA do ano/exercício de 2007 (…)» [cf. fls. 9 do PA apenso]. D) Em 28/10/2009 o representante legal da Impugnante assinou a Ordem de Serviço n.º OI200900473, cujo teor aqui se dá como reproduzido, de cujo quadro 5 consta o seguinte: «Altera-se a Ordem de Serviço que lhe foi notificada em 2009/10/14, com os seguintes fundamentos: Alargamento da acção inspetiva ao exercício de 2008, nos termos do n.º 1 do artº 15º do RCPIT, motivado pela necessidade de aferição do lucro tributável declarado, nomeadamente das vendas declaradas face ao stock de produtos acabados e IVA apurado» [cf. fls. 8 do PA apenso]. E) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200900473, a Impugnante foi objeto de uma ação de inspeção tributária externa, de âmbito parcial, em sede de IRC e IVA dos exercícios de 2007 e 2008, com início, em 14/10/2009, e conclusão, em 02/11/2009 [cf. fls. 17 a 36 do processo administrativo (PA) apenso]. F) Notificada do projeto de relatório de inspeção tributária a Impugnante exerceu o seu direito de audição, através de carta datada de 07/12/2009, cujo teor aqui se dá como reproduzido, e do qual se destaca o seguinte teor: «(…) foram prestadas informações ao inspector em relação a processos judiciais em curso sobre situações que provocaram prejuízos em termos de produtos fabricados que não foram tidas em conta (…)» [cf. fls. 235 a 236 dos autos]. G) Em 16/12/2009 foi elaborado o relatório final de inspeção tributária, composto pelos anexos I a VII, cujo teor aqui se dá como reproduzido, de cujas conclusões resultaram correções à matéria tributável com recurso a métodos indiretos, designadamente, em sede de IRC do exercício de 2008, no montante de 284.702,34€ [cf. fls. 17 a 55 do PA apenso]. H) Do relatório final de inspeção tributária pode ler-se, além do mais, o seguinte: «(…) II – 2. Motivo, âmbito e incidência A acção inspectiva ao sujeito passivo (…), incidiu nos exercícios de 2007, tendo no seu decurso, sido alargada ao ano de 2008. O procedimento inspectivo foi de âmbito parcial em IRC e IVA e teve origem no facto de o sujeito passivo declarar prejuízos em vários exercícios consecutivos e na acção de controlo de empresas com elevado endividamento perante os sócios. (…) IV – Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos Nos termos do artigo 52º nº 1 do CIRC a aplicação de métodos indirectos efectua-se nos casos e condições previstos nos artigos 87º a 89º da LGT. No art.º 87º da LGT consta que a avaliação indirecta se pode efectuar em caso de: a) … b) “Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto”. c) … d) … e) “Os sujeitos passivos apresentarem, sem razão justificada, resultados tributáveis nulos ou prejuízos fiscais durante três anos consecutivos, salvo nos casos de início de actividade, em que a contagem deste prazo se faz do termo do terceiro ano, ou em três anos durante um período de cinco”. f) … 1. Prejuízos fiscais declarados O sujeito passivo nos exercícios de 2003 a 2008 apresentou sempre prejuízos fiscais. A rentabilidade fiscal apresentada pelo sujeito passivo ao longo dos anos é muito inferior à da média das empresas do mesmo sector do Distrito da Guarda. O rácio do pessoal representa a contribuição dos custos com o pessoal para o volume de negócios. Os valores apresentados pelo sujeito passivo são bastante inferiores aos da média do distrito. Nos exercícios de 2007 e 2008 foram despedidos alguns trabalhadores, pelo que houve lugar a indemnizações, nos valores de 66.318,00€ e 8.355,85€ respectivamente. Se aos custos com o pessoal forem retirados os valores das indemnizações, uma vez que estes custos podem ser considerados extraordinários, encontramos rácios de pessoal de 3,331 para 2007 e de 3,98 para 2008, o que mesmo assim é manifestamente inferior à médias das empresas do distrito pertencentes ao mesmo sector de actividade. 3. Existências de Produtos Acabados Exercício 2007 As existências iniciais de produtos acabados em 01/01/2007 eram de 378.613,26€, conforme inventários das existências de Produtos Acabados de 31/12/2006 (ANEXO II). Da comparação dos preços unitários utilizados no inventário de Produtos Acabados, com os preços de venda praticados em Janeiro de 2007 nos documentos recolhidos por amostragem, verifica-se que o critério valorimétrico utilizado foi o do Preço Médio de Venda (PMV) deduzido de aproximadamente 20%, conforme quadro em Anexo (Anexo III), critério este que foi o utilizado no ano de 2008, com veremos a seguir. Da análise ao resumo de vendas por produtos de 2007 (ANEXO IV), comparativamente com o inventário de existências de produtos acabados em 01/01/2007, podemos elaborar o seguinte mapa: Sendo que: (1) - Representa as vendas em quantidade declaradas pelo sujeito passivo; (2) - Representa as existências iniciais de produtos acabados, em quantidades; (3) - Representa as vendas mensais em média; (4) - Representa o tempo em meses necessários para vender o stock de produtos acabados tendo como base a média de vendas por mês em 2007. Exercício 2008 As existências iniciais de produtos acabados em 01/01/2008, que são iguais à existências finais de 2007 eram de 341.944,43€. (ANEXO V). O critério utilizado para valorizar as existências foi o do Preço Médio de Venda (PMV) deduzido de 20%. O PMV foi calculado, conforme mapa da contabilidade, dividindo o valor total das vendas de produtos acabados pela quantidade de quilos vendidos. (ANEXO IV). Da análise ao resumo de vendas por produtos de 2008 comparativamente com o inventário de existências de produtos acabados em 31/12/2007, ou seja, o inventario das existências iniciais de 2008, podemos elaborar o seguinte mapa: Nota: O quadro foi elaborado com as vendas de 2007, uma vez que não existe nenhum resumo das vendas em quantidades por produtos para o ano de 2008 e o valor total das vendas de produtos acabados de 2007 para 2008 passou de 1.017.294,41€ para 1.121.657,05€ ou seja aumentou cerca de 10%, que pode ser explicado pelo aumento do preço dos produtos, mantendo-se as quantidades idênticas às de 2007. 4. Rotação de Stocks de Produtos Acabados Tendo em conta os valores encontrados no ponto anterior para o tempo médio de vendas das quantidades existentes no início de cada ano, houve necessidade de se fazer um estudo à rotação média real dos stocks. Para tal foram recolhidas aleatoriamente algumas facturas de venda de produtos, das quais consta o lote a que cada produto pertence. Com o número de lote podemos saber qual a data em que esse lote foi fabricado, e assim o tempo que demorou a ser comercializado. Para tal foram elaborados os mapas constantes do ANEXO VI, de onde foram extraídos os seguintes valores, que representam o tempo médio que cada produto esteve em armazém desde que foi produzido até à sua comercialização. Comparando os valores da rotação das quantidades existentes em inventário, com os da rotação média real dos stocks, vemos que existem grandes discrepâncias, sendo que a rotação média real dos stocks é feita num tempo muito inferior ao obtido pela rotação dos inventários. 4. Conclusão A contabilidade, embora formalmente organizada, apresenta indícios de se encontrar materialmente errada, uma vez que conforme se demonstrou nos pontos anteriores, nomeadamente através dos inventários e da rotação dos stocks, as quantidades produzidas e comercializadas pela empresa são superiores às reflectidas na contabilidade. A rotação real dos stocks ao efectuar-se a um ritmo muito mais rápido do que o declarado na contabilidade, indicia que a contabilidade não reflecte todos os proveitos obtidos pela empresa. Assim, tendo em conta que: - a empresa declarou prejuízos fiscais consecutivamente desde 2003; - a contabilidade se encontra materialmente errada, nomeadamente pelos valores dos inventários de produtos acabados e pela rotação dos stocks, o que impossibilita a comprovação e quantificação de forma directa e exacta a matéria tributavél em sede de IRC e IVA gerada pela actividade; encontra-se legitimado o recurso à avaliação indirecta prevista no artigo 87 da LGT. V – Critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos Em resultado do explanado no capítulo anterior, encontrando-se devidamente fundamentado o recurso a métodos indirectos, procedemos às seguintes quantificações no âmbito do IRC e IVA: Conforme apurámos no ponto IV.4. a rotação média dos stocks de produtos acabados é a seguinte: Nota: Valores apurados acompanhando diversos lotes nos anos de 2007 e 2008. Vamos então considerar que, em média, desde a data de fabrico de um produto até à sua venda passam três meses, uma vez que este rácio se enquadra nos resultados apurados. Temos assim que a rotação média dos stocks é quatro, uma vez que se cada produto demora três meses a ser comercializado, ou seja, durante os doze meses do ano ele “roda” quatro vezes. Desta forma e tendo em conta que as existências iniciais de produtos acabados em 2007 eram de 378.613.36€ e em 2008 de 341.944,43€, foi elaborado o seguinte quadro: IRC Calculadas as vendas presumidas ao preço dos inventários temos então de lhe acrescer a margem para obtermos as vendas presumidas ao preço de venda. * Como vimos anteriormente o critério valorimétrico utilizado nos inventários foi o do preço de venda deduzido de 20%. Rentabilidade fiscal das vendas Nos exercícios em análise, de 2007 e 2008, o sujeito passivo exerceu a sua actividade de forma continuada, não havendo qualquer indício de que a produtividade da empresa era inferior à das outras empresas do mesmo sector de actividade, ou que a rentabilidade fiscal das vendas era substancialmente diferente da rentabilidade das referidas empresas. A empresa embora situada no distrito da Guarda, exerce a sua actividade a nível nacional, tendo clientes em todo o país, sendo alguns deles grupos de distribuição nacional. Foi assim considerado como índice a aplicar à rentabilidade fiscal das vendas, a média do sector a nível nacional, uma vez que este nos parece ser aquele que melhor reflecte a realidade da empresa, até porque a média da unidade orgânica é pouco representativa, uma vez que engloba um número muito reduzido de empresas. A média nacional da rentabilidade fiscal das vendas nos exercícios de 2007 e 2008 foi a seguinte (ANEXO VII): Nota: a rentabilidade Fiscal das Vendas é nos dada pelo Lucro Tributavél/Vendas Valor total das Vendas A análise feita nos pontos anteriores é referente aos dados da produção, sendo os valores presumidos os das vendas de produtos acabados, contudo como vimos no ponto II.3.2 o sujeito passivo também vende mercadorias, pelo que para obtermos o valor total das vendas temos que somar as vendas declaradas de mercadorias às vendas presumidas de produtos acabados. Assim temos: Lucro Tributável O lucro tributável estimado será então o que resulta da aplicação da média do rácio da rentabilidade fiscal das vendas, às vendas totais: Resultado Tributável proposto (…) IX – Direito de Audição – Fundamentação Tendo o sujeito passivo sido notificado, através do ofício n.º 33394 remetido por carta registada em 24/11/2009, nos termos do art.º 60.º da LGT e art.º 60 do RCPI, para exercer o direito de audição sobre o Projecto de Correcções do Relatório de Inspecção, veio o mesmo a exercer esse direito por escrito em 09/12/2009, através de carta na qual afirma discordar “com as conclusões do projecto de relatório que nos foi enviado, resultado da inspecção que foi efectuado pelos vossos serviços à nossa empresa.” Da análise aos motivos apresentados pelo sujeito passivo temos o seguinte: O sujeito passivo vem considerar que houve várias falhas na metodologia utilizada, uma vez que “ao englobar a nossa actividade no conjunto do CAE 10510 – Indústria do Leite e Derivados, a nível nacional, comete-se um erro muito importante, uma vez que este sector apresenta um conjunto de empresas que de comum apenas têm a matéria prima empregue. Engloba empresas muito diferentes em termos de produtos comercializados (leite UHT, iogurtes, natas, leite em pó industrial, etc). Estes produtos têm rentabilidades muito diferentes, para além disso no sector específico do queijo existem vários tipos deste produto cada qual com uma rentabilidade diferente.” Alega ainda que “Utilizar indicadores médios do sector a nível nacional…é errado” e que “As vendas para o mercado externo superam em muito as vendas para essas unidades com cobertura nacional (grandes superfícies)”. Vem também dizer que: “foram prestadas informações ao inspector em relação a processos judiciais em curso sobre situações que provocaram graves prejuízos em termos de produtos fabricados que não foram tidos em conta. Foram também fornecidas informações sobre o nosso método de fabrico do produto, o qual é diferente de todas as outras empresas do sector…”. Dispõe o nº 3 do artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT) que, “Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indiretos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação.” Ora, a verificação dos pressupostos da aplicação de métodos indirectos, devidamente fundamentada no ponto IV do presente relatório e não foi contestada pelo sujeito passivo no direito de audição, contestando unicamente a metodologia utilizada na aplicação dos métodos indiretos. Porém, como dissemos, cabia ao sujeito passivo o ónus da prova da quantificação que alega excessiva, o que não se verificou. Relativamente aos processos judiciais em curso sobre situações que provocaram graves prejuízos em termos de produtos fabricados e quanto ao método de fabrico, embora tenham sido prestadas informações pelo sujeito passivo, não foi dado qualquer tratamento contabilístico, nem existem quaisquer dados objetivos que permitam quantificar o valor dos custos associados a essas situações, não foi inclusivamente comprovada a data da sua ocorrência. Nos motivos apresentados, o sujeito passivo simplesmente considera que a quantificação é excessiva e a metodologia utilizada errada, mas não apresentou provas nem dados adicionais que comprovem o alegado. Assim, e face ao que acima foi exposto, propomos a manutenção das conclusões do Projecto de Relatório, uma vez que o sujeito passivo não juntou quaisquer elementos novos que ponham em causa a análise anterior, nem provou que a quantificação seja excessiva, como lhe competia (…)» [cf. fls. 17 a 36 do PA apenso]. I) Sobre o relatório de inspeção recaiu parecer concordante e despacho de sancionamento [cf. fls. 17 e 18 do PA apenso]. J) A Impugnante foi notificada do relatório de inspeção tributária e da fixação da matéria tributável com recurso a métodos indiretos, através do oficio n.º 33595, de 22/12/2009 [cf. fls. 13 a 16 do PA apenso]. K) A Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria coletável, nos termos do artigo 91.º da LGT, cujo teor aqui se dá como reproduzido e do qual se destaca o seguinte: «(…) 26. (…) 3. A nível regional, a recolha de leite junto dos produtores passou a ser feita pela R..........., empresa constituída pela reclamante em associação com outros pequenos produtores visando reduzir custos e salvaguardar a sobrevivência, obrigando-se a reclamante a adquirir leite à sua participada na proporção da quota no capital social; 4. Ora, seria precisamente o cumprimento desse contrato com o seu fornecedor R........... a origem dos problemas que agora lhe estão a ser levantados pela Administração; 5. Os factos foram, aliás, referidos ao agente da inspeção, que no entanto os ignorou e os omitiu do relatório: i.A qualidade do leite fornecido pela R........... nunca foi boa, mas tornar-se-ia especialmente má a partir de 1999, degradando-se definitivamente nos anos de 2000, 2001, 2002 e 2003 (até 21 de Agosto deste último ano, data em que a reclamante rompeu o contrato de fornecimento e interpôs uma acção judicial de indemnização que ainda decorre nos Tribunais); ii. As consequências de tal falta de qualidade ficaram no entanto bem gravadas no património da reclamante: cerca de 40 toneladas de queijo impróprio para consumo que se fora acumulando (e que, até à realização duma peritagem destinada a apresentar em Tribunal, a reclamante conservou em armazém especialmente refrigerado para o efeito, e hoje se encontra nesse mesmo armazém e noutros locais, em adiantado estado de putrefação); iii. É esse queijo impróprio para consumo que, desde então, inflaciona o inventário das existências;(…)» [cf. fls. 42 a 59 dos autos]. L) Em 12/02/2010, no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, realizou-se reunião entre os peritos designados pela Impugnante, tendo a mesma sido suspensa até ao dia 18/02/2020, com vista à junção de elementos pelo perito da Impugnante, tendo sido elaborada ata n.º 4.1, cujo teor aqui se dá como reproduzido e do qual se destaca o seguinte: «(…) Abordou-se também a questão dos fornecedores de leite e os problemas originados com o seu fornecimento à alguns anos atrás (entre 1999 e 2003) levando a empresa a produzir queijo de qualidade inferior em que não foi possível a sua venda, e consequentemente, veio a influenciar os stocks de produtos acabados, desde essa data. A empresa não deu qualquer tratamento contabilístico a essas ocorrências, nem foram apresentadas na reunião quaisquer dados objetivos. No entanto o perito do contribuinte referiu que a não relevação contabilística foi uma opção da empresa, isto porque o registo na contabilidade iria agravar os prejuízos e colocaria a empresa em dificuldades adicionais na obtenção de financiamento. Dada a não apresentação de elementos concretos relativos ao processo judicial, o perito do contribuinte disponibilizou-se ao faze-lo numa próxima reunião a marcar (…)» [cf. fls. 67 e 69 do PA apenso]. M) Em 18/02/2020 voltaram a reunir-se os peritos da Impugnante e da Administração Tributária a fim de continuarem o procedimento de revisão, tendo ambos os peritos decidido suspender a reunião até ao dia 22/02/2010, tendo sido elaborada a ata n.º 4.2, cujo teor aqui se dá como reproduzido e do qual se destaca o seguinte: «(…) A reunião havia sido suspensa para o perito da empresa apresentar elementos concretos relativos à justificação de produtos acabados sem qualidade que estão a influenciar os stocks, e, que no pedido de revisão quantifica quer em peso (42.000Kgs) quer em valor (€180.303,00), constantes do processo judicial. Os elementos apresentados foram apenas a sentença do Tribunal Judicial de Pinhel de 18/05/2007 em que a empresa é a Ré e a autora da acção foi a empresa fornecedora de leite R........... – recolha de Leite da Beira Interior, Lda, da qual é sócia. Segundo informou na sentença não se encontra aquilo que o perito da Fazenda pretende ver justificado-stocks de produtos acabados deteriorados. O valor da indeminização pedida, €815.269,20, incluía despesas adicionais no tratamento de leite; leite fornecido com rendibilidade inferior na produção de queijo; produto acabado com tempo de conservação inferior, cf anexo I. O perito da Fazenda informa que é ao perito do contribuinte que cabe provar o excesso de quantificação, nos termos do nº3 do artigo 74º da LGT, cabendo-lhe a si justificar a base legal dos pressupostos da aplicação de métodos indirectos. Este assunto já tinha sido abordado na primeira reunião, mas o perito do contribuinte afirmou que, para ele, e uma vez que o enquadramento é efetuado “prejuízos fiscais durante três anos consecutivos…”, não merece discussão. No entanto a empresa no pedido de revisão no ponto 2,4,5 e 6 levanta algumas questões que enquanto perito da fazenda não deixarei de justificar. De facto no relatório (Capítulo IV-fls 9) são enumerados dois pressupostos para a aplicação de métodos indiretos – alínea b) e alíne e) do artigo 87º da LGT; (i) no que concerne à alínea e) é fundamento per si, não remetendo para qualquer outro atrigo (87º a 89º) e encontrando-se justificado no relatório fls10; (ii) quanto à alínea b) do artigo 87º na conclusão do capítulo IV do relatório fls. 13 e 14, facilmente se depreende que lhe está subjacente a alínea a) do artigo 88.º. É de salientar que apesar de não se fazer referência expressa à alínea a) do artigo 88º da LGT, ao referir em fls. 9 “…condições previstas nos artigos 87º a 89º da LGT”, acaba por constar. O perito do contribuinte questiona se é possível haver acordo ao que responde o da fazenda que a reunião tem como objetivo o acordo, mas acrescenta que o excesso de quantificação compete a ele tal como já havia referido. Então este informa que a empresa tem dificuldades financeiras e vai ponderar a apresentação de uma proposta. Acordaram os peritos marcar nova reunião, por um lado porque a sentença do Tribunal era extensa (50pgs) e o perito da fazenda pretendia lê-la, e por outro, porque o perito do contribuinte iria pensar melhor na apresentação ou não de proposta (…)» [cf. fls. 70 a 72 do PA apenso]. N) Na reunião de 18/02/2020 o perito da Impugnante juntou cópia de uma sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Pinhel, em 18/08/2007, no âmbito do processo 12/04.5TBPNH, cujo teor aqui se dá como reproduzido [cf. fls. 73 a 122 do PA apenso]. O) Em 22/02/2010 voltaram a reunir-se os peritos da Impugnante e da Administração Tributária a fim de continuarem o procedimento de revisão, não tendo não tendo sido possível o acordo entre ambos, foi elaborada a ata n.º 4.3, cujo teor aqui se dá como reproduzido e do qual se destaca o seguinte: «(…) Questionado pela apresentação ou não da proposta que demonstre o excesso de quantificação, o perito do contribuinte informa que não o pretende fazer, uma vez que pretende discutir esta matéria em Tribunal. O perito da fazenda, e no que diz respeito à sentença, conclui que de facto o que vem relatado nesta, não corresponde ao descrito no pedido de revisão. Os pontos do pedido de revisão discutidos nas reuniões foram os constantes das actas. Sem proposta por parte do perito do contribuinte, decidiram ambos os peritos não ser possível acordo. A posição do perito do contribuinte é no sentido de não haver qualquer correcção. Quanto ao perito da fazenda a sua posição que vai ditar para a acta é a seguinte: Da análise aos únicos elementos apresentados pelo perito do contribuinte no que respeita ao excesso de quantificação – sentença da acção judicial apresentada pela fornecedora de leite natureza, R........... recolha de leite da Beira Interior, Lda, contra a empresa em análise, pela sua leitura atenta conclui-se que a autora reclama pagamentos em atraso (facturas) para além de pedido de indeminização pela suspensão no fornecimento de leite; a Ré reclama uma indeminização de € 615.078,19 resultante da compensação do crédito da autora de € 200.191,01 com o crédito de € 615.078,19 resultante da compensação do crédito da autora de € 200.191,01 com o crédito da ré de € 815.269,20 que em resumo se deve aos factos referidos fls 4, 5 e 6 da sentença: (…) Não consta qualquer referência na sentença judicial nem foi apresentado com o pedido de revisão ou na reunião algum documento de uma qualquer peritagem destinada a apresentar em Tribunal, que evidenciasse quantidade de queijo deteriorado (40.000kgs) tal como descreve no pedido de revisão. Por outro lado não é perceptível que a empresa possa em 2009 elaborar um inventário com a discriminação de produto acabado deteriorado e em condições de venda, quando a origem dessa deterioração se reporta à pelo menos seis anos atrás (2000 a 2003). Também neste ponto não foi exibido qualquer documento. Do exposto não foram apresentados, em sede de pedido de revisão, fundamentos objectivos, isto é, suportados por documentos que sustentem o descrito no ponto 5 do nº26 do mesmo pedido, pelo que, não faz sentido a descrição enunciada no nº 27 do pedido devendo manter-se em relação aos stocks os valores constantes da contabilidade. (…)» [cf. fls. 123 a 127 do PA apenso]. P) Em 08/03/2010, no âmbito do procedimento de revisão, o Diretor de Finanças da Guarda proferiu despacho, cujo teor aqui se dá como reproduzido e do qual se destaca o seguinte: «(…) Desencadeado o respetivo procedimento, que culminou com a prolação das actas n.º s 4.1; 4.2 e 4.3, respetivamente, de 12, 18 e 22 do mês de Fevereiro de 2010, conclui-se que não houve acordo entre os peritos nomeados e intervenientes no processo. Os peritos presentes ditaram o respetivo parecer para a acta n.º 4.3. Como dispõe o nº. 6 do artigo 92º. da Lei Geral Tributária “na falta de acordo no prazo estabelecido no nº. 2, o órgão competente para a fixação da matéria tributável resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos”. Assim, decidindo: O perito da administração tributária, no seu parecer, analisa o documento apresentado já no procedimento revisão – a sentença de 18/05/2007 do Tribunal Judicial de Pinhel, em que a reclamante é ré e autora a sociedade R............, Ldª. e conclui que nesta não é feita, em momento algum, referência às 40 toneladas de produto não vendido e que ainda mantinha em stock. Por sua vez, a posição do perito nomeado pela reclamante é no sentido de não haver qualquer correcção. A fixação teve por base o relatório da inspeção tributária, que se dá por integralmente reproduzido, o qual foi sancionado por despacho de 22 de Dezembro de 2009. Da sua análise resulta haver razões fundadas para as correcções efetuadas, bem como resulta evidente a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria coletável, pelo que se mostra legitimado o recurso à aplicação de métodos indirectos, atenta a fundamentação aí expandida. Mostra-se, assim, cumprido por parte da administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da tributação por métodos indiretos, sendo que não se verifica igual cumprimento por parte da requerente em relação à quantificação – cfr. nº. 3 do artº. 74º. da LGT. Acresce que, tal como salienta a perita nomeada pela Administração Tributária, a sentença junta e apresentada para base de discussão e prova do alegado, não dá como provada a alegada existência de 40 toneladas de queijo. Sendo ainda de salientar que, a ser assim, teríamos que o alegado lote de queijo já teria mais de 6 anos de idade, o que originaria acrescidos custos de conservação, que também não foram provados. Nestes termos, tudo visto e ponderado, decido fixar a matéria tributável em sede de IRC e o Imposto sobre o Valor Acrescentado, nos valores fixados inicialmente, que assim mantenho, para cada um dos anos de 2007 e 2008. Nos termos do disposto no nº. 9 do artº. 91º. da LGT, fixo um agravamento à colecta de 5%, a qual fica, no entanto dependente de não ser deduzida impugnação judicial (cfr. al. C) do mesmo preceito) (…)» [cf. fls. 65 e 66 do PA apenso]. Q) A Impugnante foi notificada do despacho mencionado na alínea anterior através de ofício expedido, por correio registado, em 09/03/2010 [cf. fls. 62 e 64 do PA apenso]. R) Em nome da Impugnante foi emitida a liquidação adicional de IRC n.º 2010 8310001815, referente ao exercício de 2008, no montante de 21.353,68€ [factualidade não controvertida]. S) Em 09/04/2010 a Impugnante expediu, com destino ao Aterro de Resíduos Não perigosos de Castelo Branco, um contentor de resíduos composto por 13.700 kg de queijo flamengo, prato, ovelha e mistura de cabra, impróprios para consumo [cf. fls. 88 a 91 dos autos]. T) Em 26/04/2010 a Impugnante expediu, com destino ao Aterro de Resíduos Não perigosos de Castelo Branco, um contentor de resíduos composto por 2.960 kg de queijo flamengo, prato, ovelha e mistura de cabra, impróprios para consumo [cf. fls. 82 a 85 dos autos]. U) Em 31/03/2010 a Impugnante expediu, com destino ao Aterro de Resíduos Não perigosos de Castelo Branco, um contentor de resíduos composto por 10.280 kg de queijo prato impróprio para consumo [cf. fls. 93 a 100 dos autos]. V) O maior fornecedor de leite da Impugnante era a R........... [cf. depoimentos das testemunhas M............e M............]. W) A qualidade do leite fornecido pela R........... degradou-se nos anos de 2000 a 2003 [cf. depoimentos das testemunhas V............, M............e M............]. X) A quase totalidade do queijo impróprio para consumo, referido nas alíneas S), T) e U) que antecedem, foi produzido com o leite fornecido pela R........... durante os anos de 2000 a 2003 [cf. depoimentos das testemunhas V............, M............e M............]. Y) A Impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R........... [cf. depoimentos das testemunhas V............e M............]. Z) No decurso dos atos de inspeção, a Impugnante solicitou ao inspetor tributário que verificasse a existência do queijo deteriorado [depoimento de L............]. * Factos não provados “Com interesse para a decisão a proferir nada mais se provou”. * A decisão da matéria de facto fundou-se no seguinte: «Motivação: A convicção do tribunal quanto aos factos provados assentou na posição assumida pelas partes e na análise dos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo (PA) apenso, bem como nos depoimentos das testemunhas inquiridas, conforme discriminado nas várias alíneas do probatório. A testemunha M............, apesar de ser sócia da Impugnante, depôs de forma clara, objetiva e isenta sobre os factos aos quais foi inquirida, cuja razão de ciência advém do exercício de funções no sector de controlo de qualidade, não se vislumbrado qualquer razão para duvidar da veracidade do seu depoimento, contribuindo para os factos provados descritos nas alíneas V), W, X) e Y). A testemunha M............ prestou um depoimento convincente e congruente, tendo revelado conhecimento direto dos factos relatados por ter sido funcionário da Impugnante no período em causa, contribuindo para os factos provados descritos nas alíneas V), W) e X). Também a testemunha V............, professor universitário de microbiologia, prestou um depoimento convincente e congruente, tendo revelado conhecimento direto dos factos relatados, em virtude de, há vários anos, vir a acompanhar o litígio entre a Impugnante e a R........... e ter elaborado um parecer sobre a não conformidade e perda de peso do queijo produzido com os lotes de leite fornecidos pela R..........., contribuindo para os factos provados descritos nas alíneas W), X) e Y). Quanto ao facto provado descrito em Z), foi o mesmo confirmado pela testemunha L............, inspetor tributário que realizou a ação inspetiva”. * Nas suas conclusões, a Fazenda Pública impugna a determinação da matéria de facto e pretende que seja alterado: - O sentido da alínea Y), do seguinte modo: “O Tribunal “a quo” deu como provado o facto constante da alínea Y) do probatório, o qual apresenta o seguinte teor: “A Impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R........... [cf. depoimentos das testemunhas V............e M............]. Sucede que em conformidade com a prova que resultou provada no âmbito das alíneas H), K), L), M), N), O) e P) a impugnante terá conservado e armazenado o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R..........., no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH, em que a impugnante tinha a qualidade processual de Ré e R........... de Autora. Ora, a prova que resultou dos depoimentos das testemunhas V............e M............, tem necessariamente de ser articulada com as demais evidências probatórias constantes das referidas alíneas H), K), L), M), N), O) e P), impondo-se assim, ao abrigo do preceituado no artigo 662º do CPC, aplicável ex vi, alínea e) do artigo 2º do CPPT e a fim de evitar interpretações dúbias (pois parece evidenciar que a impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para quaisquer fins probatórios) a sua alteração nos seguintes termos: Y) A Impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R..........., no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH, em que a impugnante tinha a qualidade processual de Ré e R........... de Autora. [cf. depoimentos das testemunhas V............e M............e alíneas H), K), L), M), N), O) e P) do probatório.” - Pretende ainda, a Recorrente, o aditamento do quesito seguinte: “A sentença proferida no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH não faz referência à existência das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado, nem se pronuncia sobre a valorização destas e respetivo impacto no inventário de existências da impugnante”. Vejamos. Relativamente ao pedido formulado em primeiro lugar. Quando impugna a matéria de facto, a Recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição do recurso nesta parte. De acordo com o disposto no artigo 640º Código de Processo Civil (CPC) aplicável ex vi artigo 281º CPPT (Código de Procedimento e de Processo Tributário): “Artigo 640.º (Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto) 1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º Desde já adiantamos que estes ónus não foram cumpridos pela ora Recorrente. Como claramente resulta das alegações de recurso, a Recorrente não indicou nas respetivas conclusões, nem nas alegações, com a precisão que lhe era exigida os concretos meios probatórios que imporiam decisão diferente, e a decisão que, no seu entender pretende aditar, pelo que, desde já diremos que não se considera cumprida esta obrigação que sobre si recaía. Com efeito, incumbe à Recorrente cumprir este ónus, identificando os factos que entende terem sido mal julgados: quer por terem sido dados como provados quando o não deveriam ter sido, quer os que foram desconsiderados e considera serem relevantes à decisão, com indicação dos meios de prova que suportam esta sua pretensão de alteração do probatório. Assim, quando os meios de prova invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravadas, incumbe à Recorrente, transcrevê-las ou indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso [artigo 640, n.º2, alínea a) CPC]. Cabe à Recorrente cumprir este ónus, identificando os factos que entende terem sido mal julgados: quer por terem sido dados como provados quando o não deveriam ter sido, quer os que foram desconsiderados e considera serem relevantes à decisão, com indicação dos meios de prova que suportam esta sua pretensão de alteração do probatório. Diga-se ainda, que, resulta do teor do facto provado na alínea O) do Probatório, que: “O) Em 22/02/2010 voltaram a reunir-se os peritos da Impugnante e da Administração Tributária a fim de continuarem o procedimento de revisão, não tendo não tendo sido possível o acordo entre ambos, foi elaborada a ata n.º 4.3, cujo teor aqui se dá como reproduzido e do qual se destaca o seguinte: (…) Quanto ao perito da fazenda a sua posição que vai ditar para a acta é a seguinte: Da análise aos únicos elementos apresentados pelo perito do contribuinte no que respeita ao excesso de quantificação – sentença da acção judicial apresentada pela fornecedora de leite natureza, R........... recolha de leite da B…, Lda, contra a empresa em análise, pela sua leitura atenta conclui-se que a autora reclama pagamentos em atraso (facturas) para além de pedido de indeminização pela suspensão no fornecimento de leite; a Ré reclama uma indeminização de € 615.078,19 resultante da compensação do crédito da autora de € 200.191,01 com o crédito de € 615.078,19 resultante da compensação do crédito da autora de € 200.191,01 com o crédito da ré de € 815.269,20 que em resumo se deve aos factos referidos fls 4, 5 e 6 da sentença: (…) Não consta qualquer referência na sentença judicial nem foi apresentado com o pedido de revisão ou na reunião algum documento de uma qualquer peritagem destinada a apresentar em Tribunal, que evidenciasse quantidade de queijo deteriorado (40.000kgs) tal como descreve no pedido de revisão. Por outro lado não é perceptível que a empresa possa em 2009 elaborar um inventário com a discriminação de produto acabado deteriorado e em condições de venda, quando a origem dessa deterioração se reporta à pelo menos seis anos atrás (2000 a 2003). Também neste ponto não foi exibido qualquer documento. Do exposto não foram apresentados, em sede de pedido de revisão, fundamentos objectivos, isto é, suportados por documentos que sustentem o descrito no ponto 5 do nº26 do mesmo pedido, pelo que, não faz sentido a descrição enunciada no nº 27 do pedido devendo manter-se em relação aos stocks os valores constantes da contabilidade. (…)» [cf. fls. 123 a 127 do PA apenso].” Ou seja, a própria Administração Tributária, afirma: “Não consta qualquer referência na sentença judicial nem foi apresentado com o pedido de revisão ou na reunião algum documento de uma qualquer peritagem destinada a apresentar em Tribunal, que evidenciasse quantidade de queijo deteriorado…” Pelo que, não existe fundamento, para fazer valer a tese da Recorrente, de que a ora Recorrida terá conservado e armazenado o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R..........., no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH. Acresce que, o tribunal a quo, teve em consideração o depoimento da testemunha M............, sócia gerente da Impugnante, na motivação da matéria de facto que considerou provada, tendo tal depoimento sido determinante para o teor da alínea Y) do Probatório. Assim, terá de concluir-se que, a partir dos elementos de prova existentes nos autos e da posição processual das partes, não é possível concluir, que o armazenamento do queijo em causa por parte da Recorrida se deve apenas à necessidade de prova dos prejuízos no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH, que correu termos no Tribunal Judicial de Pinhel. Pelo que, quanto a este pedido, mantem-se a redação da alínea em causa, ou seja: «A Impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R........... [cf. depoimentos das testemunhas V............e M............]». No que tange ao pedido apresentado em segundo lugar: aditamento do quesito seguinte: “A sentença proferida no âmbito do processo judicial nº 12/04.5TBPNH não faz referência à existência das alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado, nem se pronuncia sobre a valorização destas e respetivo impacto no inventário de existências da impugnante”, diga-se que o que consta da referida sentença, retira-se da sua análise, sem que exista necessidade de se destacar o seu conteúdo, autonomizando-o como quesito. O que determina a rejeição da presente alegação. Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso. * Ao abrigo do disposto no artigo 662º, n. º1, do Código de Processo Civil (CPC), adita-se a seguinte matéria de facto: AA) Da sentença proferida em 18.05.2007, pelo Tribunal Judicial de Pinhel, no âmbito do Proc. 12/04.5TBPNH, na ação instaurada pela “R........... – R….., Lda.” (autora) contra a “L…, Lda.” (ré) consta, designadamente, o seguinte: BB) O queijo impróprio para consumo, com o passar dos anos, perde peso - depoimento das testemunhas da impugnante: V............, Professor Universitário de Microbilogia; M……, Sócio-gerente da empresa à data dos factos; M….. sócia e gerente da empresa à data dos factos; M............, funcionário da empresa à data dos factos. * II.2. Do Direito A Fazenda Pública, inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou procedente a impugnação apresentada por L……….., Lda., contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2008, no montante de € 21.353,68, veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo, assacando à decisão: i) Erro de julgamento quanto à determinação da matéria de facto; ii) Erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto, porquanto «a impugnante nunca trouxe aos autos quaisquer evidências probatórias que demonstrassem de forma clara e objetiva, de que forma é que aquelas 40 toneladas de queijo deteriorado, se repercutiram no inventário de 2007, bem como nunca demonstrou quais os reais custos que teve de suportar para conservar em armazém refrigerado para o efeito, as alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado em adiantado estado de putrefação»; iii) Erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa, consubstanciado na inversão das regras do ónus da prova; iv) Erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa, caracterizado pela falta de demonstração do excesso na quantificação da matéria coletável por métodos indiretos e na violação do princípio da igualdade de armas. A sentença objeto de recurso julgou procedente a impugnação, determinando a anulação do ato tributário impugnado. Julgou improcedentes os alegados e impugnados vícios de falta de fundamentação do ato determinativo da realização da inspeção, de falta de fundamentação formal da decisão de aplicação dos métodos indiretos, de erro nos pressupostos para aplicação de métodos indiretos. Considerou procedente o vício de preterição das diligências necessárias à descoberta da verdade material e, com este fundamento, anulou o ato tributário sob escrutínio. Vejamos então. Antes de mais, cumpre referir que sobre esta mesma questão já se pronunciou este Tribunal Central Administrativo Sul, ao apreciar uma situação em tudo similar à que aqui nos ocupa, apenas diferindo o ano do exercício em causa, no Acórdão proferido em 2024- 09-26, no proc. 444/10.0BECTB, jurisprudência na qual nos revemos inteiramente, tanto mais que a agora Relatora integrou o Coletivo na qualidade de adjunta. Deste modo, considerando o comando constante do nº 3 do artigo 8º do Código Civil (CC) – que impõe ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito - acolhemos o decidido naquele Acórdão, aderindo integralmente ao seu discurso fundamentador, aqui aplicável, com as devidas adaptações (onde se diz ano de 2007, deve considerar-se no presente Acórdão ano de 2008), passando a transcrever-se os fundamentos da decisão ali proferida sobre esta matéria: «Para julgar improcedente o vício referido em penúltimo lugar, escreveu-se na sentença, em síntese, o seguinte: «No caso dos autos, a Impugnante não alega, nem demonstra, qualquer factualidade concreta que, em termos de causalidade adequada, permita justificar a acumulação de prejuízos fiscais consecutivos em período superior a 3 anos, sendo de salientar que a existência de queijo deteriorado produzido entre os anos de 2000 a 2003 [cf. alíneas S), T) U) e X) do probatório] não é idónea a justificar os prejuízos declarados nos exercícios de 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008». Deste modo, julgamos que se verifica o pressuposto para aplicação de métodos indiretos previsto no artigo 87.º, n.º 1, alínea e) da LGT, sendo, assim, irrelevante apreciar, nesta sede, os erros que a Impugnante imputa à alegada discrepância entre a rotação de stocks resultante da contabilidade e o rácio de rotação real apurado por amostragem às vendas de produtos fabricados, pela simples razão que, mesmo que assista razão à Impugnante, sempre estaria a AT legitimada a proceder à determinação da matéria tributável com recurso a métodos indiretos». No que se refere ao vício referido em último lugar, cuja procedência determinou a anulação do ato tributário, escreveu-se na sentença sob escrutínio, em síntese, o seguinte: «Atenta a alínea K) probatório, verifica-se que, no âmbito do pedido de revisão da matéria tributável, a Impugnante alegou que do inventário de existências iniciais do exercício de 2007 constavam cerca de 40 toneladas de queijo impróprio para consumo, produzido com leite de má qualidade fornecido, pela R..........., entre os anos de 2000 a 2003, queijo esse que mantinha guardado nas suas instalações até à realização duma peritagem destinada a apresentar em tribunal no âmbito de uma ação judicial em curso. Ainda no âmbito do procedimento de revisão, conforme decorre da alínea L) do probatório, o perito da Impugnante referiu que o queijo deteriorado se manteve nos inventários por opção, de modo a não agravar os prejuízos e não colocar a empresa em dificuldades adicionais na obtenção de financiamento. Informa ainda a alínea Z) do probatório que, durante os atos de inspeção tributária, a Impugnante solicitou ao inspetor tributário que verificasse a existência do queijo deteriorado que se encontrava armazenado nas suas instalações. Verifica-se, assim, que no procedimento de revisão, a Impugnante alegou factos relevantes suscetíveis de colocar em causa a quantificação da matéria tributável efetuada pela AT com recurso a métodos indiretos. A decisão final do Diretor de Finanças no procedimento de revisão foi no sentido de a Impugnante não ter feito prova do excesso de quantificação da matéria tributável, nos termos do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, em virtude da sentença apresentada pelo perito da Impugnante no debate contraditório não dar como provada a existência de queijo deteriorado e não ser verosímil que do inventário constasse queijo deteriorado dos anos de 2000 a 2003 [cf. alínea P) do probatório]. Ora, à data da realização do procedimento de revisão da matéria tributável a Impugnante não havia ainda expedido para o aterro o queijo deteriorado, pelo que, face à dificuldade da prova a produzir pela Impugnante, julgamos que caberia à AT, de acordo com os seus poderes inquisitórios e com vista a descobrir a verdade material, diligenciar no sentido de confirmar os factos alegados pela Impugnante, mediante a realização da uma vistoria às instalações da Impugnante para confirmar a existência do queijo deteriorado - o que, aliás, havia já sido solicitado pela Impugnante no decurso dos atos de inspeção - mais solicitando à Impugnante os elementos necessários com vista a aferir se o mesmo constava do inventário que serviu de base à quantificação da matéria tributável» 2.2.2. No que concerne ao fundamento do recurso referido em ii), a recorrente invoca que a sentença errou na apreciação da factualidade relevante. Afirma que «estamos perante elementos probatórios na disponibilidade total da impugnante, que apenas teriam de ser por ela reunidos e entregues perante a AT ou perante o Tribunal “a quo” para que assim se pudesse concluir pela veracidade e credibilidade da tese apresentada pela impugnante, ou seja, para que assim se pudesse apurar quais as verdadeiras existências que a impugnante possuía no exercício de 2007 e o seu real valor, e subsequentemente verificar se o critério adotado pela AT era ou não adequado e se conduziu ou não a uma quantificação errada ou excessiva»; «[t]odavia, nem em sede de procedimento inspetivo, nem no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, nem em sede de produção de prova testemunhal, a impugnante logrou demonstrar qual era a valorização das referidas 40 toneladas de queijo deteriorado»; «E não se diga que tal prova se afigurava de difícil concretização para impugnante, como é defendido pelo Tribunal “a quo” pois a impugnante, melhor do que ninguém conhece os meandros da sua atividade, detendo o conhecimento integral de todas as eventuais vicissitudes que possam ocorrer no desenrolar da mesma, possuindo, melhor do que ninguém, a capacidade de provar e quantificar o impacto das mesmas quer ao nível das suas existências, quer ao nível dos resultados de cada exercício»; «[a] propósito da alegada influência das 40 toneladas de queijo deteriorado no valor do inventário de 2007 e sua repercussão na quantificação a que chegou a AT, assume particular relevância probatória– que foi totalmente ignorada pelo Tribunal a quo – o depoimento da testemunha L............que, entre o mais, referiu que “um dos pontos de análise foram as existências dos produtos acabados que existiam e nada na contabilidade permitia verificar se os produtos estavam deteriorados. Não estava refletido na contabilidade a eventual existência de queijo deteriorado” – vide gravação da prova testemunhal do minuto 1:28:53 ao minuto 1:30:18». Apreciação. A questão que se coloca reside em saber se os elementos coligidos no probatório documentam a asserção1 da recorrente, segundo a qual, «a impugnante nunca trouxe aos autos quaisquer evidências probatórias que demonstrassem de forma clara e objetiva, de que forma é que aquelas 40 toneladas de queijo deteriorado, se repercutiram no inventário de 2007, bem como nunca demonstrou quais os reais custos que teve de suportar para conservar em armazém refrigerado para o efeito, as alegadas 40 toneladas de queijo deteriorado em adiantado estado de putrefação». Vejamos. Do probatório resultam os elementos seguintes: i)No âmbito da acção inspectiva, foram prestadas informações ao inspector em relação a processos judiciais em curso sobre situações que provocaram prejuízos em termos de produtos fabricados que não foram tidas em conta (alínea F do probatório). ii) No pedido de revisão da matéria colectável, a recorrida referiu, designadamente, o seguinte: «3. A nível regional, a recolha de leite junto dos produtores passou a ser feita pela R..........., empresa constituída pela reclamante em associação com outros pequenos produtores visando reduzir custos e salvaguardar sobrevivência, obrigando-se a reclamante a adquirir leite à sua participada na proporção da quota no capital social; // 4. Ora, seria precisamente o cumprimento desse contrato com o seu fornecedor R........... a origem dos problemas que agora lhe estão a ser levantados pela Administração; // 5. Os factos foram, aliás, referidos ao agente da inspeção, que, no entanto, os ignorou e os omitiu do relatório: // i. A qualidade do leite fornecido pela R........... nunca foi boa, mas tornar-se-ia especialmente má a partir de 1999, degradando-se definitivamente nos anos de 2000, 2001, 2002 e 2003 (até 21 de Agosto deste último ano, data em que a reclamante rompeu o contrato de fornecimento e interpôs uma acção judicial de indemnização que ainda decorre nos Tribunais); // ii. As consequências de tal falta de qualidade ficaram, no entanto, bem gravadas no património da reclamante: cerca de 40 toneladas de queijo impróprio para consumo que se fora acumulando (e que, até à realização duma peritagem destinada a apresentar em Tribunal, a reclamante conservou em armazém especialmente refrigerado para o efeito, e hoje se encontra nesse mesmo armazém e noutros locais, em adiantado estado de putrefacção); // iii. É esse queijo impróprio para consumo que, desde então, inflaciona o inventário das existências;(…)».(Alínea K), do probatório). iii) Em 12/02/2010, no âmbito do procedimento de revisão da matéria tributável, «[a]bordou-se também a questão dos fornecedores de leite e os problemas originados com o seu fornecimento à alguns anos atrás (entre 1999 e 2003) levando a empresa a produzir queijo de qualidade inferior em que não foi possível a sua venda, e consequentemente, veio a influenciar os stocks de produtos acabados, desde essa data. // A empresa não deu qualquer tratamento contabilístico a essas ocorrências, nem foram apresentadas na reunião quaisquer dados objetivos. No entanto o perito do contribuinte referiu que a não relevação contabilística foi uma opção da empresa, isto porque o registo na contabilidade iria agravar os prejuízos e colocaria a empresa em dificuldades adicionais na obtenção de financiamento. Dada a não apresentação de elementos concretos relativos ao processo judicial, o perito do contribuinte disponibilizou-se ao fazelo numa próxima reunião a marcar» 4 (…)».(Alínea L), do probatório). iv) Na reunião de 18/02/2020 o perito da Impugnante juntou cópia de uma sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Pinhel, em 18/08/2007, no âmbito do processo 12/04.5TBPNH, cujo teor aqui se dá como reproduzido e do qual se destaca o seguinte: // «(…) // A reunião havia sido suspensa para o perito da empresa apresentar elementos concretos relativos à justificação de produtos acabados sem qualidade que estão a influenciar os stocks, e, que no pedido de revisão quantifica quer em peso (42.000Kgs) quer em valor (€180.303,00), constantes do processo judicial. // Os elementos apresentados foram apenas a sentença do Tribunal Judicial de Pinhel de 18/05/2007 em que a empresa é a Ré e a autora da acção foi a empresa fornecedora de leite R........... – recolha de Leite da Beira Interior, Lda., da qual é sócia. Segundo informou na sentença não se encontra aquilo que o perito da Fazenda pretende ver justificado-stocks de produtos acabados deteriorados. O valor da indeminização pedida, €815.269,20, incluía despesas adicionais no tratamento de leite; leite fornecido com rendibilidade inferior na produção de queijo; produto acabado com tempo de conservação inferior» (Alínea M), do probatório). v) Na reunião de 18/02/2020 o perito da Impugnante juntou cópia de uma sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Pinhel, em 18/08/2007, no âmbito do processo 12/04.5TBPNH, cujo teor aqui se dá como reproduzido (Alínea N), do probatório). vi) Em 09/04/2010 a Impugnante expediu, com destino ao Aterro de Resíduos Não perigosos de Castelo Branco, um contentor de resíduos composto por 13.700 kg de queijo flamengo, prato, ovelha e mistura de cabra, impróprios para consumo (Alínea S), do probatório). vii) Em 26/04/2010 a Impugnante expediu, com destino ao Aterro de Resíduos Não perigosos de Castelo Branco, um contentor de resíduos composto por 2.960 kg de queijo flamengo, prato, ovelha e mistura de cabra, impróprios para consumo (Alínea T), do probatório). viii) Em 31/03/2010 a Impugnante expediu, com destino ao Aterro de Resíduos Não perigosos de Castelo Branco, um contentor de resíduos composto por 10.280 kg de queijo prato impróprio para consumo (Alínea U), do probatório). ix) O maior fornecedor de leite da Impugnante era a R........... (Alínea V), do probatório). x) A qualidade do leite fornecido pela R........... degradou-se nos anos de 2000 a 2003 (Alínea W), do probatório). xi) A quase totalidade do queijo impróprio para consumo, referido nas alíneas S), T) e U) que antecedem, foi produzido com o leite fornecido pela R........... durante os anos de 2000 a 2003 (Alínea X), do probatório). xii) A Impugnante conservou e armazenou o queijo impróprio para consumo com vista a fazer prova de prejuízos causados pela má qualidade do leite fornecido pela R........... (Alínea Y), do probatório). xiii) No decurso dos atos de inspeção, a Impugnante solicitou ao inspetor tributário que verificasse a existência do queijo deteriorado (Alínea Z), do probatório). xiv) Mais se refere que as testemunhas inquiridas nos autos afirmaram que, seja o volume de queijo referido na alínea Z), seja os métodos artesanais de fabrico do queijo e de operação da empresa, com elevados custos com o pessoal, justificam, em parte, os resultados negativos obtidos (Alínea BB), do probatório). O alegado erro na apreciação da matéria de facto em que terá incorrido a sentença não se comprova. A sentença considerou que, perante a informação prestada pela recorrida aos serviços da recorrente de que existe queijo, em quantidades consideráveis, nos armazéns frigoríficos da recorrida, o qual resultou da baixa qualidade do leite adquirido à R..........., a recorrente não observou o dever de diligenciar pelo apuramento dos factos relevantes ao esclarecimento da situação fiscal e contabilística da contribuinte, em análise. Mais se refere que dos elementos coligidos no probatório resulta que a asserção de que a recorrida não juntou elementos probatórios e alegatórios que remetem para a existência de queijo impróprio para consumo, em quantidades consideráveis, armazenado nas instalações da recorrida e cuja relevação contabilística se repercute na contabilidade, justificando os resultados obtidos, não corresponde à realidade, como o demostram os elementos acima recenseados. Nos termos dos artigos 58.º da LGT e 6.º do RCPITA, a Administração Tributária deve realizar todas as diligências necessárias com vista à descoberta da verdade material, pelo que, perante a informação, prestada pela contribuinte, de que existem quantidades significativas de mercadoria em situação de deterioração e, por isso, não comercializáveis, cabia à AT, no âmbito do procedimento inspectivo e depois, no âmbito do procedimento de revisão da matéria colectável, realizar as diligências necessárias à descoberta da verdade sobre os factos em referência. A situação de que se trata de facto favorável à recorrida não preclude o raciocínio em causa. Por um lado, a recorrida invoca como motivos para o não relevamento contabilístico do armazenamento do queijo em referência razões de financiamento e razões comerciais; por outro lado, o armazenamento de tal mercadoria parece dever-se, sobretudo, ao litígio que a recorrida mantinha com o fornecedor do leite referido. Ao julgar no sentido referido, a sentença sob recurso não incorreu no erro de apreciação que lhe foi apontado, pelo que deve ser confirmada, nesta parte. 2.2.3. No que respeita ao fundamento do recurso referido em iii), a recorrente invoca que o segmento decisório em causa realizou uma verdadeira inversão do ónus da prova; mais refere que a descoberta da verdade material é transversal a todos os intervenientes processuais, não sendo um dever exclusivo da AT. Quer isto dizer, que não é apenas sobre a AT que recai o dever de efetuar todas as diligências para chegar à verdade material, mas sim sobre todas as partes processuais, in casu, sobre a impugnante; que «o nº 3 do artigo 74º da LGT que é sobre o sujeito passivo que recai o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação e não tendo a impugnante efetuado tal prova, sendo certo que tinha ao seu total alcance, as condições e os meios para a poder produzir, impõe-se concluir que a impugnante violou o principio da descoberta da verdade material, porquanto, o ónus probatório a que se reporta o nº 3 do artigo 74º da LGT, tem também ínsito na sua ratio a descoberta da verdade material» Apreciação. Está em causa a avaliação indirecta com fundamento no disposto no artigo 87.º/1/b) e e), da LGT. O preceito do artigo 74.º, n.º 1, da LGT determina que «[o] ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque». E o n.º 3 do mesmo artigo estabelece que, no caso de «determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação» (n.º 3). A este propósito, são pontos firmes os seguintes: (i) «Recorrendo a AT a métodos indirectos para determinar o lucro tributável do contribuinte, compete-lhe demonstrar que se encontram verificados os pressupostos legais que permitem a tributação com recurso a tais métodos. Após efectuada essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação (art. 74.º n.º 3 da LGT). // Para demonstrar o excesso de tributação não basta ao contribuinte suscitar dúvidas quanto ao método utilizado para comprovar o excesso na quantificação».16 (ii) Demonstrada que esteja a legalidade do recurso a métodos indiretos de avaliação da matéria tributável, cabe ao contribuinte concretamente demonstrar o erro ou o excesso de quantificação, não sendo suficiente meras alegações abrangentes e não concretamente densificadas quanto à inadequação do critério de quantificação utilizado pela AT».17 Não se apura a ocorrência de inversão dos ónus da prova, em matéria de impugnação do acto tributário, assente na avaliação indirecta da matéria colectável. O que consta da sentença recorrida é a asserção de que a Administração Fiscal, no apuramento da matéria colectável, não diligenciou pelo esclarecimento da situação do queijo impróprio para consumo, armazenado pela recorrida, tendo sido advertida da sua existência. Se é verdade que, uma vez preenchidos os pressupostos do recurso à avaliação indirecta, recai sobre o contribuinte o ónus da prova do excesso ou erro na quantificação, não menos verdadeira é asserção de que a Administração Fiscal não pode proceder à referida quantificação sem relevar factos alegados e comprovados no procedimento tributário, cujo impacto na determinação da matéria colectável não é objecto de dissídio entre as partes. Tendo presente o dever que recai sobre a AT de, no âmbito da quantificação da matéria colectável presuntiva, ter em conta os elementos que permitem a sua aproximação à realidade, as quantidades do queijo em apreço não podem deixar de ser avaliadas e ponderadas, no quadro da referida quantificação. A Administração Tributária está sujeita ao dever de esclarecimento da situação material relevante à quantificação da referida matéria colectável (artigo 85.º/1 e 2, da LGT). Por conseguinte, não existe inversão dos ónus da prova, previstos no preceito do artigo 74.º, n.º 3, da LGT, mas antes o reconhecimento da função de garantia da legalidade (e da conformidade dos pressupostos de facto) que assiste ao órgão que pratica o acto tributário sob escrutínio. Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu no erro de julgamento que lhe é apontado, pelo que deve ser mantida, nesta parte. _________________________ 16 Acórdão do TCAS, 16-05-2024, P. 318/08.4BELRS No mesmo sentido, v. Acórdão do STA, de 16-11- 2011, P. 0247/11 17 Acórdão do TCAS, de 15-02-2024, P. 35/09.8 BECTB. No mesmo sentido, v. Acórdão do STA, de 16- 11-2011, P. 0247/11 e Acórdão do TCAS, 16-05-2024, P. 318/08.4BELRS. Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso. 2.2.4. No que respeita ao fundamento do recurso referido em iv), a recorrente invoca que a sentença em crise olvidou a falta de prova do excesso na quantificação da matéria colectável, bem como incorreu na preterição do princípio da igualdade das partes, dado que apenas teve em consideração a versão dos factos apresentada nos autos pela impugnante. Apreciação. A este propósito, são pontos firmes os seguintes: (i) «Em caso de litígio entre o contribuinte e a Administração Tributária quanto ao critério eleito e aos resultados deste, cabe ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação ao caso concreto, isto é, aferir se o “critério presuntivo eleito” se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza se mostra comprovada pelos factos apurados»18. (ii) «[A]inda que a AT esteja legitimada a recorrer aos métodos indirectos para a fixação da matéria tributável, na respectiva decisão tem de indicar qual o critério que utilizou para a quantificação, o qual, devendo constituir um modo adequado de aproximação à realidade, tem de apresentar-se como adequado e racionalmente justificado»19. No caso em exame, a alegada preterição do princípio da igualdade das partes não se apura. O mesmo é válido em relação à preterição do ónus da prova, a cargo da impugnante, de demonstração do erro ou excesso na quantificação. Sem embargo, a questão que se coloca nos autos, não reside no incumprimento do ónus da prova em apreço (questão que não foi apreciada na sentença). Também não se verificou o alegado enviesamento da sentença em relação à versão fáctico-jurídica oferecida pela impugnante. O que sucedeu, no caso, foi a constatação da omissão da diligência necessária à descoberta da verdade material, relacionada com a vistoria, a pesagem e a análise do queijo em referência, por parte da Administração Tributária, desatendendo os apelos que lhe foram dirigidos pela recorrida. Omissão ocorrida no decurso do procedimento inspectivo e no decurso do procedimento de revisão, no quadro dos quais, os poderes-deveres de instrução dos factos relevantes, a cargo da Administração Tributária, encontram expressa consagração legal (artigos 6.º20 e 29.º21 do RCPITA e artigos 58.º22 da LGT e 50.º23 do CPPT). A preterição da formalidade em apreço determina a anulação do acto tributário, dado o seu carácter essencial à descoberta da realidade em apreço. _______________________________ 18 Acórdão do TCAS, 05.09.2019; P. 454/04.6BESNT. No mesmo sentido, v. Acórdão do STA, de 19/11/2014, P. 0407/12 19 Acórdão do STA, de 24/02/2016, P. 0329/14. No mesmo sentido, v. Acórdão do STA, de 19/11/2014, P. 0407/12. 20 “Princípio da verdade material”. 21 “Prerrogativas da inspecção tributária”. 22 “Princípio do inquisitório”. 23 “Meios de prova”. Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu no erro de julgamento que lhe foi assacado. Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.» (fim de transcrição). Concordando inteiramente com a jurisprudência citada, a qual acolhemos, por semelhança ao caso sub judice e por economia de meios, também este Tribunal entende que se verifica a omissão da diligência necessária à descoberta da verdade material, no decurso do procedimento inspetivo e do procedimento de revisão, por parte da Administração Tributária, no âmbito dos quais se integram os poderes-deveres de instrução dos factos relevantes, a cargo da Administração Tributária, os quais encontram expressa consagração legal (artigos 6.º20 e 29.º21 do RCPITA e artigos 58.º22 da LGT e 50.º23 do CPPT). A preterição da formalidade em apreço determina a anulação do ato tributário, dado o seu carácter essencial à descoberta da realidade em apreço. Tanto vale para concluir que a sentença que assim decidiu não incorreu em erro de julgamento e, como tal, tem de se manter. * III. Decisão Face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida. Custas pela Recorrente (artigo 527º do CPC). Registe e notifique. Lisboa, 10 de outubro de 2024. ---------------------------------- [Maria da Luz Cardoso] ---------------------------------- [Teresa Costa Alemão] ------------------------------ [Sara Diegas Loureiro] |