Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2170/23.0BELSB-S2 |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 08/23/2024 |
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Relator: | ANA CRISTINA LAMEIRA |
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Descritores: | INTERESSE EM AGIR ADJUDICAÇÃO POR LOTES |
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Sumário: | i. In casu, a procedência da acção quanto aos lotes 4 e 7 alteraria a 1ª posição (segundo a versão da Recorrente), e manter-se-ia a ordenação da 2ª (Flora Garden) e 3ª (da Autora). Todavia, no presente contexto, já não poderiam ser atribuídos à 2ª classificada aqueles lotes uma vez que se conformou com os lotes que lhe foram atribuídos – 5 e 6 – não impugnados. II. Além de que, de acordo com as normas procedimentais consagradas na Cláusula 21ª, n.º 5 do Programa do Procedimento, se a presente acção viesse a obter sucesso, ter-se-ia apenas de “arrumar a casa” quanto aos lotes 3, 4 e 7, sendo, para o que aqui releva, inócua a circunstância de a proposta da Flora Garden, ter ficado classificada em 2º lugar quanto aos lotes 4 e 7. Porquanto, para além de não ter sido apontada qualquer ilegalidade à sua adjudicação aos lotes 5 e 6, que se encontram em execução, também por via da proibição de adjudicação de mais de dois lotes a cada concorrente ter-se-á de aplicar não só a Cláusula 21ª, n.º 5, alíneas a) e b) do Programa do Procedimento, como a Cláusula 21ª, n.º 5, alínea c) do mesmo Programa, ficando por isso impedida de “nova adjudicação” de mais 2 lotes. III. Neste contexto, o interesse da Recorrente/Autora quanto à impugnação dos lotes 4 e 7 advém de que afastada a adjudicatária (1º lugar) a que lhe sucederia, está impedida, nesta fase, de lhe virem a ser adjudicados tais lotes – consolidação dos actos de adjudicação dos lotes 5 e 6, que se encontram arredados do objecto impugnatório. Nem tendo a Recorrente/Autora interesse na respectiva impugnação, na medida em que não lhe poderiam ser adjudicados. |
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Votação: | Unanimidade |
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Indicações Eventuais: | Subsecção de CONTRATOS PÚBLICOS |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul (Subsecção de Contratos Públicos) I.1 RELATÓRIO O presente recurso vem interposto da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa – Juízo de Contratos Públicos, constante do Despacho Saneador proferido em 08.02.2024, através do qual o Tribunal a quo decidiu julgar procedente a excepção de falta de interesse em agir invocada pela P..., Lda. (P.../Contra-interessada) e, com esse fundamento, absolveu da correspondente instância o Município de Oeiras (Entidade Demandada) e aquela Contra-interessada. Na presente acção formulou a M..., S.A. (Autora) os seguintes pedidos: “(…) Deverá a presente ação ser julgada procedente e provada e, em consequência: (i) ser anulada a decisão proferida pela Câmara Municipal de Oeiras em 31.05.2023, pela qual aquele órgão deliberou a adjudicação da proposta da A... no Lote 3 e das propostas da P... nos Lotes 4 e 7 do Concurso; (ii) serem anulados os contratos que já tenham eventualmente sido celebrados entre a Entidade Demandada, a A... e a P... para os Lotes 3, 4 e 7 do Concurso, na sequência da decisão de adjudicação referida na alínea anterior; e (iii) ser a Entidade Demandada condenada na prática do ato devido, que consiste na adjudicação das propostas apresentadas pela M... nos Lotes 3, 4 e 7 do Concurso, procedendo-se subsequentemente à celebração dos correspondentes contratos entre o Município de Oeiras e a Autora”. Indicou como contra-interessadas: A..., S.A., e P..., Lda. No presente recurso a Recorrente/Autora termina a sua Alegação formulando as seguintes conclusões: “A) O presente Recurso vem interposto do Despacho Saneador de 08.02.2024, na parte em que o TAC de Lisboa determinou a absolvição do Município de Oeiras e da P... da instância, relativamente aos pedidos formulados em relação aos Lotes 4 e 7 do Concurso, por ter julgado procedente a exceção de interesse em agir da M... quanto a esses pedidos; B) Em primeiro lugar, as normas procedimentais em causa – consagradas no artigo 21.º, n.º 5 do Programa do Concurso –, que impedem que um mesmo concorrente seja adjudicatário em mais do que dois lotes e estabelecem regras de repartição dos lotes caso uma só empresa veja a sua proposta ordenada em primeiro lugar para efeitos de adjudicação, só vinculam a entidade adjudicante, na tomada da decisão de adjudicação, não vinculando os concorrentes e não podendo validamente condicionar (até sob pena de ilegalidade ou mesmo inconstitucionalidade), o exercício do direito de ação por parte destes; C) Tais normas não impedem que a M... impugne a adjudicação de mais do que dois lotes (como o Tribunal a quo aceitou), nem impõem a impugnação da adjudicação de todos os lotes do Concurso, seja essa adjudicação (dos demais lotes) legal ou ilegal, lesiva ou inócua; D) Tendo sido atribuídos à F... os Lotes 5 e 6 do Concurso, e não tendo tais decisões de adjudicação sido postas em causa, a F...já obteve o máximo de dois lotes que lhe era procedimentalmente permitido executar, pelo que, independentemente do desfecho da presente ação, tem de se considerar arredada dos Lotes 4 e 7 do Concurso, não podendo a F... vir posteriormente a reclamar a adjudicação destes Lotes; E) A partir do momento em que decorreu o prazo de um mês previsto no artigo 101.º do CPTA e só a M... impugnou as decisões de adjudicação (apenas dos Lotes 3, 4 e 7 do Concurso), todos os demais lotes ficaram estabilizados, não podendo depois haver lugar a qualquer reordenação posterior, por parte dos demais concorrentes; F) E, no caso concreto, na prática, há uma razão adicional para isso ser assim, uma vez que a adjudicação dos Lotes 3, 4 e 7 do Concurso se encontra paralisada, ao contrário do que sucede quanto aos demais lotes do Concurso (cujos contratos foram celebrados e se encontram já a ser executados), o que significa que, quando a decisão final proferida neste processo transitar em julgado, provavelmente os restantes contratos terão sido concluídos; G) Assim, o Despacho Saneador recorrido, por um lado, erra na parte em aplica nesta sede uma norma procedimental de reordenação de lotes que só se aplicava à decisão inicial de adjudicação por parte do Município de Oeiras (mas que não tem a virtualidade de, na sequência da anulação da adjudicação de um ou mais lotes, determinar a reordenação dos demais lotes, incluindo daqueles cujas adjudicações já se consolidaram); H) Por outro lado, o Despacho Saneador erra ainda quando desconsidera que a mencionada norma procedimental, no caso concreto, só será chamada a aplicar-se num momento em que a situação relativa aos demais contratos estará, no plano dos factos, totalmente consumada; I) No pressuposto da procedência dos pedidos, ou se admite que, na sequência da anulação das adjudicações dos Lotes 4 e 7, a F... possa vir pretender alcandorar-se à posição de adjudicatária (violando a norma procedimental que impede um mesmo concorrente de ser adjudicatário em mais do que dois lotes), ou se recusa essa possibilidade (caso em que se negou interesse em agir à M... com base numa circunstância que sabe que não irá ocorrer); J) O Programa do Concurso não estabelecia qualquer hierarquia nem fornecia qualquer indicação no sentido da prevalência de uma determinada norma sobre quaisquer outras, pelo que a atribuição dos dois lotes com maior área ao mesmo concorrente não pode derrogar o limite de nenhum concorrente poder ser adjudicatário em mais do que dois lotes; K) Acresce que não pode excluir-se desde já que, quando do trânsito em julgado da sentença (o que desconhece quando ocorrerá), a F...não pretenda ou não esteja em condições de executar os contratos relativos aos Lotes 4 e 7, ou que o Município de Oeiras possa vir a invocar a existência de um prejuízo excecional para o interesse público; L) Como o cenário da adjudicação dos Lotes 4 e 7 à F... só se coloca no pressuposto da procedência do pedido impugnatório deduzido contra a adjudicação das propostas da P..., o que está em causa é a constatação antecipada, pelo Tribunal a quo, de uma circunstância que obstará à satisfação dos interesses do autor, determinando uma modificação objetiva do processo, nos termos dos artigos 45.º e 45.º-A do CPTA; M) Esta é, de resto, a única interpretação admissível à luz do Direito da União Europeia – maxime, da “Diretiva Recursos” –, a que o legislador e os tribunais Portugueses estão vinculados, sendo também a interpretação mais conforme aos princípios da tutela jurisdicional efetiva (artigos 20.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4 da Constituição e 2.º, n.º 1 do CPTA) e pro actionae (artigo 7.º do CPTA); N) A norma do Concurso que determinava a redistribuição dos lotes para que cada concorrente (que só pode ser adjudicatário em dois lotes, no máximo) ficasse com os lotes com maior área só se aplicava à própria decisão originária de adjudicação a proferir pelo Município de Oeiras, não sendo aqui aplicável; O) Em qualquer caso, não pode ter com o sentido e alcance que lhe foi dado pelo Tribunal a quo no Despacho Saneador recorrido, até sob pena de permitir pôr em causa a ordenação de propostas em lotes cuja adjudicação não foi impugnada e já se estabilizou no ordenamento jurídico, e de permitir que um concorrente possa, a final, vir a ser adjudicatário em mais do que dois lotes; P) As normas procedimentais em causa não têm por efeito retirar à M... o interesse em agir na impugnação das decisões de adjudicação de propostas que ficaram ordenadas em lugar superior ao seu, não obstando ao conhecimento do próprio mérito do pedido anulatório das adjudicações proferidas pelo Município de Oeiras nos Lotes 4 e 7 do Concurso; Q) O Despacho Saneador de 08.02.2023 é assim ilegal, por erro de julgamento e violação de lei, pelo que deve ser revogado por este Tribunal Superior e substituído por Acórdão que determine o prosseguimento da ação para o conhecimento do mérito do pedido de anulação das decisões de adjudicação das propostas da P... proferidas pela Câmara Municipal de Oeiras nos Lotes 4 e 7 do Concurso, bem como do mérito do pedido condenatório formulado nessa sequência, o que se requer; R) Deverá ainda ser determinada a dispensa integral do pagamento do remanescente da taxa de justiça, em virtude de estarem preenchidos os pressupostos para esse efeito estabelecidos no artigo 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais, por o processo não revestir especial complexidade (estando apenas em causa uma única questão processual, decidida logo no despacho saneador) e a conduta das partes não ter dado azo a qualquer incidente anómalo”. Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, sendo o Despacho Saneador de 08.02.2024, revogado na parte em que determinou a absolvição da Entidade Demandada e da Contra-interessada da instância do que respeita à anulação das decisões de adjudicação proferidas pela Câmara Municipal de Oeiras nos lotes 4 e 7 do concurso sub iudice. * A Entidade Demandada, Município de Oeiras, ora Recorrida, em sede de contra-alegações formulou as seguintes Conclusões, que se transcrevem:A. O presente litígio tem designadamente por objeto a impugnação da decisão de adjudicação relativamente aos Lotes 4 e 7 e a condenação de adjudicação das propostas da Recorrente para esses mesmo lotes. B. As propostas apresentadas pela Recorrente para os Lotes 4 e 7 ficaram classificadas em 3º lugar. C. A Cláusula 21ª, n.º 5, alíneas a), b) e c) do Programa do Procedimento estabelece, em regra, que não podem ser adjudicadas mais de dois lotes a cada concorrente, os Lotes 6 e 7 não podem ser adjudicados ao mesmo concorrente e, por fim, que sendo adjudicados mais de dois Lotes ao mesmo concorrente, este tem direito à adjudicação das propostas apresentadas nos Lotes com a maior área de intervenção (cfr. Facto Provado 2)). D. Os Lotes com maior área de intervenção são, por ordem decrescente, os seguintes: Lotes 7, 6, 4, 5, 2, 1 e 3 (cfr. Facto Provado 4)). E. Durante a fase procedimental, foram adjudicadas as propostas da Concorrente F... para os Lotes 5 e 6. F. As propostas da Concorrente F... para os Lotes 4 e 7 ficaram classificadas em 2º lugar. G. Consequentemente, como se decidiu no Saneador Recorrido, se a presente ação fosse julgada procedente, e, em consequência, fosse anulada a decisão de adjudicação referente aos Lotes 4 e 7, tais lotes deveriam ser adjudicados à Concorrente F... e não à Recorrente. H. É assim, em virtude de o Lote 7 ser maior do que o Lote 6 e do Lote 4 ser maior do que o Lote 5. I. E, nesse caso, a circunstância de as propostas da Concorrente F... terem sido adjudicadas para os Lotes 5 e 6 não obstaria à adjudicação das suas propostas para os Lotes 4 e 7, pois, como bem observa o Tribunal a quo, aquela primeira adjudicação padeceria de uma invalidade. J. Consequentemente, a Recorrente não tem interesse em agir, porquanto não obterá qualquer vantagem na sua esfera jurídica com a presente ação. K. Por sua vez, a Recorrente entende que a Cláusula 21ª, n.º 5, alínea c) do Programa do Procedimento só vinculam a entidade adjudicante na tomada de decisão de adjudicação e não o Tribunal no âmbito de uma impugnação de um concurso. L. Nessa medida, no entender da Recorrente, em caso de procedência da presente ação devem ser adjudicadas as suas propostas para os Lotes 4 e 7, porquanto as propostas da F... já foram adjudicadas para os Lotes 5 e 6 e não é permitida a adjudicação em mais de dois Lotes para cada concorrente. M. Constata-se, assim, que, na verdade, a Recorrente pretende que sejam aplicadas as alínea a) e b) da Cláusula 21ª, n.º 5 do Programa do Procedimento, mas desaplicada a respetiva alínea c) do n.º 5 da mesma cláusula. N. Todavia, ao invés do alegado pela Recorrente, o Programa do Procedimento é um regulamento administrativo que vincula a Recorrida, os operadores económicos (e, por isso, a Recorrente) e os próprios Tribunais enquanto aplicadores do direito (e, por isso, de todos os atos normativos). O. Neste sentido, (toda) a Cláusula 21ª, n.º 5 do Programa do Procedimento é também naturalmente aplicável em sede jurisdicional. P. Ainda que assim não fosse – isto é, que, no limite – se considerasse que as normas procedimentais não vinculam o Tribunal – mesmo nesse cenário deveriam ser adjudicadas as propostas da Concorrente F... para os Lotes 4 e 7 em caso de procedência da presente ação, pois ficaram à frente das propostas da Recorrente e, nesse caso, também não se aplicaria a proibição de adjudicação de mais de lotes para cada concorrente. Q. A Cláusula 21ª, n.º 5 do Programa do Procedimento não contempla uma estatuição normativa que condiciona ilegalmente o exercício do direito de ação. R. A Recorrente poderia ter sindicado a decisão de adjudicação dos Lotes 4 e 7, conquanto também tivesse impugnado as propostas classificadas em 2º lugar nesses mesmos lotes. S. Esta é uma condição necessária para preencher o pressuposto inominado do interesse em agir, pois só assim a Recorrente obteria uma utilidade/vantagem com a presente ação. T. Trata-se, no fundo, de uma situação congénere da situação em que um concorrente classificado em 3º lugar pretende ver a sua proposta adjudicada em determinado concurso. U. Para o efeito, esse concorrente necessita de impugnar a decisão de adjudicação e a decisão relativa ao 2º classificado (Ac. do TCAS, Proc. 2174/18.5 BELSB, de 23 de março de 2023). V. O conhecido “Acórdão Lombardi” não é transponível para o caso concreto e, nessa medida, o Saneador Recorrido não colide com invocada jurisprudência do TJUE. W. O entendimento sufragado pelo Saneador Recorrido, encontra-se, inclusivamente, em linha com a jurisprudência, nacional e europeia, mais recentemente veiculada nesta matéria (Ac. do STA, Proc. n. os 0648/20.7BELRA, de 23 de junho de 2022, 0927/20.3BELRA, de 30 de junho de 2022 e 0193/21.3BELRA, de 23 de junho de 2022 e o Despacho de 17 de maio de 2022, proferido no Proc. C-787/21). X. Por último, a Recorrida adere, na íntegra, ao pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça formulado pela Recorrente. * Por seu turno, a Contra-Interessada, P... ora Recorrida nas suas Contra-Alegações não tendo formulado conclusões, concluiu assim: “Em suma, de acordo com as regras aplicáveis ao procedimento, que vinculam a Entidade Adjudicante, os operadores económicos e o Tribunal na aplicação do direito, a Autora, ora Recorrente, ainda que o tribunal julgasse procedentes os fundamentos da impugnação da decisão de adjudicação dos lotes 4 e 7, que radicam na ilegalidade da admissão da proposta da Contrainteressada P..., não teria direito a ver a sua proposta a tais lotes adjudicada. Isto porque, como vimos, seria sempre a concorrente F..., cuja proposta ficou ordenada em 2.º lugar, à frente da proposta da Autora, ora Recorrente, a ter direito à adjudicação de tais lotes. A Autora poderia, isso sim, almejar a adjudicação do Lote 6, que fora adjudicado à F..., na medida em que a aplicação das regras fixadas no programa do procedimento assim o determinava, caso a proposta da Contrainteressada viesse a ser excluída. Contudo, a Autora não impugnou a decisão de adjudicação desse lote 6, optando por impugnar apenas a decisão de adjudicação dos lotes 4 e7, que, de acordo com as regras do procedimento, nunca lhe poderiam ser adjudicados. Significa isto que, de facto, carece a Autora, ora Recorrente, de interesse em agir para tal impugnação, pois nenhuma utilidade ou vantagem direta poderá resultar da sua eventual procedência para a sua esfera jurídica.: E ao contrário do que sustenta, um pouco em desespero, a Recorrente a questão não se coloca no plano de uma eventual impossibilidade jurídica de execução de uma sentença que viesse a anular a decisão de adjudicação dos Lotes 4 e 7 à Contrainteressada P... com fundamento na ilegalidade da admissão da sua proposta. O problema não reside na impossibilidade jurídica de adjudicar os lotes 4 e 7 à proposta da F..., por esta ter sido já beneficiária da adjudicação dos Lotes 5 e 6. A questão é que, a montante desse momento, a Autora não poder ser beneficiária da adjudicação dos lotes que impugna nos autos, porque não se pode, evidentemente, afastar as regras procedimentais aplicáveis apenas para seu benefício, de modo a propiciar-lhe a adjudicação de lotes mais vantajosos, a que não teria direito. E não podendo em resultado da procedência da pretensão processual que efetivamente deduz alcançar qualquer benefício, não lhe pode ser reconhecido interesse processual ou interesse em agir. Andou, pois, muito bem o despacho saneador recorrido ao concluir “pela falta de interesse em agir da Autora, quanto aos lotes 4 e 7, pois que tendo ficado classificada em terceiro lugar, e não sendo possível afastar a segunda classificada, nomeadamente porque em virtude da aplicação das normas concursais seriam estes os lotes a adjudicação a esta segunda classificada, forçoso é concluir pela procedência da exceção.” Em face do exposto, é inevitável concluir que a decisão recorrida não padece dos erros de julgamento que lhe são imputados pela Autora, ora Recorrente, tendo decidido bem ao julgar procedente a exceção dilatória de falta de interesse em agir quanto à impugnação da adjudicação dos Lotes 4 e 7, devendo, como tal ser confirmada por este Venerando Tribunal de apelação. * Todos os envolvidos aderiram ao pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça deduzido pela Recorrente.* Neste Tribunal Central Administrativo, o DMMP, notificado nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 146.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, não se pronunciou.* * I.2 DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/DAS QUESTÕES A DECIDIR Na fase de recurso o que importa é apreciar se a decisão (sentença) proferida deve ser mantida, alterada ou revogada, circunscrevendo-se as questões a apreciar em sede de recurso, à luz das disposições conjugadas dos artigos 144º nº 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do Código de Processo Civil (CPC) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, às que integram o objecto do recurso tal como o mesmo foi delimitado pelo recorrente nas suas alegações, mais concretamente nas suas respetivas conclusões (sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso) e simultaneamente balizadas pelas questões que haviam já sido submetidas ao Tribunal a quo (vide, neste sentido António Santos Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, págs. 119 e 156). Em face dos termos em que foram formuladas as respectivas conclusões de recurso, a questão essencial a resolver incide em aferir se deve ou não ser reconhecida à M... (Recorrente/Autora) interesse em agir para formular os pedidos de anulação da adjudicação das propostas apresentadas pela P... nos Lotes 4 e 7 do Concurso Público em causa nestes autos. * II. FUNDAMENTAÇÃO II.1 DE FACTO Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos, que se reproduzem: 1. Em 07 de novembro de 2022, foi publicado na II Série do Diário da República, o Anúncio de procedimento n.º 14243/2022, pelo qual foi publicitada a abertura de concurso público com publicidade internacional, designado por “2022/1383 DAQV - Serviços de manutenção de espaços verdes no Concelho de Oeiras - 7 lotes” – cfr. documento n.º 4, junto com a petição inicial; 2. Do programa do procedimento do concurso público com publicidade internacional, designado por 2022/1383 DAQV, consta, designadamente, o seguinte: “CAPÍTULO I - Disposições gerais Cláusula 1.ª Objeto do Concurso 1. O presente concurso público com publicidade internacional tem por objeto a aquisição, por divisão em lotes, da prestação de serviços de manutenção dos espaços verdes do concelho de Oeiras, de acordo com as condições definidas no caderno de encargos, correspondendo um contrato a cada um dos seguintes Lotes: a. Lote 1 – OEIRAS POENTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da zona Poente da Freguesia de Oeiras e São Julião da Barra, identificados no Anexo IV do Caderno de Encargos, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III do Caderno de Encargos; b. Lote 2 – OEIRAS NASCENTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da zona Nascente da Freguesia de Oeiras e São Julião da Barra, identificados no Anexo IV do Caderno de Encargos, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III do Caderno de Encargos; c. Lote 3 – OEIRAS OCIDENTAL NORTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da Freguesia de Porto Salvo, identificados no Anexo IV do Caderno de Encargos, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III do Caderno de Encargos; d. Lote 4 – OEIRAS CENTRAL SUL – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento das Freguesias de Paço de Arcos e Caxias, identificados no Anexo IV do Caderno de Encargos, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III do Caderno de Encargos; e. Lote 5 – OEIRAS CENTRAL NORTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da Freguesia de Barcarena, identificados no Anexo IV do Caderno de Encargos, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III do Caderno de Encargos; f. Lote 6 – OEIRAS ORIENTAL SUL – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento das Freguesias de Algés, Cruz Quebrada e Linda-a-Velha, identificados no Anexo IV do Caderno de Encargos, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III do Caderno de Encargos; g. Lote 7 – OEIRAS ORIENTAL NORTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento das Freguesias de Carnaxide e Queijas, identificados no Anexo IV do Caderno de Encargos, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III do Caderno de Encargos. (…) Cláusula 19.ª Critério de adjudicação Em cada lote / lotes a adjudicação é feita segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, na modalidade multifator prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º do CCP, tendo em conta os seguintes fatores e respetivos coeficientes: A) Preço – 40 % B) Funcionários afetos ao contrato de manutenção – 30% C) Sustentabilidade ambiental e eficiência dos Meios Mecânicos, Máquinas e Equipamentos afetos ao contrato – 30% (…) Cláusula 21.ª Adjudicação (…) 5. A adjudicação por lotes será efetuada nos seguintes termos: a) Não poderão ser adjudicados mais de 2 (dois) lotes a cada concorrente, exceto se, nos vários Lotes, os concorrentes admitidos sejam em número insuficiente para fazer cumprir esta regra. b) Os Lotes 6 e 7 não poderão ser adjudicados ao mesmo concorrente, exceto se tiver sido admitido unicamente o mesmo concorrente em ambos os Lotes; c) Caso tenha sido adjudicado mais do que 2 Lotes ao mesmo concorrente, este terá direito à adjudicação das propostas apresentadas nos Lotes com a maior área de intervenção, em cumprimento com a alínea anterior, sendo os restantes lotes adjudicados à proposta classificada no lugar imediatamente a seguir. d) Nos termos da alínea a), a adjudicação de mais do que dois Lotes ao mesmo concorrente ocorrerão da seguinte forma: i. No caso de haver mais do que 1 concorrente admitidos, a adjudicação dos Lotes sobrantes será feita alternadamente pelos concorrentes segundo o critério dos Lotes com a maior área de intervenção ainda por adjudicar, iniciando-se pelo concorrente que ficou melhor classificado no conjunto dos 7 Lotes. (…)” – cfr. documento n.º 5, junto com a petição inicial; 3. Do caderno de encargos do concurso público com publicidade internacional, designado por 2022/1383 DAQV, consta, designadamente, o seguinte: “CAPÍTULO I - Disposições gerais Cláusula 1.ª Objeto do Concurso 1. O presente Caderno de Encargos compreende as cláusulas a incluir no contrato a celebrar na sequência do procedimento pré-contratual que tem por objeto principal, por divisão em lotes, a aquisição da prestação de serviços de manutenção dos espaços verdes do concelho de Oeiras. 2. O presente procedimento pré-contratual compreende os seguintes lotes: a) Lote 1 – OEIRAS POENTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da zona Poente da Freguesia de Oeiras e São Julião da Barra identificados no Anexo IV, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III; b) Lote 2 – OEIRAS NASCENTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da zona Nascente da Freguesia de Oeiras e São Julião da Barra, identificados no Anexo IV, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III; c) Lote 3 – OEIRAS OCIDENTAL NORTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da Freguesia de Porto Salvo, identificados no Anexo IV, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III; d) Lote 4 – OEIRAS CENTRAL SUL – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento das Freguesias de Paço de Arcos e Caxias, identificados no Anexo IV, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III; e) Lote 5 – OEIRAS CENTRAL NORTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento da Freguesia de Barcarena, identificados no Anexo IV, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III; f) Lote 6 – OEIRAS ORIENTAL SUL – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento das Freguesias de Algés, Cruz Quebrada e Linda-a-Velha, identificados no Anexo IV, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III; g) Lote 7 – OEIRAS ORIENTAL NORTE – Manutenção preventiva nos Espaços verdes e Caldeiras de Arruamento das Freguesias de Carnaxide e Queijas, identificados no Anexo IV, e manutenção corretiva na área do referido Lote, delimitada no Anexo III 3. As especificidades técnicas dos serviços a contratar, comuns e específicas a cada lote, são as que constam nos anexos ao presente Caderno de Encargos (…) Cláusula 19.ª Critério de adjudicação Em cada lote / lotes a adjudicação é feita segundo o critério da proposta economicamente mais vantajosa, na modalidade multifator prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 74.º do CCP, tendo em conta os seguintes fatores e respetivos coeficientes: A) Preço – 40 % B) Funcionários afetos ao contrato de manutenção – 30% C) Sustentabilidade ambiental e eficiência dos Meios Mecânicos, Máquinas e Equipamentos afetos ao contrato – 30% (…) Cláusula 21.ª Adjudicação (…) 5. A adjudicação por lotes será efetuada nos seguintes termos: a) Não poderão ser adjudicados mais de 2 (dois) lotes a cada concorrente, exceto se, nos vários Lotes, os concorrentes admitidos sejam em número insuficiente para fazer cumprir esta regra b) Os Lotes 6 e 7 não poderão ser adjudicados ao mesmo concorrente, exceto se tiver sido admitido unicamente o mesmo concorrente em ambos os Lotes; c) Caso tenha sido adjudicado mais do que 2 Lotes ao mesmo concorrente, este terá direito à adjudicação das propostas apresentadas nos Lotes com a maior área de intervenção, em cumprimento com a alínea anterior, sendo os restantes lotes adjudicados à proposta classificada no lugar imediatamente a seguir. d) Nos termos da alínea a), a adjudicação de mais do que dois Lotes ao mesmo concorrente ocorrerão da seguinte forma: i. No caso de haver mais do que 1 concorrente admitidos, a adjudicação dos Lotes sobrantes será feita alternadamente pelos concorrentes segundo o critério dos Lotes com a maior área de intervenção ainda por adjudicar, iniciando-se pelo concorrente que ficou melhor classificado no conjunto dos 7 Lotes. (…)” – cfr. documento n.º 5, junto com a petição inicial; 4. Do caderno de encargos do concurso público com publicidade internacional, designado por 2022/1383 DAQV, resulta que os lotes em causa possuem as seguintes áreas: “Lote 1 – OEIRAS POENTE: As áreas de intervenção têm no seu global cerca de 254 302 m² (…) Lote 2 – OEIRAS NASCENTE: As áreas de intervenção têm no seu global cerca de 259 268 m² (…) Lote 3 – OEIRAS OCIDENTAL NORTE: As áreas de intervenção têm no seu global cerca de 244 911 m² (…) Lote 4 – OEIRAS CENTRAL SUL: As áreas de intervenção têm no seu global cerca de 358 734 m² (…) Lote 5 – OEIRAS CENTRAL NORTE: As áreas de intervenção têm no seu global cerca de 318 202 m² (…) Lote 6 – OEIRAS ORIENTAL SUL: As áreas de intervenção têm no seu global cerca de 421 913 m² (…) Lote 7 – OEIRAS ORIENTAL NORTE: As áreas de intervenção têm no seu global cerca de 457 249 m²” – cfr. documento n.º 5, junto com a petição inicial; 5. Em 28 de abril de 2023, o júri do concurso público com publicidade internacional, designado por 2022/1383 DAQV, elaborou documento intitulado de relatório preliminar, do qual se retira, o seguinte: “(…) 6.1. CLASSIFICAÇÃO FINAL E ORDENAÇÃO Nos termos previstos na Cláusula 21.ª, n.º 5, do Programa do Procedimento, a adjudicação por Lotes será efetuada nos seguintes termos: a) Não poderão ser adjudicados mais de 2 (dois) lotes a cada concorrente, exceto se, nos vários Lotes, os concorrentes admitidos sejam em número insuficiente para fazer cumprir esta regra. b) Os Lotes 6 e 7 não poderão ser adjudicados ao mesmo concorrente, exceto se tiver sido admitido unicamente o mesmo concorrente em ambos os Lotes; c) Caso, em resultado da aplicação do critério de adjudicação, um concorrente tenha sido o melhor classificado em mais do que 2 (dois) lotes, este terá direito à adjudicação das propostas apresentadas nos Lotes com a maior área de intervenção, sendo os restantes lotes adjudicados à proposta classificada no lugar imediatamente a seguir; d) Nos termos da alínea a), a adjudicação de mais do que dois Lotes ao mesmo concorrente ocorrerá da seguinte forma: i. No caso de haver mais do que 1 concorrente admitidos, a adjudicação dos Lotes sobrantes será feita alternadamente pelos concorrentes segundo o critério dos Lotes com a maior área de intervenção ainda por adjudicar, iniciando-se pelo concorrente que ficou melhor classificado no conjunto dos 7 Lotes. Em resultado da avaliação das propostas, conforme o Anexo IV ao presente Relatório, e em cumprimento do disposto na referida Cláusula 21.ª, n.º 5, do Programa do Procedimento, o resultado das classificações de todos os Lotes e correspondentes propostas de adjudicação é o seguinte: “(texto integral no original; imagem)” 7. CONCLUSÃO Analisadas as propostas, nos termos e com os fundamentos que antecedem, o Júri do Procedimento delibera, por unanimidade: (…)b) Propor as grelhas de pontuação constantes do Anexo IV ao presente Relatório, e que expressa o resumo das pontuações atribuídas aos fatores de avaliação, bem como as pontuações ponderadas das quais resulta a classificação final das propostas; c) Propor a ordenação das propostas, por Lotes, de acordo com o referido no número 6.1 do presente Relatório, considerando o critério da proposta economicamente mais vantajosa previsto na Cláusula 19.ª do Programa do Procedimento e consequentemente propor: (…) c. A adjudicação do Lote 3 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 8 – A…, S.A.; d. A adjudicação do Lote 4 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 3 – P..., Lda.; e. A adjudicação do Lote 5 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 7 – F... - Projetos, Silvicultura e Jardinagem Unipessoal, Lda.; f. A adjudicação do Lote 6 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 7 – F... - Projetos, Silvicultura e Jardinagem Unipessoal, Lda.; g. A adjudicação do Lote 7 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 3 – P..., Lda; d) Enviar o presente Relatório Preliminar aos Concorrentes para que estes, querendo, se pronunciem em sede de Audiência Prévia, prevista na Cláusula 20.ª do Programa do Procedimento, fixando-se para este efeito o prazo de 5 (cinco) dias úteis a contar da data da sua notificação.” – cfr. documento n.º 7, junto com a petição inicial; 6. Em 12 de maio de 2023, a Autora apresentou ao concurso público com publicidade internacional, designado por 2022/1383 DAQV, requerimento de pronúncia em sede de audiência prévia, cujo teor se tem aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais – cfr. documento n.º 8, junto com a petição inicial; 7. Em 23 de maio de 2023, o júri do concurso público com publicidade internacional, designado por 2022/1383 DAQV, elaborou documento intitulado de relatório final, do qual se extrata, o seguinte: “(…) 3. ANÁLISE DAS PRONÚNCIAS Entrando no primeiro ponto da ordem de trabalhos, o Júri analisou as pronúncias dos Concorrentes n.º 6 – M...ATIV - Gestão e Manutenção de Ativos, S.A. e n.º 9 – M..., S.A. recebidas ao abrigo do direito de Audiência Prévia: (…) 3.2. Pronúncia do Concorrente n.º 9 – M..., S.A. Na sua pronúncia, o Concorrente n.º 9 – M..., S.A. invoca e requer, essencialmente, o seguinte: • Vários concorrentes – concretamente, a P... e a A... –, de modo a obter uma pontuação superior nas suas propostas e com isso alcançar a adjudicação em pelo menos alguns lotes, prestaram falsas declarações nos currículos dos trabalhadores que declararam ir afetar à execução do contrato, atribuindo-lhes antiguidades que os mesmos não têm. • A M... apercebeu-se destas discrepâncias porque, o ano passado, o Município de Lisboa promoveu um concurso limitado por prévia qualificação para a celebração de um Acordo-Quadro para a “Aquisição dos Serviços de Manutenção e dos Trabalhos de Reabilitação de Espaços Verdes”. • A P... e a A... apresentaram candidaturas nesse concurso limitado, às quais juntaram, conforme exigido pelas peças do procedimento em causa, diversa documentação relativa ao seu quadro de pessoal, que incluía diversos dos membros que agora também são indicados nas propostas apresentadas neste procedimento. • Ora, confrontando a informação que consta dos documentos juntos às candidaturas apresentadas nesse concurso do Município de Lisboa com as informações curriculares que são apresentadas nas propostas aqui apresentadas, verificam-se claras discrepâncias… • Que não podem seguramente ser justificadas como meros e convenientes “lapsos” ou “enganos”, constituindo, muito pelo contrário, falsas declarações deliberadamente prestadas com o intuito premeditado e consciente de enganar o Exmo. Júri e o Município de Oeiras, levando à adjudicação de propostas que efetivamente não têm a qualidade (nos subfactores em causa) declarada pelos concorrentes. • Por conseguinte, as propostas da P... e da A... deverão ser excluídas deste Concurso, sob pena de ilegalidade da decisão final que vier a ser proferida. Após análise das observações e argumentos apresentados, o Júri concluiu pela não verificação dos motivos de exclusão das propostas dos Concorrentes P... e a A... invocados pelo Concorrente n.º 9. No caso concreto, o Concorrente n.º 9 afirma que os currículos apresentados pelos Concorrentes P... e A.... relativamente a alguns dos técnicos que propõe para o exercício das funções de canalizador, apresentam indícios de que esses técnicos não terão a experiência profissional que declaram ter, com fundamento no facto de que “no concurso limitado promovido pelo Município de Lisboa (…) constava um quadro com indicação dos funcionários da empresa, do qual constava este colaborador e se indicava que este trabalhador tinha integrado a empresa” em datas diferentes das indicadas nos currículos apresentados no presente procedimento. Contudo, importa esclarecer, antes de mais, que o presente procedimento pré-contratual promovido pelo Município de Oeiras é um concurso público e não um concurso limitado por prévia qualificação, como aquele que terá sido lançado pelo Município de Lisboa a que o Concorrente n.º 9 se refere e com base no qual sustenta as suas afirmações. Portanto, não tendo o presente concurso sido precedido de uma fase de qualificação dos concorrentes, considera-se que as exigências colocadas num e noutro concurso não podem ser, naturalmente, confundidas. Com efeito, num concurso limitado por prévia qualificação apreciam-se as características e as qualidades das empresas, de acordo com os requisitos de capacidade estabelecidas nas respetivas peças do procedimento, ao contrário do que acontece num concurso público, em que apenas se apreciam as propostas dos concorrentes. Por outro lado, também importa esclarecer que no presente concurso promovido pelo Município de Oeiras não são analisados os anos de experiência profissional dos técnicos propostos pelos concorrentes ao serviço das respetivas entidades empregadoras/patronais. Na verdade, o que a entidade adjudicante considerou foi o tempo de experiência dos técnicos em questão e não o tempo de serviço na respetiva ‘entidade patronal’ ou ‘entidade empregadora’, tendo isso mesmo sido evidenciado no pedido de esclarecimentos apresentado pelo Júri a todos os Concorrentes. Com efeito, de acordo com o referido pedido, como ali se pode ler, “Verifica-se que analisadas as propostas apresentadas, o Júri constatou que nos Curricula Vitae das equipas técnicas propostas, elaborados de acordo com o modelo constante do Anexo VI ao Programa do Procedimento, concretamente, no campo “Entidade para quem foi prestado” (o serviço), os concorrentes terão aparentemente considerado que a referida entidade se tratava da ‘entidade patronal’ ou da ‘entidade empregadora’ de cada técnico. Na verdade, o que a entidade adjudicante pretende saber é qual a entidade destinatária / beneficiária dos serviços prestados por cada um dos técnicos propostos e não qual a sua ‘entidade patronal’ ou ‘entidade empregadora’. Admitindo que a informação que se pretende obter, nos moldes em que foi exigida, se prestou a equívocos de interpretação, solicita-se relativamente a cada técnico proposto o esclarecimento sobre (i) qual a entidade destinatária / beneficiária dos serviços prestados por cada um dos referidos técnicos, devendo indicar (ii) a data de início e termo da prestação, com indicação dos meses e anos.” Ora, na pronúncia apresentada pelo Concorrente n.º 9 não são colocadas em crise as informações prestadas pelos Concorrentes P... e A.... em resposta a este pedido de esclarecimento. Os curricula dos técnicos dos Concorrentes P....e A.... foram avaliados considerando o tempo de experiência evidenciado relativamente aos destinatários finais dos serviços e não o tempo da relação laboral desses técnicos com os referidos Concorrentes, não tendo sido apresentado qualquer indício de que essas informações específicas (apresentadas no âmbito da resposta ao citado pedido de esclarecimento) e consideradas na avaliação das propostas correspondam a falsas declarações. Em face do exposto, entende o Júri que a conclusão não pode deixar de ser que os indícios mobilizados pelo Concorrente n.º 9 são manifestamente insuficientes no que respeita ao conteúdo dos currículos apresentados pelos Concorrentes P… & J…. e A..... Nestes termos, deliberou o Júri não acolher o entendimento preconizado pelo Concorrente n.º 9 nesta matéria. 4. RELATÓRIO FINAL Entrando no único ponto da ordem de trabalhos, e face ao anteriormente exposto, o Júri deliberou manter o teor e as conclusões do Relatório Preliminar de Análise e Avaliação das Propostas, propondo: (…) b) A adjudicação das seguintes propostas: a. A adjudicação do Lote 1 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 7 E…, S.A; b. A adjudicação do Lote 2 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 7 E…, S.A; c. A adjudicação do Lote 3 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 8 A...., S.A.; d. A adjudicação do Lote 4 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 3 P..., Lda.; e. A adjudicação do Lote 5 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 7 F... - Projetos, Silvicultura e Jardinagem Unipessoal, Lda.; f. A adjudicação do Lote 6 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 7 F... - Projetos, Silvicultura e Jardinagem Unipessoal, Lda.; g. A adjudicação do Lote 7 à proposta apresentada pelo Concorrente n.º 3 P..., Lda. Deliberou ainda o Júri remeter o presente Relatório Final de Análise e Avaliação das Propostas, o Relatório Preliminar e os demais documentos que compõem o presente procedimento ao órgão competente para a decisão de contratar, para decisão sobre o que neles é proposto.” – cfr. documento n.º 9, junto com a petição inicial. * Nada mais se provou, com interesse para o conhecimento da exceção em análise. * II.2 DE DIREITO Cumpre apreciar conforme delimitado em I.1. Assentam as partes quanto à legitimidade activa processual da Autora/Recorrente. O dissídio incide sobre a alegada falta de interesse em agir da mesma relativamente aos vícios imputados ao acto de adjudicação dos lotes 4 e 7, tal como entendeu o Tribunal a quo. Atentemos, no discurso fundamentador da decisão recorrida, nesta parte: “Conforme resulta do enquadramento supra exposto, para se conhecer do interesse em agir da Autora, há que partir da causa de pedir e pedido que esta formula nos presentes autos. Compulsada a petição inicial, a fls. 1, temos que a Autora formula os seguintes pedidos: “NESTES TERMOS, Deverá a presente ação ser julgada procedente e provada e, em consequência: (i) ser anulada a decisão proferida pela Câmara Municipal de Oeiras em 31.05.2023, pela qual aquele órgão deliberou a adjudicação da proposta da A... no Lote 3 e das propostas da P... nos Lotes 4 e 7 do Concurso; (ii) serem anulados os contratos que já tenham eventualmente sido celebrados entre a Entidade Demandada, a A... e a P... para os Lotes 3, 4 e 7 do Concurso, na sequência da decisão de adjudicação referida na alínea anterior; e (iii) ser a Entidade Demandada condenada na prática do ato devido, que consiste na adjudicação das propostas apresentadas pela M... nos Lotes 3, 4 e 7 do Concurso, procedendo-se subsequentemente à celebração dos correspondentes contratos entre o Município de Oeiras e a Autora.” Impõe-se, assim, e desde já, interpretar os pedidos formulados pela Autora. Com efeito, na petição inicial admite-se que um autor formule um pedido único, como também pedidos alternativos, subsidiários, cumulativos, genéricos e de prestações vincendas. O pedido diz-se cumulativo quando o autor apresente uma pluralidade ou multiciplicidade de pretensões, as quais pretende obter ao mesmo tempo e no mesmo processo. A cumulação pode respeitar a relações jurídicas diferentes, ou à mesma, designando-se de pedidos cumulados autónomos no primeiro caso; e no segundo, de pedidos cumulados principais e acessórios. A cumulação pode ainda ser real ou aparente, a cumulação é real quando ele formule mais de que um pedido de carácter substancial, qualquer deles traduzindo pretensão autónoma, com distinta causa de pedir, e por isso permitindo a obtenção simultânea de vários efeitos jurídicos através da procedência de todos eles; e existe uma cumulação aparente de pedidos quando a multiplicidade destes é meramente de carácter processual, nomeadamente por refletirem as múltiplas operações que o tribunal terá de desenvolver para atingir o fim último da ação, a “utilidade económica imediata do pedido” (artigo 297.º, n.º 2 e 555.º, n.º 1, ambos do CPC). A Autora formulou, nos presentes autos, três pedidos, a saber, (1) o pedido de anulação do ato de adjudicação, no que respeita aos lotes 3, 4 e 7; (2) o pedido de anulação dos respetivos contratos; e (3) o pedido de condenação à adjudicação dos lotes 3, 4 e 7. Analisando cada um dos pedidos, importa agora determinar se os mesmos são, ou não, pedidos únicos, alternativos, subsidiários, cumulativos, genéricos e de prestações vincendas No que respeita ao pedido impugnatório, temos que a Autora peticiona a anulação do ato de adjudicação, no que respeita aos lotes 3, 4 e 7. É certo que, no presente caso apenas foi praticado um ato de adjudicação, mas, ainda assim, é possível autonomizar cada um destes lotes, pelo que, temos aqui, efetivamente, uma cumulação de pedidos, em que, em bom rigor, o que é pedido ao tribunal é que ele averigue da legalidade dos atos de adjudicação quanto a cada um dos lotes. No que respeita ao pedido de anulação dos respetivos contratos, este pedido é, no fundo, uma consequência da eventual ilegalidade dos respetivos atos de adjudicação, pelo que só será considerado em caso de procedência do primeiro. Trata-se, também aqui, de um pedido cumulado acessório e aparente. Por fim, o terceiro pedido é um pedido de condenação à adjudicação dos lotes 3, 4 e 7, à Autora. É certo que Autora não coloca nenhuma alternatividade no pedido que formula, no sentido de, não lhe sendo adjudicado um dos lotes, poderem ser adjudicados os outros, ou vice versa; tal como não estabelece qualquer subsidiariedade no pedido que formula, p.ex. de que não lhe sendo adjudicado o lote 7, poder ser-lhe adjudicado os lotes 4 e 3. Todavia, resulta da petição inicial que este pedido é formulado na dependência do pedido impugnatório, o que significa que, só procedendo tal pedido, é que deverá este Tribunal se pronunciar da eventual condenação à adjudicação por referência a cada um dos lotes. Estamos, também aqui, perante um pedido cumulado acessório e aparente, na medida em que só será apreciado, quando a cada um dos lotes se chegarmos primeiro à conclusão da invalidade dos respetivos atos de adjudicação. Donde resulta que, no que ao pedido condenatório respeita, a Autora não peticiona, como invocado pelo Réu e pelas Contrainteressadas a adjudicação dos três lotes, em si mesmos considerados, mas antes a adjudicação de cada um desses lotes, no seguimento da eventual decisão quanto à validade do ato de adjudicação de cada um desses lotes. Ora, das regras do concurso público em crise, resulta que, nos termos da cláusula 21.ª, n.º 5, alíneas b) e c), do Programa do Procedimento, os lotes 6 e 7, não poderão ser adjudicados ao mesmo concorrente, e que caso o concorrente tenha sido classificado em primeiro lugar, em mais do que dois lotes, este terá direito à adjudicação das propostas apresentadas nos lotes com maior área de intervenção, sendo os restantes lotes adjudicados à proposta classificada no lugar imediatamente a seguir. Refira-se desde já que a norma do concurso padece de um erro que terá contribuído para a invocação das exceções por parte do Réu e da Contrainteressada. É que a alínea c), do n.º 5, da cláusula 21.ª, do Programa do Procedimento, começa da seguinte forma “Caso tenha sido adjudicado mais do que 2 Lotes ao mesmo concorrente”, quando o que a norma pretende disciplinar, não é a adjudicação de mais do que dois lotes, porque tal adjudicação é proibida desde logo pela alínea a), do referido normativo, mas antes a classificação em primeiro lugar, em mais do que dois lotes, do mesmo concorrente. Vejamos, então, o que resulta da aplicação de tal regra aos pedidos da Autora. Os lotes com maior área, e por ordem decrescente, são os lotes 7, 6, 4, 5, 2, 1 e 3 (facto 4 do probatório). Ora, a Autora peticiona a adjudicação dos lotes 3, 4 e 7, pelo que, aplicando as regras do concurso, teríamos, desde logo que ao abrigo do disposto na cláusula 21.ª, n.º 5, alínea c), do Programa do Procedimento, não seria possível adjudicar à Autora mais do que dois lotes, e a adjudicar, seriam os lotes com maior área, e logo os lotes 4 e 7. Todavia, a Autora foi classificada em terceiro lugar, nos lotes 4 e 7, sendo precedida pela empresa F..., classificada em segundo lugar. É certo que, como a Autora alega, esta concorrente viu-lhe ser adjudicados os lotes 6 e 5. Mas, a proceder a alegação da Autora, e a concluirmos pela existência do alegado fundamento de exclusão da proposta da Contrainteressada P..., Projetos e Construções, Lda., para os lotes 4 e 7, a verdade é que, aplicando as normas concursais, sempre seriam de se adjudicar tais lotes à F..., e não à Autora, pois que o lote 7 possui maior área que o lote 6, logo, seria de se propor a adjudicação do lote 7, e não do lote 6, à F... e, em consequência, do lote 4 e não do lote 5. Com efeito, a alegação da Autora de que esta outra concorrente viu-lhe ser adjudicados outros dois lotes, não é suficiente para afastar as regras do concurso, nomeadamente no que respeita à distribuição dos lotes em caso de classificação em mais do que um primeiro lugar. De facto, a eventual procedência do vício imputado pela Autora ao ato de adjudicação destes lotes, teria como consequência a sua adjudicação à concorrente classificada em segundo lugar, não sendo motivo legítimo para afastar esta classificada, o facto de à F... terem sido adjudicados outros dois lotes, pois que os mesmos terão sido, então, atribuídos a esta, em violação das normas concursais. O que significa que, será o ato de adjudicação dos lotes 6 e 5 que padecerá de eventual invalidade, não legitimando tal invalidade, a adjudicação dos lotes 4 e 7 à Autora. Acresce que, a Autora não impugnou a decisão de adjudicação dos lotes 6 e 5, tal como não indicou a F... como Contrainteressada. E não diga a Autora que tal possibilidade não lhe era possível antecipar, pois que as regras do concurso são claras, e das peças processuais que apresentou resulta claro que a mesma as conhece e sabe aplicar. Com efeito, não pode a Autora escudar-se no facto de não ter impugnado também o ato de adjudicação quanto àqueles dois lotes, para com isso beneficiar, pois que a própria alegação da Autora em sede de petição inicial, parte do pressuposto que à concorrente F... foram adjudicados os lotes 6 e 5, e por tal motivo, não teria já direito aos lotes 4 e 7, sem cuidar de aplicar a norma concursal em causa. Pelo que, em face do exposto, é de se concluir como concluiu a Contrainteressada P..., Projetos e Construções, Lda., pela falta de interesse em agir da Autora, quanto aos lotes 4 e 7, pois que tendo ficado classificada em terceiro lugar, e não sendo possível afastar a segunda classificada, nomeadamente porque em virtude da aplicação das normas concursais seriam estes os lotes a adjudicação a esta segunda classificada, forçoso é concluir pela procedência da exceção. Destarte, procede a exceção quanto aos lotes 4 e 7, e, em consequência, absolve da instância o Réu e a Contrainteressada, dos pedidos formulados, na parte respeitante aos lotes 4 e 7.” Com efeito, para além da indicada legitimidade activa, o autor terá de possuir igualmente interesse em agir, enquanto expressão da necessidade (utilidade) de tutela jurisdicional e a adequação do meio processual (cf. artigo 30.º, n.º 2 do CPC). Dito de outro modo, “o interesse processual (ou interesse em agir) pode ser definido como o interesse da parte activa em obter a tutela judicial de uma situação subjectiva através de um determinado meio processual e o correspondente interesse da parte passiva em impedir a concessão daquela tutela” – cfr. Miguel Teixeira de Sousa, As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, pág. 97. O interesse em agir é o pressuposto processual que traduz a necessidade efectiva, em função das concretas circunstâncias, de recorrer à intervenção dos tribunais. O que tem vindo a ser aceite pela jurisprudência como excepção dilatória inominada, cuja eventual procedência conduz à absolvição da instância. O interesse em agir, sendo diferente da legitimidade tem, todavia, em comum com este conceito o dever ser aferido objectivamente pela posição alegada pelo autor, que tem de demonstrar a necessidade do recurso a juízo como forma de defender um seu direito. “O autor tem interesse processual se, dos factos apresentados, resulta que necessita da tutela judicial (...)” (autor e obra citada, pág. 99). Tal interesse processual consiste essencialmente, como ensinam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (Manual de Processo Civil, 2.ª edição) na necessidade de usar do processo, de instaurar ou fazer a acção, o que significa, dito de outra forma, que o autor tem interesse processual quando a situação de carência em que se encontra, necessita de intervenção dos tribunais. Definido, assim, o interesse processual, importa aferir se o Tribunal a quo errou no caso em apreço sobre a falta de interesse em agir da Recorrente/autora relativamente aos pedidos formulados sobre os lotes 4 e 7. Desde já se adianta que, ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, no caso em apreço, tal interesse existe. Se dúvidas inexistem de que um concorrente preterido na adjudicação de um concurso tem legitimidade para impugnar essa decisão, por a mesma lhe ser desfavorável; a questão que lhe sucede é a de saber se tem interesse em fazê-lo quando da sua impugnação não possa resultar a adjudicação do concurso em seu benefício. Com efeito, as circunstâncias do caso concreto permitem afirmar, ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, que a Recorrente/Autora poderá retirar da impugnação da adjudicação dos lotes 4 e 7 à P..., alguma utilidade, uma vez que não se pode afirmar, sem margem para dúvidas, que a Recorrente/Autora não beneficiaria da anulação do acto de adjudicação daqueles lotes, mantendo-se inalterada a sua posição quanto a estes lotes. Explicitemos; No fundo o que importa resolver é qual a relevância processual para a Recorrente/Autora da impugnação do acto de adjudicação dos lotes 4 e 7, se a sua proposta ficou ordenada apenas em 3.º lugar, tendo sido ordenada à sua frente, em 2.º lugar, em ambos os lotes, a proposta da concorrente F.... Concorrente a quem foram adjudicados os lotes 5 e 6, justamente porque nos lotes 4 e 7 vira a sua proposta ordenada atrás da Contra-interessada P.... Ora, não se mostra disputado que os lotes 5 e 6 foram adjudicados à Concorrente F... e que tais decisões de adjudicação não foram impugnadas, nem nos presentes autos nem consta que o tivessem sido noutro processo judicial. Desta feita, tais decisões adjudicatórias encontram-se “consolidadas” e em plena execução uma vez que não operou quanto a estes lotes (5 e 6) qualquer efeito suspensivo automático, como ocorreu com os lotes 3, 4 e 7 ora impugnados – conforme sentença proferida em 15.07.2024, pelo Tribunal a quo, deferindo o levantamento do pedido de levantamento do efeito suspensivo dos atos impugnados (consulta SITAF). Como também resulta do Facto Provado 4) do Saneador Recorrido, os Lotes com maior área são, por ordem decrescente, os seguintes: Lotes 7, 6, 4, 5, 2, 1 e 3. 11. Do que antecede, flui, com forte certeza, que se a presente acção fosse julgada procedente sendo, em consequência, anulada a decisão de adjudicação dos Lotes 4 e 7, embora fosse de adjudicar tais lotes à F..., o certo é que por via do que antecede e da regra do concurso - Cláusula 21ª, n.º 5 do Programa do Procedimento – tendo já sido adjudicados 5 e 6 à Concorrente F..., esta já não poderia ver-lhe adjudicados outros lotes. Cremos que a Recorrente não se terá expressado da melhor forma ao referir que a Cláusula 21ª, n.º 5 do Programa do Procedimento – “(…) só vinculam a entidade adjudicante, na tomada da decisão de adjudicação, não vinculando os concorrentes e não podendo validamente condicionar (até sob pena de ilegalidade ou mesmo inconstitucionalidade), o exercício do direito de ação por parte destes” (cfr. as conclusões b) e n) das alegações de recurso). Na medida em que é evidente que o Programa do Procedimento vincula, não somente a entidade adjudicante, como todos os participantes no concurso. Como é sabido, o Programa do Procedimento é um regulamento e, portanto, um acto normativo. Desde logo, é a lei que lhe atribui essa qualificação, dispondo o art. 41º do CCP que “[o] programa do procedimento é o regulamento que define os termos a que obedece a fase de formação do contrato até à sua celebração”. A corroborar o que antecede, Pedro Costa Gonçalves assinala, justamente, que “o CCP indica a natureza jurídica do programa do procedimento: regulamento (regulamento administrativo). O programa do procedimento é, na verdade, a lex specialis que contém as regras aplicáveis aos participantes no procedimento e que o órgão adjudicante se obriga a respeitar (autovinculação)” - Cfr. Direito dos Contratos Públicos, 6ª Edição, Almedina, Coimbra, 2023, p. 489. Aqui chegados, já se antevê que falece a asserção do Tribunal a quo de que jamais poderia ser adjudicado à Recorrente/Autora, o lote 7, justificando que” possui maior área que o lote 6, logo, seria de se propor a adjudicação do lote 7, e não do lote 6, à F... e, em consequência, do lote 4 e não do lote 5”, na medida em que também o Lote 4 possui uma maior área do que o Lote 5. (cfr a p. 28 do Saneador Recorrido). O que acontece é que, neste caso, a procedência da acção quanto aos lotes 4 e 7 alteraria a 1ª posição (segundo a versão da Recorrente), e manter-se-ia a ordenação da 2ª (F...) e 3ª (da Autora). Todavia, no presente contexto, já não poderiam ser atribuídos à 2ª classificada aqueles lotes uma vez que se conformou com os lotes que lhe foram atribuídos – 5 e 6 – não impugnados. Assim, de acordo com as normas procedimentais consagradas na Cláusula 21ª, n.º 5 do Programa do Procedimento, se a presente acção viesse a obter sucesso, ter-se-ia apenas de “arrumar a casa” quanto aos lotes 3, 4 e 7, sendo, para o que aqui releva, inócua a circunstância de a proposta da F..., ter ficado classificada em 2º lugar quanto aos lotes 4 e 7. Porquanto, para além de não ter sido apontada qualquer ilegalidade à sua adjudicação aos lotes 5 e 6, que se encontram em execução, também por via da proibição de adjudicação de mais de dois lotes a cada concorrente ter-se-á de aplicar não só a Cláusula 21ª, n.º 5, alíneas a) e b) do Programa do Procedimento, como a Cláusula 21ª, n.º 5, alínea c) do mesmo Programa, ficando por isso impedida de “nova adjudicação” de mais 2 lotes. Cumpre destacar que a Recorrente/Autora não impugnou as adjudicações dos lotes 5 e 6, mas apenas 3, 4 e 7. Justamente alertando para a necessidade de, em caso de ligação ou interdependência na adjudicação de vários lotes, impugnar os lotes que se afigurem necessários para que o autor possa obter a adjudicação nos lotes pretendidos, vide LUÍS VERDE DE SOUSA que refere a este propósito o seguinte: “[e]sta ligação ou interdependência entre os diferentes lotes colocará algumas dificuldades em matéria processual. Na verdade, não é de afastar a possibilidade de um determinado concorrente ter um interesse direto e pessoal em estender a impugnação à adjudicação realizada no âmbito de um determinado lote ou conjunto de lotes, não porque esse lote ou conjunto de lotes alguma vez lhe possa vir a ser adjudicado, mas porque a anulação da respetiva adjudicação lhe permitirá ascender à posição de adjudicatário num outro lote ou conjunto de lotes” - Cfr. aut. cit., “Algumas notas sobre a adjudicação por lotes”, in. E-Publica, Vol. 4, n.º 2, Nov. 2017. pp. 85-86. Porém o interesse da Recorrente/Autora quanto à impugnação dos lotes 4 e 7 advém de que afastada a adjudicatária (1º lugar) a que lhe sucederia, está impedida, nesta fase, de lhe virem a ser adjudicados tais lotes – consolidação dos actos de adjudicação dos lotes 5 e 6, que se encontram arredados do objecto impugnatório. Nem tendo a Recorrente/Autora interesse na respectiva impugnação, na medida em que não lhe poderiam ser adjudicados. O caso referido em sede de contra-alegações pela CMO no Proc. n.º 2174/18.5 BELSB, de 23 de março de 2023, disponível em www.dgsi.pt no tocante às consequências da não impugnação da graduação do 2º candidato em 2º lugar não tem reflexo no presente caso, uma vez se tratava de impugnação de acto de adjudicação de um serviço a prestador único - concurso para aquisição de serviços de voz e dados fixos e móveis para os anos de 2018, 2019 e 2020, para diversos organismos dos Ministérios da Economia e do Planeamento e Infraestruturas – e não por lotes. Do que antecede, não se poderá dizer de modo concludente que, caso os pedidos impugnatórios quanto aos lotes 4 e 7, viessem a proceder seria inócua para os interesses da Recorrente/Autora. Tanto mais que como se atentou no Despacho Saneador recorrido a Recorrente não pretende a adjudicação dos 3 lotes impugnados (3, 4 e 7), como justificou: “da interpretação que se faz do pedido formulado pela Autora, resulta claro que o pretendido não é a adjudicação dos três lotes, como um todo, mas antes a adjudicação dos lotes em relação aos quais este tribunal determine a invalidade do respetivo ato de adjudicação, e no limite, concluindo pela classificação da Autora no primeiro lugar quanto a esses três lotes, adjudicar em conformidade com as regras de concurso, como resulta do por esta alegada no artigo 132.º, da petição inicial, quando coloca dentro de parenteses que deverá ser, depois de classificada em primeiro lugar, operada a regra de desempate” (p. 31). Se a Recorrida/Entidade Demandada admitiu ilegalmente a proposta da contra-interessada P..., que veio a ser a adjudicatária dos lotes 4 e 7, tal circunstância é susceptível de ter influência directa no resultado do procedimento e, portanto, no acto de adjudicação impugnado. Detém, pois, a Recorrida/Autora, interesse em averiguar da (i)legalidade da admissão da proposta da Recorrida/Contra-interessada, com a necessária repercussão ao nível da possível adjudicação a si daqueles lotes (sendo, para o efeito, irrelevante a 2ª classificada), caso se venha a concluir nesse sentido. Por conseguinte, atentos os motivos expostos, improcede a invocada excepção inominada de falta de interesse em agir da Recorrente/Autora quanto aos pedidos formulados sobre os lotes 4 e 7. Pelo exposto, será de conceder provimento ao recurso, revogar o Despacho Saneador, na parte em que julgou procedente a excepção de falta de interesse em agir, quanto aos pedidos formulados sobre os lotes 4 e 7, devendo os autos prosseguir quanto à apreciação de tais pedidos, se nada mais obstar. * Custas a cargo da parte vencida a final (vide art. 527º, nº 1 e 2 do CPC). * Face ao estatuído no art. 6º n.º 7, do RCP (dado que o valor do recurso jurisdicional ascende a € e € 9.077.408,87), será de dispensar (na totalidade) o pagamento do remanescente da taxa de justiça nesta instância recursiva (em 1ª instância esta questão não se coloca, pois é aplicável a tabela II do RCP, sendo o valor da taxa de justiça de 2 UC), pois seria desproporcionado o montante de taxa de justiça que seria devido caso não houvesse lugar a tal dispensa.* III. DECISÃO Pelo exposto, acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em: i) conceder provimento ao recurso interposto pela Recorrente; ii) revogar o Despacho Saneador, na parte em que julgou procedente a excepção de falta de interesse em agir, quanto aos pedidos formulados sobre os lotes 4 e 7; iii) ordenar a baixa ao Tribunal a quo, devendo os autos aí prosseguir para apreciação de tais pedidos, se nada mais obstar. Custas a cargo da parte vencida a final, com dispensa de pagamento da taxa de justiça remanescente devida em sede recursiva. R.N. Lisboa, 23 de Agosto de 2024 Ana Cristina Lameira, relatora Maria de Lurdes Toscano Hélia da Silva Gameiro |