Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1319/16.4BELRA-S1
Secção:CA
Data do Acordão:01/12/2023
Relator:PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA
RECLAMAÇÃO DO ATO DE HOMOLOGAÇÃO DE AVALIAÇÃO
SIADAP 2007
RECLAMAÇÃO FACULTATIVA
Sumário:I - A omissão de pronúncia verifica-se perante ausência de decisão expressa do tribunal sobre as matérias que os sujeitos processuais interessados submeteram à apreciação do tribunal em sede de pedido, causa de pedir e exceções, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, bem como sobre as que sejam de conhecimento oficioso, mas não perante a ausência de resposta concreta aos argumentos convocados pelas partes em defesa dos seus pontos de vista.
II - A reclamação do ato de homologação de avaliação, no âmbito do SIADAP 2007, tem como objeto um ato administrativo de conteúdo positivo, pelo que o objeto da impugnação contenciosa continua a ser este ato.
III - Com o SIADAP 2007, o artigo 73.º, n.º 1, passou a prever indistintamente que do ato de homologação e da decisão sobre reclamação cabe impugnação administrativa, cabe recurso hierárquico ou tutelar, ou impugnação jurisdicional, permitindo a interpretação de que se alterara a natureza desta reclamação de necessária para facultativa.
IV - O que se tornou inequívoco perante o artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro (que aprovou o novo Código do Procedimento Administrativo).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

P....., autora nos autos principais, na sequência da notificação do despacho saneador proferido em 19/04/2022, que apreciou a exceção de intempestividade / caducidade do direito de ação, decidindo que a ação apenas é tempestiva quanto à alegação do vício de desvio de poder, e concluindo pela improcedência da exceção de intempestividade na prática do ato, com tais limites, veio interpor recurso daquela decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“1. O despacho saneador de fls., debalde douto, deve ser revogado, na parte que contende com a apreciação da putativa exceção dilatória inominada de intempestividade do exercício do direito de ação, por banda da A., exceção que foi decidida com o Tribunal a quo a considerar que, para efeito de conhecimento de vícios geradores da anulabilidade, a exceção procede; e que, para efeito de conhecimento de vícios geradores de nulidade, a exceção não procede, devendo os autos prosseguir;
2. O Tribunal recorrido deveria ter simplesmente julgado totalmente improcedente tal exceção dilatória, prosseguindo os autos para audiência de julgamento sem que se estabelecesse qualquer restrição cognitiva quanto a factos alegados pela A.
3. A A. moveu a presente ação de condenação à prática do ato devido tendo por base a ausência de decisão, por parte do órgão executivo do R., sobre a reclamação apresentada ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 72.º do SIADAP, aprovado pela Lei n.º 66-B/2007, de 28.12;
4. A A. pretende, assim, que seja removido o obstáculo imposto pela recusa do R. em decidir essa reclamação;
5. Em face do que foi peticionado, conforme a PI de fls., a A. demanda a condenação do R. a deferir a reclamação apresentada em 13.07.2016, atribuindo à A., para o ciclo avaliativo 2013-2014 a mesma classificação que aquela obteve no ciclo avaliativo de 2011;
6. Para densificação do mérito substantivo da pretensão que deduziu na reclamação impetrada em 13.07.2016, a A. alegou, na PI de fls., a nulidade da avaliação desse ciclo de 2013/2014, mormente com base no desvio de poder, como bem identificado pelo Tribunal recorrido;
7. Todavia, tal circunstância não descaracteriza a presente ação nem obnubila o seu verdadeiro objeto, que é o da condenação à prática do ato devido na sequência de uma situação de inércia;
8. Tal como daí não decorre que o objeto da ação seja uma pretensão estritamente impugnatória de um ato de conteúdo expresso (que não é);
9. A Lei n.º 66-B/2007, de 28.12, confere dignidade própria à decisão emergente da reclamação prevista no n.º 1 do artigo 72.º do SIADAP, estabelecendo, designadamente, que a mesma é diretamente impugnável, para efeitos de contencioso, quer pela sua emissão, quer pela sua omissão;
10. A reclamação prevista no n.º 1 do artigo 72.º do SIADAP não se confunde, na sua natureza e finalidade, com os meios de tutela graciosa previstos no CPA, constituindo um ato administrativo em sentido próprio;
11. Tal ato, quando omitido, configura um “ato devido”;
12. A reclamação do n.º 1 do artigo 72.º do SIADAP não é equiparável à reclamação administrativa prevista no artigo 191.º do CPA, não produzindo, a sua apresentação, os efeitos previstos no artigo 59.º, n.º 4, do CPTA;
13. Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 61.º, al. h), 72.º, n.º 1, e 73.º, n.º 1, todos do SIADAP, resulta claro que a reclamação a que alude o referido n.º 1 do artigo 72.º do SIADAP é uma fase do processo de avaliação, i.e., é parte integrante do mesmo.
14. O Tribunal recorrido equivocou-se, assim, quando configurou a presente ação como sendo de condenação à prática do ato devido como tendo por objeto um ato de conteúdo expresso, ou seja, o ato de homologação da avaliação que foi reclamado em 13.07.2016;
15. Quando, na realidade, o que está em causa é a omissão de decisão do R. sobre essa reclamação e o consequente pedido de condenação do R. a dar provimento à mesma (o ato devido…);
16. Ao configurar daquela forma, erradamente, a causa de pedir e o objeto da presente ação, o Tribunal, por meio do despacho saneador, quis, aparentemente, expurgar e, aparentemente, expurgou do seu âmbito cognitivo (e decisório) aquilo que qualificou como “causas de invalidade” aparentemente geradoras de “mera anulabilidade”;
17. Os factos vertidos na PI de fls., tal como sumariados pelo Tribunal recorrido no douto saneador de fls., nos termos supra transcritos nas alegações, são factos materialmente integradores do conceito de “desvio de poder”, não se justificando qualquer restrição cognitiva quanto aos mesmos;
18. Tanto mais que o pretexto para deles não conhecer não colhe fundamento, dado que o ato de homologação da avaliação, prévio à reclamação, não é, assim, um ato administrativo impugnado nos presentes autos, nem tem de o ser;
19. Estribando-se a ação num pedido de condenação à prática do ato devido assente numa omissão de decidir (“inércia”), o Tribunal não pode ali vislumbrar uma pretensão impugnatória, apreciando a alegada exceção de intempestividade/caducidade do direito de ação à luz do que seria praticável em face de uma ação de cariz impugnatório, discorrendo sobre “causas de anulabilidade” e causas de “nulidade”;
20. A ação vertente e a pretensão de condenação à prática do ato devido assentam, assim, e diversamente, nos méritos decorrentes da reclamação apresentada em 13.07.2016, que se pretende ver deferida, e, bem assim, no reconhecimento da nulidade das avaliações dos ciclos de 2012 e de 2013-14, com base em desvio de poder, nulidade essa de que o Tribunal pode conhecer;
21. Donde, a alegada exceção de “intempestividade”/caducidade do direito de ação, deveria simplesmente ter sido indeferida, dado que a ação foi tempestivamente apresentada, ao abrigo do que preceitua o n.º 1 do artigo 69.º do CPTA;
22. Quando perante a interposição da reclamação a que alude o n.º 1 do artigo 72.º do SIADAP, e na ausência de decisão sobre a mesma, o Tribunal recorrido consigna que o prazo de impugnação jurisdicional se conta da notificação do ato de homologação da avaliação, está, na realidade, e com o devido respeito, a suprimir direitos que a lei expressamente prevê, encurtando drasticamente os meios de tutela legalmente previstos;
23. Fazendo uma interpretação e aplicação da lei que ofende a tutela jurisdicional efetiva;
24. Impedindo, assim, o pedido de condenação à prática do ato devido, como reação a uma omissão/inércia da administração;
25. Assim, quando omitida a decisão sobre a reclamação apresentada ao abrigo do n.º 1 do artigo 72.º do SIADAP, o interessado pode lançar mão do pedido de condenação à prática do ato devido, podendo fazê-lo, em caso de absoluta omissão, dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 69.º do CPTA: ou seja, 1 ano;
26. Como é o caso dos autos;
27. Consequentemente, a presente ação mostra-se tempestivamente instaurada, não apenas para apreciação da eventual nulidade da atuação administrativa, mas, também, da eventual anulabilidade, na ótica da condenação à prática do ato devido, assente na identificada omissão.
28. Assim, deve revogar-se o segmento do douto despacho saneador de fls. por meio do qual o Tribunal recorrido decidiu que “Resta concluir que a acção apenas é tempestiva quanto à alegação do vício de desvio de poder”, concluindo “…pela improcedência da excepção de intempestividade na prática do acto, com os limites supra fixados”, segmento por meio do qual excluiu, assim, a cognição e decisão sobre factos alegados, por os qualificar como vícios geradores de “mera” anulabilidade;
29. Substituindo-se a douta decisão recorrida por outra que julgue totalmente improcedente, e sem quaisquer “restrições”, a referida exceção de intempestividade/caducidade do direito de ação, alvitrada pelo R., tudo com as legais consequências.”
O Município de Rio Maior apresentou contra-alegações, terminando as mesmas com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“i. A Recorrente, inconformada com o Douto Despacho Saneador proferido em 19.04.2022 com a Ref.ª SITAF 005480559 veio dele interpor o presente Recurso, não se conformando com o mesmo na parte em que apreciou a intempestividade do direito de ação, admitindo que a ação apenas é tempestiva quanto à alegação do vício de desvio de poder, excluindo a cognição e decisão sobre factos que possam ser geradores do vício da anulabilidade.
ii. A Recorrente vem peticionar a condenação do Recorrido, na prática do ato administrativo que entende a Autora ser o devido, ou seja, a decidir a Reclamação apresentada pela Autora em 13.07.2016 em conformidade com a mesma, fazendo relevar para efeitos de carreira e relativamente à avaliação para o biénio 2013/2014 a avaliação atribuída quanto ao ciclo de 2011 e assim praticar o ato administrativo devido, invocando que existiu má-fé na fixação dos objetivos para efeitos de avaliação do SIADAP para o biénio 2013/2014, que alegadamente não foram negociados com a Autora, e que eram impossíveis de atingir e humanamente impossíveis de concretizar, o que fez com que apenas tenha obtido a menção qualitativa nesse biénio de desempenho adequado.
iii. A Recorrente não se conformou com a avaliação obtida tendo apresentado reclamação nos termos do artigo 72.º do SIADAP, instituído pela Lei n.º 66-B/2007 de 28 de dezembro, a qual não obteve resposta e que considerou indeferida.
iv. Entende a Recorrente que estamos perante a recusa da prática de ato devido e assim, a forma processual adequada é a ação administrativa para condenação à prática de ato devido, a decisão sobre a reclamação que, reforçamos, a Autora entendeu já encontrar-se indeferida no dia seguinte ao términus do prazo fixado para a decisão.
v.
vi. Relativamente ao conteúdo do ato devido, o que vem a Autora referir nos artigos 178.º e seguintes da sua Douta PI, é que a avaliação para o biénio 2013/2014 não pode ser tida em conta, porque entende que o procedimento avaliativo se encontra inquinado de “(...) vício de desvio de fim (...)” – cfr. artigo 201.º da PI.
vii. E, consequentemente, não pode ser aplicada a avaliação de 2012 por arrastamento uma vez que vem referir que tal procedimento de avaliação também está ferido de nulidade por desvio de fim e ofensa ao conteúdo essencial de um direito fundamental – cfr. artigo 206.º da sua PI -, requerendo que lhe seja atribuída a avaliação do ano de 2011, conforme expõe na sua Reclamação que, repetimos novamente, a Autora entendeu já encontrar-se indeferida no dia seguinte ao términus do prazo fixado para a decisão – cfr. artigo 164.º da sua PI.
viii. Já em sede de Contestação, entendeu o Recorrido que a Recorrente incorre em erro na forma de processo, quando configura a sua ação como uma condenação à pratica do ato administrativo devido, e não como uma verdadeira ação de impugnação, que é o que pretende.
ix. Entende o Recorrido que sobre a Reclamação apresentada deu-se um ato de indeferimento tácito por força da ausência de resposta no prazo legal de 15 dias previsto no artigo 72.º da Lei n.º 66-B/2007 de 28 de dezembro, decorrente da aplicação à Reclamação apresentada pela Autora do regime do anterior CPA, conforme prevista no artigo 109.º do CPA aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91 de 15 de novembro.
x. Perante este indeferimento tácito, não restaria solução à Recorrente, a adoção de outra forma processual que não a de impugnação desse mesmo indeferimento – e já não, como entendido pelo Recorrido na sua Contestação, a condenação à prática do ato administrativo devido, o que foi apreciado em sede de Despacho Saneador, tendo-se concluído que não existia erro na forma de processo mas intempestividade no direito de ação quanto aos vícios geradores de mera anulabilidade.
xi. Os vícios imputados geradores de mera anulabilidade do procedimento avaliativo da Recorrente, encontram-se ultrapassados com o decurso do prazo de impugnação contenciosa do indeferimento tácito, como bem decidido pelo Despacho Saneador por ora em crise que, quanto à decisão tomada, não nos merece qualquer censura.
xii. A Recorrente veio interpor o presente Recurso do Despacho Saneador alegando que o que está em causa é uma ação de condenação do Recorrido no dever de decidir, designadamente, através da decisão da Reclamação apresentada pela Autora nos termos do n.º 1 do artigo 72.º do CPTA, estando inconformada com a ausência de decisão sobre a Reclamação deduzida.
xiii. A Recorrente, não pretende, no entanto, somente a resposta à sua Reclamação, pretende efetivamente a impugnação da homologação da avaliação do biénio 2013/2014 sem que para tal estivesse em tempo, tendo bem andado o Douto Tribunal ao decidir como decidiu em sede de Saneador, pela intempestividade.
xiv. Entende a Recorrente que o Douto Tribunal a quo incorre em erro quando enquadra a presente ação de condenação à prática do ato administrativo devido no n.º 2 do artigo 69.º do CPTA, e, portanto, sujeita ao prazo fixado nessa norma, no entanto não lhe assiste razão, devendo efetivamente a presente ação ser enquadrada no n.º 2 do artigo 69.º do CPTA.
xv. Conforme admitido pela Recorrente e referido pelo Recorrido na sua Contestação, a Reclamação apresentada foi objeto de indeferimento tácito, conforme prevista no artigo 109.º do CPA aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91 de 15 de novembro, e tendo sido objeto de indeferimento ter-se-á de aplicar o n.º 2 do artigo 69.º, que nos remete-nos para o disposto nos artigos 58.º, 59.º e 60.º do mesmo diploma.
xvi. E, desta feita, importa concluir como no Despacho Saneador, ou seja, quanto aos vícios que importariam a anulação do ato de homologação, que é o que se pretende com a procedência da Reclamação apresentada, o prazo previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º é de três meses e terminou em 25.10.2016, tendo a presente ação apenas dado entrada em 04.11.2016.
xvii. Pelo que, ante todo o exposto, e conforme determina o Douto Despacho Saneador, a ação apenas é tempestiva quanto à alegação do vício de desvio de poder, devendo, desta forma, improceder o Recurso apresentado pela Recorrente, mantendo-se o Douto Despacho Saneador como foi proferido.”
O Juiz Relator, por decisão sumária de 09/11/2022, negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida.
Notificada, veio a recorrente interpor reclamação para a conferência, entre o mais invocando a nulidade da decisão sumária por omissão de pronúncia.
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Perante as conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir:
- da nulidade da decisão sumária por omissão de pronúncia;
- do erro de julgamento da decisão recorrida ao considerar a ação tempestiva apenas quanto à alegação do vício de desvio de poder, e concluindo pela improcedência da exceção de intempestividade na prática do ato, com tais limites.
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II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Para conhecimento da aludida exceção, na decisão recorrida consideraram-se provados os seguintes factos:
A) A autora é funcionária da Câmara Municipal de Rio Maior (acordo);
B) O desempenho da autora foi avaliado, com atribuição de nota, quanto ao ciclo de 2013/2014, através de despacho homologatório de 05.07.2016 (cfr. doc. 3 e 4, da p.i.; a p. 46 do processo instrutor (PA) ficheiro 2013-2014);
C) A autora tomou conhecimento da decisão em 06.07.2016 (acordo – art. 160.º da p.i.; art. 10.º, da contestação; a p. 46, do PA);
D) A autora apresentou nos serviços da Câmara Municipal reclamação da decisão em 13.07.2016 (acordo – art. 161.º, da p.i.; art. 17.º, da contestação; doc. 5, da p.i.);
E) Não foi proferida de decisão sobre a reclamação (acordo – artigos 163.º e 164.º, da p.i.; artigos 17.º, 22.º, 23.º e 24.º, da contestação);
F) Petição inicial que suporta a presente acção foi remetida ao tribunal em 04.11.2016 (consulta sitaf).
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II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme supra enunciado, a questão a decidir cinge-se a saber se ocorre a nulidade da decisão sumária por omissão de pronúncia e o erro de julgamento da decisão recorrida ao considerar a ação tempestiva apenas quanto à alegação do vício de desvio de poder, e concluindo pela improcedência da exceção de intempestividade na prática do ato, com tais limites.

a) da nulidade da sentença por omissão de pronúncia

A reclamante invoca que a decisão sumária padece de nulidade, uma vez que não apreciou a questão de, improcedendo o recurso, a tempestividade propriamente dita do exercício do direito de ação, por serem atendíveis os factos alegados na PI consubstanciadores do vício de desvio de poder, relativamente ao que o Tribunal de 1.ª Instância admitiu ser de conhecer, por gerador de nulidade.
Nos termos do artigo 95.º, n.º 1, do CPTA, a sentença deve decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.
Por seu turno, decorre do artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, que é nula a sentença quando o juiz deixa de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
À evidência, tal nulidade não se verifica.
É consensual na nossa jurisprudência que esta omissão de pronúncia se verifica perante ausência de posição expressa ou de decisão expressa do tribunal sobre as matérias que os sujeitos processuais interessados submeteram à apreciação do tribunal em sede de pedido, causa de pedir e exceções, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, bem como sobre as que sejam de conhecimento oficioso, mas não perante a ausência de resposta concreta aos argumentos convocados pelas partes em defesa dos seus pontos de vista (cf., vg, os acórdãos do STA de 06/02/2019, proc. n.º 0249/09.0BEVIS 01161/16, e de 19/05/2016, proc. n.º 01657/12, e do TCAS de 10/01/2019, proc. n.º 113/18.2BCLSB, de 22/11/2018, proc. n.º 942/14.6BELLE, e de 16/12/2015, proc. n.º 04899/09, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
Isto posto, é com dificuldade que se alcança perceber a argumentação da recorrente quanto a esta suposta omissão de pronúncia.
A decisão sumária incidiu sobre a questão colocada no recurso, de ocorrer erro de julgamento da sentença, da decisão recorrida ao considerar a ação tempestiva apenas quanto à alegação do vício de desvio de poder, e concluindo pela improcedência da exceção de intempestividade na prática do ato, com tais limites.
Não cuidou o recurso, nem tinha evidentemente de cuidar a decisão sumária de qualquer outra questão, designadamente quanto ao decidido no despacho recorrido e que se consolidou na ordem jurídica.
Improcede, pois, a invocada nulidade da sentença.


b) do erro de julgamento

Consta da decisão recorrida a seguinte fundamentação:
Nas acções impugnatórias e nas acções de condenação à prática do acto devido, como é o caso dos presentes autos, o prazo de propositura da acção é de três meses, começando esse prazo a correr a partir da data da notificação do acto, nos termos previstos nos artigos 58.º, n.º 1, al. b), 59.º, n.º 2 e 69.º, n.º 2, do CPTA.
Ressalvam-se as situações de nulidade do acto, cuja impugnação não está sujeita a prazo, nos termos do artigo 58.º, 1, do CPTA e o pedido de condenação do acto devido está sujeito ao prazo de dois anos, nos termos admitidos no artigo 69.º, n.º 3, do CPTA.
Assim, a definição do prazo de propositura da acção determina-se pelo desvalor concreto provocado pelos vícios imputados ao acto administrativo, o que importa aferir atendendo ao alegado na petição inicial e tomar posição.
A respeito do desvalor nulidade dos actos administrativos, o artigo 161.º, n.º 2, do CPA elenca as situações determinantes de nulidade (cfr. redacção do CPA aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro). A norma, ainda que tenha sofrido alterações face à redacção anterior veio, no essencial, optar pela taxatividade legal dos actos nulos.
Por outro lado, o legislador manteve o desvalor de anulabilidade dos actos administrativos para cuja violação não se preveja outra sanção, conforme o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do CPA.
A análise que seja feita sobre o regime das invalidades do acto deve necessariamente ter em conta que, face ao referido, este tem por base a regra da anulabilidade dos actos ilegais e a consequente excepcionalidade do desvalor de nulidade que sobre os mesmos possa recair (cf. artigo 163.º, n.º 1, do CPA).
Por outro lado, como dispõe o artigo 161.º, n.º 1, do CPA, acto nulo será apenas aquele para o qual a lei comine expressamente essa forma de invalidade. Algumas dessas situações estão previstas no artigo 161.º, n.º 1, outras em lei ordinária ou diploma avulso.
Está assim instituído o regime da taxatividade legal da nulidade de actos administrativos.
Retomando a análise do caso concreto, vem a autora peticionar a condenação da demandada a praticar o acto devido que atribua, ao ciclo avaliativo de 2013/2014, a menção atribuída no ciclo de 2011. Ou seja, não se conforma com a decisão avaliativa proferida para o ciclo de 2013/2014, logo é sobre este acto que deve ser contabilizado o prazo para a propositura da presente acção (cfr. artigo 69.º, n.º 2, do CPTA), visto consubstanciar um acto de conteúdo positivo que se pretende ver substituído.
As causas invalidantes apontadas à deliberação que avaliou o desempenho para o ciclo do ano de 2012 apenas poderão ser conhecidas em sede incidental, nos termos do artigo 38.º, n.º 1, do CPTA, na estrita medida em que venham apontadas causas determinantes da sua nulidade e desde que a presente acção seja tempestiva, atenta a dependência daquelas causas àquelas que são apontadas à decisão que homologou a avaliação de desempenho para o ciclo de 2013/2014 e que suporta a condenação peticionada.
Mas vejamos antes qual prazo a que a acção está, efectivamente, sujeita, por força do regime previsto no artigo 58.º, n.º 1 aplicável ex vi artigo 69.º, n.º 2, do CPTA.
A autora alega que a decisão que homologou a sua avaliação de desempenho referente ao ciclo de 2013/2014 deve ser removida da ordem jurídica com base nas seguintes causas invalidantes: alteração do local de trabalho; alteração do conteúdo funcional da actividade (passou a desempenhar funções de leitura, interpretação e resumo de actas municipais, funções que resume a funções de arquivista); fixação unilateral dos objectivos, sem negociação; fixação apenas de um objectivo quando a lei impõe a fixação do mínimo de três objectivos; fixação de objectivos impossíveis de alcançar; inexistência de contacto funcional entre a avaliadora e avaliada; fixação dos objectivos naqueles moldes resulta «de uma revanche face ao pedido de afastamento da avaliadora» e da propositura de acções judiciais contra o Município.
Quanto à decisão que avaliou o desempenho no ciclo de 2012: vem alegado ter sido despojada das funções próprias da sua categoria de técnica superior (redução de competências/do conteúdo funcional), que isso viola garantias previstas no artigo 89.º RCTFP e que resulta da lógica de conflito firmada pela propositura de acções judiciais contra o município.
Invoca a nulidades dos actos avaliativos do ano de 2012 e do ciclo de 2013/2014, com base no vício de «desvio de fim» e de «ofensa ao conteúdo essencial de um direito fundamental».
Ora, quando a autora sustenta o desvio de fim, na medida em que os actos não prosseguem qualquer finalidade pública, mas assentam numa lógica de conflito pessoal firmada entre a autora e a demandada, está em rigor a invocar o vício de ‘desvio de poder para fins de interesse privado’ que, a provar-se, determina a nulidade dos actos (cfr. artigo 161.º, n.º 2, al. e), do CPA).
O vício de desvio de poder traduz-se no exercício de poderes discricionários quando estes hajam sido usados com um fim diverso daquele para que a lei os conferiu ou por motivos determinantes que não condigam com o fim visado pelo legislador que conferiu tais poderes. Trata-se de um vício que terá de ser demonstrado por quem impugna o acto (vide, ac. do TCAS de 29.10.2020, proc. 1154/06.8BELSB).
Entende-se que a autora alega, em termos suficientes, materialidade subjacente ao vício de desvio de poder na fixação dos objectivos SIADAP e na subtracção de competências funcionais, sendo que lhe caberá demonstrar tal motivação.
Por outro lado, fora daquela circunscrição delimitada em torno do vício de desvio de poder, entende-se não resultar alegada materialidade integradora da violação do conteúdo essencial de qualquer direito fundamental.
Assim, fora do âmbito do vício de desvio de poder, todos os restantes vícios apontados ao acto consubstanciam vícios de violação de lei para os quais o CPA prevê a mera anulabilidade (cfr. artigo 163.º, n.º 1, do CPA).
Ora, o prazo para a propositura de acção administrativa condenatória suportada num acto nulo é de dois anos, contados desde a data em que o acto foi notificado ao interessado (cfr. artigo 59.º, n.º 2, ex vi artigo 69.º, n.º 2, do CPTA, na redacção vigente na data da propositura da acção). No caso de utilização de meios de impugnação administrativa, aquele prazo suspende-se e retoma o seu curso com a notificação proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo decisório, consoante o que ocorra em primeiro lugar (cfr. artigo 59.º, n.º 4, ex vi artigo 69.º, n.º 2, do CPTA).
No caso em apreço, a autora foi notificada da decisão avaliativa do ciclo de 2013/2014 em 06.07.2016 (cfr. al. C, do probatório), data em que o prazo judicial para apresentar a acção administrativa iniciou o seu curso. Contudo, tendo apresentado reclamação administrativa em 13.07.2016 (cfr. al. D), a mesma não foi decidida, sendo que o órgão competente dispunha de 15 dias úteis para proferir decisão (cfr. artigo 72.º, n.º 1, da Lei n.º 66-B/2012, de 31.12). Assim, entre 06.07.2016 e 13.07.2016 decorreram sete dias e, ao fim do curso de 15 dias úteis sem que tenha sido proferida decisão sobre a reclamação, em 03.08.2016, o prazo retomou o seu curso. Em 04.11.2016, data em que a acção foi apresentada em tribunal (cfr. al. F, do probatório), ainda não tinha decorrido o prazo de dois anos previsto no artigo 69.º, n.º 3, do CPTA.
Mas se quanto ao vício de desvio poder a acção é tempestiva, visto consubstanciar um vício determinante da declaração de nulidade do acto cuja substituição vem peticionada, a verdade é que quanto aos restantes, a acção mostra-se intempestiva.
De facto, no caso da acção condenatória com base num acto meramente anulável, o prazo previsto no artigo 58.º, n.º 1, b), do CPTA é de três meses que, sendo influenciado por uma causa suspensiva (a utilização da impugnação administrativa prevista no artigo 72.º, da Lei n.º 66-B/2007), terá de ser convertido em 90 dias.
Ora, iniciado o prazo em 06.07.2016, visto ser essa a data em que a autora se considerou notificada da decisão (cfr. artigo 59.º, n.º 2, ex vi artigo 69.º, n.º 2, do CPTA), decorreram, como vimos, sete dias até 13.07.2016, data em que foi apresentada reclamação. Não tendo sido decidida, ao fim de 15 dias úteis, em 03.08.2016, como vimos, o prazo de 90 dias retomou o seu curso e terminou em 25.10.2016.
Nos termos do artigo 58.º, n.º 2, do CPTA, o prazo é contabilizado nos termos do artigo 279.º, do Código Civil e, dessa forma, sendo um prazo substantivo e não processual, é contado de forma contínua, sem possibilidade de suspensão em férias e sem a possibilidade de aplicação do regime previsto no artigo 139.º, do Código Civil (prática do acto processual além do prazo, mediante o pagamento de multa).
A petição foi apresentada em 04.11.2016, além do termo final fixado no dia 25.10.2016.
Face ao exposto, resta concluir que a acção apenas é tempestiva quanto à alegação do vício de desvio de poder.
Resta concluir pela improcedência da excepção de intempestividade na prática do acto, com os limites supra fixados.”.
Ao que contrapõe a recorrente, em síntese:
- pretende a condenação do réu a deferir a reclamação relativa ao ciclo avaliativo 2013-2014 com atribuição da mesma classificação que obteve no ciclo avaliativo de 2011;
- tratando-se de pedido de condenação à prática do ato devido na sequência de uma situação de inércia, nos termos do artigo 72.º, n.º 1, do SIADAP
- esta reclamação não é equiparável à reclamação administrativa prevista no artigo 191.º do CPA, que produz os efeitos previstos no artigo 59.º, n.º 4, do CPTA;
- o ato de homologação da avaliação, prévio à reclamação, não é, assim, um ato administrativo impugnado nos presentes autos, nem tem de o ser;
- a ação foi tempestivamente apresentada, ao abrigo do artigo 69.º, n.º 1, do CPTA;
Vejamos se lhe assiste razão.
A pretensão vertida na petição inicial apresentada pela ora recorrente é a condenação do réu à prática do ato devido, i.e., a reconhecer, designadamente nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 42.º, n.os 5 e 6, do Regime do SIADAP, e em conformidade com a reclamação apresentada em 13/07/2016, que a avaliação a relevar, para efeitos de carreira, e relativamente ao ciclo avaliativo de 2013-2014, é a avaliação atribuída quanto ao ciclo de 2011, com a respetiva menção qualitativa, condenando-se o réu, por meio do seu órgão executivo máximo, a praticar, nesses termos, o ato administrativo devido, ilegalmente omitido.
Os pressupostos da condenação à prática do ato devido constam do artigo 67.º do CPTA, o qual dispõe como segue, para o que aqui releva:
“1 - A condenação à prática de ato administrativo pode ser pedida quando, tendo sido apresentado requerimento que constitua o órgão competente no dever de decidir:
a) Não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido;
b) Tenha sido praticado ato administrativo de indeferimento ou de recusa de apreciação do requerimento;
c) Tenha sido praticado ato administrativo de conteúdo positivo que não satisfaça integralmente a pretensão do interessado. (…)
4 - A condenação à prática de ato administrativo também pode ser pedida sem ter sido apresentado requerimento, quando:
a) Não tenha sido cumprido o dever de emitir um ato administrativo que resultava diretamente da lei;
b) Se pretenda obter a substituição de um ato administrativo de conteúdo positivo.”
Já do artigo 69.º do CPTA, com a epígrafe ‘prazos’, consta o seguinte:
“1 - Em situações de inércia da Administração, o direito de ação caduca no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a emissão do ato ilegalmente omitido.
2 - Nos casos de indeferimento, de recusa de apreciação do requerimento ou de pretensão dirigida à substituição de um ato de conteúdo positivo, é aplicável o disposto nos artigos 58.º, 59.º e 60.º”
As situações são, pois, distintas.
Caso esteja em causa a mera inércia da Administração na emissão de ato, aplica-se o prazo de um ano.
Caso esteja em causa a substituição de um ato de conteúdo positivo, aplicam-se os prazos previstos nos normativos ali referenciados.
No que para aqui importa aqui o seguinte:
“Artigo 58.º
Prazos
1 - Salvo disposição legal em contrário, a impugnação de atos nulos não está sujeita a prazo e a de atos anuláveis tem lugar no prazo de:
a) Um ano, se promovida pelo Ministério Público;
b) Três meses, nos restantes casos.
2 - Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil, transferindo-se o seu termo, quando os prazos terminarem em férias judiciais ou em dia em que os tribunais estiverem encerrados, para o 1.º dia útil seguinte. (…)
Artigo 59.º
Início dos prazos de impugnação
1 - Sem prejuízo da faculdade de impugnação em momento anterior, dentro dos condicionalismos do artigo 54.º, os prazos de impugnação só começam a correr na data da ocorrência dos factos previstos nos números seguintes se, nesse momento, o ato a impugnar já for eficaz, contando-se tais prazos, na hipótese contrária, desde o início da produção de efeitos do ato.
2 - O prazo para a impugnação pelos destinatários a quem o ato administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento, ou da data da notificação efetuada em último lugar caso ambos tenham sido notificados, ainda que o ato tenha sido objeto de publicação, mesmo que obrigatória. (…)
4 - A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar.”
supra ficou enunciado o pedido formulado pela aqui recorrente, na sua essência, de condenação do réu à prática do ato devido, reconhecer que a avaliação a relevar, para efeitos de carreira, e relativamente ao ciclo avaliativo de 2013-2014, é a avaliação atribuída quanto ao ciclo de 2011, com a respetiva menção qualitativa.
Sabemos, por constar da matéria de facto dada como assente, que no biénio de 2013/2014, para efeitos de avaliação em SIADAP, a recorrente obteve a menção qualitativa de ‘desempenho adequado’, classificação inferior à do ciclo de 2011.
Com a qual não se conformou e apresentou reclamação nos termos do artigo 72.º do SIADAP 2007 (aprovado pela Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro).
Normativo que dispõe como segue:
“1 - O prazo para apresentação de reclamação do ato de homologação é de 5 dias úteis a contar da data do seu conhecimento, devendo a respetiva decisão ser proferida no prazo máximo de 15 dias úteis.
2 - Na decisão sobre reclamação, o dirigente máximo tem em conta os fundamentos apresentados pelo avaliado e pelo avaliador, bem como os relatórios da comissão paritária ou do conselho coordenador da avaliação sobre pedidos de apreciação anteriormente apresentados.”
Releva ainda o disposto no artigo 73.º do mesmo diploma legal, com a epígrafe ‘outras impugnações’ e a seguinte redação:
“1 - Do ato de homologação e da decisão sobre reclamação cabe impugnação administrativa, por recurso hierárquico ou tutelar, ou impugnação jurisdicional, nos termos gerais.
2 - A decisão administrativa ou jurisdicional favorável confere ao trabalhador o direito a ver revista a sua avaliação ou a ser-lhe atribuída nova avaliação.
3 - Sempre que não for possível a revisão da avaliação, designadamente por substituição superveniente do avaliador, é competente para o efeito o novo superior hierárquico ou o dirigente máximo do serviço, a quem cabe proceder a nova avaliação.”
É verdade que sobre a aludida reclamação não incidiu decisão no prazo legal de 15 dias úteis ali previsto.
Todavia, tal reclamação tem como objeto um ato administrativo de conteúdo positivo, qual seja, o ato de homologação da sua avaliação, por referência ao dito biénio.
E afigura-se incontornável que a recorrente pretende ver substituído tal ato, com atribuição de distinta menção qualitativa.
Nesta medida, a utilização de meio de impugnação administrativa não tem como consequência que o objeto da impugnação contenciosa deixe de ser o ato administrativo.
No caso, o ato de homologação da avaliação.
Como a recorrente não se conforma com esta decisão, será sobre este ato que deve ser contabilizado o prazo para a propositura da presente ação, nos termos que decorrem dos citados artigos 69.º, n.º 2, 58.º, n.º 1, al. b), e 59.º, n.º 4, do CPTA.
Ademais, porquanto estamos perante uma reclamação facultativa.
Vejamos porquê.
No âmbito do SIADAP 2004 foi objeto de discussão a natureza da reclamação aí prevista, orientando-se a jurisprudência no sentido da reclamação do ato de homologação da avaliação ser necessária (veja-se, v.g., o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11/03/2010, proferido no proc. n.º 0701/09, disponível em www.dgsi.pt).
Com o SIADAP 2007, o citado artigo 73.º, n.º 1, passou a prever indistintamente que do ato de homologação e da decisão sobre reclamação cabe impugnação administrativa, cabe recurso hierárquico ou tutelar, ou impugnação jurisdicional, levando a crer que já se alterara a natureza desta reclamação.
O que se tornou inequívoco perante o artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro (que aprovou o novo Código do Procedimento Administrativo), o qual, sob a epígrafe ‘impugnações administrativas necessárias’, estatui como segue:
“As impugnações administrativas existentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei só são necessárias quando previstas em lei que utilize uma das seguintes expressões:
a) A impugnação administrativa em causa é «necessária»;
b) Do ato em causa «existe sempre» reclamação ou recurso;
c) A utilização de impugnação administrativa «suspende» ou «tem efeito suspensivo» dos efeitos do ato impugnado.”
Trata-se, pois, de uma enumeração taxativa dos casos em que se devem considerar como necessárias as impugnações administrativas existentes à data da entrada em vigor do novo Código do Procedimento Administrativo.
Como bem se vê, não consta dos citados artigos 72.º e 73.º do SIADAP 2007 qualquer menção às expressões previstas no artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, ou sequer expressão semelhante.
Afigura-se, pois, inequívoco que a reclamação do ato de homologação tem natureza facultativa (vejam-se, neste sentido, os recentes acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 28/10/2022, proc. n.º 01134/19.3BEAVR, e de 25/02/2022, proc. n.º 00010/20.1BEAVR, disponíveis em www.dgsi.pt).
Daí que o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo se iniciou no dia 06/07/2016, data da notificada da decisão de homologação da avaliação, cf. artigo 59.º, n.º 2, do CPTA, suspendeu-se com a utilização do referenciado meio de impugnação administrativa, e retomou o seu curso com o decurso do respetivo prazo decisório, cf. artigo 59.º, n.º 4, do CPTA.
E no mais, a recorrente não disputa o acerto da contagem do prazo que consta da decisão recorrida, concluindo que o prazo de três meses previsto no artigo 58.º, n.º 1, al. b), do CPTA, terminou em 25/10/2016.
Pelo que, inapelavelmente, tendo a ação sido instaurada no dia 04/11/2016, terá de proceder a exceção de intempestividade quanto aos vícios imputados geradores de mera anulabilidade.

Termos em que se conclui ser de indeferir a reclamação para a conferência da decisão sumária, que negou provimento ao recurso e manteve a decisão recorrida.
*

IV. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em indeferir a reclamação para a conferência e assim negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.
Custas a cargo da reclamante.

Lisboa, 12 de janeiro de 2023

(Pedro Nuno Figueiredo)

(Ana Cristina Lameira)

(Ricardo Ferreira Leite)