Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1955/17.1BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 09/24/2020 |
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Relator: | SOFIA DAVID |
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Descritores: | RECURSOS ADMINISTRATIVOS ESPECIAIS; 199.º DO CPA; PRESIDENTE DO CONSELHO DIRECTIVO DO IFAP; SUSPENSÃO DO PRAZO DE IMPUGNAÇÃO CONTENCIOSA; ART.º 59.º, N.º 4, DO CPTA. |
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Sumário: | I - Os recursos administrativos especiais só são um meio de reacção administrativa legalmente aceite se estiverem expressamente previstos na lei, tal como se estipula no art.º 199.º, n.º 1 e 2 do CPA. Ou seja, só “há lugar” a recursos administrativos especiais, a apresentar conforme o art.º 199.º do CPA, quando os mesmos estejam previstos em lei – especial, porque fora do regime geral do CPA; II – Não está prevista na lei a possibilidade de recurso administrativo dos actos do Presidente do Conselho Directivo (CD) do IFAP para o CD do IFAP; III - A apresentação de um recurso ilegal não tem a virtualidade de accionar a suspensão do prazo de impugnação contenciosa do respectivo acto administrativo, nos termos do art.º 59.º, n.º 4, do CPTA. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO A Confederação Nacional dos Jovens Agricultores e do Desenvolvimento Rural (CNJADR) interpôs recurso da decisão do TAC de Lisboa que julgou verificada a excepção de caducidade do direito de acção e absolveu o R., Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP (IFAP) da acção. Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: ”1. O douto Despacho Saneador-Sentença, proferido pelo Tribunal a quo, considerou relevante a invocação de uma exceção alegada pelo Recorrido, determinando a procedência daquela nos seguintes termos: “(…) Em face do exposto, julga-se verificada a caducidade do direito de ação, fundamento que obsta ao prosseguimento do processo, impedindo, portanto, o conhecimento do mérito da causa e determina a absolvição da instância (…)”. 2. Ora, não se conformando com tal decisão, apresenta a Recorrente a presente apelação porquanto subsiste o equívoco quanto ao recurso tutelar apresentado, que é confundido com uma reclamação administrativa que nunca foi apresentada. 3. Na realidade, o recurso tutelar, vulgo recurso especial administrativo – porque é assim que a norma o classifica – foi apresentado tempestivamente e motivado - vide documento junto com requerimento de 9 de março de 2018 e que ora se anexa ao presente recurso como documento n.º 1. 4. O recurso tutelar / especial administrativo, tem a sua definição, natureza e enquadramento pelo artigo 199º do CPA, tendo sido apresentado ao abrigo do disposto no artigo 199º-1-a) – CPA, que nos diz o seguinte: “Nos casos expressamente previstos na lei, há lugar a recursos administrativos: a) Para órgão da mesma pessoa coletiva que exerça poderes de supervisão;”. 5. Como foi referido na peça supra invocada, “(…) O ato de que se recorre, foi emanado por entidade – no caso em apreço o Presidente do Conselho Diretivo do IFAP – ao abrigo de competências delegadas constituindo o normativo supra a legislação habilitante. Tal como supra, referido, não obstante a delegação de competências, a verdade é que o IFAP tem por missão proceder à validação e ao pagamento decorrente do financiamento da aplicação das medidas definidas a nível nacional e comunitário, no âmbito da agricultura, desenvolvimento rural, pescas e setores conexos.”. 6. Ora como refere o disposto no n.º 4 do artigo 199º/CPA – “No recurso tutelar, a modificação ou a substituição do ato recorrido ou omitido só é possível se a lei conferir poderes de tutela substitutiva e no âmbito destes.” – Pelo que sobre tal tema, o próprio recurso tutelar (recurso especial administrativo) enquadra o problema: 7. “(…) O disposto na alínea i) do n.º 2 do artigo 5º do mesmo normativo (leia-se decreto-lei n.º 155/2012, de 23 de agosto), refere ainda, competir, sem prejuízo das competências delegadas e subdelegadas – ao conselho diretivo, o assegurar das condições necessárias ao controlo da aplicação dos regimes de ajudas e apoios na área da agricultura e pescas, bem como o controlo financeiro e orçamental que deva ser realizado por entidades legalmente competentes, nacionais ou comunitárias. Pelo que, é indiscutível que o conselho diretivo do IFAP mantém a supervisão, não obstante a delegação de competências ou subdelegação das mesmas (vulgo, no Presidente), razão pela qual se invoca a possibilidade de apresentar o presente recurso nos termos em que o faz e com os fundamentos que o mesmo contém”. 8. “Aliás, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 12º do mesmo normativo (supra, referido), os termos e as condições de aceitação de acordos de pagamento das dívidas de capital e juros são definidos pelo conselho diretivo do IFAP.” 9. “Julga-se o presente recurso devidamente enquadrado à luz das normas supra invocadas.”. 10. Assim, a Recorrente, após fundamentar e enquadrar face ao regime do recurso tutelar, leia-se recurso especial administrativo, apresentou o mesmo relativamente ao ato de que pretendia recorrer, e que se consubstanciava na decisão contida na notificação efetuada em 31 de março de 2017, pelo IFAP à Recorrente, no âmbito do PRODER 1 – Ação 4.2.1 Formação Especializada, operação n.º .......... – processo n.º 1193/2016/PRVIDE. 11. Ora, a motivação do douto despacho saneador-sentença, revela bem o equívoco ora evidenciado ao confundir o recurso tutelar, tempestivamente apresentado e fundamentado, com a figura da reclamação, nomeadamente quando refere: “Ademais, pese embora tenha apelidado o requerimento apresentado em 09.05.2017 de “recurso especial administrativo”, o certo é que dirigiu o mesmo ao autor do ato administrativo com o qual não se conforma e como tal o mesmo não pode deixar de consubstanciar uma reclamação sujeita ao prazo de 15 dias (quando a lei não estabeleça prazo diferente – como in casu parece suceder) e onde o órgão competente dispõe do prazo de 30 dias para apreciar e decidir (cfr. Arts. 191º e 192º do CPA).” – Ora, não é nada disto! 12. A verdade é que tal apreciação evidencia uma errónea interpretação e má aplicação da lei substantiva, desvirtuando as figuras, os factos e as consequências legais, nomeadamente quando considera – como fez – a caducidade do direito de ação, o que se refere sem conceder. 13. Assim, considerou o douto despacho saneador-sentença, que se verificou uma extemporaneidade da peça que classificou erroneamente como «reclamação administrativa», apresentada junto do IFAP, em 09.05.2017, e que tal terá impossibilitado que o prazo de impugnação contenciosa do ato em crise se suspendesse, o que se refere sem conceder. Concluiu ainda, que a ação de impugnação foi apresentada fora de prazo (01.09.2017), por supostamente terem decorridos mais de três meses, o que não é verdadeiro como demonstraremos, procedendo a exceção dilatória invocada pelo Recorrido, o que se refere sem conceder. 14. Ora, não tem acolhimento o douto entendimento supra. Na realidade, tal como observa o disposto no n.º 5 do artigo 199º/CPA, aos recursos tutelares, ou recursos especiais administrativos, são aplicáveis as disposições reguladoras do recurso hierárquico. 15. A notificação da decisão, foi concretizada em 31 de março de 2017, pelo que o prazo de trinta dias - como determina o n.º 2 do artigo 193º/CPA – para apresentação do recurso tutelar ou recurso especial administrativo, terminou em 17 de maio de 2017, pelo que o tal prazo foi cumprido a 9 de maio de 2017. Portanto tempestivamente. 16. Por outro, a ação de impugnação foi intentada em 1 de setembro de 2017, tempestivamente dizemos. Na realidade, a Recorrente foi notificada da decisão em crise, numa 6ª-feira, dia 31 de março de 2017, pelo que o prazo de três meses se iniciou no primeiro dia útil seguinte, ou seja, 2ª-feira, dia 3 de abril. 17. Ora, de 3 a 7 de abril, decorreram 5 (cinco) dias do prazo, porquanto a 8 se iniciaram as férias judiciais. O prazo recomeçou – após findarem as férias judiciais – a 18 de abril, contando-se até ao dia 24 de abril, mais 5 (cinco) dias, num total de 10 (dez) em três meses possíveis. 18. O dia 25 de abril é feriado, e o prazo recomeçou a contagem em 26 de abril até 8 de maio, contabilizando-se um total de 18 (dezoito) dias decorridos desde a data da notificação num praz máximo possível de três meses. 19. Continuando, a 9 de maio entrou o recurso tutelar, vulgo recurso especial administrativo, que faz suspender o prazo, pelo que o mesmo só recomeça em 9 de junho indo até ao dia 12 de junho, contabilizando mais dois dias. 20. A 13 de junho, suspende-se o prazo por ser feriado, recomeçando aquele a 14 e suspendendo de novo a 15 por ser novamente feriado. Assim, recomeça o prazo em 16 de junho e até 14 de julho, último dia antes de começarem as férias judiciais de Verão, pelo que decorreram m um total de 42 (quarenta e dois) dias contabilizados no total. Portanto, muito longe de estarem decorridos três meses. 21. A Ação entrou em 1 de setembro de 2017, primeiro dia após terminarem as férias judiciais, razão pela qual a ação de impugnação é tempestiva. 22. Acresce, face ao supra exposto, e também em observância do disposto no artigo 149º-3/CPTA, se requer aos Venerandos Desembargadores a apreciação de mérito contida na ação de impugnação, por não apreciada, devendo a mesma ser procedente por justos os fundamentos de facto e de Direito que a mesma contém, só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!“. O Recorrido nas contra-alegações formulou as seguintes conclusões: “A. A presente acção é intempestiva. B. De facto, a notificação ao Recorrente, da decisão do Recorrido, que deve ser considerada para efeitos de contagem do prazo para a propositura da acção, encontra-se consubstanciada no ofício com a referência .........., com data de saida de 30/03/2017, que lhe foi notificado em 31/03/2017. C. Com efeito, nos termos previstos na al. b) do nº 2 do artº 58º e 59º do CPTA, a impugnação de actos anuláveis tem lugar no prazo de três meses, a contar, entre outros factos, da data de notificação do respectivo acto. D. Ora, tendo a decisão do Recorrido sido notificada ao Recorrente em 31/03/2017, o prazo de três meses para a propositura da acção terminaria em 30.06.2017. E. A a providencia cautelar, na melhor das hipóteses, foi interposta em 04.07.2017, onde tal prazo já se encontraria precludido. F. Apresente acção foi instaurada em 01.09.2017 com pedido de anulabilidade do ato. G. Constata-se assim, a presença de uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso, que obsta ao prosseguimento do processo e ao conhecimento do mérito da causa e conduz à absolvição da instância, o que desde já aqui se requer (cfr. arts. 493º e segs. e 288º do C.P.C. e alínea h) do nº 1 do artº 89º do CPTA). H. Relativamente à suposta reclamação efectuado junto dos serviços do IFAP à qual foi atribuído nome de “recurso especial administrativo”..” I. Dispõe o nº 4 do Artº 59º do Código do Procedimento Administrativo (adiante designado por CPA) que “a utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar”. J. No entanto, nos termos do disposto do Artº 185º do CPA “as reclamações e os recursos são necessários ou facultativos, conforme dependa, ou não, da sua prévia utilização a possibilidade de acesso aos meios contenciosos de impugnação ou condenação à prática de ato devido”. K. Ora, face ao disposto no nº 2 do Artº 189º do CPA, “as impugnações facultativas não têm efeito suspensivo, salvo nos casos em que a lei disponha o contrário ou quando o autor do ato, ou o órgão competente para conhecer do recurso, oficiosamente ou a pedido do interessado, considere que a sua execução imediata causa prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação ao destinatário e a suspensão não cause prejuízo de maior gravidade para o interesse público”. L. Face ao exposto, verifica-se que na situação em apreço, entre a notificação à Recorrente da decisão e a sua impugnação judicial, decorreram mais de 3 meses. M. Razão pela qual, nos termos da alínea b) do nº 1 do Artº 58º, encontra-se caducado o direito de ação por parte da Recorrente, razão pela qual só a absolvição do Recorrido da instância se afigura como uma boa decisão. N. Face ao exposto, salvo melhor entendimento, verifica-se que relativamente a todas as questões suscitadas pela ora recorrente, a sentença recorrida ao julgar improcedente a ação, absolvendo o réu, fez uma correta interpretação dos factos e do direito, não merecendo por isso qualquer censura.” O DMMP apresentou pronúncia no sentido da improcedência do recurso. II – FUNDAMENTAÇÃO II.1 – OS FACTOS Na 1.ª instância foram fixados os seguintes factos, que não vêm impugnados, pelo que se mantém: 1. Em 26.01.2016 foi homologado pelo Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural o relatório I/1417/15 e respectivas conclusões da Inspecção Geral dos Ministérios do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia e da Agricultura e do Mar (IGAMAOT), realizado à operação nº.......... e referente a controlo ex-post no âmbito do Regulamento (UE) nº65/2011 da Comissão, de 27 de Janeiro. Facto admitido por acordo e Doc.1 anexo à Petição Inicial (PI). 2. Em 18.03.2016 o Secretariado Técnico da Autoridade de Gestão efectuou a reanálise dos pedidos de pagamento, tendo em conta as irregularidades encontradas pela IGAMAOT, acabando por concluir que, na operação supra referida, havia sido pago um montante de subsídio de €830.018,46, quando deveria ter sido pago o montante de €814.477,99 e a necessidade de devolução pela Autora de €15.540,47. Cfr. Doc.1 anexo à PI. 3. A Autora, notificada para se pronunciar sobre essa intenção ao abrigo dos arts.121º e 122º do CPA por ofício de 06.07.2016 e recebido em 07.07.2017, contestou a exclusão de despesas apresentadas respeitantes à prestação de serviços de contabilidade constantes da alínea c) do ponto 2 do citado ofício. Cfr. Doc.2 anexo à PI. 4. Perante tal posição o IFAP entendeu realizar uma diligência complementar tendo solicitado à Autora o envio de elementos que confirmassem os encargos com contabilidade incorridos no ano de 2012. Cfr. Doc.9 anexo à PI. 5. Embora a Autora tenha remetido, através do requerimento datado de 28.11.2016, uma nota de honorários discriminadora da factura 60/2013, ainda assim, por despacho do Presidente do Conselho Directivo do IFAP, de 30.03.2017, foi determinada a modificação unilateral do contrato de financiamento nº.......... e a devolução da verba indevidamente recebida no montante de €15.540,47 e que caso não se verifique a restituição voluntária da quantia referida, será o montante em dívida compensado nos termos legais com créditos que venham a ser ser-lhe atribuídos, seguindo-se na falta ou insuficiência destes, a instauração do processo de execução fiscal, com vista à cobrança coerciva do valor em dívida, no qual serão pedidos para além do capital, os juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral reembolso. Cfr. Docs.1 e 10 anexos à PI. 6. Tal despacho foi notificado à Autora em 31.03.2017. Cfr. Doc.1 anexo à PI. 7. Em 09.05.2017 a Autora reagindo contra tal despacho dirigiu ao Presidente do Conselho Directivo do IFAP, IP um requerimento que apelidou de “recurso especial administrativo” onde solicita, entre o mais, a suspensão do acto por resultar da execução imediata do mesmo prejuízos consideráveis e relevantes. Cfr. Docs.2 e 3 juntos no requerimento de 03.08.2017 no processo cautelar Proc.1575/17.0BELSB. 8. A Autora, reagindo contra o despacho do Presidente do Conselho Directivo do IFAP, IP, de 30.03.2017, intentou neste Tribunal o processo cautelar, previamente à instauração da presente acção, que correu os seus termos sob o nº1575/17.0BELSB04.07.2017. Cfr. fls.1 dos autos cautelares e requerimento inicial (RI) e Doc.1 ali anexo. 10. A presente acção foi instaurada em 01.09.2017. Cfr. fls.1 (em suporte físico) do Proc.1955/17.1BELSB. Nos termos dos art.ºs. 662.º, n.º 1 e 665.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (CPC), acrescenta-se o seguinte facto, por provado: 11 – O requerimento referido em 7. teve o teor constante do doc. junto com o recurso. II.2 - O DIREITO As questões a decidir neste recurso são: - aferir do erro decisório porque o A. e Recorrente apresentou um recurso especial administrativo ou tutelar, nos termos do art.º 199.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e não uma reclamação, pelo que o prazo para a apresentação da presente acção ficou suspenso nos termos do art.º 59.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA). Como decorre dos factos provados, através desta acção o A. e Recorrente pretende reagir contra o despacho do Presidente do Conselho Directivo (CD) do IFAP, de 30/03/2017, que determinou a modificação unilateral do contrato de financiamento nº .......... e a devolução da verba indevidamente recebida, no montante de €15.540,47, assim como, que determinou que caso não se verifique a restituição voluntária da quantia referida, será o montante em dívida compensado nos termos legais com créditos que venham a ser atribuídos ao A., seguindo-se, na falta ou insuficiência destes, a instauração do processo de execução fiscal com vista à cobrança coerciva do valor em dívida, no qual serão pedidos para além do capital, os juros de mora vencidos e vincendos, até efectivo e integral reembolso. A indicada decisão foi notificada ao A. em 31/03/2017. Em 09/05/2017, o A. apresentou junto do IFAP um requerimento dirigido ao Presidente do CD do IFAP, que apelidou de “recurso especial administrativo”, onde solicita, entre o mais, a suspensão do acto por resultar da execução imediata do mesmo, prejuízos consideráveis e relevantes. A presente acção foi instaurada em 01/09/2017. Na sentença recorrida entendeu-se que o requerimento apresentado no IFAP, em 09/05/2017, constituía uma reclamação, apresentada ao próprio autor do acto, já extemporânea. Consequentemente, considerou-se que a interposição de uma reclamação extemporânea não tinha por virtualidade fazer suspender o prazo para a impugnação judicial do acto reclamado. Não se acompanha tal fundamentação, sem embargo de se acompanhar o sentido da decisão que foi tomada pelo Tribunal ad quo. Conforme factos provados, apesar do A. e Recorrente ter apresentado um requerimento dirigindo-o ao autor do acto impugnado, o Presidente do CD do IFAP, enquadrou-a expressamente no art.º 199.º, n.º 1, al a), do CPA e apelidou-o de “recurso especial administrativo”. Depois, no corpo desse requerimento explicou o “enquadramento legal do presente recurso”, invocando a orgânica do IFAP, o facto do CD do IFAP ser um órgão colegial, que delegou competências de decisão no seu Presidente e a necessidade do acto sindicado - da autoria do Presidente, alegadamente no uso de competências delegadas concedidas pela Deliberação n.º 512/2015, de 13/04 - ser revisto pelo CD do IFAP – o órgão delegante e originalmente competente face aos art.ºs. 5.º, n. º2, al. i), 12.º, n.ºs 1 a 3, do Decreto-Lei n.º 195/2012, de 23/08. Naquele requerimento, o A. e Recorrente invoca também os poderes de supervisão do CD do IFAP face aos actos do respectivo Presidente e, por isso, aduz que apresenta o indicado recurso nos termos do art.º 199.º, n.º 1, al a), do CPA. Neste enquadramento factual, a reacção administrativa apresentada pelo A. e Recorrente não pode ser entendida como uma reclamação para o próprio autor do acto – o Presidente do CD do IFAP – mas tem de ser entendida como uma impugnação graciosa apresentada ao órgão delegante – o próprio CD do IFAP (cf. art.ºs 191.º e 199.º do CPA). Ou seja, o requerimento apresentado pelo A. e Recorrente em 09/05/2017 não pode ser considerado como uma reclamação administrativa para o próprio autor do acto, a interpor em 15 dias (cf. art.º 191.º do CPA), mas tem de ser considerado como um recurso administrativo especial, que vêm previsto no art.º 199.º do CPA. Acontece, que os indicados recursos administrativos especiais só são um meio de reacção administrativa legalmente aceite se estiverem expressamente previstos na lei, tal como se estipula no art.º 199.º, n.º 1 e 2 do CPA. Ou seja, só “há lugar” a recursos administrativos especiais, a apresentar conforme o art.º 199.º do CPA, quando os mesmos estejam previstos em lei – especial, porque fora do regime geral do CPA. Ora, o recurso que o A. e Recorrente apresentou em 09/05/2017 não está previsto na lei orgânica do IFAP ou em qualquer outra lei. Isto é, não está prevista na lei a possibilidade de recurso administrativo dos actos do Presidente do CD do IFAP para o CD do IFAP. Por isso, o recurso que o A. apresentou é um recurso ilegal, ou não pode ser entendido e enquadrado como um recurso administrativo especial a que alude o art.º 199.º do CPA. Acresce, que tal recurso também nunca poderia ser enquadrado na al. a) do n.º 1 do art.º 199.º do CPA, porque o CD do IFAP não exerce poderes de supervisão sobre o seu Presidente, nem pode ser entendido como um recurso tutelar, pois tal tutela, no caso, inexiste. Mais se indique, que se existisse lugar a recurso dos actos do Presidente do IFAP para o CD do IFAP, tal enquadrar-se-ia, provavelmente, na al. b) do n.º 1 ou no n.º 2 do art.º 199.º do CPA e não na invocada al. a). Em suma, o recurso que o A. e Recorrente apresentou em 09/05/2017 era legalmente inadmissível. Por conseguinte, a apresentação de um recurso claramente ilegal – que não existe, que não é legalmente permitido – não tem a virtualidade de accionar a suspensão do prazo de impugnação contenciosa do respectivo acto administrativo, nos termos do art.º 59.º, n.º 4, do CPTA. Nesse mesmo sentido já decidiu o STA no Ac. 0743/07, de 16704/2008, onde se julgou da seguinte forma: “dissentimos da ideia que a utilização de meios de impugnação contenciosa suspende sempre o prazo de impugnação contenciosa. E esta questão é decisiva. Neste ponto consideramos que, sob pena de a reacção administrativa degenerar em mero expediente para obter a dilação injustificada do prazo de impugnação contenciosa, o efeito suspensivo previsto no art.º 59º/4 do CPTA, não ocorre (entre outras situações possíveis cuja ponderação não interessa à economia da presente revista) quando o meio de impugnação administrativa utilizado não estiver legalmente previsto. (vide, neste sentido, Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in “Código de Processo Nos Tribunais Administrativos”, I, p. 392). Ora, no caso em apreço, o recorrente lançou mão, como vimos, de um recurso tutelar ilegal, por não estar expressamente previsto por lei (art.º 177º/2 CPA). Assim, dada a inadmissibilidade legal do meio utilizado e a falta de poder dispositivo da entidade tutelar, na matéria em causa, não há justificação racional para que, no caso concreto, opere a suspensão do prazo de impugnação contenciosa prevista no art.º 59º/4 CPTA.” Acompanhando tal jurisprudência, Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha indicam relativamente ao art.º 59.º do CPTA o seguinte: “a relevância suspensiva do prazo de impugnação contenciosa, prevista no n.º 4, só opera se a impugnação administrativa utilizada for admissível. Nos termos do art.º 199.º do CPA, os recursos administrativos especiais – isto é, as impugnações administrativas que não sejam reclamações nem recursos hierárquicos - só são admissíveis nos casos expressamente previstos na lei. Na ausência de lei que os preveja, eles não são, pois, admissíveis, pelo que não existe o dever legal de serem decididos, nem a sua utilização releva para o efeito previsto no n.º4 deste artigo 59.º. E o mesmo vale, também, no que diz respeito aos recursos hierárquicos, no caso de a lei excluir a possibilidade de recurso hierárquico ou de o ato ter sido praticado por órgão não sujeito aos poderes hierárquico de outro órgão, e, no tocante à reclamação para o autor do ato, no caso de se tratar uma segunda reclamação do mesmo ato, que só admissível com fundamento em omissão de pronúncia (cfr. artigos 191, n.2 2, e 193.º, n.º 1, alínea a), do CPA) É também necessário, como foi decidido no acórdão do STA de 26 de março de 2009, Processo n.º 1053/08), que a Impugnação administrativa tenha sido deduzida dentro do respectivo prazo. Para o efeito, há que considerar as diversas formas de apresentação dos requerimentos previstas no artigo 104.º do CPA e os momentos que, para cada uma delas, este artigo considera como sendo o da apresentação (o da respetiva entrega, quando o requerimento seja apresentado nos serviços; a da efetivação do registo, quando a remessa for efetuada por correio; o do termo da expedição, se o envio for por telefax; o da expedição, se o envio for feito por transmissão eletrónica de dados).” – in ALMEIDA, Mário Aroso De; CADILHA, Carlos Alberto Fernandes - Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos. 4.ª ed. Coimbra: Almedina, 2017, pp. 413-414. Em suma, o recurso que o A. e Recorrente apresentou em 09/05/2017 era manifestamente ilegal, porque inadmissível, por não estar previsto legalmente para a situação em apreço. Por isso, a interposição de tal recurso não fez suspender o prazo para a reacção contenciosa nos termos do art.º 59.º, n.º 4, do CPTA. Portanto, tendo o A. e Recorrente sido notificado da decisão impugnada em 31/03/2017, sendo-lhe assacáveis invalidades conducentes à sua anulabilidade, o prazo para o accionamento desta acção era de 3 meses, conforme previsto no art.º 58, n.º 1, al. b), do CPTA. Logo, em 01/09/2017, a data em que A. e Recorrente apresentou a presente acção, já estava caducado o seu direito de acção. Em suma, há que confirmar a decisão recorrida, que está certa, ainda que não se acompanhe a sua fundamentação. III- DISPOSITIVO Pelo exposto, acordam: - em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida, com diferente fundamentação. - custas pelo Recorrente (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA). Lisboa, 29 de Setembro de 2020. (Sofia David) O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art.º 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Dora Lucas Neto e Pedro Nuno Figueiredo. |