Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08119/11
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:02/20/2014
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:ARTIGO 28º DO DECRETO-LEI N.º 204/98, DE 11.07
PUBLICAÇÃO DO AVISO DE ABERTURA DE CONCURSO
CONCURSO MISTO
FORMALIDADE ESSENCIAL
Sumário:I - O n.º 3 do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07, impõe no caso de um concurso misto as publicações quer no DR, quer em órgão da imprensa de expansão nacional, quer nos locais em que tenham acesso os funcionários.

II - O facto de o legislador ter utilizado a expressão «publicações» no n.º 3 do artigo 28º, não afasta a obrigação de publicitação referida no n.º 2 do mesmo artigo, por afixação, ou por notificação ou por outro meio. Ali a expressão «publicações» é sinónimo de publicitação, divulgação, anúncio a todos os interessados.

III -Não tendo o aviso de abertura cumprido as exigências legais de publicitação, violou-se uma formalidade essencial, prevista no artigo 28º, n.ºs 1 a 3 do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07, que inquina ab initio todo o concurso.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Recorrente: Ministério das Finanças e da Administração Pública
Recorrido: Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul
Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa, que anulou o despacho do Director-Geral dos Impostos, de 16.11.2007, exarado na Informação n.º 105/2007, da Direcção Geral de Gestão de Recursos Humanos, que anulou o procedimento concursal a partir da publicitação do aviso de abertura n.º 6329/2006, publicado no DR, II série, n.º 107, de 02.06.2006 e que condenou o R. a reiniciar o procedimento de concurso publicitando o referido concurso.
Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões:
«A) A douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 4 de Fevereiro de 2011, que julgou procedente a presente acção, determinando a anulação do despacho da ER, com data de 16/11/2007- e, bem assim, a anulação de todo o procedimento concursal em questão, a partir da publicitação do respectivo aviso de abertura, condenando a ER a reiniciar esse procedimento, publicitando o referido concurso conforme a interpretação do art. 28º do Decreto-Lei nº 204/98, de 11 de Junho, sustentada na sentença- enferma, com o devido respeito, de erro na aplicação e interpretação do direito, do art. 28º do DL nº 204/98, de 11 de Julho, designadamente do disposto no nº 3.
B) Tal erro consubstancia-se em ter considerado aplicável ao procedimento concursal em questão, a publicitação através de afixação- do aviso de abertura- "em local do serviço a que tenham acesso todos os funcionários, sem prejuízo da notificação a todos os que justificadamente estejam ausentes", prevista no nº 2 desse artigo, para o concurso limitado.
C) Mesmo que se interpretasse o nº 3 do art. 28º no sentido defendido pelo A, o aviso de abertura do concurso não teria de ser afixado no Serviço de Finanças de Odivelas, uma vez que, atendendo ao lugar e carreira a que se destina- assistente administrativo especialista-, não existem, nos Serviços de Finanças, funcionários da carreira de assistente administrativo, sendo que a representada do A. prestava serviço, no SF de Odivelas, não como assistente administrativa, mas como Técnica de Administração Tributária Adjunta Estagiária, do Grupo de Administração Tributária (GAT), logo, numa carreira diferente.
D) Assim, tal afixação- do aviso de abertura, no SF de Odivelas- não teria qualquer razão de ser, na medida em que, apenas, nos Serviços Centrais e nas Direcções de Finanças, existem funcionários da carreira administrativa, pelo que a ER, ao afixar o aviso de abertura do concurso em questão nos serviços em que se encontravam funcionários da carreira administrativa, como aconteceu na DF de Lisboa, cumpriu rigorosamente a primeira parte do nº 2 do art. 28° do Decreto-Lei nº 204/98, de 11 de Julho.
E) Colocam-se dúvidas quanto à interpretação que é conferida pelo Autor ao artigo 28° do Decreto-Lei nº 204/98 pois, embora o nº 3 desse artigo, cuja epígrafe é "Publicidade", disponha "Nos concursos mistos há lugar a ambas as publicações previstas nos números anteriores", a verdade é que, apenas, no nº 1 são referidas duas publicações (concretamente a publicação do aviso de abertura em Diário da República e a publicação em órgão de imprensa de expansão nacional).
F) Na verdade, no nº 2 o legislador alude a outra forma de publicidade, concretamente a afixação de aviso de abertura, o que não consubstancia uma publicação.
G) Ora, referindo-se o nº 3 do referido preceito, apenas, às publicações e não a qualquer outra forma impessoal de publicidade, como deveria acontecer, tendo em atenção a epígrafe do preceito, tanto mais que no nº 2 estão contempladas outras formas de publicidade, parece que o nº 3 reporta-se, tendo em consideração a letra da lei e a sistemática usada, apenas, às publicações previstas no nº 1, e não a qualquer outra forma de publicitação ou de publicidade.
H) Do exposto, subsiste a dúvida sobre se o legislador, no nº 3 do art. 28", quis, efectivamente, referir-se a ambas as publicações previstas "nos números anteriores", ou se queria referir-se apenas às duas publicações a que expressamente alude no nº 1- ou "no número anterior"-, interpretação esta que a ER considera ser a correcta.
1) Neste sentido, salienta-se, até para se proceder a uma correcta interpretação da lei, que nos concursos internos de ingresso em que concorrem funcionários do serviço e de fora do serviço, o legislador bastou-se com a publicação no Jornal Oficial, sendo que a situação da representada pelo Autor é semelhante.
J) O procedimento da ER, no concurso misto em questão, foi o adequado, desde logo por ter promovido as publicações exigidas por lei- no Diário da República e em órgão de imprensa de expansão nacional-, sendo que a publicação em Diário da República é a forma por excelência de publicidade, pois permite um conhecimento generalizado por parte de todos, dos actos objecto de publicação, através de consulta gratuita, via "Internet".
K) Por outro lado, a ER procedeu, ainda, à afixação nos serviços Centrais e nas Direcções de Finanças, bem como incluiu a referência ao concurso, nos anúncios da página electrónica da DGCI, publicados na "lntranet', a que podem aceder todos os funcionários desta Direcção-Geral, não só na fase preparatória (alertando para a sua futura abertura), como na fase de aceitação das candidaturas, o que possibilitou que a representada do Autor tivesse as mais amplas possibilidades de ter tido conhecimento da abertura do referido concurso.
L) O pedido da representada do A., de admissão ao concurso em questão, foi apresentado fora do prazo estipulado para o efeito, sendo que a mesma teve todas as possibilidades de ter tomado conhecimento atempado da abertura do mesmo, porquanto não se encontrava ausente do serviço, durante o prazo de apresentação das candidaturas ao concurso, pelo que o acto posto em crise, é válido.
M) De todo o exposto, não tendo ocorrido a preterição da formalidade essencial do concurso, referida pelo A., tendo a ER dado cumprimento ao art. 28º do Decreto-Lei nº 204/98, de 11 de Julho, donde o acto posto em crise pelo A. não enferma do vício de violação de lei por errada interpretação e aplicação desse preceito, nem de qualquer outro, a douta sentença enferma de erro de julgamento ao considerar "verificado o invocado vício de violação de lei por errada interpretação e aplicação do art. 28° do Decreto-Lei nº 204/98, de 11 de Julho, o que invalida todo o procedimento do concurso.", pois o procedimento concursal é válido, na medida em que observou as regras previstas no referido diploma, enfermando, também, a douta sentença do referido erro ao ter decidido como decidiu.».
O Recorrido nas contra alegações formulou as seguintes conclusões: «1. A douta decisão a quo fez correcta interpretação e aplicação da lei aos factos, pelo que deve ser mantida.
2. O Artº 28º do DL 204/98, de 11 de Julho estabelece que nos concursos mistos (como é o caso) há lugar a publicação do aviso de abertura do concurso no Diário da República, em órgão de imprensa de expansão nacional, bem como à sua afixacão nos locais a que tenham acesso os funcionários que reúnam as condicões de admissão.
3. A afixação prevista e estatuída no n.0 2 do art.0 28º do DL 204/98, de 11.07 mais não, ele própria, do que um acto de publicação, pelo que o argumento apresentado pelo Recorrente, para que ao presente concurso apenas tivesse que ser aplicado a exigência prevista no seu n.0 1, carece de sustentação legal e literal.
4. Encontrando-se a representada do ora Recorrido a exercer funções no Serviço de Finanças de Odivelas e tendo os seus serviços disso conhecimento, impunha-se, pois, que para além publicação do aviso de abertura do concurso no Diário da República e em órgão de imprensa de expansão nacional, também se tivesse procedido à sua afixação naquele Serviço de Finanças de Odivelas.
5. A preterição de uma formalidade essencial, como é o acto de publicidade de um aviso de abertura de concurso, acarreta para o despacho recorrido Vicio de Violação de Lei, por violação do disposto no Art 28° do DL 204/98.»
O DMMP apresentou a pronúncia de fls. 163 a 165, no sentido da improcedência do recurso apresentado.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Os Factos
Em aplicação do artigo 663º, n.º 6, do (novo) CPC, não tendo sido impugnada, remete-se a matéria de facto para os termos em que foi decidida pela 1º instância.
O Direito
Alega o Recorrente, que a decisão recorrida padece de erro de julgamento, por errada interpretação do artigo 28º, ns.º 2 e 3, do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07.
Diz o Recorrente, que no concurso em questão, que não era um concurso limitado, não se aplicava o n.º 2 daquele artigo. No que concerne à remissão do n.º 3 do preceito, entende o Recorrente que será apenas para as publicações indicadas no n.º 1, já que no n.º 2 o legislador alude a outra forma de publicidade, a afixação do aviso de abertura, o que não consubstancia uma publicação.
Mais diz o Recorrente, que o aviso de abertura do concurso também não tinha de ser afixado no SF de Odivelas, pois destinava-se a assistentes administrativos especialistas e naquele SF não existiam funcionários da referida carreira, sendo que a representada do A. prestava serviço no SF de Odivelas como técnica de Administração Tributária Adjunta estagiária, do grupo de Administração Tributária (GAT), em carreira diferente daquela para o qual o concurso foi aberto. Considera o Recorrente, que só nos Serviços Centrais e nas Direcções de Finanças existem funcionários da carreira administrativa, pelo que a DF de Lisboa cumpriu a 1º parte do n.º 2 do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07.
Vejamos.
Conforme facto provado em 1. o concurso em apreço era um «concurso interno de acesso misto para a categoria de assistente administrativo especialista».
Por conseguinte, é inequívoco, que ao citado concurso se aplicava o n.º 3 do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07.
Determina este número que «3- Nos concursos mistos há lugar a ambas as publicações previstas nos números anteriores».
E face ao estipulado nos n.ºs 1 e 2 deste artigo, aquelas publicações são no Diário da República - DR (e dando nota dessa publicação também uma outra em órgão da imprensa de expansão nacional) e nos locais em que tenham acesso os funcionários que reúnam as condições de admissão ao concurso.
Assim, no presente concurso era exigido fazer-se as indicadas publicações, quer no DR, quer em órgão da imprensa de expansão nacional, quer nos locais em que tenham acesso os funcionários.
O que faz todo o sentido, já que no n.º 1 do artigo 28º, visa-se estipular regras gerais para todos os concursos, externos e internos, determinando-se uma publicitação geral a todos os interessados, consequentemente, exige-se a publicitação no DR e num órgão da imprensa de expansão nacional.
No n.º 2 daquele artigo, restringe-se o universo dos interessados aos funcionários pertencentes ao serviço ou quadro único, pois refere-se aos concursos limitados (cf. artigo 6º, n.º 4, alínea b) do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07). Portanto, para estes exige-se apenas a publicitação do concurso através da afixação nos locais a que tenham acesso os funcionários que reúnam as condições de admissão e, na mesma data, a notificação por ofício registado ou outro meio adequado aos funcionários que, por motivos fundamentados, estejam ausentes das instalações do serviço.
No n.º 3 do artigo, que visa concursos mistos, nos quais os interessados serão quer os funcionários pertencentes ao serviço ou quadro único, quer outros funcionários que ali não pertençam, impõe-se as publicitações gerais para a divulgação a todos interessados, que tanto podem ser funcionários do serviço, como fora dele. Exige-se aqui uma publicitação conforme as regras gerais previstas no n.º1, cumulada com a publicitação determinada no n.º 2 do artigo 28º (cf. artigo 6º, n.º4, alínea c), do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07).
O facto de o legislador ter utilizado a expressão «publicações» no n.º 3 do artigo 28º, não afasta a obrigação de publicitação referida no n.º 2 do mesmo artigo, por afixação, ou por notificação ou por outro meio.
Ali a expressão «publicações» é sinónimo de publicitação, divulgação, anúncio a todos os interessados.
E esta obrigação de publicitação é uma formalidade essencial, pois através dela garante-se que todos os interessados puderam ter conhecimento do concurso e, querendo, concorreram. Garante-se os princípios de igualdade e da concorrência. Só no caso de se verificar que apesar de preterida a formalidade, ainda assim, todos os interessados concorreram, pode degradar-se a formalidade legalmente exigida em não essencial (cf. neste sentido Paulo Veiga e Moura, Função Pública, Regime Jurídico, Direitos e Deveres de Funcionários e Agentes, Volume I, Coimbra Editora, 1999, págs. 122, 123 e 220).
Ora, no caso dos autos, verifica-se, que a representada do Recorrido não concorreu ao concurso, alegadamente porque dele não teve conhecimento atempado. Assim, não tendo o aviso de abertura cumprido as exigências legais de publicitação, violou-se uma formalidade essencial, prevista no artigo 28º, n.ºs 1 a 3 do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07, que inquina ab initio todo o concurso.
Quanto à publicação na Intranet, a mesma não afasta a obrigação de afixação exigida no artigo 28º, n.ºs 1 a 3 do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07.
Dos factos provados em B., C. e D. resulta que a representada do A. e Recorrido detinha a categoria de assistente especialista principal e exercia funções no SF de Odivelas, onde não foi afixado qualquer anúncio.
Portanto, independentemente do processo de reclassificação, a representada do A. poderia ter interesse em participar no concurso, por reunir as condições de admissão, pelo que teria o R. e Recorrente que publicitar o concurso no SF de Odivelas, conforme exigência do n.º 3 do artigo 28º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11.07, por força da remissão para o n.º 2 do mesmo artigo.
Aliás, o R. e Recorrente não poderia ignorar que a representada do A. e Recorrido, que era sua trabalhadora, estava em exercício de funções no SF de Odivelas e detinha os requisitos de admissão ao concurso. Ou seja o R. e Recorrente não podia ignorar que esta era uma funcionária potencialmente interessada em concorrer, pelo que teria de afixar o aviso de abertura do concurso nos locais em que a mesma tinha acesso, logicamente, nos SF de Odivelas.
Dispositivo
Pelo exposto, acordam em:
- em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida;
- custas pelo Recorrente.

Lisboa, 20 de Fevereiro de 2014.
(Sofia David)

(Cristina Santos)

(Rui Pereira)