Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 12217/03 |
![]() | ![]() |
Secção: | Contencioso Administrativo |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 03/25/2004 |
![]() | ![]() |
Relator: | António de Almeida Coelho da Cunha |
![]() | ![]() |
Descritores: | EXECUÇÃO DE ACÓRDÃO ANULATÓRIO EFEITO ERGA OMNES E LIMITES DO CASO JULGADO ILEGITIMIDADE PARA REQUERER A EXECUÇÃO |
![]() | ![]() |
Sumário: | I - O efeito erga omnes de um acórdão anulatório significa que ele se impõe a todo o universo de pessoas jurídicas, enquanto os limites do caso julgado determinam que só o vencedor, que obteve provimento no recurso, beneficie do decidido. II - Assim, os interessados que não impugnaram contenciosamente um dado acto, não possuem legitimidade para, com invocação do efeito erga omnes, requerer a execução daquele acórdão anulatório, por não serem titulares do direito subjectivo que se pretende executar (arts. 5º e 7º do Dec-Lei 256-A/77 e art. 46º do R.S.T.A.). |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam no 1º Juízo Liquidatário do T.C.A. Sul1. Relatório. Luis ...., Inspector do escalão VI, actualmente em exercício de funções na Direcção Central do Combate ao Banditismo da Polícia Judiciária veio interpor recurso contencioso do despacho da Sra. Ministra da Justiça, de 10.01.03, que negou provimento ao recurso hierarquico necessário interposto pelo ora recorrente do despacho do Director Nacional Adjunto da PJ que lhe indeferiu o pedido de reconstituição da sua carreira profissional com base na sua equiparação aos candidatos admitidos como Subinspectores do nível 1, por efeito do concurso aberto pelo aviso publicado na II Série do D.R. de 5.4.95, face à anulação do despacho homologatório da classificação final decidida em sede de recurso contencioso interposto por um dos candidatos. A entidade recorrida respondeu defendendo a improcedência do recurso. Em alegações finais, o recorrente formulou as seguintes conclusões: 1ª) O recorrente foi opositor a um concurso público destinado ao preenchimento de cem vagas, à altura, para o lugar de Subinspector do nível 1 do quadro de pessoal da Polícia Judiciária; 2ª) Tal concurso foi declarado inválido, ou seja, nulo, por decisão jurisdicional; 3ª) O vício que levou à nulidade do concurso configura uma violação de lei de fundo; - 4ª) O concurso é um acto uno, constituido por uma pluralidade de fases e actos internos; - 5ª) Qualquer das fases do concurso destina-se a todos os opositores, fazendo parte do concurso todos os seus candidatos que chegam à sua fase final, como foi o caso do recorrente; - 6ª) A nulidade do concurso afecta a situação de todos os seus opositores, nomeadamente o ora recorrente, na medida em que os coloca em abstracto ao mesmo nível, apesar de em concreto a situação dos mesmos não ficar automaticamente conformada; 7ª) Pois os opositores admitidos às vagas, através de concurso nulo, adquiriram os seus direitos de imediato, não se passando o mesmo com os opositores que fazendo parte da lista final não foram admitidos 8ª) Mesmo relativamente aos não admitidos, a situação não tem sido igualmente tratada pela Administração, a qual refez a carreira de uns e não refez a de outros, em igualdade de circunstâncias dado que não reconhece o efeito erga omnes da decisão que anulou o concurso; 9ª) Entende o recorrente que tem direito a beneficiar dos mesmos direitos de todos os opositores ao concurso que chegaram à fase em que o recorrente chegou, ou seja, a fase final do concurso; 10ª) A Administração Pública não conheceu sequer dos fundamentos alegados pelo recorrente para sustentar a sua pretensão; 11ª) A Administração Pública, ao não atender a pretensão do recorrente, violou os arts. 205º da C.R.P. e 673º do Cod. Proc. Civil e 6º do C.P.A., já que o acto que serve de suporte a tal indeferimento está eivado dos vícios de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, violação do principio da justiça e falta de fundamentação por insuficiência desta; - A entidade recorrida contra-alegou, concluindo o seguinte: 1º) Não tem razão o recorrente quando pretende que seja reconstituida a sua carreira profissional em condições iguais às daquele que foi recorrente vencedor; - 2º) Também não tem razão o recorrente quando pretende a anulação de todo o procedimento concursal, pois se deve apenas atender ao interesse do recorrente vencedor; - 3º) Não se verifica qualquer falta de fundamentação no acto recorrido; - 4º) Assim, deverá ser negado provimento ao presente recurso. A Digna Magistrada do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. x x 2. Matéria de Facto Encontra-se provada a seguinte factualidade relevante: a) Por Aviso publicado no Diário da República nº 81, II Série, de 4 de Maio de 1995, foi aberto concurso público para provimento de 100 lugares para Subinspector (actual Inspector-Chefe), do nível 1, do quadro de pessoal da Polícia Judiciária; - b) O ora requerente apresentou-se a concurso, tendo sido graduado em 147º lugar, conforme classificação final publicada por Aviso nº 1152/97, no Diário da República, II Série, de 28 de Maio de 1997; - c) Por Acordão de 13.12.2001, do Tribunal Central Administrativo, foi anulado o despacho homologatório da lista de classificação final, proferido em 19.05.97 pelo Exmo. Director Geral da Polícia Judiciária; - d) O fundamento da anulação deveu-se à preterição do disposto no art. 5º do Dec-Lei nº 498/88, ou seja, por não constar do Aviso de Abertura a especificação dos métodos de classificação e selecção; e) Em 23 de Setembro de 2002, foi formulada a seguinte pretensão pelo ora recorrente, tendo em conta os factos supra expostos: "... seja reconstituida a Carreira Profissional do Requerente, com base na equiparação do mesmo aos candidatos admitidos como Subinspectores do nível 1, no quadro da Polícia Judiciária, por efeito do concurso, cujo Aviso foi publicado no Diário da República nº 81, de 5 de Abril de 1995, desde a data em que os mesmos tomaram posse, até à presente data, devendo tal reestruturação da Carreira compreender todos os direitos e regalias, inclusive a diferença entre as diferentes remunerações a que o requerente teria direito e a que tem vindo a obter até à presente data". f) Tal pretensão foi indeferida pela entidade recorrida. x x 3. Direito Aplicável O que está em causa no presente recurso é a execução do Acórdão de 13.12.2001, do Tribunal Central Administrativo, o qual concedeu provimento ao recurso contencioso interposto pelo então agente de nível 4 da Polícia Judiciária, Acúrcio José Lopes da Silva Peixoto. Este candidato interpôs recurso contencioso do despacho do Ministro da Justiça que indeferiu o recurso hierarquico necessário do despacho homologatório da lista de classificação final, tendo o mesmo obtido provimento, por incumprimento do art. 5º nº 1, als. d) e e) do Dec. Lei 498/88 de 30 de Dizembro: omissão, no Aviso de Abertura do concurso, da especificação dos métodos de selecção e falta da sua definição atempada por parte do juri. Em execução de tal decisão, a Administração reconstituiu a situação actual hipotética do funcionário que recorreu e obteve provimento judicial da sua pretensão, nomeando-o na categoria de Subinspector (inspector-chefe), da Polícia Judiciária. Defende o ora recorrente que, nos termos do acórdão em referência, deveria ter sido anulado todo o concurso e ordenada a abertura de novo concurso para o preenchimento das mesmas vagas, ou, em alternativa, caso tal fosse inexequível, deveria ser reconstituida a carreira profissional de todos os candidatos que foram contemplados na classificação final do concurso, colocando-os na situação em que estariam se tivessem tomado posse do lugar de Subinspector de nível 1, na data em que tomaram posse os candidatos que foram admitidos pelo despacho homologatório da lista final. Não tendo a Administração optado pela repetição do concurso, o ora recorrente veio requerer a reconstituição da sua carreira profissional, nos termos supra expostos. Sucede, porém, que o recorrente não reagiu contra a classificação obtida no concurso a que se candidatou, pelo que, a nosso ver, não possui legitimidade para requerer a execução da decisão anulatória. Com efeito, o conceito de interessado que pode requerer à Administração a execução da sentença administrativa (art. 5º nº 1 do Dec. Lei 256-A/77) e, não conseguindo satisfação, requerer nos termos do art. 6º do mesmo diploma, ao Tribunal, a declaração de inexistência de causa legítima de inexecução, é referido pelo Prof. Freitas do Amaral como aquele que obteve provimento no recurso. No mesmo sentido se pronuncia o Exmo. Conselheiro Simões de Oliveira, in "Contencioso Administrativo", Liv. Braga, 1986, p. 229: «O direito subjectivo ao accionamento do pedido de execução do julgado cabe ao administrado vencedor no recurso contencioso." Como se escreve no Ac. S.T.A. de 11.6.96, Recurso nº 26097-A, citando o Ac. de 2.6.92, Rec. 30.459, in Ap. D.R. p. 3583, "interessado, nos termos e para os efeitos de apresentação dos requerimentos para execução do julgado, junto do competente orgão administrativo e para declaração judicial de inexistência de causa legítima de inexecução arts. 5º e 7º do Dec-Lei 256-A/77 de 17 de Junho é aquele que obteve vencimento no recurso contencioso, já que é ele o titular do direito subjectivo ao accionamento dos pedidos. - Não possui legitimidade para solicitar a aludida providência judicial quem não foi vencedor no recurso contencioso que culminou na sentença anulatória, nem nele interveio por qualquer forma, por isso lhe falecendo, igualmente, legitimidade para assegurar a condição de procedibilidade a que se reporta o nº 1 do art. 5º citado. A posição dos requerentes nestes autos é a de quem pede uma execução sem título executivo. A falta de legitimidade reporta-se aqui ao fundo ou inexistência do direito subjectivo que se pretende executar. Na perspectiva do interesse em demandar aferido pela utilidade resultante da procedência da pretensão, os requerentes teriam legitimidade. Já um conceito de legitimidade activa que acentue o interesse legítimo como aquele que é protegido pela lei, tenderá a abarcar legitimidade (ao menos configurada ex ante) uma relação de titularidade do direito substantivo, uma relação ou pertença que pressupõe a existência do direito a actuar, e quando for manifesta a inexistência do direito, reconduz essa falta, ainda, ao conceito de legitimidade. A primeira das configurações adapta-se mais à letra do art. 26º do Cod. Proc. Civil, que omite qualquer referência ao interesse legítimo, e a segunda ao art. 46º do R.S.T.A, que exige o interesse directo, pessoal e legítimo para o recurso contencioso» cfr. neste sentido, Freitas do Amaral, vol. IV, 1988, p. 171; Ac. T.C.A. de 8.2.01, Rec. 4395, in "Antologia de Acórdãos do STA e do TCA", Ano IV, nº 2, Janeiro-Março, 2001, p. 260 e seguintes; Ac. T.C.A. de 31 de Julho de 2003, in "Antologia de Acórdãos do STA e do TCA, Abril-Julho de 2003, p. 258 e seguintes). Como refere a entidade recorrida, no caso dos autos o erro do recorrente consiste em confundir a força do acórdão erga omnes com os limites do caso julgado, entendendo que aquela força implica que beneficiam do acórdão todos os interessados, ainda que não tenham sido sujeitos processuais. Ora, como é sabido, a força erga omnes do acordão consistia em que ele se impõe (se aplica) a todo o universo de pessoas jurídicas, enquanto que os limites do caso julgado implicam que só o vencedor beneficie do decidido. São questões distintas cujo efeito se pode sintetizar, concluindo, que o direito que o recorrente Acúrcio Peixoto obteve se impõe a todos, mas que só ele beneficia da execução do julgado. Ou seja: a anulação do despacho homologatório da lista de classificação final só produz efeitos relativamente àquele que impugnou contenciosamente tal despacho. Em suma, e como também se escreveu no Ac. STA de 9.07.98, Proc. 34044 A, "só os interessados que hajam sido recorrentes no recurso contencioso em que foi proferida a decisão anulatória têm legitimidade para a sua execução". Bem andou, pois, a entidade recorrida ao indeferir a pretensão do recorrente, com tais fundamentos x x 4. Decisão. Em face do exposto, acordam em negar provimento ao recurso. Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça e a procuradoria, respectivamente, em 150 Euros e 80 Euros. Lisboa, 25.03.04 as.) António de Almeida Coelho da Cunha (Relator) Maria Cristina Gallego dos Santos Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa |