Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04407/00
Secção:Contencioso Administrativo- 2.ª subsecção
Data do Acordão:06/27/2002
Relator:Cândido de Pinho
Descritores:ACTO CONJUNTO
INDEFERIMENTO TÁCITO CONJUNTO
Sumário:I- O acto conjunto é um acto complexo tomado em co-autoria, em que cada um dos orgãos tem uma palavra decisiva a dizer na matéria para a qual se encontre positivamente vocacionado e legitimado por um processo legítimo de atribuição de competência.
É por isso que cada uma das vontades isoladamente expressa não vale pelo todo, nem traduz a decisão conjunta.
II- Da mesma maneira, porque são independentes e diferentes as implicações das vontades de cada um dos entes da conjunção, não há razões válidas para atribuir a todos as consequências jurídicas normais do silêncio de um só deles, quando os restantes, desconhecendo as pretensões concretas, nunca sobre elas puderam tomar posição.
É que o indeferimento tácito, além de pressupor o dever jurídico de decidir, tem implícito ainda o poder efectivamente decidir.
III- Assim, se um certo órgão não for chamado a decidir um caso, em autoria, ou em co-autoria, não pode presumir-se que quis indeferir se não pôde sequer decidi-lo.
IV- Se o interessado dirige a um só elemento da conjunção um requerimento, a esse órgão cumpre efectuar o suprimento oficioso a que alude o art. 76º, nº2, do CPA, enviando-o posteriormente aos restantes.
Mas, se não fizer esse envio, as consequências da inacção apenas se poderão reflectir na sua esfera e unicamente a si poderão ser imputadas: a omissão poderá ser, eventualmente, encarada ineficiência, ser tida futuramente em conta no caso de classificação de serviço ou até mesmo ser motivo para procedimento disciplinar.
V- Nunca, sob pena de perversão do mecanismo do acto tácito, a partir do silêncio de um se pode responsabilizar os outros presumindo deles uma vontade que só eles estariam em condições de prestar. Seria como que depositar na esfera de um órgão a competência de outros, o que contraria o princípio da imodificabilidade e da legalidade da competência.
Nessa hipótese, se o órgão receptor do requerimento nada decide, nem faz a remessa oficiosa aos outros, o que resta é, quando muito, um indeferimento tácito parcial obtido do seu silêncio, sindicável autonomamente por vícios próprios e específicos(nunca como se de indeferimento tácito conjunto se tratasse).
VI- Será rejeitado o recurso contencioso se o seu objecto é um pretenso acto tácito conjunto atribuído a três órgãos, se só a um deles se pode imputar a tacitude.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 2ª Subsecção da 1ª Secção do TCA

I- Relatório
I..., Assistente Administrativa Principal, a exercer funções no CRSS de Lisboa e Vale do Tejo, residente em Setúbal, veio recorrer contenciosamente do pretenso indeferimento tácito atribuído aos Srs. Ministro do Trabalho e Solidariedade e das Finanças, bem assim como ao Sr. Secretário de Estado da Administração Publica, na sequência de alegado recurso hierárquico interposto em Março de 1999.
Ao acto imputa os vícios de violação do art. 21º, nº 4, do DL nº 404-A/98, de 18/12, conjugado com os arts. 13º, 59º, nº1, al.a) e 2666º, nº2, da CRP.
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O Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa respondeu suscitando a sua incompetência para a decisão do recurso hierárquico( por dela não ser superior hierárquico), além da inexistência do dever de decidir e, logo, da ausência de indeferimento tácito que a si possa ser atribuído pelo facto de nenhuma decisão conjunta lhe ter sido solicitada em recurso.
Defendeu, igualmente, a sua ilegitimidade.
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O Ministro das Finanças, através do Secretário de Estado da Segurança Social, também respondeu, este para defender o improvimento do recurso.
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O Secretário de Estado do Orçamento limitou-se a oferecer o merecimento dos autos.
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Na pronúncia que se seguiu em cumprimento do art. 54º da LPTA, o MP aproveitou para defender a inexistência de acto recorrível por a recorrente não ter dirigido o recurso às três entidades ora recorridas para decisão conjunta, nos termos do art. 21º, nº5, do DL nº 404-A/98, mas apenas ao Ministro do Trabalho.
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A Recorrente tomou posição sobre toda a matéria exceptiva, incluindo a do MP, para a contrariar e, basicamente, para referir ter apresentado o citado recurso às três entidades.
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Não tendo, porém, feito prova da referida apresentação conjunta do requerimento do recurso às três entidades, foi ordenada a sua notificação para o fazer.
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Foram juntos então os documentos de fls. 48 a 61.
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Relegado o conhecimento das excepções para final, foi mandado observar o art. 67º do RSTA.
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Alegaram a recorrente, o Secretário de Estado da Administração Publica e da Modernização Administrativa, e o Secretário de Estado da Solidariedade e Segurança Social, reiterando no essencial as posições antes assumidas nos autos.
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No seu parecer final, o digno Magistrado do MP opinou no sentido da rejeição do recurso, como o havia feito no parecer de fls. 36 vº e 37.
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Apreciando.
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II- Pressupostos processuais

1- O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias.
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2-Legitimidade
O Secretário de Estado da Administração Pública e da Modernização Administrativa pugnou pela sua ilegitimidade passiva, devido ao facto de nenhum pedido concreto lhe ter sido dirigido em ordem à produção do acto conjunto a que se refere o art. 21º, nº5, do DL nº 404-A/98.
Não podemos concordar.
A legitimidade, com efeito, afere-se pela forma como a causa de pedir e o pedido são recortados na petição inicial, como é sabido.
Ora, se a recorrente imputa às três entidades a autoria do indeferimento tácito objecto do recurso, torna-se evidente, não só por isso(cfr. art. 36º, nº1, al. c), da LPTA), mas também pelo efeito de livre apreciação que o tribunal pode extrair do eventual imobilismo da autoridade pública para efeitos probatórios(cfr. art. 50º, da LPTA), que o digno excepcionante tem todo o interesse em contradizer a tese do impetrante(cfr. art. 26º, nº2, do CPA).
Só isto já legitima, pois, a sua defesa.
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Conclusão: Todas as partes dispõem de legitimidade.
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3- Outras excepções

Foi suscitada outra matéria exceptiva, reconduzível, no entanto, a um único aspecto relevante: inexistência de acto recorrível.

3.1-Antes, porém, de a apreciarmos, cumpre alinhar previamente a respectiva factualidade:

a)- A recorrente, I..., encontrava-se provida na categoria de 2º oficial, no 5º escalão, índice 240, desde 11/11/97.
b)- Em resultado da aplicação do novo regime das carreiras da função pública provado pelo DL nº 404-A/98, de 18/12, a recorrente transitou em 01.01.98 para o escalão 4, índice 245, com efeitos reportados a 11/11/97, por despacho do Vogal do Conselho Directivo do CRSS de Lisboa e Vale do Tejo de 12/01/98 (doc. fls. 11 dos autos).
c)- Maria de Lurdes Conceição, tendo sido promovida em Setembro de 1998 a segundo oficial, escalão 5, índice 240, foi em 01/01/98 reposicionada no escalão 5, índice 260, com efeitos reportados a Setembro de 1998, por efeito da aplicação do DL nº 404-A/98(doc. fls. 12/13 dos autos).
d)- Por requerimento de 2 de Março de 1999, a recorrente apresentou recurso hierárquico necessário ao Ministro do Trabalho e da Solidariedade, ali entrado em 16 desse mês(ver p.a.).
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3.2- Apreciando, agora, a matéria exceptiva:

O excepcionante Secretário de Estado da Administração Pública disse-se incompetente para conhecer do recurso hierárquico que “serve de base ao presente recurso” por não ser superior hierárquico da recorrente(fls. 22).
Mas esta conclusão parte de um erro numa das premissas do silogismo.
Com efeito, não é o facto de não ser superior hierárquico que retira o dever de praticar a parcela de decisão que em situações destas cumpre tomar. É que, para o caso, apenas deve ser considerado o dever vinculado de co-decidir a questão da alegada inversão da posição relativa detida pela recorrente por despacho conjunto “dos ministros da tutela, das Finanças e do membro do governo responsável pela Administrativa”, tal como o impõe o nº5, do art. 21º do citado diploma. E para isso, pouco importa o nome que ao recurso( hierárquico) tenha sido dado. Importa, sim, é que a vontade da interessada tivesse sido canalizada a um específico propósito impugnativo.
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3.3- Em todo o caso, esta questão perde toda a relevância perante a invocação pelo mesmo excepcionante da inexistência de qualquer requerimento a solicitar-lhe essa decisão, que se interliga directamente com a também invocada inexistência de acto recorrível, a que o MP aderiu. E isso, sim, é assunto da maior importância.

A questão prende-se, agora, com a necessidade de uma decisão conjunta requerida pelo preceito legal e, como é compreensível, ela apenas é imposta se os interessados interpuserem o “recurso” respectivo(nº5, cit. art. 21º). Ou seja, as entidades só ficam constituídas no dever de decidir o recurso se pela via reactiva os lesados tomarem a iniciativa impugnatória. O que significa que não há aqui um dever automático de correcção das injustiças relativas decorrentes do reposicionamento escalonar. Uma tal correcção apenas terá lugar se o funcionário se não conformar com a inversão da posição relativa, demonstrando-o e obrigando a uma posição superior(hierárquica e/ou tutelar) de reexame da situação.

Por conseguinte, é por demais evidente que o interessado deverá intentar um “recurso”.
Pergunta-se: a todos os entes que devem intervir para formar a decisão conjunta, para que só então, perante a ausência de decisão possa presumir-se o indeferimento tácito da pretensão?
Alguém já disse que bastaria uma única petição de recurso dirigida a um dos co-decisores(Acs. do STA de 28/02/2002, Proc. Nº 048112 e de 08/05/2002, Proc. Nº 047917).

Bom. Por uma questão de cautela(cautela do ponto de vista da defesa dos interesses do recorrente) defendemos que o recurso deve ser dirigido a todas as entidades, de modo a que, perante o silêncio geral, a todos se possa imputar uma tacitude negatória. Mas, enfim, também concederemos que o requerimento possa ser remetido a um só deles, desde que no documento se cite a norma que impõe a conjunção, ou desde que o requerente expressamente solicite essa mesma decisão conjunta (num caso ou noutro, o órgão destinatário não poderá invocar o desconhecimento do pedido da decisão conjunta).
O que repugna é aceitar a solução além preconizada de que, mesmo na hipótese de um só ter sido o destinatário “ad quem” do recurso, dos restantes se possa presumir acto tácito.
Expliquemo-nos.
O acto conjunto não é uma mera soma de várias posições individuais, marca que é característica de acto colegial, mas um acto complexo tomado em co-autoria(M. CAETANO, in Manual de Direito Administrativo, 10ª ed, I, pag. 469, FREITAS DO AMARAL, in Curso de Direito Administrativo, I, 2ª ed., pag. 611/612 e in Direito Administrativo, III, pag. 150). Cada um dos intervenientes tem uma palavra decisiva a dizer na matéria para a qual se encontre positivamente vocacionado e legitimado por um processo legítimo de atribuição de competência (originário ou delegatório) e é da conjugação de todas as vontades que se há-de formar o acto decisor. É por isso que cada uma das vontades isoladamente expressa não vale pelo todo, nem traduz a decisão conjunta.
Ora, se isto é assim quanto ao acto conjunto expresso, não se vê razão para se pensar diferentemente relativamente ao acto tácito. Cremos, efectivamente, que só poderá haver um acto tácito conjunto se todos os entes tiverem tido a possibilidade e oportunidade de se pronunciarem sobre o assunto sem que o tenham feito no prazo legal(art. 109º do CPA).
Isto não quer dizer que por vícios próprios, intrínsecos, autónomos e exclusivos de cada das partes da decisão conjunta não possa haver impugnação contenciosa(ex. a incompetência do co-autor). Pode acontecer que um dos órgãos despache favoravelmente o pedido e o outro despache negativamente relativamente à sua esfera de acção. Isto a acontecer não significará que se produziu um acto conjunto favorável. Há um acto com duas partes, cada uma das quais desempenhando o seu papel. Por exemplo, o órgão que tutela a Administração Pública pode decidir favoravelmente um provimento num lugar ou, como na situação em apreço, uma correcção escalonar. Mas se o órgão competente para a área das finanças se opuser por razões precisamente de economia de recursos, de dificuldades financeiras e orçamentais, a decisão conjunta está tomada, embora sem favorecimento da esfera do interessado. Neste caso, porque a independência decisora assim o reclama, se o interessado quiser impugnar esta decisão apenas terá que “demandar” o órgão que lhe negou a pretensão(no exemplo, o Ministro das Finanças) e por vícios autónomos(neste sentido, J. CÂNDIDO DE PINHO, in Breve Ensaio sobre a competência hierárquica, pag. 89).

Se as intervenções decisoras de cada um dos entes do acto conjunto tem uma autonomia própria, precisamente por diferentes e independentes serem as implicações das suas vontades nas áreas em que estão posicionados do ponto de vista da sua competência( ou mesmo da jurisdição da pessoa colectiva onde se integre), então não há razões válidas para atribuir a todos as consequências jurídicas normais de um só silêncio, quando os restantes desconheciam as pretensões concretas e, por isso, sobre elas nunca puderam tomar posição. É que o indeferimento tácito, além de pressupor o dever(jurídico) de decidir, tem implícito ainda o poder (efectivamente) decidir. Ora, se um certo órgão não for chamado a decidir um caso, seja em autoria, seja em co-autoria, não pode presumir-se que quis indeferir se não pôde sequer decidir.

A ser assim, na nossa opinião, é preciso distinguir.
1º- Se o interessado dirige o requerimento a todos os entes, cada um deles poderá proceder da seguinte maneira:
a)- assume a sua parte da decisão conjunta, tomando expressamente a parte que lhe cumpre efectuar; ou,
b)- remete-se ao silêncio para daí ser extraído o indeferimento tácito;
Num caso, como noutro, parece que a sua parte decisória poderá considerar-se obtida e, dessa maneira, alcançada a decisão conjunta.

2º- Se o interessado dirige o requerimento apenas a um deles, poderá verificar-se o seguinte:
a)- O órgão pratica expressamente a sua parcela decisória e posteriormente remete-o aos outros para que o façam também, um pouco na linha do que prevêem os arts. 74º, nº1, al.a) e 76º do CPA; ou,
b)- Esse órgão não toma decisão expressa e deixa obter o indeferimento tácito, após o que remete o requerimento aos outros órgãos da conjunção; ou finalmente,
c)- Nada faz: nem decide expressamente, nem faz a remessa referida anteriormente.

É bom de ver que a “vexata quaestio” só se coloca na última das hipóteses.
Segundo pensamos, o silêncio deste e a sua inacção relativamente à remessa não pode surtir os efeitos de uma decisão conjunta, porque ele não pode responsabilizar os restantes órgãos que deveriam ter intervindo.
Nem se pode aqui apelar ao disposto no art. 76º, nº2, do CPA para se extrair diferente doutrina. O suprimento oficioso é, sem dúvida nenhuma, uma louvável atitude que reflecte de uma forma espantosa a marca garantística que o CPA trouxe para o plano axiológico das relações administrativas. Nesse quadro, o órgão pode e deve remeter o “papel” aos restantes elementos da esperada decisão conjunta. Mas, se o não fizer, os efeitos da apatia não podem ser aqueles que a lei assenta em diferentes pressupostos. Realmente, não se pode imputar aos outros nada do que eles desconhecem, mesmo que esse desconhecimento radique numa omissão culposa de outro órgão da Administração.
Um tal efeito, portanto, não cabe no âmbito de previsão do art. 109º do CPA e o contrário corresponderia a uma total perversão dos fundamentos do mecanismo do acto tácito. Com efeito, na prática, isso seria o mesmo que transformar o silêncio de um deles na assunção da vontade que só os outros estariam em condições de prestar. Seria como que depositar na esfera de um órgão a competência dos outros, o que evidentemente contraria o princípio da imodificabilidade e da legalidade da competência.
A única consequência que pode advir para quem não cumpre o dever de suprimento oficioso das deficiências dos requerimentos apenas terá lugar na própria esfera do órgão relapso: por exemplo, essa omissão será eventualmente considerada ineficiência e tida em conta futura no caso de classificação de serviço, ou até mesmo poderá ser motivo para procedimento disciplinar.
Aliás, um pouco à semelhança do que ocorre com o dever estabelecido no art. 34º do mesmo Código. Também aí só o órgão incompetente que não faz a remessa do requerimento ao órgão competente pode eventualmente sofrer efeitos na sua esfera por causa da omissão verificada. Efeitos que podem da mesma maneira traduzir-se em sancionamento disciplinar(se for entendido que a omissão preenche os respectivos requisitos) ou que até podem ser causa de responsabilidade civil extracontratual(Ac.do STA, de 23/04/96, Proc. Nº 039618; de 01/10/98, Proc. Nº 37593). O que não pode é presumir-se da omissão da remessa um indeferimento tácito, porque na verdade o órgão, sendo incompetente, não tinha o dever de decidir(cit. ac. de 23/04/96; Ac. do STA de 24/05/94, Proc. Nº 31333; 25/10/94- Pleno-, Proc. Nº 31 458; de 19/01/95, Proc. Nº 26349, in Ap. ao DR, de 18/07/97, pag. 527; Ac. do TCA, de 9/05/2002, Proc. Nº915/98).

Em suma, não podemos aceitar que o silêncio de um valha como silêncio dos restantes elementos da conjunção.
Conjunção, aliás, cada vez mais frequente em razão da articulação dos diversos órgãos e serviços do Estado pela coordenação que se impõe existir no quadro da execução das políticas governativas sobre redimensionamento e racionalidade de meios, emprego público, de recursos humanos e materiais, gestão financeira e execução orçamental, etc(exemplos: art. 29º, nº2, do DL nº 50/98, de 11 de Março, sobre a competência dos conselhos consultivos sectoriais em matéria de formação e aperfeiçoamento da Administração Pública, definida através de portaria conjunta; art. 5º, nº1, do DL nº 362/99, de 18 de Agosto que estabelece a necessidade de despacho conjunto dos Ministros das Finanças, do Trabalho e Solidariedade e do membro do Governo que tiver a cargo a Administração Pública sobre contingente de estagiários a recrutar anualmente).
A intervenção de cada um dos elementos da conjunção é justificada pela necessidade de controle de cada um dos respectivos espaços de actuação, seja a nível dos recursos humanos, do sistema de carreiras, do regime remuneratório, da gestão dos quadros de pessoal(Administração Pública), seja a nível das políticas de emprego, da formação profissional, relações laborais e inserção e segurança social(Trabalho e Solidariedade), como ainda, por fim, a nível de gestão dos instrumentos financeiros do Estado, designadamente o Orçamento em matéria de despesas públicas(Finanças).

Compreensivelmente, portanto, se o requerimento é dirigido a um só deles, e se este posteriormente não o remete aos outros órgãos co-decisores, não podemos falar aqui de um acto tácito conjunto. Não podemos aceitar, por exemplo, que o Ministro do Trabalho comprometa, responsabilize e vincule o da Administração Pública e o das Finanças(arbitrariamente poderíamos escolher outra ordem), uma vez que os pelouros de cada um dos departamentos ministeriais são específicos, com regras, também elas especiais, de cumprimento da política governamental previamente definida nos respectivos diplomas orgânicos.
O que resta, quando muito, é um indeferimento tácito parcial, sindicável autonomamente por vícios próprios e específicos(nunca como se de indeferimento tácito conjunto se tratasse).
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3.4- Será esse o caso?
A recorrente na petição inicial não disse que enviou o requerimento de recurso para os três órgãos referidos no art. 21º, nº 5, do DL 404-A/98. Por outro lado, apenas juntou cópia da petição endereçada ao Ministro do Trabalho e da Solidariedade(fls. 7).
Apenas sob iniciativa do tribunal(fls. 45) é que apresentou simples cópia dos recursos que teria dirigido aos outros órgãos. Mas, em vez de documentos autenticados, limitou-se a cópias simples(fls. 47 a 59).
Cópias que mostram claramente duas coisas:
A que corresponde à que foi dirigida ao Ministro do Trabalho não é cópia exacta da cópia de fls. 7(porque esta tem uma rasura no ponto 11 em “anulação” que aquela não tem), mas também não é cópia fiel da que foi efectivamente enviada ao Ministro(pois esta, que se encontra no processo administrativo apenso, não tem a data e assinatura manuscritas da mesma forma e no mesmo sítio).
As cópias de fls. 52 e 58, pretensamente enviadas aos Ministro das Finanças e Secretário de Estado da Administração Pública, respectivamente, aparentam colagens no cabeçalho referente ao destinatário num texto que é exactamente igual(até na rasura).
Isto isoladamente pode ser significativo ou não.
Mas além disso ainda temos de considerar que a recorrente não fez prova cabal de que ela mesma os enviou. Com efeito, os documentos de expedição pelo correio juntos a fls. 60 e 61 apenas têm como remetente o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública. Tais cópias não provam que correspondam ao envio dos recursos(podem referir-se a outro tipo de correspondência) e, muito menos, que respeitem ao envio dos requerimentos pela recorrente.
Isto significa que, nem mesmo por impulso do tribunal, a recorrente fez a prova que lhe cumpria, de acordo com o art. 56º, § 2º do RSTA.
De resto, o próprio Secretário de Estado da Administração Pública afirmou na resposta não ter recebido qualquer recurso(fls. 21/24), posição que reiterou nas suas alegações(fls. 70/71).

Temos, pois, apenas por provado, face a este conjunto de elementos e ao processo administrativo apenso, que a recorrente unicamente fez entrar no Ministério do Trabalho o recurso.
E não temos prova de que o mesmo tenha acontecido relativamente aos outros dois entes.
Assim sendo, não é possível considerar no caso presente, por extensão, um indeferimento tácito conjunto, se no máximo somente um indeferimento tácito parcelar foi obtido(este, porém, de “per si” contenciosamente não impugnado).

Isto significa que o recurso carece de objecto, o que nos impede de estudar os vícios de fundo alegados.
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3.5- Decidindo

Face ao exposto, acordam em rejeitar o recurso, por ilegal a sua interposição, nos termos do art. 57º, § 4º, do RSTA.
Custas pela recorrente, com imposto de justiça e procuradoria que fixamos em € 150 e € 75 euros, respectivamente.

Lisboa, 27 de Junho de 2002