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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06767/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/03/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO.
PRAZO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. CÔMPUTO.
ARTº.102, Nº.1, AL.A), DO C.P.P.T.
Sumário:1. O prazo da impugnação judicial é peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, dado versar sobre direitos indisponíveis no que diz respeito à Fazenda Pública. É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.576, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido.

2. A contagem do prazo para interposição de recurso contencioso de impugnação deve fazer-se nos termos do artº.279, do C. Civil, isto é, de forma contínua e sem qualquer desconto dos dias não úteis (cfr.artº.20, nº.1, do C.P.P.Tributário). No cômputo do prazo em questão, quando o seu termo final ocorra em domingo, dia feriado ou férias judiciais, faz com que o mesmo termo se transfira para o primeiro dia útil seguinte (cfr.artº.279, al.e), do C.Civil).

3. Nos termos do artº.102, nº.1, al.a), do C.P.P.T., o prazo de dedução de impugnação judicial é de noventa dias, computados do termo final do período de pagamento voluntário da liquidação.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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“B..............., S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.99 a 105 do presente processo, através da qual julgou procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de acção e absolveu a Fazenda Pública do pedido, tudo no âmbito de processo de impugnação visando liquidação de Sisa e juros compensatórios, no montante total de € 848.814,16.
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.131 a 139 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A liquidação impugnada ocorreu em 1/02/2007;
2-Foi a liquidação de 1/02/2007, impugnada, que deu origem à única execução fiscal que veio a ser instaurada;
3-Os juros de mora nesta execução, segundo a respectiva citação, são devidos a partir de 2/02/2007, pelo que o termo do prazo de pagamento voluntário terminou no dia anterior, ou seja em 1/02/2007 e não em qualquer outra anterior;
4-Pelo que a impugnação judicial, interposta em 2/05/2007, foi deduzida dentro do prazo legal de 90 dias, nos termos do artº.102, nº.1, al.a), do C.P.P.T.;
5-Se, sobre o mesmo facto tributário, outra liquidação anterior existiu, ela foi tacitamente substituída pela liquidação ora impugnada, porque, ao contrário desta, aquela, se existiu, nunca chegou a produzir qualquer efeito, nunca foram exigidos juros de mora pela falta de pagamento, nem nunca tal “dívida fiscal” foi executada;
6-Ao ter julgado intempestiva a impugnação, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser anulada e substituída por outra que julgue tempestiva a impugnação;
7-Anulando a sentença recorrida e julgando tempestiva a impugnação deduzida, deverá o venerando Tribunal de recurso, porque os autos oferecem todos os elementos para tanto, apreciar a questão de direito suscitada pela impugnante e julgar que a liquidação impugnada enferma de ilegalidade por vício de forma por preterição de formalidade essencial por falta da devida audição prévia do sujeito passivo que não se verificou nem no decurso da acção inspectiva nem posteriormente;
8-Com tal fundamento deverá a impugnação ser julgada procedente por provada;
9-Normas jurídicas violadas: Artº.102, nº.1, al.a), do C.P.P.T.; Artº.60, nº.1, da L.G.T.; Artºs.100 e 135, do C.P.A.;
10-Nos termos sobreditos e noutros que V. Exas., doutamente, suprirão, conclui-se que a douta sentença recorrida está inquinada do vício de erro de julgamento de facto e de direito, pelo que não pode manter-se na ordem jurídica, devendo ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o presente recurso e determine a procedência da impugnação judicial deduzida.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.153 e 154 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto com relevância para o conhecimento da excepção de caducidade do direito de acção (cfr.fls.101 a 103 dos autos):
1-Em 19/07/2006, data de assinatura do aviso de recepção, a impugnante foi notificada para pagar imposto municipal de sisa, pelo ofício nº.3675, de 17/07/2006, dirigido à ora impugnante assinado pela Chefe de Finanças do 10º. Serviço de Finanças de Lisboa, por delegação, com o seguinte teor:

“ASSUNTO: IMPOSTO MUNICIPAL DE SISA - NOTIFICAÇÃO PARA PAGAMENTO
Fica V. Exa. Notificado (a) para no prazo de trinta dias, a contar da data de assinatura do aviso de recepção, efectuar o pagamento da importância de € 745.702,86, acrescido de juros compensatórios no valor de € 103.111,30, mediante guias a solicitar neste Serviço de Finanças, proveniente da liquidação do Imposto Municipal de Sisa, do ano de 2001, respeitante à compra efectuada em 26-06-2001 a P............- INV. ..................., NIF ............ e C........, CONSTRUÇÃO ................, LIMITADA, NIF ..............., do prédio urbano inscrito na respectiva matriz predial da freguesia de C.............., sob o artigo ..... pelo facto de lhe ter sido dado destino diferente após a sua aquisição para revenda (artº.16, nº.1 do CIMSISSD).
Poderá reclamar ou impugnar a presente liquidação, nos termos estabelecidos nos artigos 70.° e 102° do CPPT.
Caso não efectue o pagamento dentro do prazo estipulado, será extraída certidão de dívida para efeitos de cobrança coerciva, conforme o disposto no artigo 88° do CPPT” (cfr.documentos juntos a fls.194 a 196 do processo administrativo apenso);

2-Em 2/05/2007, foi enviada sob o registo postal dos CTT, RO .................PT, a p.i. relativa aos presentes autos de impugnação (cfr.envelope junto a fls.30 dos presentes autos; articulado inicial de fls.3 a 26 dos presentes autos);
3-Pelo 10º. Serviço de Finanças de Lisboa foi emitido documento com o seguinte teor:

“IMPOSTO MUNICIPAL DE SISA
Distrito: Lisboa Concelho: Lisboa
CÓPIA DO TERMO DE DECLARAÇÃO
SISA N.° ............................... Cód. Red.:8026
SUJEITO PASSIVO:
NIF ...................... – B..................SA
SEDE: LARGO .........................., 13, R/C - ...........................
IMÓVEL:
N,° Artigo matricial: 3245
Freguesia: Campolide
Concelho: Lisboa
Localização: Avenida .............................., lote ..............
Destino: comércio
ALIENANTES:
- P.............., INV................. LIMITADA, NIF .................
- C............., CONST. E ................... LIMITADA, NIF ..................
Liquidação de SISA em virtude de ter sido dado destino diferente, apôs a sua aquisição, para revenda, art. 16°, n.° 1 CIMSISSD. Escritura lavrada em 26/06/2001 no 20.° CN Lisboa (livro 379-L, folhas 76 a 78).
Notificado para levantamento da guia de pagamento em 17/07/2006 (n/oficio n.° 3675) após relatório da Inspecção Tributária de ..................
Importância da sisa: € 745 702,86
Juros compensatórios: £ 103 111,30
Coima: € 0,00
Total: € 848 814,16
Importa em oitocentos e quarenta e oito mil oitocentos e catorze euros e dezasseis cêntimos a sisa devida pela transmissão declarada no termo acima transcrito.
Liquidação em 01 de Fevereiro de 2007” (cfr.documento junto a fls.19 dos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da excepção…”.
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso este Tribunal julga provada a seguinte matéria de facto que se reputa igualmente relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
4-A p.i. que originou o presente processo deu entrada no extinto T.A.F. de Lisboa no pretérito dia 3/5/2007 (cfr.data de entrada aposta a fls.3 dos presentes autos).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de acção e absolver a Fazenda Pública do pedido.
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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Argui o recorrente, em síntese e conforme supra se alude, que a liquidação impugnada ocorreu em 1/02/2007. Que foi a liquidação de 1/02/2007 que deu origem à única execução fiscal que veio a ser instaurada. Que a impugnação judicial, interposta em 2/05/2007, foi deduzida dentro do prazo legal de 90 dias, nos termos do artº.102, nº.1, al.a), do C.P.P.T. Que ao ter julgado intempestiva a impugnação, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser anulada e substituída por outra que julgue tempestiva a impugnação (cfr.conclusões 1 a 8 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
O prazo da impugnação judicial é peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo, dado versar sobre direitos indisponíveis no que diz respeito à Fazenda Pública (cfr.artº.333, nº.1, do C.Civil; artº.123, do anterior C.P.Tributário; artº.102, do C.P.P.Tributário; Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Procedimento e de Processo Tributário comentado e anotado, Almedina, 2000, pág.241; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 5ª. edição, I Volume, Áreas Editora, 2006, pág.267; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/6/95, rec.19056, Ap. D.R., 14/8/97, pág.1725 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2013, proc.6125/12).
Por outras palavras, o prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de uma certa pretensão, é um prazo de caducidade. E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto tributário) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr.artº.333, do C.Civil). É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.576, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/1/2013, proc. 6038/12).
A contagem do prazo para interposição de recurso contencioso de impugnação deve fazer-se nos termos do artº.279, do C. Civil, isto é, de forma contínua e sem qualquer desconto dos dias não úteis (cfr.artº.49, nº.2, do C.P.Tributário; artº.20, nº.1, do C.P.P. Tributário; Jorge Lopes de Sousa, ob.cit., pág.730).
Mais se deve levar em consideração, no cômputo do prazo em questão, que o seu termo final em domingo, dia feriado ou férias judiciais, faz com que o mesmo termo se transfira para o primeiro dia útil seguinte (cfr.artº.279, al.e), do C.Civil).
Assente que a contagem do prazo para dedução da impugnação judicial se faz de acordo com as regras previstas no artº.279, do C. Civil, haverá que apurar qual o “dies ad quem” ou termo final dessa contagem no caso concreto.
No caso “sub judice”, resulta do probatório que a sociedade impugnante foi pessoalmente notificada do acto de liquidação de sisa estruturado ao abrigo do artº.16, nº.1, do C.I.M.S.I.S.S.D., tendo a A. Fiscal fixado em trinta dias o prazo para se proceder ao pagamento voluntário do tributo, contado a partir da data da assinatura do a.r., a qual ocorreu em 19/07/2006 (cfr.nº.1 do probatório). E recorde-se que o apelante não impugna esta factualidade constante da decisão do Tribunal “a quo” no recurso deduzido (cfr.artº.640, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).
Apesar disso, defende o recorrente que a liquidação impugnada somente foi estruturada em 1/02/2007, chamando à colação o documento identificado no nº.3 do probatório. Ora, tal documento (cfr.fls.19 dos presentes autos), consubstancia uma mera cópia do termo de declaração de sisa, que não a liquidação, a qual foi notificada ao recorrente em 19/7/2006, tudo conforme consta do aludido nº.1 da factualidade provada. De resto, o próprio documento indentificado no nº.3 do probatório faz menção do ofício nº.3675, de 17/07/2006, através do qual foi notificado o acto tributário ao sujeito passivo. Por último, sempre se dirá que somente o documento identificado no nº.1 da factualidade provada satisfaz os requisitos do regime de notificação dos actos tributários constante dos artºs.36 e seg. do C.P.P.T.
Concluindo, a sociedade recorrente deve considerar-se notificada da liquidação de sisa em causa nos presentes autos em 19/07/2006 (cfr.nº.1 do probatório).
Aplicando o identificado regime ao caso dos autos, conforme mencionado, a impugnante foi notificada no dia 19/07/2006 para, no prazo de trinta dias efectuar o pagamento da liquidação do Imposto Municipal de Sisa, do ano de 2001, no montante total de € 848 814,16, terminando o prazo do pagamento voluntário, em 18/08/2006. O termo inicial do prazo de noventa dias, para impugnar, ocorreu em 19/08/2006, datando o termo final de 16/11/2006, uma quinta-feira (cfr.artº.102, nº.1, al.a), do C.P.P.T.).
Uma vez que a petição de impugnação foi expedida pelo correio, em 2/05/2007, ela é manifestamente intempestiva.
Sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 3 de Outubro de 2013


(Joaquim Condesso - Relator)
(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)

(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)