Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 02297/08 |
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Secção: | CT - 2.º JUÍZO |
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Data do Acordão: | 06/24/2008 |
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Relator: | JOSÉ CORREIA |
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Descritores: | IRC. INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA. OMISSÃO DE PRONÚNCIA. ANÁLISE CRÍTICA. QUALIFICAÇÃO COMO CUSTOS DOS JUROS IMPUTADOS POR ENTIDADE BANCÁRIA FRANCESA À SUA SUCURSAL EM PORTUGAL. PERSONALIDADE JURÍDICA E PERSONALIDADE TRIBUTÁRIA DAS SUCURSAIS. |
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Sumário: | I) -A competência do tribunal afere-se face à pretensão formulada pelo autor na petição inicial, traduzida no binómio pedido/causa de pedir, ou seja, face ao «quid disputatum» e não ao «quid decisum», isto é, dito por outras palavras, a competência determina-se pelo pedido do Autor, irrelevando qualquer tipo de indagação acerca do seu mérito. II) -A identificação dos fundamentos do recurso colhe-se nas conclusões das alegações porque é nelas que o recorrente tem de condensar as causas de pedir que tenham susceptibilidade jurídica para, segundo o seu prisma, justificar a censura da decisão recorrida. III) -O recurso tem exclusivo fundamento em matéria de direito se, perante o circunstancialismo dos autos, se concluir que para solucionar a matéria alegada e controvertida pelas partes não se torna necessário fazer qualquer juízo sobre questões probatórias ou averiguar da materialidade alegada como eventualmente interessando a outras plausíveis soluções de direito. IV) -Não padece do vício formal de omissão de pronúncia e de contradição entre os fundamentos e a decisão, a sentença recorrida que não deixa de conhecer de todas as questões suscitadas, embora não conheça de todos os argumentos ou raciocínios invocados, bem como a sua decisão mais não é do que a conclusão lógica, necessária, das premissas em que assenta e consideradas provadas; V) -Não padece do vício de falta de análise crítica das provas, a sentença recorrida que indica os concretos elementos probatórios em que assenta a decisão fáctica, bem como no final indica por que deu como provada certa matéria e não outra, indicando os concretos meios probatórios que a tal conduziram, ainda que, porventura, tal juízo se possa mostrar errado, o que integraria o errado julgamento da matéria de facto efectuado que não o citado vício; VI) -No caso de financiamentos obtidos pela sucursal junto da sede não existe a figura de mútuo pelo que não se enquadram os juros pagos pela sucursal à sede no art.° 6° do Código do IRS e, consequentemente, não haverá lugar à retenção na fonte de IRC, prevista no art.° 75° do respectivo Código. VII) -A determinação do lucro tributável da sucursal deverá efectuar-se como se de um estabelecimento independente se tratasse (n° l, art° 49° do CIRC - não residente com estabelecimento estável em território português), pelo que os juros em questão deverão ser considerados como custo, nos termos do art.° 23° do Código do IR. VIII) -Dispondo a ora recorrida, em Portugal de um centro estável de imputação de relações ou actividades económicas que geraram rendimentos, e tendo igualmente em conta o disposto no art.° 12° da CDT celebrada entre Portugal e França, os lucros imputáveis a esse estabelecimento estável nunca estão sujeitos a tributação em Portugal por retenção na fonte, mas sim nos termos equivalentes às sociedades residentes, nos termos do art.° 69° n° l do CIRC. IX) -Também as regras estabelecidas no art.° 7° da CDT entre Portugal e França apontam para que ao estabelecimento estável serão imputados os lucros que este obteria se fosse uma empresa distinta e separada que exercesse as mesmas actividade ou actividades similares, nas mesmas condições ou em condições similares e tratasse com absoluta independência com a empresa de que é estabelecimento estável, o que quer dizer que para efeitos de IRC a impugnante é considerada como sujeito passivo nos termos do art.° 2° n° l al. c) do IRC, logo tem personalidade tributária. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA 2ª SECÇÃO DO TCAS: 1.- B...., com os sinais dos autos, interpôs recurso da sentença do TAF de Lisboa que julgou improcedente a impugnação que deduziu contra a liquidação de IRC relativa ao exercício do ano de 2000. Alegou para concluir do seguinte modo: A) A liquidação de IRC ora sindicada viola o disposto nos artigos 4° e 50° do CIRC e o artigo 7° do ADT celebrado entre Portugal e França; B) A questão material controvertida consiste em determinar se os fluxos financeiros entre uma sucursal em Portugal de uma entidade residente em França são susceptíveis de serem qualificados de juros; C) Não sendo a sucursal mais do que um prolongamento da sede enquanto parte da mesma organização empresarial e não dispondo de personalidade jurídica autónoma, fica de per si inviabilizada a qualificação dos pagamentos efectuados como sendo juros derivados de um contrato de mútuo; D) Os fluxos financeiros entre sede e sucursal correspondem a meras alocações internas de fundos para fazer face a um financiamento no mercado interbancária (negociado pela Sede em França), sendo as rendas de locação financeira percebidas pela sucursal e aqui incluídas na sua matéria colectável e sujeitas a tributação em Portugal; E) Torna-se, assim, evidente que não estamos perante juros na acepção constante do n° 3 do artigo 12° do ADT entre Portugal e França, o que foi, aliás, parcialmente concedido pelo Tribunal a quo na sentença ora recorrida; F) O montante de juros resultante da afectação do financiamento por parte da sede à sucursal nunca poderia estar sujeito a tributação por retenção na fonte liberatória em Portugal, uma vez que a sede é tributada em Portugal através do seu estabelecimento estável, pois conforme determina a alínea c) do n° 1 do artigo 3° do CIRC, o IRC incide sobre o lucro imputável a estabelecimento estável situado em território português; G) As entidades não residentes em Portugal que aqui possuam um estabelecimento estável são tributados pelo lucro que esse estabelecimento estável obtenha em Portugal (rendimentos imputáveis a esse estabelecimento) -de acordo com as regras de apuramento da matéria colectável aplicáveis à generalidade das entidades residentes, com pequenas particular; H) A Recorrente é assim tributada sobre o lucro tributável imputado à sucursal, o qual será dado pela diferença (positiva ou negativa) entre os encargos suportados com os juros cobrados pela sede e os proveitos gerados com a gestão dos contratos de locação financeira celebrados pela Sucursal em Portugal; l) As relações entre sede e sucursal não revestem a natureza de verdadeiras relações jurídicas, na medida em que este conceito pressupõe a existência de dois sujeitos de direito e no caso existe apenas um, o que determina a insusceptibilidade de qualificar o acordo existente entre a Recorrente e a sua casa -mãe como um verdadeiro contrato de mútuo; J) O artigo 7° do ADT estabelece que apenas os lucros imputáveis a um estabelecimento estável podem ser sujeitos a tributação no Estado da fonte, pelo que no caso em apreço, Portugal nunca se poderia arrogar a competência para tributar os rendimentos através de retenção na fonte; K) Não consubstanciando os fluxos internos entre Sede e sucursal rendimentos de capitais ou juros, parece claro que a admitir-se a tributação de tais pagamentos os mesmos seriam efectuados exclusivamente em França, ao abrigo do artigo 7 do respectivo ADT; L) Ainda que se admitisse que os fluxos financeiros existentes entre a sede e a sucursal poderiam ser qualificados como juros, o que por mero dever de raciocínio se admite, sempre se deveria entender que os mesmos deveriam ser isentos de tributação ao abrigo do disposto no artigo 29° do EBF; M) A decisão recorrida viola de forma frontal a liberdade de estabelecimento consignada no artigo 43° do Tratado da Comunidade Europeia; N) A Recorrente foi objecto de uma tributação menos favorável do que aquela que estaria sujeita, nas mesmas condições, se exercesse a sua actividade em Portugal através de uma filial; O) O que está em causa é determinar se um sujeito passivo pode ser sujeito a uma tributação mais gravosa em função da forma jurídica que adopta em Portugal: isenta no caso de uma filial de sociedade não residente ou um estabelecimento estável de uma sociedade não residente; P) O TJCE, em matéria de discriminação, já se pronunciou nos processos n° 270/93, de 28.01.1986 e C-311/97 ("Avoir Fiscal"), pela proibição da discriminação entre sociedades residentes e não residentes para efeitos de concessão de uma isenção fiscal, nomeadamente, introduzindo um regime menos favorável para as entidades não residentes pela circunstância de exercerem a sua actividade noutro Estado Membro por intermédio de uma sucursal e não de uma filial, dotada de personalidade jurídica e residente para efeitos fiscais nesse Estado Membro; Q) Caso estivéssemos perante o pagamento de juros resultantes de um financiamento contraído por parte de uma filial portuguesa junto da sua casa mãe (instituição financeira residente noutro Estado-Membro da União Europeia), nenhuma dúvida restará que se aplicaria a isenção do artigo 29° do EBF; R) A liquidação ora sindicada ser objecto de anulação em virtude da violação dos artigos 50° do CIRC, 29° do EBF e dos princípios da não discriminação e da liberdade de estabelecimento, tal como consagrados no artigo 43° do TCE; S) A violação do princípio da não discriminação não fica sanada pela aplicação do mecanismo do crédito de imposto previsto no ADT, pois a sucursal ver-se-ia sempre obrigada a proceder à retenção na fonte do rendimento; T) As diferenças de tratamento fiscal entre filiais e sucursais de entidades residentes noutros Estados-Membros, baseadas apenas no critério da nacionalidade têm sido entendidas pelas instâncias comunitárias como restritivas das liberdades comunitárias e impeditivas da consagração do mercado único europeu; U) A omissão de pronúncia do Tribunal sobre questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, bem como a falta de exame crítico das provas, constitui causa de nulidade da sentença nos termos do disposto no artigo 125° do CPPT e do número 2 do artigo 660° do CPC e n° 3 do artigo 659° do mesmo diploma legal; V) A sentença recorrida padece de vício de omissão de pronúncia, na medida em que o Tribunal não se pronuncia sobre todas as questões levantadas pela Recorrente em sede de impugnação judicial e que constituíram parte da causa de pedir, pois não se pronuncia sobre a violação do artigo 55° da LGT, em função dos entendimentos contraditórios da Administração Tributária sobre a questão material controvertida; W) A qualificação dos rendimentos decorrentes das operações desenvolvidas pela Recorrente foi objecto de diferentes enquadramentos por parte da Administração Tributária, situação que foi submetida à apreciação do tribunal a quo e sobre a qual este não se pronunciou, o que se invoca para os devidos efeitos legais. X) Deve assim ser anulada a sentença ora recorrida, por violação do disposto no número 2 do artigo 660° do CPC e em sequência do artigo 125° do CPPT. Nestes termos, entende que o recurso deve ser julgado totalmente procedente, por provado, revogando-se a Douta Sentença recorrida, bem como o acto tributário sindicado referente a IRC do exercício de 2000, tudo com as demais consequências legais. Caso assim não se entenda, deve a sentença recorrida ser anulada por violação do disposto no artigo 660° do CPC, Assim fazendo, VOSSAS EXCELÊNCIAS, a costumada Justiça! Não foram apresentadas contra-alegações. O EPGA suscitou a excepção da incompetência hierárquica do TCAS em virtude de, no seu entender, estar em causa nos autos matéria exclusivamente de direito para cuja sendo o STA o competente para dirimir o litígio nos termos das disposições combinadas dos artigos 12º, nº 5, 26º, al. b) e 38º, al. a) do ETAF. Ouvidas as partes sobre essa matéria de excepcionalidade, veio a recorrente sustentar que também se discute no recurso matéria de facto, adrede porque foi arguida a nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por falta de exame crítico das provas. Os autos vêm à conferência depois de recolhidos os vistos legais. * 2. -Na sentença recorrida foi fixado o seguinte probatório:Factos provados: a) A Impugnante exerce em Portugal a actividade bancária e de locação financeira, por intermédio de uma Sucursal, estando a sua sede localizada em França; b) A actividade da Impugnante em Portugal limitou-se, desde 1997, e em concreto no exercício de 2000, à celebração e gestão, através da Sucursal, de dois contratos de locação financeira para a construção de dois centros comerciais localizados em C... e em L...., no valor total de PTE 1.800.000.OOO$00, correspondente acerca de EUR 9.000.000,00 (nove milhões de euros). c) O respectivo financiamento a montante, no mercado interbancário, no mesmo valor, foi negociado e celebrado em França pela sede, tendo sido os respectivos fundos afectos à Sucursal em Portugal. d) Os juros de tal financiamento, suportados pela sede em França, são facturados à Sucursal em Portugal. e) Durante o ano de 1996, a Impugnante reteve IRC na fonte, sobre os juros facturados pela sede, nos montantes de PTE 921.575$00 e PTE 64.900.572$00, à taxa de 12%; f) A partir do exercício de 1997, a Impugnante deixou de efectuar qualquer tipo de retenção na fonte; g) Na sequência de uma acção de inspecção interna à declaração Modelo 130, restrita ao ano de 2000, a Administração Tributária, por intermédio da Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária (DSPIT), notificou, a 29 de Julho de 2004, a Impugnante do respectivo projecto de relatório de conclusões, nos termos do qual se propunha a liquidação adicional de IRC no valor de EUR 42.499,12; h) No decurso da inspecção a impugnante enviou ao Director de Finanças a carta registada fotocopiada a fls. 41, com o seguinte teor: No que diz respeito à prova da participação directa no capital durante dois anos consecutivos, o sujeito passivo considera que tal prova não prossegue qualquer efeito útil, uma vez que o mesmo se encontra constituído sob a forma jurídica de uma sucursal, não dispondo, pois, de capital social, nem personalidade jurídica distinta da sociedade não residente sedeada em França, No que diz respeito à entrega dos formulários 4-RFI, o sujeito passivo entende que os mesmos não carecem de ser apresentados na situação em concreto, uma vez que os juros pagos estão abrangidos pela norma de isenção prevista no artigo 29° do BEF, não estando, pois sujeitos a tributação em Portugal. 3. Finalmente, e conforme solicitado, anexam-se os comprovativos dos pagamentos efectuados, com a identificação das respectivas datas e beneficiário. i) Consta do relatório da inspecção referido na al. g) o seguinte: "Os rendimentos pagos pelo sujeito passivo em análise, durante o ano de 2000, a não residentes, nos termos do Artº 119° do CIRC, caracterizaram-se por juros à entidade francesa «S...., SA»". Os rendimentos provenientes de juros devem ser tributados à taxa de 20%, de acordo com o estipulado nos artigos 69° e 75° (actuais 80° e 88°) do CIRC, com a correspondente retenção na fonte, do imposto (...). Na presente situação, a isenção prevista no artigo 29° do EBF não é aplicável, dado que não se trata de um empréstimo externo entre instituições com personalidade jurídica distinta, mas antes de um empréstimo da casa-mãe "S......, SA" à sua sucursal (estabelecimento estável) em Portugal. " j) A 9 de Agosto de 2004, a Impugnante exerceu o direito de audição prévia, nos termos que constam do doc. de fls. 50 e ss., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; k) A 2 de Setembro de 2004, a Impugnante foi notificada do relatório de conclusões do procedimento de inspecção, tendo a Administração Tributária mantido as correcções inicialmente previstas ao exercício de 2000, constando de tal relatório, além do mais, que "(...) o Art° 29° do EBF não é aplicável à presente situação, nem o disposto nos n°s l e 2 do Art° 12 da CDT celebrada entre Portugal e França, conforme estabelece o seu n. ° 4, sendo aplicáveis as disposições do Art° 7 da referida CDT. Assim, ao serem aceites como custos para efeitos da determinação do lucro tributável em sede de IRC, os juros pagos pela sucursal do Banco francês ao próprio Banco, encontrar-se-ão sujeitos a retenção na fonte, pelo que se mantêm as correcções propostas." 1) A 14 de Outubro de 2004, a Administração Tributária notificou a Impugnante da nota fotocopiada a fls. 84, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, de liquidação efectuada em 06.10.2004, no montante de € 42.499,12, a título de IRC (retenções na fonte), acrescido de € 9.567.15 a título de juros compensatórios, num total de € 52.066,27; m) As verbas remetidas pela sucursal à sede em 20.03.2000, 19.06.2000, 15.09.2000 e 07.12.2000 foram, respectivamente, de € 78.202,72, € 87.501,75, € 102.267,85 e € 110.227.76; n) A liquidação referida supra em 1) foi calculada com base no imposto em falta (correcção) de € 20.453,57 e € 22.045,55, incidente, respectivamente, sobre o montante pago em 15.09.2000 e em 07.12.2000, referidos na al. anterior; * Factos não provadosNão há factos não provados com interesse para a decisão da causa. * Motivação quanto à matéria de facto:A convicção do Tribunal baseou-se no teor dos documentos juntos aos autos e no PAT apenso, que não foram impugnados. * 3. – Cumpre solver a questão prévia, suscitada pelo EPGA em vista do disposto nos artigos 493º, nº 2, 494º, al. a) e 495º todos do CPC, da falta de competência hierárquica do Tribunal, por lograr de prioridade de conhecimento sobre as demais questões como se proclama no artº 660º, nº 1 al. a); 713º nº 2 e 749º, do CPC. Fazendo a recensão, o MP limita-se a afirmar que no caso dos autos está em causa apenas matéria de direito; contudo, não demonstra que assim seja. Vejamos. No artº 26º, nº 1, al. b) do ETAF, atribui-se competência à Secção do Contencioso Tributário do STA para conhecer «...dos recursos interpostos das decisões dos tribunais tributários com exclusivo fundamento em matéria de direito». O critério jurídico para destrinçar se estamos perante uma questão de direito ou uma de facto, emergente de diversas disposições legais, passa por saber se o recorrente faz apelo, na causa de pedir, apenas a normas ou princípios jurídicos que tenham sido na decisão recorrida supostamente violados na sua determinação, interpretação ou aplicação ou se também à consideração de quaisquer factos materiais ou ocorrências da vida real (fenómenos da natureza ou manifestações concretas da vida mesmo que do foro espiritual ou volitivo), independentemente da sua pertinência, merecimento ou acerto para a solução do recurso. Nessa óptica, o que é verdadeiramente determinante é o efeito que o recorrente pretenda retirar de tais asserções cujo conhecimento envolva a elaboração de um dado juízo probatório que não se resolva por meio de uma simples constatação sobre se existiu ofensa de uma disposição legal expressa que implique uma dada espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de certo meio de prova, caso em que a competência caberá já não ao tribunal de revista (artº 21º nº 4 do ETAF), mas ao Tribunal Central Administrativo por força do artº 41º, nº 1, al. a) do ETAF. E, pela voz da doutrina, não se olvida o pensamento de MANUEL DE ANDRADE, in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, página 91, que nos ensina ser a competência dos tribunais aferida em função dos termos em que a acção é proposta, «seja quanto aos seus elementos objectivos (natureza da providência solicitada ou do direito para o qual se pretende a tutela judiciária, facto ou acto donde teria resultado esse direito, bens pleiteados, etc.), seja quanto aos seus elementos subjectivos (identidade das partes). A competência do tribunal – ensina REDENTI – “afere-se pelo quid disputatum (quid decidendum, em antítese com aquilo que será mais tarde o quid decisum)”, é o que tradicionalmente se costuma exprimir dizendo que a competência se determina pelo pedido do Autor. E o que está certo para os elementos objectivos da acção está certo ainda para a pessoa dos litigantes.» «A competência do tribunal não depende, pois, da legitimidade das partes nem da procedência da acção. É ponto a resolver de acordo com a identidade das partes e com os termos da pretensão do Autor (compreendidos aí os respectivos fundamentos), não importando averiguar quais deviam ser as partes e os termos dessa pretensão» (Obra e local citados). Este entendimento está, aliás, em sintonia com o direito que a todos os cidadãos é garantido de acederem aos tribunais com o escopo de verem apreciados os direitos de que se arrogam (n.º1 do artigo 20º da Lex Fundamentalis) e tem vindo a ser aceite, no essencial, pelo STJ, STA e Tribunal de Conflitos (veja-se, entre outros, os Acs. do T. Conflitos, de 31.01.91, AD 361 e de 6-7-93 (Conflito nº 253); do STJ, de 03.02.87, in BM 364º-591, de 202-90. BMJ 394º-453, de 12.01.94 e do STA, de 09.03.89,Rec. 25084, de 13.05.93, Rec. 31478, de 27.01.94, Rec. 32278, de 28.05.96, Rec. 39911, de 26.09.96, Rec. 267, de 27.11.96,Rec. 39544, de 19.02.97, Rec. 39589, de 24.11.98, Rec. 43737 de 03.03.99, Rec. 40222, de 23.03.99, Rec. 43973, de 26.05.99, Rec. 40648, de 13.10.99, Rec. 44068, de 26.09.00, Rec. 46024, de 06.07.00. Rec. 46161, de 03.10.00, Rec. 356 e de 11.07.00, Rec. 318). Temos, assim, que a competência do tribunal se afere face à pretensão formulada pelo autor na petição inicial, traduzida no binómio pedido/causa de pedir, ou seja, face ao «quid disputatum» e não ao «quid decisum», isto é, dito por outras palavras, a competência determina-se pelo pedido do Autor, irrelevando qualquer tipo de indagação acerca do seu mérito. Ora, a identificação dos fundamentos do recurso colhe-se nas conclusões das alegações porque é nelas que o recorrente tem de condensar as causas de pedir que tenham susceptibilidade jurídica para, segundo o seu prisma, justificar a censura da decisão recorrida. E o certo é que nas conclusões U) a W) a recorrente assaca à sentença o vício de nulidade por omissão de pronúncia do Tribunal sobre questões que tinha submetido à sua apreciação, acrescentando que a falta de exame crítico das provas, constitui causa de nulidade da sentença nos termos do disposto no artigo 125° do CPPT e do número 2 do artigo 660° do CPC e n° 3 do artigo 659° do mesmo diploma legal. Substanciando, diz a recorrente que a sentença recorrida padece de vício de omissão de pronúncia, na medida em que o Tribunal não se pronuncia sobre todas as questões levantadas pela Recorrente em sede de impugnação judicial e que constituíram parte da causa de pedir, pois não se pronuncia sobre a violação do artigo 55° da LGT, em função dos entendimentos contraditórios da Administração Tributária sobre a questão material controvertida; e, a qualificação dos rendimentos decorrentes das operações desenvolvidas pela Recorrente foi objecto de diferentes enquadramentos por parte da Administração Tributária, situação que foi submetida à apreciação do tribunal a quo e sobre a qual este não se pronunciou, o que se invoca para os devidos efeitos legais. Patenteiam as transcritas conclusões das alegações que se levantam questões cuja solução passa pela reanálise da factologia fornecida pelos autos, o que quer dizer que se questionam factos que segundo a recorrente não foram considerados na fundamentação da decisão impugnada, existindo controvérsia factual a dirimir. Donde que, em atenção ao que se deixou dito, a solução da divergência não será resultado de uma actividade de interpretação e aplicação de normas jurídicas, «maxime» as atrás referidas. Colocando-se a questão da competência hierárquica perante o circunstancialismo atrás sumariado, deve concluir-se que para solucionar a matéria alegada e controvertida pelas partes se torna necessário fazer um juízo sobre questões probatórias e/ou averiguar da materialidade alegada como eventualmente interessando a outras plausíveis soluções de direito. Daí a conclusão final de que o recurso não tem exclusivo fundamento em matéria de direito, pertencendo a este Tribunal a competência pare dele conhecer., o que passará a fazer-se. * Da nulidade da sentença:Como se viu, a recorrente sustenta que a sentença recorrida padece de vício de omissão de pronúncia, na medida em que o Tribunal não se pronuncia sobre todas as questões levantadas pela Recorrente em sede de impugnação judicial e que constituíram parte da causa de pedir, pois não se pronuncia sobre a violação do artigo 55° da LGT, em função dos entendimentos contraditórios da Administração Tributária sobre a questão material controvertida; e, a qualificação dos rendimentos decorrentes das operações desenvolvidas pela Recorrente foi objecto de diferentes enquadramentos por parte da Administração Tributária, situação que foi submetida à apreciação do tribunal a quo e sobre a qual este não se pronunciou, o que se invoca para os devidos efeitos legais. Nesse sentido, a nulidade da sentença, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alíneas d) 660.º n.º2 e 713.º n.º2 do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, apenas ocorre quando o Juiz deixe de pronunciar-se em absoluto de questão que deva conhecer, que por isso tenha sido submetida à sua apreciação e da qual não conheça, nem o seu conhecimento tenha sido considerado prejudicado pela solução dada a outra (s), como constitui jurisprudência abundante (Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 2.10.1996 (ambos), recursos n.ºs 20472 e 20491). No ensinamento do Professor Alberto dos Reis - Código de Processo Civil Anotado, volume V, (Reimpressão), pág. 142 e segs - «Esta nulidade está em correspondência directa com o 1.º período da 2.ª alínea do art.º 660.º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.... São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão». Contudo, não substancia, no caso, a recorrente, tal omissão de pronúncia, antes se escuda em argumentos e raciocínios por que entende que o tribunal estava obrigado a pronunciar-se sobre a violação do artigo 55° da LGT, em função dos entendimentos contraditórios da Administração Tributária sobre a questão material controvertida. Ora, os Tribunais, como órgãos de soberania independentes não estão subordinados às decisões tomadas em matéria fiscal pela administração, ainda que vinculativas para esta, na medida em que aos Tribunais compete interpretar e aplicar a lei fiscal sem qualquer dependência dos critérios adoptados pela administração e daí que, sendo proferida decisão judicial em sentido diverso daquele que foi seguido na informação vinculativa, a administração tenha de a respeitar e fazer executar. Na verdade, tal como as circulares administrativas não vinculam os contribuintes, mas apenas os respectivos serviços. Ora, se é certo que os tribunais estão apenas sujeitos à lei, pelo que não os vincula qualquer orientação administrativa de que decorra uma certa interpretação da mesma, as circulares administrativas (bem como as informações prévias) não vinculam os contribuintes, mas apenas os respectivos serviços e, face à lei, os procedimentos definidos, «maxime» o “direito circulado” da AF não podem derrogar o princípio da legalidade tributária à luz do qual a sentença (se bem ou mal é outra questão que pode configurar erro de julgamento e já não nulidade da sentença) apreciou a invocada desconformidade do conteúdo do acto recorrido com as normas legais referidas e, deste modo, que os pressupostos realmente existentes impunham a decisão administrativa de sinal contrário, sendo certo que o Sr. Juiz recorrido, mesmo que tivesse conhecimento de posições contraditórias da AT sobre a matéria em causa, não estava vinculado àquela decisão administrativa. Termos em que não se verifica a invocada nulidade por omissão de pronúncia. * Afirma de seguida a recorrente que a sentença deixou de fazer a análise crítica das provas e isso porque e a falta de exame crítico das provas, constitui causa de nulidade da sentença nos termos do disposto no artigo 125° do CPPT e do número 2 do artigo 660° do CPC e n° 3 do artigo 659° do mesmo diploma legal.Nos termos do disposto no art.º 123.º n.º2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões. E a norma do art.º 659.º n.º3 do CPC, dispõe que o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos, ou por confissão reduzida escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer.” Por assim ser, também nesta matéria, carece de razão a ora recorrente. Na verdade, no probatório fixado na sentença recorrida não deixou a M. Juiz do Tribunal “a quo” de fixar os factos provados, subordinados a alíneas, indicando como base dessa decisão os documentos que serviram para essa prova, como no final explicitou, o que se nos afigura suficiente face às pertinentes questões a decidir, bem como justificou a factualidade que entendeu não provada, por referência ao concreto quadro da prova existente nos autos, tendo depois mesmo na aplicação do direito voltado a fundamentar, de forma minuciosa. Daí que não se possa afirmar, como faz a recorrente, que o Mº Juiz deixou de fazer a pertinente análise crítica, tendo depois fundamentado com o direito que no caso entendeu aplicável cujas normas citou, pelo que a sentença recorrida jamais poderia ter incorrido neste invocado vício. E, quanto aos factos fixados no probatório da sentença recorrida, com a análise crítica efectuada que como tal os considerou, bem poderia a ora recorrente reagir, através do presente recurso jurisdicional, invocando os concretos pontos que considera incorrectos julgados e quais os concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, a fim de permitir a este Tribunal reapreciar tal julgamento da matéria de facto efectuado, nos termos do disposto no art.º 690.º-A do CPC, o que a mesma não fez. Improcede, consequentemente, a matéria das conclusões do recurso sob análise. * Vejamos agora se os juros imputados pela recorrente, com sede em França, à sua sucursal em Portugal devem, ou não, ser considerados custos.No acórdão deste TCAS da Secção CT - 2.º JUÍZO, proferido em 29/01/2008 no Recurso nº 2161/07, relatado pelo relator desta formação, já as questões que compõem o objecto do presente recurso foram, em substância, tratadas, pelo que se vai seguir de perto a fundamentação desse douto acórdão que se adaptará à solução do presente pleito. Assim: “…vemos que no caso vertente a Selectibanque, com sede em França financiou a sucursal, em Portugal, em 1.800.000 contos, para efeitos de dois investimentos na área imobiliária em Portugal, concretamente para a construção de dois centros comerciais localizados em C..... e em L....., pelo que a sede debitou os juros à sucursal que os pagou à casa mãe, mas não efectuou qualquer tipo de retenção por entender que tais operações estavam abrangidas pelo art.° 36° A do EBF, à data dos factos. Nesse contexto, como afirma a sentença recorrida relativamente à aplicação do art.° 12° da CDT, não assiste razão à Administração Tributária porquanto conforme alega a impugnante, os lucros imputáveis a um estabelecimento estável nunca estão sujeitos a tributação em Portugal por retenção na fonte, mas sim nos termos gerais, ou seja, em termos equivalentes às sociedades residentes, nos termos do art.° 69° n° 1 do CIRC. E, tendo em conta as regras estabelecidas no art.° 7° do ADT entre Portugal e França, nunca Portugal poderia arrogar-se a competência para sujeitar esses rendimentos a tributação em Portugal por retenção em fonte, pois nos termos do art.° 7° do ADT: "1 - Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sua actividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado. Se a empresa exercer a sua actividade deste modo, os seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem imputáveis a esse estabelecimento estável. 2 - Quando uma empresa de um Estado Contratante exercer a sua actividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado, serão imputados, em cada Estado Contratante, a esse estabelecimento estável os lucros que este obteria se fosse uma empresa distinta e separada que exercesse as mesmas actividade ou actividades similares, nas mesmas condições ou em condições similares e tratasse com absoluta independência com a empresa de que é estabelecimento estável." É, pois, de sufragar a tese da sentença ao expender que: “…os normativos enunciados prevalecem sobre as normas de direito interno por força do preceituado no art° 8° da CRP, a consagração da competência exclusiva do Estado de residência, excepto quanto aos rendimentos obtidos no Estado da fonte, Portugal, através de um estabelecimento estável. Ora, por lucro imputável ao estabelecimento estável só se poderá entender os rendimentos que sejam economicamente atribuíveis ao estabelecimento estável, ou seja, os rendimentos que resultam da actividade prosseguida pelo estabelecimento estável nesse território, como é no caso em apreço e reconhecido pela Administração Tributária. Logo, o rendimento imputável ao estabelecimento estável encontra-se sujeito a tributação em Portugal de acordo com os normativos aplicáveis em sede de IRC, uma vez que o ADT entre Portugal e França não estabelece as regras de determinação da matéria colectável dos estabelecimentos estáveis, antes remetendo para a legislação interna aplicável, o que equivale a dizer que se aplica o art.° 36° A do EBF. A impugnante entende que se os juros pagos pela sede e imputados à sucursal são considerados custos nos termos do art.° 23° do CIRC pois os mesmos geram proveitos na esfera da impugnante, beneficiando da isenção consagrada no art.° 36°-A do EBF. A resposta da Administração Tributária, é no sentido de "os juros pagos pela sucursal (...) e dado que por falta de personalidade jurídica da sucursal não pode a mesma beneficiar da isenção prevista no art.° 29.° do EBF, pelo que, nos termos do disposto na alínea d) do n.° 2 do art.° 69.° do CIRC (actual art.° 80.°) estão os mesmo sujeitos a tributação à taxa de 20% pelo sistema de retenção na fonte (...) e não sendo de aplicar a taxa reduzida prevista no n.° 2 do art.° 12.° celebrada com a França uma vez que não foi cumprido o formalismo previsto no n.° 2 item I da Circular n.° 2/73, de 29 de Janeiro (posteriormente no n.° 3.1 alínea b) da Circular n.° 18/99, de 7 de Outubro) exigível por força do disposto no n.° l do art° 9 DL 215/89, de 1 de Julho)". Não assiste razão a Administração Tributária em tal fundamentação, pois ao afirmar que a impugnante não goza de personalidade jurídica esquece-se que para efeitos de IRC a mesma é considerada como sujeito passivo nos termos do art.° 2° n° 1 al. c) do IRC, logo tem personalidade tributária.” Conforme se expendeu no Acórdão do TCAS de 17/04/07, tirado no Recurso nº 1633/07, relatado pelo relator desta formação e em que era impugnante/recorrente o B.... P....., SA, na actualidade, a actividade financeira é considerada basilar de todas as demais actividades económicas pois é absolutamente indispensável para o desenvolvimento económico e social. Daí que o poder político lhe tem reservado a maior atenção, impondo-lhe regulamentação específica, cuidada e permanente. Assim, não pode exercer essa actividade qualquer pessoa ou entidade mas apenas aquelas que preencham os requisitos definidos pelo Estado pois, embora seja livre o acesso à actividade, já o seu exercício é extremamente condicionado, o que acontece não só em Portugal mas praticamente em todos os ordenamentos jurídicos. E tanto assim que, estando o nosso país – como a França - também sujeito ao Direito Comunitário, é inevitável que a situação do nosso ordenamento jurídico esteja impregnado dos princípios definidos por aquele. No Livro Branco da Comissão Europeia vieram a ser consagrados os princípios da harmonização parcial e o do mútuo reconhecimento, ou seja, cada país reconheceria as instituições bancárias dos demais países, implicando que o país de origem pudesse controlar as «suas» instituições de crédito instaladas nos outros países (de acolhimento). Com o Acto Único Europeu, assinado em Fevereiro de 1986, foram incrementadas as medidas de harmonização, mediante a definição dos projectos da liberalização completa dos movimentos de capitais, da harmonização das regras de acesso à actividade das instituições de crédito, da elaboração de um código de boa conduta referente a novos meios de pagamento, da instauração de medidas, por meio de Directivas, respeitantes ao crédito hipotecário, aos fundos próprios, à falência e liquidação de instituições de crédito e ainda ao tratamento a dar às sucursais de bancos estrangeiros. Foi neste contexto que foram publicadas várias Recomendações e Directivas de que se destacam a Segunda Directiva de Coordenação Bancária (Directiva n.° 89/646/CEE, do Conselho, de 15 de Dezembro de 1989), que institui os princípios do reconhecimento mútuo (a instituição de crédito admitida em determinado país pode exercer a sua actividade em todos os países comunitários, sob controlo do país de origem, operada pela supervisão da instituição) e o princípio da existência de normas prudenciais harmonizadas (incidindo sobre o capital mínimo, a manutenção de fundos próprios e controlo das situações de domínio, o que tudo vai no sentido de que o Direito Comunitário impõe a observância de critérios mínimos permitindo ao Estado a imposição de medidas mais severas). Merece ainda especial realce a Directiva n.° 89/647/CEE, do Conselho, de 18 de Dezembro de 1989 que estabelece os rácios de solvabilidade. A nível interno e sob a influência da evolução legislativa comunitária, foi promulgado o Decreto-Lei 23/86 que veio regular a constituição e condições de funcionamento de instituições de crédito com sede em Portugal, bem como a abertura e condições de funcionamento de filiais ou sucursais de instituições de crédito com sede no estrangeiro, revogando vários artigos do Decreto-Lei n.º 41403, e 27 de Novembro de 1957, do Decreto-Lei n.º 42641, de 12 de Novembro de 1959, e o Decreto-Lei n.º 146-A/80, de 22 de Maio. Publicado no DR nº40/86 - I Série de 18 de Fevereiro, o Decreto-Lei 23/86, conforme a sua própria declaração de princípios, tinha em vista fundamentalmente adaptar o regime legal português de licenciamento de instituições de crédito às orientações do direito comunitário, em especial as decorrentes da Directiva n.º 77/780/CEE, de 12 de Dezembro de 1977, tendo presentes as derrogações acordadas no decurso do processo negocial de adesão de Portugal às Comunidades Europeias. Optou-se pela consagração de um sistema genericamente compreensivo de todas as instituições de crédito, exceptuadas as que se venham a constituir sob a forma de empresa pública, porque a uma identidade básica de natureza é aconselhável que corresponda um regime unificado. Sendo esta a regra, poderão admitir-se algumas modificações, quando assim o determinem as particulares especificidades de um ou outro tipo de instituição de crédito: é, nomeadamente, o que por outro diploma se faz relativamente às sociedades de desenvolvimento regional. O regime definido por aquele diploma legal previa não só a constituição de instituições de crédito com sede em Portugal - às quais são equiparadas as filiais de instituições de crédito com sede no estrangeiro -, como também a abertura de sucursais destas últimas. E porque a legislação comunitária só impunha a concessão do chamado tratamento nacional aos operadores económicos da Comunidade, consagrou-se um regime especificamente aplicável aos estrangeiros que daquela liberdade não sejam titulares. Como nele ainda se declara, aproveitou-se o ensejo para uniformizar as condições de abertura de agências, em Portugal, de instituições de crédito aqui estabelecidas, matéria que, embora não regulada a nível comunitário, estreitamente se relaciona com a parte nuclear desse diploma. Entretanto, é lançado em 1990 o Livro Branco sobre os Sistema Financeiro cuja finalidade era a de coordenar as instituições financeiras, detectar zonas de conflito ou sobreposição de actividades, proceder ao estudo de eventuais inovações, formular propostas de alterações legislativas. É da conjugação desse conjunto de propostas com a legislação comunitária que resulta o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), aprovado pelo Decreto - Lei n.° 298/92, de 31 de Dezembro, que introduziu profundas alterações em todo o sector de actividade ao ponto de ser denominada “Lei Bancária” cuja vigência se iniciou em l de Janeiro de 1993. Como se proclama no seu preâmbulo, esse diploma é uma contribuição para a criação de um espaço integrado de serviços financeiros na Comunidade Europeia, baseado nos seguintes vectores: · Liberdade de estabelecimento das empresas financeiras; · Liberdade de prestação de serviços pelas referidas empresas; · Harmonização e reconhecimento mútuo das regulamentações nacionais; · Liberdade de Circulação de Mercadorias; · Liberdade de circulação de capitais( sendo uma liberdade de circulação autónoma já que dantes era instrumental); · União Económica de Monetária e sua regulamentação; · Subsidiariedade; · Conceito de Mercado único; · Primado, não discriminação As grandes inovações neste diploma, são, por um lado, a de classificação e delimitação do objecto ou âmbito da actividade das várias instituições bancárias e, por outro, e por via da transposição para a ordem jurídica nacional das Directivas Comunitárias supra referidas, principalmente da Directiva n.° 77/780/CEE do Conselho, de 12 de Dezembro de 1977, também conhecida como Primeira Directiva de Coordenação Bancária, a definição de Instituição de Crédito. É na esteira dessas alterações, que poderemos precisar em que se concretiza a actividade bancária e caracterizar quem pode exercê-la o que equivale à definição do direito material, por um lado, e do direito institucional, por outro lado. Ora, quanto à definição legal, expressa, de actividade bancária, ela apenas pode fixar-se a partir de uma lista exaustiva de operações que podem integrar aquela actividade (art. 4º do RGICSF). O mesmo se diga quanto à definição legal de instituição bancária para a qual o legislador se limitou apenas a indicar as espécies de instituições que, em sentido técnico, integram aquele conceito: instituições de crédito (art. 2.° do RGICSF) e sociedades financeiras (art. 5º). Ou seja, a metodologia é esta: enunciação do conceito de instituição de crédito e de sociedade financeira, nos preceitos citados e, após, enumeração taxativa das espécies de cada um daqueles géneros, respectivamente nos arts. 3.° e 6.° do mesmo Regime Geral. As instituições de crédito em sentido técnico (que é o resultante da transposição da Directiva n.°77/780/CEE, de 12 de Dezembro de 1977 na sua formulação mais restrita e, de resto, já adoptado pelo revogado DL nº 23/86, de 18 de Fevereiro), são empresas cuja actividade consiste em receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis, a fim de os aplicarem por conta própria mediante a concessão de crédito, bem como as empresas que tenham por objecto a emissão de meios de pagamento sob a forma de moeda electrónica (cfr. artº 2º nºs 1 e 2 do RGICSF na redacção introduzida pelo DL n.º 201/2002, de 26 de Setembro). Consoante o disposto no Artigo 3.º e atendendo ao objecto da impugnante, são instituições de crédito: (…) a) Os bancos; À excepção dos bancos, cada uma das instituições constantes da listagem do artº 3º, só pode efectuar as operações permitidas pelas normas legais e regulamentares que regem a sua actividade - cfr. nº 3 do artº 4º do RGICSF). Assim sendo, a impugnante será uma instituição de crédito por força da nova lei ( artº 3º) já que, como demonstramos supra, o que caracteriza fundamentalmente as instituições de crédito é poderem receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis para utilização por sua própria conta, não sendo tal actividade permitida às sociedades financeiras (é o chamado princípio da exclusividade consagrado no art. 8º da Lei Bancária). Como refere Saraiva Matias, Direito Bancário, pág. 30, a aplicação de tal princípio suscita no entanto, inúmeras dificuldades: “Sendo de relativa simplicidade determinar o que sejam depósitos colhidos junto do público, já o mesmo não sucede no que toca aos fundos reembolsáveis. Na verdade, também, por exemplo, os títulos de dívida mais não representam que fundos reembolsáveis. Deste modo, as obrigações, o papel comercial, os títulos de participação também podem ser havidos como fundos reembolsáveis. Mas o mais grave é que, nesse caso, segundo o princípio da exclusividade, só poderiam ser emitidos por instituições de crédito, sob pena de violação do disposto no citado art. 8.° Eis a razão pela qual o legislador, prevenindo o inconveniente, os desconsidera como fundos reembolsáveis, para este efeito, no n.° 1 do art. 9.° da mesma Lei Bancária. Falta um esclarecimento importante, antes de prosseguirmos: caracterizadas as instituições de crédito (nas quais se incluem os bancos) e as sociedades financeiras, o que é que deve, afinal, entender-se por instituições bancárias de que, aliás, fundamentalmente se ocupa o Direito Bancário? Por instituição bancária entenderemos, indistintamente, quer a instituição de crédito quer a sociedade financeira, tomadas ambas nos respectivos sentidos técnicos que acabamos de referir. Em consequência, também a noção de actividade bancária incluirá o objecto de umas e de outras.” Assim, a rigorosa precisão do objecto e regime jurídico da actividade da impugnante é fundamental para a decisão da causa porquanto, a constituição das sucursais em estados membros da comunidade europeia deve obedecer a este mesmo regime de seguida. Assim, quanto ao regime de acesso à actividade bancária: Conceptualmente, o acesso traduz a mera susceptibilidade de exercer uma dada actividade, no caso vertente, aquela que já foi supra definida. Desde 1976 e durante alguns anos por ser um sector por ser básico e determinante de toda a actividade económica, o legislador constitucional condicionou-lhe fortemente o acesso mantendo essa actividade na estreita dependência do Estado, limitando o acesso a entidades do sector público. Essa solução tinha assento constitucional no art. 85.°, n.° 3, da Constituição da República Portuguesa de 1976, que impunha a existência de sectores básicos aos quais era vedada a actividade bancária às empresas privadas ou outras entidades da mesma natureza. Em conformidade com tal preceito da Lei Fundamental a lei ordinária (art. 3.° da Lei n.° 46/77, de 8 de Julho), determinava que era vedada a empresas privadas e outras entidades da mesma natureza o acesso às actividades bancária e seguradora (entre outras). Actualmente, o regime de acesso à actividade bancária está harmonizado com a Directiva n.° 77/780/CEE, de 12 de Dezembro de 1977, sendo certo que já antes da adesão de Portugal à CEE, a CRP sofreu as revisões constitucionais de 1982 e 1989, que impuseram a alteração da mencionada Lei n.° 46/77, de 8 de Julho (a qual acabou por ser revogada pela Lei nº 88-A/97, de 25 de Julho) no sentido de a actividade bancária ser de acesso livre a qualquer agente económico que preencha os condicionalismos legais estabelecidos para esta actividade. Cabe agora referir a criação do “Passaporte Comunitário”: Assim, com a instituição do princípio do reconhecimento mútuo (a instituição de crédito admitida em determinado país pode exercer a sua actividade em todos os países comunitários, sob controlo do país de origem, operada pela supervisão da instituição), ficaram as instituições de crédito desde logo habilitadas ao chamado passaporte comunitário, ou seja, ao tratamento segundo o princípio do reconhecimento. Uma vez que as Instituições de Crédito, por força do princípio do reconhecimento mútuo, poderão, em princípio, praticar, nos países membros da CE, as operações constantes da lista anexa à Directiva n.° 89/646/CE, do Conselho, de 15 de Dezembro de 1989, desde que estejam autorizadas a praticá-las em Portugal. Como trâmites Prévios à constituição (procedimentos internos) há, antes de mais, que adoptar o correspondente “acordo de criação”, quer dizer, a vontade de criar as sucursais da sociedade em território de um país da comunidade. Depois, a autorização do Banco de Portugal (BP) é condição essencial do acesso, a qual é legalmente definida ( cfr. artº 13, ponto 11º da Lei Bancária, como acto emanado das autoridades competentes e que confere o direito de exercer a actividade da instituição de crédito; é manifestamente um acto administrativo constitutivo, sindicável no contencioso administrativo. Na fase da autorização apura-se a verificação dos requisitos de estabelecimento da sucursal em Portugal, país da Comunidade Europeia, previstos no artº 49º do RGICSF, segundo o qual, é condição do estabelecimento da sucursal que o Banco de Portugal receba, da autoridade de supervisão do país de origem, uma comunicação da qual constem: a) Programa de actividades, no qual sejam indicados, nomeadamente, o tipo de operações a efectuar e estrutura de organização da sucursal e, bem assim, certificado de que tais operações estão compreendidas na autorização da instituição de crédito; b) Endereço da sucursal em Portugal; c) Identificação dos responsáveis pela sucursal; d) Montante dos fundos próprios da instituição de crédito; e) Rácio de solvabilidade da instituição de crédito; f) Descrição pormenorizada do sistema de garantia de depósitos de que a instituição de crédito participe e que assegure a protecção dos depositantes da sucursal; g) Descrição pormenorizada do Sistema de Indemnização aos Investidores de que a instituição de crédito participe e que assegure a protecção dos investidores clientes da sucursal. Por outro lado, e em termos de gestão corrente da sucursal, a mesma deve ser confiada a um mínimo de dois gerentes, sujeitos a todos os requisitos exigidos aos membros do órgão de administração das instituições de crédito ( nº 2 do artº 49º). Apresentado o requerimento assim instruído no Banco de Portugal, segue-se a sua apreciação pelo supervisor que, o Banco de Portugal disporá do prazo de dois meses para organizar a supervisão da sucursal relativamente às matérias da sua competência, após o que notificará a instituição de crédito da habilitação para estabelecer a sucursal, assinalando, se for caso disso, as condições em que, por razões de interesse geral, a sucursal deve exercer a sua actividade em Portugal (Artigo 50 nº1). Tendo recebido a notificação do Banco de Portugal, ou, em caso de silêncio deste, decorrido o prazo previsto no número anterior, a sucursal pode estabelecer-se e, cumprido o disposto em matéria de registo, iniciar a sua actividade (artº 50º nº 2). Finalmente, para assegurar a regularidade e a legalidade da constituição/estabelecimento das sucursais há que proceder ao registo público o qual é obrigatório como se vê do artº 65º do RGICSF ao dispor que as instituições de crédito não podem iniciar a sua actividade enquanto não se encontrarem inscritas em registo especial no Banco de Portugal, sendo que estão abrangidos pelo registo o lugar e data da criação de sucursais ( al. l)-) e a identificação dos gerentes das sucursais estabelecidas (Data do início da actividade; e Lugar e data da criação de filiais, sucursais e agências do artº 66º). Mas a falta de registo não determina a invalidade dos actos praticados pois apenas constitui condição de eficácia dos actos praticados pelos órgãos das instituições de crédito, dada a sua natureza declarativa ou enunciativa do direito e que contribui para a segurança jurídica e transparência das actividades das sucursais. Essa natureza decorre, além do mais, do artº 72 do RGICSF que enumera os fundamentos de recusa do registo de que se destacam, com relevância para o caso concreto, a falta de autorização legalmente exigida (al. c) ou quando não esteja preenchida alguma das condições de que depende a autorização necessária para a constituição da instituição ou para o exercício da actividade (al. e). Quanto ao regime de exercício da actividade bancária: Conceptualmente, o regime de exercício da actividade bancária, como refere Saraiva Matias, ob. cit. pág. 31, “ traduz a capacidade, mediante o preenchimento de requisitos, de determinado agente exercer certa actividade”. Tendo em conta o tema que nos ocupa, importa definir alguns conceitos básicos fixados no artº 13º do RGICSF, como sejam: a)-Sucursal: é um a forma de representação permanente, no país ou no estrangeiro, de uma sociedade, não tem personalidade jurídica e exerce, no todo ou em parte, a actividade de empresa; é, pois, um estabelecimento desprovido de personalidade jurídica que pertence a uma pessoa colectiva e que efectua actividade desta, sendo as operações que realiza directamente imputáveis à empresa -mãe ou dominante, embora mas possa ter autonomia na sua gestão, (contratar, facturar etc.) ; b)-País de origem: é aquele em que a instituição em causa tenha sido autorizada a exercer a respectiva actividade; c)-País de acolhimento: é aquele em que, não sendo país de origem, a instituição presta serviços ou exerce actividade através de sucursal; À luz desses conceitos e do tema que nos ocupa, temos como interveniente, no âmbito do sistema financeiro português, e no exercício da actividade bancária, uma Instituição de Crédito com sede em França (País de Origem), constituiu sucursal em Portugal (Países de acolhimento e que são estados membros da CE). Assim, essa sociedade, por força do princípio do reconhecimento mútuo, pode praticar nos países membros da CE, através das sucursais as operações que está autorizada a praticar em França. Como vimos, a prática de tais operações depende da comunicação prévia das autoridades francesas às autoridades do país de acolhimento, pelo que se impõe dar anterior conhecimento à autoridade de supervisão portuguesa de todos os elementos necessários como sejam o país onde se pretende exercer a actividade e o programa de actividades a desenvolver. Observado esse procedimento, a sucursal pode efectuar no país de acolhimento as operações constantes da lista anexa à Directiva nº 2000/12/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Março de 2000, que a instituição esteja autorizada a efectuar em França e que estejam mencionadas no programa de actividades. Sobre a gestão da sucursal: Como vimos a sucursal não passa de um estabelecimento desprovido de personalidade jurídica que pertence a uma pessoa colectiva e que efectua a actividade desta, sendo as operações que realiza directamente imputáveis à empresa-mãe ou dominante, embora possa ter autonomia na sua gestão, (contratar, facturar etc.). Quer isto dizer que a gestão da sucursal se deve pautar pelas mesmas normas que regem a actividade dessa sociedade, a saber: -pelo Direito Bancário material :- que abrange a regulação das operações bancárias, dos actos e contratos levados a efeito pela sociedade e que acima se precisaram. E como o Direito material é direito privado vigora aí o princípio de autonomia técnica e de vontade ou contratual na prática das operações cuja prática foi autorizada. -pelo Direito Bancário Institucional que engloba os princípios e normas que regulam a constituição e o funcionamento das instituições bancárias, como sejam, a autorização de constituição, o registo, a fiscalização e o sancionamento das suas práticas. Estamos aqui no campo do direito público visto que há actuação com “jus imperii” e no interesse público, embora recebendo relevantes contributos do direito privado, como por exemplo se trata de um contrato de sociedade ou do acordo parassocial celebrados no âmbito da constituição de uma instituição bancária como essa empresa, que é uma sociedade comercial. Saliente-se que na sistemática do RGICSF a constituição, a autorização e o registo das instituições bancárias estão excluídos do âmbito da supervisão embora traduzam ainda os poderes do supervisor pois é especialmente na fase da autorização que melhor se apura a verificação dos requisitos de constituição, de funcionamento, de composição do capital social, de verificação da idoneidade dos accionistas e gestores. Ora, como se demonstrou já, a constituição de instituições de crédito com sede em França e das respectivas sucursais em países da CE (que é o que aqui importa) é autorizada pelo Banco de Portugal (BP), e, vigorando o princípio do mútuo reconhecimento, tal implica que a autorização (bem como a supervisão) compete ao país de origem através daquele supervisor, dependendo a prestação de serviços no espaço comunitário de simples comunicação à entidade supervisora da respectiva área e ficando a autorização de constituição vinculada ao preenchimento dos requisitos legais dos artigos 36º a 43º do RGICSF e ao registo do lugar e data da criação de sucursais e a identificação dos gerentes das sucursais estabelecidas no estrangeiro, sendo que dos actos praticados pelo BP, no âmbito da autorização e registo cabe recurso contencioso administrativo nos termos gerais – hoje, acção administrativa especial regulada nos artigos 46 e ss do CPTA- beneficiando, todavia, as decisões do Banco da presunção legal de grave lesão de interesse público, quando se promova a respectiva suspensão. Delimitados e explicitados os procedimentos relativos à autorização de constituição e do registo, cabe seguidamente precisar os termos em que se processa o seu regime fiscal. Ora, o que de importante há a reter é que a sucursal não passa de um estabelecimento desprovido de personalidade jurídica que pertence a uma pessoa colectiva e que efectua a actividade desta, sendo as operações que realiza directamente imputáveis à empresa -mãe ou dominante, embora possa ter autonomia na sua gestão, (contratar, facturar etc.). Mas, ainda que não disponham de personalidade jurídica, será que as sucursais detêm personalidade tributária e como tal, personalidade judiciária tributária? Que a sucursal de uma sociedade com sede em País estrangeiro, com estabelecimento estável em Portugal, dispõe de personalidade tributária e capacidade judiciária tributária, quanto aos rendimentos gerados em Portugal, é doutrina que dimana do Acórdão do TCAS de 25-09-2007, tirado no recurso nº 580/05, de que foi relator o 1º adjunto desta formação e que, data vénia, se vai seguir na sua fundamentação: “Para efeitos de incidência pessoal, o direito fiscal basta-se, apenas, com qualquer situação de facto ou realidade económica reveladora de capacidade contributiva, desde que se apresente como unidade económica, para lhe conferir personalidade tributária e assim suprir a carência de personalidade jurídica. «Onde quer que o Direito Fiscal depare com um ente individualizável, sob o ponto de vista da sua actividade económica, aí ele reconhece matéria a personalizar» (Pedro Soares Martinez, Da Personalidade Tributária, pág. 320). Hoje, face ao art.º 2.º do Código do IRC, dúvidas não restam que são sujeitos passivos do imposto – logo, têm personalidade tributária - «as entidades desprovidas de personalidade jurídica com sede ou direcção efectiva em território português, cujos rendimentos não sejam tributáveis» em IRS ou IRC «directamente na titularidade de pessoas singulares ou colectivas», cfr. Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Processo Tributário, Comentado e Anotado, 4.ª Edição, pág. 31 e segs. No mesmo sentido se pronuncia Jorge Lopes de Sousa, ao escrever: «Todas as entidades com personalidade jurídica têm personalidade tributária. Mas, têm também personalidade tributária entidades sem personalidade jurídica, como resulta do art.º 2.º, n.ºs 1, alíneas b) e c), e 2, do CIRC, que contém uma fórmula ampla com potencialidade para abranger qualquer entidade que seja titular de rendimentos. Por isso se poderá afirmar que onde existir um centro de imputação de relações ou actividades económicas tributárias, aí deverá haver lugar ao reconhecimento de uma personalidade tributária. ... Nos termos do n.º2 do art.º 7.º do CPC se a administração principal tiver a sede ou o domicílio em país estrangeiro, as sucursais, agências, filiais ou delegações estabelecidas em Portugal podem demandar e ser demandadas, ainda que a acção derive de facto praticado por aquela, quando a obrigação tenha sido contraída com um português ou com um estrangeiro domiciliado em Portugal. As sucursais, agências, filiais, delegações e representações de sociedades comerciais tem personalidade tributária, se estas não tiverem sede nem direcção efectiva em território português [art.º 2.º, n.º1, alínea c) do CIRC]. Por isso, nestes casos, terão também personalidade judiciária tributária (art.º 3.º, n.º1 do CPPT) e capacidade judiciária tributária (n.º3 do mesmo artigo), podendo estar, por si, em juízo. ...» Ora, dispondo a ora recorrida, em Portugal de um centro estável de imputação de relações ou actividades económicas que geraram rendimentos, e tendo em conta o disposto no art.° 12° da CDT, os lucros imputáveis a esse estabelecimento estável nunca estão sujeitos a tributação em Portugal por retenção na fonte, mas sim nos termos equivalentes às sociedades residentes, nos termos do art.° 69° n° 1 do CIRC. Também as regras estabelecidas no art.° 7° da CDT entre Portugal e França, como supra se demonstrou, apontam para que ao estabelecimento estável serão imputados os lucros que este obteria se fosse uma empresa distinta e separada que exercesse as mesmas actividade ou actividades similares, nas mesmas condições ou em condições similares e tratasse com absoluta independência com a empresa de que é estabelecimento estável, o que quer dizer que para efeitos de IRC a impugnante é considerada como sujeito passivo nos termos do art.° 2° n° 1 al. c) do IRC, logo tem personalidade tributária.” Com base em tal fundamentação, procedem, assim todas as conclusões recursivas. * 4.- Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença na parte recorrida e anular na totalidade o acto tributário impugnado. Custas pela recorrida. * Lisboa, 24/06/2008(Gomes Correia) (Eugénio Sequeira) (Lucas Martins) |