Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:010645/01
Secção: CA - 1º Juízo Liquidatário
Data do Acordão:10/08/2009
Relator:Beato de Sousa
Sumário:1 - Num procedimento de transferência para o QE de Juristas iniciado a requerimento dos interessados é predominante o interesse particular, impondo-se o tratamento não discriminatório de todos os requerentes quanto à data de ingresso nesse quadro especial.
2 – Tendo surgido dúvidas quanto à posse pelo recorrido particular, CAP Martins, de um dos requisitos exigidos para aquele ingresso (desempenho de funções de natureza jurídica) e sido decidido que o seu ingresso no QE de Juristas fosse “equacionado em função de um parecer técnico a produzir pela Assessoria Jurídica”, a respectiva pretensão ficou sujeita à condição suspensiva da verificação da existência de um determinado requisito, que o militar não podia demonstrar pelos seus próprios meios, por depender de uma avaliação técnica a efectuar pelos serviços competentes.
3 - Feita essa avaliação e constatando-se que a dita condição se verificava e que, portanto, o recorrido, à data da formulação do seu requerimento, já detinha os requisitos necessários à sua transferência para o QE de Juristas, os princípios da justiça e da imparcialidade – Artigo 6º do CPA – impunham que aquele ingressasse no QE de Juristas de forma a ver salvaguardada a posição relativa que detinha em relação aos demais interessados no mesmo procedimento.
4 – Deste modo não padece de ilegalidade o despacho do CEMFA que fez retroagir a data de ingresso do CAP Martins naquele QE, ao mesmo dia em que ingressou o Recorrente.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:RELATÓRIO

A..., residente na rua 9 de Agosto de 1990, n.°27, 2° esq., Alverca, vem interpor recurso de anulação do despacho de 13 de Março de 2001 do General Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, que deferiu o pedido de transferência para o Quadro Especial de Juristas do Capitão TPAA 066556-J, José Manuel Teixeira Pinto, referindo como recorrido particular José Manuel Teixeira Martins.
Para tanto alega que o mesmo padece dos seguintes vícios:
- arts 170° n.°2 al. a) e 180° n°1 al. a) ambos do EMFAR;
- violação do art. 100° do CPA;
- falta de fundamentação;
- vício de desvio de poder e violação do art. 170° n.°1 do EMFAR.
A entidade recorrida responde que por força dos arts 180° n.°1 al. a) e n.°2 e 181° do EMFAR na transferência por ingresso há a possibilidade de ser mantida a antiguidade relativa que os militares transportam consigo.
E, nos termos do art. 128° n.°2 al. a) do CPA o General CEME podia ter atribuído, como o fez, eficácia retroactiva ao seu despacho de 13/3/01.
O recorrido particular responde suscitando a ilegitimidade do recorrente já que este não se encontra em condições de poder receber qualquer benefício resultante da anulação do acto impugnado, nomeadamente o seu acto de posicionamento na lista de antiguidades.
Ou seja, quer ele, recorrido particular, tivesse sido posicionado à esquerda ou à direita do recorrente, a carreira militar deste sempre teria o seu desenvolvimento e progressões normais.
Quanto aos vícios de violação de lei refere que, como era mais antigo que o recorrente, essa precedência foi mantida no QE de destino, em estrita obediência ao n.°2 do art. 180° e n.°1 do art. 181 ° do EMFAR.
Quanto ao vício de violação do art. 100° do CPA refere que sendo o recorrente apenas contra interessado no procedimento de ingresso do recorrido particular, não tinha que ser ouvido.
Quanto ao vício de falta de fundamentação refere que o despacho não carecia de fundamentação nos termos do art. 124° do CPA, fundamentação que de qualquer forma ocorria.
Por fim e quanto à violação do art. 170° n.°1 do EMFAR refere que o acto foi proferido no âmbito de um poder vinculado e que, mesmo que se entendesse que tinha sido no âmbito de um poder discricionário, o fim prosseguido pela norma foi conseguido.
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Cumprido o art. 67° do RSTA o recorrente conclui as suas alegações da seguinte forma:
a) O Recorrente tem legitimidade para interpor o recurso em apreço porquanto possui um interesse directo (é imediato), pessoal (projecta se na sua esfera jurídica relações de hierarquia e autoridade) e legítimo (situação titulada pelo direito) no seu provimento.
b) O Recorrente desempenha funções técnico jurídicas na FAP desde 30/01/1996 (Doc. n.° 3, junto ao requerimento de recurso).
c) Por despacho de 05/07/2000, do General CEMFA, foi transferido do Quadro Especial de TPAA para o QE Juristas, “por ingresso”, nos termos do disposto nos arts. 168.°, n.° 2 e 170.°, n.° 2, alínea a), ambos do EMFAR.
d) Ficou com o posto de Alferes, graduado em Capitão, contando antiguidade desde 02/10/2000, ficando, nos termos do art. 180° n.°1, alínea a), do EMFAR, colocado à esquerda de todos os militares já existentes naquele Quadro Especial.
e) Em 13/03/2001, o General CEMFA deferiu o pedido de transferência do Quadro Especial de TPAA para o QE Juristas do Capitão José M. T. Martins (Recorrido Particular), tendo sido invocado, para o efeito, o disposto nos arts. 168.°, n.° 2 e 170.°, n.° 2, alínea a), ambos do EMFAR (“por ingresso”).
f) Aquele militar ficou com o posto de Alferes, graduado em Capitão, contando antiguidade desde 02/10/2000, ficando colocado, na lista de antiguidades do novo quadro, à direita do ora Recorrente (portanto, mais antigo).
g) Ou seja, o Recorrente viu-se “ultrapassado”, na antiguidade, pelo Recorrido Particular, cujo ingresso foi determinado em data muito posterior à daquele.
h) Assim, o despacho aludido nas alíneas e) e f) (despacho ora recorrido) operou efeitos retroactivos, afectando a posição do ora recorrente na lista de antiguidades, porquanto aquando daquela decisão já o recorrente havia ingressado no QUE Juristas há cerca de cinco meses.
i) Ou seja, o Recorrente acabou por ser ultrapassado, em termos de antiguidade no QE Juristas, por um militar que ingressou no mesmo por efeito de um acto administrativo posterior ao ingresso daquele, sem que, para tal, exista, ou tenha existido, qualquer fundamento ou suporte legal.
j) Situação que viola o disposto nos arts 170°, n.°2, alínea a) e 180 n.°1, alínea a), ambos do EMFAR, sendo geradora de anulabilidade nos termos dos arts 135° e 136° do CPA.
k) No processo que levou à decisão que ora se impugna, o Recorrido Público não promoveu, como devia, a audiência prévia do Recorrente antes da decisão final.
l) Ou seja, não foi facultada ao Recorrente a possibilidade de se pronunciar sobre uma decisão administrativa que manifestamente lhe era desfavorável, situação que configura uma violação ao disposto no art. 100° n.°1 do CPA, geradora de anulabilidade, nos termos dos arts. 135° e 136° do CPA.
m) Ademais, o acto recorrido, a despeito de ter produzido os efeitos mencionados anteriormente, designadamente ao nível da posição do ora Recorrente na lista de antiguidades no QE Juristas, não foi devidamente fundamentado.
n) Efectivamente, não foram demonstrados os fundamentos de facto e de direito que permitam sustentar a transferência do Recorrido Particular para o QE Juristas, pelo que se está perante uma violação do disposto nos arts. 123.°, n.°1, alínea d), 124.°, n.°1, alínea a) e 125.°, todos do CPA, geradora de anulabilidade, nos termos do arts. 135.° e 136.° do CPA.
o) Por outro lado, não se vislumbra qualquer fundamento que justificasse a transferência do militar visado com o acto recorrido, uma vez que o mesmo, a despeito de ser licenciado em direito, nunca desempenhou, nem desempenha actualmente, funções de conteúdo jurídico na Força Aérea (Doc. n.°1, junto ao requerimento de recurso).
p) Assim, não estavam verificados os requisitos legais para a transferência para o QE Juristas, do militar ora recorrido, constantes do art. 170.°, n.°1, do EMFAR: «Por necessidade de racionalização do emprego de recursos humanos ou outras necessidades de serviço, o militar pode ser transferido de quadro especial, com a sua anuência ou por seu requerimento, desde que, para o efeito, reúna as aptidões e qualificações adequadas» (negrito e sublinhado nossos).
q) Logo, estamos perante uma violação do disposto no 170.°, nº1, do EMFAR, geradora de anulabilidade, nos termos dos arts. 135.° e 136.° do CPA.
r) Com a providência requerida, o Recorrente visa a anulação dos efeitos produzidos pelo acto recorrido, em especial a anulação do posicionamento à sua direita do Recorrido Particular na lista de antiguidades no novo Quadro Especial (por conseguinte, com maior antiguidade), situação resultante da eficácia retroactiva atribuída ao acto praticado pelo Recorrido Público.
Nos termos e com os fundamentos expostos, deve conceder-se provimento ao presente recurso, anulando-se, nos termos do arts. 135.° e 136.° do CPA e, consequentemente, considerando se sem nenhum efeito, o despacho de 13/03/2001, do General CEMFA, que deferiu o pedido de transferência, para o QE Juristas, do Capitão TPAA 066556 J, José Manuel Teixeira Martins (Recorrido Particular), ficando colocado, na lista de antiguidades, à direita do ora Recorrente (portanto, mais antigo), por verificação dos vícios a seguir enunciados, para que seja reconhecido ao Recorrente o direito a não ser “ultrapassado”, em termos de antiguidade no QE Juristas, pelo Recorrido Particular (manter a antiguidade que detinha imediatamente antes do ingresso do Recorrido Particular):
(i). Violação de Lei: violação ou faz má aplicação dos arts. 170.° e 180.°, n.°1, alínea a), ambos do EMFAR e arts. 127.°, n.°1 e 128.°, n.° 2, alíneas a) e c), ambos do CPA.
(ii). Vício de forma: violação dos disposto nos arts. 100.°, n.°1, 123.°, n.°1, alínea d), 124.°, n.°1, alínea a) e 125.°, todos do CPA.
(iii). Desvio de poder: violação do disposto no n.°1 do art. 170.° do EMFAR.
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A entidade recorrida conclui as suas alegações da seguinte forma:
a) Em conformidade com o disposto no n°2 do artigo 168° e na alínea a) do n°2 do artigo 170° do EMFAR, o ingresso num quadro especial pode fazer-se por transferência de outro quadro especial;
b) A regra geral de fixação da antiguidade quando ocorre transferência de quadro especial encontra-se definida na alínea a) do n°1 do artigo 180° do EMFAR;
c) Sem prejuízo da regra geral fixada na alínea a) do n°1 do artigo 180°, o n°2 do mesmo artigo remete para o artigo 181° do EMFAR as regras aplicáveis à necessidade de dirimir um conjunto de situações susceptíveis de ocorrer na transferência de quadro especial, entre as quais se conta a igualdade de postos;
d) Por efeito da regra definida no n°1 do artigo 181° do EMFAR, verificando-se igualdade de postos é mantida a antiguidade relativa dos militares;
e) Os dois militares foram transferidos por ingresso para o quadro especial juristas com efeitos à mesma data, 2 de Outubro de 2000, oriundos da mesma especialidade, TPAA, com o mesmo posto na especialidade posto de capitão, mas com distinta antiguidade relativa nesse posto;
f) Em consequência da aplicação da regra prevista no n°1 do artigo 181° do EMFAR foi mantida a antiguidade relativa dos militares, permanecendo o ora Recorrente como mais moderno;
g) A retroactividade do despacho do General CEMFA, ora impugnado, não afecta o direito e expectativa legítima do Recorrente ao desenvolvimento da sua carreira, não devendo por isso ter sido objecto de audiência prévia do interessado;
h) O acto impugnado não padece de falta de fundamentação, na medida em que não afecta quaisquer direitos ou expectativas legítimas do Recorrente;
i) O acto impugnado não se encontra inquinado de desvio de poder, cumprindo o interesse público de relevância da antiguidade na carreira militar, protegido pelo disposto nos artigos 180° e 181º do EMFAR.
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O recorrido particular conclui as suas alegações da seguinte forma:
I) O recurso em apreço vem interposto do despacho do General Chefe do Estado-Maior da Força Aérea (CEMFA), de 13/03/2001, acto este que possui dois efeitos distintos. Por um lado, determinou o ingresso do recorrido particular num quadro de pessoal da Força Aérea, concretamente, no Quadro Especial de juristas (QE/JUR). Por outro lado, fixou o posicionamento do recorrido particular na lista de antiguidades desse mesmo QE/JUR.
II) O despacho sob recurso produziu efeitos retroactivos a 02/10/2000, data a que também reportaram os efeitos do despacho do General CEMFA, de 05/07/2000, que autorizou o recorrente a ingressar no mesmo QE/JUR.
III) Ambos os despachos produziram efeitos à mesma data 02/10/2000 ao primeiro foi atribuída eficácia, retroactiva e ao segundo eficácia diferida.
IV) O recorrente não detém legitimidade para interpor o presente recurso.
V) Quanto ao posicionamento do recorrido particular na lista de antiguidade do QE/JUR o recorrente não tem interesse directo na anulação do acto impugnado, pois dessa anulação não resultarão benefícios ou vantagens imediatamente repercutíveis na sua esfera jurídica, mas, quando muito, vantagens mediatas, eventuais ou meramente possíveis.
VI) Na verdade do despacho recorrido não resultou nem resultará impedimento imediato ao normal desenvolvimento e progressão da sua carreira militar Por um lado, não se verificou qualquer obstáculo a que o recorrente tivesse sido, como foi, promovido ao posto de Tenente do “novo” QE/JUR na data em que lhe competia: 02/10/2001 (ou seja, um ano depois do ingresso no posto de Alferes no QE/JUR, em conformidade com o disposto nos artigos 50.°, 217.° alínea e) e 218 ° n.°1 alínea a), todos do EMFAR).
VII) Por outro lado, também não resultará aquando da promoção ao posto imediato ao que possui no QE/JUR (Capitão), a qual ocorrerá em 02/10/2005 (à semelhança do recorrido particular), ou seja, quatro anos após a promoção ao posto actual no QEIJUR (Tenente), isto porque se está em presença de promoções por diuturnidade, onde o decurso de determinado tempo mínimo de permanência no posto dá lugar à promoção ao posto imediato, independentemente de vacatura (artigos 50°, 217° alínea d) e 218° n.°1 alínea b), e artigos 48° a 50°, 217° e 218°, todos do EMFAR).
VIII) Acresce que a questão da promoção ao posto de Major só se colocará a partir de 02/10/2011 e, ainda assim, num plano meramente mediato, eventual ou possível, dado ser absolutamente necessário o preenchimento de um vasto conjunto de pressupostos, como seja a existência de vaga, e o preenchimento de um conjunto de condições gerais e especiais de promoção.
IX) Como o recorrente foi incorporado na Força Aérea em 07/06/1979, em 02/10/2011, data em que alega vir a ser prejudicado na promoção a Major pela decisão recorrida possuirá 32 anos de serviço efectivo, tempo este que, somado aos 25% de aumento de tempo de serviço, determina que na primeira data terá o recorrente 40 anos de serviço efectivo.
X) Como o EMFAR permite a passagem à situação de reserva depois de o militar completar 36 anos de serviço efectivo, nos termos da alínea c) do seu artigo 153°, pode colocar-se a seguinte questão: em 02110/2011 estará ainda o recorrente ao serviço das Forças Armadas?
XI) O também recorrente não possui interesse directo no provimento do presente recurso de anulação a propósito do que denomina de “relações de hierarquia e autoridade”, que associa ao conceito de antiguidade, uma vez este constitui um conceito secundário e dependente de outros, pelo que não possui relevância, de facto e de direito, autónoma. Por isso, como não possui interesse directo quanto aos efeitos principais, por maioria de razão, também não o possui para efeitos de natureza secundária...
XII) O recorrente também não possui interesse pessoal quanto ao ingresso do recorrido particular no QE de juristas, uma vez que a decisão recorrida não teve qualquer projecção na sua esfera jurídica.
XIII) O acto impugnado é completamente inócuo para o recorrente, na medida em que não se repercute na sua esfera jurídica, sendo o despacho recorrido uma decisão que não contende com a sua posição no âmbito do QE em apreço.
XIV) O acto recorrido não provocou qualquer ultrapassagem do recorrente na lista de antiguidade, na medida em que ambos os ingressos foram efectuados na mesma data: o do recorrente por força de um acto com eficácia, diferida (de 05/07/2000 para 02/1012000); o do recorrido particular em decorrência de retroactividade legal e validamente operada.
XV) Por esta razão, o ingresso do recorrido particular no QE/JUR não prejudicou e nunca poderia ter prejudicado o recorrente, dado que, nesta data, este não se encontrava no sobredito quadro.
XVI) O recorrente também não tem interesse legítimo na interposição do presente recurso de anulação, quer quanto ao ingresso do recorrido particular no QE/JUR, quer relativamente ao posicionamento deste na lista de antiguidade desse quadro, na medida em que, face à lei, o beneficio ou vantagem que visa obter não se encontra juridicamente tutelado, pois inexiste norma que tutele a sua posição jurídica.
XVII) Com efeito, não pode haver tutela jurídica ou protecção jurídica de algo que não produziu efeitos de direito na esfera jurídica do recorrente.
XVIII) O acto impugnado operou efeitos retroactivos validamente e não provocou qualquer “ultrapassagem” na antiguidade do recorrente, na medida em que ambos os ingressos no QE/JUR se deram em simultâneo, ambos operaram efeitos à mesma data 02/10/2000, pelo que não violou nem os artigos 170°, n.°2, alínea a) e 180°, n.°1, alínea a) ou quaisquer outros preceitos do EMFAR, nem os artigos 125.°, 127.° e 128.° ou quaisquer outros incisos do CPA.
XIX) No que concretamente concerne à retroactividade do despacho recorrido, também foi respeitado o disposto nos artigos 123.° e seguintes do CPA, dado que o momento essencial e relevante de todo o procedimento administrativo que lhe foi anterior e subjacente foi a data de 19/06/2000, data do despacho CEMFA que homologou, com concordância, o parecer do Comandante do Pessoal da Força Aérea (CPESFA) de 08/06/2000.
XX) Circunstância também fundamental e relevante é que à data em que o acto recorrido produziu os seus efeitos – 02/10/2000 - o recorrido particular satisfazia os pressupostos necessários para que tal acontecesse, sendo que os mesmos se reconduziam a dois requisitos que haviam sido fixados pela Força Aérea no parecer de 8/6/00 e aceites pelo CEAAFA, para efeitos de o ingresso no QE/JUR: licenciatura em Direito e desempenho de funções jurídicas.
XXI) Do despacho do CEMFA de 19/06/2000, do dito parecer do CPESFA de 08/06/2000 e de todo o processado posterior, resulta que, por desconhecer se o recorrido particular preenchia, ou não, naquela data, o segundo requisito que havia sido fixado para ingresso no QE/JUR (exercício de funções de conteúdo funcional exclusivamente jurídico), o CEMFA remeteu para momento posterior a sua decisão, ficando a sua verificação sujeita a confirmação.
XXII) O despacho sob recurso configura, assim, um acto sujeito a condição suspensiva, tratando-se, assim, de acto juridicamente existente, de forma perfeita e completa, mas cujos efeitos só se tornaram operativos depois de confirmada a ocorrência do evento que permitiu a produção dos seus efeitos: “desempenho de funções de conteúdo funcional exclusivamente jurídicas”.
XXIII) Assim sendo, depois de averiguado e confirmado que o recorrido particular era detentor do segundo requisito que havia sido exigido para aceder ao QE/JUR, só restava ao CEMFA deferir o seu ingresso no QE/JUR nos termos em que o fez.
XXIV) Desde o dia 28/07/2000 que o recorrido público estava na posse de toda a informação que havia considerado necessária e suficiente para satisfazer o pedido de ingresso no QE/JUR do recorrido particular, ou seja, não desconhecia que este desempenhava funções de conteúdo funcional exclusivamente jurídico (e que era detentor da habilitação académica exigida).
XXV) O acto recorrido poderia, ter sido praticado com efeitos a 28/07/2000, assim como, por se tratar de acto sujeito a condição suspensiva, também poderia ter produzido efeitos a 19/06/2000, atento o disposto no art.° 129.° alínea b) do CPA.
XXVI) Se o acto impugnado já poderia ter sido legalmente praticado nestas duas últimas datas, por maioria de razão, nos mesmos e exactos termos, o poderia, ter sido na data a que foram retrotraídos os respectivos efeitos: 02/10/2000.
XXVII) O acto recorrido operou validamente efeitos retroactivos, tendo respeitado o regime previsto no art.° 128.° do CPA, posto que, à data de 02/10/2000, não só foi favorável ao recorrido particular, como também não lesou direitos ou interesses legalmente protegidos do recorrente, porquanto a posição que este pretende valer não estava tutelada por nenhum norma jurídica, já que inexistia preceito legal que impedisse o ingresso, em simultâneo, de dois oficiais no QE em apreço.
XXVIII) Em 02/10/2000 também já existiam os pressupostos legais da admissibilidade da retroactividade, na medida em que, nesta data, o recorrido particular era detentor dos dois requisitos que o recorrido público exigia para efeitos de ingresso no QE/JUR.
XIX) Quanto à alegada “ultrapassagem”, ela não ocorreu porque os dois ingressos no QE/JUR ocorreram na mesma data, ou seja, foram juridicamente simultâneos. Nem a circunstância de o ingresso do recorrente ter resultado de um acto praticado numa data (com eficácia diferida) e o ingresso do recorrido particular ter resultado de um acto praticado noutra data (com eficácia retroactiva, legalmente admitida, como se demonstrou), lhe retira esse carácter da simultaneidade jurídica, antes pelo contrário.
XXX) O momento juridicamente relevante para, efeitos dos ingressos sub judice não foi a data da prática dos actos mas a data a que esses actos produziram efeitos. Tendo os dois actos de ingresso no QEIJUR produzido efeitos jurídicos à mesma data, o acesso do recorrente e do recorrido particular ao novo quadro operou em simultâneo, inexistindo, assim, qualquer “ultrapassagem”.
XXXI) O posicionamento do recorrido particular na lista de antiguidades do novo quadro foi efectuado em obediência ao regime previsto na lei aplicável, v. g., nos artigos 180.° e 181.° do EMFAR.
XXXII) Como o recorrido particular e o recorrente possuíam o mesmo posto no quadro de origem, o recorrido público teve de se socorrer do regime regulador da determinação das antiguidades relativas entre militares, previsto no n.°1 do art.° 181.°, aplicável por remissão do n.°2 do art.° 180.°, ambos do EMFAR.
XXXIII) No despacho em crise, o recorrido público aplicou o primeiro critério de desempate, consagrado no n°1 do art. 181.°, norma que determina que a antiguidade relativa de militares com o mesmo posto é determinada pelas datas de antiguidade nesse posto, o que significa, que, havendo dois militares com o mesmo posto, será mais antigo aquele que tiver sido primeiramente promovido ao posto detido.
XXXIV) Como o recorrido particular sempre foi mais antigo que o recorrente, essa precedência foi mantida no QE de destino.
XXXV) O acto recorrido não está sujeito à audiência prévia do interessado, a que se refere o n.°1 do art. 100.° do CPA, dado que o recorrente não possuía esta qualidade, porquanto o acto sob recurso não lhe dizia qualquer respeito e a retroactividade por este operada não afectou qualquer direito ou expectativa legítima.
XXXVI) O recorrente não detém qualquer direito ou interesse legalmente protegido que obstasse quer ao ingresso do recorrido particular no QE/JUR, quer ao posicionamento deste na respectiva lista de antiguidades, pelo que o despacho recorrido não carecia de fundamentação, razão pela qual também não existe qualquer violação do disposto nos artigos 123.° n.°1 alínea d),124.° n.°1 alínea a) e 125.° do CPA.
XXXVII) No despacho recorrido não se verificou o exercício de quaisquer poderes discricionários, tendo, antes, sido praticado no exercício de poderes vinculados, na medida em que o seu exercício estava regulado por lei, no caso, pelos requisitos legais impostos pelo no n.°1 do art. 170.° do EMFAR - 1°) que o militar reúna “as aptidões e as qualificações adequadas”; 2°) “por necessidade de racionalização de emprego de recursos humanos ou outras necessidades de serviço”.
XXXVIII) Acresce que, no caso em apreço, porque estavam reunidas as aptidões e as qualificações adequadas (licenciatura em direito e desempenho de funções jurídicas) e também porque se estava no âmbito de uma necessidade de serviço, ou seja, o acto recorrido foi proferido em ordem a uma finalidade pública e visando prossecução do interesse público (interesse da Força Aérea), não podia ter sido outra a decisão do recorrido público no que concerne à situação do recorrido particular, pelo que, no acto sob recurso, mais não fez do que aplicar o regime previsto no n.°1 do art° 170.° do EMFAR.
XXXIX) Quer porque o acto recorrido não envolvia o exercício de poderes discricionários mas, sim, o exercício de poderes vinculados, quer porque o fim visado no acto sob recurso foi um fim público, não é possível invocar se o vício de desvio de poder.
XL) Mesmo que o acto impugnado tivesse sido praticado no exercício de poderes discricionários, o que só por mera cautela de patrocínio de concede, essa discricionariedade ficou juridicamente limitada, de forma definitiva e irreversível, em virtude da existência de auto-vinculação, figura jurídica que ocorre naqueles casos em que a Administração anuncia previamente os critérios de acordo com os quais vai exercer o seu poder discricionário.
XLI) De facto, a partir do momento em que no despacho de 19/06/2000 o CEMFA fixou as duas aludidas condições para efeitos de ingresso no QE/JUR, auto vinculou-se e passou a estar obrigado a obedecer a tais critérios, sob pena de praticar um acto ilegal.
XLII) Consequentemente, a partir do momento em que se constatou que o recorrido particular possuía o segundo enunciado requisito, a decisão do recorrido público só podia e devia ter sido a que foi, sob pena de violação de lei.
XLIII) Mesmo que assim não seja, o que só por mera cautela de patrocínio de concede, o acto recorrido foi praticado tendo por finalidade a prossecução do interesse público, na medida em que visou claramente a satisfação dos interesses da Força Aérea, conforme claramente resulta do texto do sobredito parecer de 08/06/2000 e das consequências, em termos de gestão de pessoal, do ingresso do recorrido particular (não recrutamento de mais pessoal licenciado em direito para o QE/JUR; preenchimento de vagas no mesmo quadro).
XLIV) Acresce que, à própria fixação das condições de acesso ao dito QE, esteve subjacente a prossecução de um fim público, já que se fixou um critério de competência e experiência, no sentido de que seriam “aproveitados” aqueles que já desempenhavam funções jurídicas, o que constituiu uma “mais valia”.
XLV) São completamente improcedentes as alegações do recorrente a propósito do desempenho de funções jurídicas fora ou dentro da Força Aérea. Em primeiro lugar, porque desde 03/04/2000 que o recorrido particular desempenhava funções dessa natureza no MDN/DGPRM. Em segundo lugar, porque em lado ou momento algum do processo subjacente ao processo das transferências para o QE/JUR se exigiu que as “funções jurídicas” fossem prestadas na Força Aérea.
XLVI) Nem uma restrição deste tipo é legalmente admissível, na medida em que é o próprio EMFAR (artigos 146.° e 147.°) que admite que militares possam desempenhar funções fora do ramo a que pertencem ou mesmo fora das Forças Armadas. E isto tanto em cargos ou funções militares, como no exercício de funções públicas que não sendo natureza militar, assumam interesse nacional.
XLVII) As alegações do recorrente, e respectivas conclusões, não respeitam o regime previsto no art° 690.° do CPC, aplicável ex vi do art. 1° da LEPTA, sobretudo quanto aos dois efeitos produzidos pelo acto recorrido (posicionamento na lista de antiguidade e ingresso no QE/JUR), pelo que ser aplicada cominação legal prevista no n.° 4 daquele preceito legal.
XLVIII) Não se acolhe o douto parecer do Distinto Magistrado do Ministério Público junto desse douto Tribunal, a propósito da questão prévia da ilegitimidade, pelo que se reitera que não possui o recorrente legitimidade para a interposição do presente recurso contencioso de anulação, pois não se encontra ele em posição de obter qualquer vantagem com essa anulação.

O MP emite parecer no sentido da improcedência da questão prévia da ilegitimidade activa e da procedência do vício de violação do art. 100° do CPA.

Pelo acórdão deste TCAS de 14-04-2005, a fls. 252/277, foi negado provimento ao recurso.
Porém, em sede de recurso jurisdicional para, o dito acórdão veio a ser revogado pelo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 22-11-2006, a fls. 393 e seguintes, por omissão de pronúncia sobre a questão da ilegal atribuição de eficácia retroactiva ao acto impugnado suscitada pelo Recorrente.
Assim, o acórdão será reformulado, mediante transcrição do já decidido e aditamento da ponderação e decisão relativamente àquela questão.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

FACTOS (com interesse para a causa)
1­_O Alferes graduado em Capitão Vítor Leitão, ora Recorrente, ingressou nos quadros permanentes (QP) da Força Aérea Portuguesa em 16/07/1983, foi promovido ao posto de alferes em 1/10/1995, ao posto de tenente em 1/10/1996 e ao posto de capitão em 1/10/2000.
2_ Por despacho de 5/7/00 do Gen. CEMFA foi deferido o seu requerimento e transferido para o quadro especial JUR com efeitos diferidos a 2/10/2000, em virtude de a sua promoção ao posto de capitão no quadro especial de origem (TPAA) ocorrer apenas em 1/10/2000.
3_O actualmente Alferes graduado em Capitão José Martins ingressou nos QP da Força Aérea Portuguesa em 1/10/1994, com o posto de alferes, foi promovido ao posto de tenente em 1/10/1995 e ao posto de capitão no quadro especial TPAA em 1/10/1999.
4_Por despacho de 13/3/01 da entidade recorrida foi deferida a sua transferência para o quadro especial JUR com efeito a 2/10/2000.
5_ Os dois militares foram transferidos por ingresso para o quadro especial juristas com efeitos à mesma data 2 de Outubro de 2000 oriundos da mesma especialidade TPAA com o mesmo posto na especialidade de que eram oriundos, posto de capitão, mas com distinta antiguidade relativa nesse posto: o actual Alferes graduado em Capitão José Martins detinha maior antiguidade nos QP e nos postos de alferes, tenente e capitão, do que o Alferes graduado em Capitão Vítor Leitão.

O DIREITO
Invoca o recorrido nas suas alegações que as alegações do recorrente, e respectivas conclusões, não respeitam o regime previsto no art. 690.° do CPC, aplicável ex vi do art. 1° da LEPTA, sobretudo quanto aos dois efeitos produzidos pelo acto recorrido (posicionamento na lista de antiguidade e ingresso no QE/JUR), pelo que deve ser aplicada cominação legal prevista no n.° 4 daquele preceito legal.
Dispõe este preceito que: “Quando as conclusões faltem, sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o n°2, o relator deve convidar o recorrente a apresentá-las, completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, sob pena de não se conhecer do recurso, na parte afectada; os juízes-adjuntos podem sugerir esta diligência, submetendo-se a proposta a decisão da conferência.”
Ora, no caso sub judice, as alegações do recorrente, supra transcritas, e que falam por si, obedecem ao preceituado por lei, pelo que não se põe qualquer questão relativamente às mesmas.
QUESTÃO PRÉVIA ILEGITIMIDADE ACTIVA
O recorrido particular excepciona a ilegitimidade do recorrente já que, a seu ver, o recorrente não tem qualquer interesse no acto que fixou o seu posicionamento na lista de antiguidades do mesmo QE, já que do mesmo não resulta qualquer impedimento no normal desenvolvimento e progressão da sua carreira militar. Cumprido o art. 54° da LPTA vem o recorrente e o MP defender que resulta do EMFA que a antiguidade é tutelada por associação a determinados efeitos jurídicos.
Os recorrentes têm legitimidade para interpor recurso quando sejam titulares de interesse directo, pessoal e legítimo.
Neste mesmo sentido dispõe o art. 268° n°4 da Constituição.
Em 1° lugar há que referir que a legitimidade activa apura-se em face dos termos em que se encontra formulada a petição, isto é, em função da pretensão do recorrente e tal como a formulou na petição (neste sentido ver Ac. do STA de 21/6/79 in AD 216, 111 e Ac. STA-P de 24/11/82 in AD 257, 656, entre outros). Mas, tentemos então definir o que é um interesse directo, pessoal e legítimo. Desde logo, interessado é uma pessoa que espera obter da anulação do acto um benefício e se encontra em posição de o receber.
O interesse é directo quando o provimento do recurso implique anulação ou a declaração de nulidade ou de inexistência jurídica de acto que constitua obstáculo à satisfação de pretensão anteriormente formulada pelo recorrente (quer essa pretensão seja positiva quer negativa) tendo como consequência a satisfação de um interesse deste ou seja causa imediata de prejuízos infligidos pela Administração.
Isto é, quando da procedência do recurso haja uma repercussão imediata no interessado e não benefício mediato ou eventual.
O interesse é pessoal quando o recorrente alegue esperar uma utilidade concreta para si próprio ou por sua função, do provimento do recurso. Assim, este interesse não é impessoal ou genérico, não se confundindo com o interesse de qualquer cidadão ou de terceiro. Isto é, há-de ser na sua esfera jurídica ou actividade que se vá produzir o efeito da declaração pretendida.
E, por fim, o interesse é legítimo se a utilidade proveniente do recurso não for reprovada pela ordem jurídica.
No sentido do que temos vindo a expor, ver Marcelo Caetano, Manual, l0ª ed., T1, pag.l332, Prof. Freitas do Amaral, Lições, Ano 19871/988,V. IV, pag. 168 e ssg, na doutrina, e os Acs. de 3/5/90 in AD 367/854, de 24/11/82 in AD 257/656 e de 15/12/87 in AD 324/1556, na jurisprudência, entre outros. A questão que se põe, no caso sub judice, é de saber se o despacho aqui em causa qualquer lesão na esfera jurídica da recorrente de forma que ela tenha um interesse directo, pessoal e legítimo na sua anulação.
Quid juris?
Será que a anulação deste acto irá repercutir na esfera jurídica da recorrente um benefício imediato?
Com o despacho recorrido foi deferido o pedido de transferência do recorrido particular para o QE juristas, com antiguidade desde 21/01/00, e à direita do recorrente na lista de antiguidades, quando havia sido transferido anteriormente com antiguidade à mesma data.
Ora, como refere o MP no seu parecer o recorrente tem um interesse na procedência do recurso “equivalente ao do recorrido particular na improcedência, pelo que não se compreende a luta deste em ver declarada a ilegitimidade activa: se o recorrente em nada beneficia com a alteração das posições relativas na lista de antiguidade, porque se empenha tanto o recorrido particular na manutenção das posições relativas derivadas do acto recorrido, em que lhe é dada a maior antiguidade?”
Na verdade, a antiguidade tem repercussões na carreira quer a nível de autoridade e relações de hierarquia quer na nomeação para o curso de promoção a oficial superior.
Pelo que, tem o recorrente interesse pessoal e legítimo na anulação do acto, com o qual beneficia, pelo que improcede a questão prévia suscitada.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
O recorrente impugna o despacho que deferiu ao aqui recorrido particular “o pedido de transferência para o quadro especial de juristas, por ingresso, nos termos do n°2 do artigo 170° e n°2 do artigo 168° do Estatuto”, com a declaração de que “produz efeitos a partir de 02.Out.2000, ficando o requerente colocado na lista de antiguidade à direita do AF/JUR 037690 Vitor Manuel Matos Leitão”, o aqui impugnante. Imputa-lhe os vícios de violação de lei dos artigos 170°, 180°, n°1, al. a) do EMFAR e 127°, n°1 e 128°, n°2, als. a) e c) do CPA; de desvio de poder; e de forma por falta de audiência do interessado e de fundamentação.
Como não está em causa qualquer nulidade a apreciação dos vícios há-de ser feita nos termos do art. 57° n°2 al. b) que estabelece que a ordem deve ser a indicada pelo recorrente quando estabeleça uma relação de subsidariedade entre os vícios, ou então os vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos. Parece, assim, dever distinguir-se, em princípio, e ressalvadas sempre situações específicas, entre a anulação que permite a renovação do acto anulado e aquela que o não permite.
Na generalidade dos casos há uma maior probabilidade de renovação do acto nos chamados vícios formais (incompetência ou vicio de forma) podendo, num maior número de hipóteses não o ser quando a anulação emerge da verificação de vícios de violação de lei de fundo ou de desvio de poder, (neste sentido Ac. do S.T.A. da 1ª S. in Ac.Dout. 317/565)
Por isso mesmo o art. 57 da L.P.T.A., com toda a prudência, não deixou de apelar, nesta matéria, para o prudente critério do julgador. No caso sub judice, não foi indicada qualquer relação de subsidariedade entre os vícios, pelo que entendemos que o conhecimento prioritário dos vícios de violação de lei e desvio de poder protege mais eficazmente os interesses dos ofendidos do que os vícios de forma por falta de fundamentação. Quanto ao vício de forma por falta de audiência prévia, o seu conhecimento é prioritário face ao “entendimento que o STA tem adoptado, por diversas vezes, que um vício formal que afecta a formação da vontade administrativa deve ser apreciado antes dos vícios que influem na formulação da própria vontade, desde que se esteja, como é o caso previsto no art. 100° do CPA, perante uma situação em que o interessado pode contrapor, perante a proposta de decisão a adoptar pela autoridade administrativa, novos elementos susceptíveis de contraditar a posição tomada e influenciar a decisão final” ( neste sentido ver Ac. do STA, de 05.02.2002, proc. 047311). Pelo que, é de começar por conhecer.
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VIOLAÇÃO DO ART. 100° DO CPA
Alega o recorrente que não foram salvaguardados os seus direitos estatutários já subjectivados.
Pelo que, estando em causa acto que iria afectar os seus direitos e interesses deveria ter sido ouvido previamente.
A questão que aqui se põe é, assim, a de saber se a entidade recorrente devia, ou não, ter cumprido o art. 100° do CPA antes de proferir o despacho recorrido. Dispõe o art. 267° n°4 da Constituição que: “O processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe disserem respeito”. E o art. 100° do CPA dispõe:
“1- Concluída a instrução, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, salvo o disposto no art. 103°.
2- O órgão instrutor decide, em cada caso, se a audiência dos interessados é escrita ou oral.”
Em suma, através deste art. 100° do CPA é consagrado um direito ao interessado de, num procedimento, ser ouvido antes de ser proferida a decisão. É a manifestação do princípio da audiência dos interessados, visando reduzir o risco de que as decisões sejam tomadas com mau conhecimento dos factos ou por motivos não relevantes.
“Trata-se da melhor garantia procedimental concedida aos interessados e que mais não é do que a aplicação ao procedimento administrativo do princípio segundo o qual ninguém deverá ser condenado sem ser previamente ouvido” (CPA de Botelho, Esteves e Pinho, em anotação ao art. 100°).
E, não se diga que não se aplica a procedimentos especiais.
Na verdade, o art. 2° do CPA expressamente dispõe que as disposições deste Código são ainda supletivamente aplicáveis a procedimentos especiais, desde que não envolvam diminuição das garantias dos particulares.
É, pois, uma formalidade imposta por lei.
Constitui entendimento corrente, quer doutrinal quer jurisprudencial, de que são essenciais todas as formalidades impostas por lei, salvo se esta dispuser o contrário e os casos em que, apesar de omitidas ou praticadas com irregularidades, se tenha atingido o resultado que com elas se pretendia alcançar (Acs de 13/2/75, 2111/78 e 27/10/83 in Acs. Dout. 163/913, 204/1461 e 267/289).
É, também, entendimento corrente que as formalidades essenciais se degradam em não essenciais, quando, apesar da sua omissão, se acaba por obter o resultado por elas visado (Prof. Marcello Caetano in Manual, 1º V., 10ª ed. pag. 472 e Acs. de 26/7/86 e 4/6/87 in Acs. Dout. 306/780 e 315/332.)
Atenhamo-nos ao caso sub judice.
O recorrente nunca foi ouvida no processo relativo ao propósito de se colocar o recorrido particular com antiguidade superior à sua no QE Juristas, ultrapassando-o.
E, para tal, bastava que a Administração o tivesse notificado informando-o de que pretendia tomar uma decisão, e que se tivesse algo a dizer, o fizesse num determinado prazo.
O que não aconteceu.
A autoridade recorrida, reconhecendo, embora, que não foi dado cumprimento ao aludido artigo 100°, entende que essa formalidade não era exigida por não ser o aqui recorrente interessado no procedimento.
E com razão.
Na verdade, não nos parece, desde logo, que o aqui recorrente seja interessado no procedimento do recorrido particular que motivou o acto recorrido, não obstante possa ver repercutida na sua esfera jurídica as consequências do acto.
Por outro lado parece-nos que a participação do recorrente não teria possibilidade de influenciar a actuação da administração.
É certo que o acto tem duas dimensões:
- âmbito de discricionariedade técnica que tem sempre uma finalidade vinculada, que corresponde à existência de condições previstas no art. 170° n.°1 do EMFAR para a transferência em causa.
- poder vinculado da Administração, na medida em que a colocação em causa apenas poderia ser determinada pelo conteúdo dos preceitos legais aplicáveis.
A nosso ver, e relativamente à 1ª dimensão do acto, não poderia admitir-se que quer o recorrente quer qualquer outro militar com interesse ou não na transferência, pudesse ser ouvido relativamente a tal questão!
Seria absurdo!
Já quanto à colocação do recorrido à sua frente, admitindo-se que o recorrente devesse ter sido ouvido (com o que não concordamos) sempre esta audição do recorrente não poderia permitir diferente decisão da entidade recorrida, como infra veremos.
Não podemos, pois, dizer que a audição da recorrente tinha possibilidade de influenciar a entidade recorrida quanto à única questão onde poderia ser admissível o cumprimento do art. 100° do CAP, cumprindo-nos apenas aferir se a decisão tomada era a única concretamente possível.
O que efectivamente acontece.
Em suma, por estar em causa uma dimensão vinculada de um acto (a colocação do recorrido particular na lista de antiguidades) não se impõe a anulação do acto, por em tal caso tal formalidade não ser essencial (princípio do aproveitamento do acto) para além de que nos casos de prática de actos sem ser na sequência de um procedimento administrativo, a obrigatoriedade da audiência do interessado não se verificar.
Não se verifica, pois, a nosso ver, este vício.
É, pois de conhecer os restantes vícios suscitados.

VIOLAÇÃO DO ART. 168° N.°2 E 170° N.°2 AL. A) DO EMFAR
Alega o recorrente que está em causa uma transferência para o QE Juristas por ingresso, nos termos dos preceitos supra referidos, pelo que sendo o CAP José Martins mais moderno do que ele não se percebe porque é que passou a ser o mais antigo dos dois!
Responde a entidade recorrida e o recorrido particular que estes preceitos não podem ser interpretados isoladamente e que nos termos dos arts 180° n.°1 al. a) e 180° n.°2 do EMFAR resulta que, porque ambos (recorrente e recorrido particular) foram transferidos por ingresso com igual antiguidade no posto de ingresso, não obstante por actos praticados em momento diferente, mas com retroactividade à mesma data, há que encontrar a antiguidade relativa entre ambos pelas datas de antiguidade no posto anterior e assim sucessivamente.
E, parece-nos que tem razão.
Efectivamente, nos termos do disposto no n°2 do artigo 168° e na alínea a) do n°2 do artigo 170° do EMFAR, o ingresso num quadro especial pode fazer-se por transferência de outro quadro especial.
O que aconteceu no caso sub judice em que os dois militares ingressaram no quadro especial JUR, por transferência do quadro especial TPAA.
Contudo, a regra geral de fixação da antiguidade quando ocorre transferência de quadro especial encontra-se definida na alínea a) do n°1 do artigo 180° do EMFAR, nos termos da qual ao militar transferido para outro quadro especial é atribuída a antiguidade do:
“a) Posto fixado para início de carreira na respectiva categoria, ficando à esquerda de todos os militares existentes no novo quadro, se a transferência se efectuar por ingresso.”
Mas, estando em causa situações de igualdade susceptíveis de ocorrer na transferência de quadro especial (como igualdade de postos; igualdade de antiguidade; precedências protocolares), sem prejuízo desta regra geral, o n°2 do mesmo artigo 180° do Estatuto remete para o artigo 181° do EMFAR as regras aplicáveis ao dirimir de tal situação.
E, nos termos do disposto no n°1 do artigo 181° do EMFAR “A antiguidade relativa entre militares pertencentes a quadros especiais diferentes com o mesmo posto ou postos correspondentes é determinada pelas datas de antiguidade nesse posto e, em caso de igualdade destas, pelas datas de antiguidade no posto anterior, e assim sucessivamente, aplicando-se para o posto de ingresso o estabelecido no artigo 178°”.
Pelo que, resulta claramente destes preceitos (artigo 180° e no n°1 do artigo 181° do EMFAR) que na transferência de quadro especial por ingresso, o militar transferido é, regra geral, colocado à esquerda dos militares que já estão no novo quadro.
Todavia, se o militar transferido tem a mesma antiguidade no posto do militar à esquerda do qual vai ser posicionado, há que “desempatar” na fixação da antiguidade relativa com a antiguidade na carreira militar.
Foi o que aconteceu com o CAP Vítor Leitão e o CAP José Martins já que no novo quadro especial mantiveram a posição de antiguidade relativa que transportavam consigo.
Improcede, pois, o vício suscitado.

VICIO DE DESVIO DE PODER (VIOLAÇÃO DO ART. 170° N.°1 DO EMFAR)
Alega o recorrente que o acto recorrido padece do vício de desvio de poder já que não se estava perante a situação do prevista no art. 170° n.°1 do EMFAR, já que não exercendo o recorrido particular funções na “área jurídica” não se vislumbram ponderosos motivos de serviço que justificassem a prolação do acto ora recorrido.
O recorrido particular responde salientando que o desvio de poder é característica dos poderes discricionários e que está em causa um poder vinculado.
O poder é vinculado na medida em que o seu exercício está regulado por lei. O poder será discricionário quando o seu exercício fica entregue ao critério do respectivo titular, deixando-lhe liberdade de escolha do procedimento a adoptar em cada caso como o mais ajustado à realização do interesse público protegido pela norma que o confere (Sérvulo Correia, Noções de D° Administrativo, 1982, pag. 230).
Dispõe o art. 170° n°1 que “Por necessidade de racionalização do emprego de recursos humanos ou outras necessidades de serviço, o militar pode ser transferido de quadro especial, com a sua anuência ou por seu requerimento, desde que, para o efeito, reúna as aptidões e qualificações adequadas.” Estamos, pois, perante uma norma que concede um poder discricionário que permite a transferência de militares do quadro especial por necessidades ou racionalização de serviço com anuência de interessados desde que os mesmos tenham aptidões e qualificações adequadas.
Só que, para a existência do vicio de desvio de poder, exige-se correntemente que da prova produzida resulte para o tribunal a convicção de que o motivo principalmente determinante da prática do acto recorrido não condiz com o fim visado pela lei na concessão do poder discricionário, e que no caso de outro ou outros fins, além daquele, poderem ter constituído também determinante do acto impugnado, a sua ilicitude, a existir, só conduz à anulação do acto se tiver influído como causa determinante deste (Acs. de 17/1/64, 31/7/64, 22/6/65 e 26/2/76 in A.D. 291569, 37/l, 431881 e 1741836, respectivamente). A Jurisprudência do S.T.A. tem admitido a existência de 2 modalidades de desvio de poder: uma, resultante de erro de interpretação da norma que define o fim para cuja realização é conferido o poder discricionário (erro de interpretação do fim legal) e outra, consequente da intenção de preterir o interesse público visado em benefício de um interesse particular ou de outro interesse público (desvio doloso). No caso de o fim de interesse público ser preterido completamente em proveito privado, é essencial o dolo, ou o “propósito consciente e deliberado” de prosseguir o fim ilegal, mas se houver apenas substituição do fim de interesse público especificamente visado na lei por outro fim, também de interesse público, mas que a lei não contemplou, não é necessária a intenção, podendo o desvio de poder resultar de simples erro de interpretação da lei (neste sentido ver M.C., Manual, 10ª ed., pags 511 e 512 e Acs. de 4/2/92 e 16/6/92 in A.D. 375/254 e A.D. 371/1179). O que vem alegado pelo recorrente é que não se justificava a transferência do recorrido particular já que não estavam verificados os pressupostos do art. 170°.
O que se traduz na existência da postergação do interesse público em proveito de um interesse privado. É, pois, necessário o dolo, o propósito consciente e deliberado de prosseguimento de fim ilegal.
O que de forma alguma resulta sequer alegado dos autos.
Assim, não resulta inequívoco para este tribunal que o motivo principalmente determinante da prática do acto recorrido tenha sido qualquer outro que não os constantes do preceito em causa.
E, os actos administrativos presumem-se legais, pelo que cabia à recorrente provar os factos constitutivos do vício invocado (neste sentido ver Ac. de 4/2/92 in A.D. 375/254).
Não tendo logrado efectuar tal prova, não se verificou o vício invocado.

VICIO DE FORMA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Alega o recorrente que o acto não está fundamentado já que não estão demonstrados fundamentos de facto e de direito que sustentem a transferência do recorrido particular para o QE Juristas.
O recorrido particular responde no sentido de que o acto não carece de ser fundamentado.
Nos termos do art. 124° do CPA têm que ser fundamentados os actos aí expressamente referidos.
Onde não se inclui o acto aqui em causa que se traduz numa resposta a um pedido de transferência que foi deferido.
De qualquer forma, e mesmo que se entendesse que o acto tinha que ser fundamentado há que salientar o seguinte.
De harmonia com o n°1 do art. 125° do mesmo diploma a fundamentação deve ser expressa através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anterior parecer, informação ou proposta, que neste caso constituirão parte integrante do respectivo acto.
Segundo o n°2, é equivalente à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
A fundamentação consiste, assim, em deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta ou em exprimir os motivos porque se resolve de uma maneira e não de outra.
E, visa impor à administração que pondere antes de decidir, contribuindo para uma mais esclarecida formação de vontade por parte de quem tem a responsabilidade da decisão, além de permitir ao administrado seguir o processo mental que a ela conduziu.
Este dever de fundamentar funciona, assim, como um meio fundamental de garantia de legalidade da actividade da administração e também de defesa dos direitos dos administrados.
Tanto neste diploma como no art. 268° n°2 da Constituição da República visa-se “captar com transparência a actividade administrativa” e “principalmente tornar possível um controle contencioso mais eficaz do acto administrativo” (ver Ac. do S.T.A de 16/05/89 in B.M.J. 387/346).
Para se atingirem estes objectivos basta uma fundamentação sucinta, mas que seja clara, concreta, congruente e suficiente. “...a enumeração dos dados de facto e de direito obriga a uma ponderação que poderá conduzir, em não raros casos à modificação ou correcção de um ponto de vista que prima conspectu, se poderia reputar o mais adequado à solução do caso concreto, com as respectivas especificidades” (Ac do T. Pleno de 22/10182 in rec.13.729).
É jurisprudência unânime que a fundamentação é um conceito relativo, que varia em função do tipo concreto de cada acto e das circunstâncias concretas em que é praticado, cabendo ao tribunal em face do caso concreto ajuizar da sua suficiência, mediante a adopção de um critério prático que consiste na indagação sobre se um destinatário normal face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante dos actos em causa, fica em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro (entre outros ver Ac. do T. Pleno de 25/07/84 in Ac. Dout. 288/1386, Ac. do S.T.A. de 30/05/85 in Ac. Dout. 295/816, Ac. De 14/04/83 do S.T.A. in Ac. Dout. 260 e 261/1031 e Ac. do T. Pleno de 23/07/87 in Ac. Dout. 314/247).
Não pode é, em vez de se revelar factos, formular-se juízos, o que impossibilita os administrados de saberem se foram tomados em consideração os acontecimentos que realmente se verificaram e até se com base neles se pode chegar à conclusão que se enunciou (neste sentido Ac. cit. in B.MJ. 387/346).
Atenhamo-nos ao caso sub judice.
É certo que através do acto recorrido, e na parte que aqui diz respeito ao recorrente, ou seja, na colocação do recorrido particular na lista de antiguidades à sua direita, não vem esclarecido devidamente porque é que tal acontece, conforme resulta do acto constante de fls. 18 dos autos e aqui reproduzido.
Contudo, não nos podemos esquecer que o acto foi proferido em resposta a um pedido de transferência do recorrido particular, pelo que a fundamentação há-de ser aferida em função do que é requerido e não da “defesa” relativamente a quaisquer eventuais repercussões desse acto em escala com outros interessados.
Pelo que, face às circunstâncias concretas em que o acto foi proferido, sempre estaria fundamentado.
De qualquer forma, porque a antiguidade relativa a tal colocação na lista corresponde ao exercício de um acto vinculado, sempre seria de aproveitar o mesmo, já que de acordo com o supra referido, o lugar do recorrido na lista de antiguidades à direita do recorrente era o único possível.
Pelo que, sempre seria de aproveitar tal acto.
Não ocorre, pois, a nosso ver, o vício de forma por falta de fundamentação.

VÍCIO DE ILEGAL ATRIBUIÇÃO DE EFICÁCIA RETROACTIVA
Dispõe o artigo 54º do CPA que o procedimento administrativo se inicia oficiosamente ou a requerimento do interessado, marcando assim uma distinção entre o procedimento de interesse público e o de interesse (predominantemente) particular. Existem também os procedimentos mistos cuja caracterização não importa agora equacionar.
No caso vertente, o procedimento de transferência para o QE de Juristas iniciou-se a requerimento dos interessados, entre eles o Recorrente e o Recorrido particular, sendo por isso predominante o interesse particular.
Note-se, aliás, que para o efeito, o requerimento do Recorrido particular precedeu o do Recorrente, mas os serviços da Força Aérea, por justificáveis questões de interesse público, de ordem prática e de uniformidade de critérios, optaram por englobar esses diversos requerimentos num procedimento comum.
É evidente que, num procedimento deste tipo, os particulares interessados devem ser tratados com equanimidade.
Há que realçar neste sentido que a Lei confere grande relevância ao registo da apresentação dos requerimentos, como se constata do Artigo 80º do CPA, em parte pelos motivos já adiantados. Isto porque, como referem Botelho, Esteves e Pinho em anotação nº3 a este artigo (in CPA Anotado e Comentado): «O disposto neste preceito tem particular importância, já que se entende que a Administração tem o dever de respeitar a ordem de apresentação dos requerimentos, no momento de decidir, evitando deste modo favoritismos».
Em suma, tratando-se no caso de uma espécie de concurso de candidatos para ingresso no mesmo QE, e sendo a data de ingresso relevante em termos de antiguidade nesse quadro, é óbvio que os princípios da justiça e da imparcialidade impunham o tratamento não discriminatório de todos os requerentes.
Foi então elaborado um parecer para avaliação dos diversos requerimentos para acesso ao QE de Juristas, no qual se propôs o deferimento do requerimento de ingresso do ora Recorrente, TEM/TPAA Victor Leitão (cfr. PA).
Já no caso do Recorrido particular, CAP/TPAA José Martins, surgiram dúvidas quanto à posse de um dos requisitos exigidos (desempenho de funções de natureza jurídica) pelo que foi proposto que o seu ingresso no QE de Juristas fosse “equacionado em função de um parecer técnico a produzir pela Assessoria Jurídica”. Em concordância o CEMFA despachou no sentido de o CAP Martins ser avaliado para futura decisão.
Ou seja, a pretensão do CAP Martins ficou sujeita à condição suspensiva da verificação da existência de um determinado requisito, que o militar não podia demonstrar pelos seus próprios meios, por depender de uma avaliação técnica a efectuar pelos serviços competentes. Feita essa avaliação constatou-se que a dita condição se verificava e que, portanto, o Recorrido, à data da formulação do seu requerimento, já detinha os requisitos necessários à sua transferência para o QE de Juristas.
Nestas circunstâncias, os já aludidos princípios da justiça e da imparcialidade – Artigo 6º do CPA – impunham que o CAP Martins ingressasse no QE de Juristas de forma a ver salvaguardada a posição relativa que detinha em relação aos demais interessados no mesmo procedimento administrativo. Para alcançar esse desiderato a Administração poderia, por exemplo, ter atendido à precedência no tempo dos requerimentos dos interessados, mas como estava também em jogo o interesse público na oportunidade da designação dos funcionários para o QE, a Administração optou – bem – por fazer retroagir a data de ingresso do CAP Martins a 2/10/2000, ou seja, a mesma data em que ingressou o Recorrente.
Deste modo não existiu qualquer ilegalidade na atribuição de efeitos retroactivos ao ingresso do Recorrido particular naquele QE.

DECISÃO

Pelo exposto acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente, fixando-se em 200 € a taxa de justiça e em 100 € a procuradoria.

Lisboa, 8 de Outubro de 2009

Beato de Sousa
António Vasconcelos
Carlos Araújo