Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 07451/14 |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 03/17/2016 |
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Relator: | CRISTINA FLORA |
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Descritores: | IRC, GASTOS, INDISPENSABILIDADE |
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Sumário: | I. Os gastos fiscais são os derivados da actividade da empresa que apresentem uma conexão fáctica ou económica com a organização e que para que relevem fiscalmente têm de estar afectos à exploração, no sentido de que deve existir uma relação causal entre os gastos e os proveitos da empresa, em termos de adequação económica do acto à finalidade da obtenção maximalista de resultados; II. O juízo de comprovada indispensabilidade é um juízo casuístico que deve ser efectuado subjectivamente, pois só analisando em concreto cada gasto poder-se-á aferir da respectiva indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | A impugnante S…., SGPS, S.A. e a Fazenda Pública vêm recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada, anulando, parcialmente, a liquidação impugnada pela S…, SGPS, S.A. e S…., SA (extinta em 22 de Janeiro de 1999) - liquidação adicional de IRC nº 2……, relativa ao exercício de 1997, sindicada nos autos. A Recorrente S…., SGPS, S.A. apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões: III. DAS CONCLUSÕES A.O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, nos autos referidos em epígrafe, na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela recorrente contra a liquidação adicional de IRC, efectuada pela AT, por referência a 1997. B.À questão jurídica a solucionar – a análise da legalidade do acto de liquidação de imposto endereçado ao impugnante e as correcções efectuadas à sua matéria colectável, por referência ao exercício de 1997 – o Tribunal a quo respondeu, na parte sobre que versa o presente recurso (consubstanciada, conforme se refere no requerimento de interposição, na parte que negou provimento à impugnação judicial deduzida, a única que aqui releva), nos seguintes termos: (i) quanto à questão da desconsideração dos custos incorridos com o arrendamento de uma ilha situada no Brasil, o Tribunal a quo considerou, “não provado que a Ilha Capítulo, no Brasil, tivesse permitido à Impugnante levar a cabo a sua missão, não tendo sido feita prova consistente que permitisse ao Tribunal efectuar alguma conexão entre as despesas com o arrendamento da ilha e a actividade exercida pela Impugnante, já que se desconhece quais os eventos que aí teriam sido organizados, quem teria nos mesmos participado, em que datas teriam ocorrido e se o foram durante o ano de 1997”; (ii) quanto à questão da desconsideração fiscal do custo relacionado com a viagem ao Brasil que consta de uma factura emitida pela VARIG, o Tribunal a quo considerou que não pode o mesmo ser considerado, uma vez que “nenhuma prova foi carreada para os autos que permita tal conclusão – a de que uma viagem foi efectuada pelo presidente do conselho de administração ao Brasil -, nem tal viagem foi referida, em concreto, por nenhuma das testemunhas inquiridas. Assim, não tendo a Impugnante logrado demonstrar a veracidade da sua afirmação, é de manter a correcção.” C.A Recorrente não se conforma, com o sentido da sentença proferida pelo Tribunal a quo quanto às questões acima mencionadas. D. Entende a Recorrente que a decisão recorrida merece censura porquanto: (i) padece de NULIDADE por não especificar os fundamentos de facto, nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC; (ii) padece de ANULABILIDADE por omissão de julgamento e fundamentação das suas decisões em matéria de prova, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e dos n.ºs 3 e 4 do artigo 607.º do CPC; (iii) padece de ANULABILIDADE, por erro de julgamento na matéria de direito, em violação do disposto no n.º 1 do artigo 123.º do CPPT, do n.º 3 do artigo 607.º do CPPT e do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC. A nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto: E. A especificação feita pela Sentença da factualidade não provada nos autos é absolutamente inadmissível, na parte a que nos reportamos nas presentes alegações, por ser meramente tautológica e conclusiva – na medida em que conclui que “Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.” F. Aliás esta especificação acaba verdadeiramente por ser inexistente: na realidade, existe uma contradição ostensiva entre, por um lado, a complexidade e extensão da factualidade que foi carreada para o processo, designadamente pela ora Recorrente, e que esta incluiu expressamente na sua petição inicial, e, por outro, o desleixo com a que a Sentença tratou em determinadas matérias. G. À sentença em crise caberia, pois ter feito constar do probatório – explicando os motivos da sua inclusão na lista dos factos não provados (ou na dos provados) – os factos concernentes com a viagem ao Brasil resultante de factura emitida pela Varig. H. Do teor da sentença deveria impreterivelmente ter resultado uma rigorosa discriminação dos factos – provados ou não provados -, ancorados nos depoimentos das testemunhas inquiridas em sede de audiência de discussão. I. Não se compreende a razão, pela qual a douta sentença não considerou o custo concernente com a viagem ao Brasil nos factos dados como provados, uma vez que a mesma está indubitavelmente abrangida nos custos respeitantes às deslocações ao estrangeiro, tendo estes últimos sido reconhecidos como indispensáveis para a obtenção de proveitos porque provados em audiência de julgamento, o que consubstanciou a anulação das correcções efectuadas pela Administração Fiscal. J. A falta de especificação dos fundamentos de facto é uma nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º, bem como no nº 1 do artigo 125.º do CPPT, sendo que, para efeitos deste último, a falta de discriminação da matéria de facto não provada é equiparada à falta de descriminação da matéria de facto provada. K. Posto que a decisão da matéria de facto, nomeadamente quanto aos factos não provados, é insuficiente, no que diz respeito às matérias em causa no presente recurso, nos termos sobreditos, ela acaba inexoravelmente por ser inadmissível também por resultar da ausência de exame crítico da prova – tal como o vem reconhecendo a Jurisprudência. L. Para além de excessivamente breve, a Sentença é, nesta parte, em grande medida, inócua, podendo até dizer-se que em parte a “motivação” não revela, verdadeiramente, motivação alguma. M. Por outro lado, todavia, o pouco que, do segmento em causa, se pode caracterizar, ainda que com dificuldade, como motivação da decisão da matéria de facto reduz-se a meras fórmulas vazias e genéricas, não podendo também ser considerada motivação suficiente. N. Assim, deve concluir-se que o Tribunal, ao declarar quais os factos que julgou provados e os que entendeu não provados, não analisou criticamente uma parte grande e fundamental das provas ao seu dispor, nem especificou os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, conforme lhe é exigido pelo artigo 607.º do CPC. O. Por falta de especificação dos fundamentos de facto, a Sentença recorrida encontra-se ferida de nulidade, prevista no n.º 1 do artigo 125º do CPPT e na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, podendo ser anulada oficiosamente, ao abrigo da alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC. A anulabilidade da Sentença por omissão de julgamento e fundamentação das suas decisões em matéria de prova P. A liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada «verdade material» -, de tal sorte que a apreciação se há-de filiar, concretamente, em critérios objectivos e, portanto, em geral, há-de ser susceptível de motivação e controlo. A consequência mais relevante da aceitação destes limites à discricionariedade estará em que, sempre que os mesmos se mostrem violados, será matéria passível de recurso. Q. Assim, deve proceder-se à ponderação sobre se a sentença recorrida, para além da indicação dos factos provados e não provados e da indicação dos meios de prova, contém os elementos que permitam concluir que a decisão emana de um processo racional, não arbitrário, de apreciação probatória. E, assim, se a motivação contém um mínimo de informação sobre o conteúdo dos diversos meios probatórios, que ateste convincentemente que a decisão é produto de um julgamento justo e equitativo. R. Da matéria de facto objecto de inquirição testemunhal, entende o Tribunal a quo não estarem provadas as duas factualidades referidas em B supra (de natureza, aliás, bem semelhante a outros igualmente afirmados e corroborados nesta sede mas que não mereceram um juízo equivalente por parte do Tribunal). S. Factualidades essas que não são tidas em conta, não obstante o Tribunal referir que os depoimentos das testemunhas são merecedoras de crédito. T. Ora, se as testemunhas são merecedoras de crédito, não se compreende o total desprezo pelos respectivos depoimentos por parte do Tribunal a quo, os quais de modo inequívoco atestaram a matéria factual controvertida. U. É que, da prova produzida em sede testemunhal e junta aos autos, considerou a recorrente ter ficado assente a generalidade dos factos constantes da petição da impugnação. V. Do teor da prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, nomeadamente do teor dos depoimentos das testemunhas C., M. e J., é entendimento da Impugnante que resulta integralmente provada a factualidade contida nos artigos 50º, 51º, 52º, 53º, 54º, 55º, e 56º da petição de impugnação, relevante para efeitos da demonstração da ilegalidade da correcção proposta pela Administração fiscal, em matéria de custos suportados pela impugnante com o aluguer da sobredita ilha e viagem ao Brasil. W. Todas as testemunhas foram peremptórias em afirmar que os custos incorridos contribuíram, inquestionavelmente, para a afirmação da empresa a nível internacional. X. Ficou, pois, demonstrada a necessidade e imprescindibilidade dos custos de deslocação e representação suportados pela impugnante, atenta a natureza da actividade por ela prosseguida e o contexto empresarial em que a mesma se insere. Y. Não é possível compreender por que razão o Tribunal não considerou os depoimentos, recolhidos das testemunhas inquiridas, atendíveis para efeitos probatórios, ajuizando-os no sentido da sua irrelevância parai a decisão da causa. Z Existe um errado julgamento da matéria de facto, na medida em que o Tribunal não deu como provados determinados factos, os quais resultam inequivocamente da prova testemunhal produzida. AA. Não o tendo feito, a sentença recorrida é anulável, pode deficiente fundamentação da decisão, equiparada à sua falta por inviabilizar o objectivo legal, nos termos do nº 2 do art. 123º do CPPT, nº 3 e 4 do artigo 607º do CPC, consequência que prejudica a apreciação das demais questões suscitadas no recurso. A anulabilidade da Sentença por erro de julgamento da matéria de direito, em violação do disposto no n.º 1 do artigo 123.º do CPPT e do n.º 3 do artigo 607.º do CPC BB. O Tribunal recorrido faz uma interpretação errada das possibilidades de aplicação do artigo 23.º do Código de IRC, a única mobilizável no caso concreto, designadamente na interpretação do requisito da indispensabilidade e da relação com os ganhos ínsitos naquela norma -, e, concomitantemente, num inegável vício de violação do princípio constitucional da tributação de acordo com o seu lucro real e do princípio fundamental da liberdade de gestão e da autonomia privada, conforme exposto supra. CC. De acordo com a formulação do art. 23º do CIRC, a regra, bem ao invés do que pretende a Administração fiscal e, na sentença da qual ora se recorre, o Tribunal a quo, é a de que todos os custos efectivamente incorridos pelas sociedades na prossecução dos seus objectivos estatutários são custos fiscalmente dedutíveis - muito embora a indispensabilidade do custo constitua um conceito indeterminado, que carece de preenchimento, a verdade é que aí o poder da Administração é rigorosamente vinculado: não lhe assiste qualquer margem de livre apreciação, nem lhe cabe formular juízos de oportunidade. DD. O artigo 23° do CIRC não pode ser usado como mecanismo de controlo da validade, consoante a correspondente rentabilidade, dos actos de gestão das empresas: num ordenamento jurídico que reconheça expressamente a liberdade de iniciativa económica e o direito de propriedade privada, a bondade das opções empresariais não pode ser sindicada pela Administração, a menos que sobre elas recaia a suspeita de que são ilegais. EE. Um sistema jurídico de um Estado de Direito democrático, que reconhece a propriedade privada, não pode deixar de ter como fulcro o respeito pela liberdade negocial e pelo poder de auto-regulamentação dos membros da comunidade criadora e destinatário do próprio sistema. FF. As considerações tecidas tomam claro que aos factos descritos - sobre os quais foi produzida a exigida prova em sede testemunhal - nunca se poderá aplicar o n. ° 1 do artigo 23° do CIRC. Repita-se: a desconsideração de uma perda efectiva e incorrida por uma sociedade na prossecução dos seus fins estatutários de forma alguma se pode deixar de estribar na definição legal de custo fiscal. GG. O Tribunal limitou-se a aderir a uma tese que não é sua - mas da Administração fiscal fundada na falta de demonstração da indispensabilidade, do ponto de vista da sua ligação aos proveitos, sem que, para o efeito, tivesse logrado esclarecer o alcance de tal demonstração: o Tribunal, ao reconhecer a comprovação documental do custo e ao não questionar a sua subsunção no escopo social da entidade que nele incorre, limita-se a questionar o benefício daquele encargo para a sociedade numa óptica que se assume de puro formalismo. HH. O juízo subjacente à decisão de improcedência da presente impugnação não corresponde senão a um juízo de oportunidade, de razoabilidade, de censura das decisões de gestão da ora recorrente - subentende-se que a prova desejada pelo Tribunal é a prova (impossível, porque altamente subjectiva e absolutamente dependente de uma definição estratégica apenas perceptível aos administradores da sociedade) de que o custo incorrido é um custo adequado, razoável e indispensável à obtenção directa e imediata dos proveitos da empresa - e já não um juízo de subsunção do custo ao escopo societário da recorrente: a conexão empresarial do custo não é nunca questionada. Para o que, repita-se, o Tribunal nem atribuiu valor à inquirição das testemunhas realizada nem ordenou a produção de quaisquer outros meios de prova. II. Termos em que deverá entender-se que a decisão recorrida, na parte em que julga improcedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrente, assenta em manifesto erro de julgamento em matéria de direito, aqui relevado na deficiente interpretação e aplicação do direito, violando o disposto no n.º 1 do artigo 23.º do CIRC e os princípios constitucionais da tributação pelo lucro real, da liberdade de gestão e da autonomia privada. TERMOS EM QUE, E NOS MAIS DE DIREITO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, POR PROVADO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS RESULTANTES DOS VÍCIOS NELE INVOCADOS.” **** A Fazenda Pública apresentou as suas alegações de recurso, e formulou as seguintes conclusões: “ CONCLUSÕES I) Da prova testemunhal recolhida nos autos, sendo que não foi junto qualquer outro elemento aos mesmos relativamente a esta realidade, não resulta demonstrado que tenham sido efectuadas deslocações ao estrangeiro ao serviço da Impugnante por parte de consultores externos correspondentes aos montantes objecto de correcção por parte da Administração Tributária. II) Também no que se refere aos custos com as viagens de helicóptero desconsiderados pela Administração Tributária, igualmente não se encontra comprovado nos autos o facto de as mesmas terem sido efectuadas ao serviço da Impugnante, ou de outra empresa do grupo (como é o caso da S…, vide gravação minuto 24 e 48 segundos), ou se as mesmas terão sido efectuadas sem qualquer relação com o escopo societário. III) Tendo sido fundadamente questionada a relevância das mesmas despesas e bem assim a sua justificação no âmbito do escopo societário, nos termos do art. 23º do CIRC, por parte da Administração Tributária, à Impugnante caberia o ónus de comprovar as razões para a inscrição dos montantes em causa nos autos como custos na sua declaração de rendimentos, cf. art. 74º n.º 1 e 75º da LGT IV) Por outro lado, nos presentes autos, estamos perante uma causa de valor superior a € 275.000,00, estabelecendo o n.º 7 do art. º 6º do RCP que “(…) o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento. V) Ora no caso dos autos, não obstante existir alguma complexidade nas questões em apreciação, a mesma complexidade não se nos afigura de molde a exigir o pagamento daquele remanescente, o qual tem apenas em consideração o valor do processo sendo independente da sua complexidade, o que se encontra em violação dos princípios constitucionais de proporcionalidade e de acesso aos tribunais, artigos 20º, 2º e 18º n.º 2 segunda parte da Constituição. VI) E as partes não tiveram, a nosso ver, no âmbito do processo um comportamento que se tivesse afastado da normalidade, ou fosse determinante de um grau de censura que implicasse o pagamento daquele remanescente. VII) A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada. Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça. e solicitando-se a dispensa do pagamento do remanescente previsto no art. 6º n.º 7 do RCP.” A Recorrente S…, SGPS, S.A., apresentou contra-alegações, e formulou as seguintes conclusões: Conclusões A A liquidação de imposto que agora se impugna decorre da circunstância de a Administração fiscal ter recusado a dedutibilidade, para efeitos de IRC, de diversas importâncias inscritas pela S.. na respectiva contabilidade e tidas em consideração para o apuramento da matéria tributável relativa ao exercício de 1997. B De acordo com a fundamentação aduzida pela Administração fiscal, a argumentação exposta assenta, no essencial, numa errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 23.° do CIRC. C Conforme se demonstrou nas instâncias próprias, as correcções impugnadas são ilegais, pelo que se impõe a respectiva anulação da liquidação de imposto agora em crise. D No que diz respeito às DESPESAS NÃO COMPROVADAMENTE INDISPENSÁVEIS DE ACORDO COM A FUNDAMENTAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO FISCAL, a Administração fiscal considera ainda que as despesas correctamente contabilizadas pela S.. corno "deslocações e estadas" não se assumiriam como custos fiscais, pelo facto de não serem alegadamente indispensáveis para a obtenção dos proveitos ou manutenção da fonte produtora. E. Os custos em apreço dizem respeito a diversas deslocações e estadas de administradores da S… (Dr. J.) e de consultores especificamente contratados pela S… para determinados projectos, encontram-se estritamente relacionados com a actividade desenvolvida pela S… e foram "indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos suieitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”. F. A Administração fiscal coloca em causa os custos efectivamente suportados pela S… e correctamente contabilizados a título de "deslocações e estadas", com o argumento de que não existiria" qualquer nexo de causalidade entre as mesmas e a actividade da S…" pois" não existem participações sociais de entidades com sede ou direcção efectiva nos países de destino das deslocações, nem projectos de participações nesses países" . G. Assim, de acordo com o raciocínio apresentado pela Administração fiscal, tais custos não teriam contribuído para a realização dos proveitos, pelo que, nos termos do artigo 23° do CIRC, seriam acrescer ao resultado fiscal declarado. H. Ora, em primeiro lugar, assinale-se que as facturas em causa, assim como todas as outras em apreço nos presentes autos, respeitam todos os ditames da lei. I. Em segundo lugar, os custos em causa referem-se a deslocações e estadas, quer de membros do conselho de administração da S…, quer de terceiros expressamente contratados para o efeito, no âmbito da política de expansão internacional já referida por causa da entrada no negócio das telecomunicações. J. É ainda inquestionável que as facturas em causa titulam custos relacionados com a actividade da S…, tendo-se revelado fundamentais para a internacionalização do GRUPO S… e para um assinalável aumento do respectivo volume de negócios, pelo que não se pode aceitar a alegação de que os mesmos não respeitariam o disposto no artigo 23º do CIRC. L. A Administração fiscal questiona ainda a admissibilidade destes custos com o argumento de que a S… não teria participações sociais em entidades com sede ou direcção efectiva nos países de destino das deslocações, nem projectos de participações nesses países. M. Como vimos, a S… integra um grupo económico que possui um assinalável volume de negócios e encontrava-se em plena fase de expansão, pelo que os membros do respectivo conselho de administração estavam atentos a oportunidades de negócio em todo o mundo. N. As suas deslocações não se cingiam apenas aos locais onde já tinham interesses mas, pelo contrário, eram efectuadas para destinos onde pudessem surgir novos negócios, numa lógica de maximização do valor das suas participações. O. É manifesto que as deslocações não poderiam estar limitadas aos locais onde a sociedade já detivesse uma participação, ao invés, era importante descobrir novas oportunidades de aquisição de participações financeiras interessantes, pelo que o raio de acção dos representantes da S… não podia ser restrito àqueles locais. P. Acrescente-se que as circunstâncias adiantadas pela Administração fiscal são irrelevantes: nem sempre as viagens de negócios são bem sucedidas ou chegam a produzir qualquer resultado ou, inclusivamente, os contratos podem ser concluídos num local diferente por comodidade das partes, por exemplo. Q. A atitude da Administração fiscal revela uma visão grosseira da natureza das actividades dos membros do conselho de administração de uma sociedade gestora de participações sociais com as características da impugnante: como é evidente, essas actividades podem abranger domínios relativamente aos quais não é possível identificar um resultado directo (negociações com parceiros internacionais, congressos, seminários, contactos com entidades oficiais, contratos com bancos estrangeiros, etc.). R. Todos estes gastos são custos fiscais, nos termos do artigo 23° do CIRC: estão enlaçados numa relação de indispensabilidade com a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora. S. Termos em que se conclui pela legalidade da Sentença proferida na parte em que julgou a impugnação judicial deduzida procedente e a liquidação adicional de IRC impugnada ilegal. TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE, POR NÃO PROVADO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE A MANUTENÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA.” **** Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência dos recursos. **** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.**** As questões invocadas pelas Recorrentes nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir são as seguintes:Recorrente Fazenda Pública: _ Erro de julgamento, por não resultar provado da prova produzida que os gastos com deslocações ao estrangeiro e com helicópteros, foram efectuados ao serviço da Impugnante, ónus que cabia à Impugnante; _ Dispensa do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no art. 6.º, n.º 7 do RCP. Recorrente Impugnante: _ Erro de julgamento de facto na medida em que os depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência, conduzem à prova da factualidade alegada nos artigos 50.º, 51.º, 52.º, 53.º, 54.º, 55.º e 56.º da p.i. que eram importantes para a afirmação da empresa a nível internacional, ficando provada a indispensabilidade do custo [conclusões P) a AA) e respectiva indicação das passagens da gravação de cada depoimento constante das alegações]; _ E erro de julgamento de direito por errónea interpretação do art. 23.º do CIRC e violação dos princípios constitucionais da tributação pelo lucro real, da liberdade de gestão e da autonomia privada [conclusões BB) a II)]. II. FUNDAMENTAÇÃO 1. Matéria de facto A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto: “III – Os factos Com base na documentação junta aos autos e constante do processo administrativo, no depoimento das testemunhas inquiridas, bem como na posição assumida pelas partes, consideramos provados os seguintes factos: a) A Impugnante S…, S.A., tinha como objecto social “o controlo, participação e investimento em empresas comerciais e industriais e a prestação de serviços de consultadoria, gestão e assistência técnico-comercial”- Cfr. documento a fls. 58 do PAT, acordo; b) Por escritura pública de 23 de Dezembro de 1998 a S…, SA, foi incorporada, por fusão, na S…, SGPS, SA – Cfr. documento 3, junto com a p.i.; c) Na sequência de acção inspectiva à contabilidade da Impugnante S…, SA, a Administração Fiscal efectuou correcções em sede de IRC do exercício de 1997, com a seguinte fundamentação: “(…) Despesas de representação Esta conta apresenta o saldo de 46.687.938$00 onde estão incluídas despesas com o aluguer de uma ilha à empresa C….., Ldª. Esta ilha está localizada no Brasil e foi efectuado um contrato de aluguer com S…., SA, para promover os seus negócios junto dos seus partners ou investidores, conforme era previsto no referido contrato. Estas despesas efectuadas com a empresa C… no total de 45.709.877$0 não são aceites fiscalmente como custo, visto serem custos incorridos não conexos com a actividade da empresa e não se poderem comprovar a sua indispensabilidade com vista à realização dos proveitos, de acordo com o artº 23º do CIRC. Atendendo a que o custo em causa não é aceite fiscalmente, por um lado, e, por outro, acresceu-se apenas 20% no quadro 17 da declaração modelo 22 de 1997, proceder-se-á à devida correcção complementar relativa à parte respeitante aos 80%, que se apresenta pela forma seguinte: 45.709.877$x 80%= 36.567.901$. Para além disso, constitui uma despesa não documentada, em virtude da inexistência total de documentos credíveis que suportam o custo, não existindo nenhuma factura/recibo emitida pela C…; estas despesas estão documentadas unicamente por cartas enviadas ao Banco pela S… a pedir para efectuarem as transferências a favor da empresa C…. e por outro lado por extractos do Banco a confirmarem as respectivas transferências. Assim, e de acordo com a alínea h) do nº1 do artigo 41º do CIRC, estas despesas no total de 45.709.877$ vão ser tributadas autonomamente, por força do DL 192/90 de 9 de Junho.(...) III.1.3- conta 6222700/708 – Deslocações e estadas (...) III.1.3.1- Doc. Int. 417 O.D. – Diz respeito a uma despesa no montante de 144.630$ relativa à estadia em Luxemburgo de 4 pessoas, mas só vai ser aceite como custo ¼ (36.157$), visto só o Sr. J… pertencer ao conselho de administração da empresa, as restantes não são trabalhadores da empresa, pelo que não é aceite como custo o montante de 108.473$, por não estar em conformidade com o artº 23º do CIRC.(...) III.1.3.2- Doc. Int 1014, 1122, 1215, 1216, 1217 e 1228. Estes documentos dizem respeito a despesas com passagens aéreas em nome de várias pessoas, sendo alguns trabalhadores da categoria B de rendimentos, conforme se pode verificar através da relação modelo 10 e outras em nome de pessoas que não são trabalhadores da empresa. Assim, de acordo com o artigo 23º do CIRC estas despesas no total de 1.654.073$ não são aceites como custo. III.1.3.3- Doc. Int. 702, 703, 704, 705, 706, 707, 729 e 1220 Estes documentos dizem respeito a facturas emitidas pela empresa “V…., SA” pelo fretamento de helicopteros ao longo do ano de 1997. Através da factura não nos é possível identificar quais os destinos destas viagens, bem como quais foram os utilizadores desses serviços, pois, a sua descrição apenas refere “rotas várias”. Com o objectivo de esclarecer esta situação foi efectuada uma fiscalização cruzada à empresa “V…”, onde nos foi facultado um mapa com os destinos das viagens efectuadas pela empresa “S….”. Através deste mapa concluiu-se que foram efectuadas deslocações a vários locais onde não existem empresas clientes da S…. Verificámos também que não existe nenhuma correspondência entre estas despesas efectuadas com o fretamento dos helicópteros e os serviços prestados pela S……., SA às empresas suas clientes, pois não existe nenhuma factura onde estejam debitadas qualquer deslocação, isto é, não se provou que os custos suportados foram repercutidos a terceiros. Assim, estas despesas no total de 59.514.875$, não podem ser consideradas como custo fiscalmente, visto estes custos nada terem a ver com a actividade da empresa e não se podem comprovar que foram indispensáveis à realização dos proveitos, de acordo com o artº 23ºdo CIRC.(...) III.1.3.4 – Doc. Int. 120 Este documento é um recibo referente a uma passagem aérea no valor de 334.487$, onde não indica quem foi o utilizador do serviço, nem foi fornecido qualquer documento onde se pudesse identificar, pelo que, este custo não é aceite de acordo com o artigo 23º do CIRC.(...) IX – Propostas Pelo exposto no capítulo III, o resultado do exercício do ano de 1997 vai ser objecto de correcção no montante de 103.553.952$: Lucro fiscal declarado: 54.724.772$ Lucro fiscal corrigido 158.278.724$ (...)” – Cfr. documento a fls. 54 a 65 do PAT, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido; d) Consta dos autos cópia de acordo estabelecido entre a ora Impugnante e “C…., Ldª” – Cfr. documento 6 junto com a p.i., o qual, se dá, aqui, por integralmente reproduzido; e) Consta dos autos cópia de carta, com o assunto: recibo-aluguel ilha do Capitulo, datado de 12 de Janeiro de 1998, dirigido à Impugnante, a qual se dá, aqui, por integralmente reproduzida; f) No ano de 1997 a Impugnante recorreu ao serviço de consultores externos, no âmbito da internacionalização do Grupo – Cfr. depoimento da testemunha C…., cujo depoimento se revelou credível, claro e revelador de um conhecimento directo dos factos; g) Os consultores externos referidos na alínea anterior efectuaram deslocações ao estrangeiro ao serviço da Impugnante – Cfr. depoimento da testemunha C…. e da testemunha J…., cujo depoimento se revelou credível, claro e revelador de um conhecimento directo dos factos; h) As visitas à rede dos concessionários dos automóveis cujo direito de importação pertencia ao Grupo S…, pelo presidente do conselho de administração da S…, eram efectuadas de helicóptero – Cfr. depoimento da testemunha C…., cujo depoimento se revelou credível, claro e revelador de um conhecimento directo dos factos; i) O presidente do conselho de administração da Impugnante deslocava-se a reuniões de helicóptero – idem; j) Com base nas correcções efectuadas na sequência da acção inspectiva, em 24 de Abril de 2002 foi efectuada liquidação adicional de IRC nº 8….., relativa ao exercício de 1997 – Cfr. documento a fls. 19, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido; * Factos não provados 1. Não se provou que a Ilha Capítulo, no Brasil, tivesse permitido à Impugnante levar a cabo a sua missão, não tendo sido feita prova consistente que permitisse ao Tribunal efectuar alguma conexão entre as despesas com o arrendamento da ilha e a actividade exercida pela Impugnante, já que se desconhece quais os eventos que aí teriam sido organizados, quem teria nos mesmos participado, em que datas teriam ocorrido e se o foram durante o ano de 1997. 2. Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados. * A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos, não impugnados, do depoimento das testemunhas inquiridas e das informações oficiais constantes dos autos, conforme referido no probatório.” **** Altera-se a seguinte factualidade, ao abrigo do artigo 662.º do CPC, com relevo para a decisão do recurso: Adita-se o seguinte facto provado: l) O contrato referido em d) foi celebrado tendo em vista a actividade empresarial da Impugnante em Portugal e os seus investimentos no Brasil (cfr. cláusula 4 do contrato de fls. 44 dos autos, e depoimento das três testemunhas); m) A ilha do capítulo objecto do contrato mencionado na alínea l) foi utlizada pela Impugnante, no ano de 1997, para a realização de reuniões empresariais (cfr. depoimento das três testemunhas, em particular, depoimento da testemunha M. que esteve presente numa dessas reuniões). Factos não provados: _ Elimina-se o facto dado como não provado, por ter sido produzida prova documental e testemunhal suficiente para dar como provado parte desse facto; _ não resulta provado que o recibo que titula a despesa no montante de 334.487$00 está relacionada com a viagem do presidentes do conselho de administração ao Brasil no âmbito da promoção do Grupo S… e da procura de um parceiro estratégico para o I…., S.A. (facto alegado no art. 50.º da p.i.), formando-se a convicção no tribunal na ausência de prova documental ou testemunhal adequada à prova desse facto. 2. Do Direito Conforme resulta dos autos foi deduzida impugnação judicial da liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 1997, que resulta de várias correcções efectuadas pela AT à matéria tributável da Impugnante, tendo a sentença recorrida julgado parcialmente procedente a impugnação. As correcções assentaram, em síntese, no entendimento de que determinados gastos inscritos pela S…., S.A. não poderiam ser aceites como custos fiscais, nos termos do art. 23.º, e alínea h) do n.º 1 do art. 41.º, ambos do CIRC, porquanto não seriam comprovadamente indispensáveis. Neste contexto, vem a Impugnante interpor recurso na parte em foi julgada improcedente a impugnação, relativamente a correcção aos custos referente com viagem ao Brasil e correcção referente ao custo respeitante ao arrendamento de uma ilha no Brasil. A Fazenda Pública recorre na parte em que julgou procedente a impugnação judicial, relativamente à correcção referente a custos com despesas de alojamento e viagens e correcção referente a custos com viagens de helicóptero. Antes de mais, vejamos quanto à nulidades da sentença invocada pela Recorrente Impugnante por não especificar os fundamentos de facto, considerando que foram vários os factos carreados para o processo [conclusões D) a O]. Apreciando. A propósito da nulidade da sentença por falta da especificação é esclarecedor o Acórdão do STA de 16/01/2013, proc. n.º 0343/12, no qual se sumariou que “I – As decisões judiciais estão sujeitas ao dever de fundamentação por força do disposto no artigo 158º do CPC, o que constitui, aliás, imperativo constitucional que decorre do n.º 1 do artigo 205.º da CRP. II – O art. 125.º do CPPT e o análogo art. 668.º, nº 1, al. b), do CPC estipulam que é nula a sentença quando falte a especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, e estes preceitos são aplicáveis aos despachos judiciais por força do estipulado no nº 3 do art. 666º do CPC. III – Se a decisão judicial de indeferimento do requerimento que a impugnante apresentou no processo de impugnação judicial – no sentido de que fosse determinado ao órgão de execução fiscal a suspensão do processo executivo face ao pedido formulado na petição inicial de impugnação de dispensa de prestação de garantia – é totalmente omissa quanto aos factos provados necessários à aplicação do direito, verifica-se omissão absoluta de julgamento em matéria de facto, que constitui uma nulidade que deve, aliás, ser conhecida oficiosamente pelo STA face ao disposto no nº 3 do art. 729º do CPC.” (sublinhados nossos). Mais se explicitou naquele acórdão, a respeito da questão, que “[e]sta especificação dos fundamentos da decisão judicial refere-se à sua motivação ou fundamentação no plano factual e jurídico e passa pela expressão e discriminação da matéria de facto considerada pertinente para apoiar a solução de direito, cumprindo, assim, uma dupla função: por um lado, impõe necessariamente ao juiz um momento de controlo crítico da lógica e da bondade da decisão; por outro, permite, pela via do recurso, o reexame da decisão por ele tomada. Razão por que a falta de julgamento dos factos necessários à decisão constitui, aliás, nulidade de conhecimento oficioso, em paralelo com a nulidade prevista nos artigos 729.º e 730.º do Código de Processo Civil, pois que – de acordo com o acórdão desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 20-11-1996, proferido no recurso n.º 20805 – o n.º 1 do art. 144º do CPT (a que corresponde o actual art. 125.º do CPPT) e a alínea b) do n.º 1 do art. 668.º do CPC, ao exigirem a especificação dos fundamentos de facto da decisão, referem-se à fundamentação ou motivação da mesma, no plano factual, que não à fixação propriamente dita, ao julgamento dos factos necessários à mesma decisão, cuja falta constitui, ao contrário daquela, nulidade do conhecimento oficioso. No mesmo sentido, e a título meramente exemplificativo, os acórdãos desta Secção de 3-6-1992, de 20-2-2008, de 12-11-2008, de 12-01-2011, de 10-03-2011 e de 16-11-2011, proferidos nos recursos n.º 14284, n.º 903/07, n.º 546-08, nº 638/10, nº 716/10, e nº 453/11, respectivamente.” (sublinhado nosso). Deve distinguir-se entre falta absoluta de motivação e motivação deficiente, medíocre ou errada, também é certo e é jurisprudência assente que esta nulidade só abrange a falta absoluta de motivação da própria decisão e não já a falta de justificação dos respectivos fundamentos; isto é, a nulidade só é operante quando haja total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão (cfr. por todos, Ac. do STA de 04/03/2015, proc. n.º 01939/13). A insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade (cfr. Alberto dos Reis, CPC anotado, Vol. V, 140.) Por isso, como salienta Jorge Lopes de Sousa devam “considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação”, já que esta se destina “a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão”, e, por isso, “quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação” (cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. II, 6.ª edição, Áreas Editora, 2011, anotações 7 e 8 ao art. 125.º, pp. 357 a 361.) Deste modo, a sentença deve estar minimamente motivada, pois caso seja omitida absolutamente a motivação de facto, então, estaremos perante a nulidade da sentença prevista no art. 123.º, n.º 2 do CPPT. Aplicando o supra exposto ao caso dos autos verifica-se que a sentença não enferma de nulidade por falta de especificação de facto, uma vez que não se verifica a falta absoluta de motivação de facto, sendo certo que, conforme supra exposto, a falta de discriminação da matéria de facto não consubstancia nulidade. Deste modo, o invocado pela Recorrente Impugnante (a sentença recorrida deveria ter dado como provado vários factos relacionados com a viagem ao Brasil com base na prova testemunhal efectuada) pode consubstanciar erro de julgamento de facto, mas não nulidade, até porque a Meritíssima Juíza no discurso fundamentador da sentença referiu-se à factualidade que julgou essencial à sua decisão, explicando as razões de não ter dado como provado alguns dos factos essenciais. Pelo exposto, não se verificam as nulidades arguidas. Vejamos, então, o regime jurídico substantivo com relevo para a decisão de ambos os recursos interpostos. Nos termos do disposto no art. 23.º do CIRC, consideram-se gastos os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Deste modo, um determinado gasto poderá ser desconsiderado se não tiver comprovação, se for dispensável, ou se irrelevante para os ganhos sujeitos a imposto. Se um gasto não é indispensável, então não integra a previsão normativa do n.º 1 do artigo 23.º, do CIRC, podendo, pois, ser por esta via, fiscalmente desconsiderado. In casu, sublinhe-se, desde logo, que não é colocado em causa que os custos se encontram comprovados documentalmente. Assim, os gastos fiscais, em regra, são os derivados da actividade da empresa que apresentem uma conexão fáctica ou económica com a organização, e que para que relevem fiscalmente têm de estar afectos à exploração, no sentido de que deve existir uma relação causal entre os gastos e os proveitos da empresa, em termos de adequação económica do acto à finalidade da obtenção maximalista de resultados. O juízo de comprovada indispensabilidade é um juízo casuístico, pois só analisando em concreto cada gasto poder-se-á aferir da respectiva indispensabilidade para “… a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”. Essa análise casuística, deverá ser efectuada subjectivamente, não podendo associar-se a um juízo meramente objectivo, dependendo da actividade e objectivos de gestão da própria empresa. A AT pode excluir gastos, portanto, quando casuisticamente haja motivos para se entender que aqueles foram incorridos na prossecução de outro interesse que não o empresarial, ou, ao menos, com nítido excesso, face às necessidades e capacidades da empresa. Como se sabe, estabelecendo o art. 75.º, n.º 1 da LGT uma presunção legal de veracidade das declarações dos contribuinte (“[p]resumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei (…)”), cabe a AT o ónus da prova da falta de correspondência com a realidade do teor das declarações (nesse sentido, cfr. Diogo Leite de campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária – Anotada e Comentada, 4.ª ed., Vislis, 2012, p. 664). Ora, deste modo, em sede de acção de inspecção, cabe à AT demonstrar os pressupostos que legitimam a correcção à declaração do contribuinte, ou seja, os factos constitutivos desse direito, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 74.º da LGT. Não é necessário que a Administração Tributária efectue uma prova directa da verificação dos respectivos pressupostos, poderá recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. ALBERTO XAVIER, Conceito e Natureza do Ato Tributário, pág. 154. Regressando ao caso dos autos, e tendo em consideração o regime legal supra exposto, apreciemos, então, cada um dos recursos. I. A Impugnante não se conforma com a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial relativamente às seguintes correcções: custo/gasto referente com viagem ao Brasil; e custo/gasto respeitante ao arrendamento de uma ilha no Brasil (Ilha do Capítulo). Invoca erro de julgamento de facto na medida em que os depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência, à semelhança do que sucedeu relativamente a outros custos, conduzem à prova da factualidade alegada nos artigos 50.º, 51.º, 52.º, 53.º, 54.º, 55.º e 56.º da p.i. que eram importantes para a afirmação da empresa a nível internacional, ficando provada a indispensabilidade do custo [conclusões P) a AA) e respectiva indicação das passagens da gravação de cada depoimento constante das alegações]. Por outro lado, entende ainda a Recorrente Impugnante que a sentença enferma também de erro de julgamento de direito por errónea interpretação do art. 23.º do CIRC e violação dos princípios constitucionais da tributação pelo lucro real, da liberdade de gestão e da autonomia privada [conclusões BB) a II)]. Apreciando. Relativamente à correcção referente ao gasto com a viagem ao Brasil titulado por factura Varig a fundamentação da matéria de facto é a seguinte: “A AF não aceitou o custo com uma viagem ao Brasil na companhia Varig na medida em que a factura não indica quem foi o utilizador do serviço, nem foi fornecido qualquer documento onde se pudesse identificar. Afirma a Impugnante que tal custo diz respeito a uma viagem efectuada pelo presidente do conselho de administração ao Brasil. Porém, nenhuma prova foi carreada para os autos que permita tal conclusão, nem tal viagem foi referida, em concreto, por nenhuma das testemunhas inquiridas. Assim, não tendo a Impugnante logrado demonstrar a veracidade da sua afirmação, é de manter a correcção.” (sublinhado nosso). Cumpre então, face à fundamentação constante do relatório de inspecção, ao disposto no art. 23.º do CIRC, ao invocado pela Recorrente na p.i. e à prova testemunhal produzida, aferir da legalidade desta correcção. Deste modo, a fundamentação desta correcção foi a seguinte: “Este documento é um recibo referente a uma passagem aérea no valor de 334.487$, onde não se indica quem foi o utilizador do serviço, nem foi fornecido qualquer documento onde se pudesse identificar, pelo que, este custo não aceite de acordo com o art. 23.º do CIRC.” Ora, face a esta fundamentação importa concluir que se encontra suficientemente justificada a correcção, pois considerando o serviço em causa, importava haver na contabilidade informação sobre quem usufruiu daquela viagem. Com efeito, ainda que no âmbito da própria inspecção, cabia à Recorrente esclarecer quem usufruiu daquela viagem, juntando os documentos que dispusesse, de modo a permitir a AT poder desempenhar a sua função fiscalizadora, não o tendo feito, encontra-se justificada a actuação da AT ao abrigo do art. 23.º do CIRC para desconsiderar aquele gasto. Deste modo, cabia à Recorrente fazer contraprova sobre a indispensabilidade daquele custo, pelo menos suficiente para sustentar uma fundada dúvida sobre a existência do facto tributário (art. 100.º do CPPT). A Recorrente invocou no art. 50.º da p.i. que aquele recibo titula uma despesa relacionada com o presidente do conselho de administração da S…, SA ao Brasil no âmbito da promoção do Grupo S… e da procura de um parceiro estratégico para o I…., S.A. Sucede que, poderia a Recorrente ter junto aos autos o bilhete de avião emitido em nome do presidente do conselho de administração da S…, mas não juntou, remetendo para a prova testemunhal produzida. Porém, a verdade é que analisado os depoimentos prestados verifica-se que a Recorrente não confrontou qualquer testemunha com aquele documento, nem foi dirigida qualquer pergunta concreta relacionada especificamente com este recibo, e também nenhuma testemunha se referiu em concreto a tal documento, o que tanto basta para concluirmos que bem andou a Meritíssima Juíza a quo quando conclui que “nenhuma prova foi carreada para os autos que permita tal conclusão, nem tal viagem foi referida, em concreto, por nenhuma das testemunhas inquiridas”. Pelo que, quanto a esta correcção improcedem os fundamentos do recurso, sendo certo que a interpretação do art. 23.º que é adoptada em nada viola qualquer dos princípios constitucionais invocados pela Recorrente. Trata-se apenas de aplicar as regras do ónus da prova (art. 74.º da LGT). Relativamente aos custos com a Ilha capítulo a sentença recorrida na parte referente aos custos com a Ilha capítulo entendeu o seguinte: “A Administração Fiscal não aceitou os custos relativos a despesas com o aluguer de uma ilha no Brasil, em virtude de ter considerado os custos incorridos não conexos com a actividade da Impugnante, bem como por não se poder comprovar a sua indispensabilidade com vista à realização dos proveitos, de acordo com o preceituado no artigo 23º do CIRC. Por outro lado, por ter sido considerada como despesa não documentada, foi tributada autonomamente por força do disposto no Decreto-Lei nº 192/90, de 9 de Junho. A Impugnante não concorda com nenhum dos fundamentos da correcção efectuada. No que respeita ao enquadramento do custo no artigo 23º do CIRC afirma a Impugnante que a ilha em apreço fica situada junto à costa brasileira e possui condições excelentes para a organização de eventos destinados à promoção de investimentos a nível internacional, pelo que a sua utilização permitiu à S…., S.A. levar a cabo a sua missão de procurar um parceiro estratégico para o I…., SA e, simultaneamente, convidar investidores estrangeiros para assumirem uma posição accionista de referência na sociedade comercial S…, SGPS, S.A. Entende que a reunião de capitais por parte de sociedades exige que os projectos sejam apresentados de uma forma condigna e de acordo com a grandeza do projecto. Sem perder de vista o que supra se disse sobre o conceito de indispensabilidade, importa salientar que o objecto social da Impugnante, como resulta do probatório, consistia no controlo, participação e investimento em empresas comerciais e industriais e a prestação de serviços de consultadoria, gestão e assistência técnico-comercial. A questão está em saber se a Impugnante logrou demonstrar a indispensabilidade dos custos em que incorreu com o arrendamento da ilha para a prossecução do seu objecto social. Entendemos que não. O tribunal considerou não provado que a Ilha Capítulo, no Brasil, tivesse permitido à Impugnante levar a cabo a sua missão, não tendo sido feita prova consistente que permitisse ao Tribunal efectuar alguma conexão entre as despesas com o arrendamento da ilha e a actividade exercida pela Impugnante, já que se desconhece quais os eventos que aí teriam sido organizados, quem teria nos mesmos participado, em que datas teriam ocorrido e se o foram durante o ano de 1997. Ora, não tendo sido feita essa prova não pode proceder a alegação da Impugnante.” (sublinhado nosso) Cumpre então, face à fundamentação constante do relatório de inspecção, ao disposto no art. 23.º do CIRC e à prova testemunhal produzida, aferir da legalidade desta correcção (sendo certo que quanto à correcção da despesa não documentada tributada autonomamente foi julgada procedente a impugnação, não tendo sido sindicada em sede de recurso pela Fazenda Pública). Esta correcção assentou na seguinte fundamentação: “(…) Despesas de representação Esta conta apresenta o saldo de 46.687.938$00 onde estão incluídas despesas com o aluguer de uma ilha à empresa C…., Ldª. Esta ilha está localizada no Brasil e foi efectuado um contrato de aluguer com S…., SA, para promover os seus negócios junto dos seus partners ou investidores, conforme era previsto no referido contrato. Estas despesas efectuadas com a empresa C… no total de 45.709.877$0 não são aceites fiscalmente como custo, visto serem custos incorridos não conexos com a actividade da empresa e não se poderem comprovar a sua indispensabilidade com vista à realização dos proveitos, de acordo com o artº 23º do CIRC.” Ora, da simples leitura desta fundamentação do acto tributário resulta a fragilidade da própria fundamentação. Com efeito, desconhece-se a razão pela qual se procede à correcção nos termos do art. 23.º do CIRC porquanto a AT limita-se a dizer que se trata de “não são aceites fiscalmente como custo, visto serem custos incorridos não conexos com a actividade da empresa e não se poderem comprovar a sua indispensabilidade com vista à realização dos proveitos”. Trata-se de um juízo conclusivo, sem que se indiquem as razões pelas quais se entendeu tratar-se de uma despesa dispensável. Por outro lado, na própria fundamentação da correcção se faz referência ao “contrato de aluguer” da ilha, o que significa que a AT teve acesso a tal contrato e suas condições acordadas, tanto mais que enuncia uma delas prevista naquele contrato “para promover os seus negócios junto dos seus partners ou investidores”. Ou seja, a natureza do gasto que é desconsiderado pela AT encontra-se materializado no próprio contrato de aluguer, contrato esse que não foi colocado em causa pela AT, e portanto, não se descortinam motivos para a desconsideração daquele gasto. Donde resulta que é manifesto que a AT não cumpriu com o ónus que sobre si recai de demonstrar os pressupostos da sua actuação (art. 74.º, n.º 1 do CPPT). Por outro lado, da prova testemunhal produzida resulta que tal gasto estava relacionado com a actividade da Recorrente, senão vejamos. Relativamente à Ilha capítulo a testemunha C. afirmou não ter conhecimento directo que reuniões se realizavam, porém afirmou que tinha conhecimento que lá se realizavam e existia um edifício para reuniões. A testemunha J. descreveu detalhadamente a necessidade do grupo de ter presença estratégica no Brasil à época em causa e afirmou ter viajado ao Brasil ao serviço da Impugnante. Por outro lado, o depoimento da testemunha M. (que aliás não é sequer referido pela sentença recorrida, não se compreendendo bem as razões pelas quais não foi considerado uma vez que é bem pormenorizado quanto a esta questão) afigura-se-nos decisivo para a prova das despesas de representação pretendida pela Recorrente Impugnante. Esta última testemunha confirmou a existência de contactos concretos no Brasil com quem negociavam. Afirmou que tinha estado na ilha do Capítulo para realizar uma reunião. Precisou bem a localização e utilização, designadamente estrategicamente fica num local entre o Rio de Janeiro e São Paulo é uma zona de Angra dos Reis que é frequentada por uma elite com funções de topo e que interessavam para o desenvolvimento dos negócios. Afirmou que o espaço tinha duas abordagens, tinha um pequeno auditório com painéis para apresentação e tinha uma casa ao lado com catering, mas tinha o objectivo para a sessão de trabalho. Sabia que a utilização da ilha foi feita para fins empresariais, era uma estrutura para encontrar parceiros, e marcavam para lá essas sessões, os executivos de Rio e São Paulo iriam a esse local específico para as sessões, tendo em conta que no Brasil a abordagem era diferente. Portanto, contrariamente ao que se entendeu na sentença recorrida, pelo menos uma reunião em concreto (no ano de 1997) se realizou nessa ilha, tendo isso mesmo sido confirmado pela testemunha que nela participou. Mas também afirmou a existência de outras, pese embora não as tenha precisado. Aliás, a existência genérica de reuniões na Ilha capítulo também foi confirmada pela testemunha C.. Portanto, resulta dos depoimentos que o arrendamento da ilha e que tinha a finalidade o desenvolvimento de reuniões, negociações e expansão estratégica do grupo com potenciais clientes, tratando-se, deste modo, de despesas de representação. Toda a explicação adiantada pela Recorrente Impugnante na p.i. para enquadrar tais despesas foi confirmada pelos depoimentos das testemunhas, que pese embora não fossem de modo a precisar exactamente todas as concretas reuniões (sendo certo que pelo menos uma foi concretizada pela testemunha que nela participou), também não o tinham de fazer, face à frágil (inexistente) fundamentação substancial do acto tributário e a existência de um contrato que também corrobora tal tese. Portanto, relativamente a esta correcção a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito, e nessa medida deve ser revogada. Face ao exposto, e em suma, o recurso da Recorrente Impugnante merece provimento apenas quanto à correcção referente aos gastos de arrendamento da Ilha capítulo, e consequentemente a sentença recorrida, nesta parte, deve ser revogada. Passemos, então, a apreciar o recurso da Fazenda Pública. II. A Recorrente Fazenda Pública não se conforma com a sentença recorrida na parte em que julgou procedente a impugnação judicial relativamente a duas correcções: custos com despesas de alojamento e viagens e custos com viagens de helicóptero. Vejamos então. A sentença recorrida, no que diz respeito à correcção referente aos custos com despesas de alojamento e viagens decidiu o seguinte: “A AF não aceitou estes custos pela circunstância de os mesmos dizerem respeito a pessoas que não eram trabalhadores da empresa, sendo alguns trabalhadores da Categoria B de rendimentos. A Impugnante não concorda com a correcção efectuada na medida em que, afirma, no ano de 1997 recorreu aos serviços de vários especialistas em diferentes áreas, os quais não dispensaram várias deslocações ao estrangeiro. Não esquecendo o que se disse relativamente ao conceito de indispensabilidade, cumpre salientar que do probatório resulta que, de facto, foram contratados consultores externos pela Impugnante no ano de 1997 os quais efectuaram deslocações ao estrangeiro ao seu serviço. Não é relevante o argumento avançado pela AF de que nas deslocações teriam participado pessoas que não eram trabalhadores da empresa. O que releva é a conclusão de que as viagens em causa foram realizadas ao seu serviço, portanto no âmbito da prossecução do seu objecto social. Assim, tem razão a Impugnante, sendo de aceitar os custos relacionados com deslocações e estadias em causa.” Relativamente aos custos com despesas de alojamento e viagens, a Recorrente Fazenda Pública vem invocar erro de julgamento (de facto), porquanto não foi feita prova documental desse custo, sendo certo que da prova testemunhal produzida não resulta demonstrado que tenham sido efectuadas deslocações ao estrangeiro ao serviço da Impugnante por parte de consultores externos, até porque estes não foram identificados pelas testemunhas [conclusão I)]. Ora, a sentença recorrida, enquadrando a fundamentação da correcção de que a não-aceitação dos custos em causa assentava na “circunstância de os mesmos dizerem respeito a pessoas que não eram trabalhadores da empresa, sendo alguns trabalhadores da Categoria B de rendimentos.”, afasta essa argumentação da AT entendendo que “[n]ão é relevante o argumento avançado pela AF de que nas deslocações teriam participado pessoas que não eram trabalhadores da empresa. O que releva é a conclusão de que as viagens em causa foram realizadas ao seu serviço, portanto no âmbito da prossecução do seu objecto social.” E com efeito, nenhum reparo há que fazer ao entendimento assumido na sentença recorrida, o que releva é saber se as viagens em causa foram realizadas na prossecução do objecto social da empresa, o que se julgou verificado com base no facto dado como provado no ponto f) e g) da matéria de facto. Com efeito, a sentença recorrida entendeu que resultou provado que a Impugnante recorreu ao serviço de consultores externos no âmbito da internacionalização do Grupo, e que esses consultores efectuaram deslocações ao estrangeiro ao serviço da Impugnante. Tais factos foram dados como provados com base nos depoimentos das testemunhas C. e J.. Sucede que, apesar da Recorrente Fazenda Pública impugnar aquela matéria de facto dada como provada, em momento algum indicou quais as passagens da gravação em que se funda a sua impugnação da matéria de facto, tal como impõe o disposto no art. 640.º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do CPC. A Recorrente neste particular, nas suas alegações de recurso, limita-se a assacar juízos conclusivos e genéricos a respeito dos depoimentos das testemunhas, sendo certo que a Meritíssima Juíza do TAF de Sintra indicou com precisão quais as testemunhas, cujos depoimentos conduziram aos factos provados. Com efeito, cabia ao Recorrente o ónus de “indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso”, não o tendo feito (nem nas conclusões, nem nas alegações de recurso que complementam aquelas) então, rejeita-se o recurso nesta parte [conclusão I)]. Passemos, então, à correcção de custos com viagens de helicóptero. Invoca a Recorrente Fazenda Pública que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento (de facto) no que diz respeito à correcção dos custos com viagens de helicópteros, porquanto, “não se encontra comprovado nos autos o facto de as mesmas terem sido efectuadas ao serviço da Impugnante, ou de outra empresa do grupo (como é o caso da S…, vide gravação minuto 24 e 48 segundos), ou se as mesmas terão sido efectuadas sem qualquer relação com o escopo societário.” [conclusão II)], sendo que era à Impugnante que cabia o ónus da prova nos termos do n.º 1 do art. 74.º e art. 75.º da LGT [conclusão III]. A correcção impugnada assentou na seguinte fundamentação, vertida no ponto c) dos factos provados: “(...) Através da factura não nos é possível identificar quais os destinos destas viagens, bem como quais foram os utilizadores desses serviços, pois, a sua descrição apenas refere “rotas várias”. Com o objectivo de esclarecer esta situação foi efectuada uma fiscalização cruzada à empresa “V….”, onde nos foi facultado um mapa com os destinos das viagens efectuadas pela empresa “S…”. Através deste mapa concluiu-se que foram efectuadas deslocações a vários locais onde não existem empresas clientes da S…. Verificámos também que não existe nenhuma correspondência entre estas despesas efectuadas com o fretamento dos helicópteros e os serviços prestados pela S…., SA às empresas suas clientes, pois não existe nenhuma factura onde estejam debitadas qualquer deslocação, isto é, não se provou que os custos suportados foram repercutidos a terceiros. Assim, estas despesas no total de 59.514.875$, não podem ser consideradas como custo fiscalmente, visto estes custos nada terem a ver com a actividade da empresa e não se podem comprovar que foram indispensáveis à realização dos proveitos, de acordo com o artº 23ºdo CIRC.(...)” Atendendo à prova testemunhal produzida, a Meritíssima Juíza do TAF de Sintra deu como provados os seguintes factos constantes dos pontos h) e i): “h) As visitas à rede dos concessionários dos automóveis cujo direito de importação pertencia ao Grupo S…, pelo presidente do conselho de administração da S…, eram efectuadas de helicóptero – Cfr. depoimento da testemunha C., cujo depoimento se revelou credível, claro e revelador de um conhecimento directo dos factos; i) O presidente do conselho de administração da Impugnante deslocava-se a reuniões de helicóptero – idem;” É com base nesta factualidade que resultou da prova testemunhal produzida em conjugação com a actividade desenvolvida pela empresa (cfr. ponto a) dos factos provados) que se conclui pela “anulação da correcção”. Aqui chegados, cumpre então apreciar a impugnação da matéria de facto que é feita pela Recorrente Fazenda Pública, da qual se depreende que pretende impugnar o facto dado como provado no ponto h) e i), pois entende que “no que se refere aos custos com as viagens de helicóptero desconsiderados pela Administração Tributária, igualmente não se encontra comprovado nos autos o facto de as mesmas terem sido efectuadas ao serviço da Impugnante, ou de outra empresa do grupo (como é o caso da S…, vide gravação minuto 24 e 48 segundos), ou se as mesmas terão sido efectuadas sem qualquer relação com o escopo societário.”. Portanto, trata-se do depoimento da testemunha C., que importa ter presente que na sentença recorrida considerou-se “credível, claro e revelador de um conhecimento directo dos factos;” não havendo razões para alterar tal juízo. Segundo alega a Recorrente Fazenda Pública o depoimento da testemunha é genérico não conduzindo à prova de que as viagens de helicóptero foram efectuadas ao serviço da Impugnante, porém, entendemos que não se verifica o erro de julgamento assacado, desde logo porque a passagem da gravação indicada pela Recorrente Fazenda Pública em nada coloca em causa os factos que foram dados como provados. Por outro lado, a testemunha esclareceu que a Impugnante, no período em causa, desenvolvia a sua actividade visando novas oportunidades de negócios, novos mercados, estava em expansão. Mais afirmou que nem sempre se concretizavam os negócios, mas que estavam constantemente a ser desenvolvidos contactos, designadamente no Brasil e que se efectuavam viagens de helicóptero. Ora, pese embora não se tenham precisado as viagens concretas que foram efectuadas, a verdade é que afirmou que era um meio de transporte utilizado pela Impugnante nos seus negócios e referiu que o presidente do conselho de administração da Impugnante se deslocava de helicóptero para participar em reuniões. Deste modo é de confirmar a sentença recorrida quanto a sua fundamentação seguinte: “Resulta do probatório que o presidente do conselho de administração da Impugnante se deslocava de helicóptero para participar em reuniões e para visitar a rede de concessionários das marcas cujo direito de importação detinha. Não podemos aceitar a argumentação da AF ao efectuar a correcção de que não é de aceitar o custo em virtude de terem sido efectuadas deslocações a locais onde não existiam clientes da Impugnante. Tendo presente o objecto social da Impugnante (alínea a) do probatório), é curial salientar que, dada a abrangência do mesmo, não se compadece com meras visitas a clientes, como pretende a AF, não sendo o argumento utilizado razoável dada a área de actividade da Impugnante. Por outro lado, as deslocações do presidente do conselho de administração não têm que, necessariamente, conduzir a um serviço prestado a uma empresa cliente, para se aferir da indispensabilidade do custo não é exigível que os custos das deslocações fossem repercutidos a um cliente. Como afirma a Impugnante, as funções de um presidente do conselho de administração, por vezes, não originam resultados imediatos. Assim sendo, demonstrada a utilização do helicóptero pelo presidente do conselho de administração da Impugnante em deslocações relacionadas com o respectivo objecto social, será de anular a correcção, nos termos requeridos.” Pelo exposto, também nesta parte, o recurso não merece provimento. Por último, vem a Recorrente Fazenda Pública recorrer da sentença recorrida com fundamento não ter havido dispensa do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no art. 6.º, n.º 7 do RCP, mais se requerendo que esta seja dispensada (conclusões IV a VI). Sucede que, quanto a este fundamento de recurso a Fazenda Pública não tem interesse em agir porquanto, estamos perante uma impugnação judicial proposta em 10/09/2002, e por conseguinte, a Fazenda Pública está isenta do pagamento de custas ao abrigo do art. 3.º, n.º 1, al. a), do Regulamento das Custas dos Processos Tributários, e art. 9.º, do DL n.º 29/98, de 11 de Fevereiro, que aprovou tal Regulamento. Face ao exposto, improcede, in totum, o recurso da Fazenda Pública. Em suma, o recurso da Recorrente Impugnante merece provimento apenas quanto à correcção referente aos gastos de arrendamento da Ilha capítulo, e consequentemente a sentença recorrida, nesta parte, deve ser revogada, e quanto ao recurso da Fazenda Pública, é de manter a sentença recorrida. III. DECISÃO Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso interposto pela Recorrente Fazenda Pública, e conceder parcial provimento ao recurso da Impugnante, revogando-se a decisão recorrida nesta parte, e consequentemente, julgar parcialmente procedente a Impugnação. **** Sem custas, por a Recorrente Fazenda Pública estar delas estar isenta (art. 3.º, n.º 1, al. a), do Regulamento das Custas dos Processos Tributários, e art. 9.º, do DL n.º 29/98, de 11 de Fevereiro, que aprovou tal Regulamento), e custas pela Recorrente Impugnante na proporção do decaimento que se fixa em 1/30 (art. 527.º, n.º 2 do CPC).D.n. Lisboa, 17 de Março de 2016. ____________________________ Cristina Flora
____________________________ Cremilde Abreu Miranda
____________________________ Joaquim Condesso |