Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 10080/13 |
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Secção: | CA-2º JUÍZO |
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Data do Acordão: | 06/05/2014 |
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Relator: | RUI PEREIRA |
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Descritores: | PROCESSO DE INJUNÇÃO – REPRESENTAÇÃO DO ESTADO – MINISTÉRIO PÚBLICO |
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Sumário: | I – O procedimento de injunção, criado pelo DL nº 404/93, de 10/2 [e entretanto revogado pelo DL nº 269/98, de 1/9, que visou alterar o seu regime no sentido de o tornar mais abrangente e expedito, mas que não lhe alterou a natureza], destina-se a facultar ao credor um meio para obter de forma expedita um título executivo. II – Os credores podem recorrer ao procedimento de injunção quando a obrigação do devedor reúna um dos seguintes pressupostos: i) não seja superior a € 15.000 e tenha como fonte um contrato; ou, ii) tenha como fonte uma transacção comercial abrangida pelo DL nº 32/2003, de 17/2. III – De acordo com o disposto no artigo 16º do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, apresentada oposição ao requerimento injuntivo, o processo é apresentado à distribuição e, ainda de acordo com o artigo 17º, nº 1 desse regime, o processamento subsequente ao requerimento de injunção segue uma forma processual alheia à jurisdição administrativa, designada acção especial para cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato. IV – Não existe nenhuma norma no regime da injunção a determinar ou a impor que as acções em que se convolam os procedimentos de injunção, na sequência da apresentação destes últimos à distribuição – nomeadamente devida à dedução de oposição –, sejam da competência exclusiva dos tribunais judiciais. V – Dado que a matéria em causa nestes autos está atribuída à jurisdição administrativa pelas alíneas e) e f) do nº 1 do artigo 4º do ETAF, com a remessa dos autos ao TAC de Lisboa, por força da oposição deduzida pelo réu, operou-se uma transmutação do procedimento de injunção em acção administrativa comum, na forma sumaríssima, atendendo ao valor do pedido, em conformidade com o disposto no artigo 17º, nº 1 do regime anexo ao DL nº 269/98, 1/9, não obstante o processamento subsequente ao requerimento de injunção, no caso de ter sido deduzida oposição, consistir numa forma processual alheia à jurisdição administrativa. VI – De acordo com o disposto no artigo 17º do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, após a distribuição, segue-se, com as necessárias adaptações, o disposto no nº 4 do artigo 1º [remessa ao autor do duplicado da contestação simultaneamente com a notificação da data da audiência de julgamento] e nos artigos 3º e 4º [termos posteriores aos articulados e audiência de julgamento], só havendo lugar à citação do réu [nova citação] nos casos em que se tenha frustrado a notificação do requerido [artigo 17º, nº 2 do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9]. VII – Assim, o processo “transita” da fase extra-judicial [injunção] para a judicial [acção administrativa comum] sem que haja lugar a nova citação do réu, valendo como tal a notificação efectuada ao requerido, por carta registada com aviso de recepção, para pagar ao requerente a quantia pedida, acrescida da taxa de justiça por ele paga, ou para deduzir oposição à pretensão [cfr. artigo 12º, nº 1 do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9], entendimento este reforçado com a remissão que o nº 2 do citado artigo faz para o regime da citação do CPCivil [artigos 231º e 232º, 236º, nºs 2 a 5, e 237º e 238º do anterior CPCivil, e artigos 223º, 224º, 228º, 229º e 230º do actual CPCivil]. VIII – Não havendo em tais casos lugar a nova citação do réu, a representação deste terá necessariamente que estar desde logo assegurada por quem caberia representá-lo, nos termos das pertinentes normas de processo, caso se tratasse “ab initio” duma acção comum. IX – Figurando como réu o Estado português, essa representação cabe ao Ministério Público, de acordo com o disposto no artigo 11º, nº 2 do CPTA, na medida em que a lei atribui àqueles magistrados a competência para representar o Estado-Administração nos tribunais judiciais e nos tribunais administrativos e fiscais [cfr. artigo 219º, nº 1 da CRP, 5º, nº 1 da LOFTJ, 5º, nº 1, alínea a) do Estatuto do Ministério Público, e 24º, nº 1 do CPCivil]. X – Da lei não resulta qualquer limitação do âmbito dessa representação que seja determinada quer pela natureza do processo que ali venha a correr termos e no qual o Estado seja interessado, quer pelo facto de no processo vir ou não a haver intervenção efectiva de um juiz e, caso ela venha a existir, pelo momento a partir do qual tal intervenção venha a ter lugar. XI – Consequentemente, tem de entender-se que essa representação se estende, em juízo, a qualquer forma de processo, declarativo ou executivo, comum ou especial, pelo que também no procedimento de injunção, que reveste natureza especial, caberá ao Ministério Público assegurar a representação do Estado |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO “PT …………….., SA” [por incorporação da “PT PRIME – Soluções Empresariais de Telecomunicações e Sistemas, SA”], apresentou junto do Balcão Nacional de Injunções contra o Estado Português – Ministério da Cultura um pedido de pagamento da quantia de € 9.623,98 e respectivos juros de mora, emergente do fornecimento de bens ou serviços que prestou àquele. Para tanto, indicou como entidade a notificar o Digno Magistrado do Ministério Público junto do TAC de Lisboa. Este Digno Magistrado deduziu oposição ao requerimento de injunção, invocando “inter alia” a ilegal representação do Estado por parte do Ministério Público [cfr. 18/23 dos autos]. Remetidos os autos ao TAC de Lisboa, aí foi proferido despacho saneador, a julgar verificada a excepção dilatória inominada da ilegal representação do Estado pelo Ministério Público, com a consequente absolvição do réu Estado Português da instância [cfr. fls. 87/97 dos autos]. Inconformada, a autora interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, no qual formulou as seguintes conclusões: “1. A douta sentença proferida fez, salvo o devido respeito, uma errada interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis, porquanto julgou procedente a excepção da ilegal representação do Estado pelo Ministério Público, absolvendo assim o Réu Estado Português. 2. Na douta sentença proferida pelo tribunal "a quo" é referido que "tendo a autora apresentado requerimento de injunção contra o Estado Português e expressamente indicado como entidade a notificar a notificar o Magistrado do Ministério Público junto deste tribunal, forçoso é concluir pela procedência da ilegal representação do Estado pelo Ministério Público no procedimento de injunção em causa [...]". 3. Ora, no requerimento de injunção apresentado no Balcão Nacional de Injunções, a ora recorrente não fez qualquer referência à entidade a notificar, tendo apenas indicado como entidade então requerida o "Estado Português – Ministério da Cultura – Secretaria Geral". 4. Porém, o Balcão Nacional de Injunções por livre iniciativa e sem qualquer intervenção da ora recorrente, fez incluir no requerimento de injunção a menção a "A notificar na pessoa do Magistrado do MP" junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa – Av. D. João II, nº 1.08.01 – Ed. G - 6º P, 1990-097 Lisboa". 5. Tal deve-se, ao que se julga, ao teor do ofício nº 18249/2009, de 4-9-2009, emitido pela Procuradoria-Geral da República, a cujo teor a recorrente é totalmente alheia, remetido ao cuidado da Exmª Senhora Directora-Geral da Administração do Estado, no qual se refere "Porque a representação do Estado em juízo deve ser assumida pelo Ministério Público, a notificação daquele [devedor/requerido], para efeitos de pagamento ou de oposição, deve ser efectuada na pessoa do magistrado do Ministério Público junto do Tribunal competente". 6. A recorrente apenas identificou a entidade recorrida – Estado Português – Ministério da Cultura – Secretaria-Geral, não tendo mencionado no requerimento de injunção por si apresentado a entidade a notificar. 7. A recorrente, no requerimento de injunção por si apresentado, não indicou como entidade a notificar o Magistrado de Ministério Público. 8. Assim sendo, no caso dos autos, salvo o devido respeito por opinião diversa, não deverá a recorrente ser prejudicada pelo teor da informação proferida pela Procuradoria-Geral da República, porquanto a recorrente apenas apresentou o requerimento de injunção contra Estado Português – Ministério da Cultura – Secretaria-Geral, nada tendo referido relativamente a uma eventual notificação na pessoa do Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, conforme veio posteriormente a ser inserido no requerimento de injunção. 9. Não obstante, sempre se diga que o Ministério Público é competente para representar o Estado e defender os respectivos interesses – artigos 219º, nº 1 CRP e 20º, nº 1 do CPC. 10. Ademais, nos termos do disposto nos artigos 11º, nº 2 do CPTA e 20º do CPC, tendo por objecto uma relação contratual estabelecida entre recorrente e recorrido, o Ministério Público é competente para representar o Estado nos presentes autos, mediante dedução de oposição e após distribuição do requerimento de injunção. 11. Aliás, os processos judiciais provindos de requerimento de injunção, nos termos previstos no DL nº 269/98, de 1 de Setembro, iniciam-se por uma fase desjurisdiconalizada sendo que, após dedução de oposição, transmutam-se em acção judicial, não se podendo admitir, salvo entendimento em contrário, que o Ministério Público tenha competência para representar o Estado na segunda fase [fase judicial] mas já não numa fase inicial! 12. Como afirma Esperança Mealha, em "Personalidade Judiciária e Legitimidade Passiva das Entidades Públicas", Publicações Cedipre Online 2, Centro Estudos de Direito Público e Regulação Faculdade Direito da Universidade de Coimbra, nas "acções sobre contratos e de responsabilidade civil "pura", em que a personalidade judiciária pertence apenas ao Estado [por força da regra da representação do Estado pelo Ministério Público nessas acções – artigo 11º, nº 2 do CPTA]". 13. Sendo assim o Ministério Público competente para representar o Estado nos presentes autos.” [cfr. fls. 106 a 110 dos autos]. O réu contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido [cfr. fls. 138/140 dos autos]. Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para julgamento. II. FUNDAMENTAÇÃO A única questão a apreciar no âmbito do presente recurso jurisdicional consiste em saber se num processo de injunção em que é demandado o Estado português deve ser o Ministério Público citado para deduzir oposição ao requerimento injuntivo ou, no caso em apreço, o ministério em causa. A decisão recorrida entendeu que a representação do Estado pelo Ministério Público era ilegal e, em consequência, absolveu o Estado Português da instância. Fundamentou-se, para tanto, no seguinte: “[…] no caso em apreço, assim como em todos os outros em que se conclua estarmos perante uma situação em que, perspectivando a acção subsequente ao requerimento de injunção, sejam competentes os tribunais administrativos, é a pessoa colectiva Estado a entidade que tem legitimidade passiva para a mesma. Porém, não deve o requerente indicar, em sede de requerimento de injunção, como sendo entidade a notificar, o Magistrado do Ministério Público, "in casu", junto do Tribunal Administrativo, mas sim o concreto serviço ou órgão que contratou consigo, devendo este, por sua vez, designar pessoa ou entidade com poderes para o representar em sede de procedimento de injunção. Neste pressuposto, vislumbram-se, assim, três vias de solução: […] 1ª – O serviço ou órgão notificado, paga e o requerente beneficia "in totum" do mecanismo de Injunção; 2ª – O serviço ou órgão não paga, apresenta oposição, situação em que o processo deverá ser remetido para o tribunal indicado no item "tribunal competente para distribuição", sendo que no caso dos tribunais administrativos, tal determinará, em regra, o aperfeiçoamento ou a convolação do procedimento num dos pedidos admissíveis na acção administrativa comum, seguindo esta, consoante o valor, a forma de processo sumaríssima, sumária ou ordinária nos termos do CPC [artigo 35º do CPTA], iniciando-se aqui, já em tribunal, a representação do Estado por um Magistrado do Ministério Público que deverá ser notificado para os termos da acção; 3ª – O serviço ou órgão não paga, nem apresenta oposição, situação em que o requerente ficará munido de um título executivo que poderá accionar também junto dos tribunais administrativos, caso seja o caso. De notar que, nesta última hipótese, as regras de legitimidade passiva serão em toda a sua amplitude a do artigo 10º, nºs 2 e 4 do CPTA, sem interferência do artigo 11º, nº 2 do mesmo diploma legal, ou seja, a entidade pública a demandar será o Ministério ao qual pertence o órgão ou serviço e não o Estado. Face a todo o exposto, tendo ora autor apresentado requerimento de injunção contra o Estado Português e expressamente indicado como entidade a notificar o Magistrado do Ministério Público junto deste tribunal, forçoso é concluir pela procedência da ilegal representação do Estado pelo Ministério Público no procedimento de injunção em causa e, consequentemente, porque estes autos emergem de tal procedimento, ilegal é também a representação do Estado pelo Ministério Público, nos autos em apreço”. Vejamos se este entendimento é de manter. O procedimento de injunção, criado pelo DL nº 404/93, de 10/2 [entretanto revogado pelo DL nº 269/98, de 1/9, que visou alterar o seu regime no sentido de o tornar mais abrangente e expedito, mas que não lhe alterou a natureza], destina-se a facultar ao credor um meio para obter de forma expedita um título executivo. Para que o credor possa recorrer a este procedimento a lei estabelece alguns pressupostos ou condições, ou dito de outro modo, nem todos os credores podem lançar mão ao procedimento de injunção para obter um título executivo. De facto, de acordo com o artigo 7º do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, na redacção que lhe foi dada pelo DL nº 32/2003, de 17/2, “considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei nº 32/2003, de 17 de Fevereiro”. Por seu turno, no artigo 1º do DL nº 269/98, de 1/9, na redacção dada pelo DL nº 303/2007, de 24/8, dispõe-se que “é aprovado o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior a € 15,000 [...]”. Da conjunção das normas transcritas conclui-se que os credores podem recorrer ao procedimento de injunção quando a obrigação do devedor reúna um dos seguintes pressupostos: i) não seja superior a € 15.000 e tenha como fonte um contrato; ou, ii) tenha como fonte uma transacção comercial abrangida pelo DL nº 32/2003, de 17/2. Como decorre dos autos, a autora e aqui recorrente pretende obter o pagamento de uma obrigação pecuniária emergente de um contrato de prestação de serviço de valor inferior a € 15.000,00, pelo que está verificado o pressuposto acima descrito sob i). Ora, de acordo com o disposto no artigo 16º do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, apresentada oposição ao requerimento injuntivo, como se verificou no caso “sub iudice”, o processo é apresentado à distribuição e, ainda de acordo com o artigo 17º, nº 1 desse regime, o processamento subsequente ao requerimento de injunção segue uma forma processual alheia à jurisdição administrativa, designada acção especial para cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato. Porém, não existe nenhuma norma no regime da injunção a determinar ou a impor que as acções em que se convolam os procedimentos de injunção, na sequência da apresentação destes últimos à distribuição – nomeadamente devida à dedução de oposição –, sejam da competência exclusiva dos tribunais judiciais. No entanto, dado que a matéria em causa nestes autos está atribuída à jurisdição administrativa pelas alíneas e) e f) do nº 1 do artigo 4º do ETAF, com a remessa dos autos ao TAC de Lisboa, por força da oposição deduzida pelo réu, operou-se uma transmutação do procedimento de injunção em acção administrativa comum, na forma sumaríssima, atendendo ao valor do pedido, em conformidade com o disposto no artigo 17º, nº 1 do regime anexo ao DL nº 269/98, 1/9, interpretado com as devidas adaptações, necessárias para a sua operatividade face ao regime do CPTA. Ou seja, não obstante o processamento subsequente ao requerimento de injunção, no caso de ter sido deduzida oposição, consistir numa forma processual alheia à jurisdição administrativa [“in casu”, acção especial para cumprimento de obrigação pecuniária emergente de contrato – cfr. artigo 17º, nº 1 do regime anexo ao DL nº 269/98], dever-se-á proceder à convolação do procedimento de injunção para uma das formas de processo consagradas no CPTA, concretamente na acção administrativa comum [cfr. artigo 37º, nº 2, alínea h) do CPTA], a qual constitui o meio processual adequado para os casos em que, por força da dedução da oposição, o procedimento de injunção se transfigura num processo judicial a correr termos nos tribunais administrativos [neste sentido, cfr., entre outros, os acórdãos do TCA Sul, de 1-7-2010, processo nº 05813/10, e do TCA Norte, igualmente de 1-7-2010, processo nº 00337/09.3BEAVR]. Sendo este o processamento subsequente aos pedidos de injunção em que a entidade demandada haja deduzido oposição, resta apreciar se a decisão recorrida fez uma correcta interpretação das normas jurídicas aplicáveis. Segundo esta, se “o serviço ou órgão não paga, apresenta oposição, situação em que o processo deverá ser remetido para o tribunal indicado no item "tribunal competente para distribuição", sendo que no caso dos tribunais administrativos, tal determinará, em regra, o aperfeiçoamento ou a convolação do procedimento num dos pedidos admissíveis na acção administrativa comum, seguindo esta, consoante o valor, a forma de processo sumaríssima, sumária ou ordinária nos termos do CPC [artigo 35º do CPTA], iniciando-se aqui, já em tribunal, a representação do Estado por um Magistrado do Ministério Público que deverá ser notificado para os termos da acção”, pelo que não podendo o réu – no caso o Estado português – ser representado pelo Ministério Público no procedimento de injunção, entendeu estar-se perante uma excepção dilatória inominada e, em consequência, absolveu o réu da instância. Mas mal, como se procurará demonstrar. Como decorre do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, nomeadamente dos seus artigos 3º e 17º, e como igualmente assinalado pela doutrina, em caso de existência de oposição ao requerimento injuntivo, o processo prossegue para a fase de julgamento [cfr., neste sentido, Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 4ª Edição, 2004, a págs. 63-64; Miguel Teixeira de Sousa, A Reforma da Acção Executiva, LEX, 2004, a págs. 69; Carlos Francisco de Oliveira Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2ª Edição, 2004, a págs. 90; Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 6ª Edição, 2008, a págs. 164; Paulo Pimenta, Notificação, Citação e Revelia, THEMIS – Revista da Faculdade de Direito da UNL, Ano VII, nº 13 – 2006, a págs. 249-250; e, na jurisprudência, o já citado acórdão deste TCA Sul, de 1-7-2010, e o acórdão da Relação de Lisboa, de 14-10-2010, processo nº 77791/09.3YIPRT.L1-8]. Assim, de acordo com o disposto no artigo 17º do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9, após a distribuição, segue-se, com as necessárias adaptações, o disposto no nº 4 do artigo 1º [remessa ao autor do duplicado da contestação simultaneamente com a notificação da data da audiência de julgamento] e nos artigos 3º e 4º [termos posteriores aos articulados e audiência de julgamento], só havendo lugar à citação do réu [nova citação, diríamos nós] nos casos em que se tenha frustrado a notificação do requerido [artigo 17º, nº 2 do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9], o que significa que o processo “transita” da fase extra-judicial [injunção] para a judicial [acção administrativa comum] sem que haja lugar a nova citação do réu, valendo como tal a notificação efectuada ao requerido, por carta registada com aviso de recepção, para pagar ao requerente a quantia pedida, acrescida da taxa de justiça por ele paga, ou para deduzir oposição à pretensão [cfr. artigo 12º, nº 1 do regime anexo ao DL nº 269/98, de 1/9], entendimento este reforçado com a remissão que o nº 2 do citado artigo faz para o regime da citação do CPCivil [artigos 231º e 232º, 236º, nºs 2 a 5, e 237º e 238º do anterior CPCivil, e artigos 223º, 224º, 228º, 229º e 230º do actual CPCivil]. Ora, não havendo em tais casos lugar a nova citação do réu, a representação deste terá necessariamente que estar desde logo assegurada por quem caberia representá-lo, nos termos das pertinentes normas de processo, caso se tratasse “ab initio” duma acção comum, ou seja, figurando como réu o Estado português, tal representação cabe ao Ministério Público, de acordo com o disposto no artigo 11º, nº 2 do CPTA, na medida em que a lei atribui àqueles magistrados a competência para representar o Estado-Administração nos tribunais judiciais e nos tribunais administrativos e fiscais [cfr. artigo 219º, nº 1 da CRP, 5º, nº 1 da LOFTJ, 5º, nº 1, alínea a) do Estatuto do Ministério Público, e 24º, nº 1 do CPCivil], sendo igualmente certo que da lei não resulta qualquer limitação do âmbito dessa representação que seja determinada quer pela natureza do processo que ali venha a correr termos e no qual o Estado seja interessado, quer pelo facto de no processo vir ou não a haver intervenção efectiva de um juiz e, caso ela venha a existir, pelo momento a partir do qual tal intervenção venha a ter lugar. Consequentemente, tem de entender-se que essa representação se estende, em juízo, a qualquer forma de processo, declarativo ou executivo, comum ou especial, pelo que também no procedimento de injunção, que reveste natureza especial, caberá ao Ministério Público assegurar “ab initio” a representação do Estado. Procedem, nestes termos, as conclusões da alegação da recorrente, pela que a decisão recorrida não pode manter-se. III. DECISÃO Nestes termos, e pelo exposto, acordam os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul em conceder provimento ao recurso interposto e revogar a decisão recorrida, que julgou verificada a excepção dilatória inominada da ilegal representação do Estado pelo Ministério Público e absolveu o réu Estado Português da instância, ordenando a baixa dos autos ao TAC de Lisboa, para aí prosseguir termos, se a tanto nada mais obstar. Sem custas. Lisboa, 5 de Junho de 2014 [Rui Belfo Pereira – relator por vencimento][Sofia David] [Frederico Branco] (Voto vencido por acompanhar o entendimento da 1ª instância) |