Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 05804/09 |
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Secção: | CA-2º JUÍZO |
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Data do Acordão: | 01/21/2010 |
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Relator: | CRISTINA DOS SANTOS |
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Descritores: | CONTEÚDO DAS CONCLUSÕES CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO |
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Sumário: | 1.O recurso configura-se como o meio processual pelo qual se submete a decisão judicial a nova apreciação por outro Tribunal, tendo por objecto quer a ilegalidade da decisão quer a sua nulidade - art°s. 676° e 668° CPC. 2. É pela alegação e conclusões que se fixa o conteúdo do recurso: nas alegações, a parte há-de expor as razões por que ataca a decisão recorrida; nas conclusões, há-de fazer a indicação resumida dos fundamentos por que pede a alteração ou a anulação da decisão recorrida - art° 690° CPC. 3. Não se considera compreendido no próprio direito ao recurso o convite ao aperfeiçoamento das conclusões nos casos em que o recorrente não tenha apresentado motivação ou todos os fundamentos possíveis de motivação, por tal equivaler, no fundo, à concessão de novo prazo para recorrer. 4. Improcede por inexistência de objecto adjectivamente admissível o recurso cujas conclusões visam questões exógenas aos fundamentos expressos na sentença cautelar recorrida. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | H.............., com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue: 1. Existe uma incorrecta interpretação da lei, e dos factos feita pelo tribunal a quo. 2. A Ré não tem legitimidade para praticar administrativos no âmbito do Reagrupamento familiar, sendo essa competência em exclusivo do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e, como decorre dos artes 98° n°l, art°102° da lei 23/2007 de 4/7 e, art. 2°, n°l, alínea j) do Decreto lei n° 252/2000 de 16/10 (lei orgânica do SEF). 3. Pelo que, o acto administrativo praticado pela Ré é, legalmente inexistente, não tem sentido, sendo nulo, cf. art. 133° n°2, alíneas b) e alínea d) do Código de procedimento Administrativo (CPA). 4. Pelo que, não tem sentido vir o tribunal a quo, e a Ré, virem invocar um acto administrativo de indeferimento. 5. Dispõe o art. 68° n°l do DL 84/2007 de 5/1l "o deferimento do pedido formulado nos termos do n°l do art. 98°n°l da lei 23/2007 de 4/7, é comunicado ao Ministério dos Negócios estrangeiros, e determina a emissão imediata, do visto de residência ". 6. Como também, improcede as razões de interesse público que a Ré se, socorre atento a que o J............, não constitui nenhum perigo ou ameaça pública nacional. 7. Como também, decorre da documentação apresentada que, o pedido de Reagrupamento Familiar feito ao SEF foi apresentado aquando a menoridade do J................ 8. Pelo que, não releva que, o pedido de visto de residência tenha sido feita na maioridade, ou que o mesmo seja já maior. 9. Pois, conforme consta dos autos, e o Mandatário do A., juntou é a Ré que, confirma que uma vez deferido o pedido de Reagrupamento Familiar, o direito ao Visto nunca caduca. 10. Como também, é dilatório a Ré, vir solicitar maior s de subsistência, ou instruir de novo, e indeferir sem ter poderes para tal. 11. Esta é, a questão nuclear, a Ré, intrometeu-se, e intromete-se de forma sistemática em processos de pedidos de visto de residência, com Instruções já deferidas pelo SEF, no âmbito do Reagrupamento familiar, o que, é abusivo, e ilegal. 12. O A., teve a bondade de juntar sentença em processo similar, para comprovar a ingerência da Ré, constante. 13. Tal ingerência é feita de forma intencional, para perigar de forma irremediável, o Direito á Família, e à paternidade que, o A., tem Garantido na Lei fundamental, e na Convenção Europeia, e Carta Europeia. 14. Não colhe, na nossa opinião, a possibilidade de continuidade da acção administrativa especial e, porque é morosa na sua decisão. 15. Como também, não colhe a possibilidade da intentar um providência cautelar, atento a que esta tem natureza precária, e pode ser alterada por acção principal o que, na melhor das hipóteses se, esta, fosse procedente, iria frustrar ainda mais o A., e seu filho, e o conceito de família, e paternidade, caso em acção principal a decisão tivesse o sentido reverso. 16. É, notória a Urgência, do A., em estar com os eu filho, já que, não o vê, praticamente desde que, saiu da Índia, isto é, há cerca de dez (10) anos. 17. O A., está a perder os melhores anos do seu filho, a sua Juventude, o seu crescimento, numa fase de transição da adolescência, para a idade adulta, sabendo - se como se sabe, do perigo das más influências, dos "maus caminhos", não é demais referir que, o J............., não tem uma Pai, ao seu lado, para orientá-lo, conduzi-lo, melhor prepara-lo, para a vida, e futuro, como só um Pai, sabe fazer. 18. É nisso que, se revela o "amor de um Pai", pelo seu filho 19. O A., é um Pai permanentemente ausente. 20. O J............, está votado ao abandono e, à sua sorte, sem rumo, e acampado há dois anos junto ao Posto consular em Deli, o que, também não é abonatório para o Estado Português. 21. Pelo que, se impõe urgência e definitividade na decisão. 22. O que, só é alcançável, com a presente Intimação, já como refere, o corpo do art. 109° n° l do CPTA "célere emissão de uma decisão de mérito, se revele indispensável para assegurar o exercício em tempo útil de um direito, por não ser possível através do decretamento provisório". 23. Como se referiu o direito em causa, é o direito à família e, á paternidade previstos na lei fundamental, e na Convenção Europeia, e Carta Europeia. 24. Sendo impossível o, decretamento provisório, porque tem carácter precário e, não se alancaria uma decisão, ou medida definitiva, como consiste seguramente a Presente Intimação, um final que, consistiria de forma definitiva na Intimação do posto consular, na emissão do Visto de Residência. 25. Tanto mais, que, a providência cautelar, estria sempre dependente de uma acção principal que, poderia demorara anos, e anos a, fio, gorando-se de forma definitiva o conceito família, e paternidade. 26. Sendo, ao mais certo que, caso fosse deferida acção de anulação, o A. e seus filhos seriam entre si, completos estranhos. 27. Teria o A, quantos anos, perto dos sessenta (60) anos. 28. Pelo que, a presente Intimação, é o meio legal mais adequado, quer pelo sua rapidez, e eficácia, pelo carácter definitivo e, atento a que, a Ré, não praticou, porque é inexistente, ou nulo, o acto administrativo praticado, antes devendo por lei, emitir o Visto. 29. Extravasou pois a Ré competências, e ofende o direito à família, pelo que o acto praticado é nulo, ou inexistente, cf. art° 133° n°2,a alíneas b) e d) do CP A. 30. Violaram-se entre outros os artes 56° do dl 244/98;arts 44° n°s l ;3 do D/r 6/2004 de 26/4;arts 98° n°l ,da lei 23/2007 de 4/7;arts 68° n°l do D/r 84/2007 de 5/11; artes 1°; 12°; 13°; 15° a 18°;26º;36º;67°;68º todos da lei fundamental, e artes 8° da Convenção Europeia, e arts7°; 15°;33° da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais da União Europeia, directiva comunitária 86/2003; e lei orgânica do SEF, vide art° 2°, n°l, alínea j). * O Recorrido contra-alegou, concluindo como segue: a. Não se encontram reunidos os pressupostos processuais específicos elencados no n.° 1, do artigo 109.° do CPTA para o Autor, aqui Recorrente se socorrer do processo urgente de intimação; b. Constitui o instrumento legal para assegurar as pretensões do ora Recorrente a acção administrativa especial de anulação ou a providência cautelar, caso pretenda conferir maior urgência, c. Caso assim não se entenda, o que por mero dever de patrocínio se concebe, deve ser considerada procedente a excepção dilatória de litispendência; À cautela e por dever de patrocínio, sempre se dirá, sobre o mérito do pedido do Autor, aqui recorrido. d. Nos termos do artigo 30.° do Decreto-Lei n.° 244/98, de 8 de Agosto, são competentes para conceder vistos "as embaixadas e os postos consulares de carreira"; e. Decorre do n.° 2 do artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 244/98, de 8 de Agosto, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 25 de Fevereiro, que apenas são susceptíveis de serem reagrupados os filhos menores e desde que existam meios de subsistência económica; f. Não tendo o Autor, ora Recorrido, demonstrado que o acto omitido é legalmente devido com o sentido positivo pretendido, isto é, não sendo o acto exigido vinculadamente positivo, não pode ser deferida a pretensão do Autor, aqui Recorrido; g. Nos procedimentos com vista à concessão de vistos, cada situação fáctica é única e exclusiva, não havendo meios de subsistência económica, com o mesmo vínculo laborai e rendimentos, pelo que não é possível aplicar-se, mais mais o princípio da igualdade sem demonstrar o preenchimento dos respectivos pressupostos. * Com dispensa de vistos substituídos pelas competentes cópias, vem para decisão em conferência – artºs. 36º nº s. 1 e 2 CPTA e 707º nº 2 CPC ex vi artº 140º CPTA. * Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte matéria de facto: 1. O requerente, H.............., residente na T............. do T.........., n° ..., ..°, ....-601 ....., é titular da autorização de residência n° POOO ........., válida até 6.12.2010. (documento n° 6 junto com a petição inicial e alegação do requerente não impugnada). 2. Em data não concretamente apurada, o requerente formulou perante o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras um pedido de reagrupamento familiar em favor do seu filho J................, nascido em 5.12.1988, o qual veio a ser deferido por despacho de 21.03.2007 do Director da Direcção Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, (documento n° 3 junto com a petição inicial e alegação do requerente não impugnada). 3. O pedido de visto de residência foi efectuado no posto consular português em Nova Deli pouco tempo depois pelo filho do requerente, J................., mas veio a ser indeferido em 5.08.2008 pela Secção Consular da Embaixada de Portugal em Nova Deli (alegação do requerente não impugnada e documento n° 3 junto com a petição da acção administrativa especial n° ..../09.1BELSB, a correr na 4a Unidade Orgânica, entre as mesmas partes, o qual consta do processo instrutor apenso). 4. O ora requerente intentou acção administrativa especial, que tem o n° ...../09.1BELSB e corre termos na 4a Unidade Orgânica deste tribunal entre as mesmas partes, na qual impugna o referido despacho de 5.08.2008 que indeferiu o pedido de visto de residência e foi proferido pela Secção Consular da Embaixada de Portugal em Nova Deli. (alegação da entidade requerida confirmada pelo requerente e processo instrutor). 5. Nesta acção administrativa especial, o ora requerente formulou contra o Ministério dos Negócios Estrangeiros os seguintes pedidos: "1. Ser anulada a decisão de indeferimento de visto de residência formulado pelo filho do A., nos termos da al. a) do n° 2 do artigo 46° do CPTA, com fundamento na sua ilegalidade. 2. Ser o Ministério dos Negócios Estrangeiros condenado a emitir visto de residência a favor do filho do A., nos termos da al. b) do n° 2 do mesmo artigo", (cópia da petição da acção administrativa especial n°....../09.1BELSB constante do processo instrutor). 6. O presente processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias foi intentado no dia 19.09.2009. (fls. 1 dos autos). DO DIREITO Em sede de sentença, o discurso jurídico fundamentador do sentido decisório é o que, de seguida, se transcreve, sendo nossos os trechos evidenciados a bold e sublinhado: “(..) III - Na presente processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias intentado contra o Ministério dos Negócios Estrangeiros o requerente formula o seguinte pedido: "...notificado o Ministério dos Negócios Estrangeiros para diligenciar a emissão urgente do respectivo Visto de Residência para o familiar do Autor J..................... a fim de permitir ao A. poder reagrupar a seu filho, para melhor educar e prover ao sustento do mesmo, exercendo assim de forma plena a sua paternidade". Conforme consta dos pontos 4 e 5 da matéria de facto assente, o ora requerente na acção administrativa especial que também intentou contra o Ministério dos Negócios Estrangeiros os seguintes pedidos: "1. Ser anulada a decisão de indeferimento de visto de residência formulado pelo filho do A., nos termos da al. a) do n° 2 do artigo 46° do C. P. T. A, com fundamento na sua ilegalidade. 2. Ser o Ministério dos Negócios Estrangeiros condenado a emitir visto de residência a favor do filho do A., nos termos da ai. b) do n° 2 do mesmo artigo". Nos termos do disposto no art.° 497°, n° 1 do Cód. Proc. Civil, a excepção da litispendência ocorre quando se verifica a repetição de uma causa, estando a anterior ainda em curso. No art.° 498°, n° 1 do C. P. Civil enunciam-se os requisitos da litispendência, por referência aos pressupostos para que haja repetição de uma causa: identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir. O requerente alega que os pedidos são diferentes, pois, no processo n°..../09.1BELSB o pedido consiste em "anular a decisão de indeferimento do pedido de residência formulado pelo filho do Autor". No art° 498°, n° 3 do C. P. Civil dispõe-se que: "Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico". Contrariamente à alegação do requerente, é fora de dúvida que entre esta acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias e a acção administrativa especial n° ...../09.1BELSB, antes interposta, existe identidade de sujeitos e de pedidos, embora nesta o autor também deduza o pedido de anulação do acto administrativo de indeferimento do pedido de concessão do visto de residência. Porém, o actual contencioso administrativo já não tem natureza de estrita anulação, mas de plena jurisdição, pelo que nas acções administrativas especiais, ainda que haja um pedido de anulação, tem sempre de haver um pedido de condenação à prática do acto administrativo devido, o qual constitui o verdadeiro objecto do processo, de forma a constituir a definição útil e final do caso posto à consideração do tribunal, (cfr. art° 51°, n° 4 do CPTA). Ora, face aos pedidos formulados em ambas as acções, verifica-se que há, entre elas, identidade de pedidos, visto que em ambos os processos o autor pretende obter a condenação do réu a praticar um acto administrativo que consiste na emissão urgente do Visto de Residência para o seu filho J................... Resta averiguar se também há identidade de causa de pedir, dispondo-se no art° 498°, n° 4 do C PCivil o seguinte: "Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Nas acções reais, a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real; nas acções constitutivas e de anulação é o facto concreto ou a nulidade específica que se invoca para obter o efeito pretendido". Tendo em conta os factos jurídicos invocados pelo ora requerente em ambas as acções (constando a petição do primeiro processo), verifica-se que os factos alegados na acção administrativa especial constam também do presente processo e são relativos à mesma relação jurídico-administrativa entre si e o réu. Porém, neste processo de intimação o requerente invoca também a violação dos direitos constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana e a constituir família, bem como alega a urgência na emissão do visto e a impossibilidade de uma providência cautelar assegurar o efeito útil da decisão a tomar na acção administrativa especial. Assim, embora haja identidade de causa de pedir entre os dois processos, os factos jurídicos invocados na intimação, por se tratar de forma especial de processo, extravasam os da acção administrativa especial e incluem também a utilidade do pedido aí formulado, ou seja, estendem-se à tutela cautelar do próprio pedido principal. Nesta medida, muito embora haja que ter em conta que a tripla identidade da excepção da litispendência deve ser conexionada com a regra basilar imposta pelo artigo 497°, n° 2 do CPCivil - finalidade de evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir decisão anterior -, tem de reconhecer-se que não existe identidade de causa de pedir, pois, na intimação para protecção de direitos liberdades e garantias os factos jurídicos invocados estendem-se a própria utilidade do exercício do direito em causa em ambos os processos. Nesta conformidade, importa concluir que entre o processo nº....../09.1BELSB, que também corre termos neste tribunal, e o presente processo, há identidade de sujeitos e de pedidos, mas não há identidade de causa de pedir, pelo que este processo não a repetição do primeiro. Assim, julgo improcedente a excepção dilatória da litispendência. xxx IV - Cumpre agora apreciar, os pressupostos processuais específicos previstos para a acção de intimação para protecção de direitos liberdades e garantias. Dispõe-se no art. 109°, n.° 1 do CPTA, aprovado pela Lei n.° 15/2002, de 22 de Fevereiro, o seguinte: "A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias pode ser requerida quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente, nas circunstâncias do caso, o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131°". Resulta evidenciado desta disposição legal que o decretamento de uma intimação através deste específico meio processual depende dos seguintes pressupostos: a) que a emissão urgente de uma decisão de mérito seja indispensável para protecção de um direito, liberdade ou garantia; b) que não seja possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar no âmbito de uma acção administrativa. Como se pode ler em anotação ao artigo 109° no Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, de Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, 2a edição revista, 2007, pág. 631, o processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias foi "...instituído como um meio subsidiário de tutela, vocacionado para intervir como válvula de segurança do sistema de garantias contenciosas, nas situações - e apenas nessas - em que as outras formas de processo contencioso administrativo não se revelem aptas a assegurar a protecção efectiva de direitos, liberdades e garantias". Este processo de intimação é um processo de tramitação rápida que tem como finalidade obter a tutela de um direito fundamental da categoria de direitos, liberdades e garantias que se encontre ameaçado, no seu exercício útil, por um comportamento positivo ou omissivo da Administração ou de um particular, pressupondo, no caso concreto, uma situação de natureza tão urgente que reivindica uma decisão judicial inadiável. A natureza urgente do conflito a solucionar no âmbito deste meio de intimação não se compadece com a tutela provisória das providências cautelares, mas obriga o tribunal a considerar o diferendo de forma global e a pronunciar-se de modo definitivo e irreversível, abarcando a decisão o objecto da causa principal, cujo conhecimento só se fará caso se verifiquem os pressupostos prévios acima enunciados. A esta luz, verifica-se que o conflito que opõe o requerente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros não pode ser resolvido através do processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias. Na verdade, está em causa um procedimento administrativo relativo à concessão de um Visto de Residência a um cidadão estrangeiro no âmbito de um processo de reagrupamento familiar, no qual já foi proferido um acto expresso de indeferimento do mesmo. Assim, o acto administrativo já proferido pela Administração deve ser impugnado através da acção administrativa especial prevista nos artigos 46° e seguintes do CPTA, tal como o ora requerente já fez, por se tratar do meio processual próprio para apreciar as ilegalidades apontadas pelo requerente à decisão. Estando em causa um acto de indeferimento da concessão de um Visto de Residência é possível ao requerente obter a tutela urgente dos direitos que invoca através de uma providência cautelar antecipatória (art. 120°, n° 2, al. c) do CPTA), na qual formule pedido que lhe permita obter o efeito pretendido com os presentes autos. Contrariamente à alegação do requerente, sob pena de esvaziamento das normas que prevêem as providências cautelares antecipatórias, a eventual imposição à Administração da obrigatoriedade de concessão do Visto de Residência, em sede cautelar, não contende com o requisito de instrumentalidade da medida, nem implica o esvaziamento do processo principal, visto que só este regula de modo definitivo a situação. Conclui-se, assim, que não ocorre o segundo pressuposto acima enunciado: a impossibilidade ou insuficiência do decretamento de uma providência cautelar no âmbito de uma acção administrativa já interposta. A falta deste pressuposto não configura uma simples questão de natureza formal, mas tem a ver com os requisitos substanciais para o deferimento de uma providência cautelar, requisitos que o legislador erigiu como a via normal para a resolução de situações de natureza urgente ainda que relativas à protecção de direitos, liberdades e garantias. Além disso, verifica-se que a urgência de uma decisão de mérito indispensável para protecção dos direitos invocados, só ocorre, precisamente, porque o requerente não requereu qualquer medida cautelar à data da interposição da acção administrativa especial. Impõe-se, pois, por falta dos pressupostos processuais específicos previstos no art. 109°, n° 1 do CPTA, a rejeição do pedido formulado pelo requerente. xxx V - Pelo exposto, por falta dos pressupostos processuais específicos previstos no art. 109°, n° 1 do CPTA, indefiro a presente intimação requerida por H................. Sem custas (art° 4°, n.° 2, al. c) do Regulamento das Custas Processuais), sendo o valor da causa indeterminável, ou seja, de 30.000,01 Euros. (..)” *** Diga-se que o decidido e respectiva fundamentação são para confirmar in totum. a) alegações e conclusões de recurso - função processual Semelhantemente ao que já vinha do art° 102° LPTA, dispõe o artº 140º CPTA que, sem prejuízo do disposto no ETAF e na Lei em causa, os recursos ordinários das decisões proferidas pelos tribunais administrativos se regem, com as necessárias adaptações, pelo disposto na lei processual civil, sendo tais recursos processados segundo os termos do agravo em matéria cível. Da remissão para o complexo normativo do CPC tem especial interesse, no caso dos autos, o disposto no art° 690° n° l, “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual concluirá, deforma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.” Ou seja, configurando-se o recurso como o meio processual pelo qual se submete a decisão judicial a nova apreciação por outro tribunal, tendo por objecto quer a ilegalidade da decisão quer a sua nulidade, art°s. 676° e 668° CPC, é pela alegação e conclusões que se fixa o conteúdo do recurso: nas alegações, a parte há-de expor as razões por que ataca a decisão recorrida; nas conclusões, há-de fazer a indicação resumida dos fundamentos por que pede a alteração ou a anulação da decisão recorrida, art° 690° CPC. Segundo a doutrina, “(..) O Tribunal superior tem de guiar-se pelas conclusões da alegação para determinar, com precisão, o objecto do recurso; só deve conhecer, pois, das questões ou pontos compreendidos nas conclusões, pouco importando a extensão objectiva que haja sido dada ao recurso, quer no requerimento de interposição, quer no corpo de alegação (..) (..) o despacho ou sentença deve ser revogado no todo ou em parte. É claro que a demonstração desta tese implica a produção de razões ou fundamentos. Essas razões ou fundamentos são primeiro, expostos, explicados e desenvolvidos no curso da alegação; hão-de ser, depois, enunciados e resumidos, sob a forma de conclusões, no final da minuta. É claro que, para serem legítimas e razoáveis, as conclusões devem emergir logicamente do arrazoado feito na alegação. As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação (..)” (1). Neste domínio as sucessivas alterações adjectivas nada de essencial vieram inovar, como resulta do disposto no art° 690° CPC: “(..) o recorrente deve apresentar, sob pena de deserção do recurso, uma alegação na qual indique os fundamentos por que pede a alteração ou a anulação da decisão recorrida (..) As alegações devem terminar com a apresentação das conclusões, nas quais, quando o recurso verse sobre matéria de direito, devem ser indicadas as normas jurídicas violadas, o sentido dado pelo recorrente à interpretação e aplicação das normas que fundamentam a decisão e ainda, se for invocado um erro na determinação da normas aplicável, a norma jurídica que devia ter sido aplicada. A especificação dos fundamentos do recurso pelo recorrente destina-se a delimitar o seu objecto (..)” (2). b) função auxiliadora do tribunal; convite ao aperfeiçoamento - limites Por conjugação do disposto nos artºs. 690º nº 4, 700º nº 1 b) e 701º nº 1 in fine CPC, pode o recorrente ser convidado a aperfeiçoar as conclusões das suas alegações sempre que elas sejam deficientes, obscuras, complexas ou não respeitem o conteúdo legalmente exigido, despacho que integra o uso de um poder discricionário do juiz do processo, artº 679º CPC. Todavia, este convite para aperfeiçoar as conclusões - e não as alegações, que, como acima dito, consubstanciam a indicação dos fundamentos do pedido de alteração ou anulação da decisão recorrida – não pode redundar, a favor da parte convidada, num alargar de prazo de recurso, em desfavor dos princípios processuais da imparcialidade do Tribunal e da igualdade das partes, este último consagrado no artº 3 - ACPC, cujo destinatário é, precisamente, o tribunal. Em nosso critério e salvo o devido respeito por entendimento distinto que não se desconhece, este art° 3°- A CPC (3), no que tange à função do Tribunal de garantir a igualdade substancial das partes, deve ser interpretado no sentido negativo, ou seja, entendendo-se que se proíbe que o Tribunal promova a desigualdade das partes, e não no sentido positivo, isto é, de cometer ao juiz a promoção da igualdade das partes no processo e de, eventualmente, auxiliar a parte necessitada. Em síntese, ao Tribunal é proibido promover a desigualdade das partes não tendo, contudo que a promover, essa é tarefa geral do legislador, aperfeiçoando o direito objectivo (substantivo ou processual), ou particular do advogado constituído nos autos, no âmbito do exercício do direito de defesa dos interesses do seu cliente na instância processual. Ao juiz cabe, por atribuição constitucional, declarar o Direito e a Justiça do caso concreto; não lhe cabe substituir-se ao legislador nem ao advogado constituído nos autos para remediar as eventuais imperfeições da lei ou de exercício do direito de acção. O juiz não pode nem deve extravasar da função de mero auxiliar no simples aperfeiçoamento de articulados e conclusões de recurso, art°s 508° n° l b) e n° 3, 690° n° 4 e 701° n° l CPC, não lhe sendo lícito assumir uma acção salvífica de articulados que nada contenham ao nível dos factos essenciais à individualização da situação jurídica e procedência da acção ou excepção, cfr. art° 264° CPC, ou de recursos que nada aleguem ao nível dos fundamentos e questões de recurso, art°s. 690° e 690°-A CPC. Mesmo sufragando, que não é o caso, a tese de sentido positivo, a dimensão normativa dos convites ao aperfeiçoamento de articulados, alegações e conclusões de recurso não consente interpretação a ponto de defender que o Tribunal, pela sua intervenção auxiliadora no processo, supra o incumprimento dos ónus que competem às partes. A levar o sentido securitário e garantístico tão longe a autoria de articulados, alegações e conclusões de recurso será, não da parte, mas do juiz, em desrespeito absoluto com os princípios constitucionais da independência dos Tribunais e da insusceptibilidade de responsabilização do juiz pela decisão do processo, cfr. art°s. 203° e 216° n° 2 CRP. A direcção da causa pelo juiz através do convite ao aperfeiçoamento a ponto de lhe autorizar a iniciativa de alegação de direito substantivo e a condução da iniciativa processual a investir nos autos, traduz-se em que esse concreto juiz desse concreto processo deixa de ser o juiz da causa para se transmutar na causa do juiz configurando-se como responsável pela decisão tomada, na medida em que o direito substantivo alegado e/ou a oportunidade de intervenção na instância são suas e não do advogado constituído, demonstrada pelo conteúdo dos despachos de aperfeiçoamento em matéria de direito substantivo e adjectivo, pelos quais, em concreto, auxiliou aquela parte, também em concreto. Esta questão dos convites a suprir deficiências tem merecido pronúncia do Tribunal Constitucional, tanto no âmbito do art° 412°, Código de Processo Penal como do regime paralelo consagrado nos art°s. 690° n°s. l e 2 e 690°-A, Código de Processo Civil, chamando-se aqui à colação, por todos, o recente Acórdão nº 140/04/Tribunal Constitucional – procº nº 565/03, publicado in DR II Série, n° 91 de 17.ABR. No citado aresto foi discutida e decidida a questão de saber se é inconstitucional a interpretação no sentido de que a falta de especificação legalmente exigida, tanto na motivação como nas conclusões de recurso, tem como efeito a improcedência deste sem que ao recorrente tenha sido dada oportunidade de suprir tais deficiências. O que o Tribunal Constitucional tem sancionado no domínio penal, é a interpretação no sentido do efeito cominatório preclusivo do recurso com base na falta de concisão das conclusões, ou da indicação nas conclusões das menções contidas no art° 690° n° 2 a), b) e c) CPC, sem que tenha havido prévio convite ao recorrente para suprir tais deficiências, considerando aquele Alto Tribunal que tal imediato efeito preclusivo constitui uma interpretação normativa eivada de acentuado formalismo que, em consequência, vem postergar a garantia constitucional do acesso ao Direito e aos Tribunais consagrada no art° 20° n° l CRP, nela incluída o direito ao recurso - vd. pontos 10.3 e 10.4 do citado aresto. Não assim nos casos em que a rejeição do recurso se fundou na insubsistência legal do requerido segundo convite à consisão de conclusões nem no facto de o conteúdo das conclusões visar não a sentença recorrida mas o acto administrativo inicialmente impugnado – vd. pontos 11.1 e 11.3 do citado aresto. Sobre este segundo fundamento, o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 374/2000, de 13 de Julho, in DR, II Série, n° 285, de 12.12.2000, proferido em processo de natureza administrativa. Mais. No que importa ao disposto nos art°s. 690° n°s. l, 3 e 4 e 690°- A n° 2 CPC, ou seja, no domínio não penal, o Tribunal Constitucional tem entendido que, com sublinhados nossos, “(..) do art° 20° n° l da Constituição não decorre um genérico direito à obtenção de um despacho de aperfeiçoamento (..). (..) Uma outra situação parece justificar ainda que não seja proferido despacho de aperfeiçoamento, a ela se aludindo no Acórdão n° 374/2000, de 13 de Julho: aquela em que, da análise da peça processual oferecida pelo recorrente, decorre que não se está perante o deficiente cumprimento de um ónus (no caso, perante uma eficiente identificação do objecto do recurso), mas perante um pedido que não pode deixar de improceder. O despacho de aperfeiçoamento, na linha de pensamento deste acórdão, não serviria para o tribunal se substituir à vontade do recorrente, convidando-o a submeter à sua apreciação um objecto diverso. (..) nem da jurisprudência deste Tribunal relativa aos recursos de natureza penal (ou contra- ordenacional) nem da relativa aos recursos de natureza não penal pode retirar-se que o despacho de aperfeiçoamento seja uma exigência constitucional, naqueles casos em que o recorrente não tenha, por exemplo, apresentado motivação ou todos os fundamentos possíveis de motivação. Tal equivaleria, no fundo, à concessão de novo prazo para recorrer, que não pode considerar-se compreendido no próprio direito ao recurso. (..) (..) Sendo a decisão da matéria de facto cindível, na medida em que existem tantos julgamentos quantos os pontos de facto submetidos à consideração do Tribunal a quo, é evidente que, se o recorrente/assistente não cumprir na especificação a que aludem os n°s. 3 e 4 do artigo 412° do CPP, o tribunal ad quem desconhecerá a vontade do recorrente e pronunciar-se-á sobre um objecto da sua própria escolha, o que frontalmente contraria a própria ideia de recurso (..)”, correspondendo, em sede adjectiva cível, ao disposto no art° 690° - A n° l alíneas a) e b) CPC. O Tribunal Constitucional é muito claro quanto a justificar um juízo de inconstitucionalidade sobre a interpretação de omissão de convite e rejeição mediata do recurso apenas quando “(..) se está perante deficiências relativas apenas à formulação das conclusões e não já perante faltas imputadas ao próprio conteúdo. Neste último caso não se vê que a Constituição possa impor qualquer dever de convidar o interessado a corrigir ou completar a peça processual em causa, ou as suas conclusões (..)” – vide Aresto citado. * Na circunstância dos autos, o conteúdo das conclusões avançadas pelo Recorrente evidencia que, no caso, são trazidas a recurso questões exógenas aos fundamentos expressos na sentença cautelar proferida e que se contêm no domínio da natureza subsidiária do meio adjectivo previsto no artº 109º CPTA. É patente que os itens 2 a 30 configuram conclusões de recurso reportadas (i) a controvérsias a propósito do acto administrativo praticado pelo Recorrido, matéria em si não versada na sentença (ii) ou a considerações de natureza melodramática, e não de natureza de facto ou de direito, que também nada têm a ver com o conteúdo da sentença de que se recorre. Consequentemente, o recurso improcede por inexistência de objecto adjectivamente admissível. *** Termos em que acordam, em conferência, os Juizes Desembargadores que constituem a Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em não conhecer do recurso por falta de objecto. Sem tributação – art° 4°, n.° 2, al. c) do RCP. Lisboa, 21.01.2010. (Cristina dos Santos) (António Vasconcelos) (Paulo Carvalho) (1) Alberto dos Reis, Código de processo civil anotado, Vol. V, Coimbra, 1881, págs.309 e 359. (2) Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex, 2a edição, págs.524 a 526. (3) Artº. 3°-A CPC - "O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais." |